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Unidade III PENSAMENTO POLÍTICO MODERNO Profa. Neusa Meirelles Pensamento político ocidental Processo histórico resultante teórico e da prática política, pelo qual: foram estabelecidos critérios e valores na apreciação do poder e política, tais como liberdade, garantia da propriedade, segurança e felicidade; a burguesia imprimiu sua marca à sociedade, que se diz sociedade burguesa, e, finalmente, construiu para si o modelo de Estado burguês. Processos endógenos ao capitalismo mudaram a sociedade burguesa: a) as formas mais rentáveis e eficientes de trabalho, presididas por sistemas de gestão mais eficientes e mais lucrativos, geraram um contingente populacional, urbano em sua maioria, integrado pelos que exercem a força de trabalho necessária ao sistema, mas em condições distintas das anteriores; b) um “novo” contingente populacional se qualifica como participante do jogo político, inclusive para redefinir sua configuração institucional e instaurar novas regras. O Estado burguês e a sociedade industrial: mudança e permanência De modo geral, na sociedade industrial, o indivíduo tem sua liberdade barrada por direitos de súdito. Tendências de pensamento surgem para dar conta das mudanças sociais e econômicas emergentes. As disposições de poder do Estado burguês precisam ser alteradas para que permaneçam fundamentalmente as mesmas. A ordem social e a política: positivismo e socialismo São posturas políticas diametralmente opostas, em face da ordem social analisada por uma racionalidade autoritária “científica”. Para o positivismo, era o controle moralizante, autoritário e científico da ordem o sentido da política positiva. As ideias socialistas visavam outra ordem social e, especialmente na versão marxista, uma ordem construída pelos militantes em um processo revolucionário de acirramento das contradições. Positivismo: Auguste Comte (Montpellier, 1798 – Paris, 1857) Obras: Curso de filosofia positiva, o Discurso sobre o espírito positivo (1844) e o Discurso sobre o conjunto do positivismo (1848). Proposta: a reorganização da sociedade a partir do pensamento científico, de uma ciência do social (sociologia) centrando a investigação nas leis naturais invariáveis, reveladas pela observação sistemática dos fatos, e pelas relações estabelecidas entre eles. O positivismo toma a sociedade como “organismo social”, estudando: a) o estado estático, pela teoria positiva da ordem social, forças sociais de preservação da estrutura e as responsáveis pela coesão social ou solidariedade; b) o estado de dinâmica social, das leis naturais que respondem pela evolução da sociedade humana, ou seja, a “Lei dos Três Estágios”, ou ainda a relação entre a ordem e o progresso. Os três estágios evolutivos da humanidade e da vida são: o teológico (fetichismo, politeísmo, monoteísmo), o metafísico e o positivo. O progresso: mudança das crenças, das teológicas para as científicas, um recurso para o reformismo, suporte para mudanças que induzem à permanência. Positivismo, uma “política científica” para a “saída” da situação social de crise, ordem moral A crise como momento da “marcha geral da civilização”, coexistência em conflito de dois sistemas: um que se extinguia (a velha ordem), e outro que tendia a se constituir (a nova ordem industrial e científica). O positivismo, o movimento (e partido) capaz de enfrentar a “anarquia social” instalada, e de preservar o Ocidente de qualquer tentativa comunista, portanto “uma política moderna, capaz de satisfazer aos pobres, tranquilizando os ricos”, sob o marco republicano, porque Comte era contrário à monarquia. Positivismo e organização política: expansão do executivo, inclusive com função legislativa; abolição do Parlamento, exceto para discussão de orçamento, abolição do sufrágio universal; o modelo positivista aproxima-se ao de uma ditadura do proletariado, um regime correspondente ao “período de transição” entre a “anarquia” e o Estado positivista. A ordem social e a política: as ideias socialistas As ideias socialistas formam um leque de tendências, mas a origem está associada à formação urbana do capitalismo, especialmente industrial. São as contradições entre segmentos sociais que passam a conviver no espaço urbano em situações radicalmente distintas que acabam por provocar as revoltas às quais as revoluções emprestaram discursos igualmente distintos. Dessas tendências, e foram muitas, apenas três nomes serão considerados nessa unidade: Saint-Simon, Proudhon e Karl Marx. As ideias socialistas: Saint-Simon (1760-1825) Saint-Simon viveu o