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Relacoes Etnicas Resumo NP2

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Africanidades: alguns aspectos da História Africana dos Negros no Brasil
Em primeiro lugar, cabe-nos definir o conceito de africanidades brasileiras. Trata-se de um processo de valorização e resgate da história e cultura africana e afro-brasileira, a fim de desfazer os estereótipos raciais construídos pelos grupos dominantes (brancos, homens, proprietários, livres e ricos). Assim, podemos dizer que esse é um paradigma que considera a perspectiva dos negros brasileiros na formação da cultura e da sociedade brasileira. Significa enxergar o mundo através de uma lente sob a perspectiva dos afrodescendentes, segundo nos define Silva (2003, p. 26):
A expressão africanidades brasileiras refere-se às raízes da cultura brasileira que têm origem africana. Dizendo de outra forma, queremos nos reportar ao modo de ser, de viver, de organizar suas lutas, próprio dos negros brasileiros e, de outro lado, às marcas da cultura africana que, independentemente da origem étnica de cada brasileiro, fazem parte do seu dia-a-dia.
(...) Então, estudar Africanidades Brasileiras significa estudar um jeito de ver a vida, o mundo, o trabalho, de conviver e lutar por sua dignidade, próprio dos descendentes de africanos que, ao participar da construção da nação brasileira, vão deixando nos outros grupos étnicos com que convivem suas influências, e, ao mesmo tempo, recebem e incorporam as daqueles.
A partir, portanto, dessas concepções, é mister que façamos essa reconstrução histórica através de uma perspectiva diferente daquela que temos utilizado em nossas escolas durante tanto tempo. Uma perspectiva que dê a conhecer a grande participação dos africanos na formação do Brasil. Uma perspectiva que os apresente não apenas em sua condição de escravizados, mas como personagens participantes da construção histórica, que, com suas culturas, línguas, formas de organização e economia, participaram expressivamente da construção disso que somos hoje.
3.1. Pegando o fio da história: a África antes de 1500
Em geral, fomos ensinados a pensar a partir de uma série de concepções bastante deturpadas ou incompletas sobre o continente africano e sua população, concepções essas em geral propagadas pelo pensamento conservador, responsável em grande medida pela formulação do chamado racismo científico.
É nesse sentido que toda a história da África passou a ser sistematicamente distorcida, esquecida ou menosprezada nos livros de história e assim foi transmitida a nós e aos nossos alunos há tantas gerações. Vamos começar a rever um pouco tudo isso e tentar pegar o fio dessa história, primeiramente com um trecho de Salum (2005, sem página):
Para compreendermos a cultura material das sociedades africanas, a primeira questão que se impõe é a imagem que até hoje perdura da África, como se até sua "descoberta", fosse esse continente perdido na obscuridade dos primórdios da civilização, em plena barbárie, numa luta entre Homem e Natureza. 
De fato, a história dos povos africanos é a mesma de toda humanidade: a da sobrevivência material, mas também espiritual, intelectual e artística.
A impressão que temos a partir do que estudamos em nossa vida escolar, é de que a África, antes do início da exploração portuguesa, era um território “perdido no mapa”, com povos “primitivos”, sem cultura escrita e com tribos selvagens que guerreavam e se escravizavam mutuamente. Atualmente, nosso conhecimento sobre esse continente é tão parco que chegamos a pensar nele como um único país, “a África”. Oliva (2003, p. 423) inicia seu artigo, intitulado “A História da África nos bancos escolares: representações e imprecisões na literatura didática”, fazendo a seguinte pergunta: “O que sabemos sobre a África?”. Repare como sua resposta nos parece infelizmente bastante familiar:
Quantos de nós estudamos a África quando transitávamos pelos bancos das escolas? Quantos tiveram a disciplina História da África nos cursos de História? Quantos livros, ou textos, lemos sobre a questão? Tirando as breves incursões pelos programas do National Geographic ou Discovery Channel, ou ainda pelas imagens chocantes de um mundo africano em agonia, da AIDS que se alastra, da fome que esmaga, das etnias que se enfrentam com grande violência ou dos safáris e animais exóticos, o que sabemos sobre a África? Paremos por aqui. Ou melhor, iniciemos tudo aqui.
É verdade: temos que reconhecer que sabemos nada ou quase nada sobre a África. A partir dessa primeira constatação, cabe-nos, como educadores, a responsabilidade de sanar tal deficiência em nossa formação e procurar nos apropriar dos conteúdos sobre a história da África e dos negros no Brasil, disponíveis na íntegra para downloads na Internet.
3.2. Heranças coloniais africanas e a formação de um país chamado Brasil 
Primeiramente, acompanhe conosco esta breve revisão histórica: sabemos que o Brasil é resultado de um longo processo de exploração colonial promovido por Portugal, com apoio financeiro da burguesia de então que, apesar de ainda não deter o poder político no século XVI, já era proprietária de boa parte das riquezas disponíveis na época, reservas suficientes para servirem de investimentos às empresas colonizadoras portuguesas rumo às Américas.
Assim, é importante ficar claro que já estávamos em pleno capitalismo moderno e que o Brasil nada mais era do que um negócio bastante interessante e promissor, tanto para os monarcas portugueses que comandaram politicamente a empreitada colonizadora, quanto para os burgueses e homens de negócio da Europa que patrocinavam tais empreendimentos.
Existe uma linha de raciocínio que já faz parte de nosso senso comum, segundo a qual os problemas do Brasil estão diretamente ligados à formação de sua população, uma vez que teriam sido mandados para cá os “piores cidadãos” portugueses, indesejados na Europa, quase “deportados” para uma terra onde poderiam “fazer do seu jeito” todas as coisas reprováveis que antes faziam em Portugal. Daí vem também uma das explicações correntes sobre o nosso “jeitinho brasileiro”, no sentido de que as leis não funcionam aqui porque desde a formação do Brasil foram trazidos para cá somente ladrões, bandidos, vagabundos, prostitutas e desocupados de todo tipo.
Isso não é verdade e a explicação fundamental está no fato de sermos, naquela época, a empresa mais rentável de Portugal. 
