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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL DISCIPLINA: PRODUÇÃO DE BOVINOS LEITEIROS FATORES QUE AFETAM A COMPOSIÇÃO DO LEITE Discentes: Daiane Cristina Becker Scalez Leni Rodrigues Lima Docente: Daniel de Paula Souza Cuiabá-MT 2010 ÍNDICE 1. Introdução ........................................................................................................................... 1 2. Composição do leite ........................................................................................................... 2 2.1 Água.............................................................................................................. ................... 3 2.2 Glicídeos ........................................................................................................................... 3 2.3 Gordura ............................................................................................................................. 3 2.3.1 Síntese de Gordura ........................................................................................................ 4 2.4 Proteína ............................................................................................................................. 5 2.4.1 Síntese de Proteína ........................................................................................................ 6 2.5 Minerais ............................................................................................................................ 7 2.6 Vitaminas .......................................................................................................................... 8 3. Qualidade do Leite.............................................................................................................. 9 3.1 Classificação do Leite (Instrução Normativa 51/2002) .................................................. 10 3.2 Coleta do Leite Cru e seu Transporte a Granel (Instrução Normativa 51/2002) ............ 14 4. Fatores que afetam a composição do leite ........................................................................ 15 4.1 Fatores que afetam a gordura do leite ............................................................................. 16 4.1.1 Raça ............................................................................................................................. 16 4.1.2 Relação Concentrado:Volumoso ................................................................................. 16 4.1.3 Fibra Efetiva ................................................................................................................ 18 4.1.4 Tipo de concentrado e seu processamento .................................................................. 19 4.1.5 Adição de gordura na dieta .......................................................................................... 20 4.1.6 Aditivos ....................................................................................................................... 22 4.1.7 Teoria dos ácidos graxos trans (AGT) na redução da gordura do leite.............................................................................................................. ......................... 23 4.1.8 Ácido linolênico conjugado (CLA) ............................................................................. 23 4.1.9 Utilização de Somatotropina e seus efeitos ................................................................. 25 4.2 Fatores que afetam o teor da proteína do leite ................................................................ 26 4.2.1 Ingestão de energia ...................................................................................................... 27 4.2.2 Proteína da dieta .......................................................................................................... 28 4.2.3 Ingestão de gordura ..................................................................................................... 29 4.2.4 Aditivos ....................................................................................................................... 30 4.2.5 Uso de uréia ................................................................................................................. 30 4.2.6 Metionina ..................................................................................................................... 31 4.2.7 Fatores Genéticos ........................................................................................................ 32 5. Fatores Ambientais ........................................................................................................... 34 6. Transtornos metabólicos e composição do leite ............................................................... 43 6.1 Síndrome do Leite Anormal (SILA) ............................................................................... 43 6.2 O Balanço Energético Negativo ..................................................................................... 45 6.3 Acidose Ruminal ............................................................................................................ 47 7. Fatores econômicos realacionados à composição do leite................................................ 48 8. Considerações Finais ........................................................................................................ 54 9. Referências Bibliográficas ................................................................................................ 55 Lista de Tabelas Tabela 1. Composição química do leite em várias raças bovinas .......................................... 2 Tabela 2. Leite Pasteurizado tipo A...................................................................................... 10 Tabela 3. Leite Cru refrigerado tipo B Integral .................................................................... 11 Tabela 4. Leite Pasteurizado tipo B.. .................................................................................... 12 Tabela 5. Leite Cru e Refrigerado tipo C ............................................................................. 13 Tabela 6. Leite Pasteurizado tipo C ...................................................................................... 14 Tabela 7. Efeito do teor de concentrado em dietas com elevada quantidade de gordura insaturada na gordura do leite ............................................................................................... 17 Tabela 8. Efeito da proporção volumoso : concentrado sobre a fermentação no rúmen ...... 19 Tabela 9. Valores percentuais de ácidos graxos agrupados na gordura do leite (g/100g de gordura) ................................................................................................................................ 24 Tabela 10. Médias e coeficientes de variação aparentes (CV) da produção de leite (PL), produção de leite corrigida (PLC) para 4% de gordura, em kg/dia, e da produção de gordura, em porcentagem (G%) e em kg/dia (Gkg), segundo os tratamentos....................26 Tabela 11. Médias diárias para PL, PLC, produção de gordura (G) no leite (em % e em g/dia) e eficiência de utilização do nitrogênio (Kg N no leite/Kg N ingerido) e da MS ingerido (Kg leite/Kg de MS ingerida) obtidas para as diferentes fontes protéicas das dietas .................................................................................................................................... 29 Tabela 12. Produção de leite corrigida (PLC) para 3,5% de gordura (G), teores e quantidades de G e proteínabruta (PB) do leite, em função dos teores dos compostos nitrogenados não-protéicos (NNP) das rações e coeficientes de variação (CV) .................. 31 Tabela 13. Produções de leite, gordura e proteína e teores de gordura e proteína em vacas zebuína, taurinas e mestiças ................................................................................................. 33 Tabela 14. Produção, Composição e escore de células somáticas do leite nos diferentes meses de controle leiteiro, em rebanhos da raça Holandesa no Rio Grande do Sul ............. 35 Tabela 15. Produção, Composição e escore de células somáticas do leite nos diferentes anos de controle leiteiro, em rebanhos da raça Holandesa no Rio Grande do Sul ............... 38 Tabela 16. Produção, composição e escore de células somáticas do leite, em relação ao tempo em controle leiteiro, em rebanhos da raça Holandesa no Rio Grande do Sul ........... 39 Tabela 17. Produção, composição e escore de células somáticas do leite, em relação ao estádio da lactação, em rebanhos da raça Holandesa no Rio Grande do Sul ....................... 40 Tabela 18. Produção, composição e escore de células somáticas do leite, em relação à idade ao parto, em rebanhos da raça Holandesa no Rio Grande do Sul ............................... 42 Tabela 19. Características físico-químicas do leite cru e critérios base para o diagnóstico da Síndrome do Leite Anormal ............................................................................................ 44 Tabela 20. Indicadores de alterações na composição do leite e a alteração relacionada ...... 44 Tabela 21. Estado natural e distribuição de corpos cetônicos (mmol/l) na circulação plasmática livre ..................................................................................................................... 