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Direito Processual Tributário Brasileiro TÍTULO III - PROCESSO JUDICIAL TRIBUTÁRIO 11. AÇÕES ORDINÁRIAS EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA 11. AÇÕES ORDINÁRIAS EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA SUMÁRIO: 1. Noções introdutórias. 2. Ação declaratória em matéria tributária. a. Conceito. b. Autotutela do ente tributante e impossibilidade de utilização da ação declaratória pela Fazenda Pública. c. Declaratividade positiva e declaratividade negativa. d. Eficácia da sentença declaratória. e. “Efeito dúplice” da ação declaratória tributária. f. Declaração de mero fato – inadmissibilidade. g. Sentença declaratória e “lei em tese”. h. Interesse de agir na declaratória- fiscal (condição da ação). i. Ação declaratória incidental. j. Antecipação de tutela na ação declaratória. k. Suspensão da exigibilidade do tributo na ação declaratória. l. Depósito na ação declaratória. m. Compatibilidade entre medida cautelar e ação declaratória. n. Ação declaratória de imunidade tributária. o. Ação declaratória (positiva) de créditos tributários escriturais. p. Ação declaratória de compensação. q. Execução fiscal e ação declaratória. 3. Ação anulatória em matéria tributária. a. Conceito. b. Críticas ao nomen iuris. c. Antiexacional imprópria de rito ordinário. d. Natureza constitutivo-negativa. e. Ação anulatória e o depósito preparatório. f. Anulatória e declaratória fiscal – distinção. g. Anulatória e declaratória negativa – cumulação. h. Ação anulatória e execução fiscal. i. Ação anulatória e embargos do devedor: litispendência. 4. A ação condenatória de repetição de indébito. a. Conceito. b. Objeto e causa de pedir. c. Fundamentos constitucionais e infraconstitucionais. d. Repetição de indébito e compensação. e. O prazo prescricional para o pedido de restituição ou repetição do indébito e a “norma interpretativa” da LC 118/2005. f. Legitimidade ativa para a ação de repetição de indébito e a retenção de tributos. g. A legitimatio ad causam fracionada. 5. Os Juizados Especiais Federais (Lei 10.259/2001) e processo tributário. 6. As Microrreformas do Código de Processo Civil, o CPC/2015 e o processo tributário. 7. As Prerrogativas e as Particularidades da Fazenda Pública em Juízo (o CPC e a Lei 10.522/2002). a. Prerrogativas ou “privilégios processuais” da Fazenda Pública. b. Antecipação de honorários e despesas de auxiliares de justiça. c. A “economia recursal” na Lei 10.522/2002. c.1. Dever de não recorrer e efeito persuasivo das decisões judiciais. d. Outras particularidades da atuação fazendária em juízo. 8. Ação de Consignação em Pagamento do Crédito Tributário. a. A consignação judicial do crédito tributário no CTN. a.1. Limitações materiais. a.2. Efeitos do depósito de tributos. a.3. Depósito integral, depósito insuficiente e depósito a maior. b. A ação de consignação em pagamento no CPC. b.1. A impossibilidade da consignação bancária. b.2. Relações jurídicas tributárias continuativas e consignatórias. b.3. A consignação em face da “incerteza subjetiva”. b.4. O rito especial da consignatória proposta por dúvida subjetiva. b.5. A conversão da consignatória em procedimento ordinário e a assistência litisconsorcial do contribuinte. c. O IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano e a consignatória. d. O ISS – Imposto sobre Serviços e a consignatória. d.1. O local da prestação de serviços. d.2. O ISS e a LC 116, de 31.07.2003. d.3. O ICMS, o ISS e a incerteza subjetiva na tributação dos provedores de Internet. 1. Noções introdutórias As ações ordinárias em matéria tributária são ações antiexacionais impróprias, de rito ordinário, manejadas pelo contribuinte com o escopo de obter tutela jurisdicional de controle da atividade fiscal (relação tributária entre Estado e cidadão-contribuinte) através de sentença de conteúdo declaratório (positivo ou negativo), anulatório (constitutivo negativo) ou condenatório em face da Fazenda Pública da União, dos Estados, dos Municípios, do Distrito Federal ou de quaisquer outros entes que exerçam atividade parafiscal. Examinadas sob o esquema geral de declaratórias, constitutivas ou condenatórias, seguem, em geral, o regime jurídico das ações concebido no bojo do direito processual civil.1-2 Apresentam-se como meios para provocar o processo judicial de conhecimento da matéria tributária litigiosa; são meios de invocação pelo contribuinte da tutela jurisdicional do Estado que se assentam no terreno das ações antiexacionais impróprias. São ações tributárias impróprias por estarem submetidas ao regime jurídico geral de processo civil e carecerem de disciplina legal própria de direito processual tributário, isto é, carecem as ações ordinárias em matéria tributária no Brasil de regime jurídico-processual específico para o trato das lides tributárias e por isso assumem o rito processual das ações ordinárias previsto no CPC/1973, arts. 282 e seguintes e art. 319 do CPC/2015.3 Ações ordinárias em matéria tributária | 457 São ações tributárias antiexacionais porque manejadas pelo contribuinte – na qualidade de autor da ação – com o escopo de obter o controle judicial da atividade fiscal do Estado (União, Estados, Municípios ou Distrito Federal) ou de entes que realizem atividades parafiscais (como, por exemplo, foi o INSS – Instituto Nacional do Seguro Social no âmbito de sua atividade de cobrança das contribuições parafiscais). São subjetivamente antiexacionais porque têm sempre o contribuinte no polo ativo e a Fazenda Pública no polo passivo e são objetivamente antiexacionais porque seus pedidos sempre conterão pretensão declaratória, anulatória ou condenatória que impliquem controle das relações tributárias entre Estado e cidadão-contribuinte. São as seguintes, a modo genérico, as espécies de ações ordinárias em matéria tributária: i) ação declaratória positiva em matéria tributária; ii) ação declaratória negativa em matéria tributária; iii) ação anulatória de ato impositivo; iv) ação condenatória de repetição de indébito. As espécies de ações ordinárias acima destacadas comportam variada gama de cumulações4 ou mesmo de especificidades, como: i) ação declaratória (positiva) de créditos tributários escriturais; ii) ação declaratória (negativa) de inexistência de relação jurídica tributária (ou inexistência de obrigação tributária); iii) ação declaratória (negativa) de ilegalidade ou inconstitucionalidade de norma tributária (inexistência de relação jurídica) cumulada com pedido de repetição de indébito (condenatória); iv) ação anulatória de lançamento (constitutiva negativa) cumulada com pedido de repetição de indébito (condenatória); v) ação anulatória de lançamento (constitutiva negativa) cumulada com pedido de condenação em perdas e danos; vi) ação declaratória de tributação indevida (negativa) cumulada com declaratória do direito de compensação (declaratória positiva); vii) ação revisional de parcelamento tributário (com pedidos declaratórios positivos e negativos) etc. Interessa-nos, por ora, as peculiaridades inerentes ao regime jurídico da ação declaratória quando aplicado às lides em matéria tributária. 2. Ação declaratória em matéria tributária a. Conceito. Pode-se definir a ação declaratória em matéria tributária como a ação antiexacional imprópria, de rito ordinário,5 aforada pelo contribuinte em face da Fazenda Pública ou em face de ente que exerça funções parafiscais, com a finalidade de ver reconhecida judicialmente (declarada) a existência, a forma (declaração positiva) ou a inexistência (declaração negativa) de determinado vínculo jurídico obrigacional de caráter tributário com o escopo de promover o acertamento da relação fiscal manchada pela incerteza.6-7 b. Autotutela do ente tributante e impossibilidade de utilização da ação declaratória pela Fazenda Pública. Somente o contribuinte poderá invocar interesse de agir em promover o acertamento judicial da relação fiscal (é, por isso, ação tipicamente antiexacional), uma vez que a Administração tributáriadetém a prerrogativa de promover a declaração administrativa (princípio da autotutela vinculada do ente tributante) do conteúdo da relação jurídica tributária, por intermédio do ato de lançamento fiscal, que, quando tornado definitivo, torna-se título executivo extrajudicial apto a aparelhar a execução forçada dos bens do contribuinte. Falece então, à Fazenda Pública, interesse de agir no pedido de acertamento judicial em matéria tributária por assistir-lhe a prerrogativa da autotutela declaratória a tornar despicienda a atuação do Poder Judiciário para fins meramente declaratórios. c. Declaratividade positiva e declaratividade negativa. A ação declaratória em matéria fiscal promovida pelo contribuinte com fundamento no art. 4.