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A VE DADE SOBRE
ISRAEL
Novas descobertas
de cientistas
reescrevem a história
da Terra Prometida
COMO FAZíAMOS SEM ••• 13 ...................................Temperos Novas descobertas
ARTE & HISTÓRIA 14 revelam mitos eA Pequena Sereia verdades sobre a
LISTA
origem dos judeus
16 ...................................Aventureiros desastrados 28BRASÕES E BANDEIRAS 17Asuástica
LINHA DO TEMPO 18Império Britânico
HISTÓRIA MALUCA 20Terra de dragões
HISTÓRIA ILUSTRADA 22Navio tartaruga coreano
ARQUEOLOGIA DO FUTURO 24Neuromancer
RETROTECH 25OTurco jogador de xadrez
HISTÓRIA HOJE
A escravidão ainda resiste no 6
planeta, afirma estudo internacional
AGENDA 10
Ocomeço e o fim do AI-5
AlMANAQUE
REPORTAGENS
CAPA
As origens de Israel 28
JEsuíTAS
A Igreja no Brasil colônia 38
NELLlE BLY
Umamulher dá a volta ao mundo 44
PIADAS
Ohumor soviético contra o poder 48
'"õõa:
o
'-'o..'"'-"""a:>-
'";!
TERREMOTO
Lisboa treme e afeta a Europa 54
mnRmm _
LANÇAMENTOS
Luzes sobre a esquerda armada 60
HISTÓRIAS íNTIMAS
Leituras para senhoras 64
FOTO-HISTÓRIA
Ulysses contra os cachorros 66
~~-------------------------------
FELIZ
2014
AequiPe responsável pela AVENTURAS NA HISTÓRIA temmuito a comemorar pelos doze meses que estão chegando aofim. A revista completou dez anos acompanhada de um grupo
de leitores fiéis que não deixa nada escapar a seus olhos e nos ajuda a
melhorar a cada edição.
Neste ano, mudamos o projeto gráfico, criamos novas seções, migra-
mos nossa comunidade do antigo Orkut pará o Facebook. A edição de
aniversário, em agosto, teve a maior venda em bancas da revista desde
2009. Os índices de satisfação de nossos assinantes com o conteúdo da
revista estão elevados. Uma pergunta que pede a opinião do leitor sobre
se a revista que ele tem em mãos está melhor que a anterior, feita a cada
nova edição, sempre supera o índice de 80% de sim.
Acontece que, para nós, em time que está ganhando se mexe, sim.
Nosso compromisso é buscar a superação a cada edição. Isso envolve
escolher pautas relevantes, curiosas e apaixonantes. Zelar pela quali-
dade do que se publica, embalar as palavras no design mais inteligente
que formos capaz de criar ... enfim, queremos melhorar, sempre.
Por causa disso, teremos muito trabalho em 2014. O que nos inspira
é saber que você estará ao nosso lado. Não só para falar bem. Mas para
criticar, apontar caminhos, reclamar, sugerir.
Uma grande revista se faz com grandes leitores.
E isso, temos certeza, nós já temos.
Um feliz 2014 e boa leitura.
Patrícia Hargreaves
DIRETORA DE REDAÇÃO
4 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
EDITORA ~ Abril
Fundada em 1950
VlcroRClVITA
(1907-1990)
ROBERTO CIVITA
(1939-2013)
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Thomaz Souto Côrreajvíce-Presldente),
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Colaboraram nesta edição: Luciana Porto Alegre Steckel (arte), Wagner
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e Deborah Souza Silva, Grace Kelly Alves (aprendiz) Atendimento ao
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DAS SESSOES DE
INE A AO· UCESS
N T LONA.
Ariel Goldenberg
Protagonista do
filme Colegas
REALIZAÇÃO:
)
Desde que Ariel era menino, seu
motorista, Carlinhos,o levavaa peçasde
teatro, shows e filmes, conversando muito
sobre o que ele tinha aprendido. "Ele sempre
foi meu companheiro", diz. Essagrande
amizade ajudou Ariel a escolhersuavocação.
Fezpeças de teatro, documentá rio, clipe,
novelas,seriadose ganhou reconhecimento
no longa Colegas, enchendo de orgulho
um dos seus maiores incentivadores.
Carlinhos
Motorista e apoiador
do sonho de Ariel (
\ ~
Participe da educação
de quem você ama para
que ele nunca pare de crescer.
GRUPO
BANDEIRANTES
IWoMAPA DA ESCRAVIDAO
ESTUDO REVELA A PREVALÊNCIADA INSTITUiÇÃO NO MUNDO ATUAL
A!walk Free Foundation ("Fundação CaminheLivre") acaba de lançar um estudo abrangenteobre a situação da escravidão no mundo. O re-
latório classificou os países segundo o risco de escravidão,
baseado em diversos fatores, como a força das leis e a ca-
pacidade do Estado em aplicá-Ias. De forma que o ranking
não tem relação direta com o número de escravos. A Chi-
na tem até 3,1milhões de pessoas nessa condição, mas não
é considerada um dos países de maior risco.
Segundo a ONG, existem quase 30 milhões de escravos
hoje. Ainda que todos os países tenham abolido a escra-
vidão, ela persiste por ações criminosas. A forma moder-
na é por dívida. Golpistas levam trabalhadores a locais
6 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
remotos onde são forçados a pagar aluguel e a comprar a
crédito na loja local - assim, nunca recebem salário e a
dívida sempre aumenta. Imigrantes ilegais são o alvo mais
comum, inclusive mulheres, forçadas à prostituição. Na
definição do relatório, casamentos forçados também são
um tipo de escravidão, tal como "adoções" nas quais a
criança é obrigada a fazer trabalhos domésticos.
A prática data da Prê- História: dos astecas aos chineses,
toda civilização tinha escravos ou servos - versão mais
branda na qual o trabalhador pertence à propriedade, não
ao senhor. O Brasil foi o último país ocidental a abolir a
escravidão, em 1888. Na Mauritânia, pior nação do mundo
pelo relatório, a abolição só ocorreu em 1981
ROTEIRO DA VERGONHA
'r't,
6° MOLDÁVIA
A
.c:: .~~~
T ,/ r.-120 HAITI*
rr índice de risco: 52,26
Número de escravos:
200 mil - 220 mil
94° BRASIL
cn
cnw
'""-cw
!;[
13
'"cn~
'"12
índice de risco: 7,16
Número de escravos:
200 mil - 220 mil
MAURITÂNIA
No país, onde uma
minoria branca
domina diversas
etnias negras, a
escravidão é à moda
antiga, com escravos
e descendentes
considerados
propriedade
comercializável.
Na maioria, são
mulheres negras,
forçadas a fazer
trabalhos domésticos
e abusadas
sexualmente.
índice de risco: 97,90
Número de escravos:
140 mil-160 mil
HAITI
Aqui O problema é uma
instituição tradicional
chamada restavek, na
qual crianças são dadas
para adoção a famílias
mais ricas e forçadas a
trabalhar pelo sustento.
Após o terremoto de
2010, o caos no país
abriu espaço para outros
tipos de escravidão,
como exploradores
sexuais e traficantes
de seres humanos,
que exportam haitianos
para outros países.
I'
PREVALECÊNCIA DA ESCRAVIDAo
MUITO BAIXA
íNDIA
País com o maior número
de escravos do mundo, é
acusado de exploração
sexual, exploração
infantil (crianças
obrigadas a pedir
esmola), casamentos
forçados e escravidão
por dívidas, quase
sempre dos dalit, os
"intocáveis", membros
da casta mais baixa.
Essa dívida é hereditária,
de forma que os filhos
do devedor também
"pertencem" ao credor.
MOLDÁVIA
A ex-república
soviética leva a pior
nota da Europa não
como algoz, mas
como vítima. Com
uma economia
miserável, seus
cidadãos entram
em esquemas para
migrar para outros
países, como
Ucrânia, Rússia
ou Polônia,
onde acabam
escravizados
por mafiosos.
* Risco de escravidão: de zero a cem, Quanto maior a nota, mais presente
é a escravidão no país. A cor vermelha indica os piores índices.
BRASIL
Possui um grande
número de escravos,
mas é considerado
o quinto menos
problemático do
continente, porque as
leis são tidas como
satisfatórias. Esquemas
de escravização por
dívidas ainda acontecem
em regiões rurais e
entre imigrantes.
Neste ano, o Ministério
do Trabalho liberou
31 escravos bolivianos
em São Paulo.
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 7
HISTÓRIA HOJE
OHDDA
PRÉ-HISTÓRIA
BOLINHAS CONTÊM CÓDIGO AINDA NÃO DECIFRADO
NOS final dos anos 60, arque-ólogos escavaram umcurioso conjunto de artefa-
tos no sítio de Chaga Mish, no Irã.
São esferas de argila, apro-
ximadamente do mes-
mo tamanho de
uma bola de tê-
nis, decoradas
por fora e com
diversos pe-
quenos objetos
dentro. Datadas
de 5,5 mil anos
atrás, eram usadas
dois séculos antes da
invenção da escrita,
que aconteceria na mesma
região. As bolinhas ganharam o
nome de "envelopes", e os objetos
dentro delas, "fichas".
Compreensivelmente, os pesqui-
sadores não queriam quebrar esses
objetos preciosos para investigar
seu conteúdo, que permaneciam,
assim, misteriosos. Este ano, uma
equipe do Instituto Oriental da Uni-
versidade de Chicago estudou-as
com tomografia eletromagnética.
Descobriam que''guardam uma
grande diversidade de obje-
tos -14 formas diferen-
tes, como pirâmi-
des, cones, esferas
ou meias-luas.
Além disso, pos-
suem um canal
interno, prova-
velmente usado
para passar um
barbante e facilitar o
armazenamento.
O historiador Cris-
topher Woods, líder do estudo,
acredita que os envelopes me-
sopotâmicos foram o "primei-
ro sistema de armazenamento
de dados". Eram uma espécie
de nota fiscal do final da prê-
história. As fichas representavam
A bola
de cerâmica:
conteúdo interno
números. Por exemplo, a quantidade
de cabras negociadas entre duas pes-
soas. No exterior, os relevos indica-
vam o comprador e o vendedor. O
código exato ainda não foi decifrado,
mas Woods acredita que cada forma
das fichas indicava um número di-
ferente, por exemplo, pirâmides para
dezenas e esferas para unidades. A
inconveniência do "contrato" neolí-
tico é que era preciso que-
brá-Ia para ser lido.
õ.
u
u
<:i:
<a>-
~
Elementos do
Interior da esfera:
fichas de argila
~ •••••••••• 0.0 ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• , ••••••••••• 0.0 0.0.' ••••• 0.0 •••••• 0.0.' •••••••••• 0.0 ••• 0.0 •••••••••• 0.00.00.00.0 •••• 0.0 ••••••••••••••• 0.0 •••••••• _ ••••••••••••••••••••••••• _ ••••••• 0'0 0.0 ••• 0.00.00.00.00.0 •••••••• ~
I "Não houve má intenção. Foi um I
i equivoco felizmente resolvido" !
~ ~
~ ••••••••••••••••• 0.00.00.0 •••• 0'0 0.0 ••• 0.0 ••••••••••••••••••• 0.0 ••••••• 0.0 0.0 •••• ' •••••••••••• , ••••••••••••••••••• 0.0 ••••••••• 0.0 •••• 0.0 ••• o.' •••••••••••••••• "0 o" ". ••• •••• ••• •••••• •••• ••••• ••••••• •••••• ••• ••••••••• •••••••• ;
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so esco e as em , com Imagens raras e enn artíer- resson, o ert apa e outros. exposiçao 01 rea erta este anoL ~
8 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
RATO NO CARDÁPIO
Análises químicas em
ossos de habitantes da
Ilha de Páscoa pré-
descobrimento revelaram
que a dieta incluía poucos
frutos do mar. A principal
fonte de proteína era o rato
polinésio, que chegou com
os humanos à ilha.
······················1·····················
ARTISTAS FEMININAS
NAS CAVERNAS
Um dos "temas" frequentes
em pinturas paleolíticas
são mãos impressas. Um
estudo revelou que 75%
dessas mãos eram de
mulheres. O que significa
que os desenhos podem
ter sido feitos por elas.
CHINATOWN ESCAVADA
Arqueólogos escavaram
o bairro chinês de
Jacksonville, nos EUA,
dos anos 1850. Entre
os achados estão um
cachimbo de ópio e
sementes de lichia, o que
indica que importavam
alimentos de seu país.
• O PALITO E A CRISE ECOLÓGICA: Por
causa de um tabu religioso, os japoneses
se recusam a usar talheres de outras
pessoas, mesmo lavados. Por isso, no
século 18, inventaram os waribashi, os
palitos descartáveis. Todos os anos, 23
bilhões deles são gastos no Japão. Para
atender a demanda, milhões de árvores
são derrubadas.
• MUDANÇA DE DENTiÇÃO: Até o século
19, a arcada dentária dos ocidentais tinha
uma oclusão perfeita. Hoje, a mordida
mais comum é a de trespasse horizontal
- os dentes de cima se fecham em frente
aos de baixo. A culpa é do garfo: até a
adoção de talheres, no século 18, as
pessoas precisavam cortar carnes e
outras partes duras com os incisivos .
• MULTIPROCESSADOR E GORDURA:
O faz-tudo da cozinha contribuiupara a
atual epidemia de obesidade, segundo
Bee Wilson. A razão é que, quando os
alimentos são divididos em pequenos
pedaços, a digestão é mais eficiente. O
mesmo número de calorias de um prato
feito no multiprocessador engorda mais
que o mesmo prato feito à mão.
DO MAMUTE AO MICRO-ONDAS
A jornalista britânica Bee Wilson é
conhecida por sua coluna Kitchen Thinker
("pensadora da cozinha") no jornal
Sunday Telegraph. Ela acaba de lançar
seu terceiro livro, Consider The Fork: A
History ot Haw We Caak and Eat
("Considere o Garfo: Uma História de
Como Cozinhamos e Comemos", sem
tradução), no qual discute a história da
cozinha e seus instrumentos. Veja alguns
de seus achados:
1,95•••
.............................., .
Altura da estátua de Ramsés 11
escavada em Tel Basta, Egito.
A medida incluiu seu chapéu
- a múmia do faraó indica
que ele tinha um pouco mais
de 1,80 m de altura.
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 9
Aos 24 anos de idade,
DOM PEDRO I é
coroado imperador do
Brasil, no Rio de
Janeiro.
1933
A LEI SECA, que
proibia a produção,
comércio e bebidas
alcoólicas nos Estados
Unidos, chega ao fim,
como um retumbante
fracasso que ajudou o
crime organizado.
1510
Com a ajuda de
mercenários locais, os
portugueses tomam a
cidade indiana de GOA.
O domínio durou 451
anos, até a região
ser anexada pela
índia, em 1961.
1987
A PRIMEIRA INTIFADA,
protesto contra a
ocupação de Israel,
começa na
Cisjordânia e na Faixa
de Gaza depois da
morte de quatro
palestinos.
1927
O filme mudo
Putting Pants on
Philip marca a
estreia da dupla de
comediantes Stan
Laurel e Oliver
Hardy, ou "O GORDO
EO MAGRO"...