Portanto, tínhamos aqui uma base importante para o sustento da monarquia portuguesa, que já enfrentava problemas sérios, tanto políticos quanto econômicos, para se manter nas relações capitalistas europeias daquele momento. É nesse sentido que homens e mulheres passam a ser enviados ao Brasil com a incumbência de fazer esse país-continente fornecer riquezas suficientes para sustentar os luxos e extravagâncias da família real e sua aristocracia e, ao mesmo tempo, para pagar os investimentos feitos pela burguesia de então, elite econômica durante aquele período.
Foi com essa mentalidade que os portugueses começaram a explorar de todas as formas o território brasileiro, retirando de nossos solos e florestas todas as matérias-primas que tivessem algum valor no mercado capitalista europeu.
Muito cedo, entretanto, os portugueses perceberam que um dos grandes problemas que teriam em sua missão de exploração brasileira seria a escassez de mão de obra para realizar um trabalho de tão grande monta como o que precisava ser realizado por aqui. 
Uma solução encontrada foi a de trazer negros africanos, vindos de Angola e do Congo, para trabalharem na agricultura. Como os portugueses já dominavam a arte das navegações, não foi difícil forçar populações africanas a se transferirem para o Brasil, submetendo-os a uma das condições de vida e trabalho mais desumanas que a história já assistiu.
É interessante que, mais uma vez, o que aprendemos em nossos bancos escolares a respeito das justificativas sobre o tráfico negreiro aponta os índios como seres acostumados à liberdade e que se recusaram ao trabalho escravo; já os negros, por estarem acostumados à escravidão já existente no continente africano,teriam se submetido mais passivamente à condição de objeto, coisa. Novamente, são explicações que não fazem qualquer sentido lógico. 
Pois é, mais uma vez podemos verificar como esse processo, cujas raízes são profundas, perdura até os dias de hoje, sendo que tais representações ainda aparecem na maioria dos livros didáticos disponíveis para nossos alunos e professores.
É nesse sentido que acreditamos ser possível enxergar a História da África e suas implicações para a História do Brasil de maneira bastante diferente daquela utilizada em nossos bancos escolares. Ao nosso ver, a apropriação que fazemos de cada fato histórico recontextualizado segundo a perspectiva das africanidades brasileiras, abrirá possibilidades e potencialidades na ação/relação educativa, capazes de refazer nossas raízes autoritárias e racistas e promover, por fim, uma realidade de igualdade entre todos e todas.
 Módulo 6 A - 
RESISTÊNCIA NEGRA E O MOVIMENTO ABOLICIONISTA: ACONTECIMENTOS ANTES E DEPOIS DA LEI ÁUREA. ESTEREÓTIPOS RACIAIS A PARTIR DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL: O PROCESSO DE MARGINALIZAÇÃO DO NEGRO
Hélio Santos, cita a dor que “são muitas as feridas da patologia racial brasileira que o país acumulou ao longo do tempo. Assim, a dor é inevitável. Há quem conclua —, incorretamente — que na vida se possa acostumar a tudo, até mesmo com a dor. Tratando-se de um machucado tão antigo, colocar para fora o sangue ruim pode ser o caminho para a cura.
Para compreender toda a problemática que envolve a escravidão no Brasil é necessário que você se debruce na verdadeira história, aquela que é desvendada pelos estudiosos do tema, entre eles Hélio Santos.
Na página 66 do livro de Hélio Santos é citada a questão da identidade, entende-se por identificar quem nós somos, como os outros me veem enquanto cidadão. A identidade é fundamental para um indivíduo, para sentir-se bem é pré requisito para “conquistar e reforçar a autoestima, sentir-se ótimo e pronto para a vida”. 
Assim, como não é possível um chinês passar por judeu, o mesmo ocorre com um negro que pensa poder passar por um branco(SANTOS,2011). Hélio Santos cita que na verdade há dores conscientes e inconscientes em todo esse processo (2011, p.64).
RACISMO: A LEGITIMAÇÃO DA ESCRAVIDÃO (PÁG 65 E 66)
Escravidão patriarcal = os derrotados tornavam-se escravos (Na antiguidade a escravidão era originária das guerras não conotação racial)
Escravidão colonial= a crença dos invasores europeus da inferioridade dos negros legitimou e autorizou o rapto destes na África.
  400 mil pessoas raptadas na África não chegaram no Brasil.
4 milhões de africanos + os “crioulos” os que viriam a nascer  - trabalharam muito.
 Para os escravistas os negros eram desprovidos de inteligência e não possuíam alma.
O COTIDIANO DO ESCRAVO (PÁG. 67 A 69)
- O escravismo é uma violência. Não há o que possa justificá-lo. No Brasil prevaleceu a ideia que o índio não era escravizável, o negro sim.
- O trafico de negros chegou a render 4.000%. Hoje, só o tráfico de cocaína rende tanto dinheiro.
Era difícil os cativos terem família ou romancear as relações.
1.    A dificuldade da relação verdadeira;
2.    O afastamento e confinamento das mulheres;
3.    A dificuldade de construir uma família (grupos étnicos diferentes)
DO ESCRAVO-TRABALHADOR A TRABALHADOR– ESCRAVO (PÁG. 77-88)
A Lei 3.353 de 13 de maio de 1888 não aboliu a escravidão (abolir no sentido de acabar). A chamada Lei Áurea apenas declarou a escravidão extinta. Há uma diferença entre extinguir uma coisa e declará-la extinta.
As elites preservaram tudo para si e, após 350 anos de superexploração da força de trabalho negra, passaram a optar pela mão de obra importada da Europa. Após a abolição, a população negra partiu da senzala para as margens.
Na página 79, Hélio Santos cita que às oportunidades no mundo do trabalho o ex-escravo tinha três caminhos possíveis:
Optar por permanecer junto àqueles negros que já estavam libertos e trabalhar em condições análogas às anteriores;
Tentar atuar onde havia produtividade, criando condições para a sua efetivação em um verdadeiro mercado de trabalho; 
Os negros poderiam ainda enfrentar a concorrência da mão de obra vinda da Europa (sobretudo a italiana), que estava em melhores condições de atuar em um regime de trabalho livre. 
