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TERCEIRIZAÇÃO: EFEITOS SOBRE AS RELAÇÕES DE TRABALHO Seminário Caderno do participante Coleção Seminários de Negociação Seminário Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho São Paulo, 2004 Coleção Seminários de Negociação Caderno do participante Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE4 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 5 SUMÁRIO Apresentação n O DIEESE n Capacitação em negociação coletiva n Características do Programa de Capacitação em Negociação – PCN n Como uma entidade sindical pode ter um PCN n Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho – o tema no DIEESE Aspectos gerais n Características do seminário Programa n Percurso da atividade Anexos n Anexo 1 – Exercício para reestruturação da empresa n Anexo 2 – Texto: A terceirização no setor empresarial privado: entre a crista da onda e o novo padrão n Anexo 3 – Texto: A terceirização no setor público brasileiro n Ficha Individual de Avaliação 7 7 7 7 8 11 13 15 17 33 49 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE6 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 7 APRESENTAÇÃO O DIEESE O DIEESE1 é uma entida- de técnica do movimento sindical bra- sileiro que atua nas áreas de pesquisa, assessoria e educação, em temas rela- cionados ao mundo do trabalho. Cria- da em 1955, não tem correspondên- cia em outra parte do mundo. A instituição é mantida por entidades sindicais sócias, como órgão intersindical, em quinze es- tados e no Distrito Federal. Sua direção sindical é composta pelas diferentes correntes do sindica- lismo brasileiro. Os temas estratégicos de a- tuação do DIEESE são a negocia- ção coletiva, o emprego e a renda, trabalhados por uma equipe técni- ca multidisciplinar. Capacitação em negociação coletiva A luta sindical abrange dife- rentes ações como mobilização, greve, articulação, organização, en- tre outras, e leva, quase sempre, a momentos ou a processos de nego- ciação em que há disputa de inte- resses. Preparar-se para desenvol- ver essas ações é um dos desafios de todo dirigente sindical. Para responder a esta neces- sidade, o DIEESE criou o Progra- ma de Capacitação em Negociação – PCN, que procura contribuir para o desenvolvimento e aperfeiçoa- mento das habilidades de negocia- ção do dirigente sindical e para for- talecer sua capacidade de ação e de organização coletiva, permitindo que ele conheça e compreenda o objeto das negociações e o ambi- ente em que elas ocorrem. O seminário Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho, como parte do PCN, pretende co- locar à disposição do movimento sindical o trabalho de pesquisa, as- sessoria, educação e a experiência do DIEESE na área de negocia- ção coletiva. Características do Programa de Capacitação em Negociação – PCN Com o PCN, o DIEESE ofe- rece oportunidades intencionais e continuadas de capacitação a diri- gentes e assessores sindicais. O ob- jetivo é possibilitar a construção de conhecimento sobre questões da negociação coletiva. O PCN trabalha quatro di- mensões relacionadas à negociação: l O ambiente da negociação: con- texto socioeconômico em que a negociação se dá historicamente e o marco institucional definido pelo sistema de relações de trabalho; l O tipo de negociação: por empre- sa, categoria ou setor; bi, tri ou pluripartite; as etapas e o processo de negociação; l O objeto da negociação: a pauta da negociação, ou seja, salário, pro- dutividade, jornada, participação nos lucros e resultados, condições de trabalho, entre vários outros itens. l As habilidades do negociador: ca- pacidade de pessoas e grupos para a negociação. Como uma entidade sindical pode ter um PCN O PCN está concebido para ser desenvolvido a partir de deman- das sindicais. Assim, para cada caso, será proposto um processo diferen- te, por intermédio de um progra- ma de formação. Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE8 Esse trabalho poderá ser re- alizado diretamente pela equipe do DIEESE ou em cooperação com os formadores da entidade deman- dante. Os participantes poderão receber certificados. Para conversar sobre um PCN, entre em contato com os Escritórios Regionais ou com o Escritório Nacio- nal do DIEESE. Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho – o tema no DIEESE O tema da terceirização é an- tigo, entretanto, no Brasil começou a se difundir na década de 80. No início se restringiu a alguns setores e aos poucos tomou fôlego e se ex- pandiu para diferentes atividades. O DIEESE, já em meados da década de 80, com o trabalho das subseções, inicia a discussão dessa temática com o movimento sindical. Vários estudos começam a ser elabo- rados em diferentes sindicatos do país, particularmente para as entida- des de bancários, petroleiros, meta- lúrgicos, químicos e petroquímicos. Esses trabalhos também en- volveram a assessoria às entidades sindicais, com subsídio às discussões e às negociações travadas sobre a terceirização e debates sobre as di- ferentes implicações da terceiri- zação no cotidiano dos trabalhado- res. Entretanto, foi no início da dé- cada de 90 que o DIEESE, com uma pesquisa, pôde se dedicar com maior ênfase a essa questão. Durante o ano de 1992 e o início de 1993, o DIEESE reali- zou uma pesquisa sobre tercei- rização com diferentes categorias profissionais.O resultado desse le- vantamento encontra-se na Pesqui- sa DIEESE nº 7, Os trabalhadores frente à terceirização, lançado em maio de 1993. Esse estudo teve grande impacto sobre o meio sin- dical e foi tema de importantes discussões e debates realizados com os dirigentes sindicais em todo o país. Foi também referência para a discussão do tema, para ou- tras instituições da sociedade, como por exemplo, a imprensa e a acade- mia. Embora 10 anos tenham se pas- sado desde a edição da pesquisa, o trabalho ainda representa uma im- portante referência para a discussão da terceirização no país. Em 1993, a subseção do DIEESE, em 1993, do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC publi- cou a cartilha Os trabalhadores e a terceirização, destacando os im- pactos da terceirização sobre o tra- balho, em particular, sobre o tra- balhador metalúrgico. Resultado do esforço coleti- vo da Linha Bancários, o DIEESE publicou em julho de 1994 o segun- do número dos Estudos Setoriais, com o tema da Terceirização e reestru- turação produtiva no setor bancário no Brasil. Este estudo, elaborado pelas subseções do DIEESE presentes em diferentes entidades sindicais de bancários do país, representou um importante instrumento de discus- são de estratégia para o movimento sindical bancário, uma vez que a terceirização foi e ainda é utilizada como um instrumento de ajuste pro- dutivo dos bancos no país. A discussão da terceirização no setor público também mereceu destaque nos trabalhos realizados pelo DIEESE. Em setembro de 1993 foi produzido o texto A ter- ceirização no setor público: o modelo paulista de privatização, que desta- cou o debate sobre o modelo de a p r e s e n t a ç ã o Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 9 contratação de mão-de-obra ter- ceirizada em diferentes empresas estatais de São Paulo e apresentou uma discussão sobre os efeitos deste modelo sobre as condições de trabalho. Ainda sobre o setor público, o DIEESE produziu em dezembro de 1993 o artigo Terceirização dos ser- viços em empresas públicas de serviços essenciais – saneamento básico, crise e privatização, que analisava as estra- tégias do recurso da terceirização no setor público. Durantea década de 90, o processo de terceirização avançou em diferentes setores produtivos e os trabalhos anteriormente desen- volvidos pelo DIEESE serviram de referência para as eventuais ações sindicais sobre o tema. Atualmente, a terceirização retorna com maior força à agenda sindical, pois revestiu-se de nova roupagem e é novamente utilizada como estratégia de reestruturação das grandes, médias e até mesmo pequenas empresas, tanto do setor privado como público. A terceirização e suas conse- qüências sobre o mundo do traba- lho têm adquirido, assim, importân- cia cada vez maior para o movimen- to sindical brasileiro. Importantes categorias profissionais já realizam discussões de pautas e rodadas de negociações específicas sobre esse tema, diante do impacto sobre os tra- balhadores. Essas demandas mobi- lizaram o DIEESE a desenvolver o seminário. Durante seis meses, cer- ca de 15 técnicos desenvolveram materiais e textos de apoio ao pro- cesso de negociação e formação dos dirigentes sindicais brasileiros sobre a terceirização. 