º, caput, do CPC,8-9pode consistir tanto na declaração positiva como na declaração negativa do conteúdo da relação fiscal manchada pela incerteza. Exemplificativamente, pode a ação declaratória conter pedido consistente no direito ao crédito tributário escritural decorrente de isenção de IPI ou ICMS em etapa anterior do ciclo de produção ou consumo (declaratividade positiva) ou, ainda, pode conter pedido consistente no reconhecimento da inexistência de vínculo tributário em virtude da inconstitucionalidade parcial ou total de norma tributária infraconstitucional (declaratividade negativa), tendo aqui efeitos diversos da ação anulatória de débito fiscal, o que permite até mesmo o ajuizamento conjunto das duas ações.10-11 d. Eficácia da sentença declaratória. As sentenças declaratórias em matéria tributária promanam efeitos palpáveis, especialmente nos casos em que dispensam qualquer providência executória ou mandamental, o que ocorre quando o pedido declaratório positivo se destina a legitimar a conduta do contribuinte na adoção de determinadas práticas contábeis, principalmente com relação ao lançamento de créditos ou de correção monetária em sua escrita fiscal, como nos casos de incerteza sobre a existência ou não do direito à utilização de créditos de ICMS – Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços ou IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados, ou nos casos de incerteza acerca do dies a quo. No tocante à correção monetária, a discussão também poderá versar acerca da ilegalidade de sua aplicação ao débito fiscal exigido pela Fazenda. Nesse caso, a ação declaratória também será cabível, e terá o efeito de impedir que a Fazenda cobre o débito aplicando a correção combatida, o que gera para o Fisco a obrigação de adotar um comportamento omissivo em relação ao direito do contribuinte, qual seja, o de permitir que o contribuinte recolha o quantum debeatur sem a correção exigida.12-13 O STF já se pronunciou no sentido de que “havendo isenção na importação da matéria- prima, há o direito de creditar-se do valor correspondente, na fase da saída do produto industrializado”, explicitando ainda o mesmo Tribunal Excelso, em outro acórdão, que “pacificou-se através do plenário de ambas as Turmas, a orientação no sentido de que é cabível a ação declaratória, para o reconhecimento do direito ao creditamento de ICM devido, se cuidando de matéria-prima importada com isenção”.14 O STJ esposa entendimento no mesmo sentido, divergindo, contudo, no tocante à correção monetária, ao afirmar não ser a ação declaratória meio adequado para o contribuinte discutir o cabimento, ou não, da aplicação de correção monetária de seus créditos.15 Independentemente do mérito da questão, os acórdãos em tela bem ilustram a qualidade dos efeitos da sentença declaratória em matéria tributária, quando se pretende atribuir certeza a procedimento Fisco-contábil da empresa-contribuinte, já que o pronunciamento judicial, mesmo quando se apresente com caráter meramente declaratório, é ato jurisdicional prescritivo, que atribui ao contribuinte o direito subjetivo de se comportar em conformidade com o conteúdo da sentença declaratória.16 O que não se pode pretender é que a Fazenda Pública, mesmo vencida na ação declaratória, seja obrigada a determinado comportamento comissivo (pois semelhante efeito somente seria obtido por intermédio de sentença condenatória ou mandamental), mas a declaratividade da sentença obriga o vencido, no mínimo, a adotar comportamento omissivo, isto é, comportamento omissivo no sentido de tolerar o procedimento do contribuinte que esteja de acordo com o conteúdo da sentença (definição judicial de determinada relação tributária), aceitando como bons os registros fiscais escorados na definição declarativa sentencial. Existem hipóteses como lembra o eminente Ministro José Delgado, nas quais o autor da ação declaratória, se quiser fazer com que a declaração obtida surta efeitos concretos, deve propor nova ação, agora de natureza condenatória.17 Frequentemente, entretanto, a sentença declaratória, valendo como preceito, cria a obrigação para a outra parte de conduzir- se conforme o declarado, como já afirmado anteriormente. Evidentemente em sede de ação declaratória que vise afirmar o direito de compensação tributária (conteúdo declaratório), não poderá o contribuinte receber da Fazenda o que eventualmente pagou a maior (conteúdo condenatório), a não ser que intente ação de repetição de indébito para esse fim, como já decidiu o TRF da 1.ª Região.18 e. “Efeito dúplice” da ação declaratória tributária. Julgado o mérito da ação declaratória desaparece a incerteza sobre a matéria submetida ao Poder Judiciário, mesmo que a ação tenha sido julgada improcedente.19 Proposta pelo contribuinte, v.g., ação declaratória de inexistência de relação jurídica tributária sob o fundamento de inconstitucionalidade de lei majoradora ou instituidora do tributo (hipótese bastante comum na lida forense), três resultados genéricos se apresentam possíveis para a mesma ação: i) sentença de procedência (sentença de mérito, art. 269 do CPC)20 que estabiliza (“acerta”) a relação fiscal declarando inexistente a relação tributária cujo contorno foi objeto do pedido (declaração negativa), tornando indiscutível a inexigibilidade do tributo; ii) sentença de improcedência (sentença de mérito) que estabiliza a relação fiscal declarando existente o vínculo tributário cuja incerteza motivou a propositura da ação (declaração positiva “a contrario sensu”) e tornando indiscutível a exigibilidade do tributo; iii) sentença de extinção do processo sem julgamento do mérito (sentença processual) que não estabiliza a relação jurídica incerta uma vez que não julga a lide posta sub judice e permite a repropositura da ação, ressalvados os casos de perempção (art. 268 do CPC/1973). f. Declaração de mero fato – inadmissibilidade. Doutrina e jurisprudência inadmitem a utilização da ação declaratória para o reconhecimento da existência ou inexistência de mero fato21 (exceptuando-se a declaração de falsidade de documento).22 O objeto da ação declaratória em matéria tributária, portanto, não se pode limitar simplesmente à declaração sobre a inexistência do fato jurídico tributário (ou fato imponível), mas sim à existência ou inexistência da relação jurídica tributária (obrigação tributária) que resulta da ocorrência de certo fato tributariamente tipificado. Inexistindo fato jurídico cujo conceito se enquadre na descrição contida na hipótese de incidência tributária, inexiste, por consequência jurídica, a obrigação tributária, esta sim objeto da declaração positiva ou negativa. Do mesmo modo, em hipótese inversa, declarada a existência do fato imponível declarar-se-á o efeito jurídico correspondente (imputação deôntica), i.e., será objeto da declaratividade contida na sentença a existência da obrigação tributária (relação jurídica tributária de caráter obrigacional). g. Sentença declaratória e “lei em tese”. Na mesma esteira da inadmissibilidade da ação declaratória para declaração de mero fato, também não se admite a utilização da ação declaratória como meio de consulta ou para a interpretação de direito em tese.23Nas províncias do direito processual tributário apresenta-se possível, sem que se cogite tratar-se de mera consulta ou de apreciação de lei em tese – porque, com efeito, disso não se trata –, a discussão de ilegalidade ou de inconstitucionalidade de norma jurídica tributária, de modo a que se declare a inexistência de vínculo tributário obrigacional entre o autor da ação (contribuinte) e a Fazenda Pública. Nesses casos a ilegalidade ou a inconstitucionalidade configuram-se em causa de pedir para o pedido de declaração de inexistência de relação jurídica tributária, isto é, a apreciação da ilegalidade ou da inconstitucionalidade impõe-se como questão prejudicial ao julgamento declaratório sobre a existência ou não da obrigação tributária (declaração da existência ou não da relação jurídica tributária). É fato que nesses casos em que se suscita a apreciação de questão exclusivamente de direito (em que não há a necessidade de comprovar a existência ou não do fato imponível, mas sim a mera exposição do autor às normas tributárias inquinadas de ilegais ou inconstitucionais) é possível a utilização do mandado de segurança para a proteção de direito “in natura”. h. Interesse de agir na declaratória-fiscal (condição da ação). Como condição para a propositura da ação declaratória (condição da ação) o contribuinte, naturalmente, haverá de comprovar seu interesse de agir (ou interesse processual), extraído da conjugação dos requisitos utilidade + necessidade do aforamento da ação. Deverá o contribuinte-autor demonstrar que a incerteza jurídica, que pretende seja superada por meio da sentença declarativa, é fundamentada em situação jurídica concreta24 e não em meras teses tributárias sem visível fio condutor entre a afirmação do direito e a situação fática vivenciada pelo autor.25 Na ação declaratória positiva em matéria tributária o interesse de agir consiste na utilidade e necessidade da declaração de existência de determinada relação jurídica sobre a qual paira a incerteza, e que é descrita na inicial para que seja declarada como existente (v.g., necessidade de declaração – obtenção de certeza jurídica – do direito de lançar créditos de ICMS decorrentes de isenção), servindo como causa eficiente do agir que é a vontade do autor.26 Isto é, descreve-se e comprova-se a situação jurídica (fato e suas consequências) que se pretende ver declarada como certa (existente) de modo a que desapareça a incerteza. Na ação declaratória negativa não há afirmação de existência de relação jurídica, mas apenas a descrição ideal27 do que se pretende seja declarado como inexistente (certeza de inexistência de relação jurídica). A demonstração de seu interesse de agir consistirá na comprovação fática de que em sua atividade particular enquanto pessoa física (v.g., nos casos de IRPF) ou jurídica exercendo atividade comercial (v.g., nos casos de ICMS), industrial (v.g., nos casos de IPI), ou de serviços (v.g., nos casos de ISS), está exposto a efeitos fiscais em sua esfera jurídica como decorrência da errônea qualificação dos fatos jurídicos tributários (ou, a contrario sensu, inexistência de fatos típicos tributários, como, por exemplo, a declaração de que certa atividade – composição gráfica – não está sujeita a IPI, mas apenas a ISS)28 ou da cogente incidência de normas sobre as quais pesa a afirmação de ilegalidade ou inconstitucionalidade (isto é, inexistência de obrigação fundada em norma desconforme ao ordenamento).29 A ação afigura-se útil como meio hábil para superação da situação de incerteza (v.g., inocorrência de fatos típicos tributários ou demonstração do autor de que sua atividade está sujeita à incidência cogente de normas fiscais que afirma estar em desconformidade com o ordenamento) através do reconhecimento judicial da inexistência da relação obrigacional; e necessária para que o contribuinte não remanesça indefinidamente exposto ao pagamento de tributos indevidos ou à espontânea, porém injurídica, inadimplência.30 Em não havendo a demonstração clara de sua exposição às normas tributárias que busca combater, carecerá de interesse de agir na propositura da ação, e o processo deverá ser extinto sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC/1973, ao qual corresponde o art. 485 do CPC/ 2015.31 i. Ação declaratória incidental. Quando se objetiva que a questão prejudicial de mérito seja abrangida pela coisa julgada, pode-se propor ação declaratória incidentemente ao processo principal (declaratório, constitutivo ou condenatório), ampliando-se dessa forma os limites objetivos da coisa julgada (art. 5.