ENTENDA O DIA SEGUINTE AO DA ABOLIÇÃO (PÁG. 79-80)
- 700 mil pessoas foram colocadas de uma só vez em disponibilidade num mercado de trabalho fictício.
- A magnitude numérica desse fato foi tão aguda que ainda hoje se faz sentir os seus efeitos danosos à população negra.
- Os 350 anos de escravidão acabaram por estigmatizar o negro como escravo, pois não o viam como alguém qualificado para as relações de trabalho livre.
Lembre-se os escravos contribuíram significativamente por mais de 350 anos e ajudaram a enriquecer a sociedade e a economia brasileira. No entanto, com o fim da escravidão, segundo Santos (2011, pag. 79-80), “a população negra partiu da senzala para as margens”. Isto é, não recebeu nenhum benefício por todo o trabalho prestado para a sociedade brasileira.
MÓDULO 6 B -
Movimentos sociais e ações afirmativas: é possível acelerar o processo de mudança?
Após estudarmos o livro de Hélio Santos, e compreendermos a complexa interpretação que este autor nos fornece sobre a trilha do circulo vicioso do racismo brasileiro, você deve estar se perguntando: mas, afinal, será possível reverter esse processo perverso?
Pois a nossa tese é: Sim! Isso é possível! A partir deste módulo, começaremos a apresentar algumas dessas possibilidades, partindo dos movimentos negros que tradicionalmente lutam contra o racismo e por igualdade de condições, e passando à definição de ações afirmativas e suas principais implicações. 
6.1 Movimentos negros na luta contra o racismo: para uma nova condição afrodescendente
Muitos de nós, ao longo de nossa trajetória escolar, já devemos ter nos deparado com algumas das seguintes explicações para a escravização do negro e para a posição que este ocupa até hoje em nossa sociedade: 
a) Durante o processo de colonização do Brasil feita pelos portugueses, a escravização do negro foi “preferível” à do índio, pois aquele sempre fora mais “passivo”, “aceitando” de forma mais mansa sua própria escravização. 
b)  Ou então: o negro, por ser mais “preguiçoso”, se acomodava à sua condição de escravo, o que fez com que permanecesse nela por quase 400 anos. São ideias que sustentam ideologicamente concepções naturalizantes da condição do negro como escravo, como se os africanos já tivessem nascido escravos, numa tentativa de apagar todo o processo econômico e social de escravização de pessoas negro-africanas por escravizadores portugueses brancos. 
c)  Ou ainda: os negros estão na situação em que estão hoje porque querem, porque não têm “competência” para “conquistar” o que os brancos conquistaram.
São explicações esdrúxulas e indignantes, mas que infelizmente todos nós já ouvimos pelo menos uma vez na vida. Para que a crítica que estamos realizando fique mais clara, pedimos que você reflita sobre os seguintes questionamentos: 
         Será mesmo que alguém pode se “acomodar” à condição de escravizado ou toda a história da resistência negra sempre foi propositalmente esquecida pelos historiadores?
         Será que o negro realmente “aceitou passivamente” sua escravização ou se organizou em inúmeros movimentos ao longo da história colonial, imperial e republicana brasileira, movimentos esses nunca citados nos livros de História?
         Será que as estatísticas que insistentemente mostramos anteriormente confirmam a “superioridade” e “competência” do branco em relação à “falta de capacidade” do negro ou são o reflexo da sociedade desigual, aristocrática e racista na qual vivemos?
É lógico que você já percebeu que nossa tese nesta disciplina procura confirmar sempre a segunda parte das perguntas anteriores, não é? Neste módulo, queremos reforçar o papel do movimento negro contemporâneo na luta contra as desigualdades raciais noBrasil, bem como na promoção de outra condição para os afrodescendentes, a partir, principalmente, de uma tomada de consciência dessas questões e da implantação de políticas de ações afirmativas, das quais falaremos em seguida.
Descatamos ainda a importância de que as crianças aprendam nas escolas uma outra história do Brasil, uma história recontada, que desta vez, leve em consideração esse personagem que, mesmo tão importante, foi tão estigmatizado em nossos livros tradicionais, sendo tomado apenas como “escravo”. Após a implantação das leis 10639/2003 e 11.645/2008, muitos incentivos foram dados à produção bibliográfica, para que grupos temáticos fossem formados e passassem a escrever um farto material pedagógico sobre a história da África e dos negros no Brasil. Muitos desses materiais estão disponíveis na íntegra para downloads na Internet; outros se encontram à venda nas livrarias; ou ainda sendo distribuídos gratuitamente, seja por órgãos públicos, seja por organizações não governamentais, com o apoio da iniciativa privada.
6.2. A especificidade das Ações Afirmativas para negros no Brasil
A força do movimento negro contra todas as formas de discriminação por raça ou cor e pela garantia de direitos sociais fundamentais da população afro-brasileira acabou por se traduzir basicamente em duas formas na legislação antirracista vigente atualmente no Brasil: de um lado, através de uma legislação penal que pune todo ato discriminatório; por outro, a partir da promoção de igualdade de oportunidades a grupos desfavorecidos socialmente, através das chamadas ações afirmativas.
Neste subtópico, vamos nos aprofundar apenas nessa última, procurando mostrar um pouco da discussão em torno de um tema ainda tão polêmico no Brasil, que mexe com os ânimos de intelectuais, ativistas e políticos, tanto de esquerda, quanto de direita, com negros, brancos e amarelos, com as pessoas de modo geral, professores, alunos, profissionais, donas de casa etc. O debate em torno das ações afirmativas é capaz de mobilizar opiniões em qualquer âmbito social ou contexto cultural, principalmente porque fazem parte delas algumas políticas que procuram garantir cotas para afrodescendentes em universidades e empresas, visando à inclusão justa desse segmento populacional.
Mas, afinal, o que são as ações afirmativas? De acordo com Bernardino (2002, p. 256-257)
(...) são entendidas como políticas públicas que pretendem corrigir desigualdades socioeconômicas procedentes de discriminação, atual ou histórica, sofrida por algum grupo de pessoas. Para tanto, concedem-se vantagens competitivas para membros de certos grupos que vivenciam uma situação de inferioridade a fim de que, num futuro estipulado, esta situação seja revertida. Assim, as políticas de ação afirmativa buscam, por meio de um tratamento temporariamente diferenciado, promover a equidade entre os grupos que compõem a sociedade.
