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Análise do Discurso Unidade III

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Unidade III
O DISCURSO SOB A PERSPECTIVA ENUNCIATIVA
7 OS ESTUDOS ENUNCIATIVOS DE BAKHTIN, BENVENISTE, DUCROT, 
GUIMARÃES E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA AS TEORIAS DO DISCURSO
Os estudos enunciativos da linguagem, mesmo ainda muito influenciados pela tradição estruturalista, 
abrem espaço para as diferentes investigações acerca do texto e do discurso, pois põem em cheque o 
postulado de que a frase (sentença/proposição possível no sistema linguístico abstrato) seria a sua maior 
unidade de análise e abrem espaço para a configuração da subjetividade na/da linguagem, no sentido de 
que considerar a enunciação é considerar também o enunciador e sua contraparte o enunciatário. Esses 
estudos legam uma grande contribuição às investigações textuais e discursivas, uma vez que resgatam 
a subjetividade/o sujeito/o falante de volta à investigação linguística.
Partindo do princípio de que a produção de sentidos na linguagem não se verifica em relação ao estado 
de coisas, mas se realiza a partir das enunciações anteriores e no acontecimento enunciativo, faremos 
algumas observações sobre o fenômeno da enunciação. Para isso, observaremos algumas reflexões 
bakhtinianas sobre a enunciação e polifonia, as considerações de Benveniste sobre a enunciação, os 
dispositivos teóricos concernentes à teoria polifônica ducrotiana, além de considerações a respeito da 
semântica enunciativa do acontecimento de E. Guimarães.
As principais teorias linguísticas da enunciação pautam‑se no confronto (definições e redefinições) 
das perspectivas de:
• Bakhtin em Marxismo e filosofia da linguagem (2009), que trata a enunciação na esfera social 
perante a filosofia da linguagem;
• Benveniste em Problemas de linguística geral II (1989), que considera a enunciação a partir da 
subjetividade na linguagem;
• Ducrot em O dizer e o dito (1987), que define enunciação a partir de uma atividade psicofisiológica, 
ou seja, as influências sociais, como um seguimento de discurso, e como um aparecimento 
momentâneo de um enunciado; e
• Guimarães em Semântica do acontecimento (2002), que redefine os vários conceitos anteriores 
de enunciação (e outros conceitos pertinentes a esta discussão) como um acontecimento de 
linguagem que se entrelaça/articula com determinadas categorias teóricas do arcabouço da 
análise do discurso, abordados por Pêcheux em Semântica e discurso (1975) e por Orlandi em 
Análise de discurso: princípios e procedimentos (2007a).
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ANÁLISE DO DISCURSO
7.1 A enunciação sob a ótica de Bakhtin
Para uma primeira abordagem de enunciação, partimos das considerações de Bakhtin (2009), que 
concebe linguagem como dialógica (e não monológica/monofônica), fundamentando‑se no produto 
ideológico de ordem social, sob as influências do marxismo e da filosofia da linguagem. A teoria 
bakhtiniana considera que a enunciação dá‑se ideologicamente, não possuindo um sentido exato, 
unicentrado, transparente, veiculado enquanto informação por uma única voz.
Bakhtin (2009), aprofundando‑se na perspectiva dialética da linguagem, ressalta a consideração de 
um sistema linguístico de normas imutáveis, e assim analisa criticamente três diferentes perspectivas 
frente à linguagem, enquanto sistema de normas, em relação ao fenômeno da enunciação:
a. o subjetivismo individualista (da consciência individual), a partir do qual é que a língua se 
apresenta como sistema de normas imutáveis e rígidas. Ao que Bakhtin (2009) considera que ao 
analisar tal sistema, profundamente, por um ângulo objetivo, é possível notar que tal proposta não 
procede, devido a não se ter encontrado indício desse sistema fechado de normas imutáveis;
b. o objetivismo abstrato em que, conforme Bakhtin (2009), podemos entender a língua podendo 
ser percebida distintamente do modo como se apresenta em um contexto individual num dado 
momento, ou seja, a língua se apresenta como uma corrente contínua, passível de evolução, 
quando comparada ao imutável, (tal teoria define que todo sistema de normas sociais existe se 
estiver relacionado à consciência subjetiva dos indivíduos e da coletividade em que essas normas 
se regulam);
c. a relação entre consciência subjetiva e a língua como sistema objetivo de normas 
incontestáveis é desprovida de qualquer sustentabilidade, sendo assim, a teoria bakhtiniana não 
considera a língua como sistema de normas imutáveis, pois pensar a natureza objetiva da língua, 
afirma Bakhtin (2009) é incorrer num grave erro, já que fechada em seu sistema imutável a língua 
não abriria espaço para ser observada a partir das suas características mais essenciais, no que 
tange o dialogismo e a polifonia nela constitutivas de subjetividade.
Conforme Bakhtin, ao entrelaçar a relação perfeitamente objetiva que a língua constitui com a 
consciência relativamente individual de um sistema de normas imutáveis, torna‑se possível entender 
que esse pode ser o modo de existência da língua para uma comunidade, embora Bakhtin (2009) ressalte 
que tais ideias não se definem claramente.
Dessa forma, torna‑se evidente para Bakhtin (2009) o questionamento se a língua existe para a 
consciência subjetiva do locutor unicamente como sistema objetivo de formas normativas intocáveis, 
pois:
Devemos, agora, perguntar‑nos se a língua existe realmente para a 
consciência subjetiva do locutor unicamente como sistema objetivo 
de formas normativas e intocáveis. O objetivismo abstrato captou 
corretamente o ponto de vista da consciência subjetiva do locutor? 
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É realmente este o modo de existência da língua na consciência 
linguística subjetiva? A essa questão somos obrigados a responder pela 
negativa. A consciência subjetiva do locutor não se utiliza da língua 
como de um sistema de formas normativas. Tal sistema é uma mera 
abstração, produzida com dificuldade por procedimentos cognitivos bem 
determinados. O sistema linguístico é o produto de uma reflexão sobre 
a língua, reflexão que não procede da consciência do locutor nativo e 
que não serve aos propósitos imediatos da comunicação. Na realidade, 
o locutor serve‑se da língua para suas necessidades enunciativas1 
concretas (para o locutor, a construção da língua está orientada no 
sentido da enunciação da fala). Trata‑se, para ele, de utilizar as formas 
normativas (admitamos, por enquanto, a legitimidade destas) num dado 
contexto concreto. Para ele, o centro de gravidade da língua não reside 
na conformidade à norma da forma utilizada, mas na nova significação 
que essa forma adquire no contexto (BAKHTIN, 2009, p. 93‑94).
Partindo da afirmação acima, em relação ao uso que o locutor faz da língua para suas necessidades 
enunciativas concretas, podemos compreender que Bakhtin (2009) discorre sobre alguns conceitos 
básicos definidos por ele como:
a. a língua: não se define enquanto um sistema de normas imutáveis, estagnadas, mas sim enquanto 
uma corrente passível de evolução contínua que se constitui perante o social, fazendo‑se desta 
forma, variável e flexível em determinado contexto, relativa às necessidades de seus falantes;
b. a enunciação: define‑se através da comunicação verbal, a qual estrutura‑se por meio da relação 
com outras enunciações, em um contexto ideológico, uma vez que a enunciação pode ser 
entendida como resultado da fala, já que esta tem a função de produzir compreensão.
Ao abordarmos as concepções de Bakhtin (2009), sobre língua, fala e enunciação é de suma 
importância destacar que em seu trabalho teórico ele enfatiza que a enunciação se constitui através 
das relaçõesque esta estabelece com outras enunciações, dentro ainda da mesma ideologia, ou, 
como explana o próprio autor, dentro de um “domínio ideológico” (BAKHTIN, 2009. p. 97).
Referente, ainda, à enunciação, podemos destacar segundo a perspectiva de Bakhtin (2009), que 
toda enunciação efetiva seja ela de que natureza for, pode vir a concordar ou discordar com um fato 
qualquer, uma vez que, este pode ser acompanhado de uma clareza ou não. De forma que podemos 
acrescentar que para Bakhtin (2009), sua teoria da enunciação se apresenta de forma social e não 
individual, ao passo que se torna evidente apontarmos estas afirmações nas suas próprias palavras.
Na realidade, o ato de fala, ou, mais exatamente, seu produto, a 
enunciação, não pode de forma alguma ser considerado como individual 
no sentido estrito do termo, não pode ser explicado a partir das condições 
2 O grifo é nosso.
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psicofisicológicas do sujeito falante. A enunciação é de natureza social. 
(BAKHTIN, 1929/2009, p. 109).
Veja que para o locutor o que importa é aquilo que permite que a forma linguística figure num 
dado contexto, aquilo que torna um signo adequado às condições de uma situação concreta dada não 
tendo importância a forma linguística enquanto sinal estável e sempre igual a si mesmo, mas tendo a 
importância que o signo é sempre variável e flexível.
De fato, podemos ainda mencionar que a enunciação, segundo Bakhtin (2009), não é capaz de 
trabalhar as formas de composição do todo, ou seja, esta não consegue relacionar os elementos que a 
constitui e as formas que a insere, uma vez que, essa enunciação só pode se constituir quando a mesma 
se relaciona com outras enunciações.
Conforme a teoria da enunciação de Bakhtin (2009), o processo de decodificação (compreensão) não 
pode ser confundido com o processo de identificação, já que o signo é decodificado e o sinal identificado. 