período intenso de lutas políticas revolucionárias de violência do terror, sucedido pela repressão e Restauração do Império com Napoleão, seguido pela nova fase de lutas, repressão e articulações políticas tendentes à reconstrução do Estado. Suas ideias são apresentadas como uma proposta “esclarecida” crítica e irônica para os leitores, mas... Seu pensamento reflete a confiança na ciência como meio para encaminhar problemas sociais, a tônica do positivismo. Para Saint-Simon, o estudo científico da sociedade parte de seu funcionamento (fisiologia) Ele distingue classes sociais pela posição profissional, posse de capital (ricos, banqueiros e proprietários) e, finalmente, trabalhadores industriais e povo. Propõe uma nova religião, mais espiritualizada, condizente com as condições instauradas pelas luzes, nas quais o poder está associado à razão, ou ao saber. Saint-Simon em Cartas de um habitante de Genebra para os seus contemporâneos (1803) No texto, ele conclama os trabalhadores a se unirem, superando a distinção entre o trabalho braçal, exercido pelos que não são instruídos, e a riqueza dos que comandam, designados por “ricos” ou “proprietários”. Essa diferenciação, base da relação de dominação entre os dois segmentos, seria minimizada na medida em que os trabalhadores, mais numerosos, “forçassem” os ricos a instruí-los. Todavia, a dominação aparece como “um fato”, um desejo, encontrado em todo homem. Saint-Simon, moralidade e política: não propõe transformação da sociedade, mas apela para o princípio moral que preside as relações administrativas, na medida em que todos trabalham para um fim comum e útil; reconhece que os trabalhadores são mais numerosos e produtivos, mas não propõe alterar essa relação, retirando dela uma conclusão de cunho moral; ênfase à organização, ao trabalho produtivo em qualquer setor, e ao saber de gestão na organização. crítico do liberalismo, sua crítica à situação na França também é liberal. Interatividade Positivismo e socialismo são tendências políticas. Abaixo estão algumas proposições a respeito, mas qual delas está errada? a) Nas duas tendências se nota o apego a uma racionalidade autoritária “científica”. b) Comte desenvolveu uma modalidade de socialismo científico do qual teve origem a sociologia. c) Para o positivismo, o controle moralizante, autoritário e científico da ordem era o eixo da política. d) As ideias socialistas de Saint-Simon tinham caráter utópico. e) As ideias socialistas na versão marxista visavam outra ordem social, atingida por meio de um processo revolucionário. As ideias socialistas: Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865), uma referência ao pensamento socialista, autor criticado por Marx Em O que é a propriedade? (1840) afirma que “a propriedade é um roubo”, embora essa frase nãofosse dele, mas de Brissot, em 1789. Três anos depois, Proudhon enviou a Marx o seu livro Filosofia da miséria (1847), acompanhado por uma carta solicitando uma “crítica severa” da obra. Marx respondeu com Miséria da filosofia e criticou Proudhon, apontando falhas teóricas, mesmo porque o francês criticara a economia política marxista sem instrumental teórico para tanto. A contribuição de Proudhon: reconhece que os direitos inalienáveis do homem eram violados pelo sistema econômico, mas acreditava na possibilidade de uma “harmonia natural” e social, conforme a vontade de Deus (embora ele se dissesse não religioso, sendo-lhe atribuída a frase de efeito “Deus é o mal”); faz uma crítica à propriedade a partir da indignação moral, em face do sistema (imoral) de retribuição – portanto uma crítica ao sistema de remuneração ao trabalho, não à propriedade privada em si; sua contribuição é um esquema normativo cujos ideais são justiça e liberdade, mas tentou basear esse esquema em uma análise econômica e apontar mudanças de caráter prático. O problema social deve ter solução científica: propõe um Banco do Povo como instrumento fundamental, mas a proposta não saiu do papel; crítico do Estado pela concentração de poder, mesmo aquele poder que represente (aparentemente) uma vontade geral, a seu ver uma ilusão, o que o torna um crítico de Rousseau, preferindo Voltaire; não aceita o sufrágio universal e, quanto à democracia, não sacrifica igualdade à liberdade, nem liberdade à igualdade. O centro da contribuição de Proudhon está no princípio da solidariedade ampliado para o âmbito político para ele o Estado é uma federação de grupos, resultante da reunião de vários grupos diferentes por natureza, objetivos, e por práticas distintas, mas agrupados em torno de um interesse