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Festas tradicionais do Brasil Biblioteca do senado LIVRO COMPLETO

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Festa de Nossa Senhora do Rosário, Padroeira dos Negros. Gravura de Johann Moritz Rugendas.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
FESTAS E TRADIÇÕES 
POPULARES DO BRASIL
Mesa Di re to ra 
Biênio 2001/2002
Se na dor Ra mez Tebet
Pre si den te
Se na dor Edi son Lobão
1º Vice-Pre si den te
Se na dor Antonio Car los Valadares
2º Vi ce-Presidente
Se na dor Car los Wil son
1º Se cre tá rio
Se na dor Ante ro Paes de Bar ros
2º Se cre tá rio
Se na dor Ro nal do Cu nha Lima
3º Se cre tá rio
Se na dor Mo za ril do Cavalcanti
4º Se cre tá rio
Su plen tes de Se cre tá rio
Se na dor Alber to Sil va Se na do ra Mar lu ce Pin to
Se na do ra Ma ria do Car mo Alves Se na dor Nilo Te i xe i ra Cam pos
Con se lho Edi to ri al
Se na dor Lú cio Alcân ta ra
Pre si den te
Jo a quim Cam pe lo Mar ques
Vi ce-Presidente
Con se lhe i ros
Car los Hen ri que Car dim Carl yle Cou ti nho Ma dru ga
Ra i mun do Pon tes Cu nha Neto
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Co le ção Bi bli o te ca Bá si ca Bra si le i ra
FESTAS E TRADIÇÕES
 POPULARES DO BRASIL
Melo Mo ra is Fi lho
Di re tor-Arquivista da Mu ni ci pa li da de do Rio de Ja ne i ro
Pre fá cio de Síl vio Ro me ro
De se nhos
 de Flu men Ju ni us 
Bra sí lia – 2002
BIBLIOTECA BÁSICA BRASILEIRA
O Con se lho Edi to ri al do Se na do Fe de ral, cri a do pela Mesa Di re to ra em 31 de ja ne i ro de
1997, bus ca rá edi tar, sem pre, obras de va lor his tó ri co e cul tu ral e de im por tân cia re le van t e para
a com pre en são da his tó ria po lí ti ca, eco nô mi ca e so ci al do Bra sil e re fle xão so bre os des ti nos do país.
COLEÇÃO BIBLIOTECA BÁSICA BRASILEIRA
A Qu e re la do Esta tis mo, de Antô nio Paim
Mi nha For ma ção (2ª edi ção), de Jo a quim Na bu co
A Po lí ti ca Exte ri or do Impé rio (3 vols.), de J. Pan diá Ca ló ge ras
Ca pí tu los de His tó ria Co lo ni al, de Ca pis tra no de Abreu
Insti tu i ções Po lí ti cas Bra si le i ras , de Oli ve i ra Vi a na
De o do ro: Sub sí di os para a His tó ria, de Ernes to Sena
Pre si den ci a lis mo ou Par la men ta ris mo?, de Afon so Ari nos de Melo Fran co e Raul Pila
Rui – o Esta dis ta da Re pú bli ca, de João Man ga be i ra
Ele i ção e Re pre sen ta ção, de Gil ber to Ama do
Di ci o ná rio Bi o bi bli o grá fi co de Au to res Bra si le i ros, or ga ni za do pelo Cen tro de Do cu men ta ção do Pen sa men to
 Bra si le i ro
Obser va ções so bre a Fran que za da Indús tria, do Vis con de de Ca i ru
A re nún cia de Jâ nio, de Car los Cas te lo Bran co
Jo a quim Na bu co: re vo lu ci o ná rio con ser va dor, de Va mi reh Cha con
Oi tos Anos de Par la men to, de Afon so Cel so 
Pen sa men to e Ação de Rui Bar bo sa, se le ção de tex tos pela Fun da ção Casa de Rui Bar bo sa
His tó ria das Idéi as Po lí ti cas no Bra sil, de Nel son No gue i ra Sal da nha
A Evo lu ção do Sis te ma Ele i to ral Bra si le i ro, de Ma nu el Ro dri gues Fer re i ra
Ro dri gues Alves: Apo geu e De clí nio do Pre si den ci a lis mo (2 vo lu mes), de Afon so Ari nos de Melo Franco
O Esta do Na ci o nal, de Fran cis co Cam pos
O Bra sil So ci al e ou tros Estu dos So ci o ló gi cos, de Sílvio Ro me ro
Pro je to Grá fi co: Achil les Mi lan Neto
Ó Se na do Fe de ral, 2002
Con gres so Na ci o nal
Pra ça dos Três Po de res s/nº – CEP 70165-900 – Bra sí lia – DF
CEDIT@ce graf.se na do.gov.br 
http://www.se na do.gov.br/web/con se lho/con se lho.htm
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Mo ra es Fi lho, Mel lo, 1843-1919.
 Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Bra sil / Melo Mo ra is Fi lho ; com
um pre fá cio de Síl vio Ro me ro ; de se nhos de Flu men Juni us. – Bra sí lia :
Se na do Fe de ral, Con se lho Edi to ri al, 2002.
 386 p. : il. -- (Co le ção Bi bli o te ca bá si ca bra si le i ra)
 1. Fes ta po pu lar, Bra sil. 2. Fes ta re li gi o sa, Bra sil. 3. Fol clo re, Bra sil.
I. Tí tu lo. II. Sé rie.
 CDD 394.20981
Su má rio
PREFÁCIO
pág. 15
FESTAS POPULARES
Ca sa men to na roça
pág. 21
Ano-Bom
pág. 31
Car na val
pág. 39
A Fes ta do Di vi no
pág. 53
A No i te de Na tal
pág. 63
A Vés pe ra de Reis 
pág. 73
A Pro cis são de S. Ben edi to no La gar to
pág. 87
A Vés pe ra de S. João
pág. 97
O 2 de Ju lho 
pág. 105
O Entru do 
pág. 115
O 7 de Se tem bro
 pág. 123
A Fes ta da Pe nha
 pág. 131
Os Cu cum bis
pág. 141
A Fes ta do Di vi no
 pág. 151
FESTAS RELIGIOSAS
As San tas Mis sões
pág. 167
S. Se bas tião
pág. 175
A Fes ta da Gló ria 
pág. 183
As En co men da ções das Al mas
pág. 191
Cor pus Chris ti
pág. 199
Qu in ta-Fe i ra San ta
 pág. 207
Sex ta-Feira da Pa i xão
pág. 213
Pre ces para Pe dir Chu va 
pág. 219
O Dia de Fi na dos
pág. 225
TRADIÇÕES
 A Fes ta da Mo a gem
pág. 233
Um Ca sa men to de Ci ga nos em 1830
pág. 243
A Fes ta dos Mor tos
pág. 253
Nos so-Pai
pág. 261
O En for ca do
pág. 269
A Co ro a ção de um Rei Ne gro em 1748
pág. 279
Na Ter ra e no Mar
pág. 285
O Va lon go
pág. 299
Um Fu ne ral Mo çam bi que em 1830
pág. 305
Lu cas da Fe i ra
pág. 311
O Na vio Ne gre i ro
pág. 317
TIPOS DA RUA
Ca po e i ra gem e Ca po e i ras Cé le bres
pág. 325
O Ca pi tão Na bu co
pág. 335
O Estra da de Fer ro
pág. 345
O Fi ló so fo do Cais
pág. 347
A For te-Lida
pág. 351
O Mi gue lis ta
pág. 353
O Po li car po
pág. 355
O Bo len ga
pág. 359
O Pica-Pau
pág. 363
O Pa dre Kelé
pág. 367
A Ma ria Doida
pág. 371
O Pra ia-Grande
pág. 373
Bar re to Bas tos
pág. 375
O Chi co Cam bra ia
pág. 377
O “Não Há de Ca sar”
pág. 381
O To más Ca cha ço
pág. 383
À me mó ria de meu pai
As bên çãos do povo bra si le i ro
por to dos os sé cu los da His tó ria
Ao ilus tre ci da dão
Dr. Hen ri que Va la da res
Ho me na gem res pe i to sa do au tor
Aos dou to res
Cân di do Ba ra ta Ri be i ro
e
Mou ra Bra sil
Lem bran ça de par ti cu lar es ti ma e con ven ci da ad mi ra ção
MELO MORAIS FILHO
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Pre fá cio
Não se deve es pe rar de mim que ve nha, nes te lu gar, que
me é ce di do pela ge ne ro si da de de Melo Mo ra is Fi lho, fa zer ain da uma
vez a ca rac te rís ti ca des te es cri tor, a aná li se des te po e ta.
O que ti nha a di zer em tão ele va do in tu i to já está es cri to na
His tó ria da Li te ra tu ra Bra si le i ra, e é co nhe ci do pelo pú bli co.
Mas, de en tão para cá, de en tão até hoje, a si tu a ção do es pí ri to
do ho mem de le tras, e as con di ções de nos sa pá tria não te rão mu da do?
Nada ha ve rá a jun tar ao que foi dito há cin co anos? Em uma 
e ou tra es fe ra, no es pí ri to do es cri tor e na vida do país, ope ra ram-se al te ra ções,
aqui pro fun das, ali bem sig ni fi ca ti vas.
Não as des cre ve rei nes te mo men to e nes te pos to, que devo à
ami za de. Duas pa la vras de ín ti mo co ló quio com o ilus tre au tor das
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Bra sil, eis quan to ve nho de por de 
leve nes tas pá gi nas. 
Em vin te e qua tro anos de vida de pu bli ci da de, que tan tos são 
os que me ca bem até hoje nas li des li te rá ri as bra si le i ras, é bem de ver e
ad mi tir que te nha co nhe ci do e pra ti ca do a mor par te dos es cri to res de
meu país.
Inte li gên ci as ele va das, ta len tos cul tos, ca rac te res se gu ros, in di -
vi du a li da des sin gu la res, mo da li da des di ver sas d’alma hu ma na, fe i ções
dis tin tas do gê nio na ci o nal, mu i tos pas sa ram por mim e me de i xa ram a
gra ta re cor da ção de sua con vi vên cia amis to sa. Des cre vê-los, fa zê-los ago ra 
no mi na ti va men te pas sar-me di an te, no taras im pres sões pro du zi das, se -
ria doce, se ria agra dá vel ao meu co ra ção, já mu i to de si lu di do: mas exi gi -
ria tem po e es pa ço, de que não pos so dis por. Bas te-me nes te mo men to
des ta car, pe las se me lhan ças e pe las an tí te ses que re ve lam, em apa ga das
li nhas, em rá pi da si lhou et te, as fi si o no mi as dos dois com quem mais
convi vi até hoje, os dois que mais es ti mei, que mais in ti ma men te aga sa lhei
na minha sim pa tia, pela fran que za de seu tra to, bon da de de seus senti men tos, 
atra ções de seu es pí ri to, in te gri da de de seu ca rá ter. 
Com ple ta men te afas ta dos os dois na di re ção da cul tu ra e na
ín do le das idéi as; per fe i ta men te dis tan ci a dos no modo de ver e apre ci ar
mais de um fato, de pe sar mais de um acon te ci men to da or dem men tal,
ti nham am bos mais de um pon to de con tac to, mais de um tra ço de se me -
lhan ça nos re ces sos ín ti mos do gê nio.
Na tu re zas sa di as, for tes, na ti va men te vol ta das à ale gria, ao
di ver ti men to, à vida fol ga zã e des pre o cu pa da de nos sas clas ses po pu la res,
na qui lo que elas ti nham de mais se le to, de mais ori gi nal, de mais fun da -
men tal men te puro, na pro vín cia, há uns trin ta ou qua ren ta anos atrás,
os meus dois ami gos con ser vam sem pre a es pon ta ne i da de da con ver sa ção,
a gra ci o si da de da pi lhé ria, o bom hu mor do tra to, o re pen te dos di tos, a
iro nia des pre ten si o sa da ré pli ca, al gu ma coisa que se pu de ra cha mar a
po e sia do ca rá ter nas al mas boas.