Sob o comando do
Duque de Caxias, o
exército brasileiro vence
a BATALHA DO ITORORÓ,
durante a Guerra do
Paraguai, um dos
combates que mudaram
o rumo do conflito.
O general Cristóvão
Barcelos, hoje nome
de rua no Rio de
Janeiro, propõe a
mudança da CAPITAL
BRASILEIRA, da cidade
onde vivia para o
Planalto Central do país.
1918
WOODROW WILSON
embarca para as
conferências de paz
em Versalhes depois
da Primeira Guerra. Foi
o primeiro presidente
norte-americano no
cargo a ir a Europa .
Escavações confirmam
a existência da CIDADE
DE HERCULANO,
soterrada, junto com
a vizinha e menos
próspera Pompeia,
pelas cinzas do vulcão
Vesúvio, em 79.
1098
Em MAÁRRAT
AL-NUMAN, cruzados
massacram 20 mil
civis a caminho de
Jerusalém. Sem
comida, alguns
soldados praticam
canibalismo.
Os irmãos Richard e
Maurice MCDONALD
abrem um restaurante
especializado em
hambúrgueres, depois
de passar mais de
dez anos vendendo
cachorro-quente.
O beneditino Pietro
Angeleri, o papa
CELESTINO V, renuncia
e volta a viver como
asceta e ermitão
depois de cinco
meses no posto. Foi
canonizado em 1313.
1812
: A campanha da
; INVASÃO FRANCESA à
j Rússia fracassa e tem
início a retirada das
tropas napoleônicas,
que chegaram a
invadir Moscou mas
saíram derrotadas.
1973
A Associação
Americana de
Psiquiatria, por decisão
unânime, retira a
HOMOSSEXUALIDADE
de sua lista de
desordens
psiquiátricas.
10 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
1773
TEA PARTY, ou festa do
chá, evento de protesto
contra o monopólio
inglês do produto,
ocorre em Boston e
marca o início do
processo de
independência dos EUA.
1793
Depois da vitória sobre
os britânicos em
Toulon, o oficial de
artilharia corso
NAPOLEÃO BONAPARTE
é nomeado o mais
jovem general da
história francesa.
1271
KLUBAI KHAN, neto de
Gêngis Khan, rebatiza
seu império de Yuan,
e dessa forma dá
início à dinastia dos
mongóis na China -
que durou até o ano
de 1368.
DIA
16
OTeaParty
em Boston:
contra o
monopólio
britânico
1983
o último ROLLS
ROYCE SILVER
GOLD - o melhor
carro do mundo
segundo a
revista Autocar
- é vendido em
Londres.
1995
BELÉM, na Cisjordânia,
suposta cidade
de nascimento de
Jesus, hoje com
25 mil habitantes,
passa do controle
israelense ao
palestino.
1983
A TAÇA JULES RIMET,
de posse definitiva
do Brasil desde a
Copa do México, em
1970, é roubada da
sede da CBF.
1888
Sofrendo de
depressão, o pintor
holandês VINCENT
VAN GOGH corta o
lóbulo da orelha
direita depois de
brigar com o
colega Gauguin.
1871
Estreia da ópera AíDA,
do italiano Giuseppe
Verdi, no Cairo, capital
do Egito - sem
nenhuma relação com
a abertura do Canal de
Suez, como afirma
o senso comum.
1988
A mando do
fazendeiro Darly
Alves da Silva,
CHICO MENDES,
líder seringueiro e
ecologista do Acre,
é assassinado em
sua casa, em Xapuri.
53
CLÓVIS I, rei dos
francos, é batizado na
fé católica em Reims,
na atual França, por
São Remígio - e com
isso o cristianismo se
espalha entre os
habitantes de seu reino.
A última reunião dos
INCONFIDENTES
MINEIROS ocorre na
casa do tenente-
coronel Francisco de
Paula Freire, em Vila
Rica, atual Ouro Preto,
Minas Gerais.
1932
O Radio City Music
Hall, um ícone cultural
norte-americano, é
inaugurado em Nova
York. A bailarina
MARTHA GRAHAM
atuou na abertura
da casa.
1895
O físico alemão
WILHELM RONTGEN
publica estudo sobre
sua descoberta de
uma nova forma de
radiação, que mais
tarde seria conhecida
como raio x.
1937
O Estado Livre Irlandês
é substituído por um
novo estado chamado
IRLANDA após a
adoção de sua nova
Constituição. Em 1949,
tornou-se uma
república soberana.
1978
Principal instrumento
discricionário da
ditadura, o AI-5, que
cassou, proibiu e
reprimiu os brasileiros,
.deixa de vigorar.
Foi o começo do fim
do regime militar.
1968
A primeira lista de
deputados federais
cassados pelo Ato
Institucional 5 da
ditadura, o tristemente
célebre AI-5, é
publicada pelo Diário
Oficial da União.
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 11
AlMANAQUE Como fazíamos sem...
TEMPEROS
NA PRÉ-HISTÓRIA, A FOME ERA O ÚNICO MOLHO
Carne crua ou assada sem tempero, com frutas e No caso do sal, o tempero não era usado apenas peloraízes como complemento, foi a alimentação gosto. Era elemento vital da civilização. O surgimento dabásica do ser humano por milênios, desde suas agricultura está ligado ao seu uso. A dieta dos caçadores-
origens na savana africana. Povos nômades ou pastoris coletores tem sal suficiente para sustentar a nutrição hu-
ainda vivem assim: os massai da África se alimentam mana, por meio da carne e do sangue de animais. Quando
de carne crua, sangue e leite. Os esquimós comem car- a agricultura foiinventada, há cerca de 10mil anos, a base
ne, gordura, sangue e entranhas de foca, baleia, morsa da dieta mudou para grãos e vegetais. Isso permitiu o
e peixes, cozidos, crus ou congelados. Para esses dois surgimento das cidades, mas, sem sal adicionado aos ali-
povos, a fome é o único tempero. mentos, as pessoas podem sofrer de hiponatremia, que
O tédio dessas dietas foi quebrado antes da invenção causa inchaço, cansaço e até morte por edema cerebral. O
da agricultura. Sítios arqueológicos de 6200 anos _. mineral se tornou o tempero universal.
atrás, na Alemanha e Dinamar- ~ .' a Há 4 mil anos, os temperos básicos ga-
ca, indicam que caçadores-cole- íRICO nharam a companhia das especiarias.
tores da região usavam a erva- ..,.~-- , , Barcos e caravanas passaram a cir-
alheira, um parente da mostarda, - ,:-.,<. \~1.;f{.~.t'lI ; :ular comvegetais secosvindos da
que tem um sabor entre o alho e a . L. ;~~' \'\;~ ~{ India por meio de comerciantes
pimenta - a agricultura {~ !.\!\ t, árabes, que caíram no gosto
já existia em regiões dis- ~' ~ n 'i!,tJ.; dos egípcios e de povos do
tantes, mas esses povos .~ Oriente Médio e da Euro-
ainda estavam no Neolíti- pa.A elasseatribuíam pro-
co, o que indica que o uso , priedades medicinais ou
do tempero era muito an- ' mágicas. Com a queda de
terior. Na América pré- Roma, o comércio foi inter-
colombiana, aste- rompido até o século 9, quando
cas, maias e incas os árabes reestabeleceram as
usavam sal, bau- rotas. Na Idade Média,a lou-
nilha e plantas cura por especiarias era tão
locais, como as grande que, em 1393,meio
pimentas. Os quilodenoz-moscadacustava
índios brasi- o equivalente ao preço de
~ leiros tinham 7 bois na Inglaterra. Perce-z
~ pimentas e er- bendo o potencial de lucro,
o
~ vas, mas não portugueses e espanhóis se
'",~ conheciam o sal. lançaram aomar atrás derotas
~ '
a: E essa diferença tem diretas coma India - emuda-~
;;) um significado importante. ram a história para sempre.
AVENTURAS NA HISTORIA 113
mm:mtmJ) Arte & História
A PEQUENA SEREIA
ESCULTURA DINAMARQUESA VIROU ALVO DE PROTESTOS
Oempresário Carl Jacobsen,herdeiro da cervejaria Carl-sberg, ficou tão entusiasma-
do com o balé do Teatro Real de Co-
penhague baseado no conto de fadas
A Pequena Sereia, de Hans Christian
Andersen, que resolveu dar forma à
obra. Em 1909, convocou o escultor
Edvard Eriksen e encomendou uma
estátua de bronze, em tamanho na-
tural. A intenção de jacobsen, desde
sempre, foi doar a obra a cidade.
TEXTO Wagner Gutierrez Barreira
Se a escultura não é exatamente
um primor como obra de arte, calou
fundo n9 nacionalismo dinamar-
quês. É o ponto turístico mais visi-
tado da capital desde sua inaugura-
ção, em agosto de 1913,e adorada pela
população - é vista por mais de
1milhão de pessoas por ano.
Só que nem todo mundo gosta
dela ..Em várias ocasiões, a escultura
foi Vítima de vândalos (veja abaixo).
Ela já teve parte do braço serrada e
foi decapitada pelo menos duas vezes
- uma terceira tentativa deixou uma
"cicatriz" de 13 em de profundidade
em seu pescoço. A sereia sobreviveu
até a uma explosão, que a arrancou
das pedras usadas como pedestal.
Foi encontrada por mergulhadores
no fundo do mar. O governo cogitou
retirá-Ia da baía e levá-Ia a um museu
em 2006, mas nunca cumpriu a pro-
messa. Não faria sentido mesmo ti-
rar a sereia de seu habitat.
14 I AVENTURAS NA HISTORIA
ALMANAQUE Lista
Os maiores
exploradores desastrados
MEIO AMBIENTE, ESTUPIDEZ OU AZAR COSTUMAM DETONAR AS BOAS INTENÇÕES
--- ...
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16 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
1ROBERT FALCON SCOTT (1868-1912)Com quatro parceiros, tentou ser o
primeiro a chegar ao Polo Sul. Encontrou
no lugar umâ bandeira da Noruega.
Arrasados, morreram um a um na volta.
A equipe de apoio interpretou de forma
ambígua as ordens para o resgate.
o SALOMON ANDREE (1854-1897)
~ Em 1897, o sueco decolou do
arquipélago de Svalbard para cruzar o Polo
Norte num balão de hidrogênio. Após dois
dias de voo, caiu no mar congelado.
Andree deu meia-volta e morreu em uma
ilha do próprio arquipélago.
3JAMES COOK (1728-1779)Descobridor da Oceania e Polinésia,
se desentendeu com os havaianos, que o
haviam recebido como um deus, por causa
de alguns botes roubados. Ordenou o
sequestro do rei local para pedir os barcos
de volta. Foi liquidado na praia.
4 FERNÃO DE MAGALHÃES (1480-1521)Famoso por ter dado a primeira volta
ao mundo, não viveu para presenciar o fim
da viagem. No meio do caminho, marcado
por motins e mau tempo, aceitou a
proposta de um rajá das Filipinas para
atacar seus inimigos. Morreu no combate.
5DAVID LlVINGSTONE (1813-1873)Tentou encontrar a nascente do Rio
Nilo. Abandonado, foi parar num zoológico
humano, exibindo-se em troca de comida.
Após o famoso encontro com Henry
Stanley ("Dr. Livingstone, eu presumo"),
I mergulhou de volta na selva e sumiu.
/ .....j
6ROBERT BURKE (1820-1861)Sem experiência em exploração, saiu
de Melbourne rumo ao norte da Austrália,
com 19 homens, um gongo chinês e uma
mesa de escritório. No primeiro dia,
cobriram 6,5 km. Impaciente, separou a
equipe e morreu de fome na volta.
~ PERCY FAWCETT (1867-1925)
• Em 1925, entrou pela Floresta
Amazônica à procura da "cidade perdida
de Z" e nunca mais foi visto. Orlando
Villas-Bôas disse que os índios kalapalo
mataram Fawcett porque ele apareceu
sem presentes - uma grave ofensa.
8PONCE DE LEON (1474-1521)O espanhol queria mais tempo para
continuar sua carreira de massacres
contra os nativos. Por um erro de tradução,
acreditou que existia uma "fonte da
juventude" na Flórida - na busca, foi morto
por uma flecha envenenada.
9CHARLES BEDAUX (1886-1944)Em 1934, o milionário organizou uma
expedição pela Colúmbia Britânica, no
Canadá, levando a esposa, a amante, uma
condessa italiana e rios de champanhe.
Quando a festiva exploração fracassou,
eles comemoraram com mais champanhe.
-.li~OHANNO, o NAVEGADOR (SÉCULO 5 A.C.)
~ O rei cartaginês Hanno explorou a
costa da África até o Senegal, onde
encontrou "pessoas muito peludas". Os
supostos "nativos" atacaram a tripulação.
Eram os chamados gorillae, gorilas -
que eles achavam ser gente.
i i I Bandeiras & Brasões
SUÁSTICA
Como amuleto de boa sorte ou
elemento decorativo, o símbolo já era
usado na pré-história, e apareceu em
culturas do mundo todo: entre celtas,
germânicos, gregos e romanos, povos
budistas e hindus, e na América
pré-colombiana.
A versão hindu deu origem ao nome, no
século 19. Antes era conhecida pelo
termo grego gammadion. Em sânscrito,
svastika significa algo como "amuleto
do bem-estar". Cada ponta representa
um purushartha, um aspecto de uma
vida bem vivida: prosperidade, prazer,
religião e iluminação. A orientação,
esquerda ou direita, não faz diferença.
No Oriente, a suástica não tem
qualquer conotação nazista. Quando
os nazistas se apropriaram do símbolo,
em 1933, ele era bastante popular no
Ocidente, usado em medalhas,
insígnias, decoração e logotipos de
empresas. Hitler dizia que ela
representava os arianos - e isso tem a
ver com a fndia. Os arianos foram um
povo saído do Cáucaso que colonizou a
Europa e a Ásia há 6 mil anos - na
fndia, fundaram a civilização de
Harappa e o hinduísmo védico, já
usando suásticas. Hitler achava que
eram os brancos originais e mais
perfeitos, e que sua genética foi
integralmente preservada entre os
nórdicos, o que não tem nenhum
fundamento científico.
~ Fatos e Versões
...........................................................................................
l..~~~?~.~~~..~.~!~.~.~~.~.~~~.~~~..~~~.~~~~~.~.~.~~.'.~~...l
EM BUSCA DO OURO
DOS TEMPLÁRIOS
Pouco antes de o líder dos
cavaleiros templários Jacques
de Molay morrer na fogueira,
em 1314, teria jogado uma praga
no rei da França, no papa e no
responsável pelo processo que
acabou com a Ordem - os
culpados pelo massacre de seu
grupo. Todos morreriam dentro
de um ano. Foi o que aconteceu.
lacobus, da espanhola Matilde
Asensi, trata da investigação dos
assassinatos levada a cabo pelo
médico Galcerán de Born,
membro da Ordem dos
Hospitalários, a pedido do papa
João XXII. A trama do romance
leva Born, seu filho e uma bruxa
judia a trilhar o Caminho de
Santiago em busca dos
esconderijos do ouro da ordem
dissolvida - que estaria se
reorganizando em Portugal. Sim,
é um livro de detetive medieval,
que fora alguns exageros da trama
mantém um bom rigor histórico.
