Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
OZONIOTERAPIA NA ODONTOLOGIA Carlos Nogales Mestrando em Endodontia pela USP – São Paulo INTRODUÇÃO O que é ozônio? Ozônio é um composto químico que consiste de 3 átomos de oxigênio (O3 – oxigênio triatômico), uma forma mais energética que o oxigênio atmosférico (O2). Desta forma, as moléculas dessas duas formas diferem em estrutura (figura 1). Este é um dos gases mais importantes na estratosfera, graças a sua capacidade de filtrar os raios UV, auxiliando, assim, a manutenção do equilíbrio biológico na biosfera. Esta camada protetora pode ser representada como o céu azul. Figura 1 – Produção do ozônio (Nogales et al., 2008) Como o ozônio é produzido? A reação de produção do ozônio consiste de uma descarga elétrica sobre a molécula de oxigênio, quebrando-a em dois átomos de oxigênio que se combinam com outra molécula de oxigênio, transformando-se na molécula de ozônio. O ozônio é produzido naturalmente através de dois diferentes métodos: • Raios ultravioletas provenientes do sol; • Descarga elétrica após tempestades. A forma médica/odontológica do ozônio é gerada a partir do oxigênio medicinal puro. Não é recomendado o uso do ar atmosférico devido a concentração do oxigênio ser variável. O ar atmosférico é composto por 71% de nitrogênio, 28% de oxigênio e 1% de outros gases, inclusive O3 passando por alterações dependentes da altura, temperatura e poluição. Na prática médica e odontológica, três métodos são capazes de gerar o gás ozônio: • Sistema ultravioleta: produz baixas concentrações de ozônio. É usado na prática da estética, sauna e purificação de ambiente; • Sistema corona: produz altas concentrações de ozônio. O mais comum na prática médica/odontológica. Fácil manuseio e a taxa de produção de ozônio é controlada. • Sistema Cold-Plasma: é usado para purificação de ambientes e água. Princípios do ozônio médico/odontológico O ozônio médico ou odontológico é uma mistura do puro oxigênio e do puro ozônio na proporção de 0.05% a 5% de O3 95% a 99.95% de O2. Graças a instabilidade da molécula de ozônio, a forma médica/odontológica de ser preparada imediatamente antes do uso, porque menos de uma hora depois menos da metade da mistura permanece a mesma e a outra parte se transforma novamente em oxigênio. A conseqüência desta propriedade é a impossibilidade de armazenamento por um longo período de tempo. Para o uso posterior é necessário associá-lo a algum veículo que de acordo com a viscosidade, a decomposição do ozônio em oxigênio pode ocorrer de maneira mais rápida ou mais lenta, aquoso ou viscoso respectivamente. Aspectos Históricos O químico alemão Christian Friedrich Schonbein é considerado o pai da ozonioterapia (1840). Ele realizou uma descarga elétrica na água a qual produziu um odor estranho chamando-a do Ozon, que deriva do Grego ozein (cheiro). O cirurgião autríaco Ernst Payr, após ser tratado com ozônio por Edward Fisch, o primeiro dentista a utilizar o ozônio, tornou-se um entusiasta a começou sua linha de pesquisa. À época a ozonioterapia era difícil e limitadas devido à falta de materiais ozônio resistentes, tais como Nylon, Dacron e Teflon. Apenas em 1950, os materiais ozônio resistentes foram fabricados. Então o físico, doutor e alemão Joachim Hansler, juntou-se a outro alemão, doutor em medicina, Hans Wolff e ambos desenvolveram o primeiro gerador para fins médicos, o qual permanece sendo a base dos equipamentos contemporâneos. Toxicidade do Ozônio Complicações com a ozonioterapia não são freqüentes, apenas em 0.0007/aplicação. A inalação do ozônio pode ser tóxica ao sistema pulmonar e outros órgãos. Como efeitos colaterais conhecidos registram-se lacrimejamento e irritação das vias aéreas superiores, rinite, tosse, dor de cabeça e ocasionalmente náusea e vômito. Devido ao poder oxidativo do ozônio, todos os materiais em contato com o gás devem ser ozônio resistentes, como vidro, silicone e Teflon. Em caso de intoxicação o paciente deve ser deitado, fazer inalação com oxigênio umidificado e administrar ácido ascórbico, vitamina E e nacetilcisteína. Contra indicação da ozonioterapia • Gravidez; • Deficiência da Glicose-6-fosfato-dehidrogenase (favismo) • Hipertiroidismo • Anemia severa • Miastenia severa • Hemorragia ativa Métodos de administração do ozônio médico O alto poder oxidativo e ação sobre bactérias, vírus