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174791051117 TEORIA DO ORDENAMENTO JURIDICO

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TEORIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO: UMA BREVE ABORDAGEM EM TORNO DA DOGMÁTICA DAS 
FONTES DE DIREITO. 
 
1. INTRODUÇÃO. 
 
As normas jurídicas não são válidas em si mesmo, pois são vinculadas a um contexto, ou seja, são dependentes 
da relação da norma com as outras normas do contexto. Ferraz Júnior assenta que o contexto tem de ser reco-
nhecido como uma “relação ou conjunto de relações globais de autoridade”. De uma forma técnica, poder-se-ia 
dizer que a validade da norma jurídica depende do ordenamento em que está inserida. 
 
Com espeque em Ferraz Jr., o ordenamento jurídico brasileiro é o conjunto de todas as suas normas, incluídas 
aqui todas as espécies classificadas anteriormente. Estão também incluídos no ordenamento os critérios de clas-
sificação (como as classificações legais dos bens segundo o artigo 79 e ss. do Código Civil), embora não sejam 
normas em face da inexistência de uma imposição vinculante e institucionalizada. 
 
Encontram-se no ordenamento também as definições (como a definição de doação segundo o Código Civil no 
artigo 538), os preâmbulos (considerações de ordem valorativa e fática, como o da Constituição de 1988), as ex-
posições oficiais dos motivos (em que o legislador revela as razões pelas quais foram estabelecidas as normas). 
 
O conceito de ordenamento é operacionalmente importante para a dogmática jurídica: ele permite a integração 
das normas num conjunto, dentro do qual é possível identificá-las como normas jurídicas válidas. É um “sistema 
dinâmico” (Kelsen), que, em oposição ao estático, capta as normas dentro de um processo de transformação con-
tínua. Normas são promulgadas; atuam; são substituídas; são revogadas ou perdem sua atualidade em face de 
alterações nas situações normatizadas etc. Para dizer se a norma é válida, é necessário integrá-la nesse conjunto 
sistêmico. 
 
2. O ORDENAMENTO JURÍDICO SEGUNDO KELSEN 
 
Para Kelsen, o ordenamento é um sistema unitário, marcado por um princípio que organiza e mantém o conjunto 
como um todo homogêneo (a norma fundamental). As normas do ordenamento compõem séries escalonadas. 
 
No escalão mais alto está a primeira norma da série, de onde todas as demais derivam. 
 
A estrutura do ordenamento jurídico, para Kelsen, é piramidal: 
 
 
 
A sentença é a norma elementar da pirâmide. Kelsen a denomina de “norma específica”. A norma jurídica pode 
ser genérica ou específica. A sentença é a norma mais específica possível. Acima dela, estão as leis (ordinárias e 
complementares). Acima das leis, as emendas constitucionais e, acima destas, a Constituição. 
 
Registre-se que a Constituição não é a norma fundamental para Kelsen, tampouco é a norma mais importante ou 
relevante da estrutura piramidal. A norma mais importante para Kelsen é a Norma Fundamental. A norma funda-
mental é o princípio que organiza e mantém o ordenamento jurídico como um todo homogêneo. 
 
 
 
 
 
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É com base na estrutura piramidal que se pode entender a explicação kelseniana de validade: uma norma vale em 
relação a outra norma, que a antecede hierarquicamente. Essa relação norma/norma é uma relação de validade 
(relação sintática). E identificar a validade de uma norma significa verificar sua relação de subordinação em decor-
rência de outra norma. 
 
A sentença é válida porque encontra apoio na norma que lhe é imediatamente superior, a lei. A lei é válida porque 
está conforme a norma imediatamente superior, as emendas constitucionais. As emendas constitucionais são 
válidas porque estão conforme uma norma imediatamente superior, a Constituição. 
 
Esse tipo de raciocínio, entretanto, levaria a um problema: o de regressão ao infinito. Essa série normativa (de 
encadeamento de normas) deve encontrar seu fim, isto é, a norma que fundamenta todas as demais. Se para 
encontrar a validade das normas, é preciso recorrer a uma hierarquia de normas, Kelsen recorre a uma norma 
básica (grundnorm) acima da própria Constituição, cuja função é outorgar-lhe validade, validando, desta forma, 
todo o conjunto. A norma fundamental é, portanto, o pressuposto lógico do ordenamento. 
 
Lembre-se que, para Kelsen, a explicação do que é norma jurídica e do que é ordenamento jurídico parte do raci-
ocínio que a norma jurídica é um juízo lógico de natureza hipotética. 
 