AVENTURAS NA HISTORIA 117
~ linha do Tempo
, A
IMPERIO BRITANICO
NO MAIOR IMPÉRIO DA HISTÓRIA, O SOL NUNCA SE PÕE
Maiorimpério da História, o Reino Unido chegoua dominar 25% da área da Terra em 1922, tendoum em cada quatro habitantes do mundo como
súdito. "O Sol nunca se põe no Império Britânico", frase
atribuída a diversos autores do século 19, não era exagero:
onde quer que fosse dia no planeta, havia ao menos uma
colônia. O Império Britânico não era insólito apenas no
tamanho. Era, afinal, uma democracia, na qual as conquis-
tas imperiais dependiam da aprovação do Parlamento.
Para vender a ideia do imperialismo, eles não podiam soar
como conquistadores vulgares. Assim, o Império consi-
derava a si mesmo como uma entidade benevolente e, aos
britânicos, civilizadores que levavam a ciência, indústria
e, não sem ironia, democracia aos povos atrasados. Foi o
que Rudyard Kiplingchamou em 1899 de "fardo do homem
branco" - carregar nas costas as populações colonizadas
-, expressão que entrou para a história como uma obra-
prima não só do racismo como também da hipocrisia. I
J
IRAQUE
(1932)*
~ História Maluca
TERRA DE DRAGÕES
Quando os europeus partiram em direção ao resto do
mundo, toda a cartografia teve de ser revista. No
começo do século 16, surgiram mapas que buscavam
descrever o mundo conhecido - e também o
desconhecido. No globo de Hunt-Lenox, de 1510, o
primeiro a conter os contornos da América, aparece a
frase HIC SVNT DRACONES- "aqui há dragões" em
latim - no leste da Ásia. A frase entrou no imaginário
popular como metáfora para o desconhecido .
.Os mapas da Renascença eram povoados por uma
multidão de criaturas fantásticas: dragões, serpentes
marinhas, hidras e demônios. O próprio Cristóvão
Colombo afirmou ter visto sereias na América, em
1493. Mesmo quando a criatura era real, o cartógrafo
costumava fantasiar. O alemão Martin Weidseemüller,
que batizou o Novo Mundo de "América", desenhou
um elefante na Noruega e escreveu embaixo "morsa".
Outra razão para os monstros era o fato de se viver
na Renascença. A moda era copiar o mundo greco-
romano, e um dos clássicos da época era História
Natural, de Plínio, o Velho, que descreve híbridos de
humanos e animais como seres de regiões remotas.
Desenhá-Ios era uma forma de demonstrar erudição.
~~O~qu~e~é~is~t~o~? _
DESCUBRA
O QUE É O
ESTRANHO
OBJETO
DA FOTO
a) Maquetes de tanque
para treinamento
b) Cortadores de grama
c) Minitratores
d) Brinquedos alemães
da Segunda Guerra
e) Bomba robô nazista
20 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
'sepeIOJlUOOOlOWaJssumbatu
WeljU!l anb SOJlnOuraia SOO!Ulll!Jq
a S00!l9!flOS 'O!P?Jiod SOpelOJlUOO
a saiojau sorapoui uranssod
w9qwel sagwale SO 'vv6~
wa 'e!pUBWJONeu anbJeqwasap
o sçda soparudeo SaJeldwexa
urauasqo SOO!uglPqsopapos
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'ssnbuei J!nJlSap amd 'w 099
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CARAPAÇA
A principal tática japonesa
consistia em abordar,
prender o navio inimigo
com ganchos, pular para o
convés e derrotar a
tripulação no combate no
corpo a corpo. Os espetos
de ferro tornavam a
~ .•.,,_: manobra impossível, e a
carapaça metálica dava
total proteção contra
flechas e balas de arcabuz
CHOQUE E TERROR ----~
A careta de ferro na proa servia para
bater nos navios inimigos, causando
danos ao casco e atordoando a
tripulação. O navio tartaruga era
enviado para o meio da frota
inimiga, divergindo fogo para si,
enquanto os navios convencionais
disparavam em segurança
FOGO NAS VENTAS --
A cabeça de dragão
lançava fumaça tóxica,
produztda pela queima
de enxofre numa fornalha
na proa do navio. Isso
era usado para encobrir
os movimentos ou após
um ataque direto,
jogando a fumaça no
convés do navio inimigo.
Um canhão adicional
podia ser posicionado
na boca do dragão
~ Arqueologia do futuro
NEUROMANCER
LIVRO PREMIADO DEFINIU A FiCÇÃO CIENTíFICA PELAS DÉCADAS SEGUINTES
Lançado em 1984, Neuromancer foi o primei-ro livro a ganhar os prêmios Nebula, Hugoe Phillip K. Dick, os três grandes da ficção
científica. A obra de William Gibson, que
lançou o termo "ciberespaço", pode não ter
sido a primeira no gênero cyberpunk - ficções
sombrias sobre as interações entre ser hu-
mano e máquina -, mas definiu o estilo, com
personagens marginais, falando em gírias
rebuscadas, habitando ambientes decrépitos
em cidades sem fim, num futuro ameaçador.
Quase 30 anos depois, as aventuras do
hacker Henry Case ainda parecem pertencer
a um futuro distante - Gibson, sabiamente,
nunca cita o ano em que se passam suas his-
tórias. Upload da consciência humana para
computadores, implantes artificiais com
melhorias para corpo e mente, nanorrobôs
letais e inteligências artificiais manipulando
pessoas, tudo isso ainda parece estar no ho-
rizonte da tecnologia da vida real - tanto que
ainda são clichês da ficção científica.
24 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
Mesmo com essas qualidades, não deixa de
haver indícios que entregam o ano em que o livro
foi escrito. Como em muitas ficções dos anos 80, o
Japão tornou-se a potência dominante do
mundo. Ninguém ouviu falar de wi-fi: a tec-
nologia é baseada em cabos. Para acessar a
"internet" da história é preciso conectar um
plugue ao cérebro. Mesmo com aMatrix co-
nectando o mundo todo, as pessoas preferem
trocar arquivos por meios físicos, as ROMs
- de read-only memory, memória somente de
leitura. Como o nome diz, elas não permitem
gravação, são baseadas em fita magnética.
Uma memória RAM - de random access me-
mory, como em qualquer computador ou
celular hoje em dia - é tão preciosa que aca-
ba vendida no mercado negro.
Se você ficou intrigado com o nome da
"internet", a trilogia Matrix dos irmãos Wa-
chowski presta homenagem à obra de Gib-
sono Isso foi o mais perto que Hollywood
chegou de adaptar sua obra.
ALMANAQUE Retrotech
OTURCO
AUTÔMATO ENGANOU
REIS E CIENTISTAS
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Numanoite de 1770,no paláciode Schõnbrunn, em Viena,a corte austríaca se reuniu
para assistir o engenheiro Wolfgang
von Kempelen responder ao desafio
que ele havia proposto a si mesmo no
ano anterior. Após assistir a um gru-
po de ilusionistas se apresentar dian-
te da imperatriz Maria Tereza, ele
prometeu superá-los com a maior
ilusão da História. E entregou: um
autômato, o que em si não era novi-
dade - máquinas assim existiam
desde a Grécia antiga. Mas esse era
diferente. Parecia capaz de pensar
- e jogar xadrez. Kempelen abriu as
portas sob a mesa na qual ficava o
tabuleiro, convidando todos a olha-
rem através da máquina, mostrando
que não havia nenhum operador
nela. Então chamou os convivas a
jogar uma partida. O conde Ludwig
von Cobenzl aceitou o desafio - e
perdeu de lavada. Após deixar a cor-
te boquiaberta, Kempelen desmon-
tou o autômato e o guardou. Depois
de 11anos, meio a contragosto, levou
o Turco para uma turnê pela Europa,
na qual derrotaria até Benjamin
Franklin, em Paris. O inventor mor-
reu em 1804, e a máquina passou por
vários outros donos e países, enfren-
tando ninguém menos que Napoleão
em 1809. Acabaria nos EUA, destru-
ída num incêndio, em 1854.
A máquina mais famosa de seu
tempo foi denunciada por Edgar
Allan Poe e muitos outros como uma
fraude operada por um ser humano.
Mas ninguém conseguia explicar
como: não havia espaço entre as en-
grenagens' nem como enxergar o
tabuleiro acima. O ilusionista francês
Jean Eugêne Robert-Houdin dizia
que havia um polonês sem pernas na
máq~ina. Outros favoritos dos detra-
tores eram crianças e anões.
O segredo foi revelado pelo filho
do último proprietário, o médico Si-
Ias Weir Mitchell. Um enxadrista
particularmente talentoso, de tama-
nho regular, era escondido dentro da
máquina. Um assento móvel era usa-
do para pular de uma parte para ou-
tra da mesa quando ela era aberta no
começo da apresentação.
o TRUQUE DA MÁQUINA
AVENTURAS NA HISTORIA I 25
eu
Eo
E
'fAbril MíOIA
MENTES
FAMINTAS
J SUPERINTERESSANTE É FEITA PARA ENTENDER O MUNDO ALÉM DO ÓBVIO.
l É A REVISTA ESSENOIAL PARA OABEÇAS QUE TÊM FOME DE OONHEOIMENTO.
· i
CAPA
VERDADEIRA..~
HISTORIADE
ISRAEL
AO LONGO DE 2,4 MIL ANOS, A
HUMANIDADE ACREDITOU QUE A SAGA DO
POVO ESCOLHIDO ACONTECEU TAL COMO
ESTÁ NA BíBLIA. AGORA, DEPOIS DE
DÉCADAS INVESTIGANDO CADA LINHA
DOS TEXTOS SAGRADOS, A ARQUEOLOGIA
CHEGOU A NOVAS CONCLUSÕES SOBRE
OS HEBREUS. MAIS REALISTAS, MAS NÃO
MENOS FASCINANTES
TEXTO Tiago Cordeiro ILUSTRAÇÕES Bruno Algarve
28 I AVENTURAS NA HISTÓRIA! •••••••. =:3 •••••••.,.
Hoje,para os arqueólo-gos, as figuras sagra-das mais importantesda Bíblia - Abraão,
Moisés, Davi, Salomão e Je-
sus - foram relega das ao terreno da
ficção. Até bem pouco tempo, o
Tanakh (oVelho Testamento), escri-
to no século 6 a.C., pautava as pes-
quisas arqueológicas no Oriente
Médio. Para usar uma expressão em
voga, os pesquisadores tinham uma
pá em uma das mãos e a Bíblia na
outra - os textos sagrados pautavam
onde se deveria trabalhar. Só há al-
gumas décadas uma nova geração
de pesquisadores inverteu a equa-
ção. Agora, o fruto das descobertas
é confrontado com os textos antigos
em busca de confirmação das evi-
dências descobertas. Parece pouco,
mas é uma revolução.
Os arqueólogos clássicos procu-
ravam evidências concretas dos fatos
narrados nos livros sagrados para
que os objetos encontrados compro-
vassem sua veracidade. A religião,
claro, limitava o alcance dos traba-
lhos. Por exemplo: ao ganhar acesso
à antiga cidade assíria de Urartu, no
século 19, especialistas ocidentais
estavam muito mais interessados em
encontrar a Arca de Noé do que em
entender o passado. (Datam desse
mesmo período expedições sérias em
Somente a partir dos anos 80 a
chamada arqueologia bíblica come-
çou a cair em descrédito. "O objetivo
não é comprovar à força que a Bíblia
está certa, nem acabar com a veraci-
dade dos relatos contidos ali. Édife-
renciar o literário do factual", diz
Israel Finkelstein, da Universidade
de Tel-Aviv, um dos mais influentes
arqueólogos da atualidade.
Antes, os pesquisadores tinham
um roteiro pré-definido. Javé esco-
lheu um homem da Mesopotâmia
para dar origem a seu povo eleito.
Orientado por Deus, Abraão seguiu
até Canaã. Seus descendentes foram
para o Egito, onde viraram escra-
vos. Até que Moisés conduziu os
hebreus através do mar. Os escolhi-
dos vagaram por 40 anos no deser-
to, até entrar em Canaã e protago-
nizar uma série de conquistas mili-
tares. Tempos depois, Davi se tor-
nou rei e foi sucedido por seu filho,
Salomão, que construiu o Templo
de Jerusalém para abrigar a Arca
da Aliança, que guardava as tábuas
dos Dez Mandamentos entregues
por Deus a Moisés. Os primeiros
cinco livros da Bíblia judaica, o Pen-
tateuco, descrevem essa trajetória.
O relato não se furta a citar montes,
cidades, reis, profetas, inimigos,
genealogias. Agora, deste novo mo-
mento das pesquisas, está surgindo
AVENTURAS NA HlSTÓRIA I 29
@
~ M 'ifi
'- " li;I I • r
o ÊXODO NÃO ACONTECEU
I
~
Em 2010, o físico Carl Drews, do Cen-
tro Nacional de Pesquisas Atmosfé-
ricas dos EUA, recriou em laborató-
rio a passagem de Moisés pelo Mar
Vermelho. Confirmou que ventos em
velocidade de 100 km/h, soprando
por 12 horas em um ponto a leste do
delta do Rio Nilo, poderiam abrir
uma brecha na água e permitir a pas-
sagem de pessoas. "A travessia foi
obra de Deus. Apenas simulei o even-
to para demonstrar como Ele atuou",
diz. "Cientistas religiosos, como eu,
acreditam que, ao pesquisar omundo
natural, estudam a obra do Senhor."
Sete anos antes, o físico britânico
Colin Humphreys, da Universidade
de Cambridge, publicou um livro, Os
Milagres doÊxodo, estabelecendo uma
série de relações de causa e efeito
para explicar as dez pragas lançadas
por [avé contra o faraó: a proliferação
de algas teria deixado o NUo verme-
lho com sangue dos peixes e afugen-
tado sapos e rãs, que apareceram
mortos nas cidades e atraíram mos-
quitos - que, por sua vez, teriam pro-
vocado a morte do gado e transmitido
doenças que deixavam chagas nas
pessoas. Chuvas de granizo umede-
ceram o solo úmido e atraíram gafa-
nhotos. Uma tempestade de areia,
comum no Egito, seria a causadora
dos três dias de escuridão. E os pri-
mogênitos, que tinham a primazia de
se alimentar antes dos irmãos, teriam
morrido ao ingerir cereais contami-
nados por fezes de gafanhotos.
Acontece que pesquisas desse gê-
nero desconsideram que os arquivos
egípcios são bem organizados e co-
nhecidos. E não há registro de que os
hebreus tenham vivido lá, algo que,
pela cronologia baseada na Bíblia,
teria ocorrido no século 13 a.C. Es-
queça a cena de Charlton Heston
acorrentado e carregando pedras
pesadas, em OsDez Mandamentos.
Nem mesmo é possível identifi-
car o faraó com o qual Moisés teria
negociado a libertação - o texto bí-
blico, tão pródigo em nomes, não
menciona o governante envolvido
em um episódio tão crucial. E é di-
fícil imaginar que 600 mil refugia-
dos, vagando por 40 anos, não dei-
xariam vestígios arqueológicos ou
registros documentais nos arquivos
de civilizações vizinhas.
