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Projeto organizacional e parâmetros

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universidade federal de minas gerais – escola de engenharia 
departamento de engenharia de produção 
epd068 – organização do trabalho 
prof. Ana Valéria Carneiro Dias1 
 
Aula 3: Fundamentos do Projeto Organizacional: parâmetros e 
contingências para projeto e análise da organização do trabalho 
 
A Organização do Trabalho situa-se, como campo de conhecimento, na ampla área da Teoria das 
Organizações. Pode-se dizer que os estudos sistematizados de Organização do Trabalho foram 
inaugurados por Frederick Taylor, no início do século XX, ainda que Adam Smith, já no século XVIII, 
tenha chamado a atenção para o fato de que mudanças na forma de se trabalhar poderiam 
engendrar mudanças drásticas nos resultados econômicos das firmas. Dentro da Teoria das 
Organizações, a Organização do Trabalho distingue-se pela sua característica essencial de ciência 
aplicada ao trabalho real. De fato, o objetivo primordial da Organização do Trabalho deve ser a 
intervenção prática, ou seja, modificar as condições nas quais o trabalho pode se realizar, de forma a 
atingir resultados econômicos, sociais e tecnológicos desejáveis. 
Uma boa maneira de se compreender o lugar da Organização do Trabalho dentro da Engenharia de 
Produção é situando-a em relação a outros campos do conhecimento relacionados às discussões 
sobre organização (Figura 1). Nesse sentido, a Organização do Trabalho estaria dedicada ao projeto 
da organização em nível “meso”, entre o nível “micro”, representado na Engenharia de Produção 
pela Ergonomia e sua análise da atividade em relação à tarefa, e o nível “macro”, responsável pela 
organização da empresa de forma geral, representado pelas discussões sobre Arquitetura 
Organizacional, Organização Industrial, Administração e Organização e disciplinas correlatas. 
Ao mesmo tempo, a Organização do Trabalho, a Ergonomia e a organização geral da empresa estão 
situadas num contexto maior, uma vez que a empresa faz parte de uma cadeia produtiva e atua em 
um determinado contexto macroeconômico-sócio-tecnológico-cultural nacional e global. Sendo 
assim, é de se esperar que a Organização do Trabalho sofra influências, também, de tais contextos. 
Contudo, é importante ressaltar que isso não significa que a Organização do Trabalho seja 
totalmente determinada pelo contexto externo e pelas decisões estratégicas tomadas na empresa. 
As influências existem, mas não são determinísticas e, além disso, se admitimos as organizações 
como sistemas abertos, é evidente que a Organização do Trabalho é influenciada, mas também 
influencia outras instâncias da empresa, bem como o ambiente externo; trata-se, portanto, de uma 
via de mão dupla. É fundamental que essa visão seja predominante nas análises e nos projetos 
organizacionais a serem conduzidos dentro da Engenharia de Produção. 
 
1 Este material foi preparado como apoio didático à disciplina EPD068 – Organização do Trabalho, do 
Departamento de Engenharia de Produção da Escola de Engenharia da UFMG. Pode ser utilizado livremente, 
desde que citada a fonte. Feedbacks são bem-vindos e podem ser enviados para anaval@ufmg.br 
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Figura 1. A posição da OT em relação a outras instâncias da empresa e do ambiente. Elaborada pela autora. 
 