comum; no âmbito internacional, esse princípio levaria aos grandes blocos de nações, ou Estados; no âmbito social, o princípio de solidariedade leva ao mutualismo, ou à associação mutualista, sistema de trocas de serviços, bens e recursos entre os integrantes da associação, evitando a luta de classes e a violência. Três contribuições de Marx e Engels para teoria e ação política: a) o materialismo histórico dialético – método de investigação e de construção do conhecimento; b) identificação de processos e de sujeitos coletivos que dinamizam a história, em uma relação dialética; c) construção simbólica, discursiva, das condições materiais de existência e daquelas possíveis de alteração pela práxis. O método de investigação, o materialismo histórico dialético A realidade social é histórica, e não um “fluir” do tempo, nem uma sequência de estágios, mas um movimento que se dá por contradição. Logo: uma dada situação no presente não é estática, pois nela estão contidas as condições do passado e ao mesmo tempo as “sementes” do futuro; o movimento dialético das condições históricas fora trabalhado antes por Hegel (idealista) e Feuerbach (materialista). Qual a novidade no pensamento de Marx e Engels? A relação entre as condições materiais concretas da vida dos homens (forças produtivas e relações produtivas) e a estrutura social política, e o Estado. O vínculo entre a vida real (as condições materiais de existência) e as ideias, enfim, o modo como os homens vivem se reflete no modo como pensam sobre si próprios, sobre os outros, sobre o mundo e a política – daí resulta o conceito de ideologia. Identificação de processos e de sujeitos coletivos na história: classe social e luta de classes Os dois conceitos resultam das relações de antagonismo instauradas no Modo de Produção Capitalista (MPC), entre capital e trabalho e dominação política. Teoricamente, no capitalismo industrial, burguesia e proletariado compõem as classes sociais em luta no MPC. Marx, no Manifesto comunista, aponta a relação de antagonismo entre classes, a luta de classes, e Lênin considerou-a como “fio condutor da história”. As classes sociais são históricas, estão em movimento, em contradição (dialética), portanto em uma dada formação social Os interesses objetivos do capital (burguesia) podem ser subdivididos e até contraditórios (latifundiários, banqueiros, industriais, exportadores, importadores), e também os interesses dos trabalhadores (sindicatos) podem aparecer subdivididos (grande empresa, indústria etc.), dando origem a subdivisões das classes em segmentos. Essas subdivisões integram o processo de luta de classes, desde que as classes tenham consciência de si e se reconheçam como sujeitos de um processo histórico. Nas condições concretas de existência, as pessoas tendem a esposar ideias relacionadas a essas condições de existência ao lugar ocupado na ordem produtiva. Ideologia, palavra difícil, mas não é só a justificativa da ordem: ela abrange uma concepção de mundo e do sujeito no mundo, uma análise do presente tendo em vista o futuro e a concepção de linhas de ação (práxis) convergentes para esse futuro; nessa acepção, ideologia abrange o conjunto de ideias e de práticas de um projeto fundamental às organizações políticas que se colocam como objetivo à transformação da sociedade, seja pela força das armas ou não. Alienação, outra palavra difícil, separação entre sujeito e realidade Partindo desse entendimento, a palavra em Marx vai remeter à separação entre trabalhador e seu trabalho, cujo “produto” será apropriado pelo outro sob a forma de capital. Essa separação é radical e o trabalhador (não importa o nível) passa a se identificar pelo trabalho que realiza e que é alienado a outrem. Ele deixa de ser ele mesmo para “ser” aquilo que faz, para “ser” o gerente, o fiscal etc. Interatividade Qual das proposições abaixo é fiel ao conteúdo exposto? a) Saint-Simon foi positivista, aluno de Proudhon. b) Saint-Simon não foi um socialista importante, mas o seu Banco do Povo foi uma iniciativa que teve significado prático. c) Marx foi um teórico do socialismo no século XIX, cujas previsões foram desmentidas por Adam Smith. d) As pessoas não estão condenadas a assumir tendências de pensamento correspondentes ao seu lugar na ordem produtiva, mas existe uma tendência para isso. e) A dialética hegeliana é tão materialista quanto a marxista, a diferença está no papel reservado a Deus em Hegel. As ideias socialistas: o ambiente político, partidos e organizações políticas Emtre meados do século XIX até as primeiras décadas do XX, opera-se uma expansão