Por isto, pode-se pensar que o ordenamento jurídico também é uma estrutura lógica. E, para que ele preserve sua 
coerência, acima de todas as normas deve haver uma primeira norma que não possui nenhuma outra norma que 
a anteceda e que justifique todas as normas que em razão dela existem no ordenamento jurídico. Esse é o pres-
suposto lógico do ordenamento. 
 
Pressuposto porque não é um conteúdo passível de comprovação, mas, sim uma premissa do raciocínio lógico. 
 
Do ponto de vista de uma análise empírica, a norma fundamental não existe. A norma fundamental é pura hipóte-
se, desprovida de qualquer conteúdo ético ou empírico. Você não vai encontrá-la em qualquer texto de lei ou na 
Constituição, pois ela não está escrita em nenhum lugar. Ela é uma pressuposição lógica para que o ordenamento 
jurídico tenha coerência lógica. Enfim, ela tem forma, mas não conteúdo. 
 
A norma fundamental é responsável pela validade de todas as outras normas e possui uma qualidade diferente. 
Ela não á válida no mesmo sentido das demais. 
 
A validade é um conceito relacional para Kelsen (relação norma/norma, em que uma é válida porque está confor-
me outra que lhe é imediatamente superior) e, por isso, a norma fundamental (ou primeira norma) não pode se 
relacionar a outra, pois, senão, não seria a primeira. 
 
“Se dissermos que a sentença de um juiz (norma individual) repousa sobre as (...) normas gerais de competência 
e de obrigação, e estas, sobre as normas constitucionais, em que repousa a validade destas? As normas constitu-
cionais, como as demais, são postas por uma autoridade competente, diz ele [Kelsen]”. 
 
Para explicar sua validade, precisa-se admitir outra norma que não é posta, visto que não deve exigir outra norma 
que lhe confira validade. Desta forma, a norma fundamental é pressuposta. Ela prescreve que o “jurista reconheça 
uma primeira norma posta como fundamento das demais normas postas e que raciocine a partir dela (por exem-
plo, a norma estabelecida por revolução ou pelo povo ou pela tradição etc.)”. Como consequência, a norma fun-
damental possui uma espécie de validade que não é do tipo relacional, mas das condições do próprio pensamen-
to: seria uma condição transcendental do pensar, segundo o próprio Kelsen. 
 
3. ORDENAMENTO JURÍDICO POR BOBBIO E POR HART 
 
A pressuposição de Kelsen foi muito criticada por filósofos do direito. A crítica fundamentou-se, sobretudo, na 
abstração da construção da norma fundamental, ou seja, na falta de explicações de como se daria o pontapé ini-
cial para a construção de um (...) ordenamento jurídico. Isto levou Norberto Bobbio, mais tarde, a afirmar que a 
explicação de norma fundamental de Kelsen não seria satisfatória. Bobbio observa que Kelsen procura o impossí-
vel com uma validade que não seja relacional e, com isto, propõe que a norma fundamental se identifique com um 
ato de poder. 
 
A norma primeira seria, portanto, posta por um poder fundante da ordem jurídica cuja característica é a efetivida-
de: “ou o poder se impõe ou não é poder fundante e não se terá norma fundamental”. Nesta perspectiva, se qual-
quer norma é posta, nem toda norma é válida. Um magistrado pode prolatar uma sentença fora de sua competên-
 
 
 
 
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cia: houve positivação, mas a norma não é válida. Essa relação entre positividade e validade, entretanto se estrei-
ta à medida que se sobe na pirâmide. Ao chegar ao poder constituinte, não haverá mais distância entre norma 
posta e normaválida, visto que tal poder, ao positivar a norma já a estabelece como válida. 
 
Já Herbert Hart, filósofo do direito inglês, propõe explicação diversa de Bobbio e de Kelsen. 
 
Ele também concebe o ordenamento jurídico como um sistema dinâmico e unitário, e, para que se possa identifi-
car a validade das demais normas, é necessário que exista uma norma de reconhecimento, isto é, uma norma que 
permita identificar outras normas como pertencentes ao sistema. Entretanto, a norma de reconhecimento, que 
deve ser a última da série normativa, não é válida e nem inválida: ela apenas existe. Não é uma condição do pen-
sar (como afirmara Kelsen), já que, se ela existe, ela é usada no âmbito do ordenamento jurídico da sociedade. 
Do ponto de vista externo (imagine-se um teórico do direito descrevendo o ordenamento jurídico), a norma de 
reconhecimento seria um dado objetivo: legisladores e magistrados lançariam mão dela como ponto de partida 
para sua atividade. 
 