46 Tabela 22. Ênfase econômica relativa (%) para variáveis produtivas e não-produtivas no índices: Net Merit (NM$), Cheese Merit (CM$) e Fluid Merit (FM$) ................................ 49 Tabela 23. Preço dos componentes do leite nos índices: Net Merit (NM$), Cheese Merit (CM$) e Fluid Merit (FM$) .................................................................................................. 49 Tabela 24. Tabelas de valores de bonificação/penalização em função dos parâmetros de qualidade do leite, como gordura, proteína, contagem de células somáticas e contagem bacteriana total ...................................................................................................................... 51 Tabela 25. Porcentagem média de bonificação ou penalização pela qualidade de leite e os respectivos valores econômicos apresentados durante os meses do período experimental . 52 Tabela 26. Porcentagem média de bonificação ou penalização pela qualidade de leite apresentadas durante as épocas do ano avaliadas ................................................................. 53 1 1. Introdução A glândula mamária é um dos órgãos mais diferenciados e metabolicamente ativos do corpo animal. O início da lactação é marcado por inúmeras alterações no metabolismo, o qual volta-se quase que totalmente para esta glândula. Ocorre um incremento na taxa metabólica pelo aumento na demanda de nutrientes, e energia para suprimento da glândula. O aporte de nutrientes para o processo de síntese dos componentes do leite pode ser de origem endógena (mobilização das reservas orgânicas), ou de origem exógena, principalmente através da ração, que compreende todo o alimento recebido durante um período de 24 horas (Fontaneli, 2001). A composição do leite é determinante para o estabelecimento da sua qualidade nutricional e adequação para processamento e consumo humano. A biossíntese do leite ocorre na glândula mamária, sob controle hormonal. Muitos dos constituintes são sintetizados nas células secretoras e alguns são agregados ao leite diretamente a partir do sangue e do epitélio glandular. Estima-se que o leite possua em torno de cem mil constituintes distintos, cada uma destas moléculas apresenta uma função específica, propriciando nutrientes e proteção imunológica para o neonato (Silva, 1997). Para os humanos o leite assume papel importante na dieta, devido ao alto valor biológico de seus nutrientes (proteínas, lipídeos, glicídeos, minerais e vitaminas), além disso, o leite permite grande variedade de processamentos industriais de diversos produtos. A composição do leite bovino varia em função de muitos fatores que incluem: raça, estágio de lactação, estação do ano, idade e principalmente nutrição. 2 2. Composição do Leite Segundo a Instrução Normativa 51/2002, entende-se por leite, sem outra especificação, o produto oriundo da ordenha completa e ininterrupta, em condições de higiene, de vacas sadias, bem alimentadas e descansadas. O leite de outros animais deve denominar-se segundo a espécie de que proceda. O leite bovino é um fluido comum da secreção da glândula mamária, composto por uma série de nutrientes, a partir de precursores derivados da alimentação e do metabolismo. Os componentes incluem água, glicídeos, gordura, proteína, minerais e vitaminas (Tabela 1). A formação do leite demanda um enorme trabalho metabólico. Em uma vaca leiteira, é requerida a passagem de cerca de 450 litros de sangue para produzir 1 litro de leite. A quantidade de leite produzido varia muito em função da espécie e da raça, além da variação individual (González, 2001). Os componentes citados anteriormente podem ser classificados de acordo com sua contribuição por unidade de massa, como principais e secundários. Os constituintes principais são a água, a gordura, as proteínas e a lactose, enquanto os constituintes secundários englobam basicamente minerais e vitaminas (Dürr et al., 2001). Tabela 1. Composição química do leite em várias raças bovinas Raça Gordura (%) Proteína (%) Relação Proteína/ Gordura Lactose (%) Cinzas (%) Sólidos Totais (%) Ayrshire 4,1 3,6 0,9 4,7 0,7 13,1 Pardo Suíço 4,0 3,6 0,9 5,0 0,7 13,3 Guernsey 5,0 3,8 0,8 4,9 0,7 14,4 Holstein 3,5 3,1 0,9 4,9 0,7 12,2 Jersey 5,5 3,9 0,7 4,9 0,7 15,0 Zebu 4,9 3,9 0,8 5,1 0,8 14,7 Holandês 3,64 3,2 0,88 4,56 0,7 12,98 Fonte: González (2001). 3 2.1 Água É o constituinte quantitativamente mais importante, correspondendo aproximadamente 87% do total. A quantidade de água no leite é regulada pela quantidade de lactose sintetizada pelas células secretoras da glândula mamária. A água destinada ao leite é transportada à glândula mamária pelo sangue. A produção de leite é rapidamente afetada pelo suprimento de água e diminui quando a água destinada ao consumo animal é limitada (Wattiaux, 1996). 2.2 Glicídeos O principal carboidrato no leite é a lactose. É um dissacarídeo composto pelos monossacarídeos D-glicose e D-galactose, ligados por ponte glicosídica ß-1,4. A lactose é o principal fator osmótico no leite, responsável por 50% desta variável, além disso tem importante papel na síntese do leite atraindo água para as células epiteliais mamárias. Em função da estreita relação entre a síntese de lactose e a quantidade de água drenada para o leite, o conteúdo de lactose é o componente do leite que tem menos variação, sendo similar em todas as raças leiteiras (González, 2001). No intestino do ruminante neonato e nos não-ruminantes, a lactose é quebrada em unidades de glicose e galactose pela enzima lactase. A lactose é a principal fonte de energia para animais neonatos. Outros carboidratos são encontrados no leite, porém em baixas concentrações: glicoselivre (cerca de 0,1 mM) e galactose livre (0,2 mM) (González, 2001). A glicose é o principal precursor da lactose, contribuindo com cerca de 60 a 70% da síntese da lactose. O restante da glicose é utilizado nas células secretoras para a síntese de proteína, glicerol ou outros precursores para síntese de gordura (Fontaneli, 2001). 2.3 Gordura A gordura constitui cerca de 3,5 a 6,0% do leite, variando entre raças bovinas e práticas de alimentação. É a principal fonte disponível de lipídeos pelo mamífero neonato para acumular reserva adiposa nos primeiros dias de vida. O componente lipídico do leite é formado por uma complexa mistura, sendo os triglicerídeos os lipídeos mais importantes (98%), envolvidos por uma membrana lipoproteica. O leite de vaca possui aproximadamente 440 ésteres de ácidos graxos e os principais são o ácido 4 palmítico e o ácido oleico. A gordura é o constituinte que mais sofre variações (Tabela 1) em razão de alimentação, raça, estação do ano e período de lactação (Silva, 1997). A gordura está presente no leite em glóbulos pequenos suspensos em água. Cada glóbulo é revestido por uma camada de fosfolipídios que previne os glóbulos de se agregarem, por repulsão dos outros glóbulos de gordura e atração de água. Enquanto essa estrutura estiver intacta, a gordura do leite permanece como uma emulsão. A gordura do leite contém predominantemente ácidos graxos de cadeia curta (cadeia de menos de 8 átomos de carbono) provenientes de unidades de ácido acético derivadas da fermentação no rúmen. Os ácidos graxos de cadeia média (8-12 C) são uma característica única da gordura do leite comparada com outras gorduras animais e vegetais. Os ácidos graxos de cadeia longa no leite são principalmente ácidos insaturados (deficiente em hidrogênio), sendo predominante o oleico (cadeia de 18 carbonos), linoleicos poliinsaturados e ácidos linolênicos (Wattiaux,1996). 2.3.1 Síntese da gordura O ácido acético e o ácido butírico são os principais precursores da gordura na glândula mamária, se tomarmos como base a absorção dos ácidos graxos voláteis (AGV), pela mucosa das papilas ruminais. O ácido acético é a principal fonte de energia para os tecidos. Já o ácido propiônico é preservado para biossíntese de glicose e galactose para obtenção da lactose. A proporção entre os ácidos graxos é definida pela relação entre volumoso e concentrado. A amplitude de contribuição do acetato na síntese de lipídeos no tecido epitelial fica entre 17 e 45% e para o butirato entre 8 e 25%, o restante provém dos próprios ácidos graxos presentes na corrente sanguínea (Fontaneli, 2001). González (2001), coloca que os ruminantes sintetizam pequenas quantidades de ácidos graxos a partir da glicose, devido à falta de atividade da enzima citrato-liase. O acetil-CoA, formado nas mitocôndrias a partir do piruvato, não pode passar diretamente ao compartimento citoplasmático, devendo ser antes convertido em citrato, que passa sem dificuldades ao citoplasma. Como a atividade da enzima citrato-liase é baixa. O acetil-CoA utilizado pela glândula mamária dos ruminantes para a síntese da gordura do leite se forma fundamentalmente a partir do acetato proveniente do sangue, que por sua vez, deriva em grande parte do acetato absorvido no rúmen. 