Fundamentalmente, a discussão sobre Organização do Trabalho não difere muito da discussão sobre 
a arquitetura das organizações. Assim, a frase de Mintzberg (2003:12) que diz que “toda atividade 
humana organizada (...) dá origem a duas exigências fundamentais e opostas: a divisão do trabalho 
em várias tarefas a serem executadas e a coordenação dessas tarefas para a realização da 
atividade”, utilizada para o estudo das macroformas organizacionais, é perfeitamente aplicável aos 
problemas básicos de Organização do Trabalho. Na mesma direção, os mecanismos de coordenação 
descritos por Mintzberg (2003) são muito adequados para o entendimento da coordenação 
interpessoal (mas também entre grupos) no contexto da organização do trabalho, bem como a 
discussão sobre formas de agrupamento que o mesmo autor apresenta. Logo, vale a pena rever tais 
conceitos para uma melhor compreensão dos modelos fundamentais de organização do trabalho e, 
principalmente, de suas variações práticas. 
Existem, contudo, alguns parâmetros específicos para projeto e análise da organização do trabalho, 
que, de uma certa maneira, partem dos parâmetros de análise organizacional “macro” (como os 
propostos por Mintzberg, citados anteriormente) e são refinados de modo a atingir o nível da divisão 
(e coordenação) do trabalho interpessoal, que é, ao fim e ao cabo, o objeto de estudo da 
Organização do Trabalho (em senso estrito). Por exemplo, os princípios propostos por Taylor em sua 
Administração Científica são, talvez, os primeiros parâmetros para projeto e análise da organização 
do trabalho; porém, são, a nosso ver, restritivos e inadequados à organização do trabalho 
contemporânea, pois deixa de lado elementos importantes para o projeto organizacional, 
especialmente porque não considera a organização como um sistema. 
Na década de 1990, alguns parâmetros genéricos para fundamentar o projeto e a análise da 
organização do trabalho foram propostos por um grupo de pesquisadores holandeses (Sitter, 
Dankbaar e Hertog, 1997). O objetivo era criar parâmetros que direcionassem o projeto, a exemplo 
dos princípios tayloristas, mas com uma visão sistêmica e contingencial da organização, ou seja, 
considerando o contexto sócio-cultural-econômico-tecnológico no qual a organização opera, e 
Tecnologia / Aspectos 
sociais, culturais, políticos / 
Aspectos macroeconômicos 
Relação entre 
empresas 
Organização da 
empresa 
Organização 
da Produção 
Organização 
do Trabalho 
Tarefa / 
Atividade 
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considerando que, embora se trate do projeto da organização do trabalho (nível da operação), ele 
não prescinde do exame das interrelações entre o nível da operação e os níveis de controle, 
atividades de apoio e demais atividades fundamentais para a empresa. É importante esclarecer que, 
ainda que a proposta tenha sido elaborada num contexto de modelo de organização do trabalho 
sócio-técnica, os parâmetros apresentados podem ser utilizados para análises e projetos 
organizacionais fundamentados em outros modelos organizacionais – inclusive o taylorista, se for o 
desejo do projetista. A seguir, serão apresentados esses parâmetros e os conceitos subjacentes a 
eles. 
 
Pressupostos e conceitos básicos para análise e projeto organizacional contemporâneo 
Antes de mais nada, vale mais uma vez ressaltar que os princípios de projeto discutidos a seguir 
partem de dois pressupostos fundamentais: 
1. A organização é um sistema aberto; 
2. A organização é um sistema aberto situado num contexto, portanto, deve ser projetada 
considerando-se suas contingências. 
Logo, ainda que se trate do projeto da organização do trabalho no nível operacional2, os parâmetros 
de projeto e os conceitos a eles associados tratam também da interrelação entre os diferentes níveis 
organizacionais. De fato, um dos primeiros conceitos a serem apreendidos é o conceito de sistema de 
desempenho e sistema de pilotagem. Todo sistema de produção é composto de um sistema de 
desempenho, ou seja, as atividades que compõem a execução do trabalho strictu sensu, e um sistema 
de pilotagem, ou seja, as atividades que compõem o controle relacionado às atividades de 
desempenho. Controle, aqui, não possui um sentido restrito, comumente associado ao termo em 
português, de verificar se o planejado (ou prescrito) foi cumprido. A palavra “controle”, em 
organização do trabalho, deve ser entendida (salvo menção expressa em contrário) como 
“gerenciamento”,ou seja, o monitoramento das ações e seus resultados (inclusive os resultados 
imediatos à ação) de modo a desencadear ações corretivas ou mesmo alterações de objetivos. Em 
alguns textos, prefere-se o termo “dirigibilidade” no lugar de “controle”, justamente para dar esse 
sentido dinâmico ao processo de gestão: num contexto mutante, não se sabe quais objetivos serão 
demandados no futuro, portanto não se conhece a priori que pontos específicos deverão ser 
controlados. 
Ainda, no sistema de pilotagem há um ciclo típico da pilotagem (controle), que é, 
fundamentalmente, composto pela etapa de percepção da situação, seguida de um julgamento 
acerca do estado e pela escolha da ação, culminando com a execução da ação. Assim, uma das 
decisões organizacionais a serem tomadas é como alocar tal ciclo de pilotagem: se será integrado em 
um único setor, grupo ou nível hierárquico, ou fragmentado em mais de um setor, grupo ou nível 
 
