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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA Amanda Plaça Bialli MANUAL PRÁTICO DE FISIOLOGIA DOS ANIMAIS DOMÉSTICOS Amanda Plaça Bialli MANUAL PRÁTICO DE FISIOLOGIA DOS ANIMAIS DOMÉSTICOS 1ª edição Curitiba 2014 Autora Amanda Plaça Bialli Zootecnista Departamento de Fisiologia Universidade Federal do Paraná Co-autoras Ana Vitória Fischer da Silva Médica Veterinária Profa. Dra. Departamento de Fisiologia Universidade Federal do Paraná Mariana Scheraiber Médica Veterinária Departamento de Fisiologia Universidade Federal do Paraná Suelen Cristina Soares Graduanda de Agronomia Departamento de Fisiologia Universidade Federal do Paraná Ilustrações Aline Garbellotti Zootecnista 2014 Apresentação Fisiologia (do grego, physis = função e logos = estudo) é a ciência que estuda as funções físicas, mecânicas e bioquímicas normais do corpo de todos os seres vivos. Tendo em vista que a medicina se dedica ao estudo das funções anormais, como doenças e distúrbios do organismo, é essencial, primeiramente, estudar a fisiologia normal para se entender os mecanismos de ação de tais doenças, o que torna possível para nós, zootecnistas e agrônomos, buscarmos a melhor forma de criação animal, visando o manejo mais adequado, com o intuito de evitar o surgimento de problemas comportamentais e de saúde. Na ciência da fisiologia, o aluno pode observar e entender as mais diversas reações do organismo animal frente á modificações em seu ambiente, interno e externo. Tais modificações podem decorrer da utilização de fármacos, mudanças ambientais de temperatura ou altitude, procedimentos cirúrgicos, como a castração, e alterações na dieta. O monitoramento das reações fisiológicas do animal pode ser feito de forma tão simples quanto monitorar as mudanças do peso corporal, como tão complexo quanto medir o potencial elétrico de uma única célula. Isto faz com que a fisiologia seja considerada uma ciência ampla e complexa, a qual exige estudo e dedicação para o entendimento de tudo o que se conhece sobre ela. Porém, buscamos neste material, limitar os conceitos apresentados, de maneira a facilitar a compreensão e estimular a memorização dos assuntos abordados. O Manual Prático de Fisiologia dos Animais Domésticos destina-se aos acadêmicos dos cursos de zootecnia e agronomia e visa a apresentar os princípios e conceitos da fisiologia de mamíferos e aves domésticas, pertinentes à prática profissional. O seu conteúdo foi desenvolvido de modo a reunir assuntos essenciais, organizados em capítulos de modo simplificado, a fim de proporcionar uma visão geral dos fundamentos da fisiologia e servir de recurso didático para aulas, provas e exames. Para a elaboração deste manual foi realizada uma pesquisa em renomadas fontes bibliográficas a respeito da fisiologia geral e animal. Em seguida, as informações e assuntos pertinentes à prática de docência, para os cursos de graduação em zootecnia e agronomia, foram agrupados e reescritos, objetivando condensar os assuntos para facilitar o estudo e maximizar a compreensão da fisiologia como um todo. Sumário Capítulo 1 Fisiologia Celular 6 Capítulo 2 Neurofisiologia 13 Capítulo 3 Fisiologia Endócrina 24 Capítulo 4 Fisiologia Cardiovascular 32 Capítulo 5 Fisiologia Respiratória 43 Capítulo 6 Fisiologia Renal 55 Capítulo 7 Fisiologia Gastrointestinal 65 Capítulo 8 Fisiologia Reprodutiva 91 Capítulo 9 Glândula Mamária e Lactação 109 Capítulo 10 Termorregulação 116 Referências 130 Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 6 Capítulo 1 Fisiologia Celular Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 7 Capítulo 1 – Fisiologia Celular Não se pode estudar fisiologia sem conhecer as noções básicas dos processos celulares e moleculares, pois estes são considerados os pilares de toda a fisiologia de um organismo, que nada mais é que a junção de blocos celulares e suas mais diversificadas funções. Basicamente uma célula é composta de água, eletrólitos, proteínas, lipídios e carboidratos, e é dividida em duas partes principais: o núcleo e o citoplasma. Estrutura da membrana A membrana celular é formada por uma bicamada de fosfolipídios, o qual possui em sua estrutura, além de ácido graxo e glicerol, ácido fosfórico (fosfato) e uma molécula nitrogenada. Os fosfolipídios possuem duas faces, uma exposta ao meio extracelular e outra voltada para o meio intracelular. A superfície externa possui um caráter hidrofílico enquanto a superfície interna se apresenta de forma hidrofóbica. Além dos fosfolipídios a membrana celular apresenta inúmeras proteínas imersas na bicamada lipídica e apresenta possíveis resíduos de carboidratos anexados às proteínas e lipídios. (Figura 1.1). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 8 Figura 1.1: Modelo mosaico fluido. Bicamada de fosfolipídeos. (redesenhado de Moyes, 2010). Em um modo geral, o organismo animal é constituído por aproximadamente 60% de água, sendo que as células também possuem concentrações controladas de líquidos no seu meio interno e externo. Este controle é feito através de mecanismos homeostáticos como, por exemplo, a osmose, que busca manter o equilíbrio entre o ambiente intracelular e o extracelular. Este equilíbrio hídrico se expressa entre 35% de água no meio extracelular e 65% no meio intracelular, ressaltando que sempre haverá mais água dentro da célula do que fora dela. Funções da membrana celular: Isolamento físico Regulação das trocas com o ambiente Comunicação entre as células e o ambiente Suporte estrutural. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 9 Transporte através da membrana Para a realização dos processos celulares é necessário que haja o transporte de moléculas através das membranas. Uma célula deve ser capaz de obter os nutrientes necessários para sua manutenção e equilíbrio da homeostasia, assim como deve eliminar os produtos residuais de maneira eficaz. A seguir apresentamos os tipos de transportes e seu mecanismo de funcionamento (Figura 1.2). Difusão passiva Apesar de a membrana servir como barreira para o transporte de muitas moléculas, algumas são capazes de atravessá-la sem o auxílio de um transportador. Basicamente a capacidade de uma molécula em atravessar a membrana está relacionada com sua hidrofobicidade. Sendo assim, quando uma molécula é lipossolúvel, ao encontrara membrana celular essa se dissolve na bicamada lipídica e atravessa para o lado oposto da célula. Os hormônios esteroides, provenientes de lipídios de cadeias complexas, principalmente o colesterol, são exemplos da difusão passiva. Ainda no transporte por difusão passiva, o fluxo ocorre a favor do gradiente, ou seja, do meio mais concentrado para o menos concentrado. Assim como, não há necessidade de um transportador, na difusão passiva também não há gasto de energia além do próprio gradiente de concentração. A difusão passiva depende basicamente da solubilidade da molécula, do gradiente de concentração, do tamanho e forma da molécula, da temperatura do sistema, do coeficiente de difusão e da área percorrida. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 10 Difusão facilitada Moléculas hidrofóbicas, como glicose e aminoácidos,não possuem a capacidade de atravessar a membrana celular espontaneamente, então, necessitam do auxílio de outras vias para realizarem a passagem. Proteínas carreadoras possuem esta função, a de transportar moléculas incapazes de permear a membrana livremente. Neste tipo de transporte, assim como na difusão passiva, não há gasto de energia, além do próprio gradiente de concentração, e a passagem das moléculas pode ser realizada por três tipos distintos de proteínas carreadoras, são elas: 1) Canais iônicos: são proteínas carreadoras que formam poros ao longo da bicamada lipídica; apenas alguns íons específicos são capazes de atravessá-lo, e somente quanto estes canais encontram-se abertos. 2) Porinas: assim como os canais iônicos, as porinas são proteínas carreadoras que formam poros ao longo da bicamada lipídica, porém permitem a passagem de moléculas muito maiores. 3) Permease: além de criar um poro que possibilita a passagem de moléculas, a permease funciona como uma enzima que ao ligar-se ao substrato sofre modificações em sua conformação. Isso torna possível a ela realizar a liberação do substrato do outro lado da membrana. Transporte ativo O transporte ativo ocorre no sentido oposto da difusão, ou seja, as moléculas atravessam a membrana contra o Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 11 gradiente de concentração, do meio menos concentrado para o mais concentrado. Deste modo, há um gasto de energia na forma de ATP. Existem duas formas de transporte ativo, e eles são diferenciados entre si pela fonte de energia que impulsiona o processo, como apresentado a seguir: 1) Transporte ativo primário: Neste processo a proteína carreadora utiliza uma reação exotérmica, onde há a liberação de calor, para fornecer a energia necessária para transportar uma molécula para o outro lado da membrana - por exemplo, enzimas como a K-ATPase e Ca-ATPase, e íons como o Na + . 