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b:cssos tempos estao manados gala- presenca conskante da p..\litica em todas as dimensees da vida social: ouvimos falar em politica estudantil; politica econernica, politica da, Igreja... Sem contar as inCim vezes que nos referimos "politicos", a "nr liticagen e`4)*, classificamos alg6-na decisao de urn amigo como uma decisao "politica". E preciso abrir uma clareira nesse omaranhado de sign.Licados. g-o- e- faz Wolfgang Leo Maar, Anal , aspectos obintivos e subje ivos ligados ao teiino eie nos d um pain& elucidalvo da ativi politica na Historia dos gra romanos ao Estado :node no. Areas de interesse: oolitic : amesm COleca0 primeiros 54 wets passos 0 WE POLITICA 15 edicao 1982 115 edwao LEITURAS Wolfgang Leo Maar Colecao Primeiros Passos • 0 que é Anarquismg— Caio Milo Costa • 0 que é Capitalismo — Afranio Mendes _Catani • 0 que a Comunismo — Arnaldo Spindei • 0 que é Constituinte — Marllia Garcia • 0 que sal) Ditaduras — Arnaldo Spindel • 0 que é Geopolitica — Demetrio Magnoli • 0 que 6 Greve — Marcia de•Paula Lelia • 0 que a Ideologia — Mar/lena Chaui • 0 que é Imperialism.— Afrenio Mendes Catani • 0 que é Marxismo Jose Paulo Netto • 0 que Parlamentarismo Ruben Keinert • 0 que é Participagao Politica — Dalmo de Abreu Dalian • 0 que a Poder — Gerard teErun • 0 que a Poder Legislativo — Nelson Saldanha • 0 que é Politica Cultural — Martin Cezar FS)" • 0 que a Politica Nuclear — Ricardo Amt • 0 que 6 Politica Social — Vicente P. Faleiros • 0 que é Propaganda IdeolOgica --Nelson Jahr Garcia • 0 que é Reforma Agraria — Jose Eli Veiga • 0 que a Revolucao — Florestan Fernandes • 0 que é Sindicalismo — Ricardo C. Antunes • 0 que a Socialismo — Arnaldo Spindel editora brasiliense 1988 Copyright r3MiNggintalalBtaITEC A C TR A T., Caricat Emit s m. 0 Iwo Revis5o: Helocsa H. Lima ISBN: 85;11-01054-8 INDICE — Apresentacao 7 — Uma visgo hist6rica 28 — Atividade politica, Estado e cotidiano 44 — Politica, cultura e ideologia 80 — Indicacoes para leitura 108 editora brasiliense s .a. rua da consolacao, 2697 01416 - sao paulo - sp. fone 10111 2801222 telex: 11 33271 DBLM BR • 111 JO • jp APRESENTA00 A politica é uma referencia - permanente em to- ( das as dimenthes do nosso cotidiano na medida em que este se desenvolve como vida em sociedade. Embora o termo "politica" seja muitas vezes utili- zado de urn modo bastante vago, é possivel precisar seu significado a partir das experiencias hist6ricas em que aparece envolvido. Em 1984, alp& vinte anos de Presidentes impos- tos pelos militares, milhoes foram as ruas em com (- dos por todo o pals na Memoravel "Campanha das diretas" para se manifestarem pela eleicalo direta, secreta e universal do Presidente da ReptIblica. Como se sabe, este acabaria por ser indicado por urn colegio eleitoral pela via indireta, porque a maioria dos congressistas eleitos foi contraria a elei- cgo direta. Em 1985 este mesmo Congresso Nacio- A Maria Arnalia Wolfgang Leo A que é Politica nal rejeitaria a proposta de convocacao de uma Assembldia Nacional Constituinte livre e soberana d desvinculada do Congresso Nacional, anulando as- sim os esforcos populares para que os congressis- tas nao agissem em beneficio proprio. No inicio de 1986 o governo decretou o "piano cruzado" pro- movendo uma reforma econornica em que se anun- ciavam beneficios a populac5o majoritaria de baixa renda, corn o que conquistou amplo apoio nas elei- coes de 15 de novembro. Encerrado o pleito, o governo decretou novas medides a lltamente impo- pu lares, levando as centrals sindicais a convocar uma grave national de protesto contra a politica econO- mica do governo. Em alguns lugares o exdrcito foi as ruas para "garantir a ordem a as instituicOes", a exemplo do que fez em 1964. N5o é preciso se estender mais. Este breve recor- te de alguns momentos da historia recente do Bra- sil elucida exemplarmentg, o significado da politica