º do CPC/1973).32 A declaração incidental pode recair sobre a causa de pedir que se constitua em questão prejudicial – que tenha sido objeto de contestação – como, por exemplo, a declaração do direito à isenção enquanto causa de pedir e a condenação na devolução do tributo pago indevidamente (repetição do indébito). Tal possibilidade, todavia, deixa de existir no CPC/2015, que não mais contempla a ação declaratória incidental. De fato, a ação declaratória incidental foi suprimida do CPC/2015, não mais havendo menção à possibilidade de resolução de questão prejudicial por esta via. Nada obstante art. 503 do CPC/2015, ao fazer referência aos limites da coisa julgada, estabelece o seguinte: “Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida. § 1.º O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se: I – dessa resolução depender o julgamento do mérito; II – a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia; III – o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal. § 2.º A hipótese do § 1.º não se aplica se no processo houver restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial. j. Antecipação de tutela na ação declaratória. Não há óbice à concessão de medida liminar de antecipação de tutela (art. 273 do CPC/1973 ou art. 294 do CPC/2015)33 no âmbito da ação declaratória em matéria tributária, pois mesmo a sentença declaratória comporta a antecipação de seus efeitos práticos. Exemplo típico é aquele em que o contribuinte pede a declaração positiva, por sentença, do seu direito em lançar créditos de ICMS ou de IPI em sua escrita fiscal, solicitando, já na petição inicial, a concessão de medida liminar que permita o lançamento provisório dos créditos sub judice (antecipação parcial dos efeitos práticos da sentença de mérito), desde que demonstre estarem reunidos os requisitos do art. 273 (a modo geral, a prova inequívoca e a verossimilhança, de modo a construir juízo de probabilidade autorizador da antecipação). Mesmo nos casos de declaratória negativa de existência (ou declaratória de inexistência) de relação jurídica tributária com fundamento em ilegalidade ou inconstitucionalidade, pode o contribuinte formular pedido de antecipação de tutela suspensivo da exigibilidade do tributo, antecipando desse modo um dos efeitos práticos da sentença final que declare a inexistência da obrigação tributária que consiste, axiomaticamente, na impossibilidade jurídica de a Fazenda Pública promover qualquer espécie de cobrança respeitante à matéria fiscal decidida. Note-se que o art. 273 do CPC/1973 teve seu § 3.º alterado e os §§ 6.º e 7.º inclusos pela Lei 10.444/2002, que ampliou a possibilidade de efetivação de antecipação de tutela. Nada obstante o fato de o CPC/2015 conferir tratamento diferenciado ao que o CPC/1973 denomina “tutela antecipada” (denominada, no CPC/2015 de tutela provisória), tais alterações, em sua maioria, são concernentes ao procedimento, bem como ao tratamento conjunto das tutelas antecipatória e cautelar. Sua natureza jurídica não se altera no novo diploma legal. Assim, a despeito do fatode haver nomenclatura diversa, não se alteram as conclusões acima expostas, sendo perfeitamente possível seja pleiteada liminarmente a antecipação dos efeitos da sentença na ação declaratória. k. Suspensão da exigibilidade do tributo na ação declaratória. A propositura da ação declaratória, per se, não suspende a exigibilidade do tributo, embora torne litigiosa a matéria tributária submetida à apreciação do Poder Judiciário, de modo que mesmo estando pendente a ação que questiona a existência ou não da obrigação tributária, a Fazenda Pública pode prosseguir com suas providências formalizadoras (apuração e lançamento) ou, já estando lançado o débito, pode aforar a respectiva execução fiscal.34 Com o fito de assegurar a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, pode, o contribuinte-autor, socorrer-se do pedido de antecipação de tutela ou fazer acompanhar a ação, da comprovação de realização do depósito integral do débito (causa de suspensão do crédito tributário, prevista art. 151, II, do CTN).35 l. Depósito na ação declaratória. Com o escopo de suspender a exigibilidade do tributo, é lícito ao contribuinte-autor fazer acompanhar a ação declaratória do depósito correspondente ao montante integral do crédito sub judice.36-37-38 Cumpre ao magistrado, no entanto, admitir o depósito para fins de declará-lo causa suspensiva nos termos do art. 151, II, do CTN, ouvindo para tanto a Fazenda Pública, que deve se pronunciar fundamentadamente sobre o seu montante, devendo este corresponder ao quantum debeatur, sob pena de operar apenas a suspensão parcial da exigibilidade. Não há a necessidade de concessão de “liminar para depósito” ou mesmo de “ação cautelar para depósito” uma vez que o efeito suspensivo decorrerá do depósito em si mesmo e não da medida liminar que é causa suspensiva distinta, prevista no art. 151, V, do CTN, já em conformidade com a LC 104/2001.39 m. Compatibilidade entre medida cautelar e ação declaratória. A ação declaratória, pelo fato de não possuir execução posterior, não está impedida de gerar efeitos concretos, palpáveis. Também pela ação declaratória, há – concretamente – entrega de segurança patrimonial, uma vez que o direito do contribuinte, v.g., de não ser compelido a recolher tributo por ter sido declarada a inexistência de relação jurídica tributária deverá ser respeitado pelo Fisco. Nesses casos, impõe-se à Fazenda Pública o dever de adotar comportamento omissivo em relação ao direito do contribuinte, o que caracteriza caráter mandamental. Justamente aqui reside a segurança patrimonial do direito do contribuinte, buscada por meio de ação declaratória em matéria tributária. Há de se concluir, portanto, pela compatibilidade entre o processo cautelar e a ação declaratória, como inclusive já decidiu o STJ.40-41 n. Ação declaratória de imunidade tributária. Expressivo exemplo da palpabilidade dos efeitos da ação declaratória em matéria tributária é o da ação que se afora com o específico fim de ver reconhecida (declarada) a imunidade tributária do contribuinte (hipótese bastante comum quando se trata de entidades de educação e assistência social sem fins lucrativos). Por se tratar de hipótese de imunidade em que se constata inexistência de relação jurídica tributária em face de preceito constitucional, pode-se utilizar da ação declaratória com o fito de ver declarada a imunidade do autor da ação, obtendo-se como efeito concreto da declaração judicial a certeza de que a Fazenda Pública não poderá cobrar tributos abrangidos pela regra imunizante em virtude da declaração de inexistência de relação jurídica tributária que possa fundamentar pretensão fiscal.42 o. Ação declaratória (positiva) de créditos tributários escriturais. Para os tributos que funcionam sob o regime de créditos escriturais (conta gráfica), como o IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados e o ICMS – Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, é comum a utilização pelo contribuinte de ação declaratória com a finalidade de ver reconhecido seu direito ao lançamento contábil de créditos não reconhecidos pela Fazenda Pública Federal ou Estadual, conforme o caso. O fundamento da demanda consiste na afirmação do direito ao lançamento de tais créditos ou, como também ocorre frequentemente, do direito ao lançamento de correção monetária inadmitida pelo Fisco (denominado de escrituração ou lançamento extemporâneo). Não há necessidade de pedido condenatório, já que, como visto acima, a sentença declaratória tem o condão de legitimar a prática contábil do contribuinte referente aos lançamentos objeto do pedido. Nesse caso, deverá ser observado o regime jurídico administrativo próprio para a restituição, o ressarcimento ou a compensação de tributos (sobre esse tema vide Capítulo 7, item 9). p. Ação declaratória de compensação. Outra modalidade bastante utilizada de ação declaratória tem por objeto o reconhecimento (declaração) do direito à compensação de indébitos tributários como débitos vencidos ou vincendos do contribuinte. Esta ação tem fundamento material no art. 66 da Lei 8.383/1991 (com as alterações da Lei 9.069, de 29.05.1995) que autoriza ao contribuinte a efetuar a compensação nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos, contribuições federais, inclusive previdenciárias, e receitas patrimoniais, mesmo quando resultante de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.43 Diversos aspectos da regulamentação e aplicação desse dispositivo, como, por exemplo, quais os pagamentos que são considerados indevidos, quais os tributos que podem ser tidos como de mesma espécie para fins de compensação, qual a fórmula correta para o cômputo de correção monetária, acabam por gerar a necessidade de acertamento judicial (sobre o regime administrativo da compensação de tributos vide Capítulo 7, subitem 9.3). q. Execução fiscal e ação declaratória. Por não operar efeito suspensivo, a ação declaratória não obsta o aforamento da execução fiscal,44-45 exceto se estiver acompanhada do depósito correspondente ao débito (art. 151, II, do CTN) ou haja sido concedida liminar antecipatória antes da inscrição em dívida ativa.46 Pendente a ação declaratória e proposta a execução fiscal, esta deve ser distribuída por dependência – em razão da conexão – ao juízo onde tem curso a declaratória. Ajuizada a execução fiscal não há óbice à propositura da ação declaratória, que igualmente, deve ser distribuída por dependência ao foro da execução, mas até que esteja seguro o juízo, não pode ser recebida com o caráter de embargos à execução. Como os embargos à execução têm o caráter de ação de conhecimento, pode dar-se a litispendência, parcial ou total, entre a ação declaratória e os embargos à execução. 