e fungos indicam a ozonioterapia para o tratemento de 260 patologias. A ação sistêmica do gás tem sido feita através de diferentes formas, como segue: • Autohemoterapia Maior: tratamento do sangue extra corpóreo e a reinfusão intravenosa do sangue do paciente. É indicada para o tratamento de desordens circulatórias arteriais, infecções, promove imunoativação, terapia adicional aos pacientes com carcinoma, campo da geriatria e artrite reumatóide. Esse tipo de terapia promove: o Ativação do metabolismo das células vermelhas do sangue com aumento do 2,3-difosfoglicerato e ATP resultando na melhora da liberação de O2 para o tecido. o Ativação de células imunocompetentes com a liberação de citocinas, tais como, interferons e interleucinas. • Insuflação retal O3/O2: é indicada para as desordens circulatórias arteriais (estágio II), imunoativação geral, coadjuvante a terapia do câncer e hepatites A, B e C. Apresenta praticamente os mesmos efeitos da Autohemoterapia maior. • Autohemoterapia menor: tratamento do sangue extra corpóreo e reinfusão intramuscular. É indicada para alergias, acne, furunculose, coadjuvante à terapia do câncer. O mecanismo de ação promove uma ativação não-específica do sistema imune e promove uma estimulação geral. O uso do Ozônio na Odontologia Introduzido na Odontologia por Edward Fisch em 1950 o uso do ozônio é interessante devido ao grande número de doenças infecciosas. A ozonioterapia apresenta grandes vantagens quando usada para apoiar os tratamentos convencionais. REVISÃO DA LITERATURA Geradores de Ozônio Odontológico A aplicação do gás ozônio tem sido advogada para o uso em Odontologia para esterilização de cavidades, canais radiculares, bolsas periodontais e lesões herpéticas. A CurOzone USA Inc (Ontário, Canadá) desenvolveu o HealOzone que agora é distribuído pela KaVo Dental (KaVo, Biberach, Alemanha) para o uso em Odontologia. Millar e Hodson compararam a seguridade de dois equipamentos, Ozi-cure (não mais disponível ou com licença para uso na Europa) e o HealOzone, sobre a quantidade de ozônio que escapa durante a aplicação do gás. O Ozi-cure quando usado sem uma adequada sucção permite que o ozônio alcance concentrações acima dos níveis permitidos e dessa forma, não deve ser usado. O HealOzone foi seguro no seu uso. Ozonioterapia nas especialidades odontológicas Estudos recentes provaram a efetividade da aplicação do ozônio em ambos os campos médicos e odontológicos e suas indicações em praticamente todas as especialidades. Prótese A placa microbiana que acumula na superfície de adaptação das dentaduras é composta por várias espécies de microrganismos, principalmente Cândida albicans. O controle da placa na dentadura é essencial para a prevenção de estomatites. Tentando resolver este problema, Arita et al. avaliaram o efeito da água ozonizada em combinação com ultrassom sobro Cândida albicans. Os autores encontraram que a exposição ao fluxo de água ozonizada (2 ou 4mg/L) por um minuto não encontraram C. albicans viáveis. Isto sugerem que a aplicação da água ozonizada pode ser útil na redução de Cândida albicansdas dentaduras. Cirurgia Bucomaxilofacial Stunbinger e Filippi descreveram a efetividade local do ozônio em feridas infectadas intraoral após alta dose de radioterapia em um estudo clínico envolvendo 11 pacientes. Na cirurgia menor odontológica, Guerra et al. compararam o use do óleo ozonizado –Oleozon – (grupo experimental) com o Alvogil e terapia antibiótica (grupo controle) no tratamento da alveolite.Foi observado que os pacientes tratados com Oleozon apresentaram um processo de cura mais rápido sem a necessidade de medicação sistêmica, quando comparada ao grupo controle. Assim, é possível concluir que o óleo ozonizado pode ser usado com efetividade no tratamento da alveolite. Ozonioterapia X Cáries Como uma modalidade de tratamento não traumática, a ozonioterapia tem um grande potencial para ser inserida na prática odontológica. Alguns estudos disponíveis avaliaram a efetividade do ozônio sobre cárie de fóssulas e fissuras, cárie oclusal não cavitada e cárie primária de raiz, mostrando uma redução significante no número de microorganismos nas lesões in vitro ou com curto acompanhamento. HealOzone, um gerador de ozônio, foi introduzido como uma alternativa conservadora para o tratamento de cáries primárias, com a aplicação do gás sobre as