A discussão sobre as ações afirmativas procedem dos Estados Unidos, onde o movimento negro lutou e conseguiu a garantia de leis que promovessem, ao mesmo tempo: primeiro, um “ ressarcimento” às perdas de oportunidades vividas pelos negros naquele país em consequência de políticas segregacionais; segundo, uma “aceleração” do lento processo histórico, para a inclusão social a curto prazo desse segmento populacional, bem como a ascendência de minorias étnicas, raciais e sexuais. Em ambos os casos, segundo Guimarães (2009, p. 170), são ações “para remediar uma situação considerada socialmente indesejável”.
 Claro que “remediar” não é o ideal de nenhuma realidade verdadeiramente democrática. Assim, é preciso considerar as ações afirmativas como uma medida paliativa, transitória e, portanto, temporária, devendo ser extinta assim que as condições sociais estiverem mais equilibradas para grupos sociais em desvantagem, como negros, indígenas e mulheres, por exemplo.
Ações afirmativas são, nesse sentido, uma espécie de “discriminação ao contrário”, também denominada como “discriminação positiva”, no sentido de proporcionar algumas vantagens aos grupos historicamente em desvantagem (e por isso considerados “minorias”), como negros, idosos, mulheres, indígenas, crianças, adolescentes etc., oferecendo-lhes facilidades temporárias para um acesso mais rápido aos direitos sociais básicos que lhes foram por tanto tempo sistematicamente negados. Para o Direito, esse recurso é denominado “mitigação de danos”, previsto em legislação brasileira, inclusive.
A condição dos afrodescendentes na sociedade brasileira: dados estatísticos, imagens e representações do negro no Brasil
Desigualdade racial revelada em números
O racismo no Brasil se confirma nos levantamentos estatísticos oficiais, produzidos pelo IBGE, dados esses que foram cuidadosamente analisados por nós, demonstrando que a condição dos afrodescendentes na sociedade brasileira ainda é desvantajosa quando comparada à de outros segmentos da população, nos mais diversos âmbitos sociais: distribuição racial por região, desenvolvimento econômico, mercado de trabalho, renda familiar, distribuição de renda, analfabetismo, desigualdade educacional em todos os níveis de ensino (do básico ao superior), condição feminina com relação a saúde, acesso à infraestrutura pública, saneamento e moradia, estrutura familiar e dedicação aos afazeres domésticos.
Os dados do Censo 2010, publicados no Diário Oficial da União do dia 04/11/2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que a população brasileira já atinge a soma de 185.712.713 habitantes. Entretanto, quando o assunto é a igualdade social entre brancos e negros, os números são bastante desoladores e mostram que o país ainda precisa melhorar muito no que tange à distribuição equitativa de direitos e oportunidades.
Neste módulo, procuraremos estudar esses dados, a fim de confirmar a tese que estamos defendendo nesta disciplina: a de que o racismo é um traço perverso no tecido social brasileiro, demonstrado e confirmado pelos levantamentos estatísticos oficiais. 
A Pedagogia da Exclusão: Imagens e representações do negro na literatura e na mídia. 
São incontáveis as pesquisas realizadas pela comunidade acadêmica sobre o tema proposto neste subtópico: as imagens e representações do negro nos diversos âmbitos da vida social. Importa destacar, inicialmente, que os resultados do processo de construção da ideologia do branqueamento continuam a marcar as imagens e representações feitas sobre o negro, seja na mídia, na literatura ou no ambiente escolar.
Comecemos analisando mais de perto como a literatura apresenta essa questão. Há um estudo, realizado por Lúcia Barbosa (2004), que analisa a imagem do negro presente nas personagens de algumas obras da literatura brasileira. Apenas para tomarmos um exemplo, a autora, ao estudar os textos de Monteiro Lobato, conclui que seus livros trazem uma visão extremamente preconceituosa sobre o negro, apesar de terem sido escritos após a abolição da escravidão.
Essa é uma crítica corrente entre os estudiosos e militantes do movimento negro, que veem nos textos de Monteiro Lobato a reprodução dos estereótipos do negro como submisso e subserviente, visto que, “embora liberto, não poderia sobreviver sem a tutela do senhor, pois era hereditariamente predisposto ao trabalho servil e desprovido de qualquer autonomia enquanto pessoa” (idem, p. 56); além disso, em suas descrições físicas de negros, os traços africanos se comparam muito a de animais, fato que, inclusive, foi objeto de fortes críticas a um dos livros de Monteiro Lobato escolhido pelo MEC para ser distribuído aos alunos da rede pública. O parecer foi dado no final de 2010 pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) a respeito do livro Caçadas de Pedrinho, proibindo sua distribuição nas escolas públicas do país. Nesse sentido, as conclusões daquela autora nos trazem elementos interessantes para essa análise (ibidem):
Não nos surpreende, portanto, a permanência dos estereótipos citados em nossos dias, a literatura encarregou-se de agregá-los à figurado negro. Talvez por isso, consideramos naturais algumas atitudes, piadas e ditos populares de cunho preconceituosos. Derivam dessas ideias cristalizadas, no âmbito da nossa sociedade, os “pretos de alma branca” e muitos outros que se perpetuaram e criaram raiz em nossa sociedade historicamente racista. Como vimos, a literatura, respeitadas as exceções, implantou, difundiu e materializou pedagogicamente fortes mecanismos de exclusão social, na tentativa de escamotear as nuanças.
Desta forma, podemos afirmar que os estereótipos a respeito do negro na escola também são alimentados por atitudes cotidianas, tanto por parte dos alunos, quanto dos professores, funcionários, diretores e todos os envolvidos no processo escolar, independentemente de serem brancos ou negros. O que Bourdieu advoga é que a interiorização desses discursos dominantes é um longo processo de aprendizado que, uma vez absorvido pelos grupos desfavorecidos, como, no nosso caso, todos nós brasileiros, exerce então a eficácia dessa violência simbólica, ou seja, é capaz de manter “cada coisa em seu lugar e cada lugar com sua coisa”, segundo já estudamos com DaMatta (1987).