5 Aproximadamente 25% dos ácidos graxos do leite são derivados da dieta e 50% do plasma sanguíneo. A glândula mamária possui a enzima glicerol-quinase, podendo portanto produzir glicerol-3-fosfato a partir de glicerol livre, para a síntese de triglicerídeos. Contudo, cerca de 70% do glicerol necessário para a síntese de triglicerídeos na glândula mamária provém da glicose sanguínea (González, 2001). De forma mais simplificada pode-se dizer que, os triglicerídeos (98% da gordura total) são sintetizados nas células epiteliais da glândula mamária e podem vir de duas fontes: a partir dos lipídeos do sangue e pela síntese “de novo” nas células epiteliais. As gorduras de origem vegetal são altamente insaturadas (deficientes em átomos de hidrogênio), desta forma, quando ingeridas sofrem uma biohidrogenação no rúmen, antes de serem absorvidas pela corrente sanguínea. Os triglicerídeos são transportados pelo sangue até a glândula mamária, onde sofrem a quebra em subunidades de glicerol e ácidos graxos livres que podem, então, ser absovidos pelas células da glândula mamária onde são utilizados para a síntese de gordura que será secretada no leite (Fontaneli, 2001). 2.4 Proteína Segundo Santin (2005), a fração protéica do leite contém um grande número de compostos biologicamente ativos. Além das proteínas do leite, caseínas e proteínas do soro do leite, existem também pequenas quantidades de outras proteínas e peptídeos. O leite bovino contém vários compostos nitrogenados, dos quais aproximadamente 95% ocorrem como proteínas e 5% como compostos nitrogenados não-proteicos. O nitrogênio proteico do leite é constituído de cerca de 80% de nitrogênio caseínico e de 20% de nitrogênio não-caseínico (albuminas e globulinas). Diversos fatores influenciam na composição e na distribuição das frações nitrogenadas do leite bovino, tais como temperatura ambiente, doenças do animal, estágio de lactação, número de parições, raça, alimentação e teor energético da alimentação (Silva, 1997). Os blocos construtores da proteína são os aminoácidos. Existem 20 aminoácidos que são geralmente encontrados nas proteínas. A ordem dos aminoácidos na proteína confere a esta uma função específica. A concentração da proteína no leite varia de 3,0 a 4,0% (30–40 gramas por litro). A porcentagem varia com a raça da vaca e com a proporção da quantidade de gordura no leite (Wattiaux, 1996). 6 A classificação de caseína e proteínas do soro seguiu o processo de fabricação de queijo, que consiste na separação dos cubos de caseína do soro após a coagulação do leite sob a ação da renina (enzima digestiva coletada do estômago de bezerros). O comportamento dos diferentes tipos de caseína (α, β ε κ) no leite quando tratados com calor, pH diferente (acidez) e concentração de sal diferente resulta nas características dos queijos, produtos lácteos fermentados e diferentes formas de leite (condensado, seco, etc.). Ocasionalmente, crianças pequenas são alérgicas a leite porque seus organismos desenvolvem uma reação às proteínas do leite. A alergia causa vermelhidão, asma, e/ou desordens gastrointestinais (cólica, diarréia, etc.). Em casos de alergia, leite de cabra é geralmente utilizado como um substituto, entretanto às vezes leite com caseína hidrolizada tem que ser utilizado (Wattiaux, 1996). A caseína tem uma composição de aminoácidos apropriada para o crescimento dos animais jovens, sendo de grande importância para a alimentação humana. A caseína é secretada pelas células alveolares na forma de micelas, que são agrupamentos de caseínas ligadas a íons como fosfato de calico, portanto encontra-se em suspensão baixa solubilidade. A caseína pode ser separada do resto do leite por centrifugação a alta velocidade, restando no leite as proteínas do soro (González, 2001). O soro do leite representa uma rica e variada mistura de proteínas lácteas que possuem um amplo espectro de propriedades químicas, físicas e funcionais. Essas proteínas não somente têm um importante papel nutritivo por serem uma rica e balanceada fonte de aminoácidos, mas também, em muitos casos, parecem exercer determinados efeitos biológicos e fisiológicos, in vivo. Entre estas proteínas se incluem a α-lactoalbumina, a ß-lactoglobulina, a lactoferrina, a lactoperoxidade, as imunoglobulinas, os glicomacropeptídeos e uma grande variedade de fatores decrescimento. Essas proteínas estão envolvidas em um grande número de efeitos biológicos observados em estudos animais e humanos, que estão resumidos na tabela 2. Além disso, essas proteínas, uma vez hidrolisadas, servem de fonte de vários peptídeos que possuem atividades biológicas e fisiológicas (Santin, 2005). 2.4.1 Síntese da proteína O ruminante supre suas necessidades protéicas através da proteína do alimento ingerido que passa intacta pela degradação ruminal e é digerida como tal pelo sistema digestivo do animal (abomaso e intestinos) e pela proteína microbiana sintetizada em 7 nível ruminal a partir do NNP, da proteína degradável da dieta e outros nutrientes (Fontaneli, 2001). Os aminoácidos e peptídeos absorvidos a nível intestinal serão disponibililzados em parte para a síntese de proteínas. Para a síntese da proteína do leite são utilizados os aminoácidos presentes na corrente sanguínea pelas células alveolares. Além dos aminoácidos, que correspondem com 90%, as proteínas séricas (10%) também são precursoras para a síntese das proteínas do leite. Entre estas últimas estão as imunoglobulinas (González, 2001). Os aminoácidos essenciais arginina, histidina, isoleucina, leucina, lisina, treonina e valina são absorvidos a partir do sangue em quantidade suficiente para sintetizar as proteínas da glândula mamária. Os aminoácidos não essenciais são absorvidos como aminoácidos livres, a partir do sangue (González, 2001). Segundo Fontaneli (2001) as proteínas do leite bovino são sintetizadas nos ribossomos do retículo endoplasmático rugoso por mecanismos de síntese protéica, ou seja, ocorre neste local ocorre a síntese de polipeptídeos. O controle genético da biossíntese das proteínas do leite é atestado pelo fato de que o conteúdo protéico total do leite e as proporções das proteínas individuais variam um pouco entre as diferentes raças. O conteúdo protéico aumenta (mas as proporções dos componentes protéicos permanecem constantes) quando se administram dietas ricas em concentrados, uma vez que estas aumentam a proporção de propionato sobre acetato no rúmen e diminuem a produção de gordura lacteal. A administração de proteínas em quantidades maiores do que as necessárias na dieta animal não altera o conteúdo de proteínas do leite, nem as proporções dos componentes, mas aumenta o conteúdo de nitrogênio não-protéico do leite (Fontaneli, 2001). As albuminas e imunoglobulinas, por estarem presentes no sangue são transferidas diretamente para as células secretoras da glândula mamária (Fontaneli, 2001). 2.5 Minerais Leite é uma excelente fonte da maioria dos minerais necessários para o animal neonato para o crescimento de ossos e o desenvolvimento de tecidos moles. Os principais minerais encontrados no leite são calico e fósforo. A digestibilidade do cálcio e do fósforo são altas, em parte porque são encontrados em associação com a estrutura das micelas de caseína. Como resultado, o leite é a melhor fonte de cálcio para o 8 crescimento do esqueleto nos indivíduos mais novos e manutenção da integridade do osso nos adultos. Além disso, o leite contém teores consideráveis de cloro, potássio, sódio e magnésio e baixos teores de ferro, alumínio, bromo, zinco e manganês, formando sais orgânicos e inorgânicos (González, 2001). As concentrações de sódio, potássio e cloro no leite constituem o segundo maior determinante do volume de água presente no leite pela pressão osmótica desses íons, complementando o efeito da lactose na determinação do volume de água no leite (Fontaneli, 2001). O cálcio do leite procede do plasma sanguíneo, em razão disso é difícil aumentar o conteúdo do cálcio do leite incrementando-o no alimento, uma vez que há equilíbrio entre o cálcio sanguíneo e o cálcio do esqueleto (González, 2001). Os oligoelementos: arsênio, boro, cobalto, cobre, flúor, ferro, iodo, manganês, molibdênio zinco e em menor quantidade alumínio, barrio, bromo, cromo e selênio, estão presentes no leite e encontram-seem complexos orgânicos. Dentre estes, o zinco é relativamente mais abundante no leite (12% dissolvido e o resto associado a partículas de caseinato) (González, 2001). 2.6 Vitaminas No leite bovino estão presentes todas as vitaminas conhecidas. As vitaminas A, D, E e K estão associadas aos glóbulos de gordura e as demais ocorrem na fase aquosa do leite. A concentração das vitaminas lipossolúveis depende da alimentação da vaca, exceto a da vitamina K. Esta, como as vitaminas hidrossolúveis, é sintetizada no sistema digestivo dos ruminantes (Silva, 1997). As vitaminas lipossolúveis A, D, E e K são encontradas basicamente na gordura do leite. A vitamina A tem como precursores os carotenóides, que se transformam em vitamina A na parede do intestino delgado. A eficiência desta conversão na vaca é relativamente pequena e é distinta conforme as diferentes raças. As raças Jersey e Guernsey convertem uma proporção maior de caroteno em vitamina A e por isso o leite apresenta-se amarelado nestas raças. A vitamina D do leite se encontra em forma de vitamina D2, o conteúdo desta vitamina está diretamente relacionado com o conteúdo de ergosterol da dieta do animal e com a sua exposição à luz solar. A vitamina E encontra- se na forma de α-tocoferol e a quantidade presente no leite tem uma estreita relação com 9 a dieta do animal. Quanto à vitamina K, o leite é uma fonte relativamente pobre desta vitamina e seus teores não se modificam com alteração da dieta (González, 2001). Das vitaminas hidrossolúveis, aquelas do complexo B são sintetizadas na microflora ruminal. O leite não constitui uma fonte importante de vitamina C, pois o processo de pasteurização destrói o conteúdo de ácido ascórbico do leite fresco. O conteúdo de vitamina C é pouco afetado por fatores como dieta, idade, raça, etapa da lactação ou época do ano (González, 2001). 