atraves dos movimentos_ que visam interferir na realidade social a partir da existencia de conflitos que n5o podem ser resoividos de nenhuma outra forma. A,politica surge junto com propria historia, com o dinamismo de uma realidade ern constante transformac5o que continuemente se revela insufi- ciente e insatisfatoria e que n5o d fruto do acaso, mas resulta da atividade dos proprios homens vi- vendo em sociedade. Homens que, portanto, tern todas as condicOes de interferir, desfiar e dominar o enredo da historia. Entre o voto e a force das ar- mas esta uma gama variada de formas de acgo de- senvolvidas historicamente visando resolver confli- . . tos de interesses, configurando assim a atividade politica em sua quest fundamental: sua relacao corn o poder. FirjalCiP91-1-tiCaiierme_para se atingir o po- der? Ou entao sera a " olitica" simplesMente—a - ativida e exercida no arWe—PD -de-r? AreferCOes — ou erarmas — servem para con ir- mar ou para transformar? Que referential usar para encaminhar estas ques- foes? Parece que, de repente, a "politica" aparece — como naquela memoravel "Campanha das Dire- tas" em 1984. Mas de fato ela n5o aparece "de repente": ja este la, multifacetada, sempre o p preo- sente em suss relacOes corn o Estado, com - der, corn a representatividade-e participac5o, com as ideologias, corn a violancia, seja nos sindica tos, nos tribunals, na escola, na igreja, na sala de tar ou ou na reuniao partidaria. E o que se vera a seguir. A politica e as politicas Apesar da multiPlicidade de facetas a que se apli- ca a palavra "politica", uma delas goza de indis- cutivel unanimidade: a referenda ao poder poli- tico, a esfera da politica institutional. Um deputa- do ou urn Org5o de administrac5o ptiblica s5o poll- we. 10 Wolfgang Leo Ap e e Politica 11 ticos para a totalidade das pessoas. Todas as ativi- dades associadas de algum modo a esfera institu- cional politica, e o espapo onde se realizam, tarn- barn sao politicas.( Um corn Icio 6 uma reuniao politica e urn partido 4 uma associacao politica, urn individuo que questiona a ordem - institucional pode ser urn preso politico; as awes do governo, o discurso de urn vereador, o voto de urn eleitor sao politicos. Mas ha urn outro conjunto ern quit a mesma pa- lavra manifesta-se claramente de -urn modo diverso. Quando se fala da politica da Igreja, isto nao se refere apenas as relapbes entre a Igreja e as institui- cilies politicas, mas a existencia de uma politica que se expressa na Igreja, ern relapao a certas questoes como a miseria, a violencia, etc. [in mesmo modo, a politica dos sindicatos nao se refere unicamente politica sindical, desenvolvida pelo governo para os sindicatos, mas as questhes que dizem respeito propria atividade do sindicato em rale° aos seus filiados e ao restante da sociedade. A politica femi- nista no se refere apenas ao Estado, mas aos ho- mens e as mulheres em geral. As empresas tern poli- ticas para realizarem determinadas; metas no rela- cionamento corn outras empresas; ou corn os seus empregados.4as pessoas, no seu relacionamento co- tidiano, desenvolvem politicas pa -ra alcancar seus objetivos nas relacties de trabalho, de amor ou de 'llehlazer; dizer "Voce - precisa ser mais politico" completamente distinto de dizer "Voce precisa se politizar mais", isto 6, "precisa ocupar-se mais da esfera politica institucional". Da mesma maneira, urn music° que exclama: "eu sou urn artista, nao entendo de politica", po- sicionando-se frente a arte engajada, refere-se -a po- litica institucional. E pode muito bem, sem incor-, rer em nenhuma incoerencia, continuar: "mas tuder. quetaco tern profundo sentido politico". Ele este fazendo uma distincao entre o valor politico ime- diato de urn corn icio pelas eleicties diretas para Pre- sidente da RepOblica, que pretende interferir na estrutura do Poder institucional, e o valor politico nao diretamente institucional do movimento sindi- cal, das