Imaginemos o exemplo de uma professora que sempre prioriza sua atenção às alunas mais “bonitas” da classe, subentendendo-se aqui as mais ricas, arrumadas, comportadas, bem vestidas, perfumadas e, geralmente, mais brancas e loiras. São elogios ao novo corte de cabelo, a um novo sapato ou celular, ou a uma tarefa bem realizada. 
Ainda não conseguiu entender por que isso acontece? Vamos lá: porque uma criança negra, por exemplo, que assiste a essas cenas cotidianamente, percebe e interioriza a mensagem transmitida pelas atitudes da professora: “não estou sendo elogiada pois não sou tão bonita, não tenho um corte de cabelo tão bonito, não estou tão bem vestida, não sou tão inteligente...”, isto é, esses estereótipos vão sendo assimilados como verdades pela criança, que é vítima dessa violência simbólica ao ponto de, quando crescer um pouco, querer alisar seus cabelos e pintá-los de loiro, por exemplo, reproduzindo então os discursos construídos anteriormente a partir de um referencial branco. A esse respeito, comenta Menezes (apud Miranda, 2010, p. 15):
A criança negra poderá incorporar esse discurso e sentir-se marginalizada, desvalorizada e excluída, sendo levada a falso entendimento de que não é merecedora de respeito ou dignidade, julgando-se sem direitos e possibilidades. Esse sentimento está pautado pela mensagem transmitida às crianças de que para ser humanizado é preciso corresponder às expectativas do padrão dominante, ou seja, ser branco.
Perceba que não é somente a criança negra quem incorpora esse discurso pautado por uma referência branca (e, portanto, não brasileira). Todos nós, em alguma medida, temos muita dificuldade em nos definirmos por nossa cor, afinal, não podemos dizer que somos nem brancos puros, nem negros puros; nem totalmente brancos, nem totalmente negros. Mas já vimos que a realidade e a estrutura social e econômica que ela nos impõe se encarrega de deixar muito claro o que significa nos fazermos brancos ou negros. Ou seja, construirmos ou assumirmos nossa identidade étnico-racial significa também ocuparmos (ou não) o “lugar-social” (status social) reservado a cada um dos grupos étnicos, conforme comprovado por tantos dados estatísticos já estudados no início deste módulo.
Violência policial e racial.
Estudando o livro de Hélio Santos (2001), pudemos fazer um percurso teórico que explica de maneira clara a ligação entre esses estereótipos produzidos pela mídia, pela literatura ou pela música popular a respeito dos negros e a violência policial dirigida a esse segmento social. Isso porque o racismo que está dissimulado e espalhado por todo o tecido social recebe nesse âmbito da violência policial e racial um caráter muito mais explicito, uma vez que apresenta-se numa versão armada, sob a proteção legal do Estado. Nas palavras do autor:
O Brasil oficial tem nas polícias (civil e militar) o seu brado armado. Como já foi visto, a sociedade vê os não-brancos (pretos e pardos) como pessoas inclinadas para o mal. Assim, é compreensível que as polícias reservem para eles uma maior atenção. Todavia, o “x” do problema está no fato de ser dramaticamente pior enfrentar um racista armado do que, por exemplo, um selecionador de pessoal que discrimine negros. E mais: o racismo policial é pago pelo Estado com o dinheiro da população. (SANTOS, 2001, p. 133-134)
Nesse sentido, o autor irá discutir as formas de abordagem policial em relação aos negros, para questionar sobre os nossos conceitos de segurança (ou insegurança) pública. A confiança da população na instituição policial também é abordada por Santos, a partir de dados que ligam o crime organizado à conivência policial. Esta sensação de insegurança imposta nesse contexto traz uma onda social em direção à excessiva demanda por segurança privada, seus profissionais e suas tecnologias.
A INTROJEÇÃO DO RACISMO e a não-identidade étnica e racial do negro brasileiro 
Um autor que explicou muito bem como se dá esse processo de introjeção do racismo foi Helio Santos (2001). Em seu livro A Busca de um Caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso, ele defende a ideia de que o racismo no Brasil ocorre segundo uma metáfora da “centopeia de duas cabeças”: pensando na pequena lacraia, que ao invés de cabeça de uma lado, e rabo de outro, teria então duas cabeças, sendo uma a do branco, e outra a do negro.  Vamos explicar melhor do que se trata. Acompanhe o raciocínio nas palavras do próprio autor (Santos, 2001, pp. 148-149):
A centopeia é um bicho conhecido também pelo nome de lacraia e costuma ser inofensivo. A inovação que a nossa teoria traz à anatomia desse bichinho é incluir outra cabeça, onde deveria estar seu rabo. Com duas cabeças, imaginamos que ela possa mover-se em sentidos opostos. Usamos essa alegoria para poder explicar o que se dá no campo racial em nosso país. Em um sentido, a sociedade, fortalecida pelos meios de comunicação, destila seu racismo e constrói os seus preconceitos contra os negros e seus valores. Os valores do negro são a sua cultura. Em um sentido contrário, temos o próprio negro-descendente vindo e assumindo (em sua cabeça), como se fosse verdade, aquelas ideias armadas contra si. 
Se lembrarmos aquilo que já colocamos nos módulos anteriores, de que os negros correspondem a mais de 50% da população brasileira atualmente, não é difícil compreendermos que, como integrante da sociedade civil, mesmo não fazendo parte da sociedade dominante, os negro-descendentes também colaboram na visão corrente em nossa sociedade, ao mesmo tempo em que passam a introjetar contra si aspectos desfavoráveis. Hélio Santos tem certeza em afirmar que se trata de uma “monumental contradição” (2001, p. 149) e, por isso, um processo não tão simples de ser compreendido, como você já deve ter percebido! Mas, por favor, prossiga com o raciocínio de nosso autor: 
Em primeiro lugar, a sociedade que discrimina a população de ascendência negra se supõe branco-europeia. Contudo, não o é. Em segundo lugar, essa sociedade discriminadora é marcadamente negra em termos culturais. Vive, consome e tem internalizados em sua cultura valores negros. Estranho, não? Flagramos agora uma ironia peculiar da terra-brasilis: aqui, os brancos (ou supostos), quando agridem os negros, ofendem a si mesmos. Isso porque eles também são meio negros/ meio brancos, curtindo e vivenciando a cultura negra. (Ibidem)
Baseados nessas concepções, podemos dizer que somos historicamente mestiços. Para compreender essa ideia é muito simples: onde poderíamos verdadeiramente encontrar um “branco-europeu-puro”? Se a própria história de conquistas e revoluções ocorridas nos últimos milênios na Europa é fruto de intensa miscigenação (talvez possamos até dizer que o povo mais mestiço da terra seja o próprio europeu!). Dá para acreditar que essa verdade histórica da miscigenação europeia foi apagada de maneira tão eficaz e definitiva? E maisgrave ainda, que nós (em especial, os brasileiros-brancos) tenhamos uma percepção absolutamente imaginária (e ilusória!) de que somos de alguma forma descendentes de uma “linhagem europeia pura”?
