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AULA DE APOIO II FORMAÇÃO SÓCIO-HISTÓRICA DO BRASIL Prof. Renato Bulcão Formação sócio-histórica do Brasil Os autores que trataremos nessa aula são: Raymundo Faoro – jurista – centro. Celso Furtado – economista – centro. Otávio Ianni – sociólogo – esquerda. Marilena Chauí – filósofa – esquerda. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: Tese do estamento político: O rei decidia sozinho toda distribuição das verbas. Havia uma classe de nobres em torno do rei. Os nobres ocupavam cargos políticos e não trabalhavam. O garantia jurídica era política. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: O estamento político nasce nas Ordenações Filipinas. As Ordenações Filipinas constituíram a base do direito português até a promulgação em Portugal de sucessivas Constituições no século 19. Foram promulgadas em 1595 e muitas das suas disposições tiveram vigência no Brasil até o Código Civil de 1916. Portanto, para Faoro, o pensamento político e jurídico brasileiro está diretamente ligado a essa forma de entender o mundo. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: As Ordenações Filipinas entraram em vigor com Filipe II de Espanha reinando sobre Portugal. A União Ibérica durou de 1580 até 1640. Essas ordenações determinaram a intervenção do Estado na economia, nos negócios, no comércio marítimo, nas compras e vendas internas, no tabelamento de preços, no embargo de exportações aos países mouros e à Índia. Permitiram também o predomínio incontestável e absoluto do soberano, e a centralização política e administrativa. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: Esta disciplina imposta sobre os particulares não respeitava a riqueza econômica, era puramente inspirada pela política. Servia ao Estado e ao estamento, e não ao comerciante nem ao comércio lucrativo. O Estado, envolvido por esse estamento burocrático, se alimentava da classe comercial, que ele desprezava e aviltava. A corte e os nobres eram os parasitas. Este padrão de comportamento do estamento, será a característica que Faoro percebeu que se instalou no Brasil. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: Nas terras portuguesas, tanto o comerciante estrangeiro ou português, só podia exercer o comércio mediante uma concessão ou delegação real, com a outorga de privilégios. O rei comerciante confundia a exploração econômica com a guerra e a administração pública. Para Faoro, tudo acabou em grossa corrupção, com o excesso do luxo. Nada precisava de merecimento porque a conquista do emprego, do posto, e da dignidade se fazia à custa da intriga bem tecida, e da conversa doce. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: Isto criou em Portugal uma imensa burocracia presidida pelo rei. A realidade política se entrelaçou na realidade social, e o cargo público conferia fidalguia e riqueza. A maldade acompanhava o funcionário, preocupado em se perpetuar no exercício do cargo que lhe conferia o pequeno poder que o acompanhava: a arte de furtar. O funcionário estava por toda parte, dirigindo a economia, controlando-a e limitando-a de acordo com sua vontade própria e seus pequenos poderes. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: As subvenções, os ordenados, as pensões devoravam o Estado, para o proveito da fidalguia detentora de cargos públicos. O comércio, controlado ou explorado pelo rei era a fonte que alimentava o caixa da Coroa. Num reino onde todos eram dependentes do rei, surgia a figura do pai do povo, voltado para o socorro aos pobres, como no governo de Getúlio Vargas. O capitalismo que existiu foi o politicamente orientado. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: Tudo era tarefa do governo, tutelando os indivíduos, eternamente menores e incapazes. O governo impedia a participação do povo nos destinos da nação. Toda tentativa de importação de técnicas de produção de bens sofria o efeito triturador e nacionalizador do estamento, que retardou a modernização de Portugal. Quando o pessimismo apontava para a crise e a miséria que se aproximavam, exigia-se uma solução do Estado. Assim nasceu a ideia ainda presente entre nós de que o Estado é a fonte de todas as desgraças e de todos os benefícios. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: O grupo dirigente não exercia o poder em nome da maioria, nem mesmo inspirado pela confiança que irradiava do povo A soberania se tornou privilégio de uma camada restrita, sem nenhum respeito pela maioria. Para Faoro, a história de Portugal e do Brasil é um cemitério de elites. As brigas pelo poder não dizem respeito ao povo. São disputas entre funcionários do Estado. Assim, a classe dirigente de hoje nunca será a mesma de ontem; em outras palavras, a oligarquia que manda hoje, será sempre derrubada por uma nova. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: O governo dessas elites levaria, em substituições sucessivas, a negar todo o conteúdo de representatividade das forças sociais. Faoro reconhece que esta crítica partiu do campo marxista, no qual, a despeito da concepção do Estado como expressão da classe dominante, o elitismo também conquistou indisfarçáveis posições. Dessa forma, Faoro consegue explicar a falência da República Velha, do Estado Novo, do período democrático de 1948/64, da Ditadura Militar, da crise econômica do governo Fernando Henrique Cardoso e a destituição do poder de Dilma Rousseff. Formação sócio-histórica do Brasil Raymundo Faoro: Por baixo de todos estes movimentos políticos persistiu a ideia do estamento de funcionários do Estado brigando pelo poder, não para estimular o trabalho e o crescimento econômico, mas simplesmente para poder se beneficiar das rendas do Estado. Sua hipótese afirma que, como consequência do isolamento do povo, os funcionários mantiveram sempre o mesmo conteúdo ideológico. É o caso que percebemos quando ouvimos grupos de funcionários ou políticos atuais defendendo regras e ideologias, apenas para poderem arrecadar mais dinheiro em seu benefício próprio. Formação sócio-histórica do Brasil Celso Furtado: Nos anos 60, pensava-se que o mercado nascia da organização da produção exclusivamente. Furtado acreditava que era possível ao Estado subsidiar uma série de iniciativas que poderiam industrializar o Norte e o Nordeste. Acreditava que os problemas econômicos não podem ser separados das suas condicionantes socioculturais e políticas. As empresas estrangeiras tenderiam a ignorar as várias formas de organização pelos sistemas nacionais em que ela se insere, portanto, o custo social. Formação sócio-histórica do Brasil Celso Furtado: Seu desenvolvimentismo acreditava que era possível estabelecer bases técnicas e econômicas que permitissem a incorporação do progresso de forma que estas de fato viessem a melhorar as condições civilizatórias dos povos latino-americanos. A questão primordial era a da acumulação capitalista e ele sugeria mecanismos que pudessem melhorar a distribuição dessa renda acumulada. Através dessa distribuição, seria possível melhorar o bem- estar geral da população. Formação sócio-histórica do Brasil Celso Furtado: Devia-se definir as estruturas que permitiriam um equilíbrio entre o capital e o trabalho. Para Furtado, isto pode ser identificado nos mecanismos de acesso à propriedade rural, aos meios de produção e ao mercado de trabalho e sua regulação. O estado de desenvolvimento é a condição ideal que uma sociedadecapitalista assume quando incorpora o progresso técnico e adquire uma dinâmica própria. O estado de subdesenvolvimento seria um estado onde haveria dificuldade na incorporação do progresso tecnológico, e isso impediria esta dinâmica. Formação sócio-histórica do Brasil Celso Furtado: Um dos problemas deste impedimento seria justamente a dificuldade de socialização da renda obtida pelo capital, que não estaria sendo distribuída de forma justa aos trabalhadores. Parece uma ideia marxista, mas não é. Para ele, a dificuldade decorreria da impossibilidade de se organizar os conhecimentos técnico e científico de forma a beneficiar diretamente a economia local. Formação sócio-histórica do Brasil Celso Furtado: A teoria do subdesenvolvimento de Furtado pode ser vista neste sentido, como uma crítica a forma racional que as elites dominantes dos países periféricos fazem da incorporação do progresso tecnológico, causando assim uma eterna dependência externa dos bens de consumo, e ao mesmo tempo, uma grande assimetria social interna. Furtado percebeu que, como a agricultura ainda é a mola mestra da economia brasileira desde meados do século 20, é a forma como a agricultura se adapta a economia do mercado internacional, que a torna fortemente responsável pela instabilidade crônica da economia brasileira. Formação sócio-histórica do Brasil Celso Furtado: Quando há uma alta nos preços de exportação de produtos agrícolas, estes são exportados diminuindo a oferta e criando um movimento inflacionário. Mas no momento em que os preços no mercado internacional mudam e a exportação deixa de ser interessante para os produtores, os lucros que antes estavam sendo feitos no mercado internacional, deve ser conseguido agora na venda destes mesmos produtos dentro do mercado nacional. Porém, até hoje, o mercado interno não é capaz de absorver 100% da produção destinada ao mercado