Quanto à existência de Moisés,
sabe-se apenas que era um nome co-
mum no Egito. Como no caso dos
patriarcas, é provável que os autores
da Torá tenham recorrido a nomes
facilmente reconhecíveis para cons-
truir uma mitologia de fundação .••
· OS HEBREUS NÃO DERRUBARAM AS MURALHAS DE JERICÓ
, '
Na Bíblia, a chegada à Terra Prome-
tida não garante seu domínio. A
região estava forrada de cidades-
estado em constante guerra entre si,
caso de jericó, Maceda e Hebron.
Liderados pelo chefe militar josué,
os hebreus conduzem uma série de
batalhas muito rápidas e eficientes,
com vitórias garantidas pela pre-
sença, no campo de guerra, da Arca
da Aliança. A mais impressionante
acontece com a muralha de jericó:
ela é derrubada pelo som de trom-
betas, tocadas ininterruptamente
por sete dias e sete noites.
Não foi bem assim. Provavelmen-
te os israelitas surgiram em Canaã,
a região que hoje corresponde aos
territórios de Israel e da Palestina,
além de partes do Líbano, dajordâ-
nia e da Síria. Eles construíram as-
sentamentos rurais em vales mais
altos e passaram a se diferenciar
culturalmente e em termos religiosos
dos povos que viviam nas planícies.
"Em termos étnicos, cananitas,
israelitas, moabitas, amonitas e fe-
nícios eram o mesmo povo. Com o
passar do tempo, eles passaram a
se diferenciar culturalmente", diz
o arqueólogo britânico jonathan
Golden, professor da Universidade
Drewe autor de Ancient Canaan and
Israel: An Introduction ("Canaã An-
tiga e Israel: Uma Introdução", sem
tradução no Brasil).
Na medida em que se diferencia-
ram do povo de origem, os hebreus
chegaram, sim, a dominar parte dos
territórios que hoje correspondem a
Israel e Palestina, mas não da forma
como descrita na Bíblia. "Foi uma
conquista lenta, levada a cabo por
tribos que provocavam guerras re-
gionais entre 1200 a.C. e 1000 a.C. Os
líderes militares de gerações diferen-
tes provavelmente foram reunidos
sob um único nome,josué", afirma o
arqueólogo Finkelstein.
Quanto às muralhas de jericó, a
datação ainda é muito discutida pe-
los arqueólogos, mas a maioria con-
corda que a cidade já estava destru-
ída na década de 1560 a.C., talvez
por causa de um terremoto, ou em
razão de batalhas. Não foram trom-
betas, de toda forma. "Outras cida-
des citadas no texto bíblico também
estavam desocupadas na época em
que, segundo a tradição, as conquis-
tas teriam ocorrido", diz Finkels-
tein. Mais uma vez, nomes muito
conhecidos (desta vez, de cidades
antigas) são citados para reforçar
uma tradição e aumentar o tamanho
do feito dos hebreus. ••
ESCAVAÇÕES RECENTES
DEZ WCAIS BíBUCOS INVES'nGADOS NOS ÚLTIMOS ANOS
(
5.GEZER
1
1. NAHAL TUT: Escavações realizadas em 2005 apontam
que o local, que posteriormente foi dominado por
romanos e mamelucos, pode ter abrigado uma cidade
murada judaica no século 8 a.C. -
2. TEL MEGIDDO: Abriga 26 camadas diferentes, com
cidades que foram sendo construídas e destruidas de
7 mil a.C. a 586 a.C. Desde 1994, é escavada em regime
bianual - os arqueólogos acreditam que a região é crucial
para explicar as origens dos cananeus e dos hebreus.
3. TEL HAZOR: Investigada exaustivamente desde a
fundação do Estado de Israel, abriga uma coleção de
19 documentos cuneiformes. Omais recente,encontrado
em 2010, data do século 18 a.C. e descreve leis no estilo
do código babilônico de Hamurabi.
4. TEL REHOV:O local de 120 mil metros quadrados é alvo
de escavações desde 1997. Foram encontradas vãrias
camadas de ocupação urbana, desde o século 12 a.C.,
e sinais de criação de abelhas e exploração de mel
datando do século 10 a.C.
5. GEZER:Cidade de origem cananeia, tem 3 500 anos
de existência e é constantemente Investigada por
arqueólogos hã um século. Desde 2010, um grupo
de americanos escava a rede subterrânea de ãguas,
encontrada na década de 1900 e nunca estudada
desde então.
6. KHIRBET QEIYAFA: Sitio conhecido desde os anos
1860, foi alvo de uma investigação intensa entre 2007
e 2013. A região, que fica nos arredores de Jerusalém,
pode ter feito parte dos limites do reino hebreu
governado por Davi.
7. TEL LACHISH: Era a segunda cjdade mais importante
do território de Judã. Escavações realizadas nos anos
1990 encontraram uma rampa construida pelos assírios
e ossadas de 1 500 pessoas, possível resultado do cerco
que derrotou os judeus na região.
8. JERUSALéM: Desde 2006, um grupo de arqueólogos
israelenses dribla a restrição para escavar o Monte do
Templo. Aproveitando o descarte de terra provoCÃldo
pela construção de uma mesquita, os pesquisadores jã
encontraram artefatos hebreus dos séculos 7 a.C. e 8 a.C.
9. TEL ES-SAFI: Investigada entre 1996 e 2002 e de
2004 a 2008, a ãrea, ocupada desde o século 5 a.C. e
desabitada em 1948, guarda sinais de ocupação filistina
- pode ter sido a cidade de Gath, citada no texto biblico.
Um escrito encontrado remete ao nome Golias.
10. VALE DETIMNA: A região foi batizada de Minas do Rei
Salomão na décadirde 1930. Pesquisas recentes apontam
que elas podem ter sido exploradas pelos edomitas,
um povo viiinho aos hebreus na época do rei Davi.
o REINO DE DAVI ERA BEM MODESTO
Em 1993e 1994, fragmentos de uma
placa escrita em aramaico para co-
memorar uma vitória militar contra
os hebreus foram encontrados no
sítio de Tel Dan, no norte de Israel. O
texto, do século 9 a.C., cita uma "Casa
de Davi". Desde então, ficou estabe-
lecida a existência real de um rei cha-
mado Davi, que teria governado por
volta do século 10 a.C. De seu filho,
Salomão, não há provas. Mas pesqui-
sadores concordam que ele existiu.
"Não há dúvidas sobre Davi, o que
reforça a tese de que deve ter tido um
filho e sucessor", diz Gershon Galil,
da Universidade de Haifa.
Desde então, uma série de desco-
bertas, algumas mais confiáveis,
outras menos, parecem a caminho
de solucionar a polêmica: deve ter
existido, sim, um reino unificado dos
hebreus. O tamanho exato do terri-
tório e o poderio militar e político
hebreu na época estão no centro do
debate. Se existe um período da his-
tória dos hebreus sobre o qual ainda
há muito a esclarecer, é esse.
O sítio de Khirbet Qeiyafa, a 30
km de Jerusalém, tem rendido mui-
tas notícias. Entre 2008 e 2013, a
região foi investigada por arqueólo-
gos da Autoridade de Antiguidades
de Israel e da Universidade Hebrai-
ca. Um tablete, encontrado em 2008
e de tradução tão difícil que existem
pelo menos três versões diferentes,
seria o mais antigo texto hebreu já
localizado e faria referência à vitória
de Davi sobre Golias. Em julho pas-
sado, foi anunciado que uma das
construções do local seria um palá-
cio que faria parte do reino de Davi.
"Os achados comprovam que existiu
um reino hebreu unificado e organi-
zado, com fortalezas e centros admi-
nistrativos", afirma o arqueólogo
israelense Yosef Garfinkel, um dos
líderes das escavações e professor da
OITO PERSONALIDADES
BíBLlCAS QUE
POSSIVELMENTE
EXISTIRAM ...
Davi, rei dos hebreus
Salomão, rei dos fiebreus
Ezequias, rei de Judã
Josias, rei de Judã J
Jeremlas, profeta de Judã
Jesus, profeta judeu
Pedro, seguidor de Jesus
paulo, seguidor de Jesus
E OITO PERSONAGENS 1
QUE PROVAVELMENTE
SÃO FICTíCIOS
Noé, construtor aa arca
Abraão, patriarca I'
Isaac, patriarca
Ismael, filho de Abraão i
Jacó, patriarca \
Moisés, lider dos hebreus
Josué, líder militar dos hebreus
Levi, fundador da tribo dos levitas j
- ];
"-
"
Universidade Hebraica. "Ainda não
foi sequer estabelecido se Khirbet
Qeiyafa é uma antiga cidade hebreia
ou cananeia", contrapõe Finkelstein.
Possivelmente existiu um reino,
ainda que pouco expressivo. Jerusa-
lém, que - diz a tradição - Davi
transformou em capital, não tinha
mais do que 2mil habitantes. Os en-
frentamentos com os vizinhos eram
recorrentes - tese reforçada pela
localização nos arredores de Jerusa-
lém, há três anos, de restos de um
muro de 70 m de comprimento e 6 m
de altura da segunda metade do sé-
culo 10 a.C. (época em que, segundo
a Bíblia, Salomão coordenou a cons-
trução de um muro ao redor da ca-
pital). "É possível que o reino tenha
durado pouco, tal como aconteceu
no século 8 a.C. com os arameus. É
um padrão que se repete na região.
Povos menores eram pressionados
por invasores egípcios e assírios",
diz Gershon Galil.
É certo que por volta de 930 a.C.
os hebreus estavam divididos em
dois reinos: Israel, ao norte, e judâ,
ao sul, tendo Jerusalém como capital.
Quando os assírios dominaram Is-
rael, em 720 a.C., o povo do norte se
dispersou - seu destino é um misté-
rio. Levas de migrantes em direção a
Judá fizeram com que a população de
Jerusalém fosse multiplicada por dez
em 50 anos. A partir de então, o reino
de Judá prosperou. Portões de cida-
des muradas encontrados em Gezer,
Megiddo e Tel Hazor, indicam que
havia um padrão arquitetônico na
formação de posições militares. O
mesmo vale para o templo encontra-
do nos anos 1980 em 'Ain Dara, Síria,
que tem um desenho semelhante à
descrição bíblica para o primeiro
Templo de Jerusalém. Construído ou
não por Salomão, é bem possível que
esse primeiro templo tenha existido.
OS REIS DE JUDÁ ESTABELECERAM O MONOTEíSMO
Se a era dos patriarcas foi deixada
no terreno da mitologia e o período
do rei Davi é motivo de polêmicas
acirradas, na etapa seguinte, que se
concentra no reino de Judá entre os
séculos 8 e 6 a.C., os fatos estão mais
bem estabelecidos. Sabe-se que a
ocupação babilônica ocorreu, eque
personagens importantes descritos
na Bíblia existiram. Eles são citados
em documentos oficiais de reinos
vizinhos ou em registros judaicos
externos ao Antigo Testamento.
O rei Acabe, de Israel, por exem-
plo, aparece em documentos do rei
da Assíria Shalmaneser IH. Os as-
sírios também registraram a traje-
tória de Oseias, que chegou ao trono
de Israel matando o rei Peca e, der-
rotado pelos vizinhos, foi obrigado
a pagar tributos ao rei Tilgath -Pile-
ser IH. Outro governante israelita,
Omri, é citado em documentos mo-
abitas. Já o rei de Judá Jeconias está
nos arquivos da Babilônia. E o es-
criba Baruque ben Neriah, para
quem o profeta Jeremias ditava seus
textos durante o exílio, teve a exis-
tência confirmada por dois docu-
mentos judaicos diferentes, encon-
trados em escavações de 1975e 1996.
O rei Iosias, de Judá, também
existiu. Foi fundamental para a con-
solidação da religião monoteísta, ao
promover uma reforma religiosa e
expulsar imagens e templos de ou-
tros deuses derivados da fé cananeia,
que ainda estava presente no imagi-
nário judaico - caso de El, Baal e
Asherah. O trecho do Pentateuco que
narra a desobediência diante de Moi-
sés, quando o povo hebreu constrói
um bezerro de ouro (ligado a Baal) e
é punido, foi elaborado nessa época.
"A própria Bíblia cita casos em
que o povo retoma a prática do poli-
teísmo", diz o filósofo e historiador
de religiões francês Frédéric Lenoir,
autor de Deus: Sua História na Epo-
peia Humana. "Os judeus não inven-
taram o monoteísmo. No século 14
a.C., ainda que num período curto
de tempo, o faraó Aquenáton estabe-
leceu uma religião com deus único.
E a consolidação do monoteísmo ju-
daico é contemporâneaao surgimen-
to do zoroastrismo na Pérsia."
OS ÚLTIMOS DIAS DE JESUS
NÃO FORAM COMO NA BÍBLIA
Para os cristãos, todos os relatos do
Antigo Testamento funcionam como
um prefácio para que o filho de Deus
em pessoa venha à Terra para redi-
mir a humanidade ao morrer em
uma cruz e ressuscitar depois de
três dias. A busca por evidências
sobre a existência do profeta judeu
que inspiraria a fundação do cris-
tianismo levou a uma vasta coleção
de dados que confirmam parte dos
relatos dos Evangelhos e, de forma
indireta, se acumulam em quanti-
dade suficiente para a historicidade
de Jesus ser aceita.
Um barco encontrado no Mar da
Galileia em 1985, por exemplo, é co-
erente com a descrição encontrada
nos Evangelhos, assim como uma
casa de Cafarnaum, do século 1a.C,
que poderia ter sido habitada por
profetas como ele. E várias persona-
lidades romanas com cargos admi-
nistrativos no território israelense já
ganharam provas concretas que vão
além dos textos da Bíblia e dos his-
toriadores romanos: a tumba do rei
da Judeia Herodes, o Grande, o os-
suário do sumo-sacerdote Caifás e
uma inscrição mencionando o gover-
nador Pôncio Pilatos vieram à tona
respectivamente em 2007, 1990 e
1961. Em setembro, arqueólogos da
Universidade Reading localizaram
uma cidade que acreditam ser Dal-
manuta, para onde Jesus seguiu, de
acordo com o texto bíblico, depois de
multiplicar peixes e pão e alimentar
4 mil seguidores. A cidade fica perto
de Migdal, considerada a terra natal
de Maria Madalena.
Como aponta o escritor Reza As-
lan, autor do recém-lançado Zealot:
The Life and Times ofJesus of Nazare-
th ("Zelote: A Vida e a Época de Je-
sus de Nazaré, com edição brasileira
prevista para o início de 2014), é bem
provável que Jesus tenha sido ape-
nas um profeta, e nem o mais famo-
so em sua época, ainda que relatos
sobre sua vida não condigam com o
que a história e a arqueologia con-
cluíram sobre o período.
O motivo para Jesus nascer em
Belém, segundo os Evangelhos, foi
um recenseamento realizado pelos
romanos - mas não existe nenhum
documento indicando que tal ordem
foi dada. Assim como não se tem
registro do comando de Herodes
para matar todos os primogênitos
da região. O costume a que Pôncio
Pilatos se refere no texto bíblico, de
libertar um preso por ocasião da
Páscoa, não existia. "Assim como a
Torá, o Novo Testamento segue a
tradição de construir mitos funda-
dores a partir de nomes reais", afir- •
ma o historiador Ron Hendel.
