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FIOS PARA SUTURA (cap 29) Os fios cirúrgicos são utilizados durante uma operação com finalidade hemostática (ligadura ou laqueadura de vasos sanguíneos) e para sutura. Denomina-se sutura à união das bordas de uma ferida com fios específicos, de modo a promover melhor e mais rápida cicatrização. Esse fios são utilizados para manter os tecidos unidos até se consumar o processo natural de cicatrização. Algumas características usadas para classificar os fios cirúrgicos constituem fatores decisivos na orientação quanto ao tipo de fio a ser usado em um determinado tecido ou situação: (1) origem do material para sua fabricação – biológicos ou naturais e sintéticos; (2) possibilidade de assimilação pelo organismo – absorvíveis e não-absorvíveis; (3) propriedades físicas – configuração básica, capilaridade, calibre, força tênsil, força do nó e memória; (4) manuseio – flexibilidade, coeficiente de fricção, arrasto tecidual e visibilidade do fio no campo operatório; e (5) desencadeamento de reação tecidual – reação celular inflamatória e fibrosa, potencial para desenvolvimento de infecção e alergia e, facilidade para esterilização. QUADRO 29.1 ORIGEM DOS FIOS CIRURGICOS Biológicos – oriundos de vegetais: algodão e linho; e oriundos de animais: categute (intestino de ovinos e bovinos), colágeno e seda (casulo das larvas do bicho-da-seda). Sintéticos – náilon (poliamida), poliéster, polipropileno, ácido poliglicólico, poliglactina, polidioxanona. Metálicos – aço inoxidável. O grande desenvolvimento alcançado pelos fios sintéticos, gerando reatividade tecidual substancialmente menor, tem favorecido sua maior utilização, na atualidade. ASSIMILACAO PELO ORGANISMO Absorvíveis: (1) em curtíssimo espaço de tempo – categute simples – 7 a 10 dias; (2) em curto espaço de tempo – categute cromado – 15 a 20 dias; (3) em médio espaço de tempo – ácido poliglicólico e poliglactina 910 – 50 a 70 dias; (4) em moderado espaço de tempo – poliglecaprona – 90 a 120 dias e (5) em longo espaço de tempo – polidioxanona – 90 a 180 dias; poligliconato – 150 a 180 dias. QUADRO 29.2 Os fios não-absorvíveis permanecem indefinidamente nos tecidos, sendo encapsulados por tecido fibroso, mas não digeridos, embora possam sofrer alterações em sua estrutura. Alguns são biodegradáveis: náilon – sofre cerca de 20% de degradação enzimática ao ano; e seda – absorvido por fagocitose em aproximadamente 2 anos. QUADRO 29.3 ESTRUTURA FISICA Monofilamentares: produzidos com um único filamento, sendo, em geral, menos maleáveis do que os multifilamentares. Multifilamentares: vários filamentos torcidos ou trancados entre si, levando a uma maior flexibilidade e mais fácil manuseio. São mais traumatizantes e ásperos ao passarem através dos tecidos, levando a maior arrasto tecidual. Geralmente, os fios Monofilamentares apresentam menor potencial para o desenvolvimento de infecções. Os multifilamentares tendem a ser mais vulneráveis à força de cisalhamento e desse modo mais suscetíveis à ruptura. Entretanto, os monofilamentares podem ser enfraquecidos pela pinça cirúrgica ou outros instrumentos, exigindo manipulação mais cuidadosa. ABSORÇAO DE LIQUIDOS E CAPILARIDADE DIAMETRO Fio 0 = 0,40 mm de diâmetro, temos fios de maior diâmetro (1, 2, 3, 4, 5 e 6, sendo este o fio cirúrgico de maior diâmetro) e de menor diâmetro (00 ou 2-0, 3-0, 4-0 até o 12-0, que é o fio cirúrgico de menor diâmetro. Considerando isoladamente, em um determinado fio o aumento de seu diâmetro é acompanhado pelo aumento de sua resistência ou força tênsil. Não há, contudo, qualquer ganho em se utilizar um fio com força tênsil maior do que a necessária para a sutura do tecido em que esteja sendo empregado. A escolha do cirurgião