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 Note que “nível operacional” não significa “operação fabril”, ou seja, produção de bens físicos em 
indústria/manufatura/artesanato. O nível operacional de um serviço pode se referir ao atendimento a clientes; 
o nível operacional de uma empresa de projeto é o setor de projetos, em uma empresa de consultoria, os 
consultores e assim por diante. Além disso, rigorosamente os parâmetros de análise e projeto organizacional 
podem ser aplicados a qualquer tipo de trabalho, inclusive administrativo (setores de apoio), embora, nesse 
caso, deva-se tomar o cuidado de enxergar o trabalho administrativo como uma “operação” em si e coloca-lo 
corretamente em relação às demais atividades da organização. 
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hierárquico. Em outras palavras: quem percebe a situação tem também a função de julgar e agir? Ou 
tais funções serão fragmentadas para outros atores? 
Outro conceito importante é a noção de subsistema. Os subsistemas são funções organizacionais que 
encerram um processo em si, ainda que o processo não encerre todas as atividades da empresa. Por 
exemplo: a função “produção” pode ser considerada um subsistema, assim como a função 
“compras”, a função “desenvolvimento de produtos” ou “inovação” e a função 
“comercialização/logística”. Pode-se detalhar ainda mais: na produção, o setor de “montagem” pode 
ser um subsistema e o setor de “acabamento”, outro. Essas funções encerram processos completos 
dentro de si, com entradas, o processo e os resultados (produtos, projetos, serviços); e cada um 
desses processos relaciona-se a outros. Na empresa, existem também outros processos cuja função é 
dar apoio a todos os demais processos; por exemplo, a função “qualidade” deve estar presente em 
cada processo da organização, assim como a função “RH”, a função “Planejamento” (inclusive PCP), a 
função “apoio a Tecnologia de Informação” ou “Manutenção de equipamentos”. Portanto, essas 
funções são denominadas “aspectos transversais” ao sistema e aos subsistemas. De fato: tanto a 
produção, quanto o desenvolvimento de produtos, por exemplo, necessitam processos de qualidade, 
de RH, de manutenção... daí a característica transversal dessas funções. 
Finalmente, vale lembrar que os subsistemas são sempre compostos de homens e máquinas e 
equipamentos (o que inclui softwares). Evidentemente, o projeto de organização do trabalho 
contemporâneo deve levar em conta as diversas possibilidades de interação entre esses elementos 
do sistema. 
 