capitalismo industrial e a formação do capital financeiro que, em ritmo elevado de acumulação e operando em escala internacional, aprofunda contradições sociais em certos países europeus, propiciando a formação de grandes contingentes populacionais emigratórios. Nessa configuração, o fortalecimento do segmento social “burguês” que se formara, enfrenta a oposição dos trabalhadores organizados em ligas, círculos operários, sindicatos e partidos políticos. Os movimentos e greves não reivindicavam o poder, mas exigiam mudanças na condução da política econômica e das políticas públicas. O ruído das reivindicações populares urbanas e o governo na França pós-revolucionária Napoleão representou uma força política pacífica e defensora da ordem democrática e da vontade geral, em meio das contradições entre segmentos da burguesia, Executivo e Legislativo. Após a queda de Napoleão, as tendências políticas já instaladas retornam: de um lado, a contrarrevolução dos monarquistas católicos, e de outro, as ideias laicas e libertáriasdos revolucionários, em geral republicanas, porém com as variações do socialismo e do positivismo. No confronto dessas duas tendências, o liberalismo passou a representar o desejo de ordem e tranquilidade ao gosto da classe média. Luís Felipe e a queda da monarquia Em 1830 explodiu a revolução, tendo por base as condições sociais precárias vividas pela maioria da população trabalhadora, sobretudo em Paris. Mas a vitória foi do capitalismo industrial, na sua configuração financeira, sobre os proprietários de terras, aristocracia e o clero. O “Rei dos Franceses”, como Luiz Felipe referia a si próprio, foi também o rei burguês, e pretendeu manter uma política liberal moderada, mas provocou oposição de vários setores, inclusive da classe operária, cujas reivindicações explodiram na Revolução de 1848, provocando a queda da monarquia. A primeira iniciativa de organização política dos trabalhadores em Londres (1864) Fundada a Associação Internacional dos Trabalhadores, de cujo Comitê participava Marx. Essa reunião ficou conhecida como Primeira Internacional. Coube a Marx redigir a Mensagem Inaugural da Associação Internacional dos Trabalhadores e os Estatutos Provisórios dessa Associação, que foi aprovada na reunião de 1871, na Conferência da Associação Operária Internacional (nome pelo qual a associação passaria a ser denominada a partir dos Estatutos). Seguiu-se, em âmbito internacional, a Segunda Internacional, em 1889, da qual participaram socialistas brasileiros. Revolução Russa e partidos políticos A mudança no ambiente político internacional afetou radicalmente o processo de construção e consolidação dos partidos socialistas. Na Rússia, a Revolução de 1905-1907 vencera a monarquia e o Partido Menchevique alcançara o poder, com perfil populista. Em 1917, o Partido Comunista Soviético lidera a Revolução Russa e assume decisivamente o poder em nome do proletariado, uma vitória que afetou profundamente as posições dos partidos operários e socialistas que se formaram no período. Partido Comunista (Rússia, 1917) Tinha perfil e objetivos decorrentes das condições históricas e políticas russas. Os soviets, ou “conselhos operários”, eram grupos de militantes organizados em todos os setores de atividade e unidades produtivas, formando uma pirâmide de poder, de controle e circulação de informação. A capilaridade da organização partidária assegurava centralidade da orientação política e ideológica, além da obtenção de informações das bases necessárias para avaliação e controle, cumprindo papel estratégico no processo revolucionário de transformação econômica e social da Rússia. Vanguarda intelectual? Na condução da práxis transformadora, o partido correspondeu à configuração russa do processo de transição política em curso, em um mundo de expansionismo capitalista. As medidas adotadas não decorriam de um modelo consolidado de Estado socialista, mas de condições históricas peculiares do momento. Portanto, não era uma teoria geral referente à passagem de um modelo de Estado capitalista para um socialista. Para Lênin e outros, caberia ao partido o papel de vanguarda revolucionária e um perfil intelectual, mas essa formação não era típica do proletariado, e sim da pequena burguesia. Seria possível uma vanguarda que não tivesse suas raízes na própria classe, ou a vanguarda deveria surgir espontaneamente do proletariado? Para Lênin, intelectuais e trabalhadores deveriam integrar-se em uma “organização centralizada e disciplinada”, dotada de uma consciência adequada, voltada para a história que é o partido. Em face da