3. Qualidade do Leite A qualidade do leite está regulamentada pelas normas da Instrução Normativa 51, cujo objetivo é melhorar a qualidade e modernizar a produção de leite no Brasil. Trata-se de uma Regulamentação Técnica para a produção, armazenagem e transporte do leite. As normas que regulamentam a qualidade do leite promovem a modernização da produção de leite e agrega valor a todos os elos da cadeia: Em nível de consumidor: este terá à sua disposição produtos que oferecem mais segurança, valor nutricional e melhores características organolépticas (odor, sabor, cor, aspecto), melhores preços e maior variedade de produtos nas gôndolas dos supermercados, maior tempo de conservação e de vida útil dos produtos. Em nível de ponto de venda: os estabelecimentos comerciais terão produtos com maior vida útil nas prateleiras, menores perdas, menor custo operacional, clientes mais satisfeitos e atrelados a eles. Em nível de indústria: com a melhor qualidade do leite a indústria poderá oferecer produtos à melhor preço, menor custo operacional, menor risco e maior confiança alimentar, maior produtividade industrial, menores perdas, maior rendimento industrial, melhor imagem e possibilidade de exportação. Em nível de produtor: neste reside atualmente o maior gargalo, existem grandes oportunidades de ganhos e melhorias, por isto, é importante o pagamento por qualidade. O consumo dos lácteos vem crescendo e continuará a crescer no mundo, bem como no mercado interno. As exportações continuarão a crescer e, embora o mercado interno ainda seja muito grande frente à produção brasileira, só lhe falta renda e incentivos através de programas sociais para incrementar o consumo. O produtor terá mais renda, menor risco, menores custos de produção,maior poder de negociação, maior profissionalização, boa relação custo-benefício, melhor sanidade e 10 segurança alimentar, grandes oportunidades de exportação da produção e melhorias tecnológicas de produção. 3.1 Classificação do Leite (Instrução Normativa 51/2002) O acompanhamento da composição do leite cru é de grande importância por três motivos: a) avaliação da dieta e do metabolismo das vacas em lactação; b) classificação do leite pelo seu valor como matéria prima para a indústria processadora; e c) verificação da integridade do leite quanto à adição ou retirada de componentes (Dürr et al., 2001). De acordo com a Instrução Normativa 51/2002, o leite pode ser classificado como tipo A, B e C. O leite pasteurizado tipo A é classificado quanto ao teor de gordura em, integral, padronizado, semidesnatado ou desnatado, produzido, beneficiado e envasado em estabelecimento denominado Granja Leiteira (Tabela 2). Tabela 2. Leite Pasteurizado tipo A Requisitos Integral Padronizado Semidesnatado Desnatado Gordura, (g/100g) Teor Original 3,0 0,6 a 2,9 máx. 0,5 Acidez, (g ác. Láctico/100ml) 0,14 a 0,18 para todas as variedades Estabilidade ao Alizarol 72% Estável para todas as variedades Sólidos Não Gordurosos (g/100g) Mín. 8,4* Ìndice Crioscópico máximo -0,530°H (-0,512°C) Contagem Padrão em Placas (UFC/ml)** n > 5; c > 2; m > 5,0x102; M > 1,0x103 Coliformes – NMP/ml (30/35°C)** n > 5; c > 0; m < 1 Coliformes – NMP/ml (45°C)** n > 5; c > 0; m > ausência Salmonella ssp/25ml** n > 5; c > 0; m > ausência *Teor mínimo de SNG, com base no leite integral. Para os demais teores de gordura, esse valor deve ser corrigido pela seguinte fórmula: SNG > 8,652 - (0,084 x G). **Padrões microbiológicos a serem observados até a saída do estabelecimento industrial produtor. n: número de unidades retiradas da amostra; c: número máximo de resultados positivos permitidos; m: separa as contagens satisfatórias das contagens aceitáveis; M: indica o limite entre as contagens aceitáveis e as contagens não satisfatórias. Fonte: Instrução Normativa 51 (2002). 11 Leite Cru Refrigerado tipo B (Tabela 3), produto integral quanto ao teor de gordura, refrigerado em propriedade rural produtora de leite e nela mantido pelo período máximo de 48h (quarenta e oito horas), em temperatura igual ou inferior a 4ºC, que deve ser atingida no máximo 3h após o término da ordenha, transportado para estabelecimento industrial, para ser processado, onde deve apresentar, no momento do seu recebimento, temperatura igual ou inferior a 7ºC. Tabela 3. Leite Cru Refrigerado tipo B Integral Item de Composição Requisito Gordura (g/100g) mín.3,0 Acidez, em g de ác. Láctico/100ml 0,14 a 0,18 Densidade Relativa, 15/15°C, g/ml 1,028 a 1,034 Índice Crioscópico máximo -0,530°H (-0,512°C) Sólidos Não Gordurosos (g/100g) mín. 8,4 Proteína Total (g/100g) mín. 2,9 Estabilidade ao Alizarol 72% Estável Contagem Padrão em Placas (UFC/ml) máx. 5x105 Contagem de Células Somáticas (CS/ml) máx. 6x105 Fonte: Instrução Normativa 51 (2002). Leite Pasteurizado tipo B, produto classificado quanto ao teor de gordura como integral, padronizado, semidesnatado ou desnatado (Tabela 4), submetido à temperatura de 72 a 75ºC durante 15 a 20segundos, exclusivamente em equipamento de pasteurização a placas, dotado de painel de controle com termo-registrador computadorizado ou de disco e termo-regulador automáticos, válvula automática de desvio de fluxo, termômetros e torneiras de prova, seguindo-se resfriamento imediato em equipamento a placas até temperatura igual ou inferior a 4ºC e envase no menor prazo possível, sob condições que minimizem contaminações. 12 Tabela 4. Leite Pasteurizado tipo B Requisito Integral Padronizado Semidesnatado Desnatado Gordura (g/100g) Teor Original 3,0 0,6 a 2,9 máx. 0,5 Acidez, (g ác. Láctico/100ml) 0,14 a 0,18 para todas as variedades Estabilidade ao Alizarol 72% Estável para todas as variedades Sólidos Não Gordurosos (g/100g) mín. 8,4* Índice Crioscópico máximo -0,530°H (- 0,512°C) Contagem Padrão em Placas (UFC/ml)** n > 5; c > 2; m > 4,0x104; M > 8,0x104 Coliformes/NMP/ml (30/35°C)** n > 5; c > 2; m > 2; M > 5 Coliformes/NMP/ml (45°C)** n > 5; c > 1; m > 1; M > 2 Salmonella ssp/25ml n > 5; c > 0; m > ausência Fonte: Instrução Normativa 51 (2002). Leite Cru tipo C é o produto não submetido a qualquer tipo de tratamento térmico na fazenda leiteira onde foi produzido e integral quanto ao teor de gordura, transportado em vasilhame adequado e individual de capacidade até 50 litros e entregue em estabelecimento industrial adequado até as 10:00 h do dia de sua obtenção, em Posto de Refrigeração de leite ou estabelecimento industrial adequado e nele ser refrigerado e mantido em temperatura igual ou inferior a 4ºC. Pode ser mantido nesse posto pelo período máximo de 24 h, sob refrigeração, sendo remetido em seguida ao estabelecimento beneficiador. Em se tratando de Leite Cru tipo C, obtido em segunda ordenha, deve o mesmo sofrer refrigeração na propriedade rural e ser entregue no estabelecimento beneficiador até as 10:00h do dia seguinte à sua obtenção, na temperatura máxima de 10ºC, enquanto perdurar a produção desse tipo de leite. Leite Cru Refrigerado, produto refrigerado e mantido nas temperaturas constantes, transportado em carro-tanque isotérmico da 13 propriedade rural para um Posto de Refrigeração de leite ou estabelecimento industrial adequado, para ser processado (Tabela 5). Tabela 5. Leite Cru e Refrigerado tipo C Item de Composição Requisitos Gordura (g/100g) mín. 3,0 Acidez, em g de ác. Láctico/100ml 0,14 a 0,18 Densidade relativa, 15/15°C, g/ml 1,028 a 1,034 Índice Crioscópico máximo -0,530°H (-0,512°C) Sólidos Não Gordurosos (g/100g) mín. 8,4 Proteína Total (g/100g) mín. 2,9 Estabilidade ao Alizarol 72% Estável Estabilidade ao Alizarol 76%* Estável *Aplicável à matéria-prima recebida em estabelecimentos sob SIF após as 10:00h da manhã do dia de sua obtenção. Fonte: Instrução Normativa 51 (2002). Entende-se por Leite Pasteurizado tipo C o produto definido neste Regulamento Técnico, classificado quanto ao teor de gordura como integral, padronizado, semidesnatado ou desnatado, pasteurizado à temperatura de 72 a 75ºC durante 15 a 20 segundos, envasado no menor tempo possível (Tabela 6). 14 Tabela 6. Leite Pasteurizado tipo C Requisitos Integral Padronizado Semidesnatado Desnatado Gordura, (g/100g) Teor Original 3,0 0,6 a 2,9 máx. 0,5 Acidez, (g ác. Láctico/100ml) 0,14 a 0,18 para todas as variedades Estabilidade ao Alizarol 72% Estável para todas as variedades Sólidos Não Gordurosos (g/100g) mín. 8,4 Índice Crioscópico Max. -0,530°H (-0,512°C) Contagem Padrão em Placas (UFC/ml) n > 5; c > 2; m > 1,0x105; M > 3,0x105 Coliformes NMP/ml (30/35°C) n > 5; c > 2; m > 2; M > 4 Coliformes, NMP/ml (45°C) n > 5; c > 1; m > 1; M > 2 Salmonella SSP/25ml n > 5; c > 0; m > ausência Fonte: Instrução Normativa 51 (2002). 