Desculpe-nos se exageramos nas exclamações e interrogações. Mas trata-se de um engano tão cristalizado e enraizado em nossa “cultura de povo colonizado”, que já tomou ares de verdade. É preciso atentar, de uma vez por todas, para o fato de que não podemos separar os seres humanos em brancos, negros, amarelos, etc. Historicamente (e geneticamente) somos o resultado da infinita mistura de uma única raça, a raça humana! Portanto, como já afirmamos outras vezes ao longo deste livro, as diferenças são construídas social e politicamente, ou seja, são fruto do processo identitário. Deu para entender agora?
Assim, se construímos para nós uma cultura hierarquizada e dividida imaginariamente entre brancos, negros e índios, estamos marchando contra nós mesmos, visto que somos, todos, um pouco branco, um pouco negro, um pouco índio e assim por diante. Esse é o sentido da centopéia de duas cabeças da qual falava Helio Santos. É como se todas as cabeças pensassem num único sentido: contra nós mesmos! Veja que triste situação nos encontramos.
Círculo Vicioso:
A forma como se deu a abolição
Dificuldades econômicas
Baixa renda e escolar
Meios de Comunicação
Violência policial
MÓDULO 7 - O processo de construção da identidade afrodescendente na infância e na juventude.
Após esta incursão por um emaranhado conceitual de complexidade sem dúvida reveladora, podemos perceber que não deveria haver no Brasil qualquer visão dicotômica das relações étnico-raciais. A teoria do circulo vicioso, ou da centopeia de duas cabeças, de Helio Santos, certamente nos elucidou em que medida esses processos obedecem a um dinamismo complexo, que intencionalmente produz e reproduz o racismo na cultura brasileira.
Portanto, não é possível compreender essa questão por meio de um raciocínio bipolarizado, afinal, não somos uma sociedade de brancos (puros) e de negros (puros). A melhor opção para elucidar essa “trilha do círculo vicioso” do racismo no Brasil seria pensarmos numa série de aspectos que se entrecruzam e se autodeterminam, dando o tom da especificidade do nosso racismo e, ao mesmo tempo, colaborando para sua perpetuação. Mais uma vez é Helio Santos quem nos ajuda a elucidar esta concepção (Santos, 2001, p.30):
O mais grave, contudo, é saber que, no Brasil, o apartheid se mantém, precisamente, por ser na realidade do tipo que é. Isto é, aqui, o abismo que separa os privilegiados dos demais vem se perpetuando ao longo do tempo em virtude das mazelas sociais recaírem sempre sobre a mesma maioria. A insensibilidade para a gravidade do problema decorre muito desse particular aspecto. A causa verdadeira dessa política – quase todos negam – é o racismo. (...) É por isso que se diz que aqui temos uma pobreza cristalizada. Isto é: dura, antiga, difícil de quebrar, pois foi construída ao longo de muitos séculos. 
É nesse sentido que deixamos de pensar a cultura como estática e dotada de uma “essência”, acabada e final, para assumirmos a perspectiva do movimento incessante de diálogo e inter-relação entre os sujeitos, bem como da importância do respeito às diferenças, necessários à construção identitária e às trocas simbólicas realizadas. 
Também já afirmamos que não se trata de uma concepção dualista da construção identitária, como se houvesse de um lado, os brancos, de outro, os negros. A construção da identidade brasileira precisa passar necessariamente pela realidade da miscigenação e da constituição de nossa cultura a partir de nossas raízes negras, indígenas e europeias, ao mesmo tempo, e em igual relevância, é importante que se diga.
Então, após essa breve revisão, podemos adentrar na questão específica da construção da identidade negra (Universidade Federal de São Carlos, 2004b, p 45): 
Munanga (2003) considera que a identidade negra não surge da tomada de consciência de uma diferença na cor da pele. Ela resulta, conforme o autor, de um longo processo histórico que se inicia com a chegada dos navegantes portugueses ao continente africano. Dito de outra forma, o processo de colonização e escravização do continente africano e de seus povos é o contexto histórico no qual devemos pensar a construção da chamada identidade negra no Brasil. (...) 
A identidade negra é entendida, aqui, como um processo construído historicamente em uma sociedade que padece de um racismo ambíguo e do mito da democracia racial. Como qualquer processo identitário, ela se constrói no contato com o outro, na negociação, na troca, no conflito e no diálogo.(...) ser negro no Brasil é tornar-se negro.
Para que você possa entender o que significa “tornar-se negro” segundo essa perspectiva, é preciso considerar que identidade de qualquer pessoa se constrói no plano simbólico, isto é, no conjunto de significações, valores, crenças e gostos que a pessoa vai assumindo em sua relação com os outros, relações estas permeadas por estereótipos raciais, preconceitos e desigualdades, conforme temos trabalhado até este ponto de nossa disciplina.
Daí a enorme dificuldade enfrentada por crianças e adolescentes, brancos e negros brasileiros, para construírem sua identidade numa sociedade tão paradoxal, em que as leis lhes garantem igualdade de direitos e oportunidades, mas cujas relações sociais revelam uma estrutura claramente hierarquizada e encharcada com um racismo às escondidas, negado e escamoteado, como já afirmamos algumas vezes. Como educadores ou profissionais da saúde, por exemplo, cabe-nos o papel de mudar esse contexto, propiciando um ambiente escolar ou institucional de respeito às diferenças e desenvolvendo uma prática condizente com os valores de justiça e equidade étnico-racial. Esse será o assunto do último tópico.