Parâmetros para projeto e análise organizacional contemporânea 
A seguir, vamos examinar que parâmetros podem ser utilizados para projetar ou analisar a 
organização do trabalho. Tais parâmetros não são exaustivos, mas são uma boa maneira de se 
começar a análise. 
Voltando aos pressupostos, a análise da organização do trabalho, ainda que tenha o foco nas 
atividades, deve considerar seu contexto. Portanto, os parâmetros não dizem respeito somente ao 
trabalho direto; por exemplo, alguns dizem respeito à relação do trabalho direto com os níveis 
administrativos ou de controle (pilotagem); outro diz respeito ao layout. É importante ter claro a qual 
nível de análise o parâmetro diz respeito, para não incorrer em erros conceituais. 
Também é preciso ressaltar que, neste texto, por questões didáticas, serão discutidas as situações 
extremas em cada parâmetro; na prática, pode-se encontrar e projetar estados intermediários. 
Finalmente, sempre que se mencionar “produção”, não estamos nos referindo somente à produção 
de bens, mas também ao nível operacional em serviços, atividades de projeto etc (vide nota de 
rodapé 2). 
1. Concentração funcional 
O parâmetro “concentração funcional” diz respeito ao fluxo de produção, ou seja, como os 
produtos/serviços percorrem o processo produtivo. Dito de outra forma, no caso de um processo 
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fabril, trata-se da análise do layout3 da produção; no caso de um processo de serviços, pode dizer 
respeito ao layout, como num supermercado, mas também ao fluxo de informações entre 
setores/departamentos/grupos (caso se processe basicamente informações, como no caso de uma 
consultoria). 
O fluxo de produção pode restringir as decisões de divisão e coordenação do trabalho. Por exemplo: 
ao optarmos por um layout funcional (Figura 2), dificilmente será viável fazer com que um 
trabalhador atue em mais de um processo. Estando restrito a um processo, provavelmente será 
necessário recorrer à supervisão direta para a coordenação entre os processos. Logo, a decisão de 
layout está direcionando a decisão de organização do trabalho. 
 
 
 
 
 
 
Figura 2. Da esquerda para a direita: Layout funcional e layout linear. Elaborada pela autora. 
Outro exemplo: ao optarmos por um layout linear (Figura 2), por definição, estamos escolhendo um 
layout dedicado a um produto, com pouca ou nenhuma variação. Isso faz com que os trabalhadores 
alocados àquela linha tenham suas atividades restritas aos processos relativos àquele produto. 
Ainda, por questões de volume (altos volumes são importantes para viabilizar economicamente uma 
linha dedicada), tende a haver uma exigência de ciclos curtos de trabalho (ou seja, cada trabalhador 
deve realizar uma tarefa de pequena duração, repetidamente). Novamente: o layout está 
direcionando a escolha organizacional. 
Analisando os extremos para esse parâmetro, temos: 
 Alta concentração funcional: todas as transformações do sistema (ordens de produção, 
encomendas, projetos) são potencialmente alocadas a todos os subsistemas, ou seja, todos 
os subsistemas envolvidos podem produzir aquele produto/serviço/projeto. Tal situação 
pode ser facilmente observada no layout funcional (daí o nome do parâmetro). No caso de 
uma única linha de produção, ou de mais de uma linha, porém dedicadas (ou seja, o produto 
só pode passar por uma linha de produção específica), a transformação será alocada a todos 
os subsistemas envolvidos em seu processo de forma mandatária. Portanto, o caso de uma 
única linha de produção ou de linha de produção dedicada é também classificado como alta 
concentração funcional. 
 Baixa concentração funcional: cada ordem é produzida em seu próprio subsistema, mas os 
subsistemas são paralelos. Nesse caso, cada produto/projeto/serviço deve ser 
prioritariamente produzido em seu próprio subsistema (ou seja, há muitos fluxos correndo 
 
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 Caso haja dúvidas sobre os tipos principais de layout, uma referência rápida é: Slack et al, 2002. 
Administração da Produção. São Paulo: Atlas. 
L1 
L2 
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em paralelo na produção), porém, como há subsistemas paralelos, é possível que a 
produção seja deslocada de um subsistema para outro (em especial numa situação limite). 
Esse é ocaso típico das células de manufatura (que são dedicadas a famílias, mas não a um 
produto somente – Figura 3) ou de layouts lineares com redundância (mais de uma linha 
idêntica). A produção não é organizada em torno de funções (daí a baixa concentração 
funcional). 
 