Fi lhos da pro vín cia, de sua in fân cia po pu lar, re li gi o sa, ca tó li ca,
não con se gui ram ja ma is apa gar as pro fun das im pres sões.
Aman tes do Bra sil em grau ex tre mo e achan do-o des vi a do da -
qui lo que so nha vam em seu pa tri o tis mo, tor na ram-se a nos so res pe i to
ver da de i ros pes si mis tas; um, por que a pá tria não era ain da o que ele
que ria que ela fos se; ou tro, por que ela ti nha de i xa do de ser o que ele
queria que ela sem pre fi cas se sen do. Um ati rou-se ao vór ti ce da ciên cia
16 Melo Mo ra is Filho
moder na, ao tor ve li nho da fi lo so fia, da crí ti ca, e, no seu so nhar pelo por vir, 
qua se de ses pe ra va da pá tria, que não an da va de pres sa; ou tro, con cen tra do
na his tó ria, na tra di ção, qua se tam bém de ses pe ra de sua ter ra, que vai
es que cen do o seu pas sa do, per den do o seu ca rá ter na ti vo, ol vi dan do as
suas len das, os seus cos tu mes, as suas fes tas, mas ca ran do a fi si o no mia,
tão sin ge la e pra zen te i ra na sua ori gi na li da de, com os ou ro péis de umas
es tran ge i ri ces im por tu nas.
Ambos, como po e tas, são fun da men tal men te cren tes, ele gía cos,
român ti cos, uma re vi ves cên cia, uma res so nân cia das ve lhas cor das ma vi o sas 
do li ris mo in gê ni to à nos sa raça. Como crí ti cos e ana lis tas, di fe ren ci am-se: 
um escre veu os Estu dos Ale mães, como que in di can do ao Bra sil o
ca mi nho do fu tu ro, ou tro es cre veu as Fes tas e Tra di ções Po pu la res,
como que nos apon tan do a tri lha do pas sa do.
E es sas duas fi si o no mi as em um pon to pa re ci das, e em ou tro
tão des se me lhan tes, são como dois so bre vi ven tes que fi ca ram da que la
gran de ge ra ção, que fe chou o ci clo do ro man tis mo, ou vin do os úl ti mos
can tos de Va re la e Cas tro Alves.
E eu os es cu tei, eu os amei; por que os com pre en di na di ver si -
da de das ín do les, na sin ce ri da de das emo ções, na pro fun de za dos afe tos.
Um, não há mu i to, mor reu; e o ou tro, vivo ain da, quer que o
con si de rem o que sem pre foi, o que sem pre quis ser, um ho mem do pas sa do, 
um ho mem para quem o Bra sil só tem atra ti vos nos tem pos que já se
fo ram, em umas pou cas de tra di ções que já mor re ram.
Com pre en den do as duas po si ções, aman do o pas sa do, cuja his tó ria,
cujas tra di ções tam bém es tu dei e des cre vi, e es pe ran do do fu tu ro, pelo
qual tam bém te nho pro cu ra do em pe nhar o meu des va lo ro so es for ço, não é 
sem melan co lia, sem uma cer ta dose de de sa len to, que me re cor do de
haver vis to, mu i tas ve zes, de ses ti ma dos, des co nhe ci dos, pela in gra ti dão
dos par vos, os la bo res des ses dois ope rá ri os cons ci en ci o sos e me ri tó ri os.
Do au tor dos Dias e No i tes, por mais que di fe ren ci a do do
pre sen te seja o nos so sen tir vin dou ro, onde hou ver al gu ma alma aman te
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 17
des te país gos ta rá ela de re cor dar-lhe os can tos pa trió ti cos; onde hou ver
al gum es pí ri to se den to de sa ber, ane lan te de pro gres so, de ses pe ra do por
sa cu dir a po e i ra das con ven ções que as fi xi am, pro cu ra rá ele nas crí ti cas
do mor to ilus tre os es tí mu los avi ven ta do res da luta, ger mi na ti vos da luz e 
do pro gres so.
Pelo que toca es pe ci al men te ao au tor des ta bela obra, pos so
di zer que, por mais que te nha de ser aci den ta do o ca mi nho do Bra sil
atra vés dos tem pos, qua is quer que te nham de ser as de si lu sões que os
desti nos his tó ri cos lhe re ser vem, a nos sa raça há de so bre vi ver no fu tu ro,
e, lá bem lon ge, quan do os son da do res do pas sa do hou ve rem de ras te jar o 
fio de ouro de nos sas tra di ções, quan do hou ve rem de es tu dar o povo, não
no ru í do das ba ta lhas e nas chi ca nas da po lí ti ca, mas sim nas efu sões da 
alma, nas ener gi as do sen ti men to, os dois li vros de Melo Mo ra is Fi lho,
onde seu co ra ção pal pi ta in te i ro, suas po e si as, que to das po dem re ce ber o
nome úni co de Can tos do Equa dor, suas des cri ções de cos tu mes, que
todas po dem ter o nome só de Fes tas e Tra di ções Po pu la res do
Brasil, hão de ser cha ma dos a de por, como do cu men tos au tên ti cos; por que
ne les vive a gran de alma des te país; por que ne les can ta e fol ga, ou geme e
cho ra este mis to de en tu si as mo e me lan co lia, de sa u da de e intre pi dez, que é o 
gê nio lu si ta no trans fi gu ra do na Amé ri ca.
Sal ve! po e ta ado rá vel, que des pre zas te as len te jou las da moda, 
para con ti nu ar a amar o sol de tua ter ra e en fe i xar em tua pa lhe ta o
brilho de seus ra i os! O teu amor te sal vou!
SÍLVIO ROMERO
18 Melo Mo ra is Filho
FESTAS POPULARES
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Ca sa men to na Roça 
(RIO DE JANEIRO)
Nos cos tu mes na ti vos de nos sas po pu la ções cam pe si nas 
há uma face tão ame na e pi to res ca, que ver da de i ra men te de li cia o ar tis ta 
que se ocu pa des ses as sun tos.
É na in ti mi da de des se povo in cul to, na con vi vên cia di re ta
com essa gen te que con ser va os seus usos ade qua dos, que me lhor
se pode es tu dar a nos sa ín do le, o nos so ca rá ter na ci o nal, de tur pa do
nos gran des cen tros por uma pre ten di da e ex tem po râ nea ci vi li za ção 
que tudo nos leva, des de as no i tes sem lá gri mas até os dias sem
com ba te.
E nem se diga que so mos um povo que não tem pas sa do e
nem tra di ções; que não ti ve mos cos tu mes pró pri os como qual quer ou tro,
só por que o pe dan tis mo me dra nos cen tros mais po pu lo sos, à som bra
da to le rân cia que tudo des vir tua e ani qui la. 
Em to dos os atos de sua vida par ti cu lar e pú bli ca, o Bra sil
pos sui o ca be dal dis tin to de usan ças, no tas dis cor dan tes de cos tu mes,
pou co va riá ve is, al guns de les, no Sul e no Nor te.
Daí a di fe ren ci a ção que nos se pa ra de po vos es tra nhos, e o
que dá a me di da de nos so ca rá ter, de har mo nia com os nos sos me i os.
Erran te de vila em vila, de ci da de em ci da de, de pro vín cia em
pro vín cia, em bus ca de nos sas tra di ções que se ex tin guem, sem um
refle xo se quer na his tó ria na ci o nal, os ca sa men tos na roça res sal tam à descri ção 
de nossa pena, tão ori gi na is nos pa re cem as suaspe ri pé ci as e os seus
deta lhes, como qua dros da vida bra si le i ra no in te ri or.
Na pro víncia do Rio de Ja ne i ro, em lu ga res como Boa Espe rança, 
Rio Bo ni to, etc., os ca sa men tos em ge ral di vi di am-se em três ca te go ri as.
A pri me i ra com pre en dia o de pes so as da clas se rica e ele va da;
a se gun da, o de in di ví du os da me di a na lo cal; a ter ce i ra, o da gen te ba i xa, 
se guin do-se logo após o dos es cra vos de fa zen das, de que mais tar de
tra ta re mos.
Embo ra es ses atos re li gi o sos, es sas fes tas nup ci a is apre sen tas sem 
en tre si pon tos de con tac to, o tipo do se gun do pla no, isto é, os ca sa -
men tos em que o no i vo e a no i va sa íam da ca ma da in ter me diá ria, nos
pa re cem de fi nir me lhor os cos tu mes ro ce i ros, por isso que exor na vam
com mais lar gue za o ce ná rio da que les no i va dos ru i do sos, e im pri mi am
um cu nho mais tra di ci o nal na cons ti tu i ção da fa mí lia.
Depois das pre li mi na res do na mo ro e do pe di do em ca samento, 
a boa nova não tar da va a ser es pa lha da por toda a lo ca li da de, por toda a
po vo a ção, acom pa nha da ha bi tu al men te das par ti ci pa ções e con vi tes.
Des de logo, se o dia fi ca va de ter mi na do, os pre pa ra ti vos co -
me ça vam, as en co men das do ves ti do da no i va, das lu vas, da gri nal da e
do véu fa zi am-se com ur gên cia e isso ao mes mo tem po que as pri mas,
os vi zi nhos, as mo ças co nhe ci das man da vam com prar na ci da de ou nas
lo jas pró xi mas cor tes de chi ta ou de cas sa para ves ti dos, fi tas em pro fusão,
flo res de pano e en fe i tes para a to a le te a ca pri cho e de acor do com a moda.
A dona da casa e as es cra vas an te ci pa vam-se na con fec ção
dos do ces sa bo ro sís si mos, na lufa-lufa dos ar ran jos do més ti cos, re co -
men dan do ao ma ri do a pro vi são ne ces sá ria de vi nhos, que i jos, lom bo de 
por co, e mais ex tra or di ná ri os para o ban que te. 
A casa era var ri da e vas cu lha da, as ser pen ti nas e os cas ti ça is
fi ca vam ges sa dos até a vés pe ra, as man gas de vi dro de sem po e i ra das e
cobertas com ra mos de flo res ar ti fi ci a is; e as mu ca mas e os molequinhos, 
olhan do para as suas rou pas no vas, es pi cha vam o be i ço, ar re ga la vam
as so bran celhas, mur mu ran do ao pas sar: “Chi!... tão bo ni to!...”
22 Melo Mo ra is Filho
A no i va, sem pre des con fi a da, as sis tia a tudo isso, sus pi ran do a
ins tan tes pelo de li ca do no i vo que, en tre gue a ou tros afa ze res, bem como
ao de en ten der-se com o al fa i a te so bre a rou pa do ca só rio, con vi dar os
ami gos, pre ve nir os to ca do res de ra be ca e de fla u ta, em pra zar para o dia
os vi o le i ros de fama, ra re a va as suas vi si tas, no que era des cul pá vel.
Con clu í dos os apres tos, e de po is que cor ri am os pro cla mas,
na ma nhã de um sá ba do a por ta da no i va já se acha va guar ne ci da de
povo e da mag na co mi ti va, que acom pa nha ria os no i vos à ma triz da vila, 
que às ve zes de mo ra va a lon ga dis tân cia.
Do in te ri or da casa, re ple ta de gen te e de al ga zar ra, lá vi nham 
as ma dri nhas e os pa dri nhos, as da mas do sé qui to, a no i va, en fim, com
véu e gri nal da de flo res de la ran je i ra, sus ten tan do-lhe a com pri da ca u da
do ves ti do bran co den go sa mu ca ma, pen te a da e ri so nha, tra ja da também
de bran co, per ma ne cen do to dos al guns ins tan tes na sa í da, à es pe ra dos 
ve lhos que gra zinavam lá den tro. 