lesões de cárie por um período de 10 a 20 segundos ocorre a redução de 99% do número de microorganismos presentes na carie in vivo. Fatores relacionados com a reversão da cárie devem incluir o tamanho e localização, o número total de microorganismos em lesões pequenas e não cavitadas apresentam uma redução maior depois da aplicação do que lesões muito extensas e lesões próximas da margem gengival apresentam uma menor redução de microorganismos. Polydorou et al. avaliaram a atividade antibacteriana de dois diferentes tempos de aplicação do HealOzone (40 e 80 segundos) em um modelo de cavidade dental e essa atividade antibacteriana do ozônio foi comparada com dois agentes de união dentinária. Os resultados foram que todos os tratamentos antibacterianos testados reduziram significativamente os níveis de Streptococcus mutans comparado com o controle. Entretanto, a aplicação do ozônio por 40 segundos foi menos efetiva do que os outros três grupos. Em conclusão, este estudo mostrou que uma aplicação de 80 segundos do ozônio com o equipamento HealOzone é uma terapia muito promissora para eliminar microrganismos de cavidades profundas. Por outro lado, Baysan et al. avaliaram o efeito antimicrobiano in vitro da aplicação do ozônio na microflora da dentina infectada associada a lesões de cárie oclusal não cavitada e subseqüentemente determinou o efeito do gás na viabilidade de bactérias presentes na dentina infectada exposta associada a essas lesões. O ozônio falhou na redução do número de bactérias viáveis na dentina infectada sob o esmalte, sugerindo que o mecanismo de ação do ozônio sobre as bactérias ocorre de uma maneira indireta. Celiberti et al avaliaram a influência do ozônio no esmalte antes do preparo e selamento. Os resultados indicaram que o ozônio não influenciou nas propriedades físicas do esmalte e não melhorou nem piorou a habilidade seladora. Assim, o ozônio pode ser aplicado sobre esmalte intacto ou preparado no processo restaurador. Periodontia Nagayoshi et al examinaram o efeito da água ozonizada sobre microrganismos e placa dental. Quase nenhum microrganismo foi detectado após o tratamento com água ozonizada (4mg/L) por 10 segundos. Quando a placa dental experimental foi exposta à água ozonizada, o número de celular viáveis mais uma vez diminuiu. A água ozonizada inibiu fortemente a formação da placa dental in vitro. Estes resultados sugerem que a água ozonizada pode ser útil para reduzir infecções causadas por microrganismos presentes na placa dental. Huth et al em um estudo in vitro avaliou se o ozônio gasoso ou aquoso exercia algum efeito tóxico sobre células epiteliais humanas e células fibroblasto de gengiva comparados com antissépticos já disponíveis (digluconato de clorexidina 2% e 0.2%; hipoclorito de sódio 5.25% e 2.25%; peróxido de hidrogênio 3%) por um período de 1 minuto e comparado com o metronidazol, por 24 horas. Como resultado o autor encontrou que o ozônio gasoso foi tóxico à linhagem de células e o aquoso foi o mais biocompatível. Endodontia Por causa das infecções polimicrobianas que acometem casos de periodontite apical, a busca por soluções com alto poder antimicrobiano a que ofereçam uma mínima injúria aos tecidos periapicais é o principal foco da pesquisa atual. O poder oxidativo do ozônio caracteriza-o como um eficiente antimicrobiano e sua indicação para a terapia endodôntica parece ser muito apropriada. Sua ação antimicrobiana foi demonstrada em pesquisas in vitro sobre cepas da bactérias tais como: micobacteria, Stafilococcus, Streptococcus, Pseudomonas, Enterococcus and Escherichia coli (Sechi et al), Stafilococcus aureus (Velano et al), Enterococcus faecalis (Hems et al) e Cândida albicans (Arita et al). Pereira avaliou os efeitos radiográficos, histopatológicos e histobacteriológico da medicação intracanal com óleo ozonizado, pasta de hidróxido de cálcio associada com paramonoclorofenol canforado e glicerina (HPG) para o tratamento endodôntico de dentes com lesão periapical. A análise dos dados não revelou diferença significante entre a resposta do tecido perirradicular para ambas as medicações, sugerindo que o óleo ozonizado pode ser usado na Endodontia como medicação intracanal. Nagayoshi et al avaliaram o efeito da água ozonizada sobre Enterococcus faecalis e Streptococcus mutans em dentes bovinos contaminados. Uma diminuição siginficante