"O texto bíblico tem centenas de
autores, e ainda assim é tão coeso e
fascinante que se tornou capaz de
difundir uma prática religiosa tão
estranha para a Antiguidade quan-
to o monoteísmo", afirma o historia-
dor americano Richard Friedman,
professor da Universidade da Cali-
fórnia em São Diego. "À parte qual-
quer discussão sobre sua historici-
dade, a própria existência de um
livro como a Bíblia pode ser consi-
derada um milagre". !llll
LIVROS
A Blblla Não 71nhaRazão,
Israel Flnkelsteln, Neli Ascher
SlIberman, Girafa, 2003
71!eRise of Anelent Israel, Wllliam
Dever, Adam Zerlal, Norman
Gottwald, Israel Flnkelstaln,
P.Kyla MaCarlar Jr, Bruca Haipam,
Hershel Shanks, Bibllcal
Arc~aeology Soclety, 2003
Who Were the Anelent Israelites
and W/1ere Dld TlWy Come From?,
WlIllam G. Dever, Wm.
B. Eerdmans Publlshlng, 2006
Arqueologia na TelTll da Blblla,
Amlhal Mazer, Paullnas, 2003
Excavatlng ;/esus, John Domlnic
Crossan e Jonathan Reed,
Harper San Francisco, 2002
Abraão - Uma Jomal/;! ao
Coração rIJI TrOs Religiões,
aruce Feller, Sextante, 2003
TODOS CONTRA OS~
Sardinha, um ex-professor formado em
Direito e Teologia, não gostou da maneira
como os religiosos purgavam os pecados.
"Tais exercícios, ainda que sejam santos e
virtuosos e ordenados para mortificar a
carne e quebrar a soberba, todavia são
mais meritórios se feitos em segredo", es-
creveu ao chefe de Nóbrega, Simão Rodri-
gues de Azevedo, líder da Companhia de
Jesus em Portugal. O curioso é que Nôbre-
ga foi o primeiro a defender que Salvador
tivesse um bispo, preocupado com o com-
portamento do rebanho na cidade recém-
fundada. O veto aos açoites públicos, po-
rém, foi só a primeira de uma série de de-
savenças em que os jesuítas se envolveram
no Brasil - e a lista só cresceu nos dois
primeiros séculos do Brasil colônia. ••
A COMPANHIA DE JESUS ARRUMOU ENCRENCA COM
POLÍTICOS, MILITARES E ATÉ COM O PRIMEIRO BISPO
NO BRASIL NA MISSÃO DE CATEQUIZAR OS íNDIOS
TEXTOMarcus Lopes ILUSTRAÇÕESRodrigo Idalino
Nem bem desembarcou na Bahia,o primeiro bispo no Brasil, domPero Fernandes Sardínha.tra-tou logo de mostrar quem man-
dava nas almas do lugar. Seu primeiro alvo
foram os jesuítas, que chegaram ao Brasil
junto com o primeiro governador-geral,
Tomé de Souza, em abril de 1549. Sardinha
ficou estarrecido com uma prática dos reli-
giosos da Companhia de Jesus: fIagelações
públicas, parte de um processo de "exercí-
cios espirituais" idealizado pelo fundador
da ordem, Inácio de Loyola. Liderados por
Manoel da Nóbrega, os jesuítas saíam à noi-
te pelas ruas de Salvador em procissão,
submetendo-se a açoites - e convidando os
moradores a imitá-los. "Inferno para todos
que estão em pecado mortal", bradavam.
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 39
t·
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I
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TERRA BRASILlS
40 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
Conflitos entre religiosos
e governantes eram comuns
na colônia. O uso de índios como
escravos dividia as opiniões
Sardinha havia sido professor do próprio
lnácio de Loyola, por isso conhecia bem a
ortodoxia jesuítica. E não gostava dela. No
curto tempo em que passou à frente da dio-
cese de Salvador, tratou de podar o poder da
turma de Nóbrega. Proibiu, por exemplo,
que pregassem aos índios em tupi - um duro
golpe na ordem, que se empenhava justa-
mente em aprender a língua dos indígenas
e adaptar o culto católico a eles. O bispo im-
plicou até com o corte de cabelo das crianças,
que para ele "se pareciam com freiras". Fi-
nalmente, vetou aos jesuítas que frequen-
'tassem as capelas que h'aviam construído
nas aldeias, proibiu que as confissões con-
tassem com intérpretes e impediu que os
índios fossem à missa nas igrejas de Salva-
dor. Em resumo, ele acabou com o trabalho
dos jesuítas. "Em tese, o confronto eclodiu
porque Sardinha era contrário à catequiza-
ção dos indígenas", escreveu Eduardo Bue-
no em seu livro A Cruz, a Coroa e a Espada.
O raciocínio do bispo Sardinha seria um
divisor de águas entre os colonizadores e os
jesuítas - para sempre. A questão dos índios
sempre teve consequências no dia a dia da
colônia, onde conflitos entre religiosos e po-
derosos eram comuns. "As disputas entre
jesuítas e governantes, e com as pessoas li-
gadas ao tráfico de indígenas, eram constan-
tes", afirma o padre jesuíta Cesar Augusto
dos Santos, mestre em História Social pela
PUC-SP e autor do livro O Colégio de Pirati-
ninga. "Os jesuítas lutavam para que o indí-
gena fosse respeitado como ser humano,
como filho de Deus, e as disputas eram for-
tíssimas." A disputa, que começou como uma
discussão teológica, teria efeitos terríveis.
O bispo Sardinha, como se sabe, entrou
para a história do Brasil ao supostamente
ser devorado por indígenas quando o navio
que o levava de volta à Europa naufragou
na costa da atual Paraíba, em 1556. O es-
critor Oswald de Andrade usou o caso em
seu Manifesto Antropófago, de 1928. O bispo
morreu, mas os inimigos dos jesuítas se
multiplicaram em Pindorama.
SÃO PAULO
Para se livrar da tutela de Sardinha, an-
tes que ele virasse comida de canibais, Nó-
brega seguiu Tomé de Souza em visita às
capitanias do sul e acabou por se estabelecer
em São Vicente. Na vila já vivia o jesuíta
Leonardo Nunes, o Abarêbebê, ou padre
voador, pela velocidade com que andava
pela região. Quando soube que, subindo a
Serra do Mar, havia um povoamento com
brancos e índios liderados pelo português
João Ramalho,Nóbrega viu a chance de
encontrar um local para catequizar os ín-
dios longe da ingerência dos poderosos" Foi
o mote para a fundação do colégio que daria
origem à cidade de São Paulo, em 1554.
Nóbrega sabia que precisava da ajuda de
Ramalho para se estabelecer no planalto,
mas em pouco tempo a relação entre os dois
degringolou. O português não era casado
com a índia Bartira e os brancos e mame-
lucos não gostavam dos valores dos religio-
sos. Quase todas as relações econômicas
passavam pelo aprisionamento e escravi-
zação de índios de outras etnias - devido à
pobreza e ao isolamento da vila, em pouco
tempo as bandeiras se transformaram na
única riqueza para seus habitantes. ••
que vem de uma forma de jogo por
eles praticado desde a Idade Média",
diz o historiador Elias Feitosa. "No
entanto, não é possível afirmar que foi
a partir daí que o futebol se
disseminou no Brasil. Assim sendo, a
versão mais aceita continua sendo a
de que ele chegou com Charles Miller."
Aos jesuítas também é creditado
a introdução do teatro no Brasil.
"Para evangelizar e catequizar os
indígenas, o padre José de Anchieta
trouxe o teatro e escreveu as
primeiras peças brasileiras", diz o
jesuíta César Augusto dos Santos,
postulador da causa de canonização
de Anchieta, cujo processo está em
análise no Vaticano.
PADRES E PAIXÃO NACIONAL
Muito ligados à educação desde os
tempos coloniais, os jesuítas podem
ter dado urna contribuição
fundamental para uma paixão
brasileira: o futebol. Muitos antes de
Charles Miller, o introdutor do futebol
no Brasil na última década do século
19, há registros de que a bola já
rolava em colégios jesuítas como
recreação dos padres e alunos.
O padre César Augusto dos Santos
conta que, algum tempo após os
jesuítas retomarem ao Brasil,
beneficiadas pela queda da reforma
pombalina, fundaram o Colégio São
Luiz, em Itu, no interior de São Paulo, i
depois transferido para a capital
paulista. "Foi nesse colégio, em Itu,
onde se realizou pela primeira vez no
Brasil uma partida de futebol, feita,
evidentemente, entre alunos", afirma
o padre César.
A versão é confirmada pelo
historiador José Moraes dos Santos
no livro Visão do Jogo - Primórdios do
Futebol no Brasil. Ele relata que, por
volta de 1873, o padre José Mantero,
professor do São Luiz, teria
apresentado a bola de futebol aos
estudantes na hora do recreio.
Em Nova Friburgo (RJ), o esporte
também deu seus primeiros passos
nas mãos dos religiosos. "Os jesuítas
italianos que ali se estabeleceram, em
1886, já conheciam o calcio, que é
como os italianos chamam o futebol,
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 41
Em 1640, autoridades de
São Paulo expulsaram os jesuítas,
fundadores da cidade.
Eles só voltaram dez anos depois
Os conflitos entre religiosos e a popula-
ção local chegavam às vias de fato resultan-
do, em diversas ocasiões, na expulsão dos
jesuítas do território paulista. Em 1633, um
grupo liderado pelo bandeirante Antonio
Raposo Tavares tomou de assalto a aldeia
de Barueri e expulsou os padres. "Lança-
ram fora os móveis da residência jesuítica,
levaram os indígenas, depredaram e fecha-
ram.a Igreja de Nossa Senhora da Escada,
padroeira da aldeia, e expulsaram os jesuí-
tas", escreveu Ney de Souza em Catolicismo
em São Paulo. Anos depois foiavezdos jesuí-
tas de São Paulo de Piratininga. Mesmo as
camadas mais baixas dos paulistanos não
viam com bons olhos aquele trabalho de
evangelização que atrapalhava o "ganha-
pão" emovia a economia da vila.
No dia 10 de julho de 1640, os padres do
Colégio receberam uma notificação de que
teriam dois dias para deixar a vila. No dia
13 de julho, às 2 da madrugada, a Câmara
mandou tocar o sino. Da janela da Câmara
(centro do poder local) foi lida para a popu-
lação a sentença de expulsão dos padres. Na
manhã seguinte, todos foram à porta do
Colégioe invadiram o prédio. Expulsos, os
jesuítas foram para Santos e só voltaram a
subir ao planalto mais de dez anos depois.
FORA DE PORTUGAL
A pá de cal nos jesuítas na colônia veio di-
retamente de Portugal. Um decreto, elabo-
rado sob inspiração doMarquês de Pombal,
expulsou a ordem da metrópole e de todas
as suas colônias, em 1759. "Declaro os so-
breditos regulares rebeldes, traidores, ad-
versários e agressores que estão contra a
minha real pessoa e Estados, contra a paz
pública dos meus reinos e domínios, e con-
tra o bem comum dos meus fiéis vassalos",
registrou o decreto do rei dom José I. "O
mandando que efetivamente sejam expulsos
de todos os meus reinos e domínios."
Em 1768, o rei da Espanha, Carlos Hl,
seguiu na mesma toada. Foi o final de uma
das experiências utópicas mais importantes
do mundo: as reduções, ou missões jesuíti-
cas, nas quais milhares de indígenas acul-
turados viviam sob os preceitos dos religio-
sos. Muitas dessas missões marcavam
justamente a fronteira entre as possessões
portuguesas e espanholas na América do
Sul, Acordos políticos na Europa levaram
a um massacre dos habitantes das reduções,
que até então funcionavam como uma sal-
vaguarda aos indígenas - viver em uma
delas era uma forma de escapar dos bandei-
rantes brasileiros e dos encomenderos caste-
lhanos, ambos interessados em buscar mão
de obra escrava nos sertões.
Osjesuítas, os pioneiros a levar a catequi-
zaçãoaos indígenas, os criadores das primei-
ras escolas na América do Sul, fundadores
de cidades no NovoMundo, aponta de lança
da Contrarreforma nas colônias ibéricas,
perderam espaçopolíticode tal maneira que,
em 1773, o papa Clemente XIV dissolveu a
Companhia de Jesus. A restituição e conso-
lidação da ordem no país só ocorreria muito
tempo depois,já comoBra-
sil independente. A força
da Companhia de Jesus,
porém, continua. Éjesuíta
o atual papa, o argentino
Jorge Bergoglio.!l!ll
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 43
AVENTURA
A REPÓRTER NORTE-AMERICANA NELLlE BLY QUIS REPETIR A
VIAGEM INVENTADA POR JÚLIO VERNE. CONSEGUIU CHEGAR AO
PONTO DE PARTIDA ANTES DO PERSONAGEM PHILEAS FOGG
------------ -- ------,--------
TEXTO Marina Ribeiro
44 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
estômago estava embru-
lhado. Olhando para bai-
xo, na amurada do navio
sobre o Atlântico, deu
vazão ao desconforto. Ela enxugou os
olhos marejados, mas a náusea conti-
nuava. O barco mal deixara o porto de
Hoboken, nos Estados Unidos. Quan-
do se virou, viu sorrisos no rosto de
outros passageiros no convés. "E ela
vai viajar ao redor do mundo!", co-
mentou um homem com sarcasmo.
Apesar de ter se juntado às gargalha-
das, foi nesse momento que a repórter
norte-americana Nellie B1y percebeu
o tamanho de sua ousadia de tentar a
dar a volta ao mundo. Ela nunca tinha
viajado de navio. Foi a primeira vez
que considerou a possibilidade de não
ser bem-sucedida na empreitada. E
ainda faltavam mais de 27 mil quilô-
metros para percorrer de barco,
A ideia de dar a volta ao mundo
surgiu em uma noite de domingo,
mais de um ano antes, no outono de
1888. Enquanto buscava sugestões de
reportagens para o jornal The Neui
York World, de Joseph Pulitzer, Nellie
percebeu que queria mesmo era estar
no outro extremo do globo. E logo
pensou que, após trabalhar anos sem
nunca tirar férias, o ideal seria fazer
com que o jornal a enviasse para lá.
Após 15anos da publicação de A 'Vol-
ta aoMundo em 80Dias, de Júlio Verne,
viajaria ao redor do planeta para ten-
tar bater o recorde de 1 920 horas de
Phileas Fogg, o protagonista do livro.
Ao apresentar a proposta, descobriu
que o jornal já tinha planos de enviar
um homem na jornada. Afinal, "uma
mulher precisa de um protetor, e mes-
mo que fosse possível viajar sozinha
precisaria levar tanta bagagem que
perderia muito tempo nas rápidas
mudanças ", disse George Turner,
diretor comercial do jornal.
Um dos artigos
de Nellle:
pioneira e
recordista.
Abaixo, a
fATHER TIIE· OUTDOIIE! recepção na
__ I chegada a
Enn ~ RecIrd hIeI un\ Jersey Clty.. 1IIe PllfIl\1lilllCl,,"lhe w.v." No detalhe,
.1iIoIIt-CidIr. • desembarque--. i na Filadélfia
!IEI\mo:, nD1n..-,"l1llL-S!C..