Nisso o no i vo, a ca va lo, os pa dri nhos e a co mi ti va de cavale i ros, 
que se acha vam a seus postos, se apro xi ma vam, dan do si nal aque le a
um car ro de bois com tol do de es te i ra co ber to de chi ta, que che gas se,
para que em bar cas sem a no i va e as ma dri nhas, as pri mas e con vi da das,
evi tan do des tar te a de mo ra do pa dre na igre ja, que os aguar da va à hora
cer ta.
– Eh! boi!...
E o car ro, ran gen do nos ei xos, pa ra va à por ta; e quan do a
noiva su bia em um ban co para en trar, das ja ne las aber tas en tor na -
vam-lhe so bre a fron te sal vas de flo res, ao que o no i vo e os ca va le i ros
sa u da vam ti ran do o cha péu, em pi nan do os ca va los e se guin do o car ro.
O no i vo, ge ral men te ve xa do, sa cu din do o fra que bo ni to, ali sa va 
de quan do em quan do as cri nas de seu gi ne te bran co, sor rin do ama re lo
a al gu ma pi lhé ria im por tu na que lhe vi es se ro çar-lhe ao ou vi do.
Du ran te o trân si to, as ro ce i ras do car ro e o sé qui to dos
cavaleiros en tre ti nham-se em con ver sas ba na is, em pro vo ca ções ma li -
ci o sas, sen do vul gar um ou ou tro dos acom pa nha do res le var al gum
tombo na es tra da, o que des per ta va gar ga lha das, cor res pon di das
pela cu ri o si da de das se nho ras que bo ta vam a ca be ça de fora e aplaudiam
por sua vez.
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 23
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 25
Che gado o ca sa men to à ma triz, o po va réu abria alas: os
escra vos que ti nham par ti do adi an te se gu ra vam os ca va los, a no i va, as
madri nhas e o mu lhe rio ape a vam-se, for man do o gru po da fren te as
madri nhas e a noiva, com a sua mu ca ma, que lhe le van ta va a ca u da do
ves ti do, en tran do na igre ja.
A estas se gui am-se o no i vo, os pa dri nhos e a tur ba de con vi -
da dos, que iam as sis tir ao ato e com par ti lhar do re go zi jo da fa mí lia.
De po is de ca sa dos, como é co mum, a no i va res sa bi a da dava o 
bra ço ao no i vo que a con du zia ao car ro, e o prés ti to, na or dem es tabele ci da, 
re gres sa va, che gan do a casa ao es cu re cer.
Ape nas vis tos de lon ge, os pais – os so gros e so gras –, se não
os acom pa nha vam, fi ca vam às ja ne las, para re ce ber os re cém-casados;
os aben çoavam e abra ça vam, es par gin do-lhes à en tra da per fu mo sas
flo res, e acla man do-lhes a fu tu ra fe li ci da de.
E um to ca dor de vi o la, sa pa te an do na rua, re tor cen do-se em
mo mi ces, an te pon do-se aos no i vos aca nha dos, can ta va:
Ti ra na, mi nha ti ra na,
Ti ra na de lá de ba i xo; 
Você vai cor tar ba na nas,
Qu e i ra me tra zer um ca cho.
Ti ra na, mi nha ti ra na,
Ai! ti ra na de Ira já!
Aqui lo que nós fa la mos
To ma ra que fos se já.
Ima gi ne-se a fer vu ra da casa, a re cep ção es tron do sa do
ven tu ro so par na sala res cen den te de flo res do cam po, de ador nos
sil ves tres. 
A ra be ca e a fla u ta to ca vam, o re bo li ço era ge ral, no tan do-se
ins tan tes mais tar de a au sên cia da mãe da no i va, que de sa pa re ce ra no
tumul to.
E o qua dris ta ins pi ra do não per dia o mo men to; e al te an do a
pri ma, to can do nos bor dões, apro ve i tan do o in ter va lo da mú si ca, lá ia:
Ó se nho ra mãe da no i va,
Saia fora da co zi nha,
Ve nha ver a sua fi lha
Como está tão bo ni ti nha.
E os “bra vos” e as pal mas co ro a vam o can tor, o vi o le i ros do
mato, nos seus re pen tes oportunos.
Nis so as mu ca mas acen di am os can de la bros, as ve las nas
man gas de vi dro, ou vin do-se de den tro o ba ru lho dos pra tos e as vo zes
di ri gen tes de pôr a mesa.
O pai da no i va, pre vi den te em tudo, man da ra cu i dar da ca va -
lha da, dos bois do car ro, do pes so al es cra vo da co mi ti va, que mais li vre -
men te se en tre ga ria à no i te às co me za i nas e ao fado.
E no sa lão a fla u ta e a ra be ca to ca vam, dan do si nal para a
pri me i ra qua dri lha.
Nisso a dona da casa che ga va ra di an te, cum pri men tan do
no va men te os seus con vi da dos, im pri min do um be i jo na fron te pura de
sua fi lha, e pe din do a to dos a fi ne za de a acom pa nha rem para o jan tar.
E en tra vam...
A la u ta e ex ten sa mesa api nha va-se de sú bi to, de se nho ras e
de ho mens, fi can do a ma i or par te, en tre tan to, para as sub se qüen tes, tãonu me ro sos eram os con vi vas.
Os prin ci pa is da fes ta, ocu pan do as ca be ce i ras, em seus lu ga res 
es pe ci a is, as pes so as mais gra das e de dis tin ção da lo ca li da de, o ban que te 
ini ci a va-se, e de po is de ser vi da a sopa, um trin cha dor po e ta, to man do
de um trin chan te, can ta va:
Estes fran gui nhos as sa dos
Fo ram bem re che a di nhos,
São pre sen tes para os no i vos
Que fi ze ram os pa dri nhos.
E um con vi va, er guen do um copo de vi nho aci ma da ca be ça:
Ta plã... ta plã... za bum ba,
Bra vo a vida mi li tar;
De fen der as mo ças be las
E de po is rir e fol gar.
26 Melo Mo ra is Filho
O sol da do, que é va len te,
Pas sa a vida a ba ta lhar;
O sol da do, que é mo fi no,
Pas sa a vida a na mo rar.
Hip!... hip!... ur rah!...
E as sa ú des aos no i vos, aos pais do di to so par, a to dos e a
cada um de per si es tron da vam à por fia; e um ou tro con vi da do, pu xando
para per to um peru as sa do, de sar ti cu la va-o, en to an do:
Este peru que aqui está,
Ontem mor reu em pa pa do;
Eu avi so ao se nhor no i vo
Que o coma com cu i da do...
Um se gun do re pen tis ta:
Da le i toa que aqui está,
Des con fi em, te nham medo,
O trin cha dor que a trin char
Olhe que lhe mor de o dedo.
E to dos, er guen do-se e em pu nhan do co pos:
Aze i to nas bem cur ti das
Têm um sin gu lar sa bor,
Só me lem bro dos ami gos
Qu an do bebo este li cor.
Hip!... hip!... ur rah!...
Ca lo ro so e ani ma dís si mo cor ria o fes tim; o en tu si as mo trans -
bor da va das ex pan sões dos con vi vas como o vi nho das ta ças che i as; a
ale gria e a fe li ci da de trans pa re ci am do sor ri so dos no i vos e das me i gui -
ces da fa mí lia.
Mas o com pli ca do jan tar de mo ra va o ba i le ro ce i ro e as dan ças 
tra di ci o na is.
Então o vi o leiro obs cu ro, trans pon do a sala do ban que te,
pedia a pa la vra, em pu nha va a vi o la e im pro vi sa va ga i a to:
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 27
Si nhá no i va e si nhô no i vo,
Deus lhes dê um bom es ta do:
Que da qui a nove me ses 
Haja um rico ba ti za do.
E dos cir cuns tan tes, que se le van ta vam em mas sa, bra da va
um: É a úl ti ma sa ú de! A sa ú de de hon ra! É de vi rar! Vi vam os no i vos!...
Gato amar ra do
Dá para miar,
A boa cham pa nha
Dá para dan çar!
Este é o gato,
Que ma tou o rato
Que roeu a cor da
Que amar ra va a bota...
Bota vi nho! Bota! 
Vira, vira, vira!...
Hip!... hip!... ur rah!...
E aos sons da mú si ca, que pre lu di a vam a qua dri lha, con tra ta -
vam-se os pa res, o noivo e a no i va fi gu ra vam, as pri mas e os pri mos
to ma vam par te, cada qual com seu bo tão de flor de la ran je ira como
distin ti vo na abo to a du ra do pa le tó e no cor pi nho. 
Fin das as pri me i ras qua dri lhas, as pri me i ras val sas, o ele men to 
na ci o nal e dominan te – o chi ba – cam pe a va ab so lu to, lân gui do, pe neirado,
bu li ço so, como a vo lú pia das nos sas no i tes mor nas e es tre la das.
E aos ti ni dos das vi o las, aos ar pe jos quen tes dos me nes tréis
pá tri os, a tro va desli za va so no ra, a can ti ga bro ta va plan gen te, encan tan do 
a no i te do no i va do e a sor te fu tu ra do nas cen te lar.
Então a no i va e o no i vo, os pa dri nhos e ma dri nhas, os con vi -
da dos em chus ma, às to a das das vi o las, ao can to so no ro dos vi o le i ros,
ca íam na chu la, re que bra vam na fi e i ra, aos epi ta lâ mi os dos tro va do res
em suas can ti gas a esmo:
Si nhô no i vo, dê-me um doce,
Si nhá no i va man da dá;
Pois pela no i te adi an te
Si nhá no i va pa ga rá. 
28 Melo Mo ra is Filho
Dan ça o fado, mi nha gen te,
Que uma no i te não é nada;
Se eu não for dor mir ago ra,
Dor mi rei de ma dru ga da. 
Ao pas so que o chi ba re cru des cia bam bo le a do, ma cio, pal me -
ja do, sa pa te a do, os que não dan ça vam con ser va vam-se de cos tas para as 
ja ne las, sen ta dos nas ca de i ras en fi le i ra das; e do belo sexo duas ou três
re pre sen tan tes, le van tan do-se sor ra te i ras, en tra vam no quar to dos no i vos,
ad mi ran do o bom gos to, pe gan do nos cor ti na dos, la van do as mãos no
jar ro, bis bi lho tan do adi an ta das.
Anti ga men te era de cos tu me bo tar-se es pi nhos de ro se i ra
deba i xo dos len çóis, atar-se gui zos e cam pa i nhas nas ex tre mi da des das
col chas, es con der-se mes mo um in di ví duo de ba i xo da cama, para la tir,
miar, can tar como galo, fa zen do de sa pon tar os no i vos, que dis pa ra vam
do quar to en tre gar ga lha das e ale gre ala ri do dos que lhes ar ma vam a
peça.
E cansados os dan ça do res, ofe gan tes as ba i la ri nas, des can savam
um pou co, iam to mar café e re fres cos, fi can do a mesa pos ta e cons tan -
te men te re no va da para os que qui ses sem ser vir-se.
De re pen te a de sa fi na da ra be ca anun ci a va fa nho sa ou tra val sa 
e o bró dio pros se guia ain da.
No ter re i ro, os es cra vos ba tu ca vam, que bra vam na chu la e
can ta vam suas tro vas.
E quan do as dan ças es tran ge i ras pa ra vam, o fado rom pia nas
vi o las, pon te a das pe los to ca do res da roça, no sa lão que co me ça va a acla -
rar-se das bar ras lon gín quas do ama nhe cer.
E os con vi da dos, na ma i or par te, não re sis tin do à ten ta ção
que lhes bu lia na alma, pu la vam no meio, o no i vo e a no i va des pen ca -
vam-se no ro do pio, e o can ta dor tri gue i ro la va va o pe i to dos cir cuns tantes 
com suas can ti gas va ri a das:
O fado veio no mun do 
Para am pa ro da po bre za,
Qu an do me vejo num fado
Não me im por to com a ri que za.
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 29
A vi o la pela pri ma,
A pri ma pelo bor dão,
O ho mem pela pa la vra
Leva a mu lher pela mão.