Do ponto de vista interno (magistrado prolatando uma sentença ou um cidadão cumprindo determinada norma), a 
norma de reconhecimento é uma regra que se assume. 
 
Importante é registrar que existe e existiu grande discussão entre os autores. A norma fundamental é o aspecto 
mais criticado na doutrina de Kelsen. Sua teoria é demasiado abstrata e se tem grande dificuldade de associá-la 
ao mundo real. 
 
Registre-se ainda que Tércio Sampaio Ferraz Junior não adotou a expressão “ordenamento jurídico” em sua teo-
ria. 
 
Ele distingue “ordenamento” de “sistema”. Embora grande parte dos autores utilize “ordenamento” como sinonímia 
para “sistema jurídico”, não se deve incorrer neste erro. Pode-se admitir “ordenamento” e “sistema” como sinôni-
mos quando se estiver falando de Norberto Bobbio, de Hans Kelsen ou de Miguel Reale. 
 
Mas, para Tércio Sampaio, para Niklas Luhmann e para Marcelo Neves, inexiste tal confusão. Para estes últimos, 
o conceito de ordenamento como sistema não admite uma só hierarquia, mas várias, não existindo, portanto, uma 
única norma fundamental. É o que se verá a seguir. 
FERRAZ JR., op. cit., 1994, p. 187. 
 
4. A TEORIA SISTÊMICA DE TÉRCIO (LUHMANN E NEVES) 
 
Para Ferraz Jr., “ordenamento” como “conjunto de normas” é uma ideia estática. Pode-se pensar, de um lado, que 
a ideia da pirâmide adotada por Kelsen seja útil para demonstrar a hierarquia entre as normas jurídicas de um 
dado ordenamento, mas, de outro, ela pode levar a um grande equívoco, o de sugerir fossilização; ou dificuldade 
do ordenamento de acompanhar as transformações sociais. 
 
O desenho piramidal que Kelsen utiliza sugere que qualquer modificação do ordenamento jurídico suscitaria um 
processo mais estático, resistente e engessado que numa concepção de sistema que procure representar uma 
(...) formação mais dinâmica. 
 
O que se explica aqui é uma noção de ordenamento de maneira mais dinâmica possível, que consiga acompanhar 
a velocidade das transformações sociais. É neste intuito que Tércio se utiliza do conceito de sistema, e não de 
ordenamento. 
 
A concepção de sistema tem caráter dinâmico. 
 
Embora a expressão “sistema dinâmico” venha de Kelsen, a ideia de sistema permite traçar os contornos neces-
sários ao Direito (se se está ou não diante de uma norma jurídica; ou se sua prescrição é válida etc.), uma vez 
que “sistema” traz uma noção de “limite” – linha abstrata diferencial que autoriza a identificar o que está dentro ou 
fora do sistema, bem como o que entra e o que sai dele. A representação gráfica para a noção de sistema é a 
circular, vez que Tércio, com espeque em Luhmann, afirma que o círculo representaria com mais fidedignidade a 
dinâmica do sistema, ou seja, a capacidade do sistema de se adaptar às transformações sociais. 
 
 
 
 
 
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Além da ideia de alteridade, de circularidade e de constante troca, Alisson Alessandro Mascaro sugere a figura de 
uma ameba como a representação gráfica que melhor possibilitaria identificar essa capacidade de transforma-
ção/mutação em relação ao ambiente em que se encontra o sistema. 
 
Ressalte-se que, qualquer que seja a representação gráfica utilizada, o que se deve ter em mente é a capacidade 
de adaptação às transformações sociais. 
 
LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas. 2ª edição. Tradutor: Ana Cristina Arantes Nasser. Petrópolis: 
Editora Vozes, 2010, p. 
FERRAZ JR., p. 188. 
 
O sistema mantém-se numa troca constante com o ambiente em que está situado. Tanto o sistema interfere no 
ambiente, quanto o ambiente interfere no sistema. Isso ocorre de forma constante. A troca entre sistema e ambi-
ente ocorre por meio de duas palavras-chave: abertura normativa e fechamento normativo. 
 
O sistema se abre para a informação advinda do ambiente e se fecha para descartar uma parte da informação 
advinda do ambiente. Em seguida, o sistema seleciona uma parcela da informação oriunda do ambiente e descar-
ta a outra parcela. O sistema não assimila toda a informação oriunda do sistema, pois estaria colocando em jogo 
sua própria autonomia, sua sobrevivência. 
 