deve ser pelo fio de sutura mais fino possível para o tecido em que se esta trabalhando, sem prejuízo do resultado, de forma a utilizar a menor quantidade de tecido estranho ao organismo. FORÇA (OU RESISTENCIA) TENSIL Quanto maior a força tênsil de um fio, menor o diâmetro que necessita ser utilizado, resultando em menor quantidade de corpo estranho nas feridas cirúrgicas. De modo geral, tecidos compostos por grande quantidade de fibras colágenas, como pele, fáscia, aponeurose e tendões, representam os tecidos mais resistentes. Em contraposição, tecidos com grande vascularização e que cicatrizam rapidamente (peritônio, órgãos intra-abdominais, músculo, tecido gorduroso) não necessitam de fios com grande força tênsil. QUADRO 29.4 FORÇA E SEGURANÇA DOS NOS É a força necessária para fazer com que um nó não sofra, parcial ou completamente, o processo de deslizamento ou de ruptura, também sendo conhecida como resistência tênsil efetiva. Quanto menor o coeficiente de fricção apresentado por um fio, maior sua possibilidade de desfazer o nó. Os fios não-absorvíveis monofilamentares são aqueles que apresentam o menor coeficiente, exigindo-se a realização de muitas alças de nós, ocasionando maior implante de corpo estranho no organismo. Os nós que não são bem fixados permitem o deslizamento, um fenômeno que ocorre em certo grau em todos os nós, sendo mais frequentes com alguns tipos de fios cirúrgicos monofilamentares sintéticos. MEMORIA É definida como sendo a capacidade inerte de um material de retornar à sua forma original depois de manuseado e deformado, relacionando-se com duas outras características, a plasticidade e a elasticidade. Quanto maior a memória de um fio, maior a rigidez, mais difícil o manuseio e menor a segurança do nó. Os fios de polipropileno e náilon são os que apresentam mais acentuadamente esse fenômeno. Nesse casos devemos adicionar seminós até se conseguir uma segurança contra o deslizamento. FLEXIBILIDADE E FACILIDADE DE MANUSEIO Relacionadas com a rigidez do fio. O manuseio mais difícil é com o aço; o mais fácil com seda. COEFICIENTE DE FRICÇAO Pertinente à facilidade com que a sutura desliza através do tecido e dos nós. Quanto maior o coeficiente de fricção de um fio, maior a sua dificuldade em deslizar pelos tecidos, ocasionando maior arrasto tecidual. Porém, quanto menor esse coeficiente, mais o fio sofre deslizamento e maior a instabilidade dos nós. ARRASTO TECIDUAL Quanto mais rígido um fio ou quanto maior o seu coeficiente de fricção, maior o arrasto tecidual, o que poderá acarretar maior dano a esse determinado tecido. VISUALIZAÇAO DO FIO NO CAMPO OPERATORIO Fios nas cores verde, lilás, azul e preta podem ser mais facilmente visualizados do que os incolores. INTENSIDADE DA REAÇAO INFLAMATORIA TECIDUAL DESENCADEADA Como regra geral, fios multifilamentares acarretam maior reação tecidual. Inicia-se com a infiltração de leucócitos na área do trauma cirúrgico e com o aparecimento de macrófagos e fibroblastos. Ao redor do sétimo dia, surge um tecido fibroso com processo inflamatório crônico. Os fios absorvíveis, notadamente os naturais, provocam reações do tipo corpo-estranho mais intensas do que os não-absorvíveis. A reação persiste até que o fio seja encapsulado ou absorvido pelo organismo. QUADRO 29.5 ABSORÇAO X NÃO-ABSORÇAO POTENCIAL PARA MULTIPLICAÇAO BACTERIANA ANTIGENICIDADE E ALERGENICIDADE Fios cirúrgicos manufaturados a partir de polímeros do ácido glicólico (ácido poliglicólico, poliglactina, poligliconato) não apresentam proteínas do colágeno, antígenos e pirógenos em sua superfície, e se situam, junto ao polipropileno, náilon e aço monofilamentares, como os menos antigênicos e alergênicos. Ao contrário, os mais antigênicos e alergênicos são o categute