1. Conheça mais sobre o Departamento Inter- sindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos – DIEESE e sua produção técnica visitando o sítio na internet: www.dieese.org.br a p r e s e n t a ç ã o Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE10 a p r e s e n t a ç ã o Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 11 ASPECTOS GERAIS Características do seminário Objetivos O seminário Terceirização: efei- tos sobre as relações de trabalho visa ofe- recer aos participantes a oportunida- de de refletir sobre o processo de terceirização, a partir da percepção que possuem desta questão no coti- diano de trabalho. Parte da experi- ência individual para, envolvendo todo o grupo, trazer elementos que permitam a reflexão sobre o tema na interface da relação capital e traba- lho, abordando elementos históricos que orientam a terceirização e seus determinantes e os diferentes discur- sos que legitimam esses processos. Também são apresentados elementos que capacitam os parti- cipantes para esta discussão, em um contexto mais amplo, como in- teresses e a estrutura institucional que moldam os processos de ter- ceirização no Brasil. Para isso, a ati- vidade reconstrói o conceito de terceirização a partir do conheci- mento dos participantes e de refle- xões possibilitadas pela vivência de situações de representação sobre este tipo de processo e da leitura de textos especialmente prepara- dos para o seminário. O percurso desenvolvido es- tá ancorado na abordagem históri- ca, com ênfase no modelo brasilei- ro, e busca um olhar que permita a percepção dos limites e dos desafi- os que a terceirização impõe ao movimento sindical, representan- te de trabalhadores assalariados do setor privado e público. São objetivos da atividade: sistematizar o conhecimento cole- tivo sobre terceirização, abordando elementos do cotidiano dos traba- lhadores, dos discursos dos diferen- tes atores sociais, dos interesses e da gestão que determinam as regras vigentes e a dinâmica da tercei- rização no Brasil; levar os partici- pantes a reconhecerem a terceiri- zação como um processo, fazendo com que despertem para a neces- sidade da preparação contínua para a discussão e a negociação deste tema, com planejamento, acompa- nhamento e avaliação das ações. Atualização e reprodução do material Entre os materiais do kit pode haver alguns que precisem de atuali- zação regular. Em caso de dúvida ou para atualizá-los, envie mensagem para gt_imprensa@dieese.org.br. Está autorizada a reprodu- ção total ou parcial do material re- ferente ao seminário, desde que citada a fonte. Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE12 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 13 PROGRAMA Percurso da atividade 1º DIA n Abertura e apresentação dos participantes n Expectativas, programa e funcionamento do grupo n A experiência sindical da terceirização n Ação sindical e terceirização 2º DIA n Ação sindical e terceirização 1. Visão empresarial da terceirização 2. Aspectos teóricos e práticos da terceirização 3º DIA n Ação sindical e terceirização n Avaliação n Encerramento Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE14 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 15 ANEXO atividade: ao sindical e terceirizao — a viso empresarial da terceirizao nú m er o 1 Exercício para reestruturação da empresa n SITUAÇÃO A Você que está lendo este papel acabou de ser contratado pela ESEEID CONSULTORIAS. A ESEEID é uma organização que presta consultoria a empresas que buscam melhorar a eficiência de mão-de-obra e assim aumentar a produtividade e conseqüentemente a competitividade. Recentemente, a ESEEID assinou um contrato com a empresa S&D Ltda., que prevê a assessoria direta no processo de reestruturação e modernização da companhia. A S&D Ltda. é uma empresa do setor têxtil, produtora de moda íntima feminina. A moda íntima feminina, apesar de representar um produto de consumo de massa, é complexa, resultado da associação de diversas partes e que tem em seu processo produtivo inúmeras etapas e diferentes linhas de produção. A S&D Ltda., como muitas empresas nacionais, mantém uma administração tradicional. Sua origem é familiar e seu controle ainda está nas mãos da família do fundador. Também é tradicional na gestão de pessoal e mantém em seu quadro de funcionários 10 mil trabalhadores de diferentes qualificações que exercem todas as funções necessárias à produção, distribuição e venda dos produtos, bem como as funções administrativas e operacionais, tais como cobrança, marketing, telemarketing, contabilidade, limpeza, vigilância, cozinha e muitos outros relacionados ao suporte do trabalho. Sua função, como técnico da ESEEID CONSULTORIAS, é montar um plano de reestruturação organizacional e gerencial que modernize as estruturas da S&D Ltda., aumente a produtividade da empresa, reduza custos e melhore a capacidade dela de concorrer no mercado internacional dominado pelas indústrias alemãs e francesas. Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE16 a n e x o 1 atividade: ao sindical e terceirizao — a viso empresarial da terceirizao Exercício para reestruturação da empresa n SITUAÇÃO B Você que está lendo este papel é funcionário da S&D Ltda. A S&D Ltda é uma empresa do setor têxtil, produtora de moda íntima feminina. A moda íntima feminina, apesar de representar um produto de consumo de massa, é complexa, resultado da associação de diversas partes e que tem em seu processo produtivo inúmeras etapas e diferentes linhas de produção. A S&D Ltda., como muitas empresas nacionais, mantém uma administração tradicional. Sua origem é familiar e seu controle ainda está nas mãos da família do fundador. Também é tradicional na gestão de pessoal e mantém em seu quadro de funcionários 10 mil trabalhadores de diferentes qualificações, que exercem todas as funções necessárias à produção, distribuição e venda de produtos, bem como as funções administrativas e operacionais, tais como cobrança, marketing, telemarketing, contabilidade, limpeza, vigilância, cozinha e muitos outros relacionados ao suporte do trabalho. Atualmente, corre pelos corredores da empresa que a atual diretoria teria contratado uma Consultoria, com a tarefa de reestruturar toda a empresa. Como representante sindical, sua tarefa é levantar dados sobre o processo de terceirização, pensar sobre ele e nos impactos sobre o trabalho e os trabalhadores. O sindicato recentemente foi chamado para debatercom a empresa e a consultoria o processo de terceirização. Assim, você agora está em uma reunião com diversos trabalhadores a fim de debater os motivos dessas mudanças e o que pode acontecer na empresa e na vida dos funcionários a partir dessa reestruturação. Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 17 ANEXO nú m er o 2 atividade: ao sindical e terceirizao — aspectos tericos e prticos da terceirizao A terceirização no setor empresarial privado: entre a crista da onda e o novo padrão DIEESE. Janeiro, 2004 Introdução Como ocorre em relação aos mais diversos temas inerentes ao mundo do trabalho no Brasil, o DIEESE já havia abordado a ex- pansão significativa do processo de terceirização na economia brasilei- ra, em princípios dos anos 90. Vári- os textos foram produzidos, semi- nários organizados e um caderno de pesquisas especialmente dedicado ao tema foi publicado em 1993. Pouco mais de 10 anos depois, ao retomar o debate sobre a tercei- rização, focalizamos agora em par- ticular o que se passou no setor pri- vado ao longo da última década do século XX e nos anos iniciais do novo século. Revisitar as análises sobre o processo de terceirização no setor empresarial privado constitui-se numa interessante empreitada. Por um lado, o próprio termo terceirização – de avassaladora presença no início dos anos 90 – deixa de aparecer com a mesma freqüência. Por outro lado, o processo segue seu curso. Neste texto, argumenta-se que a tercei- rização, configurada como uma nova “onda” na gestão das relações entre empresas no tecido econômico bra- sileiro do início dos anos 90, trans- forma-se progressivamente em um dos aspectos constituintes de um novo padrão de organização empre- sarial no setor privado, seja toman- do-se as unidades geradoras de bens e serviços como foco de análise, seja tomando-se os principais setores econômicos e, em particular, o setor industrial. Este argumento será apre- sentado e discutido em três movi- mentos. No primeiro tópico, são re- tomados os conceitos principais e as características do processo