popularidade das ideias socialistas de base marxista fora da Rússia, sobretudo entre a intelectualidade, o Partido Comunista Russo, decidiu “proletarizar” os partidos comunistas sob seu controle. Partido Comunista: a rigidez teórica e equívocos Apesar das discussões internas, o PCB persistiu na rigidez em torno de categorias de análise teórica, conduzindo à adoção de estratégias equivocadas e dissidências. Um exemplo seria a insistência de considerar o poder do grande proprietário rural como manifestação de um modelo feudal, em decadência, ou “restos feudais” presentes e persistentes no capitalismo retardatário brasileiro. Outro equívoco foi o de trabalhar com o antagonismo “proletariado versus burguesia”, uma contradição teórica válida, mas que na prática política exige estratégias adequadas à realidade, e não aderentes apenas à teoria. Enfim, faltou a análise concreta da situação. Dissidências e a presença na história política O pensamento socialista de matriz marxista-leninista esteve na base de vários partidos políticos brasileiros – do PCB, PC do B, PCR –, além das várias vertentes de movimentos que surgiram nos anos 1960. Os dissidentes – e são muitos – não deixaram simplesmente o Partido. Antes, elaboraram um exame crítico detalhado das posições adotadas pelo PCB e de suas próprias posições. Este é o caso da análise de Carlos Marighella sobre as teses apresentadas pelo Comitê Central do PCB para o VI Congresso da entidade, em 1967. O Partido Socialista Foi formado em 1947, originário da II Convenção Nacional da Esquerda Democrática, no Rio de Janeiro. A linha ideológica do partido é a liberal burguesa, aproximando-se do que se entende por “socialismo utópico”. Portanto, fundamentalmente reformista. O Partido e seus militantes desempenharam papel significativo na esfera política, sobretudo no Nordeste. Conceitos básicos: representação política e hegemonia Representação política: remete à presença de uma ausência – o representante é, por definição, uma figura coletiva, supostamente a síntese dos muitos que não têm voz ou que não podem exercê-la, por questões práticas e até mesmo por comodismo. Na democracia representativa, essas vozes silenciadas se fazem ouvir nos círculos de decisão – sobretudo no legislativo, pela voz do representante, que a si mesmo não representa! Hegemonia: remete ao exercício do poder político em dadas condições sociais e históricas. O conceito remete ao processo político, aos dispositivos e práticas de poder, no cenário cambiante em que se insere a dinâmica de governo e a própria configuração do Estado. Representação política e composição social: elites e maiorias Na condução da política, no governo e na concepção do modelo de Estado, tornou-se fundamental estabelecer mecanismos de representação política que diminuam o controle das elites sobre a política. O modelo de governo civil, inspirado na tradição liberal de uma vontade geral, consistia de um governo para o povo, e não por ele. O elitismo implícito nessa concepção política levou à aceitação de um distanciamento entre representados e governo, caracterizando o governo por consentimento da população como modelo típico da sociedade industrial. Interatividade Por que os mecanismos de representação e prática da política na sociedade industrial, baseados na vontade geral, não diminuíram as reivindicações e críticas nos países europeus? a) Devido à ordenação institucional monárquica. b) Devido a imperfeições dos sistemas eleitorais, que foram corrigidas. c) Os mecanismos de representação não se destinavam a fornecer as bases de apoio aos maus governos. d) Pela herança da Revolução Francesa e a revolta contra a ordem. e) A vontade geral não corresponde às condições concretas de existência no capitalismo industrial, pois falta um espaço para encaminhamento de interesses materiais em conflito. Impassese riscos da representação Tocqueville, em 1848, referindo-se à democracia americana, falava de uma “revolução democrática”, com base na igualdade em liberdade, favorecendo o sistema representativo. Todavia, essa “revolução” não soluciona a questão da capacitação para a escolha, muito menos para que a escolha realizada selecione os mais capazes para exercer a política. Instala-se então o risco de esses mais capazes constituírem, na verdade, representantes de uma maioria que exerceria poder opressivo. Na América, a prática associativa e o acordo moral, instaurado na primeira fase da colonização para o bem-estar de todos, contornaria esse risco. Tocqueville e as observações do “liberal de outro tipo” Em suas observações sobre os mecanismos