3. Ação anulatória em matéria tributária a. Conceito. A ação anulatória em matéria tributária ou ação anulatória fiscal afigura-se como ação antiexacional imprópria de rito ordinário e de natureza constitutivo-negativa, que pode ser proposta pelo contribuinte em face da Fazenda Pública ou em face de quem exerça atividade parafiscal, colimando a obtenção de sentença de conteúdo anulatório (modificativo ou extintivo) que anule total ou parcialmente ato administrativo de imposição tributária (lançamento tributário propriamente dito), ato administrativo de aplicação de penalidades (auto de infração). É, a ação anulatória, instrumento processual tido como de larga aplicação em matéria tributária – domina tutto il processo tributario diz Allorio47 – e reputada como modelo paradigmático de ação constitutiva no campo fiscal (Alberto Xavier).48 b. Críticas ao nomen iuris. Embora a doutrina adote o nomen iuris “ação anulatória de débito fiscal”, parece-nos mais acertado que se utilize a denominação genérica “ação anulatória em matéria tributária” ou, mais simplificadamente, “ação anulatória fiscal”, já que nem toda ação anulatória fiscal será necessariamente anulatória de ato de lançamento (ou“débito fiscal”), mas pode ter por objeto, v.g., a anulação de decisão administrativa denegatória de restituição de pagamento indevido (art. 169 do CTN). Por outras palavras, toda ação anulatória de débito fiscal será ação anulatória em matéria tributária, mas a recíproca não é verdadeira. Além disso, ainda que o objetivo da anulatória seja a desconstituição do débito, o que se anula judicialmente não é propriamente o “débito” (obrigação), mas o ato administrativo de lançamento que o declara, seja por conter vícios formais ou materiais.49 c. Antiexacional imprópria de rito ordinário. Embora expressamente prevista no art. 38 da Lei 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal) como ação antiexacional que pode ser utilizada para que o contribuinte promova a discussão da dívida ativa da Fazenda Pública, a ação anulatória do ato impositivo não encontra disciplina processual tributária específica, isto é, rege-se por disposições gerais de Processo Civil, razão pela qual é considerada ação tributária imprópria. A mera indicação constante do caput do art. 38 acima referido não é suficiente para que possa ser considerada ação tributária própria, já que se configura em ação de cognição de rito comum ordinário regida pelos arts. 282 e seguintes do CPC/1973 aos quais correspondem os arts. 319 e seguintes do CPC/2015. d. Natureza constitutivo-negativa. Por operar efeitos modificativos ou extintivos da obrigação tributária já formalizada a ação anulatória assume natureza constitutivo-negativa, isto é, por intermédio desta ação o contribuinte pretende modificar ou extinguir o conteúdo de relação jurídica tributária (principal ou acessória) já formalizada, já existente, já “constituída” (isto é, formalmente declarada) através do ato administrativo tributário.50 e. Ação anulatória e o depósito preparatório. A segunda parte do caput do art. 38 da Lei 6.830/1980 estabelece que a ação anulatória deve ser precedida do depósito preparatório do valor do débito (monetariamente corrigido e acrescido dos juros e multa de mora e demais encargos). Este depósito (tido como nova roupagem da anacrônica regra do solve et repete),51 no entanto, não se constitui em condição da ação ou sequer pressuposto de procedibilidade, conforme já há muito decidido pelo STF,52 sumulado pelo extinto Tribunal Federal de Recursos53 e reiterado pelo STJ,54-55 constituindo-se, em verdade, mera faculdade do contribuinte que deseje suspender a exigibilidade do tributo durante a pendência da ação, impedindo o aforamento da execução fiscal, consoante restou assentado pela jurisprudência do STF.56 É lícito, portanto, ao autor-contribuinte propor a ação anulatória do lançamento fiscal independentemente da realização do depósito preparatório, em homenagem ao princípio da tutela judicial efetiva em matéria tributária, que não se coaduna com criação de óbice material – visceralmente anti-isonômico – oposto inconstitucionalmente ao exercício do direito de ação.57-58 Ainda, destaque-se que o STF sumulou o entendimento de que é inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial que pretenda discutir a exigibilidade do crédito tributário. Em verdade, esse entendimento sumular apenas ratifica entendimento já consolidado na jurisprudência pátria: “Súmula Vinculante n. 28: É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade de crédito tributário. Data de publicação (DJe n. 28 de 17.02.2010, p. 1. DOU de 17.02.2010, p. 1)”. f. Anulatória e declaratória fiscal – distinção.59 Diferentemente da ação declaratória a ação anulatória fiscal necessariamente pressupõe a existência de ato administrativo cuja desconstituição seja objeto do processo.60 Este ato administrativo pode ser tanto o ato de lançamento como outro ato qualquer promovido pela Administração tributária e que represente gravame à esfera jurídica do contribuinte, como, por exemplo, ato administrativo de classificação fiscal ou de apreensão de mercadorias. No primeiro caso a ação pode ser propriamente denominada de ação anulatória de lançamento e, no segundo caso, denomina-se, genericamente, de ação anulatória fiscal, ou como prefere Americo Lacombe, ação anulatória de ato administrativo.61 Já decidiu o STF, com acerto, que como o pressuposto da ação anulatória de ato declaratório da dívida ativa é o lançamento do crédito tributário não há sentido em protraí-lo ao ato de inscrição da dívida,62 o que significa dizer que se anulando o ato de lançamento perdem seu fundamento de validade os atos subsequentes que com ele guardem dependência formal e material, como os atos de cobrança administrativa e a própria inscrição em dívida ativa. Anulado o lançamento perderá axiomaticamente os efeitos o ato de inscrição em dívida. g. Anulatória e declaratória negativa – cumulação. Como a ação anulatória tem como pressuposto específico a existência de lançamento ou outro ato administrativo de caráter fiscal e a ação declaratória pode ter como objeto a declaração de inexistência de relação jurídica tributária, assume natureza jurídica distinta o que permite seu ajuizamento concomitante ou sua cumulação no mesmo processo.63-64 É possível, por exemplo, que o contribuinte pretenda por via de pedido anulatório a desconstituição de ato de lançamento fundado em norma tributária reputada inconstitucional, e concomitantemente, pretenda por via de pedido declaratório o reconhecimento da inexistência de relação jurídica tributária como fundamento na mesma inconstitucionalidade. Nesse caso o pedido anulatório afigura-se mais estreito porque tem em mira um determinado ato administrativo, enquanto o pedido declaratório é substancialmente mais amplo já que almeja o reconhecimento (declaração da certeza) de que não pode se dar nenhuma relação tributária entre o autor-contribunte e a Fazenda Pública com fundamento em norma tida como inconstitucional. Não são pedidos incompatíveis posto que seus objetos são distintos e podem ser cumulados uma vez que sua causa de pedir é a mesma (inconstitucionalidade da norma impositiva). h. Ação anulatória e execução fiscal. O ajuizamento da ação anulatória desacompanhada do depósito do montante integral do débito não obstaculiza a propositura da execução fiscal (art. 151, II, do CTN, art. 38 da Lei 6.830/1980, Súmula 112/STJ). Admite o STJ, contudo, que se dá a conexão entre a execução fiscal e a ação anulatória (ou mesmo a ação declaratória) devendo as ações ser reunidas para julgamento conjunto (arts. 103, 105 e 106 do CPC/1973, aos quais equivalem os arts. 55 e 58 do CPC/2015).65-66 Embora não caracterizem litispendência,67 o que há de comum entre a execução e a ação anulatória do débito fiscal e que deve induzir a conexão com a reunião das causas é justamente a causa de pedir remota (ou razão mediata do pedido), isto é, no primeiro caso, o lançamento como fundamento do título executivo (causa de pedir remota para a excutição dos bens do contribuinte devedor) e, no segundo caso, o próprio lançamento tido como viciado, agora como causa de pedir remota do pedido anulatório.68 Por sua afinidade, devem os processos (execução fiscal e anulatória) ser reunidos evitando-se a possibilidade de julgamentos contraditórios.69 Uma vez estando devidamente comprovado no bojo da ação anulatória a realização do depósito realizado nos termos da Súmula 112 do STJ70 não é lícito à Fazenda Pública a propositura da execução fiscal e se o fizer fica responsável por indenizar pelos danos porventura causados71 e, em contrapartida, já se entendeu que se for ajuizada a ação declaratória ainda no curso de Processo Administrativo Fiscal que venha a reconhecer a inexigibilidade do débito tributário, deve extinguir-se a ação judicial por perda de objeto mas não pode a Fazenda ser condenada nos ônus da sucumbência.72 i. Ação anulatória e embargos do devedor: litispendência. O objetoda ação executiva não se confunde com o objeto da ação de embargos do devedor ou com o pedido da ação anulatória de débito fiscal. Embora seu grau de afinidade pela causa de pedir remota recomende sua reunião por conexão (vide supra), apresentam-se, de outro turno, como ações de natureza e pedidos distintos que não habilitam a arguição de litispendência.73 Por outro lado, entre a ação anulatória e a ação de embargos à execução pode haver, além da identidade de partes, a coincidência entre a causa de pedir e o pedido (objeto) de modo a que exsurja a relação de litispendência (art. 301, §§ 1.