de terceirização na economia brasilei- ra, no início dos anos 90. No segun- do item, discute-se a evolução do processo de terceirização a partir do resgate e da análise de pesquisas elaboradas a partir da segunda me- tade dos anos 90. O terceiro tópico aborda a terceirização como aspec- to integrante de um novo padrão de relações interempresariais, no setor empresarial privado, e relaci- onada a outros pilares de um novo padrão de gestão empresarial que se configura especialmente nos se- tores e empresas de ponta da eco- nomia brasileira. Finalmente, o quarto tópico conclui com uma dis- cussão sobre o rebatimento dessa transformação para as relações de trabalho, e em particular para a or- ganização e a ação sindical na socie- dade brasileira. A rumorosa onda da terceirização O termo terceirização passou a ocupar espaço nas discussões re- lacionadas ao mundo do trabalho no Brasil a partir do início dos anos 90, mas evidentemente não se tra- tava de um processo absolutamen- te novo. Tratava-se, a rigor, de um novo termo cunhado para caracte- Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE18 a n e x o 2 rizar a crescente e rumorosa trans- ferência de atividades realizadas por empresas de grande porte me- diante a contratação de outras em- presas (em geral de menor porte), em meio à acelerada reestruturação produtiva que buscava responder a transformações estruturais do pa- drão de concorrência na economia brasileira. Em particular, buscava- se readequar a configuração produ- tiva de empresas e setores então sujeitos à competição com produ- tos oriundos do exterior, mediante progressivas e expressivas reduções de barreiras às importações. Nesse sentido, a terceiri- zação pode ter dois significados di- versos e eventualmente comple- mentares. Por um lado, traduz a desativação, parcial ou total, de seto- res produtivos,1 com a empresa prin- cipal deixando de produzir (bens ou serviços) e passando a comprá- los de outras empresas, denomina- das terceiras. O segundo significado refere-se à contratação de uma ou mais empresas terceiras que alocam trabalhadores para a realização de al- gum serviço ou parte do processo produtivo no interior da empresa principal (ou empresa-mãe, como se convencionara denominar as empresas contratantes).2 O contexto em que se pro- paga de modo rumoroso a tercei- rização no setor empresarial brasi- leiro, durante o início dos anos 90, está demarcado por uma importan- te transformação do cenário econô- mico brasileiro – e especialmente do cenário industrial. Trata-se da abertura do mercado brasileiro a produtos (em maior grau) e servi- ços (em menor grau), que se vin- cula ao intenso movimento de rees- truturação dos sistemas e cadeias produtivas, conduzido seja pelo próprio setor privado, seja estimu- lado por programas governamentais lançados a partir de 1990, a exem- plo do Programa Brasileiro de Qua- lidade e Produtividade – PBQP. Nesse cenário, a terceiri- zação passa a contribuir de modo significativo para a desverticali- zação do tecido industrial brasilei- ro, resultando no enxugamento de recursos e de áreas mobilizados an- teriormente pelas grandes empre- sas das principais cadeias produti- vas. Aqui duas possibilidades são abertas: a terceirização por dentro corresponde à contratação de fir- mas terceiras para a execução de atividades no próprio estabeleci- mento da empresa contratante. A terceirização para fora associa-se aos conceitos de outsourcing3 , me- diante a contratação de insumos e serviços de outras empresas capa- zes de fornecê-los, e ao global sour- cing, mediante a aquisição de insu- mos e serviços em qualquer lugar do planeta, possibilidade gradual- mente incrementada, no caso bra- sileiro, pelas sucessivas reduções de alíquotas de importação na primei- ra metade dos anos 90. Entretanto, a terceirização à brasileira desse período não se resu- me apenas a isso. A forte retração da economia brasileira ao longo do cur- to governo Collor acelera e intensifi- ca esse processo, associando-o à pers- pectiva de redução de custos e am- pliando, em alguma medida, a re- tração da massa salarial como resul- tado da diminuição de remunerações pagas pelas maiores empresas e dos salários menores, vigentes nas em- presas subcontratadas, ou seja, nos se- tores terceirizados. No mesmo senti- do, a terceirização tem também o sig- Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 19 a n e x o 2 nificado de flexibilização, ao possibi- litar a transferência da responsabili- dade por alguns investimentos antes realizados pela empresa, que agora terceiriza algumas de suas atividades, bem como a transformação de custos fixos (os recursos pertencentes à em- presa) em custos variáveis, relativos aos recursos contratados pela empre- sa em firmas terceiras, apenas quando necessário. As motivações da terceiri- zação vinculam-se, portanto, à idéia de flexibilização, procurando con- trapor-se ao conceito da grande empresa vertical, hierarquizada, fordista enfim, no sentido microe- conômico do termo. Redução de custos, racionalização, especializa- ção, qualidade e produtividade, mudança organizacional e tecno- lógica emergem como aspectos as- sociados a este movimento no prin- cípio dos anos 90. Um outro lado dessa moeda é o enfraquecimento do movimento sindical, também apontado naquele período como um dos objetivos da onda terceirizante que passa a atravessar as principais empresas e cadeias produtivas do país. O discurso da eficácia empre- sarial é a palavra de ordem que acompanha a terceirização; a prática muitas vezes se revela como degra- dante e pouco virtuosa. Se a terceirizaçãofica asso- ciada à redução da massa salarial, desde a primeira metade da déca- da de 90, e a precarização das con- dições de trabalho aparece clara- mente como conseqüência da mera estratégia de redução de custos adotada por uma parcela significa- tiva das empresas de grande e mé- dio portes, por outro lado não se dá a compensação propagandeada em relação ao nível de emprego. O mercado de trabalho formal enco- lhe em meio à reestruturação e desestruturação dos diversos com- plexos produtivos que caracterizam a diversa economia brasileira. Os segmentos industriais são os mais afetados e o eventual crescimento do setor de serviços não recompõe os postos de trabalho destruídos na indústria como um todo. Ao final de 1999, a indústria brasileira fecha- ria o balanço com 4,7 milhões de empregos formais, contra 6,2 mi- lhões em 1989 (Sabóia, 2001:88). Finalmente, cabe ressaltar uma característica importante da terceirização como onda, na pri- meira metade da década de 90. A terceirização avança nesse período principalmente no que se con- vencionou chamar de atividades de apoio e, mais especificamente, atividades de apoio à gestão: de apoio administrativo, em áreas como limpeza, segurança interna, transporte e alimentação. No que diz respeito às áreas de apoio mais correlatas à produção, as principais atividades terceirizadas concentra- vam-se na manutenção de equipa- mentos e sistemas, e na elabora- ção de projetos.4 No que diz res- peito a etapas do processo produ- tivo, o ato de terceirizá-las corres- pondia geralmente ao chamado outsourcing ou ao global sourcing, mediante a opção de compra de insumos de empresas terceiras para posterior entrada no processo produtivo da contratante. Eram, portanto, muito raras – ou mesmo inexistentes naquele período – as iniciativas de terceirização de fa- ses produtivas mediante a con- tratação de empresas terceiras que operavam no mesmo espaço fabril da contratante. Essa característica Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE20 sofrerá uma importante mudança na segunda metade dos anos 90, como será visto no próximo tópico.5 O silencioso avanço da terceirização Em contraposição à rumo- rosa onda em que se constitui a terceirização no início dos anos 90, a segunda metade da década é marcada por um silencioso avanço do processo, como parte da ampla reestruturação produtiva que carac- teriza a transformação das princi- pais empresas instaladas no Brasil. No plano regional, vale res- gatar o estudo sobre a reestruturação produtiva na indústria de Santa Catarina, produzido pelo DIEESE, em 1997. Focalizando seis dos prin- cipais segmentos industriais daque- le Estado,6 o trabalho assinala que “...a terceirização disseminou-se em todos os setores pesquisados, espe- cialmente na área de apoio e nos serviços necessários à produção ...” O principal destaque era para a in- dústria metalmecânica, onde se en- contravam casos de terceirização de