MÓDULO 8 - O processo de construção da identidade afrodescendente na infância e na juventude.
Após esta incursão por um emaranhado conceitual de complexidade sem dúvida reveladora, podemos perceber que não deveria haver no Brasil qualquer visão dicotômica das relações étnico-raciais. A teoria do circulo vicioso, ou da centopeia de duas cabeças, de Helio Santos, certamente nos elucidou em que medida esses processos obedecem a um dinamismo complexo, que intencionalmente produz e reproduz o racismo na cultura brasileira.
Portanto, não é possível compreender essa questão por meio de um raciocínio bipolarizado, afinal, não somos uma sociedade de brancos (puros) e de negros (puros). A melhor opção para elucidar essa “trilha do círculo vicioso” do racismo no Brasil seria pensarmos numa série de aspectos que se entrecruzam e se autodeterminam, dando o tom da especificidade do nosso racismo e, ao mesmo tempo, colaborando para sua perpetuação. Mais uma vez é Helio Santos quem nos ajuda a elucidar esta concepção (Santos, 2001, p.30):
O mais grave, contudo, é saber que, no Brasil, o apartheid se mantém, precisamente, por ser na realidade do tipo que é. Isto é, aqui, o abismo que separa os privilegiados dos demais vem se perpetuando ao longo do tempo em virtude das mazelas sociais recaírem sempre sobre a mesma maioria. A insensibilidade para a gravidade do problema decorre muito desse particular aspecto. A causa verdadeira dessa política – quase todos negam – é o racismo. (...) É por isso que se diz que aqui temos uma pobreza cristalizada. Isto é: dura, antiga, difícil de quebrar, pois foi construída ao longo de muitos séculos. 
É nesse sentido que deixamos de pensar a cultura como estática e dotada de uma “essência”, acabada e final, para assumirmos a perspectiva do movimento incessante de diálogo e inter-relação entre os sujeitos, bem como da importância do respeito às diferenças, necessários à construção identitária e às trocas simbólicas realizadas. 
Também já afirmamos que não se trata de uma concepção dualista da construção identitária, como se houvesse de um lado, os brancos, de outro, os negros. A construção da identidade brasileira precisapassar necessariamente pela realidade da miscigenação e da constituição de nossa cultura a partir de nossas raízes negras, indígenas e europeias, ao mesmo tempo, e em igual relevância, é importante que se diga.
Então, após essa breve revisão, podemos adentrar na questão específica da construção da identidade negra (Universidade Federal de São Carlos, 2004b, p 45): 
Munanga (2003) considera que a identidade negra não surge da tomada de consciência de uma diferença na cor da pele. Ela resulta, conforme o autor, de um longo processo histórico que se inicia com a chegada dos navegantes portugueses ao continente africano. Dito de outra forma, o processo de colonização e escravização do continente africano e de seus povos é o contexto histórico no qual devemos pensar a construção da chamada identidade negra no Brasil. (...) 
A identidade negra é entendida, aqui, como um processo construído historicamente em uma sociedade que padece de um racismo ambíguo e do mito da democracia racial. Como qualquer processo identitário, ela se constrói no contato com o outro, na negociação, na troca, no conflito e no diálogo.(...) ser negro no Brasil é tornar-se negro.
Para que você possa entender o que significa “tornar-se negro” segundo essa perspectiva, é preciso considerar que identidade de qualquer pessoa se constrói no plano simbólico, isto é, no conjunto de significações, valores, crenças e gostos que a pessoa vai assumindo em sua relação com os outros, relações estas permeadas por estereótipos raciais, preconceitos e desigualdades, conforme temos trabalhado até este ponto de nossa disciplina.
Daí a enorme dificuldade enfrentada por crianças e adolescentes, brancos e negros brasileiros, para construírem sua identidade numa sociedade tão paradoxal, em que as leis lhes garantem igualdade de direitos e oportunidades, mas cujas relações sociais revelam uma estrutura claramente hierarquizada e encharcada com um racismo às escondidas, negado e escamoteado, como já afirmamos algumas vezes. Como educadores ou profissionais da saúde, por exemplo, cabe-nos o papel de mudar esse contexto, propiciando um ambiente escolar ou institucional de respeito às diferenças e desenvolvendo uma prática condizente com os valores de justiça e equidade étnico-racial. Esse será o assunto do último tópico.
8.1 Escola e a promoção da igualdade racial: desafios, estratégias e possibilidades
Diversidade, livro didático e currículo: desafios para a prática educativa 
Desenvolver um trabalho pedagógico ou profissional que leve em conta a diversidade étnico-racial e cultural é uma das tarefas mais difíceis a serem enfrentadas pela escola e pelas instituições brasileiras. Todos os envolvidos no processo educacional precisam estar atentos para a desconstrução de estereótipos de raça/cor, para a desmistificação dos mitos raciais existentes na sociedade brasileira e para a demonstração prática, em suas atitudes com os alunos, de relações não discriminatórias e equitativas em sala de aula. Além disso, atentemos para o fato de que em muitos momentos os próprios funcionários, professores e coordenadores, afrodescendentes, não se percebem enquanto negros, mas veem a si mesmos como brancos.
Nesse sentido, um importante instrumento utilizado por professores e alunos para o aprendizado é o livro didático. Em muitas comunidades, ele é a única fonte de leitura dos alunos e de sua família, dada a escassez de livros e revistas em algumas classes sociais e regiões do país. Em certos casos, torna-se também a única referência para o professor no preparo de sua aula e das atividades didáticas que irá realizar com seus alunos.
Inúmeras pesquisas têm sido produzidas pelas universidades no sentido de verificar de que forma os livros didáticos abordam a questão das diversidades, sejam as diferenças de gênero, étnico-raciais, socioculturais, religiosas, de papéis sociais, profissões etc. Os resultados demonstram que a maioria dos livros didáticos trazem uma representação muito simplificada dos fatos históricos, acabando por estigmatizar ou caricaturar segmentos sociais como mulheres, negros, idosos e trabalhadores, por exemplo. Essa simplificação colabora também no reforço de estereótipos, assunto que já abordamos fartamente nos tópicos anteriores.