de poder nos EUA, supunha ser aquele país constituído por uma população de “iguais”, por isso: ele mesmo não escapou dos preconceitos de cor e de “raça” – para ele, os “brancos” representam a “essência” do homem, e os demais povos encontrados na América, índios, são de espécie inferior; considerou a escravidão dos africanos um “mal necessário”, assim como afirmou que os povos indígenas americanos não conheciam a posse da terra; Tocqueville e as observações do “liberal de outro tipo” (continuação) sua “democracia americana” tem um referencial específico – a “democracia” praticada entre brancos dos EUA (e mantida por mais de 100 anos depois da visita do francês); interessado em demonstrar a liberdade e igualdade americanas, ele não percebeu as contradições entre norte e sul (as que eclodiriam em guerra civil posteriormente), apenas indicou a diferença entre as duas regiões; somente indicou o avanço americano sobre as terras mexicanas do Texas, sem considerar se essa “invasão branca” era ou não democrática. As manifestações populares e o cenário político da sociedade industrial nos séculos XIX e XX A participação popular passou a integrar a cultura como parte da própria concepção de política, tanto na França quanto no Reino Unido. As “barricadas” apareceram sistematicamente nas ruas de Paris e de outras cidades francesas, ao longo dos séculos XIX e XX, “por cima” das diferenças partidárias e da situação formal de eleitor. A manifestação popular, em várias vertentes, teve papel fundamental nos movimentos contra o colonialismo, reivindicação de direitos civis na África, Índia, EUA; Na América Latina, esse processo foi diferenciado. Manifestação popular na política Não consiste na expressão de partidos políticos, mas no posicionamento de militantes, simpatizantes e populares em relação a problemas políticos identificados. O trabalho de politização e mobilização é desenvolvido por agentes diversos, inclusive partidos, associações (mais recentemente ONGs, redes sociais, blogs) e a comunicação circula pela imprensa escrita, falada, televisiva e virtual. Reprimir as manifestações nas ruas constitui em mecanismo de força que “conta” a favor dos manifestantes. Governo e hegemonia: a sociedade civil em questão (Hegel e Gramsci) A construção do Estado burguês se firma nos modelos absolutistas e ganha coerência nas formulações liberais e iluministas dos séculos XVII e XVIII. O suporte teórico dessa concepção de Estado reside no conceito de vontade geral, que institui, por pacto ou contrato, o Estado como instância política que a expressa e, ao mesmo tempo, legitima o governo do qual essa “vontade geral” participa, uma formulação que se mantém. Em plena expansão do capitalismo industrial, a construção iluminista contratualista dessa concepção de Estado estava sob a crítica de autores distintos como Hegel e Marx. Mas por quê? Hegel, a construção do espaço da sociedade civil A impossibilidade de o Estado “dar conta” da sociedade em transformação foi identificada e trabalhada por Hegel, separando a esfera política da sociedade civil burguesa. O Estado deveria ser situado a partir da distinção entre o que seja de sua responsabilidade – portanto no nível mais amplo – e o que seja da responsabilidade dos membros da sociedade, no livre jogo de suas atividades. Dessa diferenciação resulta o campo específico de atuação política, espaço de manifestação dos conflitos, discussão das ideias e onde as tendências emergentes na sociedade possam ressoar sem comprometer a liberdade. Antonio Gramsci, teórico e político marxista italiano, discutiu o conceito de hegemonia em relação à sociedade civil e ao Estado Ele explica que é um erro supor uma distinção orgânica (intrínseca, arraigada ou funcional) entre sociedade civil e sociedade política, apesar de essa distinção existir teoricamente. Considera duas forças presentes na sociedade civil: os movimentos pela “livre iniciativa” e o movimento sindical. Todavia, os sindicatos dependem dos rumos emprestados à política econômica (movimentos pela livre iniciativa). Consequentemente, essa condição os mantém na subalternidade. Sociedade política ou sociedade civil? A “confusão” segundo Gramsci No Estado Liberal, as figuras que exercitam suas atividades na sociedade civil (empresários, por exemplo), são as mesmas que emprestam caráter estatal à atividade econômica, porque são elas que respondem pelas regulamentações legislativas, as quais têm caráter coercitivo. Outro aspecto importante reside na relação entre governo e sua prática governativa: enquanto o governo se apresenta como instituição e