atividades produtivas como zin- cagem, tratamento térmico, usina- gem, caldeiraria e ferramentaria. No caso do setor têxtil, ati- vidades de confecção também fo- ram reportadas como objeto de terceirização7, de acordo com o tra- balho. Entrevista com diretoras do Sindicato das Costureiras do Gran- de ABC (primeiro semestre de 2003) confirma a crescente tercei- rização de atividades vinculadas à confecção, com o surgimento de pequenas oficinas informais ali- mentando empresas de médio por- te, ou mesmo com a intensificação do trabalho em domicílio nesse seg- mento industrial. Na capital pau- lista, é notória a existência de esta- belecimentos clandestinos que se baseiam no trabalho de imigrantes bolivianos, concentrados em parti- cular no bairro do Bom Retiro.8 Outra análise realizada no âmbito regional se refere ao Gran- de ABC, que se torna a ponta-de- lança do crescente avanço da indus- trialização brasileira a partir de mea- dos dos anos 50. Focalizando a rees- truturação empresarial naquela re- gião, Klink (2001:149-50) resgata um conjunto de estratégias defen- sivas que se intensificam ao longo dos anos 90, mostrando o seu vigor particularmente nas duas principais cadeias produtivas da região, a au- tomotiva e a petroquímica. Como se poderá notar, tais estratégias es- tão relacionadas de alguma manei- ra ao processo de terceirização de atividades: l a redução das escalas de opera- ção, através dos cortes drásticos nos custos fixos e nos quadros de trabalhadores; l a ampliação das importações de insumos; l a desativação de linhas de produção; l a seleção criteriosa de fornecedo- res, e por fim, l a intensificação de processos de desverticalização e de subcontratação, objetivando descentralizar riscos e custos fixos para outras unidades que compõem a cadeia produtiva. No que diz respeito direta- mente aos processos de subcon- tratação, o mesmo autor se apóia nos dados da Pesquisa da Ativida- de Econômica Paulista (Paep), con- duzida pela Fundação Seade, em 1996, distinguindo o impacto sobre a economia regional a partir de dis- tintos focos de terceirização verifi- a n e x o 2 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 21 cados (Klink, 2001:159-69). Um primeiro grupo de atividades, em tese com maior efeito encadeador para a economia regional, estaria nos serviços do chamado terciário avançado, compatíveis com a traje- tória industrial precedente e volta- dos à elevação dos valores agrega- dos das principais cadeias produti- vas. Nesse plano estariam serviços tipicamente de apoio à produção industrial, como o desenvolvimen- to de novos produtos, a execução de projetos de engenharia, a logís- tica industrial, os ensaios de insu- mos e produtos e a manutenção de máquinas e equipamentos. Klink (2001:161) nota que, em meados dos anos 50, era a manuten- ção dos equipamentos que se desta- cava nesse grupo em termos de difu- são da terceirização nas empresas pesquisadas, enquanto os demais itens ainda mostravam um menor grau de subcontratação. Contraria- mente, era na terceirização de ativi- dades relacionadas à informatização e de apoio básico (limpeza, alimenta- ção etc.) que residia ainda o maior impacto da reestruturação no plano das relações entre empresas. Todavia, a ocorrência de subcontratação de ati- vidades do primeiro grupo (apoio di- reto à produção) era claramente su- perior nas empresas do setor auto- motivo em relação às demais, seja no ABC ou fora do ABC (Klink, 2001:162-3), já confirmando a ace- leração desse processo, a partir da desverticalização das montadoras e grandes empresas de autopeças daquele segmento empresarial.9 É importante também notar a ocorrência desse processo simul- taneamente a uma reestruturação interna da gestão empresarial e dos processos produtivos, caracterizada pela adoção de técnicas just in time, da produção flexível em células e de qualidade total, além de uma maior ênfase à inovação de produ- tos e processos por parte das em- presas do Grande ABC comparati- vamente ao restante do Estado (Klink, 2001:172). Outro elemento impulsio- nador desse avanço é a privatização de empresas estatais, em suas dife- rentes esferas (federal, estadual e municipal), que contribui de modo decisivo para o esvaziamento de equipes permanentes vinculadas às referidas empresas, como se pode verificar claramente pela subcon- tratação de atividades (dentre ou- tras) como a manutenção de redes elétricas, de redes telefônicas, a lei- tura de medidores desses serviços de interesse público, seus sistemas de atendimento ao cidadão, a segu- rança de agências bancárias, entre os diversos exemplos possíveis.10 As relações interempresas e o novo padrão produtivo dos anos 90 A reestruturação acelera-se, portanto, a partir do início dos anos 90, sendo a onda da terceirização um de seus elementosmais carac- terísticos, no caso do setor privado brasileiro. Esse processo avançaria ao longo da década, levando à trans- formação significativa dos padrões de concorrência, tecnológico e orga- nizacional nos principais setores industriais da economia brasileira. Leda Gitahy (2000), a partir de quatro pesquisas realizadas ao longo dos anos 80 e 90, caracteriza esse quadro de transformações co- mo uma mudança do paradigma de organização industrial típico da eco- a n e x o 2 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE22 nomia brasileira. Com análises nos setores metalmecânico e eletrôni- co do Estado de São Paulo, de auto- peças em São Paulo, Rio de Janei- ro e Rio Grande do Sul, e de calça- dos em São Paulo e Rio Grande do Sul, bem como a partir de um estu- do específico sobre o complexo automotivo (Gitahy e Bresciani, 1998), a referida autora destaca um conjunto de mudanças intrafirmas e interfirmas que caracterizam um novo paradigma da organização in- dustrial brasileira (Gitahy, 2000).11 As principais mudanças que carac- terizam essa transformação são a- presentadas nos Quadros 1 e 2 ( no final do texto) e tomam como base principal o estudo realizado por Gitahy e Bresciani (1998) para o complexo automotivo. Quanto mais relevante o po- sicionamento de determinada em- presa ou de suas unidades produti- vas em seus respectivos mercados, mais complexidade assume o pro- cesso de terceirização, indo para além da transferência de atividades mais simples (como a limpeza, ali- mentação, segurança etc) que carac- terizam a onda inicial dos anos 90. Nesse sentido, a terceiriza- ção configura-se como elemento integrante de uma profunda rees- truturação das relações interem- presas que se verificam nos dife- rentes mercados e cenários socioe- conômicos, dialogando, por um lado, com o aprofundamento da chamada globalização ou mundia- lização dos fluxos econômico-pro- dutivos, e, por outro lado, com no- vos padrões de concorrência e de configuração tecnológica e organi- zacional que demarcam a indús- tria da virada do século XX para o século XXI, como exemplificado pelos Quadros 2 e 3, com o regis- tro das transformações no comple- xo automotivo brasileiro e que se difundem para outros segmentos empresariais em nosso país. O Quadro 2 estaria portan- to fundamentalmente vinculado ao que Britto (1997:292) caracte- riza como estratégia “ofensiva” de terceirização, baseada em in- tensa cooperação e na “integração de competências ao longo das ca- deias interindustriais, o que refor- çaria a capacitação produtiva e tecnológica”, visando portanto uma maior eficácia técnica e eco- nômica do conjunto de empresas envolvidas.12 Enquanto estratégias “defensivas” – marcadas pela trans- ferência de custos, responsabilida- des, riscos e encargos – foram típi- cos da onda terceirizante do princí- pio dos anos 90 (inclusive no setor de telequipamentos analisado pelo autor), Gitahy (2000) aponta para a crescente complexidade das rela- ções interfirmas, verificando portan- to claras tendências de mudança abrangente e ofensiva, como ante- cipado por autores cujos estudos datam da primeira metade daquela década.13 Claro está que o grau dessa complexidade nos arranjos inter- firmas que se constituem a partir dos anos 90 é também mais ou menos avançado, especialmente em função do comportamento ado- tado pelas suas empresas líderes, aspecto que é também destacado por Carleial (1997:321-3), em seu estudo sobre a indústria eletro-ele- trônica de Curitiba. O que cabe em especial assinalar, a partir de todo o processo de reestruturação produ- tiva ocorrido ao longo dos anos 90, é a importância de análises criterio- a n e x o 2 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 23 sas que considerem a