O sinal é uma entidade imutável, ele não pode substituir, nem refletir, nem tão pouco refratar entre 
outras ações, de fato o sinal não pertence ao domínio ideológico, mas sim aos instrumentos simbólicos 
de produção no sentido amplo do termo.
Você pode observar que enquanto uma forma linguística for apenas um sinal e a mesma for percebida 
pelo receptor como tal, é possível constatar que o sinal não terá nenhum valor linguístico, já que a pura 
sinalidade não existe, isto é, a forma é orientada pelo contexto, que por sua vez já constitui um signo, 
deixando‑nos entender que, assim como um elemento torna a forma linguística, um signo não é a sua 
identidade como sinal, e sim sua mobilidade específica.
Para exemplificar a discussão acima, tomemos o conhecido “sinal” de trânsito que se refere à 
mensagem “Não estacione”.
Figura 3
Como sinal, ele é facilmente identificado, mas não há como referi‑lo em sua pura sinalidade, já que 
sua mobilidade no contexto social é tal que o próprio sinal já em sua forma orientada pelo contexto (na 
linguagem do trânsito) se constitui em signo dentro de sua simbologia ideológica, histórica e social.
Ao discorrermos sobre língua, fala e enunciação sob a ótica de Bakhtin (2009), é prudente destacarmos 
sua posição sobre a teoria da enunciação e seus respectivos problemas sintáticos. No que diz respeito 
à teoria da enunciação, o problema da sintaxe pode prejudicar a compreensão da língua e de sua 
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evolução, o que consequentemente acarreta um mau uso quanto às formas devidas dos atos de fala, dos 
quais resulta o produto da enunciação: o enunciado, conforme a teoria bakhtiniana.
Perceba que, conforme Bakhtin (2009), a teoria da enunciação considera que o processo mais 
difícil da decodificação dá‑se nas análises sintáticas do discurso, que de fato constroem o corpo da 
enunciação. Como essas análises são sempre vistas por meio da construção fonética e morfológica, 
tornam‑se algo complicado quando a intenção é trazê‑las para o objetivismo abstrato. A dificuldade 
quanto às formas sintáticas, (mas que também ocorre tanto no nível da construção fonética, como da 
morfológica), deve‑se ao fato de que tais formas são de fato mais concretas que as demais. Essas formas 
sintáticas são estreitamente ligadas às condições de fala e é exatamente por serem ligadas à fala que a 
teoria bakhtiniana ressalta a prioridade das formas sintáticas sobre as formas fonético‑morfológicas.
A teoria da enunciação de Bakhtin (2009), ressalta que devido à falta de interesse pelos fenômenos da 
enunciação na linguística estrutural, não foi possível tratar de compreensão real, concreta e não escolástica 
das formas sintáticas no funcionamento enunciativo. Para o linguista estrutural é mais confortável lidar 
com a questão da operação no centro da unidade frasal, na qual é possível ainda considerar que: quanto 
mais o linguista se aproxima das fronteiras do discurso, mais ele se aproxima da enunciação e sua posição 
não se torna segura (se torna instável), uma vez que, para nenhuma dessas categorias linguísticas convém 
a determinação do todo, já que essas categorias só são aplicáveis no interior do território da enunciação.
Desta forma, para Bakhtin (2009), o interesse da teoria da enunciação dá‑se não somente em função 
dos problemas sintáticos, mas também na composição dos parágrafos que constituem um discurso e 
demais níveis de relação das partes com o todo, importando‑se com o que precisamente interessa para 
analisar o entrelaçar da voz do falante com a voz do ouvinte, através da materialidade enunciativa.
De fato, a teoria bakhtiniana se atém ao olhar objetivo no que diz respeito ao estudo das formas da 
comunicação verbal e das formas correspondentes da enunciação completa, já que estas falam sobre 
o sistema dos parágrafos e todos os problemas análogos. Ou seja, Bakhtin se interessa pelos esquemas 
linguísticos envolvendo discursos direto, indireto e indireto livre, juntamente com suas modificações e 
suas variantes que são encontradas na língua e que servem como transmissores das enunciações de outrem 
(e que integram enunciações de outrem), abrindo a possibilidade do método linguístico‑sociológico.
Quanto aos tipos de discursos apontados acima, juntamente com os problemas sintáticos, a teoria 
bakhtiniana julga necessária uma abordagem sobre a conceituação de discurso pela teoria da enunciação. 
Esta irá explicar o funcionamento do discurso de outrem, a partir de seus esquemas específicos, realizados 
sob a forma de variantes especificas, incluindo as mudanças possivelmente encontradas nas fronteiras 
gramaticais e estilísticas. Valendo‑se da forma de transmissão do discurso de outrem, que se define numa 
relação funcional de uma enunciação com a outra diante das possíveis edificações da própria língua. Esta 
abordagem do discurso relatado constitui‑se em seus esquemas de base ou em variantes, embora a teoria 
da enunciação ressalte que é definitivamente inacessível estabelecer uma fronteira entre a gramática e a 
estilística, entre o uso do esquema gramatical e sua própria variante estilística. Para Bakhtin (2009):
O discurso indireto ouve de forma diferente o discurso de outrem; ele integra 
ativamente e concretiza na sua transmissão outros elementos e matizes que 
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os outros esquemas deixam de lado. Por isso transposição literal, palavra 
por palavra, da enunciação construída segundo um outro esquema só é 
possível nos casos em que a enunciação direta já se apresenta na origem 
como uma forma algo analítica – isso, naturalmente, dentro dos limites das 
possibilidades analíticasdo discurso direto. A análise é a alma do discurso 
indireto (BAKHTIN, 2009, p. 159).
Dessa forma, segundo a teoria da enunciação de Bakhtin (2009), é de suma importância explanarmos 
que a determinação das linhas de marca para definir o discurso indireto possui características que 
exprimem uma tendência de apreensão ativa do discurso de outrem e que cada esquema recria, a partir 
de seus métodos, a enunciação, proporcionando uma orientação particular. Uma vez que o discurso 
indireto se dá de forma analítica, ele possui suas variantes, sendo a primeira o discurso indireto 
analisador do conteúdo, a segunda o discurso indireto analisador da expressão e a terceira variante 
sendo a variante impressionista.
A primeira variante do discurso indireto pode ser compreendida como a apreensão da enunciação de 
outrem no plano temático, excluindo o que não tiver significação temática, ou seja:
A variante analisadora do conteúdo abre grandes possibilidades às tendências 
à réplica e ao comentário no contexto narrativo, ao mesmo tempo que 
conserva uma distancia nítida e estrita entre as palavras do narrador e as 
palavras citadas. Graças a isso, ela constitui um instrumento perfeito de 
transmissão do discurso de outrem em estilo linear (BAKHTIN, 2009, p. 161).
Referente à segunda variante do discurso indireto, a analisadora da expressão, esta pode ser entendida 
como a integração de forma indireta das palavras e das maneiras de dizer do outro, tornando‑se assim 
facilmente notória, justamente por sua especificidade se dar através da ironia, humor ou o uso de 
aspas.
Enquanto a terceira variante do discurso indireto, a impressionista, transmite os pensamentos e os 
sentimentos da personagem, ou seja, o discurso indireto desta, sendo utilizada pelo autor do discurso 
com uma intencionalidade de focalizar para ressaltar e abreviar o tema que pretende abordar.
Quanto ao discurso direto, Bakhtin menciona um emprego do mesmo ou de uma de suas variantes 
simultâneas, diante do ato de transposição inseparável dessa forma, o que torna justificável a sua 
tendência analítica manifestar‑se principalmente pelo fato dos seus elementos serem emocionais e 
afetivos. O discurso direto se diferencia do discurso indireto pelo emprego da entonação emocional (apelo 
de convencimento) e a variante deste é constituída pela ambiguidade, empregada mais especificamente 
na literatura.
A construção do discurso direto provém das marcas principais do discurso indireto, exatamente 
pela natureza desse discurso se dar por meio de temas básicos que são antecipados pelos contextos e 
evidenciados por entonações do autor ou personagens, essas entonações quase sempre são acompanhadas 
por um enfraquecimento da objetividade do contexto narrativo.
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Conforme Bakhtin (2009), o discurso direto e o discurso indireto formam um esquema misto quando 
engendram o discurso indireto livre, o qual proporciona um discurso por substituição do contexto 
narrativo em si para um contexto narrativo objetivo, ou seja, é a forma de discurso que o autor utiliza 
para ressaltar seus conceitos apreciativos, que se dão também através de suas entonações.
Enfim, Bakhtin legou‑nos uma importante trilha de reflexões a respeito do dialogismo, da polifonia, 
da enunciação, da interdiscursividade e até mesmo da noção de gênero textual e discursivo, defendendo 
o princípio do dialogismo como constitutivo da linguagem e a natureza social da enunciação.
Para ele, a enunciação é o produto da interação dos indivíduos socialmente organizados e, ainda 
que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante médio do grupo social 
ao qual pertence o locutor.
O termo “diálogo” deve ser entendido num sentido amplo, não apenas como a comunicação em voz 
alta, de pessoas colocadas face a face, mas como toda comunicação verbal, de qualquer tipo que seja. 
“A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros” e em todo enunciado descobriremos 
que está o outro em diferentes graus de alteridade.
 Observação
Existe uma gama dos gêneros mais difundidos cotidianamente, tão 
cristalizados, apresentando formas tão padronizadas (por exemplo, os 
provérbios), que a expressão individual do locutor praticamente só pode 
manifestar‑se na escolha do gênero.