Um ca sa men to na roça era, com pou cas va ri an tes, o que aí
fica descri to; e es sas fes tas, que en tra vam sem pre pela no i te adi an te,
dura vam por dias, na ple ni tu de da abas tan ça e da fe li ci da de.
30 Melo Mo ra is Filho
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Ano-Bom
Entre to dos os po vos, do mais ci vi li za do ao mais sel va -
gem, as fes tas de pri me i ro do ano ce le bra vam-se, pas san do ape nas pe las 
mo di fi ca ções pró pri as ao de sen vol vi men to de cada cul to e à ín do le de
no vas ra ças.
Tão alto quan to pos sam re mon tar os mo nu men tos his tó ri -
cos, as en con tra mos, não sen do ex clu í dos, como par ti ci pan tes des ses
re go zi jos re li gi o sos e pro fa nos, o ne gro d’África e o ca bo clo da Amé -
ri ca.
Dos ro ma nos, que por sua vez já ha vi am re ce bi do dos gre gos
a tra di ção, os pri mi ti vos cris tãos per pe tu a ram o le ga do pa gão das ce le -
bra ções do Ano-Novo, co lo rin do-os dos re fle xos mís ti cos dos vi dros
pin ta dos de suas ca te dra is.
Entre as ci vi li za ções mais apu ra das e as mais bár ba ras, como
dis se mos, es sas fes tas en con tram-se nas mi to lo gi as na ci o na is, ten do
como ob je ti vo as con gra tu la ções po pu la res pela vol ta da pri ma ve ra ou a 
glo ri fi ca ção da la vou ra.
Os pri me i ros sin to mas de as si mi la ção nos tem pos mo der nos
re gis tram-nos as ca len das de ja ne i ro, ful mi na das por San to Agos ti nho e
S. João Cri sós to mo, que se re vol ta ram con tra as cren ças ro ma nas ado ta -
das pe los cris tãos, vin do logo após a fes ta dos Lou cos e a dos Ino cen tes
lu di bri ar do aná te ma dos san tos-pa dres.
Du ran te as ru i do sas fes tas da pri ma ve ra, isto é, da abun dân cia 
e da co lhe i ta, os pre sen tes agrí co las tro ca vam-se, a fa mí lia e de po is as
tri bos re u ni am-se, os sa cri fí ci os, as dan ças, os fes tins, as ce ri mô ni as pro -
pi ci a tó ri as ti nham lu gar, pro vin do daí, para os po vos mo der nos, os pre -
sen tes de fes tas, as vi si tas, os fol gue dos, as abu sões, ascon gra tu la ções
pú bli cas do dia de Ano-Bom.
A Ida de Mé dia, po rém, que tudo via atra vés de suas pre o cu pa -
ções as cé ti cas, des vi ou-lhes as cor ren tes as tro lá ti cas, in clu in do-as no
ca len dá rio do Na tal, com ou tras pom pas e ou tros ide a is.
Des te ou da que le modo, o que é cer to é que as fes tas de
Ano-Bom não per ten cem a este ou àque le povo, mas à hu ma ni da de
in te i ra.
Em to dos os pa í ses da Eu ro pa, es ses fes te jos in ter ca lam-se
aos do Na tal e de Reis, for man do um todo a que os in gle ses cha mam de 
Christ mas.
Na Ingla ter ra ou na Ale ma nha, na Fran ça ou na Itá lia, o na ci o -
na lis mo pá trio trans luz nes sas ma ni fes ta ções alen tan do ve lhos cos tu mes, 
cu jas fór mu las ja ma is se apa ga ram da lem bran ça po pu lar.
E não há fes tas mais be las em qual quer des ses pa í ses; não há
ho ras mais ale gres na que les la res; não há or gu lho mais le gi ti ma men te
sen ti do por aque las tur bas, do que per ce ben do pal pi tar de ba i xo das for -
mas da arte as suas an ti gas le gen das e os seus con tos, cons ti tu in do a
base das re pre sen ta ções te a tra is do Na tal.
Jun tai a isso os pre sen tes, as sur pre sas, as vi si tas, as fe li ci ta -
ções, o con che go da fa mí lia, o be i jo im pro fa na do sob a rama ver de dos
te tos, e te re is, com uma cen te na de cou sas mais, as des pe di das do ano
ve lho e as en tra das de Ano-Novo.
32 Melo Mo ra is Filho
Esses cos tu mes se cu la res, de que da mos tes te mu nho, ain da
per du ram em toda a Eu ro pa.
Mas o Bra sil é um país adi an ta do; acha ri dí cu las as tra di ções e
des faz-se de las; ab sol ven do os de ma is po vos des sas fu ti li da des que en ver -
go nham, tra ta de en co bri-las e mos tra-se sé rio...
No ou tro tem po não era as sim.
No Rio de Ja ne i ro a fo lia toda co me ça va de vés pe ra. A ci da de,
mais ani ma da ex te ri or men te pelo con cur so de fa mí li as e de in di ví du os
am bu lan tes, re ve la va o jú bi lo pú bli co, que se os ten ta va sem re ser va.
Em qual quer pra ça, em qual quer rua, quem olhas se para as
ja ne las, no ta ria fi si o no mi as es tra nhas, ca ras no vas, que pela ma ne i ra de
apre sen tar-se, pela com pos tu ra, tor na vam-se dis tin tas de mu i tas que lá
es ta vam, apre ci an do o mes mo ob je to, en tre ti das pelo mes mo as sun to.
Nas in ter mi ná ve is ga le ri as de sa ca das, ja ne las de pe i to ril e
pos ti gos, vi am-se mo ças tou ca das de flo res na tu ra is ao lado de al gu mas
que não as ti nham, ho mens ves ti dos de brim bran co con ver san do com
amigos tra ja dos como para as re cep ções ín ti mas, ve lhas fol ga zãs e gri ta deiras 
fa lan do para as vi zi nhas de de fron te, cri an ças tra qui nas e ar re ne ga das
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 33
Pre sen tes de Ano-Bom
tre pan do nas gra des de fer ro das sa ca das, sus pen den do dos es pi gões as
ma ça ne tas de chum bo das ex tre mi da des, que, às ve zes, lhes es ca pan do
das mãos, ma chu ca vam-lhes os pés. 
E o que que ria isso di zer?
Eram as fa mí li as que ti nham che ga do da roça para pas sar o
Ano-Bom com os pa ren tes, con vi dan do-os para a vés pe ra de S. João em 
seus sí ti os e fa zen das...
Aque las cu jas re la ções não iam além da cor te, re u ni am-se igual -
men te, com ple tan do o as pec to pi to res co des sa cena, mais ou me nos
po pu lo sa, se gun do os tem pos em que es ses cos tu mes eram de ri gor.
Com an te ce dên cia, já os pre sen tes de fes tas prin ci pi a vam a cho -
ver, e a es cra va tu ra a fa zer-se in te res sa da nas fe li ci da des de seus se nho res.
E as tra di ções con so li da vam as ba ses da fa mí lia, e o re i na do
das su pers ti ções ilu mi na va-se da es pe ran ça.
O dia de Ano-Bom era a épo ca em que os mem bros de uma
mes ma fa mí lia con gre ga vam-se. Vin do por ve zes de gran des dis tân ci as,
pas sa vam jun tos, no meio do pra zer e das fe li ci ta ções, até de po is de Reis.
Para ver ama nhe cer o Ano-Novo, nin guém dor mia an tes da
meia-no i te, pois era da cren ça po pu lar, que quem se con ser vas se com os
olhos aber tos até de po is da que la hora, ve ria rom per a au ro ra de anos
se guin tes.
Então, con clu í das as mag ní fi cas ce i as, as can to ri as ao Me ni no
em seu pre se pe, no fim das pi lhé ri as dos ve lhos ma tu tos, de diá lo gos ex -
tra va gan tes, os ino cen tes na mo ros fer vi am nas sa las, ao di a pa são do ba -
ru lho dos pra tos que se la va vam nas co zi nhas, das ras ca das das se nho ras 
com as ne gras, do res so nar dos me ni nos es ti ra dos nos so fás e nas ca de i -
ras da sala da fren te, à es pe ra do si nal do Ano-Novo.
Qu an do o re ló gio ba tia me ia-noite, uma onda ma ru lho sa de
ale gria es pra i a va-se pela as sem bléia, ao pas so que as mu ca mas, os mo le co -
tes, as cri as em fral das de ca mi sa, pen du ra vam-se às sa ca di nhas da es ca da
que de i tava para o quin tal, pas ma das de nada des co brir, mas com os
olhares fi tos nas tre vas que amor ta lha vam o ano ve lho.
– Boas sa í das e me lho res en tra das! di zi am os pais aos fi lhos,
as ir mãs aos irmãos, os pa ren tes e ami gos en tre si, abra çan do-se,
beijan do-se, sal tan do de con ten ta men to.
34 Melo Mo ra is Filho
Nas ca sas em que ha via ba i les, o mes mo cos tu me co ro a va a
tra di ção, aos sons da mú si ca, ao bri lho das ser pen ti nas fa is can tes, aos
ri sos que cor ri am lím pi dos de uns lá bi os de rosa.
Isso, po rém, que pro lon ga va a fes ta, mu da va com ple ta men te
no dia pri me i ro. Da ma nhã à tar de, as vi si tas fa zi am-se, des fi la vam
nu me ro sos os por ta do res de pre sen tes, sen do de pre fe rên cia con tem -
pla dos, nas fre gue si as, o vi gá rio, os mé di cos e o fis cal.
As ban das mi li ta res to ca vam às por tas e nos sa guões das ca sas 
dos ge ne ra is, dos mi nis tros, das pes so as gra das, dan do as boas fes tas;
com pen san do-lhes a aten ção al gu ma cé du la avul ta da ou pe ças de di nhe i ro 
em ouro.
Enquan to nos ar ma zéns de co mes tí ve is o co mér cio en ca i xo -
ta va dú zi as de gar ra fas de vi nho, acon di ci o na va que i jos do re i no, pre -
sun tos, ca i xas de fi gos e ame i xas, di ver sos gê ne ros des ti na dos aos fre -
gue ses do ano; en quan to do con ven to da Aju da, ri quís si mas ban de jas de 
pra ta, com a fir ma do in di ví duo pre sen te a do, ar ma das de do ces, sa íam
umas após ou tras; era cu ri o so de ver-se o que pas sa va nas ruas, en tre -
ten do os abe lhu dos que co men ta vam dos so bra dos. 
Por toda a par te en con tra vam-se ne gros do ga nho, de ca mi sa
de al go dão por fora da cal ça ar re ga ça da, con du zin do em ces tos um le i -
tão de bar ri ga para cima, amar ra do de pés e mãos, com o fo ci nho aper -
ta do com um bar ban te gros so, e guin chan do, acer ca do de ga li nhas, pa -
tos e mar re cos, com a ca be ça pen den te das be i ra das do ces to e en fe i ta -
dos nas asas com la ci nhos de fita. Para con tra pe so, o ga nha dor não de i -
xa va de le var um galo ou um peru na mão li vre, tam bém en fe i ta do de fi -
tas es tre i tas ver des e azu is.
Ao pre sen te era cos tu me acom pa nhar um car tão de vi si ta ou
uma car ta, con ce bi da mais ou me nos nes tes ter mos:
“...Boas sa í das e me lho res en tra das lhe de se jo. Inclu so, en con -
tra rá vos se me cê um le i tão zi nho, umas ga li nhas e um peru para mais um
pra to de seu jan tar...”
Aqui e além apa re ci am car re ga do res com ca i xões de vi nho ou 
com ca i xas de açú car, cri a dos de li bré pre ce den do es cra vos en vi a dos
com dá di vas prin ci pes cas, tais como col chas da Índia, apa re lhos da Chi na, 
ba i xe las de pra ta, ca va los de mon ta ria, fa zen do con tras te com a cri ou la
ou mu la ta de casa me nos rica, que se guia com um pão-de-ló, um
Fes tase Tra di ções Po pu la res do Brasil 35
bolo-in glês, um pas te lão numa sal va mo des ta, co ber ta com uma gaze
cor-de-rosa, com um tope de flo res ar ti fi ci a is no cen tro, atra ves sa do por 
um car tão ou um es cri to.