simples e o cromado. ESTERILIZAÇAO A possibilidade de propiciar esterilização fácil e perfeita é indispensável a todos os materiais cirúrgicos. PRINCIPAISFIOS CIRÚRGICOS ABSORVÍVEIS CATEGUTE Fio biológico monofilamentar torcido, apresentado sob a forma simples. O categute cromado pode ser utilizado no plano total das anastomoses gastrointestinais em dois planos (mantém sua resistência o tempo suficiente para ocorrer a cicatrização primária), na sutura do peritônio, na bolsa escrotal, e no períneo, não devendo ser utilizado no plano aponeurótico (por levar mais tempo para cicatrizar). O categute simples pode ser empregado na sutura do peritônio, na bolsa escrotal, no períneo e na reaproximação do tecido muscular e do tecido celular subcutâneo. Alguns preconizam o uso de categute para pequenos ferimentos em crianças, no sentido de não haver necessidade de sua retirada; também pode ser usado em ferimentos nas regiões palmares e plantares, com o intuito de orientar a linha de cicatrização. Devido ao seu alto conteúdo proteico, ambos, categute simples e cromado, apresentam grande sensibilidade à digestão por enzimas proteolíticas, sendo contraindicados para utilização em anastomoses biliares e pancreáticas, e para sutura de ulceras pépticas duodenais. A resistência tênsil dos fios de categute simples e cromado se esgota totalmente em 7 a 10 dias e em 15 a 20 dias, embora ainda existam resquícios desses fios por até 70 e 90 dias, respectivamente. Recomenda-se que o categute seja utilizado logo que seja retirado da embalagem, sob pena de perda de flexibilidade, que, contudo pode ser restaurada pela imersão em água destilada estéril ou solução fisiológica. Possui inúmeras características indesejáveis: (1) é o fio que provoca a mais intensa reação tecidual inflamatória, interferindo no processo de cicatrização; essa reação é maior com o fio simples do que com o cromado; (2) apresenta absorção irregular, imprevisível e variável; (3) é o fio que tem a menor força tênsil; (4) os nós tendem a afrouxar devido à alta capilaridade que apresenta, além do fato de atrair fluidos para a ferida, tornando-a edemaciada; e (5) apresenta perda da forca tênsil e absorção aumentada na presença de infecção. ACIDO POLIGLICOLICO O ácido poliglicólico (Dexon®), fio absorvível, sintético e multifilamentar. Mais recentemente, foi lançado comercialmente em nova apresentação (Dexon Plus® ou Dexon II®), com um revestimento sintético para favorecer a passagem pelos tecidos e facilitar a realização dos nós. É absorvido por hidrolise química entre 50 e 70 dias (médio espaço de tempo), mas apresenta perda completa da resistência tênsil a partir de quatro semanas (5% da força tênsil após quatro semanas). Apresenta, assim como os demais polímeros do ácido glicólico e a polidioxanona, absorção muito mais previsível do que os categutes. Dentre suas vantagens, citam-se: (1) força tênsil praticamente inalterada por 21 dias (ácido poliglicólico>poliglactina); (2) pequena capilaridade, baixa memória, e segurança regular dos nós; (3) mínima reação inflamatória tecidual e (4) taxa de infecção significativamente menor do que os fios de categute, constituindo-se fio de escolha em feridas infectadas. Como desvantagens, sua flexibilidade é apenas regular e apresenta custo elevado para o nosso meio. É preconizado para uso em sutura em praticamente todos os tipo de tecidos: peritoneal, muscular, aponeurótico, subcutâneo e, mesmo na pele, como sutura continua intradérmica. Na cavidade abdominal, pode ser utilizado em anastomoses gastrointestinais e biliodigestivas. Como não contêm material proteico, acido poliglicólico e a poliglactina 910 não sofrem a ação das enzimas proteolíticas pancreáticas, mas, possivelmente, amilase e lipase podem