possibilida- de de diferentes características dos processos de terceirização, vincula- dos a transformações nos padrões de concorrência, tecnologia e ges- tão das empresas, bem como a mudanças nas estruturas de gover- nança dos diversos arranjos/com- plexos industriais ou dos diferen- tes segmentos de serviços. A terceirização como parte do novo padrão produtivo: implicações para a organização sindical no Brasil Desde o início da rumorosa onda da terceirização em princípi- os dos anos 90, este se tornou um tema relevante para as relações de trabalho e a organização sindical no Brasil, dada a variedade de impli- cações que acompanhava e segue acompanhando o referido proces- so. As pesquisas do DIEESE pu- blicadas em 1993 e 1997 davam conta disso, de modo bastante si- milar. No primeiro caso, o destaque vai para os relatos de precarização das condições de trabalho, em suas diversas dimensões: jornada, saúde e segurança, salários e benefícios. No segundo caso, os princi- pais relatos de sindicatos e traba- lhadores enfatizavam a precariza- ção das condições de trabalho, o aumento da insegurança no traba- lho (em suas mais diversas formas), a redução de postos de trabalho, a informalização de vínculos de em- prego, a redução de salários e mas- sas salariais, a dificuldade de aces- so a treinamento para os trabalha- dores de firmas terceiras, o descon- trole sobre as jornadas de trabalho, perante a quase absoluta ausência dos sindicatos na condução de pro- gramas de terceirização e de rees- truturação produtiva (DIEESE, 1997:18).14 Pertence a Aparecido Faria (1994:40-60) uma das mais interes- santes e pioneiras abordagens so- bre a terceirização e os desafios que esta impunha à organização sindi- cal. Dentre os efeitos da terceiri- zação, relacionados pelo autor, en- contram-se de redução salarial e redução do número de empregos até desmobilização sindical e dimi- nuição do número de trabalhado- res sindicalizados. Almeida Neto (2003:68) a- ponta a redução de custos de pro- dução como o motor fundamental da terceirização, especialmente via redução de salários e benefícios, mas nota seu uso também como forma de fragmentação das catego- rias profissionais e enfraquecimen- to de sindicatos. Esse aspecto se confirma não apenas pela redução de remunerações brutas pagas a tra- balhadores de empresas terceiras, como se vincula também à nova regulamentação dos contratos de trabalho temporário, que resultou no corte de alguns “encargos” inci- dentes sobre os salários nominais.15 Também a maior complexi- dade, grau de cooperação ou vir- tuosidade do novo arranjo inter- firmas não significa garantia de avanços do ponto de vista das con- dições de trabalho e especialmen- te da remuneração e dos benefíci- os não-salariais auferidos pelos tra- balhadores. Em um cenário de ele- vadas taxas de desemprego, obser- va-se que a reestruturação produti- va é acompanhada, por um lado, de níveis mais elevados de treinamen- to e qualificação profissional, e, por a n e x o 2 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE24 outro lado, pela crescente redução da renda do trabalho. Outro aspec- to que permanece relevante nos processos de terceirização é a dife- renciação ou segregação social cons- tituída pelas diferentes condições de contratação entre os empregados com vínculo trabalhista com a em- presa principal e os empregados “subcontratados” de empresas me- nores, por vezes operando à margem da economia formal, diferenciação esta que se acentua à medida que diminui a complexidade ou o status da atividade terceirizada.16 Em suma, se a precarização do trabalho permanece como carac- terística da terceirização “à brasilei- ra”, típica da rumorosa onda dos anos 90, a continuidade e a com- plexidade dos processos de reestru- turação produtiva impõem um o- lhar cuidadoso e capaz de distin- guir, na maior parte dos casos, a ocorrência de distintas experiênci- as de terceirização em uma mesma empresaou arranjo produtivo, em um leque de possibilidades que vai da redução de custos e degradação do trabalho, em um extremo, à co- operação interfirmas com base no trabalho qualificado e especializa- do, no outro. Nesse sentido, o principal desafio do movimento sindical bra- sileiro se refere à própria capacida- de de representação de entidades criadas para atuar em âmbitos ge- ralmente restritos de uma configu- ração setor/categoria/local clara- mente extemporânea ante a trans- formação da economia brasileira, não apenas ao longo dos anos 90, mas tomando-se inclusive toda a segunda metade do século XX. Resolver a referida equação, envol- vendo estrutura e representação (já identificada em diversos momen- tos da história brasileira, do início do século passado até o período contemporâneo), bem como com- preendendo a complexidade, a di- versidade e o caráter permanente da mudança nos padrões de produ- ção de bens e serviços, eis uma ne- cessidade que parece imperiosa e inadiável para o movimento sindi- cal brasileiro. a n e x o 2 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 25 a n e x o 2 Quadro 1 Transformações no interior das empresas Fonte: Gitahy e Bresciani (1998:30); Gitahy (2000:18) 1. BASE TÉCNICA (inovações tecnológicas) 2. ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA PRODUÇÃO 3. NOVAS FORMAS DE GESTÃO E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO 4. NOVAS CONCEPÇÕES DE GESTÃO PRODUTIVA n maior grau de automação dos processos; n maior flexibilidade dos equipamentos; n sistemas informatizados permeando a gestão. n mudanças no layout das plantas (mini-fábricas, células); n programas de qualidade e produtividade, visando melhoria contínua e redução dos “desperdícios” e custos associados (estoques, retrabalho, defeitos, tempo de circulação de materiais, tempo de preparação de máquinas e do lead-time). n mudança nas atribuições profissionais dos trabalhadores envolvidos nas atividades operatórias; n maior tendência à polivalência; n maior responsabilidade pela condução do processo; n introdução do conceito de equipe de trabalho. n redução dos níveis hierárquicos da empresa; n treinamento técnico e comportamental; n nova postura gerencial; n programas participativos; n remuneração variável/participação nos resultados; n fábricas focalizadas. Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE26 a n e x o 2 Quadro 2 Transformações na relação interfirmas Fonte: Gitahy e Bresciani (1998:30); Gitahy (2000:19) 1. NOVAS FORMAS DE RELAÇÃO COM O MERCADO 2. DESENVOLVIMENTO DE REDES DE RELAÇÕES INTERFIRMAS 3. MUDANÇAS ORGANIZACIONAIS 4. REPERCUSSÃO DE NOVOS PRODUTOS n implantação do sistema just in time para adaptação da estrutura da firma às instabilidades da demanda qualitativa e quantitativa do mercado; n focalização dos processos, redefinição de produtos e clientes (especialização); n flexibilização das condições operacionais da empresa; n uso de novos materiais e componentes. n com fornecedores – criando parcerias seletivas e um nível de estabilidade que permita garantias de atendimento em termos de qualidade do material fornecido e dos prazos de entrega. Essa parceria inclui muitas vezes assistência técnica da grande empresa (ou central, na rede) na direção de seus fornecedores, sejam eles de componentes ou serviços de apoio direto à produção; n com subcontratadas “externas” – que passam a realizar partes da produção ou elaborar componentes e peças dos produtos finais das grandes empresas, ou prestar serviços que são executados fora das fronteiras físicas da grande empresa; n com subcontratadas “internas” – que passam a realizar determinadas atividades de apoio direto à produção (manutenção, ferramentaria, engenharia de projetos, engenharia de métodos, entre outros). n constituição de condomínios industriais; n formação do “consórcio modular”. n obsolescência de componentes e modelos; n desenvolvimento de novos materiais e componentes alternativos. Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 27 a n e x o 2 Qu ad ro 3 Tr an sf or m aç õe s n a ca de ia a ut om ot iv a br as ile ira l el et ro m ec â- ni co s, in íc io d o us o de C NC l m an ut en çã o co rr et iv a, re al iz ad a po r de pa rta m en to s es pe ci al iz ad os l co nt ro le d e qu al id ad e tra di ci on al v ia in sp eç ão , co m bi na do , n o fin al d a dé ca da , co m a s pr im ei ra s ex pe riê nc ia s lo ca liz ad as c om CC Q l bu ro cr át ic a, hi er ar qu iz ad a, co m g ra nd e nú m er o de ní ve is hi er ár qu ic os l pr oc es so de ci só rio d e ci m a pa ra b ai xo l or ga ni za çã o fu nc io na l (d ep ar ta m en to s po r f un çã o) l co nt ro le si nd ic al v ia C LT e re pr es sã o po lic ia l l em pr es as re fra tá ria s ao s si nd ic at os , re pr es sã o às lid er an ça s l gr up os cl an de st in os + Ci pa AN O S 70 PA DR ÃO D E CO NC OR RÊ NC IA PA DR ÃO T EC NO LÓ GI CO PA DR ÃO D E GE ST ÃO IN OV AÇ ÕE S TE CN OL ÓG IC AS E O RG AN IZ AC IO NA IS (D E PR OC ES SO ) N O IN TE RI OR D AS E M PR ES AS ES TR U TU R A D A EM PR ES A R EL AÇ Õ ES D E TR AB AL H O EQ U IP AM EN TO S/ M AN U TE N ÇÃ O Q U AL ID AD E l pr od uç ão di rig id a ao m er ca do in te rn o pr ot eg id o e em ex pa ns ão l lin ha s de m on ta ge m l di vi sã o ríg id a de c ar go s e ro tin iz aç ão l lin ha s de di ca da s l or ga ni za çã o fu nc io na l e ro tin iz aç ão l es to qu es l pl an ta s ve rti ca liz ad as l nú m er o el ev ad o de fo rn ec ed or es l co nf lit os n a ca de ia p ro du tiv a l us o in te ns iv o de tr ab al ha do re s se m i- qu al ifi ca do s l ro ta tiv id ad e in te ns a p/ re du zi r sa lá rio s e di sc ip lin ar m ão -d e- ob ra l es tru tu ra d e ca rg os e s al ár io s ba se ad as e m po st os /ta re fa s (g ra nd e le qu e sa la ria l) l ch ef ia s au to rit ár ia s OR GA NI ZA ÇÃ O DO TR AB AL HO /G ES TÃ O DA P RO DU ÇÃ O ES TR U TU R A D E Q U AL IF IC AÇ ÃO PO LÍ TI CA S D E G ES TÃ O RE LA ÇÕ ES IN TE RF IR M AS (C LI EN TE / FO RN EC ED OR ) F on te : G ita hy e B re sc ia ni (1 99 8) ; G ita hy (2 00 0: 38 ) CO NT IN UA Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE28a n e x o 2 Qu ad ro 3 Tr an sf or m aç õe s n a ca de ia a ut om ot iv a br as ile ira l el et ro - m ec ân ic a, in íc io de a ut om aç ão m ic ro el et rô ni ca (R ob ôs , C NC Tr an sf er , C AD / CA M in ov aç õe s lo ca liz ad as ), CN C, D NC l in íc io d a de sc en tra liz aç ão e in te gr aç ão d a m an ut en çã o e TP M l in íc io e in te ns ifi ca çã o, a pa rti r d e m ea do s da d éc ad a, d o m ov im en to p el a qu al id ad e l in te ns ifi ca çã o de e xp er iê nc ia s co m C CQ n o in íc io d a dé ca da , ab an do na da s po st er io rm en te l ut ili za çã o cr es ce nt e do C EP e ou tra s té cn ic as de q ua lid ad e l TQ M l ce rti fic aç ão IS O 90 00 l in íc io d o pr oc es so d e de sc en tra - liz aç ão : l re du çã o do s ní ve is hi er ár qu ic os l un id ad es d e ne gó ci os l ge st ão p or pr oc es so s l “e qu ip es ” ou “p ro je to s” m ul tif un ci on ai s l re de m oc ra - tiz aç ão , si nd ic at os at ua nt es , l gr ev es , co nf lit os l no va s lid er an ça s co m is sõ es d e fá br ic a l pr io rid ad e pa ut a sa la ria l l ne go ci aç ão co le tiv a ce nt ra liz ad a AN O S 80 PA DR ÃO D E CO NC OR RÊ NC IA PA DR ÃO T EC NO LÓ GI CO PA DR ÃO D E GE ST ÃO IN OV AÇ ÕE S TE CN OL ÓG IC AS E O RG AN IZ AC IO NA IS (D E PR OC ES SO ) N O IN TE RI OR D AS E M PR ES AS ES TR U TU R A D A EM PR ES A R EL AÇ Õ ES D E TR AB AL H O EQ U IP AM EN TO S/ M AN U TE N ÇÃ O Q U AL ID AD E l cr is e e re tra çã o do m er ca do in te rn o l am pl ia çã o da s ex po rta çõ es (p ar a EU A e Eu ro pa ), n um co nt ex to d e ac irr am en to d a co nc or rê nc ia n o m er ca do in te rn ac io na l l lin ha s de m on ta ge m l in íc io d as cé lu la s, te cn ol og ia d e gr up o l re du çã o de es to qu es l in íc io d a de sc en tra liz aç ão l ut ili za çã o lo ca liz ad a de iu st -in -ti m e, ka nb an , S FM , gr up os s em i- au to nô m os , ilh as d e pr od uç ão l in íc io d a tra ns fe rê nc ia d e at iv id ad es d e qu al id ad e e m an ut en çã o pa ra a p ro du çã o l no va s fá br ic as de di ca da s l in íc io d o pr oc es so d e de sv er tic al iz aç ão da s gr an de s em pr es as l in íc io d os pr og ra m as d e de se nv ol vi m en to de fo rn ec ed or es l ju st -in -ti m e ex te rn o (in ic ia l) l au m en to d os re qu is ito s de es co la rid ad e l au m en to d a pr op or çã o de tra ba lh ad or es qu al ifi ca do s no co nj un to d a m ão -d e- ob ra OR GA NI ZA ÇÃ O DO TR AB AL HO / G ES TÃ O DA P RO DU ÇÃ O ES TR U TU R A D E Q U AL IF IC AÇ ÃO PO LÍ TI CA S D E G ES TÃ O RE LA ÇÕ ES IN TE RF IR M AS (C LI EN TE / FO RN EC ED OR ) F on te : G ita hy e B re sc ia ni (1 99 8) ; G ita hy (2 00 0: 38 ) CO NT IN UA Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 29 a n e x o 2 Qu ad ro 3 Tr an sf or m aç õe s n a ca de ia a ut om ot iv a br as ile ira l am pl ia çã o da au to m aç ão m ic ro -e le trô ni ca l TP M , a po io à pr od uç ão de sc en tra liz ad o, ex te rn al iz aç ão d e at iv id ad es d e m an ut en çã o l pa ut a am pl ia da (p ol íti ca s se to ria is , in ov aç ão e tc .) l ne go ci aç õe s m úl tip la s, de sc en tra liz ad as , bi e tr ip ar tit es AN O S 90 PA DR ÃO D E CO NC OR RÊ NC IA PA DR ÃO T EC NO LÓ GI CO PA DR ÃO D E GE ST ÃO IN OV AÇ ÕE S TE CN OL ÓG IC AS E O RG AN IZ AC IO NA IS (D E PR OC ES SO ) N O IN TE RI OR D AS E M PR ES AS ES TR U TU R A D A EM PR ES A R EL AÇ Õ ES D E TR AB AL H O EQ U IP AM EN TO S/ M AN U TE N ÇÃ O Q U AL ID AD E l po lít ic a de ab er tu ra d o m er ca do , ac or do s se to ria is , re cu pe ra çã o e cr es ci m en to d o m er ca do in te rn o, M er co su l l re to m ad a do s in ve st im en to s, in st al aç ão d e no va s pl an ta s l lin ha s de m on ta ge m l cé lu la s de us in ag em l m in i-f áb ric as (s eg m en ta çã o da s fá br ic as ) l re du çã o de es to qu es l ap oi o à pr od uç ão de sc en tra liz ad o (q ua lid ad e/ m an ut en çã o) OR GA NI ZA ÇÃ O DO TR AB AL HO / G ES TÃ O DA P RO DU ÇÃ O ES TR U TU R A D E Q U AL IF IC AÇ ÃO PO LÍ TI CA S D E G ES TÃ O RE LA ÇÕ ES IN TE RF IR M AS (C LI EN TE / FO RN EC ED OR ) l au m en to d os re qu is ito s de es co la rid ad e l po liv al ên ci a l tra ba lh o em gr up os l m en or ro ta tiv id ad e l no vo p ap el d e ch ef ia s l no va s es tru tu ra s sa la ria is (m ul tif un ci on ai s) l m ai s tre in am en to e in fo rm aç ão l pa rti ci pa çã o no s re su lta do s l jo rn ad a fle xí ve l l in te ns ifi ca çã o do m ov im en to pe laq ua lid ad e, at in gi nd o to da ca de ia au to m ot iv a l fo ca liz aç ão l m ov im en to d e ex te rn al iz aç ão / in te rn al iz aç ão d e at iv id ad es (te rc ei riz aç ão ) l pr es sã o po r re du çã o de cu st os e qu al id ad e ao lo ng o da c ad ei a l ap oi o à ca pa ci ta çã o de fo rn ec ed or es l di fu sã o do ju st - in -ti m e ex te rn o l “c on do m ín io s in du st ria is ” l gl ob al s ou rc in g l in te ns ifi ca çã o do m ov im en to d e re es tru tu ra çã o e de sc en tra liz aç ão : l re du çã o do s ní ve is hi er ár qu ic os l un id ad es d e ne gó ci os l ge st ão p or pr oc es so s l “e qu ip es ” ou “p ro je to s” m ul tif un ci on ai s l “h or iz on ta liz a- çã o” d a es tru tu ra e de p ro ce ss os de ci só rio s F on te : G ita hy e B re sc ia ni (1 99 8) ; G ita hy (2 00 0: 38 ) Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE30 a n e x o 2 1. Cf. DIEESE, 1993:5. 2. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001) registra no mesmo sentido, à página 2700 o verbete Terceirização como “ato ou efeito de terceirizar; forma de organização estrutural que permite a uma empresa transferir a outra suas ati- vidades-meio, proporcionando maior disponibili- dade de recursos para sua atividade-fim[...]; contratação de terceiros, por parte de uma empre- sa, para a realização de atividades geralmente não essenciais [...]”. Também os verbetes Terceirizar e Terceiro fazem menção ao referido processo. 3. No sentido oposto, a tomada ou retomada de responsabilidade das empresas anteriormente contratantes sobre atividades anteriormente terceirizadas é denominada de insourcing. Algu- mas empresas executam o referido movimento ao longo da década, sem configurar todavia uma onda contrária de mesmo porte. 4. Cf. DIEESE, 1993:17-8. 5. A respeito dessas características e peculiarida- des da terceirização no cenário brasileiro, vide Fa- ria (1994:43). 6. Alimentos, cerâmica, metalmecânica, papel e celulose, plásticos e têxtil (DIEESE, 1997). 7. Entrevista com diretoras do Sindicato das Costurei- ras do Grande ABC (primeiro semestre de 2003) con- firma a crescente terceirização de atividades vincula- das à confecção, com o surgimento de pequenas ofi- cinas informais alimentando empresas de médio por- te, ou mesmo com a intensificação do trabalho a do- micílio nesse ramo. Esse movimento havia sido ana- lisado anteriormente por Abreu e Sorj (1993). 8. Essa face típica da terceirização nas grandes me- trópoles é mostrada de forma clara pelo diretor Ken Loach no filme Pão e rosas, sobre imigrantes lati- no-americanos trabalhando em atividades tercei- rizadas por empresas norte-americanas. 