Tho.,.ande Oh'" Them""''' Ho.'"
at NellJe ."'. Ani".I. . ~
WUClllf UlI1U ti IEW l1Il m ..-m.\- . ~
t» Dale Contl7 .,ww W1til t..- •.
Nellie já estava habituada a ouvir
o que uma garota deveria ou não fa-
zer. Nascida Elizabeth jane Cochran,
em 5 de maio de 1864, logo aprendeu
a enfrentar desafios. Era órfã de pai
desde os 6 anos e viu a fortuna da fa-
mília virar pó. Aos 16,mudou-se para
Pittsburgh, onde ajudava a mãe com
tarefas da casa, que abriram a pensio-
nistas para complementar a renda.
Aos 21 anos, Elizabeth leu um edi-
torial no The Pittsburgb Dispatcb,
"Para que meninas são boas". O arti-
go repreendia mulheres até por tentar
ter educação ou carreira, sugerindo
que deveriam ficar em casa. Isso a
enfureceu a ponto de escrever uma
carta ao jornal, assinando como "Or-
fãzinha". O editor George Madden
ficou tão impressionado com a res-
posta que colocou um anúncio para
que a órfã fosse visitar a redação e
ofereceu-lhe a oportunidade de fazer
um texto de resposta. ••
AVENTURAS NA HISTÓRIA 145
AVENTURA
o CAMINHO DE NELLlE BLY
A JORNALISTA NORTE-AMERICANA CONSEGUIU
DAR A VOLTAAO MUNDO EM 72 DIAS, 6 HORAS E 11MINUTOS
23/01/1890
__ ~~1Il"' ~
~ ·~if 14/11/1889
Hobboken,
25/01/1890 EUA--- , \ Nova Vork,
21/01/1890 '.. EUA
São Francisco,
EUA .-<\.....-
,
TRECHODETREM
TRECHODENAVIO
Elizabeth foi para casa e escreveu
seu primeiro artigo, "O enigma femini-
no". Madden lhe ofereceu trabalho
como jornalista sob o pseudônimo de
Nellie B1y(nome de uma canção popu-
lar da época). Ajornalista Brooke Kro-
eger, autora da biografia Nellie Bly -
Daredeoil, Reporter, Feminist (sem tra-
dução), afirma que Nellie não era ne-
nhum gênio e nem uma escritora
primorosa. "Ela era apenas alguém que
conseguia executar o que quisesse."
CHEGAR PRIMEIRO
"Enviem um homem e eu começarei
no mesmo dia por algum outro jornal
e chegarei antes", disse Nellie. john
Cockerill, editor-chefe do Tbe World,
46 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
22/11/1889
Londres,
Inglaterra
21/11/1889
Southampton,
Inglaterra
23/11/1889
Calais,
França
~ .1
23/11/1889
Amiens,
França
.-'~'.
~""- •....:.:.!
--:--.:-,
..~I
",_... 6
já a conhecia bem o bastante para sa-
ber que ela não estava blefando. Após
receber a oferta de outro viajante para
fazer a viagem ao redor do mundo em
menos de 80 dias, os editores do The
Wor/d perceberam que corriam o ris-
co de outra publicação bancar a aven-
tura antes deles. No dia 11de novem-
bro de 1889, Nellie Bly foi convocada
às pressas ao jornal. "Você pode co-
meçar a rodar o mundo depois de
amanhã?", perguntaram. "Posso co-
meçar neste minuto", respondeu.
Na manhã seguinte, ela se encon-
trou com o estilista William Ghorm-
ley requisitando um vestido para
aquela noite, que "aguente o desgaste
constante de uso por três meses". Às
8/12/1889
Colombo, Ceilão
(atual Sri Lanka)
16112/1889
Penang,
Malãsia
18/12/1889
Cingapura,
Cingapura
5 da tarde, ela estava fazendo a prova
final de uma peça feita com pelo de
camelo. Para complementar, comprou
um casaco xadrez e uma bolsa de
mão. Conseguiu reunir numa mala
pequena roupas íntimas, papéis, ca-
netas e tinta, itens de higiene, copo,
garrafinha, chinelos, roupão, lenços,
casaco, chapéu e um hidratante para
o frio, o maior item da bagagem. "O
mais aventureiro, mais do que qual-
quer parte específica de sua viagem,
foi a própria ideia de fazê-Ia - e levan-
do apenas uma bolsa!", diz Matthew
Goodman, autor de Eighty Days.
Nellie Bly and Elizabeth Bisland's His-
tory-Making Race Around the Wor/d
(sem tradução).
BÊNÇÃO DE VERNE
o clima ruim fez com que o desem-
barque na Inglaterra atrasasse. Se
perdesse o trem da noite para Lon-
dres, estaria atrasada para todos os
demais embarques. Por intervenção
do correspondente local Tracey Gre-
aves, pôde tomar o trem que levaria a
correspondência para a capital ingle-
sa, de onde rumou para a França.
Graças a um desvio de rota e a decisão
de perder duas noites de sono, encon-
trou o autor que a inspirara a viajar.
Em Amiens, Júlio Verne abriu sua
casa à repórter e se interessou por qual
seria a trajetória. "Por que você não
vai a Mumbai, como meu herói Phile-
as Fogg?", perguntou o francês. "Por-
que estou mais ansiosa para chegar
com rapidez do que em salvar uma
jovem viúva", disse Nellie, fazendo
Em Hong Kong, no meio do
caminho, Nellie soube que não
estava tentando dar a volta ao
mundo sozinha. Uma jornalista da
Cosmopolitan estava à sua frente.
referência à indiana Aouda, salva pela
intervenção do viajante do livro.
Da França, partiu para Brindisi, na
Itália, de onde faria a travessia do Me-
diterrâneo a bordo do navio Victoria.
Poucos dias após ter embarcado, sur-
giu um rumor de que Nellie seria uma
herdeira norte-americana viajando
com uma escova de cabelos e uma car-
teira recheada. Isso fez com que dois
passageiros propusessem casamento
a ela. Os dias passavam e Nellie seguia
seu roteiro por portos sob domínio
britânico. No Sri Lanka, o antigo Cei-
lão, ela teve uma infeliz surpresa.
Uma parada rápida acabou se arras-
tando por cinco dias. Ao deixar Co-
lombo a caminho de Hong Kong, a
embarcação enfrentou uma monção,
mas, ainda assim, chegaram ao desti-
no com dois dias de antecedência.
COMPETIDORA
"Qual é o seu nome?", perguntou a
ela um homem do escritório de nave-
gação em Hong Kong. "Você vai per-
der", afirmou o rapaz. "O quê? Acho
que não. Compensei meu atraso", ela
disse. "Você não está fazendo uma
corrida ao redor do mundo?", quis
saber. "Sim, estou em uma corrida
contra o tempo", retrucou Nellie.
"Tempo? Não acho que seja o
nome dela. A outra mulher vai
ganhar. Partiu daqui há três
dias", disse ojovem. A "outra mu-
lher" era Elizabeth Bisland, que
também partiu de Nova York no dia
14 de novembro. Ela era a desafiante
da revista Cosmopolitan. "Prometi ao
editor que iria dar a volta ao mundo
em 75dias, e se conseguir isso estarei
satisfeita. Não estou competindo com
ninguém. Se alguém quiser fazer a
viagem em menos tempo, que se pre-
ocupe com isso", disse.
Para piorar, ela ainda teria de ficar
parada por cinco dias na China. Do
continente para Yokohama, no Japão,
tudo foi rápido e tranquilo. O mesmo
não pode ser dito dos primeiros dias
no Pacífico. Desembarcou em São
Francisco duas semanas depois.
Nos EUA, Nellie percorreu o país
em um trem fretado pelo jornal para
que completasse a viagem e chegou ao
seu destino, Nova Jersey, em 25 de
janeiro de 1890, quebrando todos os
recordes de circum-navegação. "A
volta ao redor do planeta tornou Nellie
Bly uma celebridade mundial, mas no
geral teve um efeito negativo sobre a
sua carreira como jornalista", afirma
Goodman. Segundo ele, Bly se tornou
muito famosa para continuar a traba-
lhar como repórter infiltrada. Pouco
depois, casada, abandonou ojornalis-
mo. A aposentadoria só foi quebrada
no século 20. Nellie
foi a primeira mu-
lher a atuar como
correspondente na
Primeira Guerra
Mundial. !lI:]
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 47
COMPORTAMENTO
RDE
COMO OS SOVIÉTICOS USARAM O HUMOR PARA SUPORTAR
A RIGIDEZ E OS EQuívocos DE SEUS DIRIGENTES
TEXTO Diogo Antonio Rodriguez ILUSTRAÇÕES Guilherme Darezzo
Durante seus mandatoscomo presidente dosEUA, Ronald Reagan ti-nha um jeito peculiar de
encerrar os discursos. Onde estivesse,
a qualquer público, o ex-ator quase que
sempre terminava suas falas com uma
piada. Foi assim em discursos a tra-
balhadores de uma fábrica, na campa-
nha e até na Casa Branca. Sua prefe-
rência era por um tipo especial de
anedota, como esta, contada em 1988:
"Na URSS, um homem vai a uma con-
cessionária comprar um carro e o ven-
dedor diz: 'Tudo bem, em 10 anos você
pode vir pegar seu carro'. 'De manhã
ou àtarde?', o homem responde. 'Que
diferença faz?', pergunta o vendedor.
'O encanador vem de manhã"'.
48 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
Fiel ao tempo histórico que viveu,
o 40° presidente dos EUA gostava de
colecionar piadas sobre o comunismo.
Paul Goble, então funcionário do De-
partamento de Estado, estima ter co-
letado 13mil piadas no período em que
Reagan esteve no poder. Mais do que
tirar sarro de um regime político-
ideológico em estado terminal, o pre-
sidente norte-americano acreditava
que as piadas tinham real poder, pois
desafiavam as rígidas estruturas de
censura da União Soviética. Elas re-
velavam, segundo ele, "o sentimento
do povo a respeito de seu governo".
Qualquer ocasião era oportunidade
para Reagan exibir seu repertório.
Nem o próprio líder da URSS foi pou-
pado. O secretário-geral Mikhail Gor-
bachev teve de ouvir seu colega norte-
americano ironizar a educação de ní-
vel superior soviética durante a assi-
natura de um tratado para eliminar
mísseis nucleares de médio alcance
em Washington, em 1987."Quando os
universitários americanos são ques-
tionados sobre o que querem fazer
depois de se formarem, eles respon-
dem: 'Ainda não sei, não decidi'. Os
russos respondem à mesma questão
dizendo: 'Não sei, não me disseram'."
Os chistes eram criados dentro da
própria União Soviética e mostravam
que, apesar da falta de liberdade de
expressão, os cidadãos que viviam
sob o comunismo não haviam perdi-
do a capacidade de rir e nem a vonta-
de de burlar as leis do país. ••
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 49
COMPORTAMENTO
Ben Lewis, cineasta e historiador
britânico, resolveu investigar a
abrangência e o poder das anekdoty
(piada, em russo). Durante dois anos
viajou a países da antiga Cortina de
Ferro como Hungria, Polônia, Romê-
nia e Rússia para tentar traçar a ori-
gem do humor sob o comunismo.
Lewis queria entender se as piadas,
proibidas, podem ter sido uma das
armas de quem lutava contra o regi-
me totalitário que se instalou na Eu-
ropa Oriental por 72 anos.
COMÉDIA
"O comunismo é o único sistema po-
lítico que criou sua marca interna-
cional de comédia", afirma Lewis.
Todos os dias havia uma nova piada
em circulação, ainda que quem fosse
pego contando-as corresse o risco de
ser preso ou mandado para umgulag,
o campo de trabalhos forçados. So-
ciólogo do humor e professor da Uni-
versidade de Reading, na Inglaterra,
Christie Davies afirma que "o maior
'corpus' de piadas que existem ridi-
cularizando governantes e um siste-
ma político vem da antiga União
Soviética e dos países sob o comunis-
mo na Europa oriental.
Entre os motivos para que o humor
fosse digno de análise está o fato de
que abrangia todos os aspectos da vida
cotidiana. Da compra de pão às deci-
sões dos líderes, tudo virava piada.
"Na URSS, tentavam controlar tudo,
a vida econômica inteira, o dia a dia,
as artes, ciências, cultura", diz Davies.
"Tudo virou política. Havia mais coi-
sas sobre as quais fazer piada porque
havia muitas interferências. Na maior
parte das ditaduras, o cotidiano fica
mais ou menos igual." Não havia
como escapar do controle, então con-
tavam-se piadas: "Milhões de cida-
dãos dos países comunistas conside-
ravam as piadas um ato de rebelião",
diz Ben Lewis. O poder do humor era
visto de tal maneira que "muitas pes-
soas que viveritm no bloco soviético
me disseram que o humor tinha der-
rubado o comunismo", diz ele.
A pesquisa de Lewis se baseou em
cerca de 40 compilações de piadas
lançadas em países ocidentais entre
1950 e 1980. A mais antiga foi publi-
cada em 1951,na Alemanha. No livro,
o autor, Yevgeny Andreevich, argu-
menta que a "piada é a única arma
disponível para aqueles que vivem
sob um regime totalitário". "Por dis-
seminar essas piadas, inúmeras pes-
soas foram presas pela polícia secre-
ta. A sentença usual para contadores
de piadas era de cinco anos."
PUNiÇÕES
Houve dois períodos no universo das
piadas ilegais soviéticas. O primeiro
coincide com os governos de Lenin
(1922 a 1924) e Stalin (1924 a 1953) e
corresponde a uma época de maior
rigidez. Não há dados oficiais, mas
estima-se que a maior parte das pu-
nições por contar piadas (considera-
das 'propaganda anticomunista', por-
tanto um crime) tenha ocorrido du-
rante esses anos. Comparativamente,
havia uma quantidade menor de
piadas circulando. Talvez isso se ex-
plique pelo fato de o regime ser novo.
Tão novo que a realidade ainda não
havia virado motivo de piada. ••
50 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 51
COMPORTAMENTO
52 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
o humor usado para criticar Stalin
era muito parecido com o dos tempos
do czar Nicolau 11, o que indica que
ainda não havia uma crítica direta ao
comunismo. Havia também, claro, o
medo da repressão stalinista, que per-
seguiu seus opositores no que ficou
conhecido como o Grande Terror e
matou e cassou milhões de pessoas.
O segundo período começa após a
morte de Stalin, quando se inicia o
governo de Nikita Khrushchev e vai
até a ruína do socialismo, em 1989. A
censura ainda estavaem vigor e pes-
soas eram presas por fazer 'antipro-
?
paganda', mas era cada vez mais raro
que alguém fosse condenado por pia-
das. Aqui, o humor soviético começa
a se refinar e a fazer pouco das filas
para comprar pão e carne, da má qua-
lidade dos produtos e da falta da liber-
dade de expressão.