Bakhtin ressalta que as palavras não são de ninguém, estão a serviço de qualquer locutor e de 
qualquer juízo de valor, e podem mesmo ser totalmente diferentes, até mesmo contrárias. Conforme 
Bakhtin, em relação às fórmulas estereotipadas da vida corrente, os sistemas ideológicos constituídos da 
moral social, da ciência, da arte e da religião cristalizam‑se a partir da ideologia do cotidiano, exercem por 
sua vez sobre esta, em retorno, uma forte influência e dão assim normalmente o tom a essa ideologia.
Diana L. P. Barros (1997), sintetiza em um capítulo as principais contribuições de Bakhtin às teorias 
do discurso. Assim, põe‑se a questão: “de que forma e por quais razões Bakhtin é considerado um 
precursor ou antecipador de perspectivas teóricas tão diferenciadas?”. O trabalho de Barros procura 
mostrar que foram suas reflexões variadas sobre o princípio dialógico da linguagem que anteciparam 
e influenciaram os estudos do texto e do discurso, tanto na própria concepção de texto (discurso, ou 
enunciado) enquanto objeto das ciências humanas, como sobre o princípio dialógico e seus diferentes 
desenvolvimentos nas diferentes teorias.
Em primeiro lugar, vamos acompanhar a reflexão crítica feita por Bakhtin (apud BARROS, 1997) sobre 
a defesa do texto como objeto das ciências humanas. Ele defende (ao contrário da tradição estruturalista) 
que a especificidade das ciências humanas está no fato de que seu objeto é o texto/discurso, de modo 
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que as ciências humanas voltam‑se para o homem como produtor de textos/discursos. O homem é 
posto em evidência através dos textos e se constitui enquanto objeto de estudos por meio dos textos. 
Esse aspecto, inclusive distingue as ciências humanas das ciências exatas que tratam o homem fora do 
texto. E como ao próprio olhar de F. Saussure, “o ponto de vista cria o objeto”, cada ciência humana trata 
de um objeto textual diferente já que cada uma lança sobre o texto um olhar específico.
Ao tratar, em seus escritos, do texto como objeto das ciências humanas, 
Bakhtin aponta já as duas diferentes concepções do princípio dialógico, a do 
diálogo entre interlocutores e a do diálogo entre discursos, pois considera 
que nas ciências humanas o objeto e o método são dialógicos (BARROS, 
1997, p. 28).
De acordo com Bakhtin (2009), o texto se define como:
a. objeto significante – o texto significa;
b. produto da criação ideológica (da enunciação) – contexto histórico, social, cultural etc.;
c. funcionamento constitutivamente dialógico, consequente das duas características anteriores 
– define‑se pelo diálogo entre interlocutores e com outros discursos/textos;
d. materialidade única, não repetível – o arranjo de sua textura é singular (de cada um dos textos 
produzidos).
 Lembrete
O texto não existe fora da sociedade e não pode ser reduzido à sua 
materialidade linguística (empirismo objetivista), nem diluído no estado 
psíquico dos seus interlocutores, falante/ouvinte – autor/leitor, (empirismo 
subjetivista).
Veja que a linguística, entretanto, por fazer abstrações de suas formas de organização e de suas 
funções sociais, ideológicas, por fazê‑lo ainda o seu objeto de análise, torna‑o sistematicamente, 
teoricamente repetível enquanto objeto. Nesse sentido, seria então a linguística essencialmente uma 
ciência humana? Pergunta Barros (1997) diantedas reflexões propostas por Bakhtin. A autora busca 
resposta para sua pergunta no próprio Bakhtin.
Em relação ao método, nas ciências humanas, Bakhtin sustenta que se trata da compreensão 
respondente:
• nas ciências naturais – o método busca um objeto;
• nas ciências humanas – o método busca um sujeito produtor de textos.
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As ciências exatas são uma forma monológica do conhecimento: o intelecto 
contempla uma coisa e pronuncia‑se sobre ela. Há um único sujeito: aquele 
que pratica o ato de cognição (de contemplação) e fala (pronuncia‑se). 
Diante dele, há a coisa muda. Qualquer objeto do conhecimento (incluindo 
o homem) pode ser percebido e conhecido a título de coisa. Mas o sujeito 
como tal não pode ser percebido e estudado a título de coisa porque, como 
sujeito, não pode, permanecendo sujeito, ficar mudo; consequentemente, o 
conhecimento que se tem dele só pode ser dialógico (BAKHTIN, 1992, p. 403, 
apud BARROS 1997, p. 29).
Para Bakhtin, as relações entre o sujeito da cognição (interpreta e compreende) e o sujeito das 
ciências humanas (conhece um objeto) são de comunicação entre destinador e destinatário.
As reflexões de Bakhtin sobre as ciências humanas e a linguagem indicam já 
algumas das razões que o tornaram precursor e antecipador dos estudos do 
discurso. Seu ponto de partida, seu gesto inicial na concepção da própria ciência 
é o de colocar o texto como fulcro, como lugar central de toda investigação sobre 
o homem. Ainda hoje, muitos dos estudiosos da linguagem têm dificuldade em 
aceitar isso, em reconhecer o papel do texto (BARROS, 1997, p. 30).
Veja agora, conforme apresenta Barros, alguns conceitos baseados no princípio dialógico, teorizados 
por Bakhtin (e por outros autores a partir de seu legado) que são de alto valor para os estudos do texto 
e do discurso.
O primeiro que colocamos em destaque é o conceito de dialogismo. Como já foi enfatizado, a 
concepção de linguagem defendida por Bakhtin é essencialmente dialógica. Se a ciência humana reúne 
método e objeto dialógicos, suas ideias sobre o homem e suas práticas são definidas pelo dialogismo. 
Conforme Bakhtin, a alteridade (heterogeneidade) define o ser humano, pois o outro é imprescindível 
para a sua constituição. É impossível pensar o homem – e, portanto, o sujeito – fora das relações que o 
vinculam ao outro. Para Bakhtin, a vida é dialógica por natureza.
É nesse panorama que tomam forma as concepções dialógicas da linguagem e do discurso que 
mais de perto interessam aos estudos do texto e do discurso. Por essa via, duas noções de dialogismo 
revelam‑se para nossos estudos: o diálogo entre interlocutores e o diálogo entre discursos.
O diálogo entre interlocutores ingressa no campo dos estudos sobre a interação verbal entre sujeitos 
e sobre a intersubjetividade. Sobre o dialogismo entre interlocutores, assegura Barros, quatro aspectos 
devem ser destacados (BARROS, 1997, 30‑31):
a. a interação entre os interlocutores é o princípio fundante da linguagem – não só a linguagem é 
essencial para a comunicação, mas a interação entre os interlocutores funda a linguagem;
b. a significação das palavras, o sentido do texto dependem da relação entre os sujeitos, pois se 
constroem na produção e interpretação dos textos;
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c. a intersubjetividade precede à subjetividade, já que a relação entre os interlocutores funda a linguagem 
e dá sentido ao texto, construindo os próprios sujeitos enredados no próprio texto que produzem;
d. as observações feitas podem conduzir a conclusões precipitadas sobre a noção de sujeito defendida 
por Bakhtin, considerando‑a “individualista” ou “subjetivista”. Na realidade, ele enxerga dois tipos 
de sociabilidade: a relação entre os sujeitos (interlocutores em interação) e a destes sujeitos com 
a sociedade que os abriga.
Considerando a natureza deste dialogismo interacional, reconhece‑se a contribuição de Bakhtin aos 
estudos do discurso, da comunicação e da interação verbal, entre os quais estão assinalados:
• a variação linguística, funcional, discursiva;
• a reversibilidade discursiva (e intersubjetiva);
• a construção dos interlocutores no diálogo;
• o jogo de imagens;
• os simulacros e as avaliações entre eles;
• a questão da competência dos sujeitos da comunicação.
Conforme enfatiza Barros, os estudos da comunicação verbal não nasceram no seio da linguística 
puramente ou das teorias do discurso, mas trilharam um percurso aberto pela teoria da informação. 
Considere‑se que estes esquemas apresentavam furos que nunca cobriam suficientemente o 
funcionamento da comunicação.
Entenda que a concepção bakhtiniana de comunicação é bastante diferente de como a teoria da 
informação a concebe e (mesmo sendo‑lhe anterior), antecipa‑lhe algumas soluções para os seus 
principais problemas que acabaram servindo de escopo às críticas levantadas para comunicação verbal 
por outros autores em seu tempo.
 Observação
A teoria da informação nos anos 50 influencia a linguística – vejam‑se 
os esquemas de comunicação, de Karl Buhler a Jakobson, que incluíam 
funções da linguagem (poética, fática, metalinguística, referencial etc.) e 
elementos chave nesse esquema (mensagem, emissor, destinatário).
Com base nas críticas já levantadas por Bakhtin, três são as principais objeções que se estabelecem no 
que se refere aos esquemas de comunicação mencionados. Seguem junto a elas as reflexões bakhtinianas 
que ajudaram a elucidar e resolver estes problemas para tantas teorias:
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a) simplificação excessiva da comunicação linguística – sistematização de códigos e 
subcódigos, bem como restrição das funções da linguagem, reduzindo‑as à função 
informativa/referencial.
Bakhtin insiste na variação discursiva, funcional e linguística, bem como na heterologia e 
pluridiscursividade da linguagem – diversidade de vozes, das línguas e dos tipos discursivos. Nesse 
aspecto, não se pode ocultar a tentativa de Jakobson (e outros autores) em melhorar os esquemas de 
comunicação, tornando‑os mais próximos às diferentes funções da linguagem (a função poética, por 
exemplo!).
b) modelo linear dos esquemas, que se ocupa apenas ou de preferência com o plano da 
expressão.