Na Ba hia, além de to das es sas ofer tas, es ta va nos há bi tos
dar-se es cra vos no dia de Ano-Bom. Assim, com um mo le qui nho, uma
mo le ca, um ca sal de ne gros no vos, ob se qui a vam-se as me ni nas, as mo ças
ou os che fes de fa mí lia.
Na que la pro vín cia, onde as ca de i ri nhas es ti ve ram cons tan te -
men te em uso como meio de trans por te, não ca u sa va es pan to en tra rem
por uma casa dois ne gros de ca sa ca de por ti nho las com vi vos ama re los
ou ver me lhos, de cha péu de ole a do com ga lão, cal ça cur ta e um pau no
om bro, acom pa nhan do o por ta dor de uma car ta na qual se lia: “...Como 
lem bran ça de Ano-Bom ofe re ço-lhe essa pa re lha de ne gros de ca de i ra,
pe din do des cul pa de não ser cou sa su fi ci en te...”
A isso não se li mi ta vam os pre sen tes. Pes so as ha via que ofer -
ta vam ca sas e pa lá ci os. O paço de S. Cris tó vão foi um pre sen te de
Ano-Bom, fe i to pelo ne go ci an te Eli as Antô nio Lo pes a D. João VI, que
o ven deu ao Esta do, quan do se re ti rou para Por tu gal. 
36 Melo Mo ra is Filho
Ne gros de ca de i ra
Con si de ra va-se uma gran de fal ta, um cri me, a au sên cia dos
pa ren tes mais che ga dos no jan tar da fa mí lia. Nin guém re le va va essa
fal ta, pois acre di ta va o povo que o que se fa zia no pri me i ro do ano, se
fa ria o ano in te i ro.
Daí se de pre en de que cada um que ria es tar nes te dia com os
seus, que to dos ves ti am rou pa nova, que se brin ca va, to ca va, can ta va, a
fim de que o con ce i to po pu lar se re a li zas se em sua ple ni tu de pres sa gi o sa.
Os es cra vos, que nun ca fo ram es tra nhos às ale gri as ou des -
gra ças do nos so lar, ga nha vam fes tas, ti nham fol ga, di ver ti am-se tam -
bém.
Por oca sião dos ban que tes fi dal gos ou dos jan ta res me nos
opu len tos, ao ca lor dos brin des, ao ala ri do da can ção:
Como can ta o pa pa ga io,
Como can ta o pe ri qui to...
os con vi vas en tu si as ma dos pro fe ri am lon gos dis cur sos, os ra pa zes re -
ci ta vam col che i as, as mo ças tí mi das e ver go nho sas aba i xa vam os olhos
às pa la vras “amor”, “meu bem”, re fer ven do a ani ma ção nas sa ú des
em hon ra aos mais ve lhos, à fa mí lia re u ni da.
As vi si tas ofi ci a is e as de ami za de fa zi am-se im pres cin dí ve is.
Ha via cor te jo no paço, os pre se pes per no i ta vam ilu mi na dos, e – boas
en tra das – boas fes tas – eram mo e da cor ren te de ci vi li da de en tre a
po pu la ção.
De po is de cer to pe río do, quan do o Bra sil fez tim bre em imi -
tar o es tran ge i ro no que ele tem de pior, en ten deu que, para pa re cer-lhe
bem, cum pria des qui tar-se das usan ças tra di ci o na is, quan do eles as
man têm in tac tas.
Não com pre en den do este país que nin guém pode ter sor ri sos 
nas ter ras para onde vai em bus ca de for tu na, su pôs que a cou sa as sim
se pas sa va lá por fora, e anda pre o cu pa do com um fu tu ro que não lhe
per ten ce.
Das nos sas fes tas nin guém mais se lem bra; os la ços de fa mí lia 
qua se não exis tem; do dia de Ano-Bom, de gran di o so e ex pan si vo que
era, nem nos res tam ves tí gi os!
E em tro ca de todo esse pas sa do nos im pin ge a Eu ro pa
cro mos e fo lhi nhas!
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 37
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Car na val
(RIO DE JA NE I RO)
Não é de hoje a his tó ria das ve sâ ni as hu ma nas.
O car na val, que é uma fre no pa tia, fi lia-se às mais al tas ci vi li za -
ções, exi bin do-se ru di men tá rio en tre os po vos sel va gens. As se nha dos
Qu e ru bins egíp ci os, das Sa tur na is ro ma nas, das Ba ca na is gre gas, da fes ta 
dos Ino cen tes e dos Lou cos, de que fa lam as crô ni cas da Ida de Mé dia, é 
a mes ma do car na val de Ve ne za, de Roma, de Pa ris, do Rio de Ja ne i ro e
das tri bos ama zô ni cas. 
Entre to dos os po vos en con tram-se as mas ca ra das – des de o
Indo – que, como pen sa Vol ney, des fi gu ra va o céu, o me ta mor fo se a va,
até os nos sos tu ca nos, que to ma vam más ca ras de fo lhas e de cas cas de
ár vo res, de ter ra e de ca be ça de ani ma is, para as fes tas do Bu i an té.
S. João Cri sós to mo con de na va os de bo ches e as mas ca ra das
nas igre jas; e o Papa Ino cên cio III as ver be ra va por meio de uma de cre tal
– “Dão-se al gu mas ve zes nas igre jas es pe tá cu los e di ver ti men tos de
teatro, e não so men te in tro du zem nes ses es pe tá cu los e nes ses di ver ti mentos
mons tros mascara dos, mas ain da em cer tas fes tas os diá co nos, os pa dres 
e sub diá co nos per mi tem-se a li ber da de de fa zer toda a cas ta de lou cu ras 
e pa lha ça das...
“Eu vos con ju ro a ex ter mi nar este cos tu me...”
O car na val im pli ca o uso da más ca ra e dos dis far ces; e a
más ca ra era usa da pe los trá gi cos gre gos e ro ma nos.
Nas Ba ca na is e nos es pe tá cu los ha via más ca ras que ex pri mi am
o ódio, a lu bri ci da de, a sá ti ra...
Em Fran ça, des de o sé cu lo XIV, diz o bi blió fi lo Jacó, as
másca ras fo ram ado ta das: Fi li pe o Belo ti nha o car na val como o fol gue do 
de sua predi le ção.
Se gun do o re da tor do Jour nal de Pa ris, ci ta do pelo ro man cis ta
dos Nou ve a ux ro mans de Pa ris, “uma sin gu lar mas ca ra da teve lu gar no re i na do 
de Car los VI, no ce mi té rio dos Ino cen tes. Em uma ação fan tás ti ca,
cha ma da Dan ça Ma ca bra, in di ví du os de am bos os se xos, dis far ça dos em
gen te de to das as con di ções, des fi la vam ante a Mor te, que im pas sí vel
lhes ou via as que i xas. Pe di am-lhe a pro lon ga ção da vida; uns para re a li -
za rem pro je tos de am bi ção, ou tros para go za rem de sua nova for tu na,
to dos para al gu ma qui me ra. A Mor te, de po is de chas que ar em ver so
com os su pli can tes, des car re ga va-lhes a fo i ce”.
A mas ca rada da Dan ça Ma ca bra es te ve mu i to em voga na
Ale ma nha e na Su í ça.
Hen ri que III dis pen sa va ca lo ro sa ani ma ção a esse re go zi jo
pú bli co. À se me lhan ça dos va li dos do rei, os no bres e as se nho ras do
tom mas ca ra vam-se.
Acres cen ta o his to ri a dor Les to i le que aque le so be ra no gos ta va
tan to de fan ta si ar-se, que de i ta va-se de más ca ra, in te ri or men te un tu o sa e
pin ta da.
No Bep po de Lor de Byron, o po e ta en ca re ce o car na val de
Ve ne za: Go et he no Fa us to é me nos en tu si as ta pelo car na val de Roma.
No tem po de Luís XIV as cor te sãs e as mu lhe res da moda
ta tu a vam-se exa ge ra da men te, e usa vam de si na is pre tos no ros to para
fa ze rem-se mais lin das; mu i tas ha via que so bre a al vu ra da face as sen ta -
vam es tre las e me i as-luas de ta fe tá, que con cor ri am para trans for má-las.
A re vo lu ção aca bou com as mas ca ra das em Fran ça, re a pa -
re cen do elas mais tar de nas ruas e te a tros.
Uma co in ci dên cia: o car na val fran cês ago ni za va, quan do
nas cia o car na val bra si le i ro.
40 Melo Mo ra is Filho
O car na val do Rio de Ja ne i ro co me çou após a pro i bi ção do
jogo do en tru do pelo de sem bar ga dor Si que i ra, úni co dos nos sos che fes
de po lí cia de quem a tra di ção re pe te o nome com se gu ran ça e res pe i to.
Mu i to an tes, ina u gu ra ram-se os ba i les mas ca ra dos, de vi dos os 
pri me i ros à ini ci a ti va da can to ra Del mas tro, que para aqui vi e ra com a
com pa nhia lí ri ca de Mme. La gran ge.
Estes ba i les ti ve ram lu gar onde é hoje o te a tro da Fê nix
Dramá ti ca, que com pre en dia a gran de chá ca ra da Flo res ta.
Su ce de ram-se a es tes os do Ânge lo, na chá ca ra da Rua do
Con de, na Ci da de Nova, e os do Ni co la, no Largo do Ro cio.
Ao cres cen te e ines pe ra do fa vor do pú bli co cor res pon de ram
os te a tros de S. Ja nuá rio, Lí ri co Flu mi nen se, S. Pe dro e Gi ná sio, que
para o mes mo fim abri ram as suas por tas, acom pa nhan do-os o Clu be
Flu mi nen se, que só ad mi tia os só ci os, e o Pa ra í so que ace i ta va a to dos. 
Em que con sis tia o nos so pri mi ti vo car na val ao ar li vre? É
fá cil de co gi tar: em pe que nos gru pos de más ca ras er ran tes, um prin cez
des gar ra do, e as sim por di an te. 
Em 1854, já al guns car ros com más ca ras apa re ce ram e das
ja ne las ati ra ram-lhes flo res. O Jor nal do Co mér cio, no ti ci an do o fato,
acon se lhou que para o ano fu tu ro se re u nis sem, o que da ria mais re le vo
ao fes te jo.
Até en tão a lou cu ra des co bria o pra zer ao som da mú si ca
es co lhi da, inun da va-se da luz dos lus tres e can de la bros, mi ti ga va a sede
pro vo ca da pe las dan ças ar den tes nas ta ças de cham pa nha, e re quin ta va
de gozo na que les abri gos res guar da dos e ide a is como as cis mas vo lup -
tu o sas dos cren tes de Ma o mé.
Era à no i te que na que las Lu per ca is es plên di das as mu lhe res
coro a vam-se de fas ci na ções, que os mo ços de qua li fi ca ção dis tin ta
dissi pa vam-se atra ídos.
No Clu be, es pe ci al men te, quan ta per di ção no lan gor mor no
da be le za aris to cra ta, no ro çar de um cor po de neve, num cis mar vago,
ao ter ra ço ou à ja ne la, ten do por tes te mu nhas o olhar pes ta ne jan te das
es tre las e o céu pro fun do e es cu ro como as ma rés in cer tas do des ti no!...
Mas a luz do dia ti ve ra in ve ja da luz dos can de la bros; a voz do 
jor na lis ta é o fiat das socie da des; e a Lou cu ra, no seu des per tar de
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 41
sonâm bu la, em bo ca as fan far ras no meio das pra ças, com o seu sé qui to
de cem es cra vas e de mi lha res de ca ti vos.