O órgiÕ responsável por investi-
gar e prender os piadistas era a
NKV:q, o serviço secreto. Ben Lewis
afirma que em 1933 um número sig-
nificativo de pessoas foi parar na
cadeia por causa das piadas. Estima-
se que 43 686 pessoas foram presas
por violação desse tipo até 1935. Ain-
da não se sabe quantas dessas acu-
sações diziam respeito especifica-
mente a piadas, mas é possível ter a
medida do perigo que se corria.
PIADA OFICIAL
Dizer que as piadas sobre os gover-
nantes, o regime e a vida sob o comu-
nismo eram proibidas não quer dizer,
porém, que os órgãos oficiais da
URSS achassem o humor desimpor-
tante. Entre os anos 1920 e 1950houve
calorosos debates entre os intelectuais
do partido para tentar descobrir como
deveria ser o "riso soviético". Anatoli
Lunacharski, ministro da Educação
e Cultura entre 1917e 1929, publicou
•
em 1920 um texto chamado Nós rire-
mos, onde tenta definir que tipo de
comédia seria apropriada aos novos
tempos: "O riso não é sinal de força,
ele é a própria força. E deve ser cana-
lizado na direção correta".
O humor serviria como instrumen-
to de educação cívica, desde que apro-
vado previamente e distribuído pelo
governo. Criticar não era propriamen-
te um problema. Sergei A. Oushakin,
diretor do Programa de Estudos Rus-
sos e Eurasianos da Universidade de
Princeton (EUA), observa: "Se você
olhar os documentos oficiais de perto,
verá que eles não queriam suprimir
as críticas totalmente, mas definir que
tipo de crítica poderia ser feita".
A finalidade do riso ia além da di-
versão. Ele deveria ajudar a identificar
os problemas do sistema. "Essa crítica
localizada dava a possibilidade de cri-
ticar o sistema social, mas, ao mesmo
tempo, havia espaço para que ele me-
lhorasse. Ao contrário das piadas
clandestinas, que diziam que não ha-
via esperanças", diz Oushakin. A isso
deu-se o nome de "humor positivo".
Oushakin, porém, mostra que o
regime não conseguiu cooptar o hu-
mor. ''A ideia de administrar o riso era
incompatível com seu efeito irruptivo
e perturbador. A arma do humor era
muito refinada para ser controlada",
afirma o pesquisador no artigo Red
Laughter: On Refined Weapons ofSoviet
]esters. Para Christie Davies, é exagero
dizer que piadas tivessem papel polí-
tico tão importante. Segundo ele, ser-
viriam como "termômetro" da situa-
ção. Ben Lewis concorda: "Foram
importantes para manter o espírito
de oposição à URSS vivo. Era só uma
maneira de articular a oposição.
Quando eles começaram a derrubaros regimes, pararam de fazer piadas
e entraram em ação". !l!ll
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 53
VEMABAIXO
o TERREMOTO QUE CHOCOU A EUROPA, REDESENHOU A CAPITAL
PORTUGUESA E TEVE REFLEXOS ATÉ NA INCONFIDÊNCIA MINEIRA
TEXTO Fernando Duarte, de Londres
54 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
Era por volta de 9h40 de. 1° de novembro de 1755.Portugal se orgulhava deser o bastião do catolicis-
mo, e as igrejas da capital estavam
lotadas para a celebração do Dia de
Todos os Santos. Lisboa, com 200
mil habitantes, era a quarta cidade
europeia mais populosa na segunda
metade do século 18.Um quadro que
ajudou a amplificar o impacto da
primeira grande catástrofe natural
moderna: naquela manhã de sol, um
terremoto de força descomunal ar-
rasou a cidade, matando milhares de
pessoas e sacudindo muito mais do
que apenas prédios e palacetes.
De acordo com testemunhas tão
variadas como moradores da cidade
e diplomatas estrangeiros, entrevis-
tados pelas autoridades portuguesas,
os tremores duraram de3a 6minutos.
Com epicentro no Oceano Atlântico,
cerca de200 km ao sul do arquipélago
de São Vicente, o terremoto atingiu
também oMarrocos e a Argélia, e foi
sentido em outros países da Europa,
incluindo a Inglaterra, com relatos de
um tsunami que atingiu a costa da
Cornualha. Outras cidades portugue-
sas sofreram graves danos. Mas ne-
nhum lugar foi tão devastado quanto
Lisboa: o número de mortos é calcu-
lado entre 10mil e70mil pessoas, e se
estima que 85%dos prédios, incluindo
marcos públicos, comooPalácio Real
e igrejas, cheias de fiéis por causa do
feriado santo, foram abaixo.
A tragédia foimaior ainda porque
muitos habitantes de Lisboa corre-
ram para a beira do Rio Tejo com a
intenção de fugir dos desabamentos
e dos incêndios que se alastravam
pela capital. A região, porém, foiatin-
gida por uma série de tsunamis ge-
rados em decorrência do terremoto.
As ondas destruíram o porto e toda
a parte baixa da cidade. O que não
caiu ou ardeu em chamas acabou car-
regado pelas águas - um desastre até
então inédito na Europa moderna .••
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 55
TRAGÉDIA r--
) ,
I
Era feriado relig\oso e as igrejas
estavam lotada . A maioria ruiu
~~~~~L-~ -eem-e-t-remo . ô·b-a~d
Alfama, onde ficavam as
prostitutas, escapou ileso
IMAGINÁRIO
Se provocou consternação de sobra
em Portugal, a tragédia também im-
pressionou vizinhos europeus. O
terremoto de Lisboa foi a primeira e
até agora maior catástrofe natural
europeia devidamente registrada.
Ocorreu num período em que a co-
municação e a preservação da memó-
ria tinham avançado no continente,
tanto que centenas de gravuras e
imagens da tragédia foram confec-
cionadas em Portugal e no exterior.
"O terremoto teve um impacto .no
imaginário popular que pode ser
comparado com o horror provocado
pelo 11de Setembro de 2001. Foi um
evento que chocou o mundo da épo-
ca. Já vi até comparações com a Bom-
ba de Hiroshima. A repercussão foi
imensa pela magnitude da destrui-
ção", diz o historiador inglês Edward
Paice, autor de A Ira de Deus, uma
reconstituição do terremoto.
Era uma época turbulenta no que
diz respeito ao relacionamento entre
homem e Igreja. E a data da catástro-
fe não poderia ter sido mais sugesti-
va. O fato de Lisboa ter sido arrasada
,num dia santo não passou desperce-
bido pelos dois lados do debate. Teó-
logos se apressaram em enxergar um
castigo divino. Os iluministas tive-
ram no acontecimento um trunfo em
seus argumentos em prol da razão
sobre a fé. A hipótese de castigo divi-
no teve respaldo num país devoto
como Portugal, embora a ironia de
que o distrito de Alfama, onde ficava
a zona do meretrício em Lisboa, re-
sistiu ao terremoto por estar na parte
mais alta da cidade, também tenha
sido notada, assim como o fato de que
quase 90% das igrejas lisboetas e pelo
menos 80% de conventos e mosteiros
terem sido reduzidos a escombros.
Sebastião José
de Carvalho e
Meio, o Marquês
de Pombal: um
"case" de
reconstrução
urbana no
século 18
A tragédia levou a um questiona-
mento da vontade divina. O filósofo
francês Voltaire mencionou o sismo
em seu seminal livro Cândido, atacan-
do a noção de que "Deus sabe o que
faz". Seu colega e compatriota jean-
jacques Rousseau viu confirmada sua
teoria de que a vida nas cidades era
nociva ao ser humano - a aglomeração
urbana em Lisboa teria contribuído
para um maior número de mortes. Na
Alemanha, Immanuel Kant foi uma
das primeiras vozes a buscar uma ex-
plicação natural para o catac1isma.
A geologia era uma ciência nova
no século 18 - estudos da época afir-
mavam que a Terra tinha 75mil anos
- e o terremoto ofereceu uma oportu-
nidade preciosa de estudos, um em-
purrão para a criação da sismologia.
Uma iniciativa crucial veio na res-
posta das autoridades portuguesas à
destruição. Lisboa e Portugal ficaram
de joelhos após a catástrofe, os escom-
bros do Palácio Real servindo de sím-
bolo. O rei José I e sua família esca-
param da tragédia por estarem fora
da cidade, mas viveram como refu-
giados comuns nas colinas da Ajuda
- o soberano ficou traumatizado e se
recusou a dormir sob um teto. Portu-
gal só não ficou acéfalo porque o
primeiro-ministro Sebastião de Melo
chamou a responsabilidade para si.
Mais conhecido por seu título de no-
breza, o Marquês de Pombal coman-
dou esforços de reconstrução impres-
sionantes mesmo nos dias de hoje. A
começar pela determinação em mos-
trar a mão forte do Estado. ••
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 57
·,,
TRAGÉDIA
GS 100MAIORES DA HISTÓRIA
os TREMORES MAIS LETAIS DA HUMANIDADE-MATARAM MAIS DE 2 MILHÕES DE PESSOAS
!
SHENSI(CHINA) 23 de janeiro de 1556
CALCU,A (INOIA) 11 de outubro de 1737
TANGSHAN(CHINA)27 de julho de 1976
r-t__ ~_K;.;.;A.;,;.N=S;;;JJ.I{CHINA)16 de dezembrO-d!!el1~92~OL••• ÍI.(j2:Q100º-mmllil.mmI-º.Ortlto!!.!!J_-_J -----------,----f-\
KWANTO(JAPÃO) 1° de setembro de 1923
.HumulnUliup
143 mil mortos
MESSINA (ITALlA) 28 de dezembro de 1908 120 mil mortos..•
CHIHLI (CHINA) 27 de setembro de 1290 _ 100 mil mortos
SHEMAKHA(AZERBAIJÃO)novembro de 1667 _ 80 mil mortos
----o
LISBOA(PORTUGAL)1° de novembro de 1755 _70 mil mortos
YUNGAY(PERU)31 de maio de 1970 _66 mil mortos
• SUSPEITA-SE aUE o NÚMERO DE
MORTOS SEJA MUITO MAIOR aUE O
-DIVULGADO PELO-GOVERNO-CHIN~S_ -
ESTIMA-SE QUE O TOTAL DE ViTIMAS
CHEGOU A 650 MIL
FONTE: EARTHOUAKES, BRUCE A. BOLT
58 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
LEI MARCIAL
"Reis não se envolviam na adminis-
tração, e as circunstâncias deixaram
Pombal ainda mais poderoso. Ele era
autoritário, mas é difícil não ter res-
peito pelo que fez para tentar trazer
Portugal de volta à normalidade", diz
Paice. Pombal convocou batalhões
para ajudar no combate aos incêndios
e no resgate das vítimas e impôs Lei
Marcial para conter saqueadores.
Contrariando a doutrina católica, or-
denou que cadáveres fossem recolhi-
dos depressa para evitar doenças e
atirados ao mar.
Em 4 de dezembro de 1755, pouco
mais de um mês depois
da catástrofe, o enge-
nheiro-chefe da corte,
Manuel da Maia, já apre-
sentava os planos de re-
construção. Eram cinco
alternativas, do abando-
no da cidade a uma re-
forma completa. Pombal
aprovou a quarta opção,
que propunha um radi-
cal redesenho da Parte
Baixa da capital.
Lisboa ganhou padro-
nização na construção de
casas e edifícios, nos as-
pectos estético e estrutural: uma tra-
ma de vigas de madeira conhecida
como "gaiola pombalina", para me-
lhor resistir a sismos, e mais espaça-
mento entre edificações para preve-
nir incêndios. Para testar a seguran-
ça dos prédios, Pombal criou um
"simulador de terremotos" - tropas
marchavam ao redor das edificações,
criando pequenos temores.
Dos escombros, surgiu a Baixa
Pombalina. Seus 236 mil m- viraram
um dos mais estudados casos de pro-
jetos urbanísticos de larga escala no
mundo. Pombal também tomou a
decisãode fazer um censo da tragédia:
questionários foram enviados a todas
as paróquias pedindo informações
sobre o terremoto. Além de detalhes
como rachaduras e intensidade dos
tremores, o questionário de Pombal
pedia observações sobre o comporta-
mento de animais e mesmo sobre re-
duções de volume d'água em poços.
Tais informações deram a cientistas
subsídios para reconstituir os eventos
geológicos de 1°de novembro, incluin-
do estimativas da intensidade do tre-
mor - estima-se que o terremoto de
Lisboa de 1755tenha atingido de 8,5 a
9 graus na Escala Richter.
Nenhuma surpresa, então, que as
autoridades portuguesas tenham
olhado para suas colônias na hora de
pagar a conta. Especialmente a mais
rica delas: o Brasil foi visto como tá-
bua de salvação. Pombal aumentou os
já rigorosos impostos sobre o ouro
brasileiro vindo de Minas Gerais,
acirrando o sentimento antiportuguês
na região que anos mais tarde abriga-
ria o primeiro grande movimento
pró-emancipação do Brasil, a Incon-
fidência Mineira.
A catástrofe aumentou a dependên-
cia econômica de Portugal junto à In-
glaterra, por mais que Pombal tivesse
tentado fomentar o desen-
volvimento econômico do
país, que vivia da explo-
ração das colônias e com-
prava tudo dos ingleses.
Hoje, Pombal é lembrado
com uma coluna e uma
estátua no centro da capi-
tal, mas caiu em desgraça
após a morte de domJosé
I, em 1777.Destituído pela
sucessora, Maria I, viveu
no ostracismo até sua
morte, em 1782.
Nos últimos anos, o
terremoto voltou a ser
lembrado, com a publicação de um
polêmico documento do Instituto Eu-
ropeu de Estudos Marinhos. Pesqui-
sadores detectaram atividades tectô-
nicas na região e sugeriram que um
novo grande tremor poderá atingir
Portugal. Mas dificilmente terá tanto
impacto nos rumos da história como
o sismo de 1755,que
mudou um país e
um continente. E
que tem nas ruínas
do Convento do Car-
mo, no Rossio, uma
rara lembrança. ~
Pombal coordenou os esforços
mesmo num momento em que Portu-
gal tinha os bolsos vazios. Segundo o
historiador e economista português
Álvaro Pereira, a tragédia causou pre-
juízos da ordem de 48% do PIE da
época. ''A economia viveu uma fase de
depressão entre 1750 e 1770 e obvia-
mente a catástrofe não ajudou. Por
outro lado, houve consequências po-
sitivas: o esforço de reconstrução rea-
queceu setores da economia, como a
construção civil", explica José Luís
Cardoso, do Instituto Superior de Eco-
nomia e Gestão, em Lisboa.
AVENTURAS NA HISTÚRIA I 59
· ,
oMILITA~TE E
O MILIONARIO
PERSONAGENS DOS ANOS DE CHUMBO LANÇAM AUTOBIOGRAFIAS
Doisenvolvidos com a esquer-da armada, perseguidos eexilados durante a ditadura
militar, estão lançando suas autobio-
grafias. Os personagens, no entanto,
não poderiam ser mais díspares.
O pernambucano Cid Benjamin
era estudante de engenharia na Uni-
versidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) e líder estudantil quando, em
1968, filiou-se ao Movimento Revo-
lucionário 8 de Outubro (MR-8). Aos
•••• 20 anos, tornou-se uma das figuras
60 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
mais importantes da organização.