intratubular dessas bactérias foi observada. Isto foi melhorado após a agitação mecânica, aproximando o efeito da água ozonizada ao hipoclorito de sódio 2.5%. A citotoxicidade da água ozonizada também foi avaliada em fibroblasto de rato. A atividade metabólica dos fibroblastos foi maior quando tratadas com água ozonizada enquanto uma diminuição destas células foi observado quando elas foram expostas ao hipoclorito de sódio. Hems et al avaliaram o potencial antimicrobiano do gás em cepas isoladas de Enterococcus faecalis. O biofilme incubado por 240 segundos com a água ozonizada não revelou redução da microflora. Em conclusão, o ozônio teve ação antimicrobiana sobre Enterococcus faecalis planquitônico, mas pouco efeito quando essa bactéria está organizada em biofilme. Cardoso avaliou a eficiência da água ozonizada como um agente irrigante durante o tratamento endodôntico para eliminar Cândida albicans e Enterococcus faecalis e neutralizar lipopolissacarídeo (LPS) inoculado em canais radiculares. Foi possível observar efetiva ação antimicrobiana após 10 minutos de ozonização da água na suspensão bacteriana. Houve ausência de resíduo após sete dias quando uma segunda coleta foi realizada. Entretanto, a água ozonizada não foi capaz de neutralizar LPS de E. coli no interior do canal radicular e a quantidade remanescente do LPS pode ser responsável por conseqüências biológicas como periodontite apical. Estrela et al testaram a eficiência da água ozonizada, ozônio gasoso, hipoclorito de sódio 2.5% e clorexidina 2% em canais radiculares humanos infectados por Enterococcus faecalis e resultou que nenhuma das soluções testadas foi eficaz contra a suspensão bacteriana. Estomatologia Sechi et al avaliaram o efeito do óleo de girassol ozonizadoem diferentes espécies de bactérias isoladas de diferentes locais. O óleo mostrou-se efetivo contra todas as bactérias, sendo a micobacteria a mais susceptível. Macedo e Cardosodescreveram um relato de caso clínico da aplicação do óleo ozonizado sobre herpes labial e osteomielite mandibular e mostrou um reparo mais acelerado em comparação com os protocolos convencionais. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Introduzido na Medicina pelo químico alemão Christian Friedrich Schonbein, em 1840, a ozonioterapia aparece como uma nova modalidade terapêutica com grandes benefícios aos pacientes. A conhecida e potente ação antimicrobiana do ozônio, acrescida da capacidade de estimular o sistema sanguíneo e modular a resposta imune, faz este agente terapêutico indicado para o tratamento de 260 patologias médicas, dentre elas Hepatite, herpes simples, Zoster, disfunções circulatórias, doenças imunes e outras. Seu uso na Odontologia é interessante devido ao grande número de doenças infecciosas. O ozônio foi introduzido por Edward Fisch em 1950 usando-o para o tratamento de feridas infectadas e infecções periodontais crônicas. Atualmente o foco da pesquisa tem se voltado para a determinação de protocolos de uso. A principal linha de pesquisa é desenvolvida com base no aparelho HealOzone e sua ação sobre tecido cariado em fóssulas e fissuras, lesões de cárie não cavitadas, lesões de cárie primária de raiz. A ação do ozônio sobre a microbiota constituinte dessa patologia é conhecida pelos estudos, entretanto um desacordo ocorre em relação ao tempo de aplicação do gás. Um estudo sugere que em um prazo de 10 a 20 segundos a aplicação do gás remove cerca de 99% dos microrganismos, em contra partida há relato que a aplicação por 40 segundos não foi eficiente na descontaminação e não atuou sobre a dentina contaminada sob o esmalte. Na Endodontia o mesmo desacordo ocorre em relação à inativação da microbiota intracanal, fazendo uso principalmente da água ozonizada. Os estudos relacionam diversas concentrações, entretanto não há um consenso com relação à determinação de um protocolo seguro e confiável. Tais desacordos podem estar relacionados com diferenças metodológicas vinculadas à falta de pesquisas in vitro e in vivo de longo prazo, estudos randomizados e duplo cego. Diante do exposto, o futuro da ozonioterapia deve focar o estabelecimento de parâmetros seguros e bem definidos através de estudos randomizados e controlados a fim de determinar precisas indicações e protocolos para o tratamento das mais diversas patologias médicas e odontológicas.
Compartilhar