º, 2.º e 3.º, do CPC/1973 e 337, §§ 1.º, 2.º e 3.º, do CPC/ 2015), uma vez que seja em sede de ação de embargos à execução, seja em sede de ação anulatória fiscal, o que pretende o contribuinte-autor é tutela jurisdicional constitutivo-negativa que desconstitua o título por vício formal ou material.74 4. A ação condenatória de repetição de indébito a. Conceito. A ação de repetição de indébito em matéria tributária é ação antiexacional imprópria de rito ordinário e de natureza condenatória, que pode ser proposta pelo contribuinte em face do ente tributante que tenha recebido tributos tidos como indevidos, com o escopo da obtenção de sentença de conteúdo condenatório que determine ao órgão exator a devolução dos ingressos indevidos. Mais amplamente sobre os conceitos de repetição, restituição e ressarcimento veja-se supra Capítulo 7, item 9. b. Objeto e causa de pedir. O pedido condenatório (objeto) da ação repetitória consiste na devolução de tributos, penalidades pecuniárias ou acréscimos como correção monetária e juros recolhidos indevidamente; sua causa de pedir pode estar assentada em erro material ou formal gerador do recolhimento procedido; anulabilidade do auto de infração ou do ato de lançamento; ou ainda a ilegalidade ou inconstitucionalidade da norma que embasou o recolhimento do tributo cuja devolução se requer. c. Fundamentos constitucionais e infraconstitucionais. A obrigação de devolução de tributos recolhidos indevidamente está tutelada tanto constitucionalmente quanto no Código Tributário Nacional. Seu fundamento constitucional está relacionado com a garantia do direito de propriedade, prevista no art. 5.º da CF/1988. Com efeito, “proíbe expressamente a Constituição Federal a apropriação ou confisco de bens econômicos dos contribuintes sem causa jurídica”.75-76 O Código Tributário Nacional prevê expressamente a possibilidade de restituição de tributos recolhidos indevidamente, através de seus arts. 165 a 169. A legalidade (estrita legalidade e tipicidade) é considerada como o princípio constitucional mais importante no campo da incidência tributária e a contrario sensu é fundamento elementar do direito à devolução: “Este concepto de la legalidad tributaria sirve perfectamente para fundamentar el reconocimiento del derecho del particular a la devolución de ingresos indebidos”.77 Também o princípio constitucional da capacidade contributiva é apontado como fundamento da devolução de tributos indevidos. “El derecho a la devolución desarrolla un papel de gran importancia porque reconduce a la ortodoxia constitucional vínculos de tributación que no respetan, en principio, el principio de capacidad contributiva. El derecho a la devolución de una suma ‘debida’ degrada el vínculo porque le priva de un rasgo esencial de la relación tributaria, el ser la causa de la atribución patrimonial, pero esta degradación produce que se salve de ser tachado de inconstitucional”.78 A devolução de valores pagos indevidamente, em qualquer caso, é reflexo precípuo de efetivação da justiça social, em conformidade com os parâmetros de conduta que norteiam a vida em sociedade. Além disso, é regra amplamente entabulada no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente em se tratando da restituição de tributos recolhidos a maior. Além disso, a Constituição Federal ainda impõe a observância dos princípios da moralidade, da responsabilidade objetiva do Estado, da isonomia, da ampla defesa, da justa indenização, da equivalência, do devido processo legal, entre outros não menos importantes, todos afetos à confirmação do instituto acima descrito. d. Repetição de indébito e compensação. A decisão que julga pela procedência da Ação de Repetição de Indébito é composta por duas partes: uma declaratória e outra condenatória. Conforme bem expõe Aroldo Gomes de Matos: “Aliás, como toda sentença condenatória possui um grau de declaração, simplesmente basta que o sujeito passivo ajuíze a ação sem intitulação específica, com pedido apenas condenatório, porque o bojo da sentença contemplará automaticamente a parte declaratória negativa da relação jurídico-tributária”.79 O contribuinte que obtém sentença de procedência em ação de repetição de indébito, como no caso em análise, pode utilizar-se da carga declaratória da mesma para dar azo a compensação, inclusive sem necessidade de autorização da Fazenda Nacional, bastando comunicação em juízo de tal procedimento,80 através da conjugação da possibilidade de aproveitamento do efeito declaratório da sentença com a previsão legal da compensação presente no art. 66 da Lei 8.383, de 30.12.1991. Gabriel Troianelli, a respeito desta questão, observa que “nada impede, assim, que o contribuinte que tenha ajuizado anteriormente Ação de Repetição de Indébito compense, por sua conta e risco, o tributo indevido. Nessas hipóteses, a compensação não se dará na ação de repetição de indébito, mas apesar da ação. O contribuinte que compensa crédito tributário na pendência de ação de repetição de indébito relativa ao mesmo crédito apenas opta por uma outra via não judicial para obter o ressarcimento do indébito tributário”.81 Nos casos em que há decisão judicial transitada em julgado, o comando individual de natureza jurídica judicial contém os elementos necessários para a possibilidade de compensação.82-83-84-85 Como a sentença trânsita poderá ser utilizada administrativamente, deverá ser observado o regime jurídico administrativo próprio para a restituição, o ressarcimento ou a compensação de tributos (sobre esse tema vide Capítulo 7, subitem 9.a). e. O prazo prescricional para o pedido de restituição ou repetição do indébito e a “norma interpretativa” da LC 118/2005. Durante muito tempo observou-se viva controvérsia quanto à contagem do prazo para o pedido de restituição de tributo nos casos de lançamento por homologação, que o CTN trata como hipótese de antecipação de pagamento, sem que haja formalização por parte da autoridade administrativa. Veja-se que a regra do art. 168 do Código Tributário Nacional estipula que “o direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: (I) – Na hipótese dos incisos I e II do art. 165, da data da extinção do crédito tributário; (II) – Na hipótese do inciso III do art. 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória”.86 A dúvida, na hipótese do inc. I do art. 165, supracitado, está que se põe em causa o momento em que se dá a “extinção do crédito tributário” nos casos em que o contribuinte antecipa o pagamento do tributo que, posteriormente, é objeto do pedido de restituição, hipótese em que se aplicam os §§ 1.º e 4.º do art. 150, que disciplina a extinção nos seguintes termos: “§ 1.º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento. (…) § 4.º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação”. De forma muito lúcida, aplicandocoerentemente esses dispositivos, o STJ – STJ pacificou entendimento no sentido de que se devem computar cinco anos a partir do pagamento, que é quando se dá a homologação tácita do tributo recolhido indevidamente (art. 150, § 4.º), somados de mais cinco anos referentes ao prazo prescricional que o CTN fixou (art. 168). Essa forma de cálculo do prazo prescricional foi vulgarmente denominada de “tese dos cinco mais cinco”. No entanto, reavivou-se controvérsia quando a LC 118, de 9.02.2005, em seus arts. 3.º e 4.º, dispôs diferentemente sobre a interpretação a ser atribuída ao inc. I do art. 168 do CTN, inserindo no sistema suposta norma interpretativa e atribuindo-lhe gravosa retroatividade: “Art. 3.º Para efeito de interpretação do inc. I do art. 168 da Lei 5.172, de 25.10.1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1.º do art. 150 da referida lei. Art. 4.º Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3.º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”. Como se observa, sob o pretexto de promover “interpretação autêntica”87 do art. 168, I, do CTN, a LC 118/2005 busca obter os efeitos retroativos previstos pelo art. 106 do CTN quando se trate de lei “expressamente interpretativa”.88 Ocorre que, à toda evidência, mais que mera interpretação, o dispositivo produz inovação no sistema jurídico, constituindo-se em gravame intolerável ao princípio constitucional da irretroatividade das leis previsto genericamente no art. 5.º, XXXVI, da CF/1988 e particularmente para a matéria tributária, previsto no art. 150, III, “a”. Diante da evidência da violação constitucional em que incorreu a norma supostamente interpretativa, o próprio STJ já se pronunciou – acertadamente segundo pensamos – assentando o entendimento de que sua aplicação é insuscetível de ser retroativa, podendo aplicar-se tão somente aos pedidos de restituição de tributos formulados após a vigência do art. 3.º da LC 118/2005.89 No entanto, em virtude do forte teor constitucional das decisões do STJ, o STF, pronunciou- se em sede de recurso extraordinário, sobre a inconstitucionalidade parcial da LC 118/2005 (RE n. 566.621, rel. Min. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, j. em 04.08.2011, publicado em 11.10.2011). Desse pronunciamento, podem-se inferir, finalmente, serem os seguintes os prazos a serem observados: (a) tributos indevidos recolhidos até 08.06.2010 – prazo de 5 (cinco) anos para repetição (partindo, logicamente, do pressuposto que não foi ajuizada nenhuma ação até 08.06.2005, para recuperar o indevido); (b) tributos indevidos recolhidos após 08.06.2010 – prazo de 5 (cinco) anos para repetição; (c) tributos indevidos recolhidos até 08.06.2010, com pedido formulado até a mesma data – prazo de 5 (cinco) anos para repetição; (d) tributos indevidos recolhidos até 08.06.2010, com pedido formulado após 08.06.2010 – prazo de 5 (cinco) anos para repetição; (e) tributos indevidos recolhidos até 08.06.2005, com pedido formulado até essa data – poderá recuperar os 10 (dez) anos de pagamento indevido; e (f) tributos indevidos recolhidos até 08.06.2005, com pedido formulado após essa data – prazo de 5 (cinco) anos para repetição. Para o exame dos demais aspectos referentes à prescrição no quadro da repetição do indébito, veja-se, supra, Capítulo 7.2, subitem 1.f. f. Legitimidade ativa para a ação de repetição de indébito e a retenção de tributos.90 A adoção pela Fazenda Pública de modelos de transferência de responsabilidade tributária, também conhecidas na doutrina europeia como “privatização da gestão tributária”, concernente à transferência para terceiros, geralmente pessoas jurídicas de direito privado, das funções de formalização e até mesmo de arrecadação tem sido crescente.91 E não se trata apenas da fenomenologia clássica, que afeta a retenção e o agente retentor (retención, retenedor) na relação do indébito.92 Variados e criativos mecanismos e denominações como substituição para trás, substituição para frente, monofasia, responsabilidade, retenção na fonte de rendimentos, retenção de receita, sub-rogação etc., produzem novos e insuspeitados vínculos jurídicos, alimentam vigorosas discussões doutrinárias e jurisprudenciais. Transformaram-se, de uma parte, em eficaz estratégia sob o prisma arrecadatório, mas de outra, fomentam graves problemas sob o prisma material e processual tributário. De fato, em numerosas situações, observa-se que novos conflitos entre substitutos e substituídos, retentores e retidos, demandam a adoção de um modo de pensar especificamente processual tributário, e não meramente processual civil.93 Situação comum é a que se encontra quando retentores (responsáveis tributários) e retidos (contribuintes) se veem diante de declaração de inconstitucionalidade em mero controle difuso pelo STF. Enquanto a inconstitucionalidade de tributo que opere sob regime de retenção for declarada em sede de controle difuso e não em caráter de controle concentrado, os contribuintes expostos ao mesmo regime necessitam promover suas ações individuais ou mesmo coletivas com o objetivo de assegurar seus interesses. O efeito prático de declaração incidental de inconstitucionalidade pelo STF pode consistir em: (a) servir como precedente para o aforamento pelos contribuintes retidos, de ações declaratórias de inexistência de relação jurídico-tributária (por inconstitucionalidade) cumuladas com pedido condenatório de repetição do indébito tributário; e (b) servir de fundamento jurídico pelos agentes retentores, para alicerçar a afirmação de liquidez e certeza do direito nos casos de impetração de mandado de segurança.94 A lei não prescreve que, caso o retentor não recolha, o retido terá que recolher. Ao contrário: não havendo o recolhimento pelo retentor, que é sujeito passivo da obrigação tributária na modalidade de responsável, esta é quem está exposta à inscrição em dívida ativa e sucessivos atos de cobrança, inclusive forçada, pela via do executivo fiscal. Nesse caso de obrigação retencional e de responsabilidade sub-rogatícia, a sujeição executiva – legitimação passiva para a execução fiscal – é exclusiva do agente retentor, eliminando por excludência a responsabilidade do retido. Embora essa compleição fático-jurídica sugira a aplicação dos arts. 121, II, e 128, primeira parte, do CTN,95 há evidente dificuldade semântica para seu perfeito enquadramento nas categorias tradicionalmente conhecidas. Inicialmente é preciso analisar, diante dessas normas, a situação do retido e da indústria retentora. Para o Código, o sujeito passivo é a pessoa obrigada ao pagamento, seja enquanto contribuinte ou na condição de responsável. Ora, o sujeito à retenção não é sujeito passivo da obrigação principal, já que não está obrigado ao pagamento de tributo ou mesmo de penalidade pecuniária, e, logo, embora seja contribuinte, não é sujeito passivo. Quem está obrigado à retenção e ao respectivo recolhimento é – por expressa injunção legal – tão somente o agente retentor. Por outro modo de dizer, embora o retentor não seja contribuinte stricto sensu, figura como sujeito passivo por responsabilidade. Ademais, pode- se afirmar que o retentor, embora exposto à sujeição passiva, não suporta economicamente o tributo, pois na qualidade de “agente de repasse” do tributo, tão somente transfere o valor que foi suportado pelo contribuinte stricto sensu. Devemos lembrar que as figuras do retido e do retentor, nos moldes como previstas na legislação, foram criadas para atender unicamente aos propósitos arrecadatórios. Aliás, não se trata aqui da vetusta discussão sobre contribuinte de fato e contribuinte de direito, que tanto atormenta a doutrina no tema da repetição do indébito tributário, mas, sim, de vínculoslegais de distinta natureza, o primeiro se constituindo em liame de natureza puramente econômica – o contribuinte suporta o ônus econômico do tributo – e o segundo laço jurídico se constituindo em sujeição passiva, de natureza puramente obrigacional, mas de raiz puramente arrecadatória. Há, também, muita flutuação conceitual quando da distinção entre a mecânica da retenção e a figura do substituto tributário.96-97 Diversas hipóteses não se ajustam propriamente à ideia de substituição tributária, embora essa locução possa ser encontrada em parte da jurisprudência e também em alguma fonte doutrinária – o que pode conduzir a equívocos. Estamos com a doutrina que distingue a responsabilidade da substituição da seguinte forma: (a) na responsabilidade tributária o contribuinte é trocado pelo responsável de modo que desaparece o vínculo material original, remanescendo, portanto, apenas o vínculo debitório entre o responsável e o ente tributante; e (b) na substituição tributária a legislação obriga terceiro vinculado ao fato gerador a cumprir com a obrigação, remanescendo, no entanto, também o vínculo original. Como nesse sistema de responsabilidade a obrigação do retentor elimina a obrigação do retido, sob esse critério tratar-se-ia de responsabilidade por sub-rogação.98 Pode-se dizer, então, que no regime dos arts. 121 e 128 do CTN, nem todo contribuinte é sujeito passivo do tributo (embora suporte economicamente a exação) e nem todo sujeito passivo é contribuinte (stricto sensu). Há, então, “contribuinte sem sujeição”, que corresponde à figura do retido e “sujeito passivo não contribuinte”, representado pela figura do retentor. Desse regime jurídico tipicamente de Direito Tributário devem fluir as necessárias consequências processuais tributárias a serem aplicadas no âmbito judicial, sobretudo referentes à legitimação para a causa. Evidentemente ambos, retido e retentor, são contribuintes em sentido lato, mas para fins da presente análise adotaremos a distinção entre contribuinte sem sujeição (contribuinte stricto sensu) e sujeito passivo não contribuinte, como forma de demarcar com fortes cores as diferentes posições jurídicas de cada uma dessas figuras. g. A legitimatio ad causam fracionada. Das peculiaridades do tratamento tributário surgirão, inexoravelmente, particularidades de natureza processual. Em primeiro plano, convém lembrar que as relações processuais que decorram desse sistema devem respeitar a condição de ambas essas figuras, sem criar embaraços à necessidade de defesa de ambos, contribuinte sem sujeição e sujeito passivo não contribuinte. O contribuinte retido, ao suportar o ônus econômico do tributo, fará jus à repetição do indébito, enquanto que o sujeito passivo retentor conserva o direito de discutir sua sujeição passiva, realizar o depósito e não ser compelido, sob nenhuma forma, à inadimplência. Ou seja, o contribuinte sem sujeição (retido) tem legitimação ad causam para formular o pedido de repetição do indébito e o sujeito passivo não contribuinte (retentor) tem legitimidade para discutir o vínculo enquanto responsável e fazer o depósito se assim desejar. De fato, tem reconhecido, acertadamente, o STJ, que o agente retentor tem legitimidade ad causam para discutir a incidência do tributo, mas não tem esta legitimidade para pedir repetição do indébito, legitimidade esta exclusiva do retido.99-100 Aliás, ainda segundo a linha pretoriana, para que o retentor possa estar legitimado a pleitear a restituição do indébito, teria que estar munido de autorização expressa dos retidos, nos moldes do art. 166 do CTN.101 Como se vê, não pode haver concorrência na legitimação para a causa, uma vez que autores distintos (contribuinte e sujeito passivo) não podem pleitear os mesmos efeitos materiais. A solução pretoriana, adequada à realidade fático-jurídica, promoveu o correto recorte nos bens jurídicos sob tutela, promovendo nessa esteira o fracionamento da legitimatio ad causam, de modo a conferir ao retentor (sujeito passivo não contribuinte) o direito de discutir sua relação obrigacional com a União enquanto responsável por sub-rogação, e, doutra parte, de forma a deferir ao retido (contribuinte sem sujeição) o direito de requerer a repetição do indébito que financeiramente suportou. 