Por 15 meses, participou de ações
urbanas armadas, inclusive o se-
questro do embaixador dos EUA
Charles Elbrick. Cid foi preso e bru-
talmente torturado, em abril de 1970,
e solto como resgate de outro embai-
xador, o alemão Ehrenfried von Hol-
leben. Em seu exílio, recebeu treina-
mento militar em Cuba e pretendia
ingressar clandestinamente no Bra-
sil pelo Chile, em 1972, para retomar
as ações de guerrilha. Foi surpreen-
dido por outros guerrilheiros indo na
contramão, a caminho do Chile fugi-
dos do Brasil, onde a ditadura havia
conseguido sufocar completamente
a esquerda armada. No ano seguinte,
teve outra surpresa ingrata no golpe
de Augusto Pinochet contra o presi-
dente Salvador Allende, e acabou
exilado dentro do exílio. Lançado
agora, décadas depois, seu livro é um
contraponto interessante a O Que é
Isso, Companheiro?, de seu colega de
MR-8 Fernando Gabeira. Cid consi-
dera que houve muitos erros estraté-
gicos na ação da esquerda, mas seu
livro não é uma crítica das ideias e
cultura dos guerrilheiros. Cid não se
arrependeu, e ainda se considera so-
cialista. É membro fundador do
PSOL. Atuando como jornalista in-
vestigativo desde sua volta, apresen-
ta um retrato objetivo e al,go frio e
implacável da época. Cid também faz
críticas duras às gerações anteriores
da esquerda, na figura de Luís Carlos
Prestes, e ao governo do PT, partido
que também ajudou a fundar.
O publicitário paulista Carlos
Knapp começa suas memórias sobre
a ditadura militar com a frase "Te-
nho uma sorte espantosa". E seu re-
lato mostra isso. Nos anos 60, sua
agência publicitária, a Oficina da
Propaganda, tornou-se uma das
maiores de São Paulo. Sem qualquer
convicção política, por desgosto com
o cerco às liberdades pessoais do Ato
Institucional g, decidiu oferecer seus
serviços aos membros da Aliança
Nacional Libertadora (ANL).
Knapp dirigiu seu Mercedes im-
portado em ações de guerrilha urba-
na e hospedou o líder Carlos Mari-
ghella. Acabou se dando conta de que
sua riqueza e contatos não serviam
como proteção quando, num super-
mercado, seu filho pequeno o reco-
I GRACIAS A LA VIDA
Num reflexo, apliquei-lhe
um golpe de judô. Sou
faixa preta e tinha sido
campeão brasileiro juvenil
(...). Meu oponente, que
depois soube ser o major
Moacir Fontenelle, voou
por cima de mim e
desabou no balcão da
padaria, estilhaçando
vidro por todo lado. Ato
contínuo, surgiram entre
15 e 20 sujeitos, a maioria
com fuzis, e começou uma
briga que durou vários
minutos. A padaria ficou
inteiramente destruída.
MINHA VIDA DE TERRORISTA
Jonas e outro companheiro
embarcaram no meu carro e
mandaram que eu seguisse
para a Vila Prudente. Iam
loquazes, excitados, colocando
balas nos seus revólveres e
armando as bombas. Eu ia
apreensivo, a atividade deles
podia ser facilmente notada
pelos passageiros dos ônibus
que eram ultrapassados.
O que iríamos fazer,
exatamente: atirar bombas
contra uma delegacia de
polícia? De dentro de meu
carro importado, sem
dissimular a chapa?
nheceu num anúncio de "terroristas
procurados". E aí sua sorte se fez va-
ler: conseguiu fugir do Brasil e passou
a viver na Europa, ignorando as or-
dens dos companheiros para ir à
Cuba receber treinamento. De volta
ao Brasil, anos depois, Knapp reto-
mou o trabalho como publicitário, e
mais tarde, participou da área de co-
municação dos governos FHC e Lula.
Relatos tão distintos, ambos honestos
e informativos, são uma oportunida-
de para perceber a diversidade entre
as pessoas que se engajaram na luta
violenta contra o regime autoritário.
Veja acima um contraste.
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 61
PACTO COM O CRIME
Em 1989, o empresário e militar da
reserva Jorge Salcedo recebeu uma
proposta que não podia recusar: o
Cartel de Cali queria sua ajuda para
armar uma operação de assassinato
contra Pablo Escobar. Ao aceitar a
proposta, ele tinha mais que medo ou
dinheiro em mente: ameaçado pelo
governo da Colômbia, Escobar havia
recorrido a ações terroristas,
tornando-se o inimigo público número
1 do país. A ação foi um fracasso, e o
pacto com o que Salcedo julgava ser
o mal menor logo cobrou seu preço:
a contragosto, tornou-se um membro
pleno do cartel, que se tornaria a
maior organização criminosa da
história. Confrontado com uma ordem
para cometer assassinato, decidiu
saltar do barco se aliando a agentes
norte-americanos, o que culminaria
com a destruição da organização, em
1998. Esse thriller policial verídico é
narrado agilmente em À Mesa com
o Diabo, do repórter investigativo
norte-americano William C. Rempel.
62 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
CRIADORES
DO
SÉCULO 20
AFUNDAÇAoDASNAÇÓES
MAIS IMPORTANTES DA
HISTÓRIA RECENTE
Adécada de 1860 é lembradapela Guerra Civil America-na, em meio à qual Abra-
hamLincoln libertou os escravos (e,
no Brasil, pela Guerra do Paraguai).
Mas havia muito mais atividades no
mundo. Em 1861, o czar Alexandre
II aboliu a servidão na Rússia, abrin-
do caminho para o desenvolvimento
industrial do país, evitando que
caísse na mais completa irrelevân-
da. No ano seguinte, Otto von Bis-
marck tornou-se primeiro-ministro
da Prússia, iniciando o processo
de unificação da Alemanha, que
criaria o primeiro estado de bem-
estar social moderno, a superpo-
tência que estaria no lado errado
de duas guerras mundiais,
Em Forja de Impérios, o acadê-
mico Michael Knox Beran traz
um paralelo entre esses três per-
sonagens fundadores - ou revo-
lucionários, como ele afirma - das
potências que definiriam grande
parte da história do século 20_ A
comparação mais fácil é entre
Lincoln e Alexandre: ambos li-
bertaram milhões de seres huma-
nos de instituições arcaicas e in-
justas. Bismarck também enfren-
tou a herança do passado, na
forma do feudalismo de inúmeros
pequenos principados que domi-
navam territórios alemães, e o
presidente tornado imperador
Napoleão Ill - o quarto persona-
gem principal, não mencionado
no título, que tentou resgatar as
ambições imperialistas de seu tio,
Napoleão Bonaparte.
.Mesmo com essa proposta de
paralelismo, os países que nasce-
riam dessas revoluções são com-
pletamente díspares, o que se
torna claro no livro, e assim tam-
bém são seus personagens. Lin-
coln encarnava a simplicidade
igualitária republicana, com um
estilo tão despojado que lhe ren-
dia críticas no próprio país. Ale-
xandre era um filho da pompa e
solenidade de uma casa real ab-
solutista. E Bismarck, um nobre
construindo uma nação indus-..
trial moderna, mas fortemente
aristocrática e autoritária.
HOMO MACHO
BRASILIENSIS
Organizada pelas historiadoras Mary dei Priore e Márcia
Amantino, a coletânea História dos Homens no Brasil
aborda um pouco de tudo sobre a construção da identidade
do macho nacional. Entre outros temas, os ensaios
tratam de moda e vaidade masculina na era colonial,
as ideias de masculinidade vindas da África, a
situação histórica dos homossexuais, o surpreendente
conservadorismo sexual da
juventude revolucionária dos anos
60 e a ascensão do Brasil como um
dos pioneiros mundiais do MMA
(mixed martial arts, o "vale-tudo").
~ ;
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 63
LEITURA
PARA SENHORAS
AINDA ANTES DA INDEPENDÊNCIA, ESCOLAS PARA
MENINAS DA ELITE SE MULTIPLICARAM NO BRASIL
Noséculo 19, a precariedadedos centros de educação, ainstrução primária de curta
duração e má qualidade e o estado de
ignorância em que as mulheres eram
mantidas foram alvo de críticas de
viajantes estrangeiros, vindos de pa-
íses onde as diferenças de educação
entre os gêneros quase não existia
64 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
mais. A ênfase na vida doméstica e o
escravismo só faziam agravar o "rit-
mo lento e pouco imaginativo no qual
se desenrolava a vida das senhoras
no Brasil". O inglês John Mawe, por
exemplo, nelas acusava a falta de
educação e de recursos de ~spÍrito
além dos conhecimentos superficiais.
Segundo o observador, ocupavam-se
de trabalhos leves que nada tinham
a ver com o que se aprendia na esco-
la. Ao contrário, a instrução poderia
colocar em risco o esquema de con-
trole sobre esposas e filhas cujo ape-
tite intelectual deixava a desejar; não
deveriam dedicar-se à leitura, nem
precisavam escrever porque "pode-
riam fazer mal uso da arte".
No século 19, as brasileiras de
elite estavam alfabetizadas e um
novo mercado surgiu para
atendê-Ias. O período coincide
com a popularização das
novelas, anunciadas em jornais
"Poucas mulheres podem ler", ano-
tava o comerciante inglês Thomas
Lindley. Elizabeth Agassiz confirmou
que, na Amazônia, elas deixavam es-
coar uma existência fanada, "sem li-
vros, nem cultura de qualquer espé-
cie". Um naturalista americano, Her-
bert H. Smith, anotou que, na segunda
metade do século 19, pais sensatos
reclamavam da falta de educação das
filhas, Tais críticas, con-
tudo, não elucidam se
nossas avós já sabiam
ler ou não. É provável
que não tivessem um
padrão de educação
ideal, tal como já existia
na Europa ou nos EUA,
com múltiplas discipli-
nas e sem diferenças
quanto à educação que
era dada aos homens.
Mas nada as impedia
de saber ler. As escolas para meninas
de elite começavam a multiplicar-se.
Em 1814,anúncios na Gazeta do Rio de
Janeiro indicavam a presença de pro-
fessores particulares que as ensina-
vam a "ler, escrever e contar". De pas-
sagem por Recife, o francês Louis-
François Tollenare observou que os
preconceitos sobre a educação femini-
na começavam a diminuir. Abertas
para as influências europeias -leia-se,
as modas e os modismos -, as jovens
educadas por freiras não se contenta-
vam mais em aprender só "a costurar
e a ler". No Rio de Janeiro, livros eram
oferecidos em lojas nas quais, também,
comercializavam-se quinquilharias:
cartas de jogar, cera da Índia, tinta de
escrever, estampas e desenhos, lustres,
encerados e tapetes, vidros da Boêmia,
imagens sacras e móveis europeus.
Eram livros de pintura, de viagens,
atlas, dicionários históricos, geográfi-
cos e mitológicos junto com xales, le-
ques e objetos de prata.
A Gazeta do Rio dejaneiro anuncia-
va um produto irresistível: leitoras
interessadas em magia poderiam
achar livros sobre a matéria "na loja
da Gazeta". Entre outros, a Defesa de
Cecília Faragó, acusada de feiticeira,
por 1$280, o Breve Tratado sobre as
Ações do Demônio, por 1$280, aHistória
das Imaginações Extravagantes de Ouj1e,
do mago francês, por 2$400.
De passagem pelo Brasil em 1822,
a inglesa Maria Graham pôde travar
contato com essas discretas leitoras.
Uma delas, a jovem dona Carlota, filha
do poderoso Brás Carneiro Leão e de
Ana Francisca Maciel da Costa, baro-
nesa de São Salvador de Campos de
Goitacazes, especial por "seu talento e
cultura acima de suas companheiras",
levou a viajante a conhecer a bibliote-
ca do desembargador da Relação do
Rio de Janeiro, composta de livros de
direito, história e literatura, principal-
mente inglesa e francesa. Outras mu-
lheres que lhe chamaram atenção fo-
ram a esposa do ministro da Fazenda
Manuel Jacinto, "tbe most pleasant wo-
man", e a Marquesa de Aguiar, consi-
derada "bem-educada para uma por-
tuguesa". A biblioteca de
José Bonifácio, "provida
de livros em todas as lín-
guas", impressionou-a
vivamente, e com a impe-
ratriz Leopoldina, no dia
dos anos de dom Pedro,
diz ter conversado "um
bom pedaço sobre auto-
res ingleses e especial-
mente acerca das novelas
escocesas". As mulheres
da família imperial liam
e gostavam de livros. A jovem dona
Francisca, em viagem à França em
companhia de seu recém-esposo, o
príncipe dejoinville, deliciava-se com
as aventuras de dom Quixote.
As novelas eram o grande sucesso:
novelas de "grande merecimento",
"acabadas de sair à luz", "mui galantes
e divertidas" eram anunciadas por
catálogos ou em jornais. Narradas por
autores na sua grande maioria anôni-
mos, nelas cruzavam-se "histórias"
variadas, sicilianas, inglesas, turcas,
napolitanas, de ilustres aventureiros
ou misteriosos desconhecidos.
Por MARV DEL PRIORE
Doutora em história social com pós-doutorado na École des Hautes Études en Sciences Sociales.
vencedora do Prêmio Jabuti e autora de Histórias Intimes - Sexualidade e Erotismo na História do Brasil.
AVENTURAS NA HISTÓRIA I 65
-ULYSSES CONTRA OS CAES
OPOSICIONISTA QUASE FOI ATACADO NA BAHIA
Em13 de maio de 1978, ErnestoGeisel estava no comando daditadura militar. O deputado
Ulysses Guimarães, presidente do
MDB, o partido da oposição, viajou a
Salvador para lançar a candidatura
do correligionário Rômulo Almeida
ao Senado. A Bahia era o feudo polí-
tico de Antonio Carlos Magalhães, da
governista Arena. O governador era
seu afilhado Roberto Santos.
Havia um comíciomarcado para as
20 h na Praça Dois de Julho, mas 400
soldados cercaram o local e ameaça-
66 I AVENTURAS NA HISTÓRIA
ram Ulysses e sua comitiva com armas
e cachorros. O deputado deu um che-
ga pra lá nos policiais, cruzou o cordão
de isolamento e fez um discurso para
uma audiência de PMs. "Soldados da
'minha pátria", bradou, empapado de
suor, a camisa rasgada pela truculên-
cia oficial. "Enquanto ouvíamos as
vozes livres que aqui se pronuncia-
ram, ouvíamos o ladrar dos cães lá
fora!", prosseguiu Ulysses. "O ladrar,
essa manifestação zoológica, é do ar-
bítrio, do autoritarismo que havere-
mos de vencer. Meus amigos, foi uma
violência estúpida, inútil e imbecil.
Saibam que baioneta não é voto e ca-
chorro não é urna."
O destino dos personagens: Ulys-
ses, presidente da Câmara, foi o patro-
no da Constituição de 1988, ainda em
vigor. Roberto Santos foi antecedido e
sucedido por ACM no governo da
Bahia. Rômulo Almeida acabou der-
rotado na disputa ao Senado. Todos
tiveram um destino comum no gover-
no de José Sarney, o primeiro pós-di-
tadura: ACM e Santos foram minis-
tros. Almeida, diretor do BNDES.
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