 
 
 
 
 
Figura 3. Layout celular. Elaborada pela autora. 
 
2. Especialização de desempenho 
Trata-se da “divisão horizontal do trabalho”, ou seja, da divisão do trabalho de produção strictu 
sensu. Quanto mais o trabalho é dividido, maior a especialização. Examinando os extremos: se a cada 
trabalhador é alocada somente uma tarefa, há alta especialização de desempenho; caso o 
trabalhador possa realizar todas as tarefas do processo, há baixa especialização de desempenho. 
 
3. Diferenciação de desempenho 
Trata-se de um aspecto da “divisão vertical do trabalho”. Nesse parâmetro, examinamos a alocação 
de tarefas de preparação e apoio (por exemplo: limpeza, organização do setor, manutenção básica 
de equipamentos, set-up: programação de equipamentos, troca de ferramentas...) em relação às de 
execução a diferentes trabalhadores em diferentes subsistemas. 
 
Assim, para os casos extremos: caso o trabalhador que executa a produção também realize 
atividades de preparação e apoio à sua tarefa, dizemos que há baixa diferenciação de desempenho. 
Ao contrário, se o trabalhador que executa não puder realizar nenhuma tarefa de preparação e apoio 
(sendo tais tarefas alocadas a uma ou mais pessoas de outros subsistemas – por exemplo, setor de 
serviços gerais, setor de manutenção), há alta diferenciação de desempenho. 
 
Importante notar que esse parâmetro não se ocupa das atividades de controle. Tais atividades serão 
objeto de análise do próximo parâmetro. 
 
4. Separação de produção e controle 
Esse parâmetro diz respeito a um outro aspecto vertical do trabalho, especificamente, o aspecto de 
“controle”. Como já explicado, “controle”, aqui, não se refere à verificação do prescrito, mas 
apresenta um significado mais amplo, de gerenciamento de variabilidades. Inclui, numa lista não 
exaustiva, questões de qualidade, quantidade (o que implica em velocidade, ou ritmo), sequência de 
produção, além de conformidade, se for o caso, entre outros aspectos. 
 
Haverá baixa separação de produção e controle (ou integração de produção e controle) se o mesmo 
trabalhador responsável pela execução da atividade puder controlar os aspectos relacionados a ela. 
Família 
P1 e P2 
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Ao contrário, alta separação de produção e controle significa que o trabalhador que realiza a 
atividade não pode controlar nenhum aspecto a ela relacionado (aspectos esses designados a um ou 
mais funcionários de outro(s) subsistema(s)). 
 
É interessante perceber que esse parâmetro pode ser influenciado por uma questão tecnológica. De 
fato, a natureza de alguns processos de trabalho faz com que a produção e o controle não possam 
ser separados; tipicamente (mas não só) isso é verdade para o trabalho em processos automatizados. 
Por exemplo: em uma sala de controle de uma indústria química (processo contínuo automatizado), 
o trabalho direto (produção) é, justamente, o de controlar o processo realizado pelo equipamento. 
Outro exemplo, na mesma linha: um operador de trens de metrô (ou locomotiva) com operação 
automatizada tem como trabalho (produção) o controle dos parâmetros do sistema. Da mesma 
forma para um piloto de grandes aeronaves (que, na maior parte do tempo, voam de modo 
automático). Note que essas situações são totalmente diferentes do trabalho de um inspetor de 
qualidade: nesse caso, o trabalho do inspetor é controle, porém sobre o trabalho realizado por outro 
funcionário. 
 
5. Especialização da pilotagem 
A especialização da pilotagem analisa a distribuição dos aspectos transversais do sistema (qualidade, 
planejamento e programação, manutenção, sistemas de informação, RH...) na arquitetura 
organizacional da empresa. Esse parâmetro não deve ser confundido com “diferenciação de 
desempenho”; aqui, trata-se de examinar as funções transversais que não são realizadas pelo nível 
operacional (produção). 
 