2) Transporte ativo secundário: Este transporte acopla o movimento de uma molécula ao movimento de uma segunda molécula, ou seja, ele é dependente do transporte ativo primário. Durante os transportes, muitas moléculas circulam pela membrana, e então há uma nomenclatura para que seja possível diferenciar as atividades que estão ocorrendo no sistema, tais como: - Simporte ou co-transporte: ocorre quando duas moléculas se movem no mesmo sentido. -Antiporte ou contra-transporte: ocorre quando duas moléculas se movem em sentidos opostos. - Uniporte: ocorre quando apenas uma molécula está sendo transportada. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 12 Figura 1.2: Mecanismos de transporte através da membrana.(redesenhado de Moyes, 2010). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 13 Capítulo 2 Neurofisiologia Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 14 Capítulo 2 – Neurofisiologia O sistema nervoso, considerado o principal do organismo animal, coordena a atividade de todos os demais sistemas. Sendo assim, é importante iniciarmos nossos estudos entendendo seu funcionamento para que, futuramente, a compreensão dos demais sistemas seja facilitada. O sistema nervoso possui o neurônio como sua principal unidade funciona. Esta célula altamente especializada é subdividida em quatro partes principais: corpo celular ou SOMA, dendritos, axônio e terminal pré-sináptico. O corpo celular ou SOMA realiza o armazenamento das organelas responsáveis pela maior parte da atividade metabólica da célula; O dendrito é a área receptora de toda informação extracelular e se encontra na membrana celular; O axônio é uma extensão da membrana celular e responsável pela transmissão da informação que chega aos neurônios; O terminal pré-sináptico é uma região repleta de vesículas sinápticas responsáveis por repassar a informação para as demais células nervosas ou musculares gerando respostas. Ao longo do axônio há um envoltório isolante, chamado de bainha de mielina ou bainha de Schwann. A bainha é formada por células da neuroglia, no qual se estende por todo o axônio, envolvendo-o desde a medula espinhal até Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 15 as terminações nervosas. Porém, a bainha é envolta no axônio de forma descontínua em pontos periódicos chamados de nodos e, desse modo, serve como um excelente isolante elétrico para o axônio, exceto nos pontos correspondentes aos nodos, que é por sua vez o local onde ocorre a troca de íons. (Figura 2.1) Figura 2.1:Neurônio típico. Representado por um neurônio pré-sináptico e suas ramificações, em contato com o neurônio pós-sináptico através da fenda sináptica. (redesenhado de Silverthorn, 2010). Outra célula importante do sistema nervoso é chamada de célula da glia, a qual desempenha um papel estrutural e não gera potenciais de ação. Contudo, estudos apontam que células da glia apresentam importante papel, podendo participar no processo de produção de mielina para o sistema nervoso central. O sistema nervoso dos mamíferos é dividido em sistema nervoso central (SNC) e sistema nervoso periférico Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 16 (SNP), sendo estes dois sistemas subdivididos entre si (Tabela 2.1), e apresentados a seguir. Tabela 2.1 Organização do sistema nervoso. (adaptado de Cunningham, 2002). Sistema nervoso central (SNC) O cérebro é a principal área dosistema nervoso, sendo o responsável por todo o armazenamento de memória, elaboração de pensamentos e emoções, assim como do desenvolvimento do psíquico e o controle das diversas funções do organismo. A medula espinhal exerce duas funções principais: ação condutora entre o cérebro e diversas vias nervosas; coordenação das mais diversas atividades neurais subconscientes, como por exemplo, reflexo de retirada de determinada parte do corpo de algo que esteja lhe causando dor. SNC SNP Aferente (sensorial) Somático Visceral Eferente (motor) Somático - músculo esquelético Autônomo - Musculatura cardíaca e lisa Glândula exócrina Cérebro Medula espinhal Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 17 Transporte ativo O encéfalo é formado pelo cérebro e tronco encefálico, resultando em sofisticado centro de integração que coordena todas as atividades do organismo animal. Apesar das diferenças anatômicas existentes entre a organização cefálica de aves e mamíferos (Figura 2.3), suas regiões e respectivas funções fisiológicas são muito semelhantes (Tabela 2.2). Figura 2.2: Estrutura encefálica de mamíferos e aves. (redesenhado de Moyes,2010). O prosencéfalo mostrado na figura á cima, ainda é subdivido em duas partes: o telencéfalo, camada mais externa também chamada de córtex, região dividida em dois hemisférios onde há sulcos e saliências, e a camada interna do cérebro que é chamada de diencéfalo. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 18 Tabela 2.2: Regiões e funções do encéfalo (adaptado de Moyes, 2010). Sistema nervoso periférico (SNP) Faz parte do SNP os nervos e gânglios presentes fora do SNC, eles servem de veículo para informações sensitivas, e encaminham-nas para o cérebro e medula espinhal, a fim de promover movimentos musculares e secreção de glândulas, por meio dos nervos motores. Estrutura Função Encéfalo (hemisférios cerebrais) Processamento da informação Núcleos da base Movimentos Amígdala Emoções Hipocampo Memória Bulbo olfatório Olfação Bulbo olfatório acessório Detecção de feromônios Tálamo Informação sensorial Hipotálamo, hipófise Regula temperatura corporal, centro da saciedade, reprodução e rítmos cardíacos Epitálamo Secreção de melatonina, regulação da fome e da sede Teto (lobos ópticos) Informações visuais Tegmento Respostas reflexas a informações visuais, auditivas e tatéis Bulbo Rítmo respiratório, frequência cardíaca e pressão arterial Ponte Centro pneumotáxico Cerebelo Mantém a postura corporal, coordena a locomoção Prosencéfalo: telencéfalo Prosencéfalo: diencéfalo Mesencéfalo Rombencéfalo Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 19 O SNP é subdividido em duas vias (Tabela 2.1). A via sensorial (aferente) é responsável por encaminhar o estímulo da periferia para o SNC - por exemplo, sensação de bexiga plena, dor, frio. Já a via motora (eferente) é responsável por encaminhar a resposta ao estímulo recebido – por exemplo, mecanismos de termorregulaçãoe contração muscular (Figura 2.3). Figura 2.2: Secção transversal da medula espinhal de mamífero.Neurônios sensoriais aferentes penetram na medula espinhal pela raiz dorsal, enquanto os neurônios eferentes deixam a medula pela porção ventral. (redesenhado de Moyes, 2010). Sistema Nervoso Autônomo (SNA) Ainda dentro do SNP temos o sistema nervoso autônomo (SNA), que regula as atividades viscerais e outras estruturas que não estão sob controle voluntário. Basicamente são os nervos que regulam a musculatura lisa, cardíaca e a atividade de glândulas. Em geral o SNA está relacionado à homeostasia do organismo, ou seja, ao processo dinâmico responsável pela regulação do meio interno a fim de satisfazer as necessidades do corpo. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 20 Sendo assim, o SNA é ainda subdividido em mais duas partes: simpático e parassimpático. - Sistema Nervoso Simpático A divisão simpática do SNA prepara o organismo animal para enfrentar uma situação de estresse causada por possíveis alterações fisiológicas, também conhecidas como respostas de fuga ou luta. - Sistema Nervoso Parassimpático A divisão parassimpática do SNA é, na maioria das vezes, oposta às atividades da divisão simpática. No geral, a atividade parassimpática é responsável pela digestão e armazenamento de moléculas de energia proporcionando ao organismo animal um estado de repouso. Sistema Nervoso Entérico Alguns estudos relatam o sistema nervoso entérico ainda como parte do SNP, e o definem como uma rede de neurônios motores e sensitivos localizados por toda a parede do trato gastrointestinal e glândulas acessórias, como pâncreas e fígado, por exemplo. O trato gastrointestinal é controlado de forma extrínseca, através do SNC, e de forma intrínseca, realizada pelos neurônios que compõem os plexos nervosos e componentes da mucosa intestinal. A atividade do sistema nervoso entérico é regulada pela divisão simpática e parassimpática do SNA, agindo diretamente no órgão alvo de maneira intrínseca. O controle extrínseco realizado pelo SNC é somente realizado quando o Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 21 controle intrínseco não é capaz de controlar todas as atividades demandadas ao trato gastrointestinal. Potencial de ação O potencial de membrana de uma célula em repouso é basicamente determinado pela concentração do íon K + e pela permeabilidade ao Na + , Cl - e K + . Normalmente, uma célula nervosa em repouso é pouco permeável ao Na + , porém ao receber um estímulo a membrana pode passar subitamente a ser permeável ao íon, e fará com que o Na + passe para o interior da célula