propiciar a sua desintegração. Assim, ambos devem ser evitados em anastomoses sob a ação de suco pancreático direto. Seu uso na camada aponeurótica não é defendido universalmente em face da perda precoce da resistência tênsil efetiva na linha de sutura em torno de quatro semanas. POLIGLACTINA 910 Apresenta características e aplicabilidades, assim como vantagens e desvantagens, relativamente similares às do fio de ácido poliglicólico, sendo um fio multifilamentar mais flexível e maleável do que aquele, por apresentar revestimento lubrificado (Vicryl®). Após 4 semanas mantém apenas 6% da sua força tênsil. Apresenta menor capilaridade e mais resistência do que o anterior. É fabricado nas cores branca e violeta, e este último não deve ser empregado na pele, sob risco de levar ao processo indesejado de tatuagem. Um novo fio (Vicryl Rapide®) foi lançado com indicação específica para sutura em feridas de pele e mucosas em que a absorção rápida possa ser benéfica, com forca tênsil mantida por cerca de 10 dias apenas, com absorção completa entre 30 e 40 dias e virtualmente isento de reação inflamatória tecidual. POLIGLECAPRONA Fio sintético, monofilamentar, absorvível em moderado espaço de tempo (90 a 120 dias) – Monocril®, Caprofyl®. Apresenta fácil manuseio, com pouco arrasto tecidual, força tênsil regular (diminuição progressiva a partir de 3 semanas), pequeno fenômeno de memoria, segurança regular dos nós e indução de ínfima reação tecidual. POLIDIOXANONA Fio sintético, monofilamentar, absorvível em um longo espaço de tempo e com grande e duradoura força tênsil – PDS®. Embora sua força tênsil seja menor do que a dos fios de ácido poliglicólico e poliglactina, ela se mantém durante mais tempo. Induz pequeno grau de reação tecidual, mesmo em presença de feridas infectadas. Apresenta boa segurança dos nos, memória baixa, mas seu manuseio não é tão fácil. Pode ser utilizado em qualquer tipo de anastomose no sistema digestivo, inclusive nas pancreáticas, apresentando desintegração bem mais controlada e uniforme. POLIGLICONATO Fio sintético, monofilamentar, absorvível por hidrolise, em longo espaço de tempo, em torno de 150 a 180 dias (Maxon®). É o fio que apresenta a melhor e mais duradoura força tênsil e a maior segurança em relação aos nós, em comparação aos outros fios absorvíveis. Apresenta manuseio muito fácil e tem pouco fenômeno de memória. A reação tecidual desencadeada é comparável à da polidioxanona. Está indicado para todos os tipos de tecidos, bem como para fechamento de parede abdominal. Seu grande inconveniente é ser o fio de mais alto custo. QUADRO 29.6 PRINCIPAIS FIOS CIRÚRGICOS NÃO-ABSORVÍVEIS SEDA Fio biológico, multifilamentar, trançado, não-absorvível. É fácil de manusear, flexível, apresenta pequena memória e força tênsil que decai muito lentamente. É recoberto por ceras, resinas, outro revestimento similar, visando a não provocar arrasto e floculação nos tecidos. Seus nós são seguros. Possui resistência superior à dos fios de algodão e linho, mas inferior à dos fios não- absorvíveis sintéticos. Provoca grande reação tecidual, podendo potencializar processos infecciosos. Pode ser utilizada em suturas gastrointestinais e para ligadura de vasos sanguíneos, sua grande vantagem está no baixo custo, junto com o linho e o algodão, mas o uso desses fios vem declinando, dando lugar aos fios sintéticos. ALGODAO Fio biológico, multifilamentar, torcido não-absorvível. É bem flexível e possui as mesmas características do fio de seda, mas tem menos resistência e maior tendência à floculação. Os fios de linho e algodão ganham 10% de força tênsil quando umedecidos. Por ser um fio de baixo custo, continua sendo muito utilizado em diversos procedimentos, como anastomoses gastrointestinais