Mesmo nos casos em que o funcionário na produção pode realizar atividades transversais, a partir de 
um certo grau de complexidade tais atividades precisam ser realizadas por especialistas. Por 
exemplo: um projetista pode realizar a manutenção básica de seu computador, como atualizações de 
rotina, limpeza de memória etc, mas questões mais complexas, como as relacionadas às redes 
internas, ou procedimentos corretivos devem ser realizadas por especialistas. Outro exemplo: um 
operário pode realizar manutenções básicas em seu equipamento, como lubrificação, troca de 
ferramentas, limpeza etc, mas manutenção corretiva ou preventiva de maior complexidade exigirá 
um técnico especialista. Resumindo, sempre haverá tarefas complexas que devem ser alocadas a um 
especialista (que, em alguns casos, pode ser até mesmo terceirizado). A questão examinada por esse 
parâmetro é: como esses especialistas são agrupados na estrutura organizacional da empresa? 
 
As possibilidades extremas para esse parâmetro são as seguintes: caso os especialistas de 
determinada área (qualidade, TI, RH...) estejam, no organograma da empresa, alocados em um único 
setor (setor de Qualidade, de TI, de RH...), diz-se que há alta especialização da pilotagem. Contudo, 
se os especialistas estiverem dispersos pelo organograma, não existindo um setor único de 
Qualidade, TI, RH... (por exemplo, quando existem mini-fábricas e cada uma delas tem seu pessoal de 
Qualidade, de TI, de RH...), então haverá baixa especialização da pilotagem. 
 
Um pequeno exercício: faça a relação entre esse parâmetro e os tipos de agrupamento propostos por 
Mintzberg. 
 
 
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6. Diferenciação da pilotagem 
A diferenciação da pilotagem trata da distribuição das atividades de controle (pilotagem) em 
domínios decisórios separados, conforme a hierarquia. Caso as atividades de controle sejam 
realizadas rigorosamente dentro de um domínio decisório hierárquico específico, então há alta 
diferenciação da pilotagem. Ou seja: decisões estratégicas só podem ser tomadas pela cúpula; 
decisões táticas, pela gerência intermediária; e decisões operacionais, pela supervisão direta e/ou 
núcleo operacional. Nas situações em que as decisões se “misturam” ao longo da cadeia hierárquica, 
diz-se que há baixa diferenciação: por exemplo, caso o núcleo operacional possa também participar 
das decisões estratégicas e táticas da empresa. 
 
Atenção: esse parâmetro deve ser sempre analisado “de cima para baixo”. Embora a função da 
cúpula deva ser primordialmente pensar a estratégia, é bastante comum que ela também influencie 
nas questões táticas e até operacionais, e isso não configura, por si, baixa diferenciação. A baixa 
diferenciação existe se, explicitamente e formalmente, os níveis hierárquicos inferiores podem tomar 
decisões de nível superior. 
 
7. Alocação do ciclo de pilotagem 
Finalmente, o parâmetro da alocação do ciclo de pilotagem investiga como se dá o tratamento de 
imprevistos associados ao trabalho que se está analisando (denominamos tais imprevistos de 
“eventos”. O conceito detalhado pode ser encontrado em Zarifian, 2001, e na disciplina EPD068 será 
melhor trabalhado nas aulas finais). Conforme exposto anteriormente, um imprevisto dá origem a 
um ciclo de pilotagem, constituído pela percepção, julgamento, escolha da ação e atuação. O 
parâmetro trata de verificar se essas etapas estão alocadas a um mesmo subsistema (ou seja: quem 
percebe o problema tem a prerrogativa de julgar, escolher a ação e agir) ou não (por exemplo: quem 
percebe o problema deve imediatamentecomunica-lo a um superior ou a um técnico, encerrando-se 
aqui sua participação no tratamento do imprevisto). No primeiro caso, o ciclo de pilotagem é 
integrado; e no segundo, é fragmentado, podendo haver, obviamente, situações intermediárias. 
 