Bakhtin vai mais longe nessa questão, já que considera a interação como a realidade 
fundamental da linguagem. Não deve mais ser pensada como via de mão única, do emissor 
para o receptor, mas como um sistema reversível e interacional. Aqui também se colocam os 
simulacros intersubjetivos e a avaliação na relação entre os interlocutores. Nesse ponto, há uma 
grande proximidade com as contribuições de M. Pêcheux sobre os jogos de imagem entre os 
sujeitos no discurso.
c) caráter por demais mecanicista.
Bakhtin buscou encaminhar a abordagem da interação verbal para uma proposta mais “humanizante”, 
mais “sociologizante”, melhor dizendo. É aqui que também se releva a contribuição bakhtiniana sobre o 
diálogo entre discursos.
O diálogo entre discursos – aqui se pontuam questões de discurso e enunciação, discurso e contexto 
histórico, discurso e ideologia, bem como as noções de intertextualidade, interdiscursividade, polifonia 
e heterogeneidade discursiva.
 Lembrete
O dialogismo é o princípio constitutivo da linguagem e é a condição do 
sentido se efetivar no discurso.
Nessa perspectiva, o discurso não é individual nas duas acepções de dialogismo mencionadas:
• Não é individual, pois se constrói entre dois interlocutores, pelo menos (que por sua vez, 
são seres sociais).• Não é individual, pois se constrói como um diálogo entre discursos, mantendo relações 
com outros discursos paralelos ou anteriores.
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ANÁLISE DO DISCURSO
Por essa ótica, conforme reporta Barros, o texto é tido em Bakhtin tanto do ponto de vista de sua 
constituição interna como externa, sendo considerado assim como um objeto completo para os estudos 
e métodos linguístico‑discursivo‑social e histórico.
Três pontos devem ser esclarecidos: em primeiro lugar é preciso 
observar que as relações do discurso com a enunciação, com o 
contexto sócio‑histórico ou com o “outro” são, para Bakhtin, relações 
entre discursos‑enunciados; o segundo esclarecimento é o de que o 
dialogismo tal como foi acima concebido define o texto como “tecido de 
muitas vozes”, ou de muitos textos ou discursos, que se entrecruzam, se 
completam, respondem umas às outras ou polemizam entre si no interior 
do texto; a terceira e última observação é sobre o caráter ideológico 
dos discursos assim definidos. Com essa concepção de dialogismo 
aproximamo‑nos não mais dos estudos da comunicação verbal, mas 
principalmente das teorias pragmáticas, das teorias do discurso e do 
texto e até de preocupações psicanalíticas como o “outro” do discurso. 
(BARROS, 1997, p.34).
7.2 Enunciação sob a ótica de Benveniste
Você verá que tão importante como a ótica de Bakhtin (2009) sobre a enunciação, é o ponto de 
vista de Benveniste (1974/1989) que será de fundamental importância quanto ao conjunto de teorias 
a serem percorridas nesta reflexão. Emile Benveniste (1989), apesar de preso à tradição estruturalista 
e de apostar na unicidade do sujeito locutor, contribuiu para a difusão e importância dos estudos 
enunciativos, destacando‑se por considerar que na enunciação a subjetividade da/na linguagem se 
funde na ação do próprio ato de linguagem, sendo este individual, mas que convoca o “outro/tu” para 
dentro da enunciação.
Cada enunciação é um ato que serve o propósito direto de unir o ouvinte 
ao locutor por algum laço de sentimento, social ou de outro tipo. Uma 
vez mais, a linguagem, nesta função, manifesta‑se‑nos, não como um 
instrumento de reflexão, mas como um modo de ação (BENVENISTE, 
1974/1989, p. 90).
Esse autor afirma que a enunciação coloca em funcionamento a língua por um ato individual de 
utilização, por parte de um locutor que mobiliza a língua por sua conta: é o ato mesmo de produzir um 
enunciado. A enunciação se caracteriza pela realização vocal da língua, supõe a conversão individual 
da língua em discurso (a semantização da língua) e apresenta caracteres formais próprios a partir da 
manifestação individual que ela atualiza.
Entenda que tal mobilização e apropriação da língua são, para o locutor, a obrigatoriedade de referir 
pelo discurso e para o outro: “a referência é parte integrante da enunciação”. (BENVENISTE, 1989, p. 90). 
A emergência dos índices de pessoa (EU/TU) só se produz por meio da enunciação. Como diz o autor, o 
presente é propriamente a origem do tempo.
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 Observação
A enunciação cria entidades na rede de indivíduos em relação ao 
“aqui‑agora” do locutor.
Emile Benveniste (1989) ao tratar a enunciação e seu aparelho formal, aponta primeiramente, 
como caráter introdutório, a preocupação em definir “emprego das formas na língua” como a origem 
(linguístico‑descritiva) da remissão do locutor no dizer. Benveniste (1989) buscou conduzir seu estudo 
aprofundando a investigação enunciativa sobre a apropriação da língua pelo locutor, colocando‑a em 
funcionamento por um ato individual.
Acerca do funcionamento enunciativo ressaltam‑se três aspectos importantes:
a) Realização vocal da língua, na qual, os sons emitidos procedem de atos individuais com 
relação à produção nativa e são interferidos pela diversidade das situações, nas quais a 
enunciação é produzida.
b) Semantização da língua, que conduz à teoria do signo e a análise da significância.
c) Os caracteres formais da enunciação, a apropriação da língua pelo locutor através da 
correferenciação e no consenso pragmático.
Segundo Benveniste (1989), a enunciação provém de um próprio ato individual de linguagem. Nesse 
ato individual se introduz o locutor, a língua e a enunciação, de modo que é na realização individual 
que a enunciação se define como um processo de apropriação, onde o locutor se “apodera” do aparelho 
formal da língua e enuncia de seu lugar de locutor. Segundo Benveniste (1989), o locutor assume a 
língua, na qual este implanta “o outro” diante de si.
Podemos compreender então que a situação de toda a enunciação é uma alocução que postula um 
alocutário, ou seja:
A condição mesma dessa mobilização e dessa apropriação da língua é, para o 
locutor, a necessidade de correferir identicamente, no consenso pragmático 
que faz de cada locutor um colocutor. A referência é parte integrante da 
enunciação (BENVENISTE, 1989, p.84).
Benveniste destaca que a presença do locutor na enunciação de seu discurso como um centro de 
referência se dá uma vez que o locutor assume a língua na qual ele, ao implantar o outro diante de si, 
parte da condição de movimento e posse da língua, resultando na necessidade da correferenciação para 
que se constitua um colocutor.
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ANÁLISE DO DISCURSO
Segundo a ótica de Benveniste, a linguística considera que a relação discursiva da enunciação dá‑se 
com os receptores reais ou imaginários, individuais ou coletivos, baseando‑se no quadro figurativo da 
enunciação, uma vez que ela pode ser encarada como:
I. enunciação como interrogação, a qual é constituída para promover resposta;
II. enunciação como intimação, a qual procede claramente ordem, asserção 
que visa comunicar uma certeza, podendo ser denominada como quadro 
figurativo da enunciação (BENVENISTE, 1989, p. 85).
Ainda sobre essas considerações, Benveniste trata como um caso de “monólogo” aquilo que define como 
um diálogo feito de linguagem interior entre um locutor e um ouvinte, no qual acontece a predominância do 
eu‑locutor, e posteriormente do eu‑ouvinte. Ou seja, um diálogo interiorizado, em que, segundo Benveniste 
(1989), é necessário invocar a frequência e a utilidade prática da comunicação entre os indivíduos para então 
ter a noção de diálogo e originar diversas variedades. Dentro da perspectiva linguística:
Cada enunciação é um ato que serve o propósito direto de unir o ouvinte 
ao locutor por algum laço de sentimento, social ou de outro tipo. Uma vez 
mais, a linguagem, nesta função, manifesta‑se não como um instrumento 
de reflexão, mas como um modo de ação (MALINOWSKI, apud BENVENISTE, 
1989, p.89‑90).
Quanto ao que se refere à subjetividade na linguagem, Benveniste se defronta com dilemas das 
considerações semióticas e semânticas, nos quais se entrelaçam o locutor e a língua, definindo a 
subjetividade na linguagem como uma condição da mobilização e da apropriação que o locutor faz 
da língua ao utilizá‑la. Benveniste considera fundamental a presença de locutores para elaboração 
integrante da enunciação, sendo estes locutores destacados por uma temporalidade que se faz como 
um quadro inato do pensamento, o que pode ser compreendido mais explicitamente em seu trabalho, 
“O aparelho formal da enunciação”:
O presente formal não faz sentido se não explicitar o presente inerente à 
enunciação, que se renova a cada produção de discurso, e a partir deste 
presente contínuo, coextensivo a nossa própria presença, imprime na 
consciência o sentimento de uma continuidade que denominam “tempo”; 
continuidade e temporalidadeque se engendram no presente incessante 
da enunciação, que é o presente do próprio ser e que se delimita, por 
referência interna, entre o que vai se tornar presente e o que já não o é mais 
(BENVENISTE, 1989, p.85‑86).