3.2 Coleta de Leite Cru Refrigerado e seu Transporte a Granel (Instrução Normativa 51/2002) O processo de coleta de Leite Cru Refrigerado a Granel consiste em recolher o produto em caminhões com tanques isotérmicos construídos internamente de aço inoxidável, diretamente do tanque de refrigeração por expansão direta ou dos latões contidos nos refrigeradoresde imersão. Em casos de cooperativas em que se utilizam tanques comunitários, não é permitido acumular, em determinada propriedade rural, a produção de mais de uma ordenha para enviá-la uma única vez por dia ao tanque comunitário. No caso da coleta de diferentes tipos de leite, a propriedade produtora de Leite tipo B deve dispor do equipamento necessário ao bombeamento do leite até o caminhão- tanque. O tempo transcorrido entre a ordenha inicial e seu recebimento no estabelecimento que vai beneficiá-lo (pasteurização, esterilização, etc.) deve ser no máximo de 48h, independentemente do seu tipo, recomendando-se como ideal um período de tempo não superior às 24h. 15 No estabelecimento industrial, quando da recepção de diferentes tipos de leite, a plataforma deve descarregar primeiramente o Leite tipo B ou efetuar a sanitização após a recepção de outros tipos de leite ou, ainda, utilizar linhas separadas para a sua recepção. O funcionário encarregado da coleta pode rejeitar o leite que não atender às exigências, o qual deve permanecer na propriedade. Antes do início da coleta, o leite deve ser agitado com utensílio próprio e ter a temperatura anotada, realizando-se a prova de alizarol na concentração mínima de 72% v/v. As amostras de leite a serem submetidas a análises laboratoriais devem ser transportadas em caixas térmicas higienizáveis, na temperatura e demais condições recomendadas pelo laboratório que procederá às análises. O leite da propriedade cujas análises revelarem problemas deve ser, obrigatoriamente, submetido a nova coleta para análises no dia subseqüente. Nesse caso, o produtor deve ser comunicado da anormalidade e o leite não deve ser coletado a granel. Fica a critério da empresa coletar esse leite separadamente ou deixar que seja entregue pelo próprio produtor diretamente na plataforma de recepção, no horário regulamentar, onde deve ser submetido às análises laboratoriais. 4. Fatores que afetam a composição do leite Os principais meios para se alterar a composição do leite são a nutrição, o manejo e a genética. Mudanças na composição do leite através da genética são obtidas a longo prazo, se comparadas às alterações produzidas por práticas de nutrição e de manejo, que geralmente ocorrem de forma quase imediata. Por outro lado, as mudanças obtidas pela genética são permanentes, ao contrário das alterações proporcionadas pelas práticas de nutrição, que são transitórias (Almeida, 2004). Apesar de transitória a nutrição é a principal ferramenta para que os produtores de leite possam alterar a composição do leite, respondendo por até 50% da variação nos teores de proteína e gordura do leite. As modificações em composição do leite conseguidas com o manejo nutricional são rápidas e efetivas. Os nutrientes consumidos constituem-se nos precursores, diretos ou indiretos, dos principais componentes sólidos do leite. Todos os aminoácidos essenciais e alguns não-essenciais necessários para a síntese de proteína do leite são oriundos do sangue (Pedroso, 2006). 16 4.1 Fatores que afetam o teor de gordura no leite 4.1.1 Raça A gordura é o componente do leite que sofre maior variação em função da alimentação, podendo variar em 2 e 3 unidades percentuais (Peres, 2001). Os fatores nutricionais que mais afetam o teor de gordura do leite são: o aumento de concentrado na dieta, a quantidade e o tamanho da fibra e a adição de tamponantes e compostos ionóforos (González e Campos, 2003). Existem fatores não nutricionais que envolvem raça, estágio de lactação, estação do ano, volume de leite produzido, entre outros. Há também um componente genético na porcentagem de sólidos do leite produzido por diferentes animais. Algumas raças naturalmente apresentam maiores teores de sólidos, com destaque para a raça Jersey (Tabela 1). Dentre as raças utilizadas no Brasil, os animais que representam o grupo Bos taurus, de alta produtividade por animal, são os animais das raças Holandesa, Pardo- Suíça e Jersey, enquanto que os animais que representam o grupo Bos indicus pertencem as raças Gir leiteiro e Guzerá. Pode-se ressaltar ainda a utilização de animais da raça Girolando, desenvolvida a partir do cruzamento de animais das raças Holandesa e Gir leiteiro (Rennó, 2000). 4.1.2 Relação Concentrado:Volumoso Segundo Mühlbach (2004) citado por Alves Filho (2005), existe uma regra fundamental na alimentação da vaca leiteira: a quantidade de concentrado não pode exceder a metade do total de matéria seca (MS) consumida pelo animal, ou seja, a relação volumoso:concentrado deve ser de, no mínimo, 50:50. O atendimento dessa regra possibilita o funcionamento normal do rúmen, pois essa quantidade mínima de volumoso é necessária para manter a ruminação do animal, entretanto segundo Peres (2001), o limite mínimo de 40% de volumosos na dieta foi determinado em pesquisas norte-americanas. Embora as forrageiras brasileiras, em geral, apresentem naturalmente maior teor de fibra, elas exigem maior suplementação de concentrados, especialmente quando os animais são de alta produção. Dependendo da formulação da dieta esta condição coloca os animais em situações limite, onde a busca por maior produção leva a problemas metabólicos e diminuição no teor de gordura do leite (Peres, 2001). 17 O consumo adequado de volumoso garante um teor normal de gordura no leite, pois com a fermentação da fibra no rúmen são produzidos os ácidos acético e butírico, dos quais é formada no úbere 50% da gordura do leite. Na medida em que se aumenta o fornecimento de concentrado na dieta ocorrem alterações da fermentação no rúmen, com aumento da produção de ácido propiônico e, proporcionalmente, uma diminuição dos ácidos acético e butírico (Figuras 1) (Alves Filho, 2005). O aumento de concentrado eleva a produção de ácidos, concorrendo para a reducão do pH ruminal. Sob pH ruminal menor do que 6,0 a degradação da fibra é prejudicada, diminuindo a produção de ácido acético em contraposição ao ácido propiônico, que aumenta. Sendo o ácido acético o principal precursor da gordura do leite, a sua redução estaria então diretamente relacionada à queda da gordura do leite. Dados de pesquisa indicam que a redução na gordura do leite ocorre principalmente quando a proporção molar de ácido propiônico passa de 25% ou a relação acetato:propionato baixa de 2,2:1 (Fontaneli, 2001). O efeito do nível de concentrado da dieta no teor de gordura pode ser observado na tabela 7. Tabela 7. Efeito do teor de concentrado em dietas com elevada quantidade de gordura insaturada na gordura do leite Parâmetro 50% de concentrado 80% de concentrado % de gordura de leite 3,36 2,49 Kg de gordura 1,06 0,68 Fonte: Griinari et al.(1998), citado por Knorr (2002). Quanto mais ácido propiônico é absorvido do rúmen, maior é a produção de leite, pois esse ácido é utilizado pelo organismo do animal para produzir a lactose do leite, e quanto mais lactose (cujo teor no leite tem pouca variação), tanto maior a produção de leite. Na prática observa-se que, com o aumento no fornecimento de concentrado, aumenta a produção de leite, com queda no teor de gordura (Alves Filho, 2005). 18 Figura 1. pH do rúmen e sua relação com as proporções entre os ácidos acético, propiônico e láctico Fonte: Mühlbach (2004) citado por Alves Filho (2005). 4.1.3 Fibra efetiva Outro aspecto nutricional relacionado ao nível de gordura do leite é a quantidade de fibra efetiva da dieta, ou seja, aquela que estimula a ruminação e com isso a salivação. A fibra efetiva é responsável pela manutenção do pH ruminalacima de 6,2 através do estímulo à ruminação que provoca um aumento na produção de saliva e na liberação de tamponantes. Como efeito direto do pH ocorre uma maior digestão da fibra em favorecimento das bactérias celulolíticas do rúmen que vão ser responsáveis pela produção de ácido acético. O estímulo à ruminação é desencadeado pelo tamanho da partícula da fibra, cerca de 20% da fibra deve ter no mínimo 4 cm de comprimento e o restante não deve ser moído em partículas menores que 0,6 a 0,8 cm (Peres, 2001), (Knorr, 2002). Dietas com níveis adequados, porém finamente moídos não produzem estímulo à ruminação. Como regra geral, as dietas devem conter um mínimo de 28% de FDN, sendo 75% deste proveniente de forragens não finamente moídas (Knorr, 2002). Quando 19 utilizar grande proporção de subprodutos fibrosos, que normalmente tem baixa efetividade de fibra, é conveniente aumentar este valor para 30 a 32% (Peres, 2001). Fibra em excesso nas dietas reduz a ingestão de matéria seca devido ao mais rápido enchimento do rúmen, associado a menor taxa de passagem, o que limita a produção de leite (Peres, 2001). Se o volumoso é de baixa qualidade (teor de FDN acima de 60%), sua fermentação no rúmen é muito lenta e seu consumo é baixo, o que limita também o consumo total de MS (Alves Filho, 2005). De modo geral, segundo Alves Filho (2005), a vaca leiteira deve ruminar pelo menos 8 horas por dia, em vários períodos após as refeições, pois a ruminação aumenta a produção de saliva, que ajuda a regular as condições de fermentação no rúmen, isto é, controlar o pH. Um valor de pH acima de 6,0 favorece a fermentação da fibra do volumoso, que é o alimento mais barato da dieta, e quanto melhor a fermentação da fibra no rúmen, tanto mais volumoso (e concentrado) o animal poderá ingerir, e, em decorrência, tanto melhor poderá ser a produção de leite (Tabela 8). Tabela 8. Efeito da proporção volumoso:concentrado sobre a fermentação no rúmen ----------% da MS --------- Mastigação pH ------% molar------ Relação Vol. Conc. FDN FDA (min/dia) rúmen Acético Propiônico Molar 100 0 65 41 960 7,0a 70 18 3,9 80 20 55 34 940 6,6a 67 20 3,4 60 40 45 27 900 6,2a 64 22 2,9 40 60 34 20 820 5,8 58 28 2,1b 20 80 24 13 660 5,4 48 34 1,4b 0 100 14 6 340 5,0 36 45 0,8b a faixa de pH adequada para a fermentação da celulose b relação molar que causa queda da % de gordura no leite Fonte: Backman (2002) citado por Alves Filho (2005). 