comunidades de base da igreja, de uma pas- seata de estudantes, do movimento gay, de uma in- vasao de terras, ou de urn manifesto cultural. •Nlgo resta cluvida, porem, de que este segundo significado 6 muito mais vago e impreciso do que o primeiro. A evolucao historica ern dire* ao gigan- tismo das InstituicOes Political — o Estado onipre- sente — e acornpanhada de uma politizacao geral da sociedade em seus m fnimos detalhes, por exigir urn posicionamento diario frente ao Poder. Mas ao mesmo tempo traz consigo a imposicao de normas corn que balizar a pr6pria aplicacao da palavra poli- tica; procurando determinar o que 6 e o que nao 6 "politica". Desta forma, oculta-Se ao eleitor o seu ser politi-' co, atribuindo-se esta qualidade apenas ao eleitey Ou entao atribui-sea pessoa urn espaco e urn tern- po determinado para que exerca uma atividade politica, na hora das eleic -Oes, quando esta na tri- buna da Camara dos Deputados depois de ter sido eleita, quando senta no palacio para despachar corn) 12 Wolfgang Leo 4que é Politica 13 seus secretarios mesmo sem ter sido eleita. A prO- pria delimitacao r(gida da politica constitui, por- tanto, urn produto da histOria; e este 6, sem dOvi- da, o principal motivo pelo qual nao basta ater-se a urn significado geral da politica, que apagaria todas as figuras corn que se apresentou em sua genese. Esta delimitacao operada pelo nivel institucional traz consigo alteracoes profundas,na esfera de valo- res associados a politica. Unia Conjuntura institu- cional insatisfat6ria, pela corrupgao ou pela violen- cia, jamais dissociadas, reflete-se numa desmoraliza- cab da atividade politica — politicagem — que pode reverter ern apatia ou na propura de alternativas extra - institucionais como a luta armada. Ao mesmo tempo, processa-se uma inversao na valorizacao da atividade politica na pr6pria esfera institucional, em que ela deixa de serum direito, passando a ser apenas urn dever e uma responsabilidade. Em ou- tran palavras, a Instituicuo passa despercebido que a sua é tambem uma politica, assentada na sociedade corn uma proposta de participacao, representacao e direcao. Por esta carancia de -v_isgo de relatividade, instaura-se urn normativismo absoluto, ocultan- do-se assim sua natureza hiat6rica. Interessa perceber que, apesar de haver urn signi- o ficado predominante, que se impbe em determi- nadas situac6es, e que aparede como sendo "a" politica, o que existe na verdade sao politicas. E apenas aparente a incoerancia de um I ider sin- dical afirmando que a acao do movimento social de inegavel expressao politica que representa "nab tem sentido politico". Ele resguarda seus flancos em relacao ao Estado que [he nega o direito de fazer politica fora dos espacos especificamente de- limitados para tanto — os partidos oficiais e legais. Mas, simultaneamente, procura recuperar o signifi- cado amplo de uma politica forte fora do ambito em que ela se desacreditou, por nao ser represen- tativa, por nao permitir a participacao e nao ofere- cer uma diregao socialmente valorizada. Naquele movimento social, sem drivida, pode-se nao fazer a pol itica, mas certamente se faz uma pol itica. De modo anatogo, a Igreja, mesmo naso sendo uma instituicao politica — prerrogativa do Estado secularizado sempre sustenta a proposta de fazer politica, oferecendo urn nivel de atuacao em que procura traduzir anseios e interesses socials. Ela nao pretende o poder institucional — o governo mas urn poder politico. Existem, portanto, em urn mesmo instante, I varias politicas, ou ao menos %/arias "propostas politicas" na sociedade. Em decorrencia, ha uma situacado dinamica em que as diversas propostas relacionam-se entre si e corn a trama social a que proCuram conferir uma expresso politica. Situacao dinamica essa que implica dois tipos de questhes basicas. Em primeiro lugar, a focali- zacao do movimento historico de inter-relaciona- mento das diversas pol iticas, em