9. Cf. Klink, 2001:162-7. 10. É interessante notar que até mesmo a chamada “indústria do futebol” – um dos segmentos com maior expressão na chamada economia do entre- tenimento – foi afetada por esse processo, com o surgimento de grandes e pequenas firmas de agen- ciadores (“empresários”) que intermediam a ofer- ta de trabalhadores – no caso atletas profissionais – para os clubes. A partir do caso pioneiro do Grê- mio Maringá, na primeira metade dos anos 90, clu- bes de certa expressão chegaram a terceirizar todo o seu departamento de futebol, colocando-o sob o comando de “empresas”, exemplo recente da tra- dicional Portuguesa de Desportos. Situação inusi- tada viveu no início de 2004 a Portuguesa de San- tos, com uma disputa jurídica entre o clube e uma empresa contratada para controlar as atividades re- lacionadas ao seu futebol profissional; durante al- gumas semanas, havia dois grupos de atletas sen- do preparados em locais distintos para a disputa do torneio seguinte. 11. Como observa a autora (Gitahy, 2000:16), a pesquisa sobre um processo de mudança sempre é demarcada pela “coexistência de elementos de transformação e conservação”, que se apresentam de modo distinto de acordo com o contexto especí- fico e o estágio do processo. 12. Estudos recentes sobre novas configurações de arranjos interfirmas na indústria automobilística bra- sileira estão também presentes em Salerno (2001), Zawislak e Melo (2002), Ramalho e Santana (2002). 13. São os casos do próprio Britto (1997) e anteri- ormente de Faria (1993). 14. A terceirização como modo de flexibilização do trabalho e algumas ações sindicais relacionadas a esse foco, na primeira metade dos anos 90, encon- tram-se em Bresciani (1997). 15. A título de exemplo, o site de uma empresa que oferece apoio a processos de terceirização compara os custos finais de um empregado com contrato pela CLT e outro pela legislação dos contratos por tempo determinado. Para salários nominais idênticos, o valor desembolsado pela empresa, no primeiro caso, é acrescido de 70,5% e, no segundo caso, de 54,6% (www.employer.com.br/man_tec.asp?item- 1/, em 01-nov-1003). Cabe notar que o surgimento de cooperativas muitas vezes está associado a um processo de terceirização, que visa reduzir o custo do trabalho por parte da empresa principal. 16. Santos (1997) focaliza particularmente esta se- gregação estudando as operações da Cia. Vale do Rio Doce na região da Serra dos Carajás (PA). Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 31 a n e x o 2 Referências bibliográficas l ABREU, A.; SORJ, B. Sub- contratação e trabalho a domicílio: a influência do gênero. In: MAR- TINS, H. ; RAMALHO, J.R. Ter- ceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, 1994. l ALMEIDA NETO, J. Glos- sário da reestruturação produtiva. Florianópolis: Visual Books, 2003. l BRESCIANI, L. P. 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Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 33 ANEXO nú m er o 3 atividade:ao sindical e terceirizao — aspectos tericos e prticos da terceirizao Terceirização no setor público brasileiro DIEESE. Dezembro, 2003 Introdução Este texto foi elaborado com a finalidade de subsidiar o debate no movimento sindical sobre as for- mas e o processo de terceirização adotado no setor público brasileiro e, também, pretende apontar al- guns de seus impactos sobre con- dições de trabalho, remuneração e organização sindical no local de tra- balho. Com estes objetivos, o texto está organizado em três seções. Na primeira, serão abordados as ori- gens e os aspectos legais/jurídicos intrínsecos ao processo de tercei- rização no setor público, bem como os limites legais existentes a essa forma de contratação na adminis- tração pública. Na segunda seção, serão apresentadas algumas formas ou instrumentos usados no setor público para terceirizar atividades ou prestação de serviços à sociedade. Na última seção, serão considerados alguns efeitos da terceirização na ótica das condições de trabalho, de remuneração e na organização sin- dical no local de trabalho. Do ponto de vista concei- tual, numa perspectiva da adminis- tração de recursos, a terceirização é uma estratégia e prática de gestão, que se caracteriza, em essência, pelo repasse de um serviço ou pro- dução de um determinado bem para outras empresas ou entidades/ instituições externas, por meio de assinatura de contratos entre as par- tes. Ela corresponde, assim, a um processo de transferência ou dele- gação a outros de funções ou ativi- dades antes desenvolvidas interna- mente, podendo vir a englobar tan- to etapas do processo produtivo de um bem ou serviço, de forma total ou parcial, ou apenas atividades consideradas de apoio como limpe- za, vigilância, transporte, dentre outras. Tais atividades ou funções transferíveis a terceiros, em geral, criam formas diversas de relações de parceria entre as partes, medi- ante o cumprimento de regras ne- gociadas entre ambas, a partir da legislação pertinente. É importante também sali- entar, para além do conceito, que numa perspectiva histórica, essa prática de gestão do trabalho e or- ganização da produção constituiu- se em um recurso muito difundido no âmbito das empresas capitalis- tas, como um dos elementos de enfrentamento da crise mais recen- te, no escopo da chamada reestru- turação produtiva. Nesse contexto, a terceirização foi adotada pelas empresas com a finalidade de pos- sibilitar a focalização da produção, isto é, como uma forma de concen- trar as estratégias empresariais na atividade-fim; de simplificar a ges- tão da produção e da força de tra- balho, como resultado da diminui- ção da diversidade das formas orga- nizacionais, e de reduzir custos ad- ministrativos e fixos. No Brasil, a terceirização também veio a ser adotada pelo estado na condução de sua máqui- na administrativa, tendo seu uso se intensificado, particularmente, na Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE34 década de 90, na medida em que os instrumentos legais e institucio- nais foram sendo construídos para a execução dos objetivos de gestão e solução de crises financeiras, tan- to em empresas públicas como na própria administração direta. Terceirização no setor público: origens e aspectos legais/jurídicos 1.Terceirização na adminis- tração pública no âmbito da reforma do Estado No decorrer da década de 80, as economias desenvolvidas e em desenvolvimento estavam a- presentando um cenário de grave crise econômica.Vários autores, na época, debateram sobre o diagnós- tico e algumas soluções para a crise vivida no Brasil e no mundo. Como resultado desse intenso debate, venceu a tese na qual a crise brasi- leira foi identificada essencialmen- te como conseqüência da crise fis- cal do Estado.1 Como afirmou Bres- ser Pereira (2001, p.1), “... o Estado entrou em crise e se transformou na prin- cipal causa da redução das taxas de cres- cimento econômico, da elevação das ta- xas de desemprego e do aumento das ta- xas de inflação, que, desde então, ocor- reram em todo o mundo”. Nessa perspectiva, a partir de então, a crise se coloca como um processo decorrente da forma “am- pliada” como o Estado veio ao lon- go de décadas intervindo na eco- nomia, caracterizada essa interven- ção pela conjunção “explosiva” das suas atividades na área social, em- presarial e também regulatória da economia. Assim, o tamanho do déficit público,2 em meio a onda da globalização ao final dos 80, pas- sa a ser, também no Brasil, um fa- tor que reduz a autonomia do esta- do nacional na implementação de suas políticas macroeconômicas, principalmente pelas conseqüênci- as que o elevado déficit traria para inserção competitiva do país em um mundo em transformação. A superação da crise econô- mica nacional, no âmbito estatal, vem exigir uma reconstrução gra- dual ou uma reforma do Estado, ao mesmo tempo do processo de rees- truturação das empresas privadas, que significaria, dentre outros as- pectos, a limitação do papel do Es- tado na economia. Essa limitação seria conduzida mediante a transfe- rência de algumas de suas ativida- des para a iniciativa privada ou para o chamado setor público não-esta- tal, que engloba o conjunto de orga- nizações sem fins lucrativos, incluí- das no campo do terceiro setor. Ao longo da década de 90, para além da limitação da interven- ção do Estado na economia, a re- forma gerida no país visou, tam- bém, a adoção de um paradigma gerencialista no bojo da