5. Os Juizados Especiais Federais (Lei 10.259/2001) e o processo tributário A Lei 10.259, de 12.07.2001, instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, com competência para processar e julgar – e quando possível conciliar – os feitos de competência da Justiça Federal relativos às infrações criminais de menor potencial ofensivo e as causas que não excedam o valor correspondente a sessenta salários mínimos.102 Sua instalação em cada circunscrição judicial depende de decisão do Tribunal Regional Federal competente. Sobre o Juizado Especial Federal Cível, algumas relevantes características legais com referibilidade ao processo tributário devem ser destacadas: i) no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, sua competência é absoluta e abrange expressamente as ações para anulação de atos previdenciários e para anulação do lançamento tributário, não podendo ser remetidas ao Juizado, no entanto, as demandas aforadas até a data de sua instalação; ii) não se incluem em sua competência: (a) as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País; (b) as causas fundadas em tratado ou contrato da União com estado estrangeiro ou organismo internacional; (c) as ações de mandado de segurança; (d) as execuções fiscais; (e) as demandas sobre direitos ou interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos; iii) nas relações tributárias continuativas em que a pretensão recaia sobre parcelas vincendas, o valor da causa – para fins da fixação de competência do Juizado – corresponde apenas à soma de doze parcelas; iv) o regime recursal do Juizado consagra expressamente o princípio da irrecorribilidade das interlocutórias, o que significa que não cabe recurso de agravo de instrumento das decisões proferidas no curso do processo, inclusive das medidas liminares concessivas ou denegatórias da cautela requerida; v) não há para o INSS e a União ou para qualquer pessoa jurídica de Direito Público o benefício do prazo em quádruplo para contestar ou prazo em dobro para recorrer e, além disso, não haverá reexame necessário, isto é, não se aplica às causas de competência do Juizado a regra do “recurso ex officio”; vi) os representantes judiciais da União e do INSS estão autorizados a transigir ou desistir nos processos de competência do Juizado; vii) nos incidentes de uniformização sobre interpretação de lei federal versante sobre Direito material em que haja orientação da Turma de Uniformização que contrarie a súmula ou jurisprudência dominante do STJ, poderá ser provocada, diretamente, a manifestação desse tribunal. Nessa hipótese, havendo plausibilidade do direito invocado e fundado receio de dano de difícil reparação poderá ser concedida medida liminar determinando a suspensão dos processos nos quais a controvérsia esteja estabelecida; viii) ao processamento e julgamento do recurso extraordinário aplica-se o mesmo regime do incidente de uniformização; ix) nas hipóteses de repetição de indébito, após o trânsito em julgado da decisão, o pagamento de valor não superior a sessenta salários mínimos será feito no prazo de sessenta dias, independentemente de precatório. Complementarmente, a Lei 12.153, de 22.12.2009, criou disciplina específica para os denominados “Juizados Especiais da Fazenda Pública”, que se constituem em órgãos da justiça comum e integrantes do Sistema dos Juizados Especiais (Juizados Especiais Cíveis, Juizados Especiais Criminais e Juizados Especiais da Fazenda Pública). A utilização dos Juizados Especiais em matéria tributária – agora Juizados Especiais da Fazenda Pública– representa sensível avanço no trato judicial das causas de pequeno valor e deverá ser de ampla aplicação, principalmente para as pessoas físicas (notadamente no campo previdenciário), e para as microempresas e empresas de pequeno porte. Sem embargo das vantagens atinentes à redução dos prazos,103 das formalidades e dos incidentes processuais, como a supressão do recurso de agravo de instrumento e do benefício de elastecimento de prazo para a Fazenda Pública e a dispensa dos abomináveis precatórios requisitórios,104 somente a lida forense e o paulatino aprofundamento das investigações doutrinárias, no entanto, irão determinar os reais benefícios e as eventuais implicações no que tange à qualidade da prestação jurisdicional em matéria fiscal, particularmente no campo da conciliação e do juízo arbitral, institutos nem sempre assimiláveis aos rigores da relação obrigacional tributária.105 6. As Microrreformas do Código de Processo Civil, o CPC/2015 e o processo tributário O Código de Processo Civil de 1973 sofreu diversas alterações pontuais com o propósito de ajustá-lo às necessidades contemporâneas de eficácia e celeridade da prestação jurisdicional. Estas modificações operam-se através de pequenos blocos legislativos que são aprovados de tempos em tempos e são denominados de “microrreformas”. Tudo isso tendo culminado no texto do CPC/2015. Ao contrário do que se poderia pensar, a nova legislação processual não rompe drasticamente com o sistema em vigor. Diversamente, o novo diploma segue a mesma sistemática constante das microrreformas empreendidas no CPC/1973, mas de forma aperfeiçoada, na medida em que compõe um todo harmônico e coeso. Como ponto de partida, algumas etapas das modificações empreendidas no CPC/1973 são de particular interesse ao direito processual tributário – e merecem ser examinadas com o fito de contextualizar alguns aspectos do CPC/2015 – que é o ponto de chegada. A primeira fase objeto de nossas considerações é de 1994 e 1995 e teve como principal alteração, do ponto de vista do processo tributário, a inserção do regime de antecipação de tutela no bojo do art. 273 do CPC/1973 através da Lei 8.952 de 13.12.1994, sistema que se revelou, ao longo do tempo, como de grande aplicação em matéria tributária (sobre as peculiaridades da antecipação de tutela em matéria tributária, vide infra Subcapítulo 12.2, item 8). A segunda fase dessas microrreformas ocorreu nos anos de 2001 e 2002. As Leis nos 10.352, de 26.12.2001, e 10.358 de 27.12.2001 – e a Lei 10.444, de 07.05.2002 – promoveram diversas alterações no corpo do Código de Processo Civil de 1973. Algumas dessas modificações, ainda que gerais, têm particular aplicação ao campo processual tributário: i) reforçou-se a efetividade dos provimentos jurisdicionais mandamentais, liminares ou finais, através da possibilidade de cominação de multa não superior a vinte por cento do valor da causa em face de quem embarace o cumprimento das ordens judiciais – art. 14, V do CPC/ 1973. A possibilidade de cominação de multa foi incorporada no CPC/2015, prevista no seu art. 77, que também estabelece o dever de as partes cumprirem os provimentos judiciais, em seu inc. IV, que reza: “IV – cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criar embaraços à sua efetivação”; ii) estabeleceu-se, em autêntico desdobramento do princípio constitucional do juiz natural, nova regra de distribuição por dependência para os casos de extinção do processo, sem julgamento do mérito (nova redação dada pela Lei 11.280/2006) e sucessiva repropositura de ações, mesmo que em litisconsórcio com outros autores (essa prática – desistência e redistribuição – é muito comum em matéria tributária tendo em vista que a homogeneidade qualitativa das lides tributárias leva a parte a buscar – por meio da repropositura – uma chance a mais de distribuição do processo a magistrado favorável ao seu pleito nos casos em que já se tem prévio conhecimento da habitual linha decisória de cada juiz) – art. 253, II, do CPC/ 1973, ao qual equivale o art. 286, II, do CPC/2015. Ainda a Lei 11.280/2006 – elencou mais uma hipótese (inc. III do art. 253 do CPC/1973) determinante da distribuição por dependência, qual seja: “quando houver o ajuizamento de ações idênticas, ao juízo prevento”, regra que integra também o corpo do CPC/2015, no inc. III do art. 286; iii) suprimiu-se a obrigatoriedade de duplo grau de jurisdição (ou recurso ex officio) para as seguintes hipóteses: (a) condenação da Fazenda Pública ou procedência de embargos à execução fiscal em ação cujo valor não supere 60 (sessenta) salários mínimos; (b) quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário ou súmula do STF ou do “tribunal superior competente” (à expressão “súmula do tribunal superior competente” equivale dizer súmula do Tribunal Regional Federal ou Tribunal Estadual – Tribunal de Alçada ou Tribunal de Justiça – competente para apreciação do recurso ou mesmo súmula do STJ) – art. 475, §§ 2.º e 3.º do CPC/1973. O CPC/2015 trouxe alteração em relação às hipóteses de dispensa da remessa necessária, relacionando o valor da condenação com a parte que figura no processo. Assim, fica suprimida a obrigatoriedade do duplo grau quando a condenação ou o proveito econômico obtido nas causas de valor certo e líquido, inferior a 1000 (mil) salários mínimos, se a demandada for a União, suas autarquias e fundações de direito público; quando inferior a 500 (quinhentos) salários, se demandado o Estado, o Distrito Federal, suas respectivas autarquias e fundações de direito público, bem como os Municípios capitais de Estados; 100 (cem) salários mínimos para os demais municípios, suas respectivas autarquias e fundações de direito público. Já em relação à dispensa de duplo grau por sentença fundada em julgamento de Tribunal Superior, houve ampliação das hipóteses, a saber, (a) sentença fundada em súmula de tribunal superior; (b) sentença fundada em acórdão proferido pelo STF ou STJ em julgamento de recursos repetitivos; (c) sentença fundada em incidente de resolução de demandas repetitivas ou assunção de competência;106 (d) sentença fundada em entendimento coincidente com orientação vinculante, firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa – art. 496, §§ 3.