realizadas em dois planos, ligadura de vasos e mesmo nas camadas aponeuróticas, mas , devido a inúmeras desvantagens, tende ao desuso. LINHO Fio biológico, multifilamentar, não-absorvível. Pode, ocasionalmente, formar pequenos focos de abcessos que se situam superficialmente na ferida, fazendo saliência na pele e formando pequenos seios que não cicatrizam atéque o fio de sutura seja removido (reação tipo corpo estranho). Mesmas características dos anteriores. NAILON Fio sintético, polímero de poliamida, monofilamentar ou multifilamentar trançado, não-absorvível. Bem tolerado pelo organismo, devido à pouca reação tecidual que acarreta. Apresenta boa e duradoura força tênsil, que, porém decai a partir de 6 meses, e pouca ou nenhuma capilaridade (exceto na forma multifilamentar, menos utilizada). Possui pequeno arrasto tecidual. Dentre suas características indesejáveis destacam-se: (1) é um fio muito escorregadio, em face do baixo coeficiente de fricção, com os nós podendo se desfazer facilmente, a menos que se usem muitas alças para formas os nós, o que aumenta a quantidade de corpo estranho na ferida; além disso, a força utilizada para os nós pode levar ao corte dos tecidos; e (2) é rígido, pouco flexível, com alta memória. Por se constituir em um fio relativamente inerte, pode ser utilizado em quase todos os tipos de tecidos, prestando-se inclusive, para anastomoses gastrointestinais e biliares. POLIPROPILENO Fio sintético, monofilamentar e não absorvível – Prolene®. É extremamente liso com coeficiente de atrito arrasto tecidual muito baixos. É praticamente inerte, podendo ser utilizado mesmo em áreas infectadas, além de ter resistência praticamente imutável ao longo dos anos; porém propicia alto fenômeno de memória. Excelente fio para implantes de próteses cardíacas e anastomoses vasculares, mantendo sua força tênsil por tempo indefinido. Pode ser utilizado em praticamente todos os tipos de tecidos, sendo considerado o fio ideal para chuleios intradérmicos. No entanto é um fio mais dispendioso que o náilon. POLIESTER Fio sintético, não-absorvível, multifilamentar trançado. Pode ser sintetizado sem qualquer revestimento, tendendo a “cortar” suavemente ao passar pelos tecidos, ou com revestimento de teflon, silicone e polibutilato, que não levariam a esse efeito indesejado. Excetuando-se o de aço, o fio de poliéster é o mais forte de todos os fios. Determina pouca reação tecidual e constitui excelente escolha para o fechamento de aponeuroses, pela sua resistência e integridade duradouras. Necessita em torno de 5 alças de nós para torná-los seguros e apresenta média intensidade de fenômeno de memória. POLITETRAFLUOROETILENO Fio sintético, monofilamentar, não-absorvível, de uso mais recente, notadamente pela mínima reação tecidual que acarreta, levando bons resultados (PTFE®). Não tem sido rotineiramente usado em nosso meio. AÇO Fio mono ou multifilamentar torcido ou trançado, fabricado a partir de liga de ferro com carbono, de uso muito restrito na atualidade. É o fio de maior força tênsil existente e o que provê menor reação tecidual. É pouco flexível e pouco maleável, sendo desconfortável tanto para o paciente quanto para o cirurgião, furando seguidamente as luvas cirúrgicas e ocasionando ferimentos. Os nós comuns são impraticáveis com esse tipo de fio, sendo, por isso, fixados por meio de torção longitudinal de suas extremidades com o uso de pinças. Muitas vezes, esses fio têm que ser retirados por fazer muito volume e causar dor na parede abdominal, incomodando os pacientes; também devem ser retirados quando há infecção. O nó pode rasgar ou escapar do tecido, podendo ocasionar necrose em decorrência do nó muito apertado. Apesar de ser um fio forte, não é muito durável, fragmentando-se