Ele assimila a informação para poder se adaptar ao ambiente (em face da mutabilidade do ambiente), mas não 
assimila o todo. 
 
Na acepção de Ferraz Jr., poder-se-ia afirmar que o ordenamento jurídico, além de ser composto por um conjunto 
de elementos normativos e não-normativos, é também uma estrutura, ou seja, um conjunto de regras que deter-
minam as relações entre os elementos. 
 
É o próprio Tércio que esclarece: “uma sala de aula é um conjunto de elementos,as carteiras, a mesa do profes-
sor, o quadro-negro, o giz, o apagador, a porta etc.; mas estes elementos, todos juntos, não formam uma sala de 
aula, pois pode tratar-se de um depósito da escola; é a disposição deles, uns em relação aos outros, que permite 
identificar a sala de aula; esta disposição depende de regras de relacionamento; o conjunto destas regras e das 
relações por ela estabelecidas é a estrutura”. 
 
O conjunto dos elementos constitui apenas o repertório. 
 
Quando se afirma que a sala de aula é um conjunto de relações (estrutura) e de elementos (repertório), pensa-se 
nela como um sistema. O sistema é um todo composto por estrutura e repertório. Assim, o ordenamento jurídico é 
um sistema. 
 
A estrutura entre as normas jurídicas ocorre de forma circular (e não linear) e haverá um encadeamento, uma 
espécie de série normativa. Imagine-se que cada norma é um círculo, que vai interferir em outro círculo (norma), 
que vai interferir em outro e assim por diante. 
 
Esse encadeamento normativo circular culmina em uma primeira norma, isto é, necessariamente tem um término; 
não é infinito. Não é infinito porque a relação de subordinação não é causal-linear, que implica relações lineares 
que se prolongam infinitamente nos dois lados da série: “toda causa produz um efeito que é causa de outro efeito, 
e assim por diante; e todo efeito provém de uma causa que, regressivamente, é feito de uma causa, que é efeito 
de outra causa etc.”. 
 
A série deve ter um ponto final, senão a subordinação perderia o sentido: pense-se na autoridade que estabeleceu 
a competência de determinado magistrado para julgar ações de certa matéria. Qual seria a autoridade que estabe-
leceu a competência daquela primeira autoridade pra determinar as competências do magistrado? E assim suces-
sivamente poder-se-ia chegar ao infinito. O problema, portanto, é explicar como se interrompe a série normativa 
circular do sistema, tanto regressivamente (a norma-origem) quando progressivamente (decisão final). Isso ocorre 
por meio da regra de calibração. 
 
Através da regra de calibração é que o sistema se ajusta ao ambiente externo. Ela coordena/orienta a substituição 
de uma série normativa por outra. 
 
 
 
 
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A expressão vem da cibernética, trata-se de regrasde regulagem; de ajustamento de um sistema. Pense-se numa 
geladeira, cujo controle da temperatura interna é feita por um maquinismo de produção de ar gelado. Esse maqui-
nismo é regulado através do termostato, que permite o mantimento de determinada temperatura. 
 
Ocorre que a temperatura de uma geladeira não se mantém estável o tempo inteiro. Fora da geladeira, ou seja, no 
ambiente, a temperatura pode atingir 30 graus ou pode atingir 10 graus. 
 
A geladeira irá trabalhar de acordo com a informação que vem do ambiente. Se a geladeira é aberta diversas ve-
zes durante o dia, o ambiente vai fornecer calor para seu interior no momento em que a porta é aberta (recepção 
de uma (ou mais) informação advinda do ambiente); quando a porta é fechada, o termostato assimila que precisa 
mandar um comando para o motor, a fim de que este volte a produzir frio para manter a temperatura desejada. 
Por outro lado, se a porta da geladeira não é aberta muitas vezes, o comando é que se fique em stand by, ou seja, 
que o motor cesse de fazer frio, já que se atingiu a temperatura almejada. 
 
O termostato é a regra de calibração. Ele vai calibrar o sistema, ajustá-lo ao ambiente externo. 
 
Tércio aduz que os sistemas normativos jurídicos “são constituídos primariamente por normas (repertório do sis-
tema) que guardam entre si relações de validade reguladas por regras de calibração (estrutura do sistema)”. 
 