Em ja ne i ro de 1855 já as fo lhas diá ri as anun ci a vam que o
car na val se ria mag ní fi co: as fa mí li as mais con si de ra das, a mo ci da de mais 
di nhe i ro sa e ilus tre, as so ci a vam-se à em pre sa do dia.
Ju ris con sul tos, mé di cos, jor na lis tas, mi li ta res, al tos fun ci o ná ri os 
pú bli cos, ne go ci an tes, fa zen de i ros, tudo quan to a so ci e da de flu mi nen se
pos su ía de se le to ab sor via-se numa só idéia, num só pen sa men to.
No Lar go do Ro cio e em mu i tís si mas ruas, as ca sas de ven der 
e alu gar ves ti men tas mul ti pli ca vam-se. Nas ca sas par ti cu la res viam-se o
ve lu do e a seda, as es pi gui lhas e os bor da dos a ouro; nos al fa i a tes, os
cos tu mes es pe ci a is; nos ou ri ves, ade re ços fi nís si mos.
De co ra vam-se sun tu o sa men te os te a tros. Nos ce ná ri os, su -
bin do até as bam bo li nas, os es pe lhos cin ti la vam como va gas des cen do
de fan tás ti cas mu ra lhas: pal me i ras à en tra da de gru tas, cas ca tas ar ti fi ci a is,
flo res e per fu mes, fa zi am su por que na que les sa lões enor mes se iri am
asi lar as fa das dos con tos das Mil e Uma No i tes.
Cá fora o co mér cio abria pe sa da bol sa ao ar tis ta mais há bil no 
en fe i te das ruas, ao jar di ne i ro mais ze lo so no cul ti vo das pal me i ras e
ar bus tos de or na men ta ção, a quem mais des lum bran tes er gues se as ar -
ca ri as ilu mi na das, ao pin tor de mais ima gi na ção e es pí ri to no aca ba do
dos es cu dos im plan ta dos de tro féus, onde se liam epi gra mas e qua dras
chis to sas.
Nos co re tos em pro fu são pre ga vam-se ban cos para a mú si ca
e co lo ca vam-se fi gu ras que sim bo li za vam per so na gens e acon te ci men tos 
ri dí cu los.
Nos pri mi ti vos car na va is a in fluên cia era ta ma nha, que pode
di zer-se que um ter ço da po pu la ção mas ca ra va-se.
E tan to é ver da de, que os di re to res de te a tros ad ver ti am ao
pú bli co que se ria ve da do o in gres so nos ba i les a quem não se apre sen -
tas se fan ta si a do.
Em 1855 fa zia a sua pri me i ra pas se a ta o Con gres so das
Su mi dades Car na va les cas.
Antes do dia 23 de fe ve re i ro, em que ca í ra o Entru do, uma
co mis são com pos ta do Dr. Jo a quim Fran cis co Alves Bran co Mu niz Barre to, 
42 Melo Mo ra is Filho
Co ro nel Po li do ro da Fon se ca Qu in ta ni lha Jor dão e do Dr. José Mar ti ni -
a no de Alen car, di ri giu-se a S. Cris tó vão, pe din do a S. M. o Impe ra dor
que vi es se com as prin ce sas ao paço da ci da de hon rar com a sua pre sen -
ça o car na val do ano e as sis tir à pas sa gem do Con gres so.
Des ta so ci e da de ti ve ram a ini ci a ti va no tá ve is ho mens de le tras 
e jo vens es cri to res, cujo ta len to im pu nha-se pelo bri lho pro gres si vo.
Estes le a is com pa nhe i ros de tan tas gló ri as, que res plan de cem
do pas sa do, fa zi am par te da re da ção do Cor re io Mer can til e cha ma vam-se
Hen ri que Cé sar Muz zio, Pi nhe i ro Gu i ma rães, Ma nu el Antô nio de
Alme i da, J. de Alen car, Au gus to de Cas tro, Ra mon de Aze ve do e ou tros, 
que sa u da vam o fu tu ro en tre um ar ti go de fundo, uma po e sia, um
folhetim, e o de sa bro char das es pe ran ças na ala me das sem pre encanta do ras
da pri me i ra moci da de.
Fe li zes tem pos aque les em que Alves Bran co, F. Ota vi a no,
Fir mi no Ro dri gues Sil va e Pa ra nhos re gi am os mo ços, por que eles viam
a pena de ouro na mão do mes tre e do ami go!
Afas ta dos des se gru po, mas co nhe ci dos de bo ni to nome, a
eles re u ni am-se Jo a quim de Melo, Fran cis co Au gus to de Sá, os dois
Fa ros, Pa lha res, Cris ti a no Stock me yer, Ho rá cio Urpia e mais, que for ta -
le ce ram o em pre en di men to como for ma e como idéia.
Nas tar des do do min go as ban das mar ci a is to ca vam; os chi -
cards, os ti tis, os flam ba rás, os pi er rots, os dé bar de urs, os do mi nós, os zés-pe re i ras,
os D. Nu nos e os ca va le i ros de capa e es pa da per cor ri am a cida de. Os
car ros de mas ca ra dos não ti nham con ta. Dos so bra dos des do bra vam
col chas de da mas co e en tor na vam flo res; os es ta los ful mi nan tes imi ta vam
as cre pi ta ções das fo gue i ras e a mul ti dão acu dia a vá ri os lu ga res, cu ri o sa
e fes ti va.
No ano a que nos re fe ri mos, os más ca ras de es pí ri to tor na -
ram-se sa li en tes. Um fran cês hou ve que, no Pro vi só rio, in tri gou a toda a 
gen te. Este más ca ra en ver ga va um cos tu me me ta de pre to e me ta de
bran co.
Muitas pes so as ain da se re cor dam de um in di ví duo que,
tre pa do numa sa ia-balão de pro por ções co los sa is, dis tri bu ía pe las ja ne las 
po e si as, tro can do pi lhé ri as.
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 43
Con se cu ti vo este car na val à ilu mi na ção a gás des ta ca pi tal,
jun to a um mi ne i ro que mon ta va num boi, con quis tou gos to sas gar ga -
lha das um su je i to en fe za di nho, es can cha do numa ju men ta bran ca, ten do 
em toda a exó ti ca ves ti men ta es ca das e lam piões de pano, re cor ta dos e
co si dos.
Pi sa va-se so bre fo lhas de ca ne la e man gue i ra, sa cu dia-se do
cha péu ro sas e jas mins, co ra va-se à in dis cri ção de um más ca ra que se -
gre da va (em voz alta) o que vira e o que não vira.
Na Pe ta ló gi ca do Lar go do Ro cio, Pa u lo Bri to, Te i xe i ra e
Sou sa, Cons tan ti no Go mes de Sou sa, La u rin do Ra be lo, Za lu ar, o ba cha -
rel Gon çal ves, Cas tro Lo pes, José Antô nio, Bra ca ren se e Ma cha do de
Assis, atro pe la vam os prin ce ses que en tra vam e os de sen xa bi dos que
pas sa vam.
Qu an ta lem bran ça ori gi nal, quan to de sa pon ta men to en gra ça do, 
quan ta cor ri da de ven ci do!
Uma vez La u rin do Ra be lo es ta va na por ta. Um mas ca ra do,
ves ti do de ca pim, apro xi ma-se. O po e ta fá-lo pa rar e diz-lhe, tor cen do o 
bi go de:
– Meu ami go: o se nhor, de po is de di ver tir-se, come a rou pa,
não é as sim?Ao que o in ter lo cu tor nada res pon deu, per tur ba do, por cer to.
O im pe ra dor, a im pe ra triz, e as prin ce sas ob ser va vam do pas -
sa di ço do pa lá cio a ani ma ção dos fes te jos, es pe ran do um pou co re ti ra dos
pe las Su mi da des, cuja tar dan ça os im pa ci en ta va.
Por vol ta das 5 ho ras da tar de, a tur ba to ma va as sa í das de
onde o clan gor dos cla rins e o tro pel dos ca va los avi zi nha vam-se.
O povo abria-se em fi le i ras de fron te do paço; de en vol ta com
a mul ti dão os ve lhos ca be çu dos, de ca ja do e lu ne ta, sus pen di am no ar as
enor mes más ca ras de pa pe lão, sa ra co te an do; os di a bi nhos bar bu dos re vi -
ra vam a más ca ra, en ro lan do à cin ta a ca u da ver me lha... A ex pec ta ti va era 
inex ce dí vel!
E os sons se es cu ta vam de per to, de mu i to per to...
A fa mí lia im pe ri al che ga va às sa ca das, e os vi vas e ur ras, como 
uma pi râ mi de so no ra, que en fi as se a grim pa na imen si da de, ti nham por
base on du lan te o pas mo de toda aque la po pu la ção.
44 Melo Mo ra is Filho
Logo após, trans pu nha o Lar go do Paço a ban da mar ci al do
Con gresso das Su mi da des Car na va les cas, ves ti da com o pi to res co cos tume 
dos cos sa cos da Ucrâ nia.
Os cla rins es co ce ses do re gi men to dos high lan ders for ma -
vam-lhe a re ta guar da, an te ce den do ao car ro de D. Qu i xo te, o ca va le i ro
da Man cha, que fa zia tre mu lar, com a ga lhar dia de um he rói de Cer vantes,
o pen dão ad mi ra vel men te tra ba lha do das Su mi da des.
To dos os ca le ches – e de vi am ser mais de doze – eram puxa -
dos a duas pa re lhas lin dís si mas, aja e za das com gran de za. So bre cada
carro de sen ro la va-se rica col cha de da mas co co ber ta de ren das al vís si mas; 
e, em cima das al mo fa das, ou aos pés dos per so na gens, ces tas com pe -
quenos bu quês, ca i xi nhas com es ta los ful mi nan tes, grãos-de-bico e fe i jões 
con fe i ta dos, que cada um ati ra va aos es pec ta do res das ja ne las e à gen te
aglo me ra da nas ruas.
No meio de bra vos e flo res, o pri me i ro gru po de ca va le i ros
foi de um su ces so ma ra vi lho so. Era um gru po his tó ri co, re pro du zi do
com tan ta pro pri e da de e luxo no tra jar, que não há quem o ti ves se vis to
que dele não se re cor de des lum bra do. Esses ca va le i ros eram Ni co lau I,
Impe ra dor de to das as Rús si as, Abdul-Met jid, o se nhor de Istam bul, um 
gre go, o Almi ran te Du guay-Trou in, Mar co Spa da e um dra gão prus si a no
da Mor te.
Pa ran do a ins tan tes, re fre an do os gi ne tes aris cos, jo ga vam às
se nho ras, du ran te o tra je to, ra mos de flo res, den tro dos qua is me ti am
um car tão de vi si ta, que ti nha por fim de cla rar o nome dos per so na gens
que re pre sen ta vam. Por exem plo:
“Ni co lau I cum pri men ta a V. Exª, por quem mor re de amo res.”
Ca le ches com ba ya de ras, man da rins, no bres do Cáu ca so, Ben -
ve nu to Cel li ni, Fer nan do o Ca tó li co, o Du que de Gu i se; gru pos a ca va lo,
ca rac te ri za dos como o Du que d’Alba, Car los V, o Con de de Pro ven ça,
Ta deu Ko sci us co; fa e to nes em que se re pim pa vam o Dr. Dul ca ma ra,
pre go e i ros, etc., cons ti tu íam o pom po so prés ti to do Con gres so que, em
sua mar cha tri un fal por uma es tra da de fo lhas ver des e aro má ti cas, ao
dar de jar das lu zes que se me lha vam abó ba das de fogo, às acla ma ções
po pu la res e às ca ta du pas de flo res e har mo ni as, en tra va vi to ri o sa men te
no gran de car na val.
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 45
Impos sí vel fora des cre ver o en tu si as mo das mul ti dões! Para
ca mi nhar no pas sa do, só a ima gi na ção es cla re ce a tre va!