7.3 Enunciação sob a ótica de Ducrot
Ainda dentro da perspectiva dos estudos enunciativos, Ducrot (1987), elabora o Esboço de uma 
Teoria Polifônica da Enunciação, partindo da influência de Bakhtin (2009), acerca do dialogismo e da 
polifonia da linguagem (categorizados por Bakhtin principalmente em textos literários). Nos textos há 
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várias vozes que falam ao mesmo tempo sem uma desvencilhar‑se das outras. Para Ducrot, o mesmo 
que acontece na literatura popular, carnavalesca, analisada sob a perspectiva dialógica e polifônica de 
Bakhtin, acontece de modo generalizado na linguagem, a partir do princípio de que, em cada ato de 
enunciação, se apresenta um autor/locutor que agrega para si várias vozes implícitas distintas, ocultas 
no engendramento linguístico, mas que convocam as enunciações e enunciadores anteriores.
Compreenda que os estudos de Ducrot (1987) na perspectiva da semântica enunciativa/argumentativa, 
ponderam a existência de uma cadeia de vozes que compõe, de forma implícita, a enunciação, contestando 
assim o pressuposto da unicidade do sujeito falante, que Benveniste (1989) considera, sustentando que 
cada enunciado possui, um e somente um autor (DUCROT, 1987, p.161).
Podemos então notar que a teoria contestadora em relação à unicidade do sujeito é uma das fontes 
da ampliação/evolução dos estudos enunciativos, uma vez que o acontecimento enunciativo‑discursivo 
efetiva‑se através de diferentes gêneros textuais e discursivos, configurando a voz do outro em uma 
rede polifônica.
Ducrot (1987) também reflete sobre o estilo indireto livre e ressalta que este não se aplica a enunciados 
isolados, voltando‑se novamente à teoria bakhtiniana, em relação à literatura, a qual Bakhtin (2009) intitula 
como uma disciplina “pragmático‑semântica” ou “pragmático‑linguística”. Essa visão está vinculada ao 
pressuposto da ação humana em sua totalidade, destacando como objeto de estudo o uso da linguagem, 
que acaba por ordenar a razão de certas palavras em determinadas ocasiões serem constituídas de eficácia: 
os atos de fala performativos, por exemplo, um padre, durante a cerimônia de casamento, enuncia: “eu vos 
declaro marido e mulher” e assim o sujeito que entrou solteiro na igreja, sai dela casado.
Ducrot se preocupa com o uso linguístico do ato de fala a partir do próprio enunciado, ou seja, como aparecem 
os efeitos da enunciação, considerando que para que isso aconteça de forma teoricamente sustentável, faz‑se 
necessário explicitar a diferença entre enunciado e frase, através de uma teoria polifônica.
Ducrot (1987) define frase como o objeto teórico pertencente não ao linguista e sim, em especifico, 
à gramática, enquanto o enunciado para ele é a ocorrência de uma frase em diferentes ocasiões, 
podendo‑se considerar que uma mesma frase pode ser manifestada por uma única pessoa em 
circunstâncias distintas e também por duas pessoas diferentes. Daí é possível compreender a existência 
de duas ocorrências de uma mesma frase, enquanto, estrutura lexical e sintática (supostamente 
subjacente), já que no discurso podem ser consideradas como uma ocorrência contínua de enunciados. 
Desse modo, é possível compreender os efeitos de sentido reais da situação enunciativa, ou seja, uma 
hipótese interna que permite a explicação, concluindo que o enunciado é parte da enunciação.
Os provérbios, por exemplo, são enunciados que podem circular em diferentes enunciações e, 
portanto, ditos por enunciadores diferentes que produzem sentidos diferentes. Imagine o enunciado 
proverbial “Quem não chora não mama” dito por diferentes locutores:
• uma criança com fome;
• um aluno “cavando” nota com o professor;
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• um mendigo pedindo dinheiro na rua;
• uma empregada requerendo aumento de salário;
• um funcionário querendo sair mais cedo do trabalho etc.
Ainda referente à distinção de frase e enunciado, Ducrot (1987) destaca que a Enunciação pode ser 
compreendida em três aspectos:
I. a enunciação como atividade psicofisiológica, ou seja, as influências sociais;
II. a enunciação como um segmento de discurso, isto é, o enunciado;
III. a enunciação como aparecimento momentâneo de um enunciado, aparecimento esse 
que constatamos Ducrot (1987) designar como um acontecimento histórico, podendo 
entendê‑lo como algo que passa a existir a partir do momento em que acontece.
O que nos leva a compreender que a enunciação refere‑se ao aparecimento de um enunciado.
Ducrot (1987) ressalta que não é possível afirmar a definição oposta de frase e enunciado com a 
distinção de enunciação, sem antes explicitar a diferença entre a “significação” e o “sentido”. Conforme 
a teoria polifônica, a significação está para a frase, assim como o sentido está para a caracterização 
semântica do enunciado, pois conforme a concepção polifônica, entende‑se que a significação pode 
ser o “algo” que o sujeito falante procura transmitir em uma construção que ocorre em uma situação 
de discurso. Enquanto o sentido é compreendido como um conjunto de indicações sobre a enunciação, 
ou seja, podemos considerar o sentido ser o “algo” ou alguma coisa que se comunica ao interlocutor, 
reconhecendo o fato de que o sujeito falante realiza o ato para transmitir um saber ao interlocutor, 
levando‑se em consideração que o(s) sentido(s) em um enunciado é/são passível(is) de interpretação(ões), 
sendo, portanto, denominado(s) como descrição(ões) pragmática(s).
 Lembrete
Ducrot critica o postulado da “unicidade do sujeito na enunciação”, que 
defende a existência de um único autor/sujeito responsável pelo que é dito 
no enunciado.
Aprofundemos, então, a definição de “sujeito”, por Ducrot (1987), em suas propriedades categoriais 
específicas:
a. Sujeito dotado de toda atividade psicofisiológica, ou seja, formação de julgamentos, escolha de 
palavras e utilização gramatical.
b. Sujeito tomado como autor do enunciado, aquele que ordena, pergunta, afirma etc.
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c. Sujeito definido através da designação que recebe pelas marcas de primeira pessoa, isto é, quando 
o sujeito é EU, aquele que produz o enunciado (concepção do discurso relatado direto). Em 
relação ao termo “sujeito” definido por Ducrot (1987) é possível constatarmos duas distinções de 
personagens: locutor e enunciador:
a. Locutor (L): o ser responsável pela enunciação, (referente ao pronome eu como marca de primeira 
pessoa), embora um único enunciado possa apresentar dois locutores distintos evidenciados 
pela marca de primeira pessoa, como por exemplo: “João me disse: eu virei”.
b. Enunciador (E): é o sujeito dos atos ilocutórios fundamentais, como na afirmação, recusa, 
pergunta, incitação, exclamação, ou seja, enunciador é o sujeito ao qual é atribuído os diversos 
pontos de vista que se dão pelas palavras.
Aplicando essa tese de vários sujeitos em textos literários, Ducrot (1987) ressalta: “direi que o 
enunciador está para o locutor assim como a personagem está para o autor” (DUCROT, 1987, p. 192).
Em síntese, Ducrot desenvolve mais sistematicamente a teoria polifônica da enunciação, sendo este 
passo significativo no sentido de romper com a unicidade do sujeito falante. Ele conduz uma reflexão 
crítica sobre a postura tradicional de algumas linhas teóricas da linguística que concebem a linguagem 
comomonológica e o sujeito como unicentrado. Conforme Ducrot (1987), sua teoria polifônica da 
linguagem desconstrói o postulado teórico acerca do sujeito unicentrado. Ele estabelece a distinção 
entre os conceitos de frase (objeto teórico) e enunciado (fato empírico observável no mundo). A 
descrição do conceito de enunciação tem três acepções:
• Enunciação – atividade.
• Enunciação – produto.
• Enunciação – acontecimento.
É com a última concepção (mais completa) que Ducrot se coaduna em sua teoria. Dentro dessa 
perspectiva, conforme o autor, sobre os conceitos de sentido e significado, o sentido diz respeito à 
enunciação e o significado diz respeito à frase. Na enunciação, o sentido tem natureza instrucional a 
partir das “variáveis argumentativas”.
Note que a concepção polifônica do sentido mostra como o enunciado assinala, em sua enunciação, 
a sobreposição de diferentes vozes. Para Ducrot, tal qual uma cena de teatro em que se configuram 
diferentes personagens que dialogam entre si, há uma apresentação de diferentes vozes, de vários pontos 
de vista, e o locutor tem como função provocar seu aparecimento e mostrá‑los dentro do enunciado: a 
estes diferentes pontos de vista o autor vai chamar de enunciadores. Ducrot (1988) aponta três diferentes 
funções enunciativas para melhor identificar a multiplicidade de vozes presentes na enunciação:
• O sujeito empírico – SE: que é o autor efetivo, agente da reprodução de discursos já escutados 
ou lidos. O ser empírico que preenche o lugar de sujeito.
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• O locutor – L: que é o responsável presumido pelo enunciado a quem se atribui a responsabilidade 
pelo mesmo, responsável, inclusive pelo ato praticado e não pelo conteúdo proposicional. (marcas 
em primeira pessoa);
• O locutor – Lp: que é o locutor‑enquanto‑pessoa‑no‑mundo, aquele que serve de suporte para 
determinadas predicações;
• Os enunciadores – E1, E2,...: que são os vários pontos de vista que podem ser percebidos em um 
mesmo enunciado.
Apagada a mediação do sujeito empírico na enunciação, as figuras enunciativas (SE, L, E1, E2...) 
dão lugar à multiplicidade de sujeitos. Dessa forma, podemos compreender que os tipos de locutor 
exemplificados acima acabam por evidenciar a primeira forma de polifonia, uma vez que prova a 
existência de mais de um sujeito no enunciado.
