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Tema: Aspectos osteomioarticulares e exercício 1. Introdução Ossos, articulações e músculos formam o aparelho locomotor; juntos, interagem para a produção de movimentos. São estruturas com diferentes características e que sofrem adaptações à aplicação de diferentes forças. Essas forças podem ser aplicadas pelo exercício físico, por exemplo, que tem importante papel no desencadeamento de adaptações. No osso, o exercício físico pode acarretar aumento da massa óssea; nas articulações, aumento da amplitude de movimento; no músculo, aumento da força e da área de secção transversa. Dessa forma, o exercício físico mostra-se também importante na prevenção de doenças nessas estruturas, como osteoporose, artrite e atrofia muscular, que se relacionam com perda de massa óssea, desgaste da articulação e perda de massa muscular, respectivamente. O objetivo dessa aula é apresentar as características e funções dessas estruturas, com ênfase nos ossos e articulações; como reagem às diferentes solicitações mecânicas; o papel do exercício físico e a relação entre populações especiais, ossos e articulações e exercício físico. 2. ASPECTOS OSTEOMIOARTICULARES: FUNÇÕES E CARACTERÍSTICAS Os aspectos osteomioarticulares serão abordados de forma separada: ossos, articulações e músculo esquelético. OSSOS O corpo humano possui 206 ossos, os quais formam o esqueleto, que pode ser dividido em axial (cabeça e tronco) e apendicular (membros superiores e inferiores). O esqueleto é uma estrutura dinâmica que apresenta inúmeras funções, como suporte de carga e estrutura, o que permite que o corpo se mantenha ereto – essa é a principal função da pelve, da coluna e das extremidades inferiores (PETERSON & RENSTROM, 2002). Ele também fornece locais rígidos para que músculos, tendões e ligamentos se fixem, permitindo a movimentação, e protege órgãos vitais, como cérebro, pulmões e coração (PETERSON & RENSTROM, 2002). Além disso, é o maior reservatório de cálcio e fósforo do corpo e contém as células precursoras dos glóbulos vermelhos do sangue (abriga a medula óssea) (GONÇALVES, 2000). Os ossos são compostos por água e matriz óssea, formada pelas partes inorgânica e orgânica. A parte inorgânica é composta, principalmente, pelos íons cálcio e fósforo, que formam os cristais de hidroxiapatita. Além desses íons, encontram-se na matriz inorgânica íons bicarbonato, magnésio, potássio, sódio e citrato em pequenas quantidades (GONÇALVES, 2000). Já a parte orgânica é formada por fibras de colágeno, pela substância de base (proteoglicanos) e células do tecido ósseo (osteoblastos, osteoclastos e osteócitos) (BIANCO & FRAGA, 2008). Os cristais