4.1.4 Tipo de concentrado e seu processamento O tipo de concentrado e o processamento pelo qual este passa, também influem na sua fermentação ruminal, em especial na sua taxa de fermentação, o que consequentemente reflete no teor de gordura do leite. 20 Os carboidratos dos alimentos podem ser divididos em duas frações: estruturais (FDN) e não estruturais (principalmente amido, açúcares e pectina). Os carboidratos não estruturais (CNE), de modo geral, possuem alta taxa de fermentação e produzem maior proporção de ácido propiônico e láctico (com exceção da pectina), que reduzem o pH ruminal e a gordura do leite. Sendo assim, quanto maior o teor de CNE de um alimento, maior seu potencial em diminuir o teor de gordura do leite. Além disso, mesmo entre carboidratos não estruturais existem diferenças na velocidade de degradação em função do tipo de carboidrato predominante e do seu processamento (Peres, 2001). Os concentrados compostos por um maior teor de carboidratos não estruturais são geralmente grão de cereais com altas concentrações de amido como milho, sorgo, cevada e trigo. Estes concentrados têm uma alta digestibilidade e são rapidamente fermentáveis no rúmen produzindo ácidos propiônico e láctico. Portanto dietas com maiores proporções de concentrados com altos teores de amido geram uma redução do pH ruminal diminuindo assim as concentrações de gordura no leite (Knorr, 2002). Já os concentrados compostos por um maior teor de carboidratos não estrutursão fontes energéticas com maior teor de fibra (celulose, hemicelulose e pectina), como farelo de glútem de milho, polpa cítrica, casca de soja e farelo de trigo e que normalmente são oriundos de resíduos de agroindústrias. Estes concentrados têm alta digestibilidade, porém não reduzem o pH ruminal por apresentarem uma fermentação mais lenta (Knorr, 2002). Com relação ao processamento, práticas como a floculação a vapor e o armazenamento na forma de silagens de grãos úmidos tendem a elevar a taxa de digestão do amido e, com isto, tendem a deprimir a gordura do leite (Fontaneli, 2001). 4.1.5 Adição de gordura na dieta A fim de se aumentar a densidade energética de dietas, principalmente de vacas de alta produção, é comum a inclusão de gorduras em níveis de 5 a 7% da matéria seca da dieta (Knorr, 2002). Essa prática proporciona um aumento na produção total de leite, todavia o fornecimento de gordura tende a deprimir os teores de gordura e proteína do leite (Peres, 2001). A extensão do efeito depressor da gordura nos componentes do leite é em função principalmente da quantidade e do tipo de gordura utilizada. Os tipos de lipídeos empregados nas dietas podem influenciar a fermentação e a digestibilidade ruminal da 21 fibra, por meio da supressão das bactérias celulolíticas e metanogênicas (Duarte et al., 2005). De acordo com Peres (2001), as gorduras poliinsaturadas ou ricas em ácidos graxos do tipo “trans” (óleos vegetais de milho, soja, girassol e canola e também o óleo de peixe) são as que apresentam maior efeito supressor no teor de gordura do leite. A utilização de lipídeos insaturados interfere no metabolismo ruminal, mas, por outro lado, seu efeito hipocolesterolêmico o torna desejável na composição do leite para a saúde humana (Palmquist & Jenkins, 1980; Chalupa et al., 1984; Van Soest, 1994, citados por Duarte et al., 2005). O excesso de gordura atua no rúmen diminuindo a digestibilidade da fibra, decorrente de um mecanismo físico de recobrimento da fibra com gordura, dificultando o ataque microbiano e provocando efeitos tóxicos diretamente sobre certos microrganismos (Duarte et al., 2005), alterando assim a proporção de acetato e propionato e facilitando o acúmulo de ácidos graxos do tipo “trans”, especialmente se à gordura forem associados altos níveis de carboidratos não estruturais na dieta (Peres, 2001). A gordura saturada, por sua vez, é menos ativa ruminalmente, portanto têm menor efeito na composição do leite, efeito este que é ainda menor quando se utiliza gorduras protegidas. A gordura protegida é uma gordura envolvida por uma “capa” de proteína (formaldeído tratado), que protege a mesma da degradação ruminal ou ser constituída por sabões de cálcio (alternativa mais comum) (Fontaneli, 2001). Gorduras protegidas, sob forma de sabões de cálcio ou tratadas com formaldeído, são inertes no rúmen passando de forma intacta por este, resultando em um menor efeito depressor nos níveis de gordura do leite. O fornecimento de grãos de oleaginosas como caroço de algodão, apesar do alto teor de ácidos graxos insaturados, quando fornecidos inteiros ou grãos de soja quebrados em 3 ou 4 partes, e respeitados os limites de utilização também não reduzem os níveis de gordura do leite, pois não afetam a fermentação ruminal devido a lenta degradação e consequente passagem direta pelo rúmen (Fontaneli, 2001), (Peres, 2001), (Knorr, 2002). Segundo ARM & HAMMER® (2004), existe um limite da quantidade de gordura livre ou não protegida que pode ser adicionada a dieta. Caroços oleaginosos inteiros na forma tostada ou crua liberam ácidos graxos instaurados que podem prejudicar a fermentaçãoruminal. Esses ácidos graxos podem ser tóxicos à flora em certas 22 concentrações, resultando em depressão da digestão de fibras, queda na gordura do leite e redução da produção de proteína microbiana que pode levar a um déficit protéico mesmo que o balanceamento da dieta pareça correto. À medida que esses ácidos graxos são hidrogenados pela flora ruminal, os ácidos graxos saturados resultantes tem menor valor nutritivo do que os originais fornecidos ao animal. Ácidos graxos saturados podem ser fornecidos ao animal na forma de gordura animal, sebo hidrogenado, como gordura levemente protegida no rúmen. Esses alimentos terão menor impacto na fermentação ruminal mas, também terão menor digestibilidade quando comparados a ácidos graxos insaturados que chegam ao intestino, como os contidos no MEGALAC. Na verdade, esses ácidos graxos saturados têm 60% do valor energético de MEGALAC, o que os torna somente um pouco mais rico energeticamente que o milho (ARM & HAMMER®, 2004). 4.1.6 Aditivos Os aditivos comumente utilizados na produção de ruminantes, visando melhorar o desempenho produtivo destes e que afetam os teores de gordura do leite são os tamponantes (bicarbonato de sódio) e os ionóforos ou modificadores ruminais (monensina sódica e lasalocida). Os tamponantes minimizam a queda de pH ruminal, evitando a acidose quando são fornecidas aos animais dietas com altas proporções de concentrados rapidamente fermentáveis, mantendo ativas as bactérias que digerem a fibra. Assim, os níveis de ácido acético produzidos no rúmen não são reduzidos e não ocorre diminuição na porcentagem de gordura do leite (Knorr, 2002). Já os ionóforos atuam alterando o padrão de fermentação ruminal, aumentando sua eficiência por eliminar as bactérias que produzem metano e gás carbônico. Atuam através da seleção de bactérias preferencialmente produtoras de ácido propiônico, em detrimento ao ácido acético, precursor da gordura do leite. Desse modo, o fornecimento destes aditivos tende a diminuir o percentual de gordura do leite, embora sua produção total (Kg de gordura) normalmente seja mantida através de eventuais ganhos e produção (Peres, 2001). 23 4.1.7 Teoria dos ácidos graxos trans (AGT) na redução da gordura do leite Como já comentado, diversos fatores relacionados com a manipulação da dieta podem alterar o teor de gordura do leite, a principal teoria relacionando estes fatores à diminuição de gordura do leite, baseia-se na alteração da fermentação ruminal que reduz a quantidade de precursores de gordura (ácido acético) na glândula mamária. Ácidos graxos trans são conhecidos por serem produzidos por 2 vias. Uma seria através da fermentação ruminal bacteriana (biohidrogenação) e a outra pela hidrogenação química de gorduras vegetais. Sabe-se que a gordura insaturada presente nos alimentos ou fornecida via óleo é altamente tóxica às bactérias celulolíticas. O processo de biohidrogenação nada mais é do que a atuação de bactérias ruminais com o intuito de incorporar íons H na gordura, a fim de saturá-la. É por esta razão inclusive que os tecidos de animais ruminantes possuem gordura com alto grau de saturação (Fontaneli, 2001). Segundo Griinari et al. (1998) citados por Knorr (2005), ocorreu uma redução de 30% nos teores de gordura e de 35% no volume total de gordura quando se comparou uma dieta com baixo nível de fibra e gordura insaturada com outra dieta com alto teor de fibra e gordura saturada. Neste experimento foi verificado um aumento das concentrações no leite do isômero trans-10 do ácido octadecenóico (C18:1, trans-10). Portanto, para que haja redução na gordura do leite são necessárias 2 situações: a) ambiente ruminal alterado pela falta de fibra ou excesso de grãos; b) presença de gordura insaturada na dieta, gerando AGT pela biohidrogenação incompleta. É importante salientar que esta gordura insaturada não é necessariamente proveniente de suplementos de gordura da dieta, uma vez que muitos grãos, como milho e soja, contêm altos teores de gordura insaturada (Knorr, 2002). 