que se determina a preponderancia de uma delas — a chamada "poli- tica hegernonica" — ou a situacao delicada — que e o que se denomina de "crise politica" — em que 14 ue Politica Wolfgang Leo int! 15 do debate parlamentar, ou da disputa pelo gover- no institucional, urn partido esta no terreno da politics. A questato é complexa. No resta a menor porenn, de que na esquina da vertente institu- cional com a vertente social encontra-se talvez o major dos desafios politicos. Dois exemplos poder5o servir para situar o problema. Como explicar — e isto vale sobretudo para os oases chamados capitalistas — que nas sociedades contemporaneas mais estaveis e portanto n5o ameacadas em sua institucionalizacao politica, em seu governo, nEo se eliminem os bols5es de pobreza apesar de ha muito se ter atingido urn nivel de riqueza que objetivamente permitiria faze-lo? Rompem-se desta forma os compromis- sos das instituicaes com a representac5o social, a cujos interesses n5o atendem, embora pudessem faze-lo. Como explicar — e isto vale sobretudo para os parses chamados de socialistas — que em lugar algum onde se tenham firmado politicas de cunho social — educac5o, emprego, satide, alimentac5o, transporte para todos — tenha sido possfvel insti- tucionalizar formas de governo que n5o se sintam sempre ameacadas, e que por isso mesmo lirnitem a participack social? Se os interesses sociais sato atendidos, por que temer a mais ampla partici- pac5o nas instituicoes que deveriam representar a sociedade? nenhuma consegue impor-se. Ou ent5o em qUe uma ja perdeu a sua sustentacao, mas nenhuma outra possui fundamentos suficientes para se tornar uma alternativa. Em segundo lugar, cabe dedicar-se I corn especial carinho a propria conjuntura em que / se desenvolve uma politica como expressOo de certas situac5es em sociedade. Em outras palavras , como algo que nao tern, passa a ter significado politico. Estas duas questhes se encontram. Basta exami- nar estes agentes politicos por excelancia da socie- dade moderna que sato os partidos. E certo que fazem parte do nivel pol ftico institucional, e como tais se inserem na disputa pela primazia no contro- le do governo e na ocupacato do aparelho estatal. Porem, tambem s5o partidos de alguma coisa, de determinados interesses em relacOo aos quais tam compromissos. S5o esses compromissos jusfamente que Ihes conferem signifidado, e em relac5o a estes devem traduzir uma importancia no jogo parla- mentanA politica dos partidos, portanto, tem duas faces: uma em relacgo a sociedade e seus in- teresses; outra como politica de disputa do go- verno.t. As palavras inglesas policy e politics, embora n5o traduzam precisamente os dois nfveis em ques- t5o, sato elucidativas. Um partido a testa do gover- no executa uma policy nas relacties com os outros parses, ou no que diz respeito a saide, aos trans- portes, a educacab; a palavra tern mais a ver corn a adnninistrac5o dos negocios publicos, corn realiza- c5o de interesses sociais. Enquanto participa do 16 Wolfgang Leo flit qua e Politica 17 0 poeta e o libertador Ainda uma pequena digress5o. Que seja apenas pela tradicab das proprias analises do terra, as questhes pol (teas tern sido quase sempre enfocadas num prisma que privilegia unicamente o coletivo social. N5o ha por que divergir da concepc5o se- gundo a qual o homem 6 urn ser social — raid() de ser, alias, da prOpria atividade politica — e que a existenciaindividual apresenta-se como conse- quencia desta especificidade dos homens. 