a favor do seu gradiente eletroquímico, causando uma despolarização da membrana e consequentemente um sinal elétrico. Ao longo da membrana celular há diversos tipos de canais especializados na passagem de íons específicos como: canais de Na + , K + , Cl - e de Ca 2+. A abertura de um canal para que ocorra o fluxo de íon de um lado para o outro é denominada ativação. Os axônios possuem canais de Na + e K + que são ativados pela despolarização da membrana, o que permite primeiramente a entrada de Na + seguida da saída de K + . Quando os canais iônicos se abrem há um fluxo interno e externo dos íons. Usualmente o K + se move para fora da célula enquanto os íons Na + , Cl - e Ca 2+ penetram no meio intracelular. Este fluxo de íons pela membrana celular despolariza ou hiperpolariza a membrana o que gera um sinal elétrico. Por sua vez, o potencial de açãoocorre através de uma grande despolarização, causada pela entrada de Na + e Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 22 saída de K + da célula, que percorre longas distâncias em um neurônio sem perder a força inicial do estímulo (Figura 2.4). Figura 2.4: Períodos refratários de um potencial de ação. (redesenhado de Silverthorn, 2010). Sinapse A comunicação intercelular pode ocorrer através de pequenos espaços existentes entre as células. Esta comunicação especializada é denominada de sinapse, uma região onde a célula sinalizadora e a célula alvo do estímulo estão muito próximas entre si, podendo estar ligadas ou não. Sinapses elétricas Ocorrem através da transferência de um sinal elétrico que se difunde pelo citoplasma de uma célula pré-sináptica para uma pós-sináptica através de junções comunicantes. Este tipo de sinapse ocorre principalmente em neurônios do SNC, assim como em células da glia e músculos cardíaco e liso. A principal vantagem da sinapse elétrica é sua rápida dissipação pelas células formando uma grande rede de Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 23 sinapses levando e recebendo informações de todo o organismo animal. Sinapses químicas Este é o tipo de sinapse que mais ocorre no sistema nervoso de um animal, sendo necessário um neurotransmissor para carregar a informação de uma célula nervosa à outra. Na célula pré-sináptica o sinal elétrico é convertido a um sinal químico, o qual se liga a um neurotransmissor para atravessar a fenda sináptica. O neurotransmissor ao se ligar a seu receptor na célula pós- sináptica gera uma resposta elétrica ou aciona um segundo mensageiro. Deste modo, o estímulo proveniente de uma célula se propaga pelas demais células de todo o organismo (Figura 2.5). Figura 2.5: Terminal axônico. Neurotransmissores são os mensageiros de uma sinapse química. (redesenhado de Silverthorn, 2010). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 24 Capítulo 3 Fisiologia EndócrinaFisiologia dos Animais Domésticos UFPR 25 Capítulo 3 – Fisiologia Endócrina Como visto nos capítulos anteriores, as células possuem a capacidade de se comunicarem entre si. Estas comunicações podem ser realizadas através de junções comunicantes (poros aquosos existentes entre as membranas) ou mensageiros químicos que repassam o sinal para células-alvo por meio de receptores. Quando a comunicação é feita a longas distâncias, os animais usam o sistema nervoso e o sistema endócrino. No sistema endócrino o mensageiro químico é transportado pela corrente sanguínea da célula sinalizadora até a célula-alvo. Estes mensageiros são denominados hormônios, substâncias químicas produzidas por um grupo de células especializadas, capazes de percorrer longas distancias até a célula-alvo através da corrente sanguínea. Os hormônios exercem sua função até mesmo em concentrações muito baixas. Alguns neurônios possuem funções endócrinas, realizando o papel de secretores de neurotransmissores na comunicação nervosa. As demais células do sistema endócrino podem participar realizando comunicações endócrinas ou exócrinas e normalmente estão agrupadas em estruturas denominadas glândulas(Figura 3.1). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 26 Figura 3.1: Localização das glândulas endócrinas clássicas em suínos. Estão representados ovários e testículos simultaneamente. (adaptado de Frandson, 2005). Glândulas endócrinas possuem células altamente especializadas na função secretora, e liberam seus hormônios diretamente na corrente sanguínea. Já as glândulas exócrinas, como o seu nome sugere, são responsáveis por levar suas secreções até a superfície do corpo, como a pele e superfícies respiratórias. Um exemplo muito conhecido quando se trata de secreções exócrinas em animais é o feromônio, uma secreção de odor característico e responsável pela comunicação entre os animais. Além disso, são as glândulas exócrinas as responsáveis por encaminhar o suor para a superfície da pele, assim como o muco das brânquias no caso de peixes e até mesmo lesmas e caracóis no seu processo de locomoção. (Figura 3.2) Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 27 Figura 3.2: Estrutura funcional das glândulas exócrina e endócrina respectivamente. As glândulas exócrinas secretam substâncias químicas diretamente nos ductos que as levarão para o meio externo do corpo. As glândulas endócrinas secretam seus hormônios na corrente sanguínea e os carregam para suas células-alvo. (redesenhado de Moyes, 2010). Receptores hormonais As células presentes nos órgãos-alvo de um determinado hormônio são especializadas para receber determinados tipos de hormônios, ou seja, são capazes de identificar e realizar uma ligação ou união química com o hormônio em questão através de receptores específicos normamente presentes na membrana ou citoplasma célular. Então para que uma célula responda a um hormônio, é necessário que a célula em questão tenha o devido receptor de identificação do hormônio. As principais vias de transdução de um sinal químico realizadas por uma célula animal estão descritas a baixo e representadas na (Figura 3.3) Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 28 Figura 3.3: Tipos de receptores em animais. (redesenhado de Moyes, 2010). Receptores intracelulares: localizados no citoplasma celular são responsáveis por interagir com mensageiros químicos hidrofóbicos. Canais iônicos controlados por ligante: após a ligação entre o mensageiro químico e o sítio de ligação, ocorre uma alteração na permeabilidade da membrana, permitindo a passagem do sinal. Receptores enzimáticos: a resposta é induzida através da ativação / inativação de uma determinada enzima. Receptores ligados à proteína G: enviam sinais a uma proteína G associada, a qual inicia o processo de transdução do sinal e consequentemente resposta biológica na célula- alvo. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 29 Eixo Hipotalâmico-hipofisário Para o entendimento do eixo hipotalâmico-hipofisário, é necessário resgatar conceitos sobre as funções do hipotálamo e da hipófise. A glândula hipófise, também conhecida como pituitária, é pequena do tamanho aproximado a de um feijão. Ela se localiza abaixo do cérebro, mais especificamente, abaixo do hipotálamo. Aparenta como uma pequena projeção do encéfalo conectada por uma fina haste; porém, a hipófise não fica suspensa como um pêndulo, ela se encaixa em uma pequena cavidade óssea para proteção. A hipófise ao longo do desenvolvimento embrionário é dividida em duas porções: Hipófise anterior (adeno-hipófise): extremamente importante para a vida dos vertebrados, essa porção é responsável pela secreção dos hormônios prolactina (PRL), adrenocorticotrofina (ACTH), tireotropina (TSH), hormônio folículo estimulante (FSH), hormônio luteinizante (LH) e hormônio do crescimento (GH). A secreção de todos os hormônios da adeno-hipofise é mediada por neuro-hormônios do hipotálamo, que podem ser inibidores ou estimulantes de outros hormônios. Hipófise posterior (neuro-hipófise): armazena e secreta apenas dois neuro-hormônios produzidos pelo hipotálamo, como a ocitocina e a vasopressina (ADH) (Tabela 3.1). Basicamente a hipófise possui a função de armazenar e secretar os hormônios sintetizados no hipotálamo, que chegam à hipófise através do eixo hipotalâmico-hipofisário. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 30 Este eixo consiste em um conjunto de arteríolas responsáveis pela ligação entre o hipotálamo e a hipófise, no qual há a passagem dos hormônios sintetizados no hipotálamo para serem estocados e secretados para o sistema circulatório pela hipófise. Entretanto, vale ressaltar que a neuro-hipófise possui uma ligação neural com o hipotálamo, através de neurônios, enquanto a adeno-hipófise recebe os hormônios através do sistema porta hipotalâmico-hipofisário. Os conceitos acima apresentados estão representados na (Figura 3.4). Figura 3.4: Sistema porta hipotalâmico-hipofisário e sistemas neurais da neuro-hipofíse (adaptadode Silverthorn, 2010). A seguir (Tabela 3.1) com as principais glândulas endócrinas e seus respectivos hormônios. Abreviações utilizadas: ACTH, corticotropina; ADH, hormônio antidiurético (arginina-vasopressina); CRH, hormônio liberador de corticotropina; FSH, hormônio folículo estimulante; GH, hormônio do crescimento; GHIH, hormônio inibidor do hormônio do crescimento; GHRH, hormônio liberador do hormônio do crescimento; GnRH, hormônio liberador da gonadotropina; LH, hormônio luteinizante; PRL, prolactina; TRH, hormônio liberador de tireotropina; TSH, tireotropina; PTH, hormônio paratireóideo Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 31 Tabela 3.1:Principais glândulas endócrinas e seus respectivos hormônios e ação em seus tecidos-alvo (adaptado de Moyes, 2010). Glândula Endócrina Hormônio Ação Tecido ou órgão alvo CRH Estimula a liberação de ACTH Adeno-hipófise GnRH Estimula a liberação de FSH e LH Adeno-hipófise GHRH Estimula a liberação de GH Adeno-hipófise GHIH Estimula a liberação do GH Adeno-hipófise TRH Estimula a liberação do TSH Adeno-hipófise Dopamina Inibe a liberação de prolactina Adeno-hipófise Ocitocina e ADH Estocados e liberados pela neuro-hipófise Neuro-hipófise ACTH Estimula a liberação de glicocorticóides Córtex adrenal FSH Estimula o desenvolvimento folicular e do esperma Ovários e testículosLH Estimula a ovulação, o desenvolvimento do corpo lúteo e a secreção de andrógenos Ovários e testículos GH Promove o crescimento de animais jovens, efeito metabólico sobre carboidratos, lipídios e metabolismo proteíco em adultos Todo o organismo TSH Estimula a liberação de hormônios tireódeos Células da tireóde PRL Promove a lactação e o comportamento materno Glândula mamária e SNC Ocitocina Estimula a contração uterina e a ejeção do leite Útero e glândula mamária ADH Reabsorção de água, reduz o volume urinário, realiza a constrição dos vasos para elevar a pressão arterial Rins e arteríolas Glicocorticóides Essencial para respostas normais ao estresse, metabolismo proteíco e de carboidratos Múltiplos ógãos incluindo o fígado Aldosterona Conserva Na+ e elimina K+ Rins Medula adrenal Adrenalina e noradrenalina Aumenta a resposta simpática ao estresse Vários ógãos simultâneos Células foliculares tireóideas T4 e T3 Aumenta o consumo de oxigênio e geração de ATP Quase todas as células do organismo Células parafoliculares tireóideas Calcitocina Promove a retenção do cálcio Ossos Paratireóide PTH Promove o aumento de cálcio e a redução do fosfato plamástico Ossos e rins Ilhotas pancreáticas: células beta Insulina Promove a captação de glicose, síntese protéica e lipídica Vários tecidos e órgãos incluindo a musculatura esquelética, o fígado e o tecido adiposo Ilhotas pancreáticas: células alfa Glucagon Promove a glicogenólise e a glicogênsese Fígado Hipotálamo Adeno-hipófise Neuro-hipófise Córtex adrenal Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 32 Capítulo 4 Fisiologia Cardiovascular Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 33 Capítulo 4 – Fisiologia Cardiovascular O sistema cardiovascular possui como principal função distribuir o sangue para os tecidos de maneira a fornecer os nutrientes essenciais ao bom funcionamento do metabolismo das células, assim como realiza a remoção dos resíduos celulares. O coração é o principal órgão do sistema cardiovascular, se localiza na cavidade torácica de todos os animais e serve como uma bomba propulsora que, através de suas contrações, gera suficiente pressão para impulsionar o sangue para todos os tecidos do corpo do animal. Este órgão é revestido por uma camada fibrosa, chamada de pericárdio que, por sua vez, é preenchido por um líquido com função lubrificante para evitar o atrito durante as contrações cardíacas. O epicárdio constitui a camada mais interna do pericárdio, e se localiza próximo ao músculo cardíaco, local onde se situam os nervos que regulam a atividade cardíaca e as artérias coronárias que suprem a necessidade sanguínea do coração. O miocárdio constitui o músculo cardíaco, propriamente dito e é dividido em várias camadas, de acordo com a orientação das células musculares. Por fim, o endocárdio constitui o revestimento mais interno do coração, voltado para as câmaras cardíacas, em contato com o sangue (Figura 4.1). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 34 Figura 4.1: Estrutura do coração de aves e mamíferos. (redesenhado de Moyes, 2010). A distribuição do sangue pelo sistema cardiovascular nos tecidos se dá por meio de uma rede vascular assim constituída - artérias, que transportam o sangue do coração para os demais tecidos, sob alta pressão, apesar do baixo volume sanguíneo. - veias, que carregam o sangue dos tecidos de volta ao coração. Neste caso, há grande fluxo de sangue transportado sob baixa pressão sanguínea. - capilares, que se localizam nos tecidos entrepostos às veias e artérias, e realizam a troca de nutrientes, resíduos e líquidos através de suas paredes. - vênulas e arteríolas, que são veias e artérias com diâmetro reduzido e contribuem para a distribuição e retorno venoso. Além de funções e espessuras serem diferenciadas, os vasos sanguíneos também diferem entre si quanto ao revestimento. Veias e artérias são revestidas por até três camadas de tecido, enquanto as vênulas e arteríolas possuem apenas duas e os capilares sanguíneos somente Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 35 uma camada, isto ocorre de modo a facilitar a troca de nutrientes entre os capilares e os tecidos, como oxigênio, CO2 e glicose - por exemplo(Figura 4.2). Figura 4.2: Variação estrutural dos vasos sanguíneos de vertebrados.(redesenhado de Moyes, 2010). Uma das principais características do sistema circulatrório é ser um sistema fechado, no qual o sangue que circula pelas veias e artérias permanece isolado do meio externo. O sangue realiza o transporte de oxigênio do pulmão para os tecidos e carrega o gás carbônico dos tecidos para os pulmões. Realiza a absorção e transporte dos mais diversos nutrientes no trato gastrointestinal, transporte de hormônios para as células-alvo e calor dos tecidos termogênicos para a superfície da pele, possui função protetora por meio de suas células de defesas (leucócitos) e regulação da concentração de água no organismo. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 36 Circuito do sistema cardiovascular O coração é divido sagitalmente por uma parede central, chamada septo, e os lados direito e lado esquerdo são subdivididos verticalmente átrio e ventrículo, ligados entre si por válvulas atrioventriculares que permitem apenas o fluxo sanguíneo unidirecional, do átrio para o ventrículo. A válvula atrioventricular direita é também chamada de valva tricúspide; e a válvula atrioventricular esquerda, de valva bicúspide (Figura 4.3). Figura 4.3: Anatomia interna do músculo cardíaco. O fluxo unidirecional do sangue é assegurado por dois conjuntos de valvas. (redesenhado de Silverthorn, 2010). Os átrios recebem o sangue que retorna dos tecidos para o coração, por meio dos vasos sanguíneos, enquanto os ventrículos bombeiam o sangue do coração para os tecidos. O lado direito do coração é responsável pela circulação pulmonar. Desse modo, o sangue proveniente dos tecidos é recebido no átrio direito, passa, através da valva tricúspide, para o ventrículo direito, que o bombeia para os Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 37 pulmões, onde será oxigenado. O lado esquerdo do coração realiza a circulação sistêmica, ou seja, recebe o sangue proveniente dos pulmões, já oxigenado, no átrio esquerdo, o qual passa para o ventrículo esquerdo através da valva bicúspide, e então é bombeado para todos os tecidos do organismo (Figura 4.4). Figura 4.4: Figura representativa do circuito fechado do sistema circulatório. O coração é uma bomba que impulsiona o sangue para todas as partes do corpo. (redesenhado de Silverthorn, 2010). Convencionalmente, quando se aborda o sistema cardiovascular, o sangue é representado pelas cores azul e vermelha, representando, respectivamente o sangue com menos oxigênio (azul), e o sangue oxigenado (vermelho). Como o esquema apresentado na (Figura 4.4), o sangue menos oxigenado (”azul”), denominado venoso, é aquele que já passou pelos tecidos e liberou o oxigênio, retornando pelo sistema venoso ao coração para ser bombeado aos pulmões, e novamente receber oxigênio. Já o Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 38 sangue oxigenado (“vermelho”), denominado arterial, é aquele que saiu dos pulmões para o coração e foi bombeado para todos os tecidos do corpo levando o oxigênio necessário para o funcionamento celular e orgânico.