4.1.8 Ácido linolênico conjugado (CLA) CLA é um termo que descreve os isômeros geométricos do ácido linoléico, a conjugação da ligação dupla é geralmente nas posições 9 e 11 ou 10 e 12, podendo ser configuração cis ou trans . Mais de 80% do CLA presente nos produtos lácteos está na forma de isômeros cis-9 e trans-11(Alves Filho, 2005). Ácidos graxos com insaturação conjugada não são normalmente constituintes da dieta do rebanho leiteiro, porém a adição de ácidos graxos insaturados na dieta de vacas 24 lactantes pode aumentar de forma natural o CLA e diminuir o teor de gordura no leite, melhorando assim a imagem dos produtos lácteos junto ao consumidor, uma vez que este está preferindo os alimentos que possuem menor teor de gordura e sem aditivos, como adição de CLA de forma artificial (Santos et al., 2001). Ao utilizar uma suplementação de gordura, deve-se levar em conta que normalmente as dietas de ruminantes contêm cerca de 3% de lipídios para que haja um efeito mínimo na fermentação ruminal, já que gorduras insaturadas possuem efeitos inibitórios sobre microorganismos celulolíticos. Apesar dessas limitações, a adição de fontes suplementares de lipídios em especial de cadeia longa, tem grande influência na elevação da concentração dos mesmos na gordura do leite, após sofrer ou não biohidrogenação por ação microbiana no rúmen (Santos et al., 2001). Atualmente os consumidores estão preocupados com relação a sua saúde, e o aumento de ácidos graxos insaturados, juntamente com a redução dos saturados, é favorável à redução do colesterol sanguíneo no homem. Observa-se na tabela 9, que ao fornecer lipídios ricos em ácidos graxos insaturados na dieta, há uma diminuição no teor de ácidos graxos saturados no leite. Esta resposta deve-se ao fato de parte dos ácidos graxos insaturados escapar do processo de biohidrogenação ruminal, sendo absorvido diretamente pelo intestino delgado, associado ao fato da redução dos ácidos graxos de cadeia curta, devido ao menor suprimento dos ácidos acético e butírico. Tabela 9. Valores percentuais de ácidos graxos agrupados na gordura do leite (g/100 g de gordura) Ácido graxo Tratamentos Contraste Controle Grão de soja Óleo de soja L1 L2 Insaturados 28,9 35,4 34,1 0,09 0,71 Saturados 56,0 52,5 46,0 0,05 0,09 Cadeia curta 16,7 13,8 12,2 0,01 0,26 Cadeia longa 36,1 46,4 44,5 0,06 0,70 L1: controle versus grão de soja e óleo de soja; L2: grão de soja versus óleo de soja. Fonte: Santos et al. (2001). 25 Santos et al. (2001), verificaram que a adição do grão de soja aumenta os teores de ácido linoléico e linolênico no leite, quando comparado ao óleo de soja , sendo este fato explicado, provavelmente, pela proteção dos lipídios na matriz protéica da soja, diminuindo seu contato com os microorganismos ruminais. 4.1.9 Utilização de Somatotropina e seus efeitos Historicamente, os efeitos da somatotropina bovina (BST) sobre a lactação e o crescimento são conhecidos desde as décadas de 20 e 30 do século passado, porém grande número de pesquisas passaram a ser realizadas após o desenvolvimento da tecnologia de DNA recombinante que proporcionou o desenvolvimento do rBST com o mesmo potencial biológico e permitiu a produção do hormônio em escala (Sant’Ana, 2010). O uso do BST em vacas em lactação tem efeitos sobre a partição preferencial de nutrientes para a síntese do leite, interferindo no metabolismo de vários órgãos e tecidos através de ações diretas (tecido adiposo e fígado) e efeitos indiretos mediados pelofator de crescimento semelhante à insulina (IGF-I) (Bauman, 1992 citado por Oliveira Neto, 2001). O padrão de resposta à utilização do rBST é o aumento gradual da produção de leite poucos dias após a aplicação, sendo atingida a máxima resposta durante a primeira semana. Ao cessar a aplicação de rBST, gradualmente a produção de leite retorna aos níveis anteriores ao início da aplicação. Dessa forma, a aplicação de rBST em vacas leiteiras influencia a produção de leite e o formato da curva de lactação (Bauman et al., 1999; Dunlap et al., 2000; Luna-Dominguez et al., 2000, citados Rennó et al., 2006). Em relação à composição do leite de vacas suplementadas com rBST, na maioria dos trabalhos, não se encontram alterações na porcentagem de gordura, proteína e lactose nos animais tratados (Barbano et al., 1992; Bauman, 1992; BAuman ET AL., 1999, citados por Rennó et al., 2006). Rennó et al. (2006), avaliaram-se os efeitos da aplicação de rBST sobre o desempenho produtivo e reprodutivo de vacas da raça Holandesa no início da lactação. Foram avaliadas 41 vacas, dos 60 aos 150 dias de lactação, em três tratamentos: 1- sem aplicação de rBST (controle); 2- aplicação de rBST 60 dias após o parto (rBST-60); 3- aplicação de rBST 100 dias após o parto (rBST-100). A aplicação de rBST aumentou a produção de leite e a produção de leite corrigida a 4% de gordura em 14,0 e 13,2%, 26 respectivamente, quando administrada aos 60 dias pós-parto. Não se observou efeito da aplicação de rBST sobre a porcentagem e a produção de gordura do leite (Tabela 10). Tabela 10. Médias e coeficientes de variação (CV) da produção de leite (PL), produção de leite corrigida (PLC) para 4% de gordura, em Kg/dia, e da produção de gordura, em porcentagem (G%) e em kg/dia (Gkg), segundo os tratamentos Tratamento PL (kg/dia) PLC (kg/dia) G% (%) Gkg (kg/dia) Controle 30,25 b 27,23 b 3,37 a 1,01 a rBST-60 34,50 a 30,82 a 3,29 a 1,14 a rBST-100 31,40 a b 28,78 a b 3,50 a 1,08 a CV (%) 13,08 12,64 11,57 14,22 Na coluna, médias seguidas de letras distintas diferem entre si (P<0,05), segundo o teste Tukey. Fonte: Rennó et al. (2006). 4.2 Fatores que afetam o teor de proteína do leite A amplitude de variação no teor de proteína do leite é muito menor, quando comparada com a gordura. A gordura pode variar de 2 a 3 unidades percentuais, a proteína dificilmente varia mais que 0,3 a 0,4 unidades percentuais em relação à nutrição(Peres, 2001). Da mesma forma que o teor de gordura do leite, o teor de proteína também é influenciado por fatores genéticos. Esta pequena possibilidade de variação pode ser explicada pelo fato de que, a síntese de proteína é muito mais restrita em termos de precursores usados, pois as unidades formadoras de proteína são os aminoácidos e a deficiência de um único aminoácido compromete a síntese de toda a molécula de proteína (Peres, 2001). Os parâmetros para avaliar o teor de proteína do leite também são restritos, em função da limitada variação. De acordo com Peres (2001) existem alguns passos que podem ser adotados para monitorar a nutrição pelo teor de proteína do leite, são eles: Verifique se a média dos teores de proteína do leite está dentro do padrão da raça (3,2 ± 0,2% para a raça Holandesa). Valores médios 0,3% abaixo da média da raça indicam problemas. Neste caso devem ser feitas duas observações, primeiramente observando o estádio de lactação do rebanho, pois o teor de proteína tende a ser menor no início e aumentar gradativamente conforme se aproxima o final da lactação, e no verão (estresse térmico) o teor de proteína tende a cair; 27 Verifique se os valores individuais estão dentro do padrão, independente da média. Variações individuais maiores que 0,2% indicam problemas. Com essa avaliação é possível identificar os possíveis grupos de animais com problema dentro do rebanho. Como já foi mencionado a quantidade de proteínas sintetizadas na glândula mamária é determinada pela quantidade de aminoácidos absorvidos no intestino delgado (ID). Quanto mais aminoácidos forem absorvidos, mais substrato haverá para a síntese de caseína, e proteínas do soro do leite. Esses aminoácidos originam-se da proteína microbiana (PMic) produzida no rúmen e da proteína não degradável no rúmen (PNDR) que chega praticamente intacta ao ID. Para que a utilização desses aminoácidos seja eficiente é preciso que tenham perfil semelhante aos incorporados à proteína do leite. A Pmic tem excelente perfil de aminoácidos para síntese de proteínas do leite, mas o perfil da PNDR é bastante variável, pois depende totalmente dos alimentos utilizados no arraçoamento das vacas. Via de regra o perfil de aminoácidos da PMic é melhor que o da PNDR (Pedroso, 2006). Dessa forma, a maximização da síntese de PMic é fundamental para se produzir leite com elevado teor de proteína. Dietas que forneçam de 11 a 13% da MS na forma de proteína degradável no rúmen (PDR), com uma fonte de PNDR de perfil adequado de aminoácidos, que complemente o da PMic, fornecem as condições para maximizar a síntese de proteínas do leite (Pedroso, 2006). 