Na no i te an te ce den te, o ba i le das Su mi da des mar ca va no tá vel
acon te ci men to, por isso que, como ba i le à fan ta sia, ain da ne nhum ou tro
en la çou com tan to bri lho e for mo su ra, a no bre za e o ta len to.
O Clu be Flu mi nen se, ador na do com o ma i or es plen dor, era o 
pa lá cio das re pre sen ta ções fi dal gas. As mo ças mais be las, mem bros do
Mi nis té rio, do Se na do, do cor po di plo má ti co, ge ne ra is, po e tas, li te ra tos,
jor na lis tas, fun ci o ná ri os pú bli cos, etc., aí se acha vam dan do mais re al ce à 
gran di o sa fes ta.
Sem ro te i ro de ter mi na do, a pas se a ta da que le ano re a li zou-se
ao aca so; e depois de per cor re rem o Ca te te, vol ta ram à chá ca ra da
Flores ta, de onde sa í ram, dis per san do-se afi nal.
Na ter ça-feira fi ze ram o en ter ra men to do car na val. As pom -
pas fu ne rá ri as do deus Momo não po di am ser mais so le nes. O prés ti to
se guiu a pé: car re ga do por do mi nós, o fé re tro sim bó li co foi de pos to num
ca ta fal co er gui do de ba i xo das ar ca ri as ilu mi na das da Rua das Vi o las. A
ban da mi li tar to cou a mar cha fú ne bre, um mem bro da co mis são dos
feste jos re ci tou um dis cur so, ter mi na do o quê, foi trans por ta do o ata ú de,
es col ta do pelo Con gres so, ao te a tro Pro vi só rio.
Du ran te o tra je to, as es tron do sas de mons tra ções ex ce di am do 
en tu si as mo. Vi vas, po e si as, alo cu ções bur les cas na Pe ta ló gi ca, ilu mi na -
ção das ruas e do edi fí cio do clu be, ban de i ras e mú si cas, as si na la vam-lhe 
os tri un fos.
À en tra da do Lí ri co, as sa u da ções da pla téia e dos ca ma ro tes
não fo ram me nos sig ni fi ca ti vas. 
Quan do o Con gres so das Su mi da des Car na va les cas
banque te a va-se nos sa lões, as pol cas, os ga lo pes, as qua dri lhas e as
val sas res piravam ape nas, su fo ca dos pe los sons dos gui zos e das trom pas, 
dos gri tos es trí du los, da vo ze ria con fu sa e do ba ter dos pés de um lou co
em de lí rio – o Ba i le Mas ca ra do!
Des tar te ina u gu ra da a fes ta, fora de bal de que rer de tê-la nas
suas ce le bra ções anu a is.
46 Melo Mo ra is Filho
As Su mi da des, er guen do ar cos tri un fa is, pre pa ra vam o ca mi nho
até hoje tri lha do pelo car na val do Rio de Ja ne i ro, em bus ca do tem plo
do deus Momo, uma das mais pal pi tan tes in di vi du a li za ções das bi zar ri as 
do es pí ri to hu ma no.
E a União Ve ne zi a na, que apa re ce ra mais tar de, cha ma o
Con gres so de ir mão, e dis pu tam-se a pri ma zia. Ambos têm nas mãos a
taça dos três dias, que fer ve de ri sos e de es que ci men to.
Com a fron te en gri nal da da das ro sas pá li das da fo lia, como as 
mu lhe res da Ba bi lô nia, o Con gres so e a União an te ci pam-se no re quin te 
do pra zer.
A Eu ter pe Co mer ci al, so ci e da de de mú si ca, trans for ma-se em 
Zu a vos e, ano por ano, o car na val adi an ta-se nas suas jor na das ru i do sas.
Entre tan to, o Con gres so, du ran te o seu re i na do, cam pe ou
ab so lu to. Os seus ba i les e os seus prés ti tos fi ca ram úni cos.
*
Até 1877, a fi si o no mia do car na val era mais ex pan si va, mais
po pu lar. To dos os te a tros da vam ba i les; as ruas e pra ças de co ra vam-se
com am pli tu de e pro fu são; car ros de más ca ras per cor ri am as ruas; os
gru pos fan ta si a dos eram inú me ros; e os más ca ras iso la dos fa zi am rir
pela ori gi na li da de das idéi as, des ta can do-se pelo es pí ri to.
Enquan to um prés ti to des fi la va e um ou ou tro gru po mais
avul ta do exi bia-se vis to so pela ruas prin ci pa is, os más ca ras de to das as
ca te go ri as en tre ti nham, em quan ti da de pro di gi o sa, to das as aten ções.
Sen tia-se que a ci da de saía fora de sua vida ha bi tu al, e que seu 
as pec to ex te ri or era um re fle xo pá li do da ale gria pú bli ca.
Os te a tros em ban de i ra dos, o co mér cio das ves ti men tas, co re tos,
mú si cas e ru mo res ge ne ra li za dos, cons ti tu íam o cli ma do do min go, que,
des de as duas ho ras, trans mi tia o con tá gio da lou cu ra à po pu la ção in te i ra.
Du ran te os três diasha via o car na val das ruas, dos te a tros, do
Clu be, dos sa lões. Mu i tos gru pos or ga ni za ram-se, cada qual com mais
ele gân cia e acen tu a da ca rac te rís ti ca.
A Boê mia, pre ce den do os Cro má ti cos, apre sen tou-se nos te a tros 
com es tra nho lu zi men to. O ves tuá rio era o se guin te: blu sa de seda, de
man gas cur tas, fran ja da de ouro, ma no plas de ver niz, cal ção de ca mur ça
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 47
e jus to, bo tas à Fer nan do, fa i xa de co res vi vas, ar go lões de me tal nas
ore lhas, ca be le i ra cres pa, dis tin guin do-se pe los ca pa ce tes en ci ma dos por 
pás sa ros, lan ter nas, qui me ras, etc., cujo efe i to era ad mi rá vel.
Re cor da mo-nos de um des ses chi cards, que so bre o ca pa ce te
de cou ra ce i ro prus si a no os ten ta va um pe na cho es car la te e bran co, de
mais de um me tro de al tu ra.
Esses boê mi os anun ci a vam-se pelo gri to es pe ci al, de que fala
Hen ri Mur ger.
O Clu be X, do qual ain da se fala com sa u da des, com pu -
nha-se igual men te de ri quís si mos e es pi ri tu o sos chi cards, ini ci a do res dos
car ros de idéi as, que com tan ta van ta gem fo ram apro pri a dos pe las so ci e da -
des ulteri o res. As da mas do Clu be X fan ta si a vam-se com es me ro e
prima vam pelo con jun to das for mas. Da pas se a ta que fez o clu be,
acom pa nha do de ca me los, há mu i to quem se lem bre.
O dis tin ti vo dos só ci os era um C e um X no alto do ca pa ce te
e nos es cu dos.
Não nos pre o cu pan do de gru pos vul ga res, fa le mos de uma
an ti ga so ci e da de, que re ti rou-se das fo li as car na va les cas, por que já não
ti nha mais lou ros a co lher – os Estu dan tes de He i del berg.
E quem eram es tes es tu dan tes?
Na pri mi ti va, ra pa zes do cur so mé di co, al guns em pre ga dos
pú bli cos, e pou cos, mas de boa co lo ca ção, do co mér cio.
Esta so ci e da de não fa zia pas se a tas: dava seus ba i les, ou con -
cor ria aos do Lí ri co, Gi ná sio e S. Pe dro.
Pelo pes so al es co lhi do, per ce be-se o su ces so de sua exis tên cia.
Qu an do os Estu dan tes de He i del berg trans pu nham os sa lões,
a fina crí ti ca, a in tri ga es pi ri tu o sa, a pi lhé ria ino fen si va, en tra vam em
con tri bu i ção. As fa mí li as nos ca ma ro tes e os más ca ras que fla na vam
nos in ter va los da dan ça, pu nham-se em guar da para o riso e para o
de sa pon ta men to.
O seu tra jar era es pe ci al, se gun do o es ti lo uni ver si tá rio. Eis o
uni for me: so bre ca sa ca cur ta abo to a da, cal ção-ca mur ça, bo tas de mon tar,
fa i xa, es pa da, boné sem aba, mas cir cu la do por lar ga fita, em que re al -
ça vam as co res da ban de i ra do país ao qual cada um apa ren ta va per ten cer.
O rei des to a va, por que subs ti tu ía o boné pelo cha péu ar ma do 
e ves tia ir re pre en sí vel ca sa ca.
48 Melo Mo ra is Filho
To dos tra zi am por ta-voz, com que atro a vam céu e ter ra.
As mu lhe res que os se gui am, ves ti das a ca pri cho e in te res -
san tes, aju da vam-lhes a atra ves sar a no i te, no meio das dan ças e das
gar ga lha das ar gen ti nas.
Em qual quer das tar des, más ca ras avul sos fa zi am-se cé le bres
pela ori gi na li da de das lem bran ças.
Um vez apa re ceu um galo bas tan te vis to so, que can ta va,
abrin do as asas, jun to a um fi gu rão, que so bre o ab dô men de i xa va ler o
se guin te le tre i ro: Aqui den tro há al gu ma cou sa.
No S. Pe dro, no Pro vi só rio, de po is de ter de bi ca do nas ruas a
todo o mun do, apre sen tou-se um in di ví duo, cor re ta men te tra ja do, ves ti do 
à cor te, como vul gar men te se diz, de ócu los, ca be le i ra e na riz pos ti ços,
de um es pí ri to sur pre en den te, fa lan do fran cês, in glês, ale mão, ita li a no e
por tu guês. 
Não hou ve quem não o ad mi ras se, já pelo chis te, já pela pu re za 
da pro nún cia nas lín guas em que se ex pri mia.
Por ba i xo dos ar cos pin ta dos e de lu zes; ao aço i te das ban -
de i ras sus pen sas, abal ro an do-se no co re tos; e, à no i te, ao fogo dos
ar cho tes, os zés-pe re i ras, a Mor te, de cam pa i nha e fo i ce, os prin ce ses de
más ca ra de ara me e de pa pe lão, os ran chos com to ca tas e os di a bi nhos
de ra bos e chi fres, agi ta vam-se, mo vi am-se, dan do a es ses qua dros um
as pec to ver da de i ra men te en can ta do.
De sú bi to, uma ban da de mú si ca as so ma va, pre ce di da de fo gos 
de ben ga la e da mul ti dão dan do vi vas.
Eram as Su mi da des, a União Ve ne zi a na, os Zu a vos, ou qual -
quer ou tra so ci e da de, con for me os tem pos, que na ter ça-fe i ra en ter ra va
o car na val...
Nos es qui fes, com ro de las de li mão, ou ri ça dos de pa li tos,
guar ne ci dos de ar cho tes, car re ga dos ao om bro, os le i tões as sa dos, os
pe rus, as ga li nhas e o fi am bre para as ce i as no te a tro.
O fé re tro pa ra va em de ter mi na dos lu ga res, en to a va-se um De
pro fun dis, to ca vam-se mar chas fú ne bres, re ci ta vam-se dis cur sos cô mi cos,
po e si as dis pa ra ta das, em hon ra do car na val e da co me za i na.
Estas fes tas fo ram mais ou me nos as sim até o ano de ses sen ta 
e tan tos, em que a Pa u li céia Va ga bunda com pa re ceu nos fes te jos.
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 49
Foi este o úl ti mo car na val clás si co, es tron do so. O Impe ra dor
des ceu, na úl ti ma tar de, ao paço da ci da de.
À ex ce ção do Con gres so e da União Ve ne zi a na, as mais so ci e -
da des exis ti am: par te da po pu la ção mas ca ra va-se, e os te a tros e clu bes
eram pa ra í sos ar ti fi ci as. 
Sem po der mos fir mar as da tas da fun da ção das so ci e da des de 
hoje, re cor da mo-nos de um fato que de ter mi nou o re nas ci men to do
car na val, que ia em de ca dên cia: o in cên dio de uma far má cia ou dro ga ria
da Rua Di re i ta, no ano de 1861. 