Todo sistema atua num ambiente, o sistema social, que é nada mais que a própria vida social, que lhe atribui de-
mandas (sobretudo conflitos que ensejam decisão). Para seu funcionamento, as normas são organizadas por 
séries hierárquicas de validade, que culminam numa norma-origem. Quando “uma série não dá conta das deman-
das, o sistema exige uma mudança em seu padrão de funcionamento, o que ocorre pela criação de nova norma-
origem e, em consequência, de nova série hierárquica. O que regula esta criação e, portanto, a mudança de pa-
drão, são suas regras de calibração. Graças a elas, o sistema muda de padrão, mas não se desintegra: continua 
funcionando”. 
 
Observe-se o exemplo dado por Tércio do famoso julgamento havido no Tribunal de Nuremberg após a 2ª Guerra 
Mundial. 
 
Grande dilema dos magistrados à época era o fato de inexistirem normas de Direito Internacional Penal que tipifi-
cassem genocídio como crime. Em vigor já estava o princípio nullum crimen nulla poena sine lege (não há crime 
nem pena sem lei anterior que os definam). Mas como responsabilizar os nazistas pelos crimes ocorridos? O Tri-
bunal definiu “genocídio” como crime contra (...) humanidade e, para escapar ao princípio do nullum crimen, invo-
cou a existência de determinadas exigências fundamentais de vida na sociedade internacional que implicariam a 
responsabilidade penal dos governantes e dos seus executantes. Em termos sistêmicos, houve uma mudança de 
padrão: o padrão de funcionamento do ordenamento penal internacional – padrão de legalidade, regido pelo prin-
cípio nullum crimen nulla poena sine lege – foi convertido para um padrão de legitimidade, regido pelo princípio de 
exigências fundamentais de vida na sociedade internacional. Tais princípios são regras de calibração de um sis-
tema normativo. 
 
As regras de calibração estatuem relações dinâmicas, surgem e desaparecem a todo momento e têm como fonte 
a jurisprudência, a doutrina, a política, a moral, a religião etc. Pode-se depreender dos exemplos que o sistema 
jurídico não possui uma norma fundamental, mas muitas, milhares! Enquanto em Kelsen, há uma norma funda-
mental (“a” norma fundamental), para Tércio há várias! No Tribunal de Nuremberg, o princípio do nullum crimen 
constituía uma série normativa regulando o direito penal internacional. Quando se viu a hipótese de impunidade 
dos criminosos nazistas (informação advinda do ambiente), o Tribunal viu-se obrigado a substituir tal encadea-
mento por outro tipo de série, o princípio de exigências fundamentais de vida na sociedade internacional. Se não 
há esta mudança de padrão, o sistema entra em colapso: autodestruição. A regra de calibração traduz-se na ten-
tativa de reajustamento do sistema ao ambiente. 
 
Em suma, enquanto sistemas dinâmicos, o ordenamento jurídico possui grande mobilidade: tudo está em movi-
mento, daí a dificuldade de operá-lo. Cabe ao jurista operar essa possibilidade de jogo. É por isso que ele precisa 
lançar mão de conceitos operacionais dinâmicos, sob pena de os conflitos sociais serem indecidíveis (proibição 
em face do princípio da vedação ao non liquet). 
 
É importante ressaltar, por fim, que não é só o ambiente que interfere no sistema, trazendo-lhe novas informa-
ções. 
 
 
 
 
 
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Pode haver também interferência de um sistema sobre outro: é o acoplamento estrutural. Por exemplo, o sistema 
religioso interfere no Direito quando, em relação ao Código Penal, pleiteia pelo mantimento do aborto como crime. 
 
Mas cabe ao Direito, por meio de sua estrutura e repertório, regular essa interferência do sistema religioso. 
 
Quando um sistema troca informações com o ambiente ou com outro sistema, através de abertura e fechamento 
normativos, ele está preservando sua própria existência. A isto se dá o nome de autopoiese. Autopoiese é a capa-
cidade do sistema jurídico de produzir suas próprias normas, isto é, a capacidade de se manter vivo e, ao mesmo 
tempo, de se adaptar, trocando ou se comunicando com o ambiente ou com outro sistema. A base dessas trocas 
(com o ambiente ou com outro sistema) é a comunicação. Cada sistema possui uma linguagem específica e um 
código binário específico (lícito/ilícito no caso do Direito). O sistema econômico possui uma linguagem específica e 
um código binário específico (ter dinheiro/não ter dinheiro). 
 
Ao mesmo tempo em que o Direito troca com a Economia ou com a Religião, e esses trocam com o ambiente, 
tem-se a estruturação da sociedade. A sociedade é o grande ambiente, dentro do qual há todos esses sistemas 
interagindo entre si ao mesmo tempo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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