0 que n5o basta, porern, para explicar a fre- quente sensacao de camisa-de-forca corn que a politica 6 encarada pelas pessoas em suas ativi- dades individuals, quer na vida do artista, do profissional competente ou do apaixonado no banco de jardim, quer na do proprio sindicalista ou na do "politico", que encerram seu expediente diario como se se despissern de urn pesado fardo. A atividade politica passa a ser uma especie de mal necessario, uma atividade social transforma- dora pela qual se visa a realizar certos fins utili- zando-se de determinados -rheios. Enfim, um instrumento de que ha preeis5o na vida em socie- dade. Isto me parece correto, embora parcial. Trans- pira urn certo objetivismo de realizac5o de metas maiores, relativas a interesses socials. Estes podem it do bem-estar comum a capacidade de oferecer seguranea externa e conc6rdia interna a sociedade, associadas a organizac5o e controle das atividades do conjunto da vida social, como fungi -Oes atribu f- das comumente ao Estado e a vida politica, para justificar e explicar a sua existencia. Ou ent5o a perspectiva de operar mudancas atraves do assalto ao poder politico seria um fim que justificaria qualquer meio, submetendq hierarquicamente to- das as atividades envolvidas a nobreza da sua fina- lidade. Por oposicao a esta "objetividade" das tarefas politicas, sugere-se a existencia de instancias e valores "subjetivos" devidamente enclausurados parte e subordinados a politica, cuja satisfacao deve aguardar a realizacao da utopia, ante o risco que significa o abandono das prioridades sociais qfetivas. IA atividade politica caberia privilegiar o estudo e a transformac5o das condic6es objetivas na socie- dade que permitissem renova-la estruturalmente, corn novas relacoes sociais e pol (fleas, de modo a permitir ent5o a plenitude da vida individual.k Mas, corn a agua com que se pretende lavar os interesses sublimes das suas - impurezas profanas, jogs-se a crianca. A esta, por mera referencia a pretens5o da objetividade, acima assinalada, pode- -se chamar de condieoes subjetivas. Como realizar urn sentido social-pol itico, se ha urn fosso a separa- -lo do sentido individual-humano, cuja travessia requer esforcos nem sempre radicados na vida real no seu desenrolar cotidiano? Como conciliar, diria alguern, as minhas escoihas individuals corn as minhas escolhes politicas? E isto n5o vale so papa a relacao entre os amigos e os corn- fr-- 7 --( km , e 0 alienado: inconsciente do fato de ser ele mesmo, homem, que produz as coisas; as relacOes entre os homens, que produz a si mesmo. 19 18 Wolfgang Leo MIlue 0 politica panheiros de militancia; serve tambdrn para o traba- Ihador que quer melhorar o seu salario e precisa ser mobilizado para uma luta politica mais ampla, cujas metas muitas vezes pouco significam ao seu dia-a-dia. Como assentar as possibilidades da luta de classes nas necessidades efetivas dos homens? )tComo casar a necessidade de canalizar esforcos em conjunto, corn a diversidade das possibilidades individuaisk Em nome de que sustentar uma- vontade que pode implicar no sacrificio do . ciesejo? Talvez mostrando a falsidade deste desejo, e acenando corn a realizacgo futura ern major profundidade. Corn o que claramente neo se consegue apagar o esforco consciente que faz do engajamento na atividade politica uma opcgo volunteria, acompa- nhada do abandono de uma faceta substantiva da individual idade. Certamente as condickes objetivas determinam as condicties subjetivas. Merx mostra como o modo de producgo capitalista submete de urn modo tgo universal a sociedade, que as proprias relaceies entre os homens surgem como relaciies "coisificadas" entre o capital e a forca de trabalho. Em vez de as "coisas" servirem as pesscias, estas acabam achando que servem as coisas. 