Pense, a título de ilustração, no funcionamento enunciativo da ironia: através da definição de 
enunciador e locutor poderíamos entender a origem da ironia como uma forma de antítese em que, 
de maneira esquematizada dir‑se‑ia A para levar a entender não A. Mas para Ducrot (1987), a ironia 
trata‑se do locutor “fazer ouvir” um discurso, porém fazer ouvir este como um discurso sustentável do 
outro. Consideramos então o fenômeno linguístico da ironia como mais uma forma de se evidenciar 
a existência da polifonia na enunciação, uma vez que se dá de forma implícita a voz do outro no 
enunciado de um locutor, pois, segundo Ducrot,
Assumindo a responsabilidade de um conteúdo, não se assume a 
responsabilidade da asserção deste conteúdo, não se faz desta asserção o fim 
pretendido de sua própria fala, (o que implica a impossibilidade, definidora, 
para mim, da pressuposição, de encadear com os pressupostos) (DUCROT, 
1987, p. 218).
Feitas todas estas reflexões, correlacionaremos a elas as contribuições Guimarães (2002) que 
redefinem e ampliam o fenômeno da enunciação, no seio da semântica do acontecimento. Para 
Guimarães, a Teoria Polifônica da Enunciação sustenta de forma significativa a existência de 
vários sujeitos em um mesmo enunciado. Ele discorda da linguística estrutural que considera 
a existência da unicidade do sujeito, simplificando a enunciação como um elemento reduzido da 
língua e desconsiderando a pluralidade de sujeitos no enunciado, a pressuposição e outros fatores 
determinantes no funcionamento enunciativo.
7.4 Enunciação sob a ótica de Guimarães
Você acompanhou as concepções de enunciação sustentadas pelos já comentados autores, Bakhtin 
(2009), Benveniste (1989) e Ducrot (1987), que são reconhecidamente grandes responsáveis pela 
evolução dos estudos da teoria enunciativa, uma vez que proporcionaram (cada um a sua maneira) a 
possibilidade de observarmos a teoria da enunciação sob várias óticas, consequentemente, tornando‑a 
um aspecto decisivo para a investigação da linguagem na perspectiva do discurso.
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Sendo a teoria da enunciação reconhecida através de vários pontos de vista, ela se fará presente 
nos estudos de Guimarães (2002) de maneira redefinida e ampliada em sua teoria da semântica do 
acontecimento.
 Observação
Esta área de estudo caminha em total compatibilidade com os 
pressupostos da análise do discurso francesa.
Segundo Guimarães (2002), na sua semântica do acontecimento, a linguagem é conceituada a partir 
de sua relação com o real (a linguagem fala de algo), e “não há como pensar uma semântica linguística 
sem levar em conta que o que se diz é incontornavelmente construído na linguagem” (GUIMARÃES, 
2002, p.7). Sendo assim, a linguagem é considerada como histórica ao falar de algo que é constituído 
na própria linguagem em si. A semântica do acontecimento pode ser compreendida como o lugar de 
observação do sentido – o enunciado –, isto é, do acontecimento do dizer.
Enquanto Benveniste (1966) define o sentido da unidade linguística como sendo fruto de um 
movimento integrativo – que dá o sentido da unidade na relação da parte (elemento) com o todo 
(enunciado) – sem ir além do enunciado, ao contrário, Guimarães (2002) afirma a passagem do enunciado 
para o texto (enunciação) ou ainda para o acontecimento enunciativo fora da segmentalidade, ou seja: 
“Não há como considerar que uma forma funciona em um enunciado, sem considerar que ela funciona 
num texto, e em que medida ela é constitutiva do sentido do texto” (GUIMARÃES, 2002, p. 7).
Em relação ao conceito de enunciação, a semântica do acontecimento a define como um espaço 
possível de uma formação histórica do sentido, partindo da perspectiva de que se trata de um 
acontecimento de linguagem, em que se estabelece a relação do sujeito com a língua. Ao contrário de 
Benveniste (1970), que afirma que a enunciação é a língua funcionando através do locutor e ao contrário 
também de Ducrot (1984), que conceitua a enunciação como o aparecimento de um enunciado.
Partindo da afirmação de que a enunciação trata‑se de um acontecimento de linguagem, este 
acontecimento pode ser compreendido, segundo a semântica do acontecimento, a partir da língua e do 
sujeito que se relacionam pelo funcionamento da língua toda vez que algo é enunciado. Considere‑se 
que o sujeito é um ser afetado pelo simbólico e inserido num mundo constituído através do simbólico.
O acontecimento, segundo Guimarães (2002), não se trata de um fato no tempo, ele temporaliza, 
ou seja, coloca sua própria temporalidade. Ao contrário de Benveniste (1974), Guimarães considera que 
não é o sujeito quem temporaliza e sim o acontecimento que é constituído pela temporalidade e toma 
o sujeito. A temporalidade se forma a partir de uma futuridade, considerando que a teoria afirma que o 
futuro é próprio do acontecimento, desta forma, compreende‑se o fato do acontecimento de linguagem 
projetar em si um futuro.
Portanto, é possível a compreensão de que não há acontecimento de linguagem sem uma futuridade, 
uma vez que, sem esta nada é interpretável, pois a futuridade existe no acontecimento devido à 
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existênciada memória enunciativa (um passado) que promove o significar, ou seja, ao mesmo tempo 
em que é próprio da temporalidade o futuro, esta possui também uma rememoração de enunciações 
que pode ser considerada como uma nova temporalização, assim como a futuridade, que, dessa forma, 
constitui o presente proporcionando o espaço dos sentidos, ou seja: “O acontecimento é sempre uma 
nova temporalização, um novo espaço de conviviabilidade de tempos, sem a qual não há sentido, não 
há acontecimento de linguagem, não há enunciação” (GUIMARÃES, 2002, p. 12).
A teoria da semântica do acontecimento considera que o locutor se divide no acontecimento por 
enunciar enquanto sujeito. Para a análise de discurso de linha francesa, sujeito é aquele que enuncia na 
região do interdiscurso, memória de sentidos que é estruturada pelo esquecimento. Porém, Guimarães 
(2002) ressalta que é importante não confundir o conceito que cada uma das teorias atribui ao elemento 
sujeito, pois cada qual o conceitua a partir de realidades teóricas distintas, como interdiscurso (conceito 
utilizado pela AD), e acontecimento, compreendido como o espaço de temporalização, rememoração 
fragmentada de enunciações tidas como passado, na perspectiva da semântica do acontecimento.
Esta caracterização da temporalidade do acontecimento não coincide, 
portanto, com o tempo do ego que diz eu, que chamo aqui locutor. A 
configuração do Locutor no acontecimento é a origem do dizer e assim da 
temporalidade. Diria que Benveniste limitou‑se a tratar desta representação. 
Deste modo a temporalidade do acontecimento da enunciação traz sempre 
esta disparidade temporal entre o tempo do acontecimento e a representação 
da temporalidade pelo Locutor. Esta disparidade significa diretamente a 
inacessibilidade do Locutor àquilo que enuncia. O Locutor não está onde 
a enunciação significa sua unidade (tempo do Locutor). Assim o Locutor 
está dividido no acontecimento. E está dividido porque falar, enunciar, 
pelo funcionamento da língua no acontecimento, é falar enquanto sujeito. 
Para caracterizar este aspecto recorro, neste ponto, à posição da análise 
do discurso para a qual o sujeito que enuncia é sujeito porque fala de uma 
região do interdiscurso, entendendo‑se este como uma memória de sentidos. 
Memória que se estrutura pelo esquecimento de que já significa (ORLANDI, 
1999). Ser sujeito de seu dizer, ser sujeito, é falar de uma posição do sujeito. 
(GUIMARÃES, 2002, p.14).
Observe que em relação à redefinição da teoria enunciativa e seus conceitos, é notória a distinção 
que Guimarães (2002) expõe em comparação com Ducrot (1987) ao conceituar “sujeito”. Enquanto 
Ducrot considera sujeito como uma figura psicofisiológica, não sendo um personagem da enunciação, 
Guimarães o redefine como sendo uma figura política constituída pelos espaços da enunciação que é 
incluída entre as demais figuras existentes da enunciação.
Você deve entender como espaço de enunciação o funcionamento das línguas que são “habitadas” 
por falantes que se dividem entre os direitos e os modos de dizer. Assim se ressalta que esses espaços de 
enunciação são constituídos pela contradição de uma normatividade com suas rupturas, ou seja, trata‑se 
de um espaço político que é dividido em formas desiguais que disputam a palavra no acontecimento 
de linguagem.
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É válido ressaltar que o espaço da enunciação é concebido como crucial na conceituação da 
enunciação, sendo esta uma prática política e não individual/subjetiva, uma vez que a semântica do 
acontecimento considera que esse espaço enunciativo se divide entre línguas e falantes, conforme 
Guimarães: “enunciar é estar na língua em funcionamento. E a língua não funciona no tempo, mas pelas 
relações semiológicas que tem. A língua funciona no acontecimento, pelo acontecimento, e não pela 
assunção de um indivíduo” (GUIMARÃES, 2002, p. 22).
Referente à disputa da palavra, podemos compreender que a teoria da semântica enunciativa considera 
que ela se dá em cenas enunciativas, que são modos próprios de ingressar a palavra nas relações entre 
figuras da enunciação e as formas linguísticas, ou seja, cenas enunciativas: “São lugares constituídos pelos 
dizeres e não pessoas donas de seu dizer. Assim, estudá‑la é necessariamente considerar o próprio modo 
de constituição desses lugares pelo funcionamento da língua” (GUIMARÃES, 2002, p.23).