4.2.1 Ingestão de energia O aumento da ingestão de energia através de fontes de carboidratos aumenta a porcentagem e a produção de proteína no leite. Estima-se que 85% do aumento da produção de proteína se dá através de maior produção de leite enquanto somente 15% da resposta está relacionada a aumentos na porcentagem de proteína no leite. O consumo de carboidratos não fibrosos (CNF) de fermentação rápida fornece energia prontamente disponível para os microrganismos ruminais sintetizarem a PMic, ou seja, o aumento da densidade energética da dieta é dependente do fornecimento de maior proporção de concentrado, o que aumenta a produção de ácido propiônico no rúmen. Parece haver uma relação positiva entre o ácido propiônico produzido no rúmen e o teor de proteína do leite. Alguns pesquisadores defendem a tese de que a população de microrganismos 28 que têm o ácido propiônico como principal produto final da fermentação devem possuir perfil de aminoácidos mais adequado à síntese de proteína do leite (Peres, 2001). Dietas deficientes em energia podem reduzir o teor de proteína do leite em 0,1 a 0,3 unidades percentuais. Mesmo com a necessidade de maximizar o consumo de carboidratos não fibrosos (CNF), é preciso atender às necessidades de fibra (FDN). As dietas devem conter no mínimo 28-30% de FDN. Vacas em início de lactação devem receber quantidade maiores de CNF (até 40% da MS), pois precisam minimizar os efeitos do balanço energético negativo desse período (Pedroso, 2006). 4.2.2 Proteína da dieta Geralmente dietas com baixa concentração de proteína resultam em menores teores de proteína no leite. No entanto, fornecer proteína em excesso, além das exigências da vaca, não aumenta a proteína do leite. É preciso fornecer quantidades equilibradas de PDR e PNDR. Tanto a produção de leite, como a produção de proteína do leite serão maximizadas se a quantidade de PDR na ração ficar em torno de 12% da MS total, valor considerado ótimo para a síntese de PMic, desde que o suprimento energético também seja adequado (Pedroso, 2006). Pereira et al. (2005) utilizaram 12 vacas em lactação da raça Holandesa, puras e mestiças para avaliar os consumos, as digestibilidades aparentes dos nutrientes e a produção e composição do leite de vacas no terço médio da lactação recebendo dietas contendo níveis crescentes de proteína bruta (PB) no concentrado (20; 23; 26 e 29% da material natural - MN). A dieta consistiu de 70% de silagem de milho como volumosoe 30% de concentrado. Verificaram que os valores médios de produção de leite e as porcentagens de gordura e proteína do leite não variaram (P>0,05) nos diferentes níveis de PB do concentrado. Contudo, a produção de leite corrigida para 3,5% de gordura e as quantidades de gordura e proteína aumentaram linearmente. De acordo com Pina et al. (2006) a produção de leite corrigida ou não para 3,5% (PLC) de gordura, o teor e a produção de gordura do leite não foram influenciados pelas diferentes fontes protéicas avaliadas, mas a eficiência de utilização da MS e do nitrogênio dietético para a produção de leite e o teor e a produção de proteína do leite foram inferiores para as dietas contendo farelo de algodão em relação àquela com farelo de soja (Tabela 11). 29 Tabela 11. Médias diárias para PL, PLC, produção de gordura (G) no leite (em % e em g/dia) e eficiência de utilização do nitrogênio (kg N no leite/kg N ingerido) e da MS ingerida (kg de leite/kg MS ingerida) obtidas para as diferentes fontes protéicas das dietas Item Dieta CV (%) FS FA 38 FA 28 FSU PL (kg/d) 23,85 23,76 22,69 23,42 5,23 PLC (kg/d) 25,11 23,67 24,75 24,13 6,43 Eficiência MS 1,25 1,22 1,16* 1,29 5,29 Eficiência N 0,248 0,217* 0,224* 0,252 5,35 G (%) 3,85 3,53 4,07 3,73 5,30 G (g/dia) 911,50 825,01 919,79 862,50 9,63 PB (%) 3,19 2,98* 3,12 3,17 5,07 PB (g/dia) 756,92 702,36* 701,13* 732,25 6,14 Fonte: Pina et al., 2006. 4.2.3 Ingestão de gordura Diferentemente do aumento de energia disponível através de maior porporção de concentrados ou carboidratos não estruturais, a adição de gordura à dieta normalmente diminui a porcentagem de proteína no leite em 0,1 a 0,3 unidades percentuais. O fato é que os microrganismos do rúmen não conseguem utilizar lipídeos como fonte de energia, isto limita a produção de proteína microbiana e, consequentemente, o aporte de aminoácidos para a glândula mamária. Este efeito é semelhante independente do tipo de gordura utilizada, já que, mesmo as gorduras inertes no rúmen, limitam a fermentação. Em função disso, é recomendável aumentar a quantidade de proteína não degradável no rúmen, para que se mantenha o teor de proteína do leite em dietas com alta inclusão de gordura, destacando que este procedimento reduz mas não elimina totalmente o efeito da gordura no teor de proteína do leite (Peres, 2001). A inclusão de caroço de algodão e soja em grãos, que via de regra contribuem para aumentar a produção de leite e a eficiência alimentar, deve ser feita de forma criteriosa. Muitas vezes quando se consegue um aumento de produção com o fornecimento desses alimentos, não é raro haver queda no teor de proteína do leite, mas isso normalmente se deve a um efeito de diluição, pelo maior volume de leite, e não a uma redução na síntese de proteína na glândula mamária. Normalmente os ganhos que se tem em produção são 30 economicamente mais interessantes do que as possíveis perdas em proteína com o uso de alimentos ricos em óleo (Pedroso, 2006). 4.2.4 Aditivos A eficiência de fermentação no rúmen e a proporção molar de ácido propiônico é aumentada com o fornecimento de ionóforos. Esta maior disponibilidade de ácido proiônico pode estar associada a maior disponibilidade de alguns aminoácidos que favorecem a síntese de proteína do leite (Peres, 2001). Outro aditivo é a niacina, que naturalmente é sintetizada pelos microrganismos do rúmen mas sua produção pode ser limitada em situações desfavoráveis. Estudos demonstraram que o fornecimento de 6 a 12 gramas de niacina por animal/dia, a partir das duas últimas semanas que precedem o parto até o pico de consumo de alimentos (80 a 120 dias após o parto), aumentou a ingestão de matéria seca, aumentando a produção de proteína bacteriana e diminuindo a concentração de nitrogênio uréico no leite (Peres, 2001). 4.2.5 Uso de Uréia Silva et al. (2001) utilizaram 15 vacas lactantes (Holandês X Gir) para avaliar a produção e a composição do leite com o uso da uréia. A produção máxima de leite, de 20,10 kg/dia, foi obtida com o teor estimado de 4,79% de NNP, ou 0,7% de uréia na MS total das rações. Observou-se redução linear do teor de gordura com o aumento dos teores de NNP nas rações, enquanto a proteína se comportou de forma quadrática, sendo o teor máximo de 3,4% estimado com 3,88% de NNP (Tabela 12). 31 Tabela 12. Produção de leite corrigida (PLG) para 3,5% de gordura (G), teores e quantidades de G e proteína bruta (PB) do leite, em função dos teores de compostos nitrogenados não-protéicos (NNP) das rações e coeficiente de variação (CV) Variáveis Teores de NNP (%) CV (%) 2,08 4,01 5,76 8,07 Consumos (kg/dia) PLG (kg/dia) 21,18 24,92 20,63 18,83 15,94 G (%) 4,65 4,50 4,29 3,90 14,60 G (g/dia) 809,94 933,23 789,31 701,95 19,92 PB (%) 3,22 3,55 3,07 2,69 10,66 PB (g/dia) 559,69 731,48 553,12 486,82 16,41 Fonte: Silva et al. (2001). Oliveira et al. (2001) encontraram resultados diferentes no que se refere ao teor de proteína no leite. Com o aumento do nível de NNP na ração (teores de NNP avaliados: 2,22 4,18 5,96 8,09), o consumo de MS diminuiu, o que, entretanto, não foi suficiente para reduzir significativamente a digestibilidade das frações nutritivas. O teor de gordura do leite, expresso em %, não foi influenciado (P>0,05) pelos diferentes níveis de NNP, apresentando valor médio de 4,41%. Entretanto, quando expresso em g/dia, houve decréscimo linear com o aumento do teor de NNP das dietas. A proteína do leite, expressa em % e g/dia, decresceu linearmente (P=0,05 e P=0,001, respectivamente) com o aumento dos níveis de NNP nas dietas. As digestibilidades dos nutrientes não foram influenciadas pela utilização de NNP nas rações, entretanto, como houve redução no consumo e na produção de leite, à medida que os níveis de NNP na ração foram aumentados, a recomendação de inclusão de NNP vai depender dos custos da uréia e do leite. 4.2.6 Metionina Sancanari et al. (2001) utilizaram vacas Holandesas com produção superior a 20 kg de leite/dia, de primeira e segunda lactações, com 19±6 dias em lactação, para avaliar o efeito da suplementação com 8,4 g/dia de metionina protegida (MPDR) ou 8,4 g/dia de metionina não-protegida da degradação ruminal (MNPDR) sobre a produção e composição do leite, comparativamente a vacas controle, durante 90 dias. A 32 suplementação com metionina protegida da degradação ruminal esteve mais associada a alterações na produção e no teor de gordura do leite do que aumentos na produção de leite. Embora não se tenha obtido resposta significativas com relação à produção de leite e à produção e teor de proteína do leite, a metionina parece ser um aminoácido limitante para síntese de proteína do leite durante o pico e no início da lactação e ser co-limitante no meio da lactação. Vacas multíparas responderam mais intensamente à suplementação com aminoácidos, aumentando a persistência da lactação, prolongando a produção elevada de leite, durante o pico da lactação, sugerindo que a metionina é um aminoácido limitante no pico e no início da lactação (Sancanari et al., 2001). 4.2.7 Fatores Genéticos A variabilidade entre as raças leiteiras na habilidade de produzir leite e sólidos é uma ferramenta para atuar geneticamente, e mais rapidamente do que a seleção dentro de raça, sobre o potencial de produção de um rebanho.A raça Holandesa apresenta menores percentuais, mas maiores produções totais de gordura e proteína. Já as raças Jersey e Pardo-Suíço, apesar dos altos percentuais
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