0 homem distancia- -se, alheia-se em relaggo ao significado, ao valor que as coisas, os outros homens e ele proprio tern para si mesmo'! Sua prOpria vontade e seu desejo sub- metem-se ao mecanismo inexorevel da reproducgo capitalistat3 Tornando-se um homem "alienado", inconsciente do fato de ser ele mesmo, homem, as st it tt li ► it t i ll il it tt i 21 20 Wolfgang LeoAf QNeaPolitica que produz as coisas e as relacees entre os homens, que produz a si mesmo. Oculta-se o seu papal de elemento dinamico principal, de produtor da his- tOria. A prOpria atividade politica aparece como relac5o entre eleitor e eleito, entre Estado e cida- dao, e seu aspecto proprio de relac5o humana set perde. Embora o sujeito da politica seja o homem,1 a politica 6 a politica da luta de classes. A moral! que rege a vida individual acaba submetendo-se aot capital — 6 preciso ganhar mais — ou- as regras do governo — isto 6 censurado, aquilo 6proibido. Para restaurar a verdade seria preciso uma tran0 forma* pratica, uma analise cientifica que revele. estes fatos como conseqOancias de determinadasi politico que tambarn servem ao capital e n5o ao9 homens. Se o problema 6 politico; a politicapode t. muds-lo. Mas as condicoes subjetivas nao sao apenas determinadas pelas condicees objetivas. Elas tem, urn componente real, que hao desaparece simples-! mente ao joga-lo mais adiante. E, por este seu componente real, influenciam ,tamb6m as prOprias situacees "objetivas", que deste modo passam tambarn a ter uma existancia apenas relativa. A ! social-democracia, corn o seu sindicalismo apenas reivindicativo, realizava interesses efetivamente existentes, cuja satisfac5o delegaria a urn segundo piano o mundo das promessas. 0 liberalismo capi- talista satisfaz de fato a muitas aspiracees indivi- duals, que nth) sk apenas enganos ou desejos impossiveis. Qualquer proposta politica transfor- madora que negasse a valorizacao do sentido humano da existancia individual, ou a submetesse a uma valorizack exclusiva do coletivo, que significasse um fardo para o indiv(duo, s6 conse- guiria como adeptos os fanaticos., Para estes a leitura dos manuais substituiria a felicidade real. A soluck politica deve associar-se necessaria- mente uma soluc5o civilizatOria voltada a realiza- ck de interesses humanos. Seria isto utOpico? Qu haveria a possibilidade de associar os meios politicos — coletivos — a obje- tivos que valorizem no homem a sua individua- lidade e a sua especificidade? Para Marcuse, na relacgo dos meios corn os fins 6 poss(vel encon- trar uma nova etica, em que os valores no s5o descartados apenas como meros habitos impostos por urn modo de produck e sua politica, nem submetem o individuo ao isolamento das quali- dades meramente pessoais. Plata°, no Banquete, pee na boca de S6crates a realizack do futuro eterno no amor presente pela paternidade. Sartre lembra que, para a bur- guesia do seculo XVIII, o_sentido da vida estava em legar urn capital a seus filhos. para Sartre, o sentido estaria em saber_queas_causas pelas quaffs lutava continuariam a motivar os homens, que valorizariam o seu papal como contribuic5o. Servir para nada no futuro tornaria sem sentido huma- no o presente. Deve tambem haver realizacees ja no cotidiano imperfeito do presente, em uma politica voltada a realizac5o do para(so futuro. Ha uma mediack entre o privilegio ora atribu(do a experiancia da 22 Wolfgang Leo M ue a Polltica 23 PS raz5o — que diz: n5o 6 possivel —, ora a imagine* PO. do desejo — que diz: 6 possivel. "Sonhar 6 precise, desde que reatizemos o sonho meticulosamente e o 0100 confrontemos passo a passo corn a realidade", disse Lenin. Para Max Weber "a politica consiste POO num esforpo tenaz e energico de furar tabuas duras 000 de madeira.Este esforpo exige simultaneamente paixao e precisao... nao se poderia jamais esperar S. o possivel se no mundo n5o houvesse sempre a lie esperanpa no impossivel... 