administra- ção pública, em substituição a uma cultura burocrática de controles de processos, a partir do qual se bus- caria a implementação de mecanis- mos de mercado na gestão pública. Esses mecanismos se voltariam agora para o controle de resultados, para a busca da eficácia e da efici- ência, maior responsabilização dos atores públicos e por uma flexibi- lização da gestão na área de Recur- sos Humanos. No seu conjunto, esses objetivos reforçariam a tese de que o Estado deveria delegar algumas de suas atividades a tercei- ros ou a outros parceiros, como uma forma moderna e mais efetiva de a n e x o 3 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 35 conter o crescimento do déficit pú- blico e dotamanho da máquina administrativa. Sendo assim, buscando de- limitar com clareza as funções do Estado, segundo a reforma do es- tado preconizada,3 as autoridades nacionais envolvidas (particular- mente no Mare – ex-Ministério da Reforma do Estado), pretenderam definir, a partir de seu conceito de Estado, três áreas de atuação: as ati- vidades exclusivas do Estado; os serviços sociais e científicos do Es- tado; e a produção de bens e servi- ços para o mercado. Por outro lado, seria ainda conveniente distinguir, em cada uma dessas áreas, quais se- riam as atividades principais e quais as auxiliares ou de apoio. Na lógica do projeto de re- forma do Estado, as chamadas ati- vidades exclusivas de Estado de- veriam, naturalmente, permanecer dentro do Estado, distinguindo-se entre elas, verticalmente, no seu topo, a existência de um núcleo estratégico, e, horizontalmente, as secretarias formuladoras de políti- cas públicas, as agências executivas e as agências reguladoras. No meio, entre as atividades exclusivas de Estado e a produção de bens e serviços para o mercado, cuja idéia consistia na sua privati- zação, haveria ainda dentro do Es- tado, uma série de atividades na área social e científica que não lhe seriam exclusivas e também não envolveriam poder de Estado. Es- tariam incluídas nesta categoria as escolas, as universidades, os centros de pesquisa científica e tecnoló- gica, as creches, os ambulatórios, os hospitais, as entidades de assistên- cia aos carentes, os museus, as or- questras sinfônicas e outras. Segundo o projeto do gover- no, não haveria razão para que essas atividades permanecessem dentro do Estado, mas também não se jus- tificaria sua privatização, já que se- riam, por natureza, freqüentemente atividades fortemente subsidiadas pelo Estado, além de contarem com doações voluntárias da socie- dade. Por isso, defendeu-se para essas atividades a chamada “publi- cização” – ou seja, a sua transferên- cia para o setor público não-estatal ou terceiro setor. No Brasil, ao con- trário do ocorrido no último quar- tel do século XX nos serviços soci- ais e científicos na Nova Zelândia, Austrália e Reino Unido, o progra- ma do governo de publicização pre- viu a transformação desses serviços ou atividades em Organizações So- ciais – OSs, legalmente constituí- das como entidades públicas de di- reito privado, que poderiam cele- brar um contrato de gestão com o Estado e, assim, serem financiadas parcial ou mesmo totalmente pelo orçamento público. Construído o novo corpo es- trutural da ação do Estado, deter- minou-se que as chamadas “ativi- dades principais” seriam aquelas consideradas propriamente de go- verno, em que o poder de Estado – ou seja, as ações de legislar, regu- lar, julgar, policiar, fiscalizar, defi- nir políticas e fomentar – é exerci- do. Em paralelo, para que essas funções típicas do Estado possam ser realizadas, seria necessário que os políticos e a alta burocracia esta- tal, no núcleo estratégico, e tam- bém a média administração públi- ca do Estado, contasse com o apoio de uma série de “atividades ou ser- viços auxiliares”: limpeza, vigilân- cia, transporte, serviços técnicos de a n e x o 3 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalho participante – DIEESE36 informática e processamento de da- dos, entre outras. A solução encon- trada para essa sinergia operacional foi a de que tais serviços deveriam, em princípio, ser terceirizados, ou seja, submetidos à licitação pública e contratados com terceiros. Parecendo ser sensível a cer- tas particularidades, o projeto, to- davia, previa a possibilidade de ha- ver “outros serviços dessa natureza de apoio”, para os quais, devido a sua proximidade com a “atividade exclusiva/principal de Estado”, não seria recomendada a terceirização. Por esse motivo e porque também haveria áreas e atividades discutí- veis quanto à publicização ou não, optou-se e buscou-se concretamen- te uma mudança na relação de con- trato ou vínculo de trabalho, ou seja, legislou-se para a criação de dois regimes jurídicos dentro do Estado: o dos funcionários estatu- tários e o dos empregados. A con- dição de servidores estatutários fi- caria, assim, limitada às carreiras de Estado, e, por sua vez, seriam con- siderados empregados públicos – numa situação intermediária entre o servidor estatutário e o trabalha- dor privado – os demais servidores que exerçam “atividades auxiliares ou de apoio”, aquelas que se deci- diu não terceirizar ou não foi possí- vel publicizar. 2. Aspectos legais e jurídicos da terceirização na administração pública no Brasil: uma perspectiva temporal Do ponto de vista da gestão, a terceirização é um recurso legal e contratual que vem sendo ampla- mente utilizado nas empresas pri- vadas, bem como em órgãos e em- presas da administração pública di- reta e indireta.4 No âmbito do se- tor público, juridicamente falando, trata-se de uma transferência con- tratual, mas parcial, da responsabi- lidade pela produção de alguns de seus serviços a empresas privadas, nacionais ou multinacionais, coope- rativas de trabalho, Organizações da Sociedade Civil de Interesse Públi- co e Organizações Não-Governa- mentais,5 sendo, necessariamente, precedida por licitação,6 disciplina- da pela Lei 8.666/93 e pelas leis que posteriormente a alteraram. Assim, via licitação, a administração públi- ca delegaria atividades a uma em- presa, não havendo nenhum víncu- lo de subordinação entre o traba- lhador da prestadora de serviços e o órgão/entidade pública. Essa contratação de serviços pela administração pública brasilei- ra, todavia, não é em si um proces- so essencialmente característico da década de 90 ou da proposta de re- forma do Estado brasileiro. Segun- do a legislação pertinente, em dé- cadas anteriores, o setor público já utilizava esse recurso para desen- volver parte de suas atividades como forma de impedir o cresci- mento da máquina administrativa no âmbito de pessoal e custeio. Como se sabe, a administra- ção pública está fortemente vincu- lada ao princípio da legalidade (ar- tigo 37 da Constituição/88), e, nes- se caso, é imprescindível efetuar o que a lei determina. No âmbito fe- deral, o marco legal disciplinador da transferência de serviços para a ini- ciativa privada foi o Decreto-Lei 200/1967, em que foi estabelecido que, no âmbito dessa esfera gover- namental, as atividades deveriam ser descentralizadas, ocorrendo, sempre que possível, a transferên- cia de tarefas executivas às empre- a n e x o 3 Terceirização: efeitos sobre as relações de trabalhoparticipante – DIEESE 37 sas privadas com o objetivo de con- centrar as atividades na área de pla- nejamento, coordenação, supervi- são e controle e para evitar o cresci- mento desmensurado da chamada burocracia estatal.7 O decreto acima menciona- do não se aplicava, entretanto, às demais esferas governamentais. Somente na década de 90 foi regu- lamentada a Lei 8.666/93 (com pos- teriores alterações em alguns de seus dispositivos a partir da Lei 8.883 de junho/94), que trata de li- citações e contratos na administra- ção pública, para disciplinar a con- tratação de serviços no âmbito dos estados, municípios e Distrito Fe- deral. Isto sugere que, na década considerada, intensificou-se o uso da terceirização no âmbito da ad- ministração pública brasileira como forma de frear o crescimento do dé- ficit governamental, que se expres- sava na insuficiência de receitas para cobrir os gastos do Estado, identificados como prioritários à época. A despeito do uso recorren- te em algumas esferas nacionais, por muitas décadas, foi também em 1993, através da Lei 8.745/93, que se regulamentou ou se legalizou a adoção do contrato por tempo de- terminado na administração públi- ca, sem requisito de concurso pú- blico, como forma de atenuar situ-
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