precocemente nos tecidos. Presta-se muito bem para a síntese óssea. QUADRO 29.7 ESCOLHA DO FIO CIRURGICO As características ideais para um fio de sutura são: (1) ser flexível; (2) mostrar grande resistência à torção e à tração; (3) ter fácil manuseio; (4) apresentar calibre fino e regular; (5) proporcionar facilidade para o nó cirúrgico; (6) desencadear pouca reação tecidual; (7) ser facilmente esterilizável; (8) não servir com nicho para o assentamento de infecções; e (9) ter baixo custo. Não existe um fio que possa ser considerado ideal para todos os tipos de órgãos ou tecidos. Em várias situações, diversos tipos de fios poderão servir, e a escolha dependerá do hábito, da experiência e do bom senso do cirurgião. Em outros casos, entretanto, a escolha pode ser muito restrita. O que se deseja é escolher o fio que proporcione um apoio mecânico adequado capaz de preservar a força de uma determinada ferida até que surja suficiente cicatrização para suportar qualquer estresse ou sobrecarga. Em tecidos que cicatrizam lentamente, como pele, fáscia e tendões, devem ser empregados fios não-absorvíveis ou absorvíveis em longo espaço de tempo (até seis meses). Em tecidos que cicatrizam rapidamente, como estômago, intestino e bexiga, podem ser empregados fios absorvíveis em médio espaço de tempo. Quando o resultado estético é importante, por exemplo, uma sutura em face, três aspectos principais devem ser considerados: (1) deve-se utilizar o fio monofilamentar de menor diâmetro possível, e mais inerte, como náilon ou polipropileno; (2) quando factível, suturas na pele devem ser evitadas, realizando-se fechamento intradérmico, sem exteriorização do fio; e (3) quando julgado pertinente, o uso de adesivos tópicos ou fitas deve ser apreciado, no lugar do fio cirúrgico. Como regra geral, não se deve implantar mais material estranho (fio cirúrgico) do que o estritamente necessário. Qualquer material estranho inserido em tecidos potencialmente contaminados pode converter uma discreta contaminação em infecção. Suturas realizadas em tecidos potencialmente contaminados devem ser realizadas com fios monofilamentares. Uma última recomendação diz respeito ao uso de material estranho na presença de fluidos corporais com alta concentração de cristaloides e em que possa ocorrer lipogênese, como nos tratos urinário e biliar. Em suturas nesse locais, deve-se optar pelo uso de material absorvível em médio espaço de tempo, como os fios de poliglactina 910 e acido poliglicólico e, ao menos teoricamente, nunca utilizar fios não-absorvíveis que possam atuar como nicho para precipitação de cristaloides e formação de cálculos. AGULHAS CIRURGICAS Existem vários tipos de agulhas cirúrgicas, as mais resistentes são fabricadas com puro aço inoxidável de alta qualidade, afiadas o bastante para penetrarem no tecido com trauma mínimo, e rígidas o suficiente para resistirem à curvatura; contudo também devem apresentar maleabilidade que permita o seu arqueamento antes de quebrarem. Seu diâmetro apresenta grande variação, assim, a escolha da agulha deve levar em consideração a espessura e o tipo de tecido em que será utilizada, a localização, o tamanho da sutura, a acessibilidade e a preferência do cirurgião. Suas variações incluem (1) a terminação; (2) o corpo; e (3) a ponta. As agulhas podem ter fios forjados/encastoados em sua terminação (chamados fios sertix) ou serem “nuas” – traumáticas, em que se montam os fios cirúrgicos, levando a traumatismo adicional dos tecidos por onde passam – ainda usadas por razões econômicas. As agulhas podem apresentar braço único (uma única agulha no fio) ou duplo (duas agulhas, uma em cada extremidade do fio). Essas ultimas são utilizadas, principalmente, para anastomoses vasculares. HASTES OU