Além da questão da simplificação, outro grande problema dos livros didáticos é a invisibilidade desses segmentos sociais desfavorecidos, que aparecem representados no conjunto dos conteúdos didáticos numa relação desproporcional àquela existente na sociedade brasileira. 
Vejamos o que Silva (2005, p. 22) afirma:
A invisibilidade e o recalque dos valores históricos e culturais de um povo, bem como a inferiorização dos seus atributos adscritivos, através de estereótipos, conduz esse povo, na maioria das vezes, a desenvolver comportamentos de autorrejeição, resultando em rejeição e negação dos seus valores culturais e em preferência pela estética e valores culturais dos grupos sociais valorizados nas representações.
Devido a essas e outras conclusões de inúmeras pesquisas realizadas é que as professoras e professores não podem se manter passivos na utilização dos livros didáticos; ao contrário, podem trabalhar ativamente na desconstrução de estereótipos, na representatividade de todos os segmentos sociais e na valorização das diversidades étnico-raciais.
Outra importante discussão a ser feita para uma educação para a igualdade racial é a relação entre o currículo e a diversidade. Como educadores, precisamos estar sempre alertas para o fato de que os currículos são fruto de escolhas políticas, debates calorosos e que compete a nós incluir ou excluir assuntos, disciplinas ou aspectos que servem ou não ao propósito de formação da criança e do jovem.
O poder público brasileiro já reconheceu, a partir das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, que há a necessidade urgente de incluir de uma vez por todas em nossos currículos a problemática das relações étnico-raciais, por meio do estudo da história e da cultura africana, afro-brasileira e indígena em todos os níveis escolares, chegando também à formação universitária dos professores.
Para terminar este subtópico, gostaríamos apenas de enfatizar: é imperativo que cada um dos envolvidos no processo educacional brasileiro – a começar pelos professores, é claro, mas também os coordenadores, diretores, gestores e administradores do poder público e do setor privado – tomem uma decisão política pela igualdade nas relações étnico-raciais. A partir da instituição da Lei 10.639/2003, todos esses agentes estão convocados a instituir mudanças estruturais no ensino, abarcando a reformulação dos currículos, dos projetos pedagógicos, dos planos de aula, de materiais didáticos e paradidáticos, enfim, de toda a prática educativa de modo geral, a fim de promover o reconhecimento, o respeito e a garantia das diversidades culturais, e de forma especial, da população afrodescendente no Brasil.
Escola e a promoção da igualdade racial: estratégias e possibilidades 
Neste último subtópico do módulo 8, pretendemos indicar algumas estratégias, especialmente ao professor, que demonstrem de maneira bastante prática como podemos de fato realizar uma educação cidadã, livre de racismos, dos estereótipos e de qualquer forma de discriminação.
Além das mudanças no sistema de ensino, através de revisões curriculares, nos planejamentos, aulas e materiais pedagógicos de toda sorte, cabe também a todos os agentes do processo de aprendizagem se colocarem mais próximos da realidade sociocultural de seus alunos. Isso significa conhecer a comunidade escolar, seu perfil socioeconômico, o entorno da escola, os principais problemas do bairro, da cidade, bem como as principais manifestações culturais da comunidade, arte, música, religiosidade e outros aspectos que aproximem os educadores dos alunos e de seus familiares.
São inúmeras também as pesquisas realizadas a esse respeito, mostrando que, quando a escola se coloca ao lado da comunidade, os projetos pedagógicos acontecem de maneira mais tranquila, efetiva e osobjetivos traçados são atingidos com maior sucesso. Um bom exemplo é o artigo de Silva (2003, p.27-28), no qual a autora sugere aos professores algumas estratégias bastante úteis para uma mudança de paradigma, a partir da compreensão e aplicação do que sabemos sobre africanidades brasileiras. Segundo Silva, os professores devem:
• buscar conhecer as concepções prévias de seus alunos a respeito do estudado, ouvindo-os falar sobre elas;
• ajudar os alunos a compreender que ninguém constrói sozinho as concepções a respeito de fatos, fenômenos, pessoas; que as concepções resultam do que ouvimos outras pessoas dizerem, resultam também de nossas observações e estudos;
• lançar desafios para que os alunos ampliem e/ou reformulem suas concepções prévias, incentivando-os a pesquisar, debater, trocar idéias, argumentando com idéias e dados;
• incentivar a observação da vida cotidiana, observações no contexto da sala de aula, a elaboração de conclusões, a comparação entre concepções construídas tanto a partir do senso comum como a partir do estudo sistemático.
Em se tratando de Africanidades Brasileiras, é preciso acrescentar que [os professores]:
• (...) devem combater os próprios preconceitos, os gestos de discriminação tão fortemente enraizados na personalidade dos brasileiros, desejando sinceramente superar sua ignorância relativamente à história e à cultura dos brasileiros descendentes de africanos;
• devem organizar seus planos de trabalho, as atividades para seus alunos, (...) que os levem a por “a mão na massa”, sempre informados e apoiados pelos mais experientes. Dizendo de outra maneira, aprender realmente o que se vive e muito pouco sobre o que se ouve falar.
Para concluir, a autora resume em três pontos os princípios da pedagogia antirracista, a saber: respeito, reconstrução do discurso pedagógico e estudo da recriação das diferentes raízes da cultura brasileira. Também contribui com as disciplinas específicas, como música e dança, matemática, psicologia, sociologia, educação física, história, literatura e língua portuguesa, sugerindo práticas que cada um desses professores especialistas podem adotar para abordar o tema “africanidades brasileiras” em sala de aula (Ibidem, p. 28-29).
É nesse sentido que procuramos conduzir os estudos desta disciplina, através principalmente dos seguintes reposicionamentos: mudança de discursos e de práticas; respeito à pluralidade; novas relações interpessoais, mais afetuosas, profundas e significativas; uma subjetividade livre de clausuras e modelos preestabelecidos; crítica ao atual modelo hegemônico de homogeneização e “assujeitamento”; recriação de novos sentimentos e reconhecimentos, especialmente em relação a si mesmo, num movimento de respeito a toda forma de diversidade.

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