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5.4 A Empresa Reinterpretada à Luz da Sociedade do Risco e do Ordenamento Jurídico-Constitucional Brasileiro. LIVRE INICIATIVA ART.1, INC.IV, CF. REGULAMENTADO PELO ART 966 CC. DO MEIO AMBIENTE ART, 255,CF. PRINCÍOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONOMICA. Constitucionalmente garantida, a livre iniciativa (BRASIL, 1988) concede aos cidadãos o direito à escolha e ao exercício da empresa elegida. Esta, cujo conceito específico só pode ser obtido por meio da leitura do art. 966 do Código Civil Brasileiro (BRASIL, 2002), é definida como a “[...] atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. Afora a limitação promovida pelas próprias implicações conceituais relativas à filologia do vocábulo, que não se propõe a conceituar toda e qualquer atividade, a empresa escolhida encontra óbices e delimitações maiores ainda na esfera constitucional. Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Logo, embora a Constituição de 1988 garanta, no art. 1º, inciso IV, a livre iniciativa como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, ela também prevê, no caput do art. 225, que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, motivo pelo qual incumbe não só ao Poder Público como tam- bém à coletividade defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 1988) Uma atividade que tenha por finalidade conquistar lucro a qualquer preço, ainda que por meio da destruição ambiental e da imposição de riscos e danos à sadia qualidade de vida, já não pode ser concebida juridicamente como empresa, pois a norma legal que a define se submete não só ao art. 1º, inciso IV da Constituição, como também ao caput do art. 225 da Lei Fundamental. (BRASIL, 1988) Dos Princípios Fundamentais Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. DO MEIO AMBIENTE Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; (Regulamento) II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; (Regulamento) (Regulamento) (Regulamento) (Regulamento) III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (Regulamento) IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; (Regulamento) V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; (Regulamento) VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. (Regulamento) § 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. SAMAR - MARIANA. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. § 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. (Regulamento) (Regulamento) § 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. § 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas A empresa já não é só a “[...] atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços [...]”, mas sim a “[...] atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços [...]” (BRASIL, 2002) que defenda e preserve, para as presentes e as futuras gerações, o meio ambiente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida. (BRASIL, 1988) O desenvolvimento hermenêutico de uma nova concepção jurídica de empresa, tal qual o realizado logo acima, não pode, igualmente, ficar alheio às previsões normativas encontradas nos art. 170, inciso VI, e art. 225, §1º, incisos IV e V, da Constituição da República. (BRASIL, 1988) DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte. IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995) Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. A primeira prevê que a ordem econômica tem como princípio a defesa do meio ambiente, “inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação”. Já as outras duas estabelecem que incumbe ao poder público, respectivamente, exigir estudo de impacto ambiental para as obras ou atividades que apresentem potencial de degradação ambiental, bem como “[...] controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.” (BRASIL, 1988) Assim, a empresa, para ser concebida juridicamente como tal na atualidade, não pode se limitar ao exercício inconsequente da “[...] atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” (BRASIL, 2002). Ela deve, em igual medida, defender e preservar o meio ambiente equilibrado, essencial à qualidade de vida, bem como se sujeitar a estudos de impacto ambiental, caso apresente potencialde degradação ambiental, a tratamento diferenciado, conforme o impacto ambiental decorrente de seus processos produtivos, e ao controle de sua produção, comercialização e emprego de técnicas, métodos e substâncias que possam representar risco para a vida, para o meio ambiente e para a qualidade deles. É, portanto, já na caracterização constitucional da empresa dentro do ordenamento jurídico brasileiro que se mostram as primeiras evidên- cias da diferença, deveras óbvia, entre a empresa que teve lugar na sociedade industrial do final do século XIX e a empresa tal como vista perante a sociedade do risco contemporânea. Enquanto aquela era definida juridicamente de modo rígido e por um viés exclusivamente econômico, esta apresenta natureza mais ampla, flexível, e porta consigo uma extensa carga jurídico-axiológica socioambiental. Ressalte-se que raciocínio parecido pode ser feito utilizando-se não só as demais normas dispostas na Constituição, mas também as normas legais positivas que tenham o intuito de garantir os valores socioambientais alcançados. Isso se deve em razão da sistematicidade com que o ordenamento se organiza. Logo, caso a atividade técnico-econômica, na consecução de sua finalidade, seja desenvolvida por meio da violação de uma norma legal de segurança do trabalho, seu enquadramento como empresa passa a ser inadequado à luz da releitura jurídico-constitucional que aqui se propõe. Contudo, esse é apenas o primeiro ponto de desenvolvimento de uma nova concepção jurídica da empresa à luz da sociedade do risco. Tal como dito por Ulrich Beck e já exposto anteriormente, se o controle da atuação que se dá na esfera subpolítica demanda juízos e meios de comunicação independentes, as normas que disciplinam as garantias judiciais e a liberdade de imprensa assumem um importante significado. Logo, diante de situações em que se contraponham, de um lado, os princípios e regras de livre condução da empresa, se e como produtora de riscos socioambientais, e de outro os princípios e regras de garantia da atuação independente dos juízos e da imprensa, estes últimos devem prevalecer. Por fim, talvez a proposição mais ousada e de maior relevância do sociólogo seja a de que as pessoas envolvidas na empresa devem buscar internalizar, no âmbito das decisões, um paradigma pluralista, que permita o exercício da reflexão a respeito dos próprios processos criativos e produtivos. Tal qual o macrossistema político, jurídico-constitucionalmente organizado no Brasil de modo a permitir a participação de diferentes representações da sociedade no processo de debate e escolha dos rumos a serem tomados, a empresa 9assim definida passaria a funcionar como um microcosmos constitucional, uma minirrepresentação do sistema constitucional pluralista de decisão. Assim, o controle dos processos produtivos, insumos e demais elementos que possam representar riscos socioambientais viria não apenas de entes externos, mas também daqueles que fazem parte da atividade em si, e que, como tal, têm mais informações e, consequentemente, melhores condições de orientar e guiar a empresa segundo os padrões jurídico-constitucionalmente permitidos.
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