º e 4.º, do CPC/2015. iv) quando a sentença de mérito confirmar a antecipação dos efeitos da tutela, o respectivo recurso de apelação será recebido somente no efeito devolutivo, eliminando-se dessa forma a vetusta discussão sobre a suspensão da eficácia de medida liminar suspensiva da exigibilidade do tributo (art. 151, V do CTN) em face da interposição de apelação com efeito suspensivo – art. 520, VII do CPC/1973. A mesma regra consta do CPC/2015, em seu art. 1.012, que em seu inc. V contempla a mesma hipótese, com aperfeiçoamento de redação: “V – confirma, concede ou revoga tutela provisória”. v) com relação ao rito do agravo de instrumento e o prazo dos recursos especial e extraordinário quando houver interposição de embargos infringentes, são também dignas de nota as seguintes alterações, ainda que sendo de caráter mais geral não toquem tão diretamente com o processo tributário: (a) no tribunal, o relator ao receber recurso de agravo de instrumento poderá convertê-lo em agravo retido – art. 527, II do CPC/1973, nova redação;107 (b) também no recebimento do agravo de instrumento caberá ao relator deferir antecipação de tutela total ou parcialmente (positivação da construção doutrinária denominada agravo com efeito ativo) – art. 527, III do CPC/1973, ao qual equivale o art. 1.019, I, do CPC/2015; (c) quando da parte não unânime do acórdão forem interpostos embargos infringentes, o prazo para recurso extraordinário ou recurso especial, relativamente ao julgamento unânime, ficará sobrestado até a intimação da decisão nos embargos – art. 498, caputdo CPC/1973. (d) na hipótese de não interposição de embargos infringentes o prazo relativo à parte unânime da decisão terá como dia de início aquele em que transitar em julgado a decisão por maioria de votos – art. 498, parágrafo único do CPC/1973. No que concerne à possibilidade de conversão do agravo de instrumento em retido, ela não se verifica no CPC/2015, na medida em que o agravo na modalidade retida deixa de existir. Por outras palavras, salvo as hipóteses expressamente previstas em lei (nas quais é cabível agravo por instrumento), as decisões interlocutórias não são recorríveis. Ao contrário do que possa parecer inicialmente, a opção legislativa não é ruim, pelo contrário. Se, por um lado, o legislador suprimiu a possibilidade de se recorrer das interlocutórias, como regra geral, pelo outro, não mais se verifica o fenômeno da preclusão. Assim, todas as questões surgidas no curso da ação podem ser atacadas, por meio da interposição de recurso de apelação. Veja-se que o que a lei fez foi suprimir uma modalidade de apresentação de recurso, mas não tolheu da parte o direito de se insurgir de determinada decisão judicial. O que antes era objeto de agravo retido, no CPC/ 2015 passa a ser do recurso de apelação. Em relação às observações concernentes aos embargos infringentes, há importante alteração no CPC/2015. Não há mais previsão legal deste recurso. O que a nova lei processual prevê é uma técnica de julgamento, pois, ao tratar do julgamento do recurso de apelação prevê, no caso de julgamento não unânime, que o julgamento tenha prosseguimento, em sessão designada com a presença de outros julgadores – art. 942 do CPC/2015. Do ponto de vista geral, embora relevante, a etapa das microrreformas do Código de Processo Civil de 1973, de 2001 e 2002, não tem o mesmo alcance da reforma de 1994, quando, por exemplo, se modificou o art. 273 para nele criar a possibilidade ampla de utilização do pedido de antecipação de tutela. Permaneceu carente o sistema brasileiro de intervenção mais profunda, principalmente no campo recursal. Ainda hoje, por exemplo, uma decisão interlocutória proferida em primeiro grau de jurisdição pode, frequentemente, vir a ser reapreciada até pelo STJ mediante a utilização de sucessivos expedientes recursais. Aliás, no campo das liminares em matéria tributária, quase que a totalidade das decisões monocráticas nos juízos de primeiro grau são reapreciadas nos tribunais implicando desperdício de tempo e de recursos materiais. Do ponto de vista do Processo Judicial Tributário muito há que ser revisto para que se alcance a proximidade, a efetividade e a utilidade dos meios no que tange à lide tributária, principal matéria-prima e vasto ramo do ainda embrionário Direito Processual Público. Por essa razão, a terceira etapa das microrreformas do CPC/1973, de 2005 e 2006, procura atender, ainda que em parte, à necessidade de maior controle do sistema recursal e à redução radical do tempo no processo, mesmo que assumindo severos riscos nesse campo como se verá abaixo. Em verdade, o escopo explícito desta terceira etapa de reforma do CPC/ 1973 é o de dar efetividade ao princípio da razoável duração do processo, inserido ao texto constitucional a partir da Emenda n. 45/2004.108-109 Entre estas importantes alterações havidas se destacam aquelas referentes ao regime dos agravos de instrumento e retido (Lei 11.187/ 2005);110 ao processo de execução fundado em título executivo judicial (Lei 11.232/2005);111 à informatização do processo judicial (Lei 11.419/2006).112 São reformulações tipicamente processuais civis que devem ser examinadas no âmbito do Direito Processual Civil e que reflexamente influirão nas lides tributárias. No entanto, existem tópicos da reforma que devem receber menção específica no que se refere à sua inserção no processo tributário pelas suas próprias particularidades. Não estamos afirmando que aquelas reformas são menos importantes que estas, mas, apenas que certos territórios de disciplina processual são mais capazes de gerar problemas especificamente processuais fiscais. Com esse escopo, destacamos sinteticamente alterações abaixo, considerando suas possíveis repercussões no tratamento administrativo e judicial das lides fiscais. Alguns desses tópicos serão melhor desenvolvidos ou estarão referidos nos itens específicos, conforme indicado. É importante ressaltar que a edição do CPC/2015 não isenta o intérprete da compreensão das reformas procedidas no CPC/1973, na medida em que fortemente inspiradoras da nova lei. Veja-se que neste contexto, o CPC/2015 veio em boa hora. Senão vejamos. i) Súmula impeditiva de recursos. Instituiu-se a chamada súmula impeditiva de recurso que preceitua não poder o magistrado receber o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmulas do STJ ou do STF (Lei 11.276/2006). Como nestes tribunais é muito frequente a fixação de enunciados sumulares em matéria fiscal, esta norma poderá ser de dilargada aplicação nesse campo, com o que se potencializam os graves riscos inerentes a esse sistema de bloqueio recursal, sobretudo quando sua aplicação implicar agressão ao princípio constitucional expresso da ampla defesa e à garantia constitucional implícita do duplo grau de jurisdição. Em verdade, tal anômalo efeito bloqueador de recursos somente poderia ser cogitado em se tratando de súmula vinculante – que não é a hipótese, sob pena de incontornável inconstitucionalidade. Além disso, a validade jurídica do impedimento recursal está condicionada à validade jurídica da súmula que ganha potencial efeito geral e abstrato. Justamente por tal efeito, para a adoção lícita da súmula como impeditiva de recurso, o debate jurisprudencial deverá ser quantitativa e geograficamente representativo, qualitativamente completo e temporalmente maduro.113 No CPC/2015 a figura da súmula impeditiva de recursos não subsiste, embora seja possível constatar a existência de mecanismos que se assemelham ao fenômeno. Embora o recurso de apelação deva ser dirigido ao juízo de primeiro grau, nos termos do art. 1.010, § 3.º, os autos devem ser remetidos ao tribunal pelo juiz, independentemente de juízo de admissibilidade. Por outras palavras, o recurso de apelação sofrerá a análise dos seus pressupostos de cabimento pelo relator, no tribunal, não mais passando por um duplo juízo. Ao analisar os seus pressupostos, nos termos do que diz o art. 932, IV, pode o relator negar provimento ao recurso, dentre outras hipóteses, que for contrário à súmula do STF ou do STJ. ii) Julgamento liminar da lide. Acrescentou-se o art. 285-A ao CPC/1973 – doutrinariamente denominado “julgamento de ações ou processos repetitivos” – facultando ao magistrado a possibilidade de julgar liminarmente a lide, independentemente de citação do réu, quando constatar já terem sido proferidas sentenças de improcedência em casos idênticos (sentenças paradigmas) e desde que a questão controvertida seja unicamente de direito (Lei 11.277/2006). Como existe grande homogeneidade qualitativa nas lides tributárias, onde frequentemente discute-se a legalidade ou a inconstitucionalidade de normas introdutoras de obrigações fiscais, esta norma se afigura potencialmente lesiva aos contribuintes, sobretudo por desafiar os princípios constitucionais da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da ampla defesa. De fato, a colidência com a Constituição se estabelece, pois, enquanto esta prescreve que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou a ameaça a direito” (art. 5.º, XXV), e também assegura aos litigantes em processo judicial “o contraditório e a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes” (art. 5.º, LV), o julgamento liminar da lide preconizado pelo art. 285-A cria forma oblíqua, transversa, para afastar substancialmente a tutela judicial cognitiva, colimando eliminar – aparentemente para fins de propiciar economia no tempo do processo – o contraditório
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