6 precise Prue as pessoas se armem sempre da force da alma que Ihes permi- ts. tira ultrapassar todos os naufragios das esperanpas, a mas que o facam desde o presente, sen5o nao sera° capazes de fazer o que 6 `possivel ser feito hoje. ill Aquele que este convencido disto, (...) possui a vecapao da politica!". a 4 A propria atividade politica, longe de ser apenas 1000 voltada a uma transformapao do "mundo objetivo" com vistas ao futuro, significa, tambern, o exerci- Pa cio de uma atividade transformadora da conscien- a cia e das suas relapoes com .o mundoiAssim as pre- pries propostas polfticas s5o repensadas em cima a do que etas tern a oferecer ja, aqui e agora. Em Ole termos que Ihes conferem urn significado huma- no imediato real, sem que lot° signifique o aban- ille dono de perspectives mediatas- para o futuro iiile como metas necessaries. "A politica do corpo", per exemplo, ao exigir a valorizap5o de algo tao Ole individual como o corpo humano enquanto fonte Se e condip5o de bem-estar e prazer, puxa para o cotidiano finalidades frequentemente jogadas ao .0111 elem. Para ser feliz nab 6 preciso antes construir o socialismo.I A meta por enquanto irrealizavel ja tern componentes possiveis, que devem ser condi- paes, e nao resultados. A medida corn que estas "pequenas coisas" s5o praticaveis, nao deve mais ser estranha aos criterios de walla* de politicas menos imediatistas. ManifestapOes como as de maio de 1968 em Pa- ris — que ocorreram tambem em praticamente todo o mundo — tinham como razEo de ser n5o a oposi- plo pura a determinadas instituipoes, nem a realize- * de projetos alternativos futuros. Expressando o descontentamento profundo e a imobilidade geral a que a maioria dos homens foi condenada em face das amarras de urn determinado tipo de par- ticipap5o politica institucionalizada, os manifes- tantes procuravam urn papel, no presente, que No limitasse apenas ao futuro distante qualquer reali- ze* de significados humanos, ja t5o espoliados pelas imposip5es do esforpo exigido pelas "condi- poes objetivas". Que pode alguem fazer hoje, e como pode reatizar algum significado humano na sua atividade, num pals onde os politicos se reve- zam num poder aparentemente imovel e inacessf- vel, onde o tweed° emprego, quando acontece consegui-lo, significa uma amarra para toda a vide, onde a ciencia apenas banaliza e castra a imagine- * criativa e transformadora, onde os valores morals submetem-se a uma etica consumista, alie- nando as relapoes humanas em seu conteodo mais profundo? Por into, nos movimentos sociais emergentes no Brasil, muitas vezes nao se Procure so canalizar esforcos comuns para obter objetivos ainda nao exis- tentes — por exemplo: alteracoes na politica traba- lhista do governo atravos do movimento sindical., Na pratica cotidiana, a atividade politica assumer a perspectiva de realizar dimensees humanas mais corn profundas no relacionamento pessoal, co o res- - peito a diversidade individual e a critica a formas predeterminadas de conduta. Sem isto, desvincula- -se a realidade do dia-a-dia do espaco -de atuaceof politica. if t- A democracia, longe de se esgotar nos fins, je precisa se apresentar nos meios. A tab difundida ideia de que ha necessidade de juntar esforcos, apagando diferentes, para realizar metas em que a diversidade possa, enfim, se destraldar, no res- peito aos interesses da individualidade, adquire uma nova conformacab. A reunik num coletivo de individualidades diferentes precisa assentar no respeito a diversidade dos interesses isolados. Cria-se assim uma nova dimensao social, em que a diversidade apresenta-se numa pratica politica que relativiza as arestas mais esperas do confronto de interesses, na medida em que as consciencias se transformam, e corn elas os proprios objetivos : individuals. A democracia passe a se interiorizarl como uma conduta pessoal, 'de modo que as escolhas pessoais possam encontrar-se corn as' escolhas politicas. Isto pode parecer urn novo ardil do Estado., A experiencia do poder totalitario de propostas j politicas assentadas na mobilizapab popular tarn- born sugere a necessidade de uma transformapeo das consciancias individuals. Sob o nazismo, Hitler facilmente conseguia apoio majoritario, porque agrescentava a sua proposta politica uma proposta cultural em que se interiorizay.am na propria cons- ciencia individual os moldes autoritarios. Por outro lado, sabe-se que muitas alternativas demo- craticas nao se firmaram — e muitas ainda tern dificuldade em se firmar transformando-se