Observe que adotar a palavra é colocar‑se no lugar de quem enuncia, ou seja, o lugar do locutor que 
pode ser definido como o responsável pela enunciação, ele representa o “eu” na enunciação em que ocorre 
o enunciado. Já o alocutário é representado pelo “tu” no discurso a partir do próprio locutor, ainda podemos 
diferenciar, com base em Guimarães (1987), os dois papéis de locutor: L que é a fonte do dizer e o Lp que é 
o locutor enquanto‑pessoa‑no‑mundo, este deve ser caracterizado socialmente e historicamente.
Portanto, podemos compreender que a teoria da semântica do acontecimento estuda a enunciação 
formatando sua temporalidade entre línguas e falantes, dentro de um espaço denominado espaço da 
enunciação, de modo a considerar que o sentido das expressões linguísticas não refere a verdade, mas o 
significado do/no enunciado que se dá através do acontecimento enunciativo em que funciona.
Em síntese, Guimarães, assim como Ducrot, distancia‑se da visão de Benveniste, que concebe a 
enunciação como uma atividade do locutor em produzir um enunciado e que considera o sujeito da 
enunciação como uno, único e onipotente em relação ao seu próprio dizer e à língua da qual esse 
sujeito se apropria para dizer algo. Ele mantém que no enunciado há a representação de diferentes 
papéis do locutor. “As personagens se constroem à medida que se representam uma diante da outra” 
(GUIMARÃES, 2002, p. 21). O autor explicita que a dupla falante/ouvinte apenas caracteriza os agentes 
físico‑fisiológicos de falar e ouvir, de modo que não dizem respeito ao linguístico e, portanto, não se 
incluem como objeto da semântica. Entretanto, as figuras/personagens da enunciação linguisticamente 
consideradas são: locutor/alocutário e enunciador/destinatário.
O locutor é aquele que se representa como eu na enunciação, representando‑se, internamente 
ao discurso, como responsável pela enunciação em que ocorre o enunciado. O locutor é uma figura 
constituída internamente ao discurso e marcada no texto pelas formas do paradigma do eu. O alocutário 
é o tu do discurso, representado enquanto correlato do locutor pelo próprio locutor. Na representação 
do locutor, podemos distinguir dois papéis, L e Lp. O locutor L é aquele que simplesmente se representa 
como fonte do dizer. O locutor Lp é o locutor‑enquanto‑pessoa‑no‑mundo. O locutor‑enquanto‑pessoa
‑no‑mundo deve ser caracterizado sócio‑historicamente, e isso já se constitui em um deslocamento que 
o autor faz em relação a Ducrot, para quem o Lp é apenas mais uma figura representativa das funções 
enunciativas que ele descreve. Respectivamente ao locutor L, há o alocutário AL e, ao locutor‑enquanto
‑pessoa‑no‑mundo, há o alocutário‑enquanto‑pessoa (ALp) (GUIMARÃES, 2002, p. 22).
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Há ainda o nível da relação entre enunciador e destinatário para fechar o quadro polifônico da 
enunciação. O enunciador é a posição do sujeito que estabelece a perspectiva da enunciação. O 
destinatário é o correlato constituído segundo a perspectiva do enunciador. Suponhamos aqui que no 
meio de uma conversa alguém diga: “Água mole em pedra dura tanto bate até que fura”. Em tal enunciado 
representa‑se um L que fala da perspectiva do senso comum e que, inclusive, mobiliza essa perspectiva 
como argumentopara o que diz. Assim L, nesse caso, fala de uma perspectiva genérico‑coletiva, e esta 
enunciação representa um enunciador genérico‑coletivo.
 Saiba mais
Para aprofundar o olhar acerca das teorias enunciativas, você pode ler 
o texto,
O espaço na enunciação publicitária: do contexto social ao discursivo, 
dos autores Trindade, Eneus e Fabiano (2006).
Disponível on‑line no site: <http://www.portalaled.com/es/o‑espa%C3
%A7o‑na‑enuncia%C3%A7%C3%A3o‑publicit%C3%A1ria‑do‑contexto‑
social‑ao‑discursivo>, pertencente à página da Associação latino‑americana 
de estudos do discurso (ALED).
Ao contrário de Benveniste, Guimarães não exclui o enunciado proverbial do funcionamento 
enunciativo, nem dialógico, nem muito menos lhe sonega o locutor. Guimarães procura caracterizar 
uma cena enunciativa no texto, que cruza as representações da enunciação (L, Lp, E), e como essas 
representações relacionam‑se com as de alocutário e destinatário, representando a alteridade na 
enunciação. As categorias de análise mencionadas pelo autor são inspiradas na teoria polifônica da 
enunciação de Ducrot, mas ele enfatiza seu afastamento quanto ao apego à posição estruturalista 
manifestado por Ducrot. Para o autor, a enunciação constitui historicamente as regularidades da língua, 
que estão sempre abertas ao efeito do episódio enunciativo.
7.4.1 Análise: o fenômeno da ironia sob a ótica do acontecimento enunciativo
Após tantas discussões teóricas acerca da enunciação e do discurso, vamos fazer uma breve análise 
para visualizar as categorias principais da teoria enunciativa funcionando na linguagem. A análise 
que se segue busca evidenciar a efetivação do fenômeno linguístico da ironia através da polifonia 
não marcada linguisticamente num trecho do editorial do Jornal “O Estado de São Paulo”, datado de 
15/07/2008.
Se há um enunciado, irônico ou não, há necessariamente o responsável por seu acontecimento na 
linguagem, que se trata do locutor (o jornal, a instituição jornalística, o editor‑chefe), o qual se utiliza 
do fenômeno linguístico da ironia para deslocar o sentido literal no enunciado em destaque para criticar 
implicitamente a ação dos senadores. Vejamos o trecho:
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“Considerações sobre a Lei Seca” (O Estadão, terça‑feira, 15 de Julho de 2008):
“... A defesa dos cavalos como meio de transporte rendeu a nosso bravo viajante uma 
enxurrada de e‑mails, de diversos conteúdos. Houve desde quem o chamasse de doido varrido 
até uma série de manifestações de apoio de entidades de cavaleiros e simpatizantes em 
todo o País. De Lisboa, o ginete acidentado – e amigo de Mr. Miles – Sardenson Walterberg 
agradeceu a menção feita a ele na semana passada e informou que, apesar de ter‑se 
estatelado, não sofreu tanto, visto que foi amparado pelos hífens das muitas mesóclises 
espalhadas em terras lusitanas.”
O presente recorte enunciativo, como já foi dito, pertence ao editorial do jornal “O Estado de São 
Paulo” que aborda a Lei 11.705, que consiste na punição de condutores embriagados, posta em vigor em 
2008 que alterou o Código de Trânsito Brasileiro.
O assunto referido acima é problematizado através de e‑mails destinados a Mr. Miles, um dos 
homens mais viajados do mundo, que já esteve em 132 países e 7 territórios ultramarinos e é colunista 
e conselheiro editorial da revista Próxima Viagem. Estes e‑mails discorrem sobre as considerações feitas 
por seus remetentes sobre a hipótese do colunista não viajar mais ao Brasil devido à inserção da “Lei Seca” 
no país, uma vez que esta proíbe a circulação de condutores embriagados e desprovidos de reflexos.
Tais considerações geraram a resposta imediata de Mr. Miles na busca de esclarecer que não só é 
favorável a atual lei, como esta não influenciará sua vinda ao Brasil, justamente por julgar que leis 
escritas, enquanto generalizam, não distinguem a individualidade.
Através das considerações feitas sobre a “Lei Seca” por Mr. Miles e seus remetentes, torna‑se possível 
o acontecimento enunciativo da instituição jornalística, contido do fenômeno linguístico da ironia que 
desloca o sentido literal para os possíveis sentidos existentes de forma implícita, ou seja, a existência de 
várias vozes (polifonia) acarretando em diversos sentidos (polissemia).
Consideramos que a ironia é possível de se analisar no seguinte enunciado: “A defesa dos cavalos 
como meio de transporte rendeu a nosso bravo viajante uma enxurrada de e‑mails, de diversos 
conteúdos”, partindo da pressuposição que se faz notória no enunciado, podemos apontar os possíveis 
enunciadores, sendo:
• o primeiro enunciador é “Cavalos como meio de transporte”, ou seja, a troca de automóveis 
por cavalos como meio de transporte para a redução dos acidentes causados pela embriaguez de 
condutores;
• o segundo enunciador é “Falta de bom senso no trânsito”, uma vez que parte‑se da pressuposição 
de que condutores devem ser responsáveis, mas se alcoolizados, não possuem a responsabilidade 
ao dirigirem embriagados.
• o terceiro enunciador é “Cavalos como meio de transporte – uma forma de lograr a lei”, 
se refletirmos a possibilidade de que cavalos como meio de transporte podem dar continuidade 
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à embriaguez de condutores, uma vez que tal meio de transporte não causa risco a terceiros, 
porque são animais providos de reflexos e não máquinas conduzidas. Dessa forma é possível 
considerarmos que o fato de se ter cavalos como meio de transporte trata‑se de uma maneira de 
lograr a “Lei Seca”, justamente porque a lei escrita coíbe os condutores de dirigirem automóveis 
quando embriagados e não animais. Portanto, a defesa por cavalos no lugar de automóveis como 
meio de transporte permitirá que os condutores continuem a transitar embriagados.