Os te a tros es ta vam che i os e a no tí cia es pa lhou-se.
Os Zu a vos, su pon do que o fogo se ha via de cla ra do em casa
de um dos só ci os, para lá cor re ram, e, com o seu uni for me car na va les co, 
au xi li an do o cor po de bom be i ros, por ta ram-se com a ma i or va len tia.
Extin to o in cên dio, le van ta ram-se para eles as la ba re das do
pres tí gio. No vos só ci os en tra ram; o en tu si as mo avi ven tou-se, e não lon ge
des se ba tis mo de fogo, que lhes con sa grou o nome, re ce be ram no cris ma
de Momo o de Te nen tes do Di a bo.
Nos car na va is pos te ri o res a 1869, uma ou tra ge ra ção, tra zen do
con si go no vas idéi as, veio ocu par o ce ná rio pou co po vo a do do pas sa do
e as sis tir à ago nia das der ra de i ras as so ci a ções que fa le ci am.
Da al tu ra de suas as pi ra ções, re co lheu o que lhe pa re ceu útil,
acu mu lan do os ca be da is de que pre sen te men te dis põe.
Os Fe ni a nos, gru po dis si den te dos Te nen tes do Di a bo, exem -
pli fi cam o que di ze mos.
A par tir de 1870, o car na val con cen trou-se nas gran de so ci e -
da des, ab sor ven do os más ca ras.
Pe que nos ran chos, fo liões dis per sos e de pon tos dis tan tes,
para ve rem o des fi lar de um prés ti to sun tu o so, aflu íam aos lu ga res in di -
ca dos no iti ne rá rio, aban do nan do as sim seus pas se i os, seus cen tros, seu
meio; mas como tan to go za vam fan ta si a dos como sem dis far ce, opi na ram 
pela con ve niên cia, e o más ca ra de on tem tor nou-se o cu ri o so de hoje. 
Não sa be mos se com isso ga nhou ou per deu o car na val;
como re go zi jo po pu lar, não é mais o que era.
Os te a tros, fi can do va zi os, por que as ca ver nas e as ca sas pró -
pri as lo cu ple ta vam-se, apa ga ram seus lus tres, fe cha ram suas por tas; e os
50 Melo Mo ra is Filho
cu ri o sos, de po is que as so ci e da des pas sam, vol tam aos seus la res, como
nos dias co muns. 
Entre tan to, cum pre con fes sar que os De mo crá ti cos, Fe ni a nos 
e Tenen tes são jus ta men te dig nos da glo ri o sa re pu ta ção que lhes dis pen sa 
o pú bli co, re pu ta ção ad qui ri da pelo es pí ri to su til de suas idéi as, pelo
apa ra to gran di o so de seus prés ti tos.
Mar ge an do as cor ren tes mo der nas, subs ti tu í ram as ca val ga das 
nu me ro sas, os car ros de más ca ras, os per so na gens dis far ça dos, a mas ca -
ra da ge ral, pe las suas cus to sas ban das de mú si ca, pe las ale go ri as do
por ta-es tan dar te, pe los car ros de idéi as, cada qual mais es pi ri tu o so e ori gi -
nal, ou mais rico.
De ba i xo das ro das des tes car ros, en tre tan to, fi ca ram es ma -
ga dos os ar le quins, os po li chi ne los e ou tros ti pos, que ou tro ra tan to nos 
di ver ti ram.
E a alu são de i xou de ser pes so al para abran ger um cír cu lo, um 
fato, uma ação. Apla u di das mu i tas das suas crí ti cas pela fe li ci da de das
re pro du ções, os acon te ci men tos mais ri dí cu los e fri san tes do ano são
trans por ta dos para aque les ce ná ri os am bu lan tes como para um ba i xo-re -
le vo exe cu ta do por mes tre. O povo ri-se a bom rir, por que, co nhe cen do
o as sun to, pode dar aos per so na gens os no mes au tên ti cos. 
De po is das ru i do sas Ale go ri as em que to das as so ci e da des se
em pe nham por ex ce der-se, se guem-se os car ros de idéi as, em que os
Fe ni a nos, De mo crá ti cos e Te nen tes têm-se co ro a do de la u réis, na re a li -
da de des lum bran tes. A pas sa gem de Vê nus, em que apa re cia um cé le bre
as trô no mo ar ma do de te les có pio; A man cha de Jú pi ter, alu são mag ní fi ca à
es cra vi dão; Bra ços à la vou ra, As bar ra qui nhas, a Qu es tão dos bis pos, etc., con -
quis ta ram tão vi vas ma ni fes ta ções que a im pres são pro du zi da res tou
ina pa gá vel na me mó ria pú bli ca.
Os Fe ni a nos, os Te nen tes e os De mo crá ti cos, em pu nhan do o
ce tro da tra di ção, re pre sen tam atu al men te o car na val do Rio de Ja ne i ro. 
Fes tas e Tra di ções Po pu la res do Brasil 51
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A Fes ta do Di vi no
(PRO VÍN CIA DO RIO)
Por va les e ser ras, por es tra das e po vo a dos, me ses an tes da fes ta
do Espí ri to San to, gar ri dos fo liões dis per sa vam-se em ban dos no in te ri or
da pro vín cia do Rio de Ja ne i ro, an ga ri an do es mo las para as fes tas das
ca pi ta is, dos mu ni cí pi os, que se fa zi am ou tro ra a ri go ro so ca pri cho dos 
fes te i ros e se gun do os do na ti vos das po pu la ções de vo tas.
A isso, po rém, pre ce dia a ele i ção das me sas das res pec ti vas
ir man da des e a es co lha dos li be ra is fes te i ros, a cuja di re ção e car go
fi ca ri am a so le ni da de re li gi o sa e os fes te jos ex ter nos.
Des de en tão, três, qua tro ou cin co ban de i ras, de con for mi da de
com a ex ten são das fre gue si as ou dis tri tos, pu nham-se em mar cha, mu -
ni das de im pres cin dí ve is li cen ças, le van do a to dos os ares e a to dos os
la res o ins tru men ta do anún cio da fes ti vi da de anu al, que fa ria con ver gir
em um pon to de ter mi na do os ha bi tan tes de um ter mo qual quer, que
geral men te se an te ci pa vam em suas pi e do sas ofe ren das à gran di o sa fes ta 
do Espí ri to San to, sem pre es plên di da e con cor ri dís si ma.
E de que se com pu nham as ban de i ras?
Cada uma de um ran cho de ra pa zo las, bran cos, cri ou los e
mes ti ços, ves ti dos de bran co, com as ja que tas en fe i ta das de la ça ro tes de
fi tas, tra zen do cha péus de pa lha com la ços ver des, es car la tes,
cor-de-rosa, etc., que des do bra vam-se em lon gas e flu tu an tes pon tas
so bre os om bros e as cos tas.
Do ran cho a fi gu ra mais sa li en te era o al fe res da ban de i ra, es pi -
ga do e per nós ti co ra pa gão, que to ma va con ta das es mo las, par la men ta va 
di re ta men te com os de vo tos e ofer tan tes, res pon sa bi li zan do-se pelo que 
des se e vi es se du ran te o ex ten so e de mo ra do tra je to.
A ves ti men ta do al fe res da ban de i ra não di fe ria da de seus com -
pa nhe i ros, va len do-lhe a pro e mi nên cia no gru po o es tan dar te por ele
des fral da do, a ban de i ra do Di vi no, onde uma pom ba pin ta da so bre um
fun do de ra i os so la res des ta ca va-se no cam po de seda ver me lha da re fe -
ri da ban de i ra, fran ja da de ouro, de pra ta ou de lã, de acor do com as pos -
ses das ir man da des, en ci ma da por uma pom ba de pau, pra te a da ou dou -
ra da, sus pen den do o vôo de um mon te de iri sa das fi tas.
Engros san do a tur ma dos fo liões, cer can do ou la de an do a
ban de i ra, vi nham os to ca do res de fer ri nhos, de pan de i ros, de pra tos, de
tam bo res e de vi o las, em ri so nho con ví vio, pu lan do, to can do, can tan do: 
Dai es mo la ao Di vi no,
Com pra zer e ale gria,
Re pa rai que esta ban de i ra
É da vos sa fre gue sia.
A es sas Fo li as acom pa nha va um ou mais ani ma is de car ga
para con du zir dá di vas e pro mes sas, pren das para os le i lões, ob je tos de
di fí cil trans por te.
À no tí cia de que an da vam ban de i ras, não ha via casa que não se
jul gas se hon ra da de re ce ber-lhes a vi si ta, não ha via um po bre que em
sua pa lho ça hu mil de de i xas se de se pre ve nir para o fa vo rá vel aga sa lho
dos fo liões, re ser van do, na fal ta de es mo la pe cu niá ria, uma ga li nha, uma 
le i toa, uns pom bi nhos, um peru, para ofe re cer ao Di vi no.
E in ter nan do-se nas es tra das, trans pon do o ter re i ro das fa -
zen das, su bin do à cris ta das mon ta nhas, as fo li as de nun ci a vam-se lon ge
fa zen do vi brar a me lo di o sa or ques tra, en chen do o es pa ço de so nân ci as
tra di ci o na is em todo o País.
54 Melo Mo ra is Filho
No Rio Bo ni to, onde ima gi na mos as sis tir à fes ta no dia de sua 
ce le bra ção li túr gi ca, o apa ra to de que ela se re ves tia em ou tro tem po nos 
pa re ce me lhor de se nhar os tra ços ge ra is das ve lhas usan ças da co lô nia,
que, mo di fi ca das en tre nós, con ser va ram o que era es sên cia, opu len -
tan do-se no pitores co do ce ná rio e pela va ri a bi li da de im per sis tên cia das
ra ças.
As fo li as pre cur so ras dos po pu la res fes te jos do Espí ri to San to 
pos su íam na roça um con jun to de for ma li da des, um re per tó rio de qua -
dras de re cur so, tão pri mi ti vos e com ple tos, que, a um mo men to dado,
pu nham em con tri bu i ção não só a es pon ta ne i da de re li gi o sa, mas ain da a 
ge ne ro si da de hos pi ta le i ra da que la boa gen te, que não co nhe cia obs tá cu los 
no cum pri men to de tra di ci o na is de ve res.
E o ban do ru i do so lá ia, se guia, pa ra va, can ta va à por ta de
uma ca si nha de sapé, à be i ra do mato ou da es tra da:
Ó se nhor dono da casa,
Re ce bei esta ban de i ra,
Faça fa vor de en tre gá-la
A quem tem por com pa nhe i ra.
O ro ce i ro e a famí lia, já al vo ro ça dos pela mú si ca e pela
canto ria, es cu ta das de há mu i to, acha va-se fora; ace i tan do a ban de i ra do 
Divi no, be i ja va-a, e com igual re ve rên cia a pas sa va à mu lher que o imi ta va 
e esta aos filhos, es cra vos, e mais vi zi nhos pre sen tes.
O al fe res, re to man do-a de po is, adi an ta va a sa co la das es mo las,
tendo no fren te a ra di an te pom ba do Di vi no, re co lhen do o óbo lo da
piedade in di vi du al, a par tí cu la re pre sen ta ti va da cren ça, que é a fe li ci da de
da cons ciên cia e da vida.
Em jor na da pe no sa, des pro vi da de al ber gues, as ban de i ras,
fa lan do a lin gua gem da po e sia, en con tra vam na li be ra li da de dos ro ce i ros 
o in dis pen sá vel para o sus ten to e para a vi a gem.
E os tam bo res ru fa vam, os fer ri nhos ba ti am, cho ca lha vam os
pan de i ros, os pra tos e as vi o las, que acom pa nha vam:
A ban de i ra aqui che gou
Um fa vor quer me re cer:
Uma xí ca ra de café
Para os fo liões be

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