em apandices de instituicoes coercitivas, por nao con- seguirem revelar o encontro de seu significado politico com o seu sentido humano. As garantias politicas coletivas nab se expressam corn igual abrangencia no cotidiano em que se desenvolvem os interesses pessoais. Isto revela o encontro profundo existente entre propostas politicas e propostas culturais, para que se possa reunir a historia das transformacoes no "mundo objetivo" corn a historia das transforma- caes da consciencia. Uma cultura pode tornar-se predominante, institucionalizando-se e refluindo sobre a sociedade corn as viseiras impostas pelo poder que se considera legal. Mas pode, tambem, enpontrar-se na sociedade, expressando seus signi- ficados humanos, para condicionar as alternativas politicas. Aqui o papel dos intelectuais é de grande relevancia: em suas mem pode adquirir forca poli- tica de dire* para a sociedade o complexo con- junto de manifestacOes culturais. Preso as determinacaes do aparelho ins;itucional politico, ou porta-voz das manifestapoes culturais sociais, cabe a figura do intelectual a importante tarefa de ser mediador entre interesses individuals 24 Wolfgang Leo ue e Politica 25 26 Wolfgang Leo Maar e coletivos. Ele pode formular propostas que per- mitam, ja, a confluencia de uma politica vo/tada a objetivos culturais no futuro e de uma cultura que confira urn sentidq human atual a esta politica. Os intelectuais scib personagens a urn termo poli- ticos a culturais, conferindo representaeao cultural a politica, e direcao politica a cultura. Talvez, como sugeriu Gramsci muitas vezes, fagam no futuro urn papel semelhante ao desempenhado pelos Partidos Politicos, os agentes da mediagffo entre a expresso politica e a sua demanda social. Falando sobre a critica literthria e seus critarios, Gramsci formula corn precise.° este esparto de atuacao: "0 politico que pressiona para que a arte con- temporanea expresse explicitamente o mundo cultural, realize atividade politica, nffo de crftica artistica; se a sociedade cultural pela qual se luta é algo latente e necessario, sua expansao sera irresistivel e encontrara seus proprios artistas . por outro lado, é necessario nab esquecer que . o literato deve necessariamente ter perspectivas menos precisas e definidas do que o politico, deve ser menos ssectarioc e ser mesmo 'contrario' disso. Para o polftico, toda imagem 'fixada' a priori reacionaria, pois considera todo movimento em seu devenir. 0 artista, em troca, deve ter imagens 'fixas' e situadas de forma definitive. 0 politico considera o homem como é em seu momento e como deve ser para alcangar determinado fim. Seu trabalho consiste em fazer os homens mar- charem em frente para sair da sua existancia atual 0 que e Politica e porem-se em condi* de alcangar coletivamente os fins propostos; ou seja, 'adaptarem-se' a estes fins. 0 artista representa necessaria e realistica- mente 'o que existe' de individual,nab confor- mista, etc., em certo momento. Por into, do seu ponto de vista, o politico sempre achara o artis- te ... a merce dos tempos, anacrenico, superado pelo devenir real". Gramsci interroga no homem, a urn só tempo libertador e poeta, a ambigUidade profunda com que se defronta em seu cotidiano. Sem propor uma conciliagffo, formal e abstrata, provoca o tema gerado por uma fragmentacab concreta e real. Como encarar nosso "tempo de partidos, tempo de homens partidos", nas palavras de Carlos Drummond? A histOria oferece algumas pistas que enrique- cem o presente. Portas abertas que nffo precisam mais ser arrombadas. Cada leito trilhado a uma razgo a mais para desafiar a imaginagab, como um novo leque de possibilidades abertas que, se nab conduz a linha a ser tragada, ao menos lhe ilumina o pano de fundo. 27 1 • e p • JP Page 1 Page 2 Page 3 Page 4 Page 5 Page 6 Page 7 Page 8 Page 9 Page 10 Page 11 Page 12 Page 13 Page 14 Page 15
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