Esse terceiro enunciador possibilita a efetivação da ironia como um acontecimento de linguagem no 
recorte enunciativo do editorial referido acima, pois desloca o sentido literal causando o(s) efeito(s) de 
sentido(s) pretendido(s) pelo locutor que enuncia pautando‑se na enunciação de outrem.
Dessa forma, para a constituição do fenômeno linguístico da ironia através da polifonia aplica‑se a 
análise pertinente à semântica enunciativa/argumentativa:
“A defesa dos cavalos como meio de transporte rendeu a nosso bravo viajante uma enxurrada de 
e‑mails, de diversos conteúdos”;
E¹: “Cavalos como meio de transporte”;
E²: “Falta de bom senso no trânsito”;
E³: “Cavalos como meio de transporte: uma forma de lograr a lei”.
É pertinente destacarmos que o locutor responsável pelo enunciado expõe suas considerações sobre a 
“Lei Seca”, pautando‑se no contexto presente no editorial, para defender o uso de cavalos como meio de 
transporte. Nota‑se no referente enunciado a existência de um locutor que se divide em sua própria posição, 
pois este pode ser compreendido como o próprio lugar do dizer que é estabilizado, demarcado socialmente (L), 
justamente por esse ser o jornal, lugar onde se dá o enunciado, parte de um todo. Esse mesmo locutor também 
ocupa a posição de “sujeito” enquanto‑pessoa‑no‑mundo (Lp), ao assumir‑se em determinada forma que o 
demarca social e historicamente através do funcionamento de um acontecimento na/pela linguagem.
 Saiba mais
Para aprofundar o olhar acerca do fenômeno da ironia observado do ponto 
de vista das teorias enunciativas, você pode ler o texto:
Polifonia, representação e humor: a ironia como mecanismo argumentativo 
nas paródias de MAD TV, do autor Jefferson Voss (2011).
RevLet – Revista Virtual de Letras, v. 03, nº 01, jan./jul, 2011
Disponível on‑line no site: <http://www.revlet.com.br/artigo/75>
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7.5 As teorias enunciativas e a AD
Contrastando as diferentes perspectivas enunciativas com a AD, você poderá notar que a análise 
de discurso francesa também considera esta categoria teórica em lugar especial. Quando analisamos 
um discurso, partimos da interpretação que se estabelece mais centralizadamente, mas sem deixar de 
ver outros lugares de interpretação possíveis, pois todo enunciado, ou toda sequência de enunciados é 
linguisticamente descritível como uma cadeia (léxico‑sintaticamente determinada) de pontos à deriva 
possíveis, que oferecem lugar à interpretação. A AD entende os conceitos de enunciação e enunciado, 
conforme sintetiza Ferreira (2001), da seguinte maneira:
Enunciação:
Processo de reformulação de um enunciado através do qual ele é posto em 
funcionamento, surgindo como uma de suas possíveis formas de atualização. 
Os processos de enunciação consistem em uma série de determinações 
sucessivas, pelas quais o enunciado se constitui pouco a pouco e que têm 
como característica colocar o “dito” e, em consequência, rejeitar o não‑dito 
(FERREIRA, 2001, p.14).
Enunciado:
Unidade constitutiva do discurso que nunca se repete da mesma maneira 
(ver paráfrase e polissemia), já que a sua função enunciativa muda de 
acordo com as condições de produção. É a partir dos enunciados, portanto, 
que podemos identificar as diferentes posições assumidas pelo sujeito no 
discurso (FERREIRA, 2001, p.14).
Outro par conceitual de grande importância na AD e que se compatibiliza com a posição teórica da 
semântica do acontecimento enunciativo (de Guimarães) é o par história/historicidade. Vejamos as 
definições para estes conceitos, a partir do que sintetiza Ferreira (2001):
História:
Produção de sentidos que se define por sua relação com a linguagem. A 
história organiza‑se a partir das relações com o poder e está ligada não à 
cronologia, mas às práticas sociais. Para a AD, todo o fato ou acontecimento 
histórico significa, precisa ser interpretado, e é pelo discurso que a história 
deixa de ser apenas evolução (FERREIRA, 2001, p.17).
Historicidade:
Modo como a história se inscreve no discurso, sendo a historicidade 
entendida como a relação constitutiva entre linguagem e história. Para o 
analista do discurso, não interessa o rastreamento de dados históricos em 
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um texto, mas a compreensão de como os sentidos são produzidos. A esse 
trabalho dos sentidos no texto e à inscrição da história na linguagem é que 
se dá o nome de historicidade (FERREIRA, 2001, p.17).
Veja que para a AD, a questão da enunciação pode ser recolocada (em termos diferentes dos de 
E. Benveniste) assim como a da interpretação. O discurso é dispersão de sentidos, porque é efeito de 
sentido entre sujeitos. Não existe no discurso univocidade de sentido, ou sentido literal, assim como não 
existe na língua e no sujeito do inconsciente, estruturado pela língua, a completude que se espera e se 
busca.
Conforme Orlandi (2007a), o discurso tomado como objeto de estudo na AD deve ser entendido como 
um processo que se dá sobre a língua, como base, na contingência de uma memória (interdiscurso) e 
de uma atualidade (o acontecimento, movimento da sua produção material). Ou, em outras palavras, o 
encontro de uma estrutura com o seu acontecimento – a língua e a organização estrutural‑ideológica 
do interdiscurso com o acontecimento enunciativo‑discursivo – desencadeador da ruptura/do novo, 
abertura para a evidência da falta, do lapso e do investimento ideológico do sujeito que se inscreve 
e se dispersa no discurso, enunciando e sendo enunciado, a partir do que já foi dito e colocando a 
possibilidade, sobre o mesmo, de outros dizeres.
Segundo Orlandi a AD articula o linguístico ao sócio‑histórico‑ideológico, pondo a linguagem na 
relação com os modos de produção social. Como já citamos anteriormente, “não há discurso sem sujeito, 
nem sujeito sem ideologia”. Há, entre os diferentes modos de produção social, um modo de produção 
social especifico que é o simbólico. Há, pois, práticas simbólicas significando (produzindo) o real. A 
materialidade do simbólico assim concebido é o discurso (ORLANDI, 2002).
É importante colocar ainda que Orlandi (2006a) em seu texto Tipologia do discurso e regras 
conversacionais, faz uma reflexão acerca de algumas posturas linguísticas e enfatiza sua crítica àquilo 
que ela denomina de “tropeços da linguística”. E quais seriam esses tropeços? Conforme a autora 
postula:
1. A centralização polarizada, seja na hegemonia do EU ou na tirania do TU, que trata insuficientemente 
a questão da subjetividade.
2. A abordagem que atribui à linguagem o papel de representação informativa, verdadeira e 
transparente do mundo.
A autora sustenta que, quanto à hegemonia do EU e/ou a tirania do TU, “Não é só de Benveniste 
essa posição, ela pode ser vista através de toda a teoria da enunciação”. (ORLANDI, 2006a, p.149). Já 
sobre o segundo “tropeço”, é um problema que persegue a tradição linguística (análise de conteúdo) 
e especialmente se destaca na perspectiva da semântica formal. A AD busca superar estes e outros 
problemas/lacunas na investigação acerca da linguagem, do sujeito e dos sentidos.
Conforme Orlandi (2006a), a análise do discurso critica ainda algumas tipologias e “regras 
conversacionais” propostas em outras teorias por tratarem insuficientemente a questão da subjetividade 
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e do sentido na linguagem. Uma posição teórica que aparece nitidamente criticada no texto por seu 
reducionismo diz respeito às teorias pragmáticas, em relação às regras de discurso a partir das máximas 
conversacionais: princípio de cooperatividade, quantidade, qualidade, relevância, modo etc., em autores 
como Grice, Searle. Postular estas regras é imaginar a linguagem inocentemente controlável, comportada, 
obediente... Ou seja, é estar longe do que de fato acontece no discurso: junto às estabilidades convivem as 
rupturas, contradições, falhas etc. Claro que essas regras conversacionais funcionam em certas práticas 
enunciativas, mas não em todas, não sempre.
Conforme Grice (um autor referencial nos estudos tradicionais da pragmática) a teoria das regras 
conversacionais pretende analisar o sentido a partir da relação entre o que é dito na sentença e um 
estado de coisas no mundo. Grice defende que na linguagem devem prevalecer a máxima da quantidade 
(a contribuição deve ser tão informativa quanto necessária); a máxima da qualidade (só deve ser dito 
aquilo para o que se possa fornecer evidência adequada); a máxima da relevância (independentemente 
da importância da informação, ela deve antes ser relevante aos objetivos e intenções da conversação); 
a máxima do modo/maneira (na conversação é preciso ser claro, evitando obscuridade de expressão, 
ambiguidades, delongas desnecessárias, desordenação). Assim, os enunciados precisam estar de acordo 
com certas máximas conversacionais que priorizam o princípio da cooperatividade na conversação, em 
busca da construção dos sentidos. Entretanto, muitas vezes essas máximas são completamente deixadas 
de lado, pelos interlocutores, em função da própria manutenção do sentido da conversação. Considere 
a situação que se configura na interação a seguir cuja máxima conversacional (de Grice) foi quebrada, 
considerando a produção de sentidos no texto.
‑Olá, Luíza, eu estava mesmo querendo falar com você. Minha empregada doméstica 
pediu demissão e eu estou precisando muito de uma substituta. Então estava pensando se 
você não poderia me indicar

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