discurso no plano formal, as práticas governativas são afetadas pelo jogo das elites por hegemonia na sociedade civil. Comentários finais A vida social contemporânea propicia a formação de demandas gerais da maioria da população, além de demandas peculiares a segmentos sociais específicos. Essas demandas, sob a forma de reivindicações, surgem nas cidades e propiciam uma nova política, cuja aplicação se dá sobre o corpo, na dimensão de uma “biopolítica” ou “biopoder”. As políticas públicas de saúde, migração, natalidade etc. são exemplos dessa modalidade de política. No controle dessas políticas estão posicionadas as elites no jogo dinâmico por hegemonia. Interatividade Qual das proposições abaixo está incorreta? a) A incorporação de previsão e racionalidade à gestão do capital na indústria e serviços expandiu o capitalismo financeiro internacional. b) A capilaridade da organização partidária foi fundamental à Revolução Russa, propiciando maior flexibilidade ideológica. c) Um erro do PCB residiu no apego às categorias teóricas. d) O pensamento socialista, de matriz marxista-leninista, serviu de base para vários partidos políticos brasileiros e para vertentes das organizações contra a ditadura. e) Hegemonia remete ao exercício do poder político; o conceito não remete à estabilidade, mas à dinâmica de poder. ATÉ A PRÓXIMA! Slide Number 1 Pensamento político ocidental �Processos endógenos ao capitalismo�mudaram a sociedade burguesa: � O Estado burguês e a sociedade�industrial: mudança e permanência �A ordem social e a política: positivismo e socialismo� �Positivismo: Auguste Comte �(Montpellier, 1798 – Paris, 1857)� �O positivismo toma a sociedade�como “organismo social”, estudando: � �Positivismo, uma “política científica” para a�“saída” da situação social de crise, ordem moral � Positivismo e organização política: �A ordem social e a política: as ideias socialistas� �As ideias socialistas: Saint-Simon (1760-1825)� �Para Saint-Simon, o estudo científico da sociedade parte de seu funcionamento (fisiologia) � �Saint-Simon em Cartas de um habitantede�Genebra para os seus contemporâneos (1803)� �Saint-Simon, moralidade e política: � �Interatividade� �Resposta� �As ideias socialistas: Pierre-Joseph Proudhon�(1809-1865), uma referência ao pensamento�socialista, autor criticado por Marx� �A contribuição de Proudhon: � O problema social deve ter solução científica: �O centro da contribuição de Proudhon�está no princípio da solidariedade ampliado�para o âmbito político� �Três contribuições de Marx e Engels�para teoria e ação política:� �O método de investigação, o�materialismo histórico dialético� �Qual a novidade no pensamento de Marx e Engels?� �Identificação de processos e de sujeitos coletivos�na história: classe social e luta de classes� �As classes sociais são históricas, estão em movimento, em contradição (dialética), portanto�em uma dada formação social� �Ideologia, palavra difícil, mas�não é só a justificativa da ordem:� �Alienação, outra palavra difícil,�separação entre sujeito e realidade� Interatividade Resposta �As ideias socialistas: o ambiente político,�partidos e organizações políticas� �O ruído das reivindicações populares urbanas�e o governo na França pós-revolucionária� �Luís Felipe e a queda da monarquia� A primeira iniciativa de organização política�dos trabalhadores em Londres (1864) Revolução Russa e partidos políticos �Partido Comunista (Rússia, 1917)� Vanguarda intelectual? �Seria possível uma vanguarda que não tivesse�suas raízes na própria classe, ou a vanguarda�deveria surgir espontaneamente do proletariado?� �Partido Comunista: a rigidez teórica e equívocos� Dissidências e a presença na história política �O Partido Socialista� Conceitos básicos: representação�política e hegemonia �Representação política e composição�social: elites e maiorias � �Interatividade� �Resposta� �Impasses e riscos da representação� �Tocqueville e as observações�do “liberal de outro tipo”� �Tocqueville e as observações do�“liberal de outro tipo” (continuação)� �As manifestações populares e o cenário político�da sociedade industrial nos séculos XIX e XX� Manifestação popular na política �Governo e hegemonia: a sociedade�civil em questão (Hegel e Gramsci)� �Hegel, a construção do espaço da sociedade civil� �Antonio Gramsci, teórico e político marxista�italiano, discutiu o conceito de hegemonia�em relação à sociedade civil e ao Estado� �Sociedade política ou sociedade civil?�A “confusão” segundo Gramsci� �Comentários finais� �Interatividade� Resposta Slide Number 57
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