externo. Formação sócio-histórica do Brasil Otávio Ianni: Na perspectiva (neo) liberal, o trabalhador assalariado, ainda que sujeito ao aparelho repressor do Estado e protetor da propriedade privada, disporia de uma janela para negociação, pela pressão e por acordos políticos entre as classes sociais. Contudo, o que vemos são os protestos por reformas, com uma remota possibilidade de revolução proletária. A partir de 1920 e 1930, as classes dominantes e o governo começaram, a reconsiderar a abordagem exclusivamente policial em relação aos protestos e a questão social subjacente, pois perceberam que o problema é político. Formação sócio-histórica do Brasil Otávio Ianni: O progresso nas negociações políticas de classe não é constante, pois o militarismo e o conservadorismo em geral, pretendem o tempo todo desconstruir essa abordagem e retornar ao uso da repressão. O país cresceu economicamente, assim como o poder do Estado, mas os trabalhadores continuaram em condições precárias. À medida em que os índices de distribuição de renda continuaram estagnados mesmo com o crescimento da economia, a desigualdade piorou. Os trabalhadores no campo ou na cidade, carregam o país mas mantém-se pobres. A sociedade brasileira é uma fábrica de desigualdade social. Formação sócio-histórica do Brasil Otávio Ianni: É dominante a percepção da elite, militares e civis, que manifestações do proletariado e das classes mais pobres sejam distúrbios à ordem pública. Não existe diálogo fácil entre a classe dominante e os trabalhadores, quando a questão são as reivindicações sociais. O uso do aparelho repressor do Estado, legitimado por uma visão pejorativa do povo, acabam por solucionar permanentemente a falta de diálogo: o povo é pobre por que é preguiçoso. Formação sócio-histórica do Brasil Otávio Ianni: O capitalismo sustenta essa aparência, pois seus movimentos cíclicos e acelerados produzem a contradição que quanto mais riqueza é gerada, mais miséria surge. Há duas abordagens mais recorrentes para tentar resolver este problema: O assistencialismo, que casa com o populismo, pois não reforma nem revoluciona o sistema, mas apenas concede pequenas benfeitorias que não permitem às pessoas ascenderem socialmente ou modificarem estruturalmente as relações sociais que configuram suas vidas. Formação sócio-histórica do Brasil Otávio Ianni: A segunda abordagem é a criminalização e a repressão, pois quando os conflitos sociais tencionam, as negociações se demonstram incapazes de dirimir esses conflitos, e o assistencialismo falha em acalmar os explorados e oprimidos, a repressão estatal torna-se o caminho utilizado para resolver os conflitos de classe. A globalização necessitou da classe que exerce o poder de maneira patriarcal, para implantar as diretrizes neoliberais, e o clientelismo e sustentar o poder com as mesmas famílias. Formação sócio-histórica do Brasil Otávio Ianni: As oligarquias tornaram-se politizadas, pois seus representantes políticos encarregaram-se da transição entre o Brasil não-globalizado para o globalizado, de maneira que tudo se modernize conservando a essência desigual do país. Ianni percebeu os pensadores brasileiros não abandonaram os conceitos antigos com que pensam a sociedade nacional, e se demonstram incapazes de questionar as propostas da globalização. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: Marilena Chauí afirma que a autoimagem do brasileiro ensinada nas escolas faz com que nós tenhamos orgulho do país, e acreditemos que as melhores qualidades do povo são seu calor, caráter e falta de preconceito. A natureza é constantemente citada, sendo sua abundância um motivo de orgulho e celebração, aumentando a impressão de que o Brasil se assemelha a um paraíso. Chauí chama esse conceito de mito fundador. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: Um mito fundador é aquele que não cessa de encontrar novos meios para exprimir-se, novas linguagens, novos valores e ideias, de tal modo que, quanto mais parece ser outra coisa, tanto mais é a repetição de si mesmo. O mito ganha novas formas e estabelece um eterno vínculo com passado, de tal forma que o sentido da história obedece ao mito fundador, mesmo que aconteçam transformações na forma de narrá-lo, ele continuará sendo alimentado e transmitido. Isto é um semióforo, que tem força simbólica; é uma relíquia de um povo, algo que conserva sentidos heroicos, de grande magnitude. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: Esse evento ou objeto é central para as culturas, pois emanam um poder simbólico e são elementos dos quais a cultura destaca, seja através de cultos religiosos, rituais, celebrações, estátuas, entre outras coisas que sejam comum a todos. No mundo capitalista, o denominador universal, a moeda, pode adquirir e equivaler as coisas mais distintas, mas ela não pode ser considerada um semióforo, pois ela mesma possui valor de troca e é mercadoria. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: As elites, sejam militares, religiosas ou financeiras controlam o poder em diversas formas; o conhecimento, a riqueza material, o discurso religioso, poder bélico ou político. Dessa maneira, são também as responsáveis, inicialmente, pelo semióforos, e por esse motivo eles foram conservados, mesmo com a introdução do sistema capitalista. As elites disputam os semióforos: A elite religiosa os utiliza para construir milagres, a elite política constrói propaganda e a elite financeira acumula obras de arte, mansões e prédios modernos. Formação sócio-históricado Brasil Marilena Chauí: O nacionalismo ganha força pois o patriotismo passa a ter um novo objeto de “culto”, o Estado. Os símbolos de unificação, os semióforos construídos pelo Estado, ganham destaque na sociedade, ajudando a criar uma tradição cultural estatal. O nacionalismo resolveu três questões simultâneas que colocavam em risco o projeto político estatal das elites: o socialismo, os resquícios tradicionalistas que recusavam a modernidade, e a cooptação da pequena burguesia. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: O ápice desse modelo tem lugar com o nazi-fascismo, que se apodera dos meios de comunicação de massa para inserir esses símbolos de poder do Estado-nação na vida cotidiana. O Estado invade as casas e mentes dos indivíduos, através de técnicas propagandísticas de massa, engrandecendo a figura do Estado-nação acima das classes e das esferas privada e pública. O melhor caminho para a propaganda nacionalista é o esporte, através de seus ídolos. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: O Verdeamarelismo; A definição do verdeamarelismo é no início do século 20 a imagem construída pela elite do próprio Brasil, como um país agrário, buscando enfatizar as sobras do sistema colonial. A exaltação da natureza brasileira e a ideia de ordem e progresso, casavam-se para sugerir subliminarmente que o caminho do país era a continuidade do extrativismo e de suas políticas agrárias e desiguais, iniciadas durante o Brasil colônia e atualizadas conservadoramente no começo do século 20. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: A industrialização rearranjou as forças econômicas do país, permitindo uma aceleração na urbanização, assim como o surgimento de uma burguesia industrial, que viria tomar espaço político e econômico da hegemônica elite agrária, O movimento cultural do Modernismo nacionalizou-se , construindo culturalmente o verdeamarelismo e apoiando a ditadura de Getúlio Vargas. A burguesia industrial emplacou o projeto nacional desenvolvimentista e originou o segundo verdeamarelismo, tentando construir uma identidade nacional. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: O período militar, que corresponde ao momento da “questão nacional”, que substituiu a ideia de “identidade nacional” e se utilizou do verdeamarelismo como ferramenta política para sustentar a opinião pública a seu favor, e para se legitimar politicamente perante aqueles que afrontavam o regime. O verdeamarelismo passou a cultuar o povo brasileiro, as diversas etnias estereotipadas, unidos sob a mesma nação. Chauí sustenta que a ideologia verdeamarela, é composta no imaginário tendo por base Deus, a Natureza e o Estado. Formação sócio-histórica do Brasil Marilena Chauí: “Se o Brasil é “terra abençoada por Deus”, se é paraíso reencontrado, então somos berço do mundo, pois somos o mundo originário e original. E se o país está “deitado eternamente em berço esplêndido” é porque fazemos parte do plano providencial de Deus “e somos o paraíso na terra”. O Rei era representante de Deus e não dos governados. O mesmo ocorre na República com o Presidente, pois o povo sabe que os políticos representam o Estado e não os interesses dos trabalhadores. Por causa dessa organização, não se ensina ao povo uma relação democrática, mas cria-se um sistema de clientela e favores; um populismo. Formação sócio-histórica do Brasil Conclusão: Tire suas próprias conclusões. Reflita sobre os embates ideológicos percebendo o que é um discurso politico que só alimenta a continuidade da classe política como elite dominante no Brasil. Perceba que não existem soluções mágicas nem milagres. Talvez assim, no future teremos uma mudança da realidade sócio-histórica brasileira. ATÉ A PRÓXIMA!
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