É por isso que o sistema cardiovascular é denominado de ciclo fechado, pois consiste em um circuito que se repete de maneira igual e a todo instante. A intensidade com que o sangue é bombeado para fora dos ventrículos é denominada de débito cardíaco, enquanto a velocidade com que o sangue retorna aos átrios é chamada de retorno venoso. Sendo assim, quando em estado de repouso, um animal possui o seu débito cardíaco igualado ao seu retorno venoso. o débito cardíaco total é distribuído de forma desigual por vários órgãos, ou seja, cada órgão recebe a porcentagem do débito cardíaco de acordo com suas necessidades. (Tabela 4.1). Tabela 4.1: Distribuição do débito cardíaco pelos principais tecidos. (adaptado de Costanzo, 2011). Estrutura Débito cardíaco Cérebro 15% Coração (artéria coronária) 5% Rim 25% Sistema gastrointestinal 25% Músculo esquelético 25% Pele 5% Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 39 Como ocorre a contração do músculo cardíaco O coração possui dois tipos de células principais: células contráteis e células de condução, sendo que a maior parte da musculatura cardíaca é composta pelas células contráteis que também são consideradas as células de trabalho do coração. Cerca de 1% das células contrateis possuem a capacidade de gerar potencial de ação espontaneamente, elas são as principais responsáveis pela contração do miocárdio e são denominadas de células marca-passo que possuem a característica de desencadear o estímulo da contração sem a necessidade de um sinal elétrico do sistema nervoso central. O potencial de ação gerado pelas células marca- passo se propaga para as demais através de junções comunicantes, o que permite que o sinal se estenda de uma célula muscular do ventrículo á outra, e dessa maneira há uma condução do potencial de ação pelos ventrículos de forma rápida e ocorre a contração seguida da liberação do sangue de maneira eficiente. Ao contrário do que parece, as células marca-passo não se contraem, elas apenas alteram levemente seu potencial de membrana inicial, de -60mV para o limiar -40mV, o que gera um potencial de ação. Isto ocorre graças a uma pequena movimentação de Na + para o interior da célula. O coração realiza dois movimentos principais: contração e relaxamento. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 40 Na contração, também conhecida como sístole, os potenciais de ação iniciados na membrana das células miocárdicas desencadeiam uma corrente de fluxo de Ca 2+ do meio extracelular para o intracelular. Esta entrada de Ca 2+ para o meio intracelular não é suficiente para desencadear a contração, então ocorre o processo chamado de liberação de Ca 2+ induzida por Ca 2+ . Este processo ocorre por meio da liberação de mais Ca 2+ existente no retículo sarcoplasmático e que funciona como uma espécie de gatilho para a contração muscular. Após o aumento significativo de Ca 2+ no meio intracelular, as moléculas se ligam a troponina C, o que causa uma interação entre as proteínas presentes na musculatura, a miosina e a actina, que então gera uma tensão e consequentemente a contração do miocárdio. No relaxamento, também conhecido como diástole, o Ca 2+ volta a ser acumulado no retículo sarcoplasmático pela atividade da Ca 2+ ATPase e então a concentração do íon no meio intracelular retorna aos níveis de repouso. Assim como, o Ca 2+ que havia entrado nas células durante o potencial de ação é expulso para o meio extracelular enquanto ocorre a entrada de Na + para o interior das células (Figura 4.5). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 41 Figura 4.5: Acoplamento excitação-contração nas células do miocárdio. (redesenhado de Costanzo, 2011). Composição do sangue O sangue dos vertebrados, quando centrifugado, permite identificar sua composição em três partes distintas: fluído (plasma), eritrócitos (células vermelhas) e uma pequena porcentagem de leucócitos (células brancas). As diversas células encontradas no sangue dos animais são conhecidas como hemócitos, e participam das mais diferenciadas atividades metabólicas e fisiológicas. São exemplos dessas atividades o transporte de nutrientes, armazenamento e transporte de oxigênio, coagulação sanguínea e, até mesmo, a fagocitose de células danificadas As hemácias são as células mais abundantes do sangue dos vertebrados e uma das mais importantes de todo organismo de um animal. Nelas se encontra a hemoglobina, Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 42 pigmento respiratório que possui, como principal função, o armazenamento e o transporte de O2 e CO2 no corpo. Os leucócitos não possuem hemoglobina e são conhecidos como as células de defesa do organismo, entre eles encontramos: heterofilos, basófilos, eosinófilos, monócitos e linfócitos. O número destas células de defesa no fluxo sanguíneo de um animal varia de acordo com sua idade, sexo, condições estressantes e doenças. Porém, alguns estudos apontam que 60 a 65% dos glóbulos brancos são linfócitos, conhecidos como células especializadas em produção de anticorpos e combate á infecções. O plasma sanguíneo é a fração líquida do sangue no qual diversos íons e proteínas encontram-se dissolvidos para serem transportados e utilizados por todo o organismo. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 43 Capítulo 5 Fisiologia Respiratória Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 44 Capítulo 5 – Fisiologia Respiratória A palavra respiração pode ser utilizada na fisiologia para dois processos distintos. A respiração celular é a interação entre o oxigênio e as moléculas orgânicas presentes no meio intracelular, a fim de desencadear a produção de dióxido de carbônio, água e ATP para a geração de energia. O outro processo de respiração, o qual será aprofundado neste capítulo, é a respiração externa, que é a movimentação de gases do meio extracorpóreo até o interior das células do organismo. O sistema respiratório é um conjunto de estruturas com a capacidade de realizar a ventilação e a troca de gases, e é composto pelos pulmões e por uma série de vias aéreas que realizam a conexão desses com o ambiente. Sendo assim, observam-se duas zonas distintas compondo o sistema respiratório, a zona de condução e a zona respiratória. Zona condutora Também conhecida como vias aéreas, esta zona é responsável pelo transporte do ar para dentro e para fora dos pulmões e é composta pelo nariz, faringe, laringe, traqueia, brônquios, bronquíolos e bronquíolos terminais. O ar é inspirado através da boca e do nariz, e percorre o percurso que vai da faringe e laringe até a traqueia. Na traqueia, há uma divisão em dois brônquios primários, sendo uma para cada pulmão. Estes brônquios sofrem Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 45 sucessivas divisões ao longo do pulmão até que os menores se ramificam e dão origem aos bronquíolos. Por sua vez os bronquíolos continuam se ramificando em porções menores até que ocorra a transição da zona condutora para a zona de respiração, a qual realiza a troca dos gases, também conhecida como alvéolos. As vias aéreas são compostas por musculatura lisa, além de células ciliadas e secretoras de muco. Além de realizar o transporte do ar do meio externo para os pulmões, as vias aéreas possuem função de aquecimento do ar atéatingir a temperatura corporal do animal, umedecimento do ar expirado através da produção de muco a fim de não permitir que os tecidos de troca sequem, assim como realizam a filtragem do ar com a finalidade de não permitir que vírus, bactérias e partículas inorgânicas alcancem os alvéolos (Figura 5.1). Figura 5.1:Comparação anatômica entre pulmões e cavidade torácica de equinos e do homem.(adaptado de Silverthorn, 2010). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 46 Zona respiratória Esta zona é o local onde ocorrem as trocas gasosas propriamente ditas e é composta por uma série de alvéolos especializados. Juntamente com os alvéolos, participam das trocas gasosas os bronquíolos respiratórios, os ductos alveolares e os sacos alveolares. Os bronquíolos respiratórios são considerados estruturas de transição, fazendo parte tanto da zona condutora como da zona respiratório, pois a partir deles começam a brotar ramificações alveolares de trocas gasosas. Os ductos alveolares são formados por uma série de alvéolos e ao final de seus prolongamentos se encontram nos sacos alveolares. Os alvéolos são as principais estruturas responsáveis pela troca gasosa na zona respiratória, são evaginações em formato de pequenos sacos que se prolongam dos bronquíolos, ductos e sacos alveolares. Devido a grande área de superfície dos milhares de alvéolos existentes nos pulmões, é possível uma rápida e eficiente troca de oxigênio e gás carbônico entre o gás presente nos alvéolos e os capilares sanguíneos (Figura 5.2). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 47 Figura 5.2: Ramificação das vias aéreas e estrutura do lóbulo pulmonar. Cada grupo de alvéolos é circundado por fibras elásticas e por um grupo de capilares. (redesenhado de Silverthorn, 2010). No epitélio alveolar é possível encontrar dois tipos de células principais. As células do tipo I são extremamente finas e responsáveis pela troca gasosa propriamente dita, pela importância de sua função estas células ocupam cerca de 95% de todo o epitélio alveolar. As células do tipo II possuem inúmeras funções, incluindo a manutenção do equilíbrio hídrico nos pulmões e a secreção de surfactantes pulmonares. Os surfactantes são lipoproteínas necessárias para realizar a redução da tensão alveolar através do revestimento dos alvéolos durante a expansão dos pulmões e entrada do ar pela respiração. Além das células tipo I e II, no epitélio alveolar encontram-se células fagocitárias denominadas de macrófagos alveolares. A principal função dos macrófagos é manter os alvéolos livres de poeiras que eventualmente podem ser inaladas na inspiração. Estas células se enchem com o material indesejado e migram para os bronquíolos no qual com a movimentação dos cílios é possível transportar o Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 48 material até as vias aéreas superiores, que então pode ser deglutido ou expectorado (Figura 5.3). Figura 5.3: Representação estrutural dos alvéolos de mamíferos e suas células. (redesenhado de Moyes, 2010). Ciclo respiratório O ciclo respiratório é dividido em três fases: inspiração (entrada de ar nos pulmões), expiração (saída de ar para o meio externo) e repouso (período entre respirações). Durante a inspiração ocorre a contração dos músculos inspiratórios, denominados diafragma, e o aumento no volume da caixa torácica. Consequentemente há uma queda na pressão alveolar para cerca de 1cmH2O a baixo da pressão atmosférica fazendo com que o ar penetre nos alvéolos até que a pressão alveolar se iguale novamente a pressão atmosférica. Ao final da inspiração o volume de ar nos Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 49 pulmões está no seu limite máximo e a pressão alveolar está equilibrada com a pressão externa. No momento da expiração ocorrem os eventos opostos á inspiração. O diafragma relaxa e há uma queda no volume de ar na região torácica ocasionando um aumento na pressão alveolar de até 1cmH2O á cima da pressão atmosférica, o que permite a expulsão do ar para o meio externo. O movimento de expiração cessa quando a pressão alveolar se iguala a pressão atmosférica novamente e neste momento o pulmão alcança seu menor volume. A fase de repousoé definida pelo intervalo entres os ciclos respiratórios, ou seja, não há ar se movimentando para dentro ou para fora dos pulmões e novamente a pressão alveolar é igual á pressão atmosférica (Figura 5.4). Figura 5.4: Pressão durante o ciclo respiratório normal. A – Repouso; B – Metade da inspiração; C- Fim da inspiração; D – Metade da expiração. Os valores de pressão são dados em cmH2O em relação à pressão atmosférica (Patm). Os valores sobre as setas amarelas representam as pressões transmurais. (redesenhado de Costanzo, 2011). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 50 Trocas gasosas Troca gasosa é o termo utilizado para referenciar a difusão de O2 e CO2 nos tecidos periféricos e nos pulmões. Basicamente, o oxigênio passa do gás alveolar para os capilares pulmonares e segue para todos os tecidos do corpo. Nesses, o oxigênio se difunde da corrente sanguínea para dentro das células, e o sangue captura o CO2 ali presente. O sangue, carregado de dióxido de carbono, retorna para o pulmão no qual é eliminado do por meio da expiração (Figura 5.5). Figura 5.5: Representação esquemática de alvéolo e de capilar pulmonar próximo. O O2 é adicionado ao capilar sanguíneo enquanto o CO2 é removido.(redesenhado de Costanzo, 2011). O oxigênio transportado de forma dissolvida na corrente sanguínea não é suficiente para suprir a demanda metabólica dos tecidos, então há uma segunda forma de transporte desta molécula que é o O2 ligado à hemoglobina. Cerca de 98% do O2 no sangue é transportado de forma combinada com a hemoglobina, uma proteína globular capaz de se ligar à até 4 moléculas de oxigênio. O dióxido de carbono é, significativamente, mais solúvel que o oxigênio, e grande parte dele provêm da Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 51 respiração mitocondrial. Deste modo, é de extrema importância que este gás seja transportado para fora do organismo. Porém, apenas pequena parcela do dióxido de carbono presente no sangue encontra-se na forma molecular de CO2. A maior parte desta substância é transportada na forma de bicarbonato (HCO3 - ), produto da reação do CO2 com a água que conta com o auxílio de uma enzima catalizadora denominada anidrase carbônica (AC). O sistema respiratório e o pH sanguíneo Todos os animais possuem mecanismos regulatórios do pH intracelular e do pH dos líquidos extracelulares, como o sangue por exemplo. A fisiologia respiratória é de extrema importância para a manutenção dos limites ideias de pH sanguíneo pois o dióxido de carbono possui uma estreita relação com o pH do meio através da reação catalisada pela AC. Durante períodos de hiperventilação há maior quantidade de ar inspirado do que o necessário para eliminar o CO2 do sistema. Neste caso, há queda na concentração de HCO3 - circulante e, consequentemente, aumento no pH sanguíneo, o que pode levar a um distúrbio metabólico chamado de alcalose respiratória. Já durante a hipoventilação ocorre o oposto, há baixa quantidade de ar inspirado, o que é insuficiente para a remoção do CO2 necessário. Então, ocorre um aumento na concentração de HCO3 - seguido pela queda do pH do sangue. A hipoventilação pode desencadear o fenômeno conhecidoFisiologia dos Animais Domésticos UFPR 52 como acidose respiratória devido a maior concentração de íons H + presentes no sistema. Sistema respiratório das aves As aves possuem diferenças significativas no sistema respiratório, quando comparadas aos mamíferos. Primeiramente as aves são desprovidas de diafragma e seus pulmões não possuem a capacidade de se expandirem durante o ciclo respiratório, além disso, as aves possuem estruturas anexas denominadas sacos aéreos que realizam a ventilação dos pulmões. O pulmões são localizados na região torácica dorsal e são responsáveis pelas trocas gasosas, assim como nos mamíferos. Porém os sacos aéreos são estruturas altamente diferenciadas e que não estão presentes em mamíferos. São grandes, de paredes finas no qual consistem em prolongamentos de alguns brônquios secundários. Na maioria das aves domésticas como galinhas, frangos, patos, pombos e perus existem nove sacos aéreos ao total, sendo eles acondicionados aos pares com exceção do saco aéreo clavicular. Sendo assim, existem dois grupos de sacos aéreos: craniais (cervicais, clavicular e torácico lombar) e os caudais (caudais e abdominais)(Figura 5.6). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 53 Figura 5.6: Sistema pulmão-sacos aéreos da galinha. (redesenhado de Reece, 2006). A troca gasosa nas aves ocorre no paleopulmo e neopulmo, também denominados de pulmões verdadeiros. Eles são fixos e rígidos não permitindo o aumento ou diminuição do volume torácico, sendo a ventilação de responsabilidade apenas dos sacos aéreos. Na inspiração das aves, o ar que entra pela traquéia ao atingir o brônquio secundário mediodorsal se divide em dois caminhos. Uma parte do gás caminha em direção aos sacos aéreos craniais, passando pelo paleopulmo; a outra parte do gás se direciona aos sacos aéreos caudais, passando pelos parabronquios neopulmonares. Salienta-se que a troca gasosa ocorre no momento em que o gás passa pelas estruturas do paleopulmo e do neopulmo, e que em seguida ocorre apenas a ventilação nos sacos aéreos. No momento da expiração o gás retorna dos sacos aéreos caudais sentido neopulmo até atingir o paleopulmo, ao mesmo tempo ocorre a saída do gás que estava nos sacos aéreos craniais. Todo o gás do sistema irá se reencontrar nos brônquios primários e será novamente exalado para a Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 54 atmosfera através da traquéia. Basicamente nenhum gás sai do sistema respiratório para a atmosfera sem que este passe pelo paleopulmo, obrigando a realização das trocas gasosas (Figura 5.7). Figura 5.7: Mecânica da respiração nas aves. (redesenhado de Macari, 2002). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 55 Capítulo 6 Fisiologia Renal Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 56 Capítulo 6 – Fisiologia Renal O sistema urinário é composto por rins, ureteres, bexiga urinária e uretra. Os principais órgãos do sistema renal são os rins que possuem diversas reponsabilidades para a manutenção da homeostasia corpórea. Duas de suas principais funções são excretar produtos de resíduos metabólicos, e a regulação do volume e composição do ambienteinterno, como o fluido extracelular – por exemplo. Sendo assim, quando o corpo apresenta sinais de deficiência ou excesso de água e eletrólitos, os rins agem de forma a alterar o ritmo de reabsorção e secreção dessas substâncias. Entre as funções dos rins pode-se citar seis que são de grande importância para o controle da homeostasia do organismo: - Equilíbrio iônico: Controlam a absorção e a perda de íons, mantendo assim os níveis ideais de concentração; -Equilíbrio osmótico: os rins produzem a urina e controlam o volume a ser produzido, mantendo desta maneira o equilíbrio hídrico; - Equilíbrio do pH: regula o pH sanguíneo retendo ou eliminando H + ou HCO3 - ; - Pressão sanguínea:os rins controlam o volume de líquido extracelular através de hormônios, sendo assim regula o volume de sangue e consequentemente da pressão sanguínea; Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 57 - Excreção: eliminação de toxinas e resíduos nitrogenados, além da retirada do excesso de vitaminas lipossolúveis do organismo através da urina; - Produção de hormônios: síntese e liberação de hormônios importantes para a homeostasia do organismo como a eritropoietina (síntese de eritrócitos) e a renina (regulação da pressão sanguínea). Os rins são subdivididos em três porções: o córtexque é a região mais externa do órgão, a medulaque é a região central do rim e por fim a pelve renal que é a extremidade voltada pra o meio interno do órgão no qual encaminha a urina recém-formada até os ureteres. A urina de ambos os rins é drenada e encaminhada para o ureter, em seguida para a bexiga, local onde fica armazenada até a sua eliminação (Figura 6.1). Figura 6.1: Secção transversal de rim de mamíferos(redesenhado de Silverthorn, 2010). A unidade funcional de um órgão é uma estrutura capaz de realizar todas as funções necessárias daquele órgão. Nos rins, os néfrons são considerados a unidade funcional, ou seja, realizam quase todo o processo fisiológico necessário para a formação da urina. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 58 Os néfrons encontram-se entremeados no córtex e na medula renal, sendo cerca de 80% na região do córtex (néfrons corticais) e os outros 20% na região da medula (néfronsjustamedulares) (Figura 6.2). Figura 6.2: Representação estrutural do néfron. Néfrons corticais estão localizados predominantemente no córtex, enquanto néfronsjustamedulares são encontrados principalmente na medula renal. (redesenhado de Moyes, 2010). Cada néfroné divido em duas porções: túbulo renal (formado por uma única camada de células epiteliais) e glomérulo (região de inúmeros capilares). O túbulo é subdivido em diversos segmentos como visto na figura anterior. O sangue entra no rim através da artéria renal e segue em direção á artérias menores e arteríolas do córtex. Nesta porção a disposição dos vasos sanguíneos torna-se um sistema porta no qual o sangue flui para uma rede de capilares que se aglomeram em um formato de bola formando a região doglomérulo.Através dosistema porta renal é possível ocorrer a filtração e reabsorção de líquidos de volta para a corrente sanguínea ou para o interior do túbulo renal. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 59 O glomérulo é o principal elemento do néfron, e é através de seus capilares que os líquidos são liberados para o túbulo.A parede capilar do glomérulo funciona como um complexo filtro biológico que barra a passagem de células sanguíneas e macromoléculas para o túbulo renal, porém, permite a entrada de componentes líquidos do sangue e eletrólitos para a cápsula de Bowman (Figura 6.3). Figura 6.3: Estrutura anatômica do glomérulo. Rede de capilares que libera grande parte dos líquidos do sngue para dentro da cápsula de Bowman do néfron. (redesenhado de Moyes, 2010). Após a entrada na cápsula de Bowman, o filtrado inicial se movimenta pelo lúmen através de suas regiões específicas. Inicia seu trajeto saindo da cápsula de Bowman e passando pelo túbulo proximal e caminhando em direção á alça de Henle (estrutura em formato de “U”), em seguida passa pelo túbulo distal e chega ao ducto coletor que drena o líquido diretamente na pelve renal. Neste momento o filtrado já é denominadourina e é transportada para a bexiga, região no qual a urina fica armazenada até que seja excretada. Ao longo de totó o túbulo renal há inúmeras células epiteliais que realizam a reabsorção e a eliminação de solutosrealizando assim o processo de formação da urina durante o trajeto percorrido (Figura 6.4). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 60 Figura 6.4: Partes de um néfron. (redesenhado de Silverthorn, 2010). Os solutos do ultrafiltrado são, em sua maioria, reabsorvidos no túbulo proximal por meio ativo ou passivo. A reabsorção e movimentação de solutos como Na+ e Cl-, proporcionam a criação de um pequeno gradiente, favorecendo assim, a movimentação da água para dentro das células e para os espaços intercelulares. Desta forma, mais de 60% da água filtrada pelo rim é reabsorvida durante sua passagem pelo túbulo proximal. Regulação da função renal A atuação dos hormônios sobre o sistema cardiovascular e sobre os néfrons é de suma importância para Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 61 a manutenção do equilíbrio iônico e osmótico do corpo, e, portanto, promove alterações na composição da urina. Os hormônios esteroides e peptídicos atuam rapidamente sobre este sistema, alterando os níveis de transportadores presentes no túbulo. A angiotensina II, que possui atuação vasoconstritora, e as prostaglandinas, de atuação vasodilatadora, estão entre os hormônios mais importantes atuantes no processo. Além disso, outro hormônio, a renina, desempenhará importante papel na conversão do angiotensinogênio, em angiotensina I, que posteriormente será convertida pela enzima conversora de angiotensina (ECA), em angiotensina II. A queda na perfusão renal estimula a liberação da renina pelo rim, desta forma inicia-se a conversão de angiotensinogênio em angiotensina I. A angiotensina I sofre a ação da ECA e é convertida a angiotensina II, que por sua vez, irá estimular a secreção da aldosterona pelo córtex da adrenal, promovendo aumento na retenção de Na e H2O, e a vasoconstrição, aumentando a pressão sanguínea. A este processo, dá-se o nome de sistema renina-angiotensina- aldosterona (Figura 6.5). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 62 Figura 6.5: Representação esquemática do complexo renina- angiotensina-aldosterona. AI – Angiotensina; ECA – Enzima conversora de angiotensina; AII – Angiotensina II; “-“ Inibição. (redesenhado de Cunningham, 2004). Sistema renal das aves Anatomicamente, o sistema renal das aves, é composto por dois rins, com lobos cranial, médio e caudal; e por dois ureteres. Desta forma, e devido a ausência da bexiga urinária, a urina é transportada diretamente para a cloaca através dos ureteres, e excretada juntamente com as fezes (Figura 6.6). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 63 Figura 6.6: Representação dos rins de aves. Vista abdominal dorsal de um frango. (adaptado de Reece, 2006). O funcionamento do sistema renal das aves, tendo em vista os processos de filtração glomerular, reabsorção e secreção tubular, e osmolalidade, é muito semelhante ao já estudado anteriormente em mamíferos. Dentre os aspectos que diferem o sistema das aves e dos mamíferos, além da ausência de bexiga para armazenamento das excretas, podemos citar o tipo de produto final proveniente do metabolismo de nitrogênio e a diferenciação dos néfrons. As aves apresentam dois grupos principais de néfrons, sendo um de funcionamento semelhante ao dos mamíferos, e outro de funcionamento semelhante ao dos répteis, sendo os semelhantes aos dos répteis incapazes de concentrar a urina (Figura 6.7). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 64 Figura 6.7: Localização dos néfrons das aves. Tipo réptil (TR) e do tipo mamífero (TM) (redesenhado de Reece, 2006). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 65 Capítulo 7 Fisiologia Gastrointestinal Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 66 Capítulo 7 – Fisiologia Gastrointestinal A ingestão de alimentos é de suma importância para a reposição dos nutrientes e manutenção da produção dos animais. Além disso, a alimentação é importante para a manutenção das reservas energéticas disponíveis ao organismo. A quebra dos alimentos tem seu início na boca, através da mastigação. Após a ingestão do alimento as reservas energéticas são armazenadas como formas complexas, sendo classificadas como triglicerídeos, proteínas, glicogênio hepático e muscular. O consumo de alimentos pode ser influenciado por diversos fatores como as sensações cefálicas – visão, olfato, audição; as contrações gástricas da fome; a velocidade da ingestão (interferindo diretamente nos sinais de saciedade); e as sinalizações das reservas de nutrientes pelo sangue. Controle hipotalâmico da ingestão de alimentos As ações hipotalâmicas são de extrema importância para a determinação da ingestão de alimentos, tendo em vista que o controle da fome é realizado pelo hipotálamo lateral, e a saciedade pelo hipotálamo ventro medial, portanto, lesões no hipotálamo lateral causarão a perda de apetite, bem como lesões no hipotálamo ventro medial, causarão a perda de saciedade. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 67 Dois tipos de sinais (fatores) são necessários para que o hipotálamo exerça seu controle: os fatores intrínsecos e os fatores extrínsecos. Os fatores intrínsecos, ou teoria a longo prazo/nutricional, são fatores relacionados às reservas de determinados nutrientes, disponíveis para o organismo, sendo dividida em: teoria gllicostática (teor de glicose) , teoria aminostática (teor de aminoácidos), teoria lipostática (teor de gordura), teoria ionostática (teor de eletrólitos) e teoria termostática (relacionada a temperatura interna). Já os fatores intrínsecos, ou teoria a curto prazo/alimentar, está relacionada diretamente a ingestão de alimentos, sendo regida por fatores visuais, olfatórios, orais, gastrointestinais e hepáticos. Constituição do trato gastrointestinal São componentes do trato gastrointestinal (TGI): boca; esôfago; estômago, intestino delgado (duodeno, jejuno e íleo); intestino grosso (ceco, cólon, reto); e ânus; e os considerados órgãos acessórios: dentes; língua; glândulas salivares (parótidas, submandibulares e sublinguais); fígado; vesícula biliar e pâncreas. Além disso, o TGI é constituído por quatrotúnicas/camadas concêntricas ao longo de sua extensão(Figura 7.1),são elas: 1) Túnica mucosa: É a porção que entra em contato com o alimento. Com funções de absorção, proteção e secreção, é altamente vascularizada por vasos sanguíneos e linfáticos. Possui, por toda sua extensão, glândulas e tecido linfoide. A liberação enzimática pelas glândulas da mucosa é Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 68 proporcionada pela contração da camada muscular da mucosa; 2) Túnica submucosa: É rica em vasos sanguíneos e linfáticos. É a via de transporte de nutrientes. O sistema nervoso entérico, denominado plexo submucoso, atua sobre a túnica submucosa, controlando as secreções gástricas e intestinais; 3) Túnica muscular: Dividida em duas camadas, uma interna de orientação circular e outra externa com orientação longitudinal, é composta por células musculares lisas. O sistema nervoso entérico, denominado plexo mioentérico, atua sobre a túnica muscular, controlandoos seus movimentos; 4) Túnica serosa: Camada externa dos órgãos do TGI, permite que um órgão do trato deslize contra outro, sem atrito, através da secreção do líquido seroso. Figura 7.1: Secção transversal do intestino e estômago. (redesenhado de Silverthorn, 2010). Parede intestinal Parede estomacal Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 69 Regulação do trato gastrointestinal O Sistema Nervoso Autônomo (SNA) é responsável por parte da regulação do TGI. Possui duas componentes, sendo uma intrínseca denominada Sistema Nervoso Entérico, localizada nos plexos mucoso e mioentérico, e uma extrínseca, sendo a inervação simpática e parassimpática. A ativação da inervação simpática realiza atividade anabólica, ou seja, através da liberação da noradrenalina no TGI, as atividades motoras e secretórias são inibidas. Já a inervação parassimpática é realizada pelos nervos vago e pélvico, e promove a estimulação das atividades motoras e secretoras. A inervação intrínseca exerce sua função sobre os plexos submucoso e mioentérico, e é independente a inervação extrínseca. Através do envio e recebimento de informações entre os mecanorreceptores e quimiorreceptores da mucosa, células musculares secretórias e endócrinas controlam as funções de contração e secreção do TGI. Além do controle nervoso, as funções gastrointestinais também sofrem controle hormonal. As ações hormonais sobre o trato são variadas atuando desde a contração e relaxamento da musculatura do trato, até sobre o crescimento dos tecidos gastrointestinais. A liberação destes hormônios na corrente sanguínea depende de seu estímulo fisiológico correspondente, portanto, sem que haja o estímulo a liberação não ocorre. Entre os principais hormônios reguladores do TGI temos: Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 70 Gastrina: Hormônio de principal ação sobre o estômago. Produzidos pelas células G da parece estomacal, tem sua liberação estimulada pela presença de proteína no trato, e por sua vez, estimula a produção de ácidos e da motilidade no estômago; Colecistocinina (CCK): Sendo produzida no intestino, sua liberação ocorre devido à presença de proteína e gordura no intestino. A CCK liberada pelo intestino é transportada por via sanguínea até o fígado e pâncreas. Quando no fígado, a colecistocinina estimula a síntese e liberação da bile, e a contração da vesícula biliar. Sua presença no pâncreas estimulam as células pancreáticas (células Acinares) a liberarem as enzimas digestivas. Estas enzimas atuaram somente em meio alcalino; Secretina: Assim como o CCK, a Secretina também é produzida pelo intestino. Sua liberação ocorre devido a presença de ácidos no ambiente hiperosmótico. A Secretina liberada é encaminha através da corrente sanguínea, passando pelo pâncreas e posteriormente irrigando o estômago. Quando no pâncreas, a Secretina estimula as células pancreáticas e os ductos pancreáticos a liberarem água e bicarbonato. No estômago atua inibindo o esvaziamento gástrico, promovendo o controle da passagem das partículas ao intestino. Além da ação destes hormônios, o trato também recebe a ação do Peptídeo Insulinotrópico Glicose- dependente (GIP). Sendo secretado pelas células K do intestino delgado, sua liberação é estimulada pela presença de glicose, aminoácidos e ácidos graxos no intestino. Quando secretado, e uma vez na corrente sanguínea, é levado ao pâncreas, onde atua sobre as células β estimulando a liberação da insulina. Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 71 Motilidade A motilidade gastrointestinal é essencial para os processos de transporte, degradação e mistura dos alimentos presentes no TGI com os sucos digestivos, sendo proporcionada pela contração e relaxamento da musculatura presente nos órgãos digestivos. As primeiras etapas do processo de quebra dos alimentos ingeridos são a mastigação e a deglutição. A mastigação, movimento voluntário coordenado pelo SNC, promove a trituração dos alimentos para facilitação da ação do suco digestivo. Além de sua importância para facilitação da ação do suco, a trituração através da mastigação também é extremamente importante para se evitar demasiada escamação da mucosa do trato, buscando- se causar menores danos, tendo em vista que o processo de reconstituição da mucosa lesionada é lento. Os órgãos envolvidos no processo de mastigação são: Dentes, lábios, língua, e bochechas. O processo de deglutição se divide em três fases: Fase oral: A fase oral corresponde à mastigação, mistura, e insalivação do alimento. Após mastigação, a ação da língua sobre o alimento, o dirige à linha média em direção á faringe; Fase faríngea: É a passagem do alimento através da faringe em direção ao esôfago, caracterizada pela abertura do esfíncter esofágico superior. A fase faríngea é, portanto, caracterizada pela ativação da contratilidade esofágica. Devido aos movimentos realizados pela epiglote com o objetivo de promover proteção à região da nasofaringe, não Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 72 há respiração nesta fase de deglutição. Nesta fase não há mais controle dos alimentos; Fase esofágica: Nesta fase o alimento sofre a ação de ondas peristálticas (propulsivas) primárias e secundárias, direcionando-o ao estômago. Caso as ondas primárias não sejam suficientes para a remoção completa do alimento na parede esofágica, as ondas secundárias entrarão em ação para promover o esvaziamento do esôfago. Assim como na fase faríngea, na fase esofágica também não há controle do alimento. Após a passagem do bolo alimentar pelo esôfago, ocorre o relaxamento da porção oral do estômago, permitindo assim sua passagem para o interior do estômago. Após a entrada do bolo, o estômago sofre contrações de quebra e mistura, dando início a digestão. O estômago divide-se anatomicamente em três partes: corpo, fundo e antro (Figura 7.2). Ele também pode ser dividido, em relação à motilidade, em duas partes: a porção proximal, denominada região oral, e a porção distal, denominada região caudal. Figura 7.2: Relação estrutural do estômago (redesenhado de Silverthorn, 2010). Fisiologia dos Animais Domésticos UFPR 73 Após a deglutição, o bolo fica armazenado na porção proximal do estômago (região fúndica). Parcialmente, a partir de contrações fracas, o alimento é passado para a parte mais medial do estômago, e passa a sofrer a ação de contrações mais intensas, que promovem a quebra do alimento em partículas menores, e sua mistura com as secreções gástricas. Logo após procede-se a seleção de partículas, onde aquelas com aproximadamente 1 𝑚𝑚3 são passadas para o duodeno. As partículas que não são passadas ao duodeno sofrem o processo de retropropulsão, que consiste no retorno do alimento ao estômago, onde ele volta a passar pelos processos de quebra e mistura. Após a quebra em partículas menores, os alimentos são levados ao duodeno. Este processo é denominado de esvaziamento gástrico sua velocidade da passagem é variável, sendo que a velocidade de passagem dos líquidos é maior que a dos sólidos. No intestino delgado o quimo é submetido á contrações que promovem a sua mistura às secreções pancreáticas e outras enzimas digestivas. Existem dois tipos de contrações intestinais (Figura 7.3) sua regulação é realizada pelo SNE de acordo com sua função: 1) Contrações segmentares: São as responsáveis pela mistura do quimo com os
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