CORPOS DAS AGULHAS As agulhas podem ser retas ou curvas, e seu corpo (ou eixo) pode ser arredondado, triangular ou achatado. Dentre as curvas, existe uma grande variedade de formatos e tamanhos, mas como regra geral, elas seguem a circunferência de um círculo e podem se constituir em apenas um pequeno arco ou mais da metade da circunferência. Comumente são disponibilizadas em quatro modelos diferentes: 5/8 de círculo; 1/2 de círculo; 3/8 de círculo; e 1/4 de círculo, todas a serem apreendidas com porta agulha. A agulha reta somente é utilizada na pele, sendo segura pelos3 primeiros dedos. Há também um terceiro tipo de agulha, chamada mista ou semicurva, que apresenta uma haste reta com extremidade curva. FIGURA 29.2 As agulhas de 1/4 e 3/8 de círculo são utilizadas em procedimentos operatórios superficiais, ao passo que as de 1/2 e 5/8 de círculo se prestam à profundidade das feridas e das cavidades corpóreas por permitirem rotação mais fácil e segura do porta-agulhas. O corpo da agulha deve apresentar diâmetro o mais próximo possível do fio que carreia, para não determinar dano tecidual desnecessário. Em alguns casos, o corpo pode ser estriado para melhorar o contato com o porta-agulhas. Dessa forma, interage com o porta- agulha e transmite a força de penetração a sua ponta. O tamanho de uma agulha é fornecido pela mensuração de todo o seu comprimento, quando tornado reto. FIGURA 29.3 PONTAS DAS AGULHAS São apresentadas em oito tipos diferentes: cortante, cortante convencional ou triangular, cortante invertida ou triangular inversa, espatular ou hexagonal, romba, afilada ou cilíndrica, em lanceta e com a ponta de precisão ou de diamante. Contudo, quanto ao formato de seu corpo e ponta, os tipos mais frequentemente utilizados são: (1) cilíndricas ou redondas, com secção circular – penetram nos tecidos por divulsão, de forma atraumática; são usadas em suturas delicadas como no tubo digestório e vasos sanguíneos; um outro tipo de agulha com corpo cilíndrico e ponta romba é comumente utilizado em tecidos pouco resistentes, como baço e fígado; (2) triangulares e espatuladas – com arestas cortantes e que, ao penetrarem nos tecidos, seccionam suas fibras; são empregadas em estruturas mais resistentes, como aponeurose e pele; e (3) mistas – com corpo cilíndrico e ponta triangular. FIGURA 29.4 ORIFICIOS OU OLHOS DAS AGULHAS Podem ser únicos ou duplos, com três principais: elíptico, quadrado e francês. Os fios são “montados” nessas agulhas acarretando maior traumatismo tecidual. Um quarto tipo de “orifício é utilizado nas agulhas de uso único e é dito atraumático. FIGURA 29.5 Alguns tipos de agulhas apresentam o princípio da liberação controlada (control release), que facilita sua separação do fio, quando desejada pelo cirurgião. Sem alterar as propriedades de encastoamento (preensão), uma discreta e firme pressão em sentido reto no porta-agulha promoverá a liberação do fio. Essa característica permite a realização de uma extensa linha de sutura interrompida com muito mais rapidez, sem perda de qualidade. AGULHA DE DESCHAMPS FIGURA 29.6 O carregador de fios de Deschamps, ou agulha de Deschamps, é uma agulha acoplada a uma haste, com pontas relativamente rombas, em que o fio é posicionado em sua extremidade, passado sob a estrutura desejada, e, posteriormente, retirado da “agulha” para que se possa realizar o nó cirúrgico. Esses carregadores são apresentados com extremidades curvas para a direita e para esquerda, conforme o que se deseja realizar. São de grande utilidade na confecção de nós provisórios, temporários ou falsos, como, por exemplo, nas ligaduras temporárias das artérias tireóideas inferiores, durante uma tireoidectomia subtotal.
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