Aqui, é importante fazer duas observações: primeiro, esse parâmetro difere do parâmetro 
“separação de produção e controle” pelo caráter do imprevisto. O quarto parâmetro trata de 
controles rotineiros da operação, e o sétimo parâmetro dedica-se aos imprevistos inerentes à 
operação. Segundo, esse parâmetro deve ser sempre examinado considerando-se imprevistos 
inerentes ao processo, ou seja, imprevistos que, do ponto de vista da complexidade, poderiam ser 
tratados pela operação a menos de uma decisão organizacional. Explicando melhor: se um 
imprevisto é tão complexo que não pode ser tratado pelo núcleo operacional, necessitando muitas 
vezes de técnicos especializados, ele deve ser excluído da análise nesse parâmetro, porque a 
fragmentação do ciclo de pilotagem nesse caso não é devida à escolha organizacional, mas sim à 
complexidade tecnológica4. Para analisar esse parâmetro, opte por imprevistos mais simples e até 
certo ponto rotineiros, tais como: falta de matéria prima, panes ou quebras de máquina de baixa 
complexidade, alterações nos pedidos dos clientes, problemas de qualidade de baixa complexidade 
etc. 
 
4 Rigorosamente, os imprevistos de alta complexidade também são questões organizacionais; afinal, é uma 
escolha da organização o grau de qualificação do núcleo operacional. Contudo, numa primeira aproximação é 
possível realizar a simplificação aqui proposta. 
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Conclusão 
O objetivo desse texto foi apresentar algumas ferramentas úteis para se projetar e/ou analisar a 
organização do trabalho de qualquer sistema de produção, seja ele de bens ou de serviços. 
Como dito anteriormente, os parâmetros propostos não analisam somente o trabalho em si, mas sua 
relação com os demais subsistemas e aspectos da organização; o quadro 1 resume essa noção. 
Parâmetro A que se refere 
Concentração funcional Fluxo de produção (layout) 
Especialização de desempenho Trabalho direto (nível operacional) 
Diferenciação de desempenho Trabalho direto (nível operacional) 
Separação de produção e controle Trabalho direto (nível operacional) 
Especialização da pilotagem Arquitetura organizacional (agrupamentos) 
Diferenciação da pilotagem Arquitetura organizacional (níveis hierárquicos) 
Alocação do ciclo de pilotagem Processo de tratamento de imprevistos 
Quadro 1. Parâmetros e níveis de análise. Elaborado pela autora. 
De nossa experiência, a melhor maneira de se compreender os parâmetros de projeto e análise 
organizacional e sua utilidade é, exatamente, colocando-os em uso. A prática permite um 
entendimento muito melhor e mais nuançado dos parâmetros. Assim, procure aplicá-los em diversos 
sistemas de produção com os quais você tenha contato, além de realizar os exercícios propostos na 
disciplina. 
 
Referências, ou para saber mais: 
AULICINO, M. Elementos para projeto de organização do trabalho na operação de processos 
contínuos: considerações a partir de um estudo de caso. Dissertação (Mestrado) – Escola Politécnica 
da USP, 1998. 
MINTZBERG, H. Criando organizações eficazes. São Paulo: Atlas, 2003. 
SALERNO, M. Projeto de organizações integradas e flexíveis. São Paulo: Atlas, 1999. 
de SITTER, L. U.; den HERTOG, F.; DANKBAAR, B. From complex organizations with simple jobs to 
simple organizations with complex jobs. Human Relations, vol. 50, n. 5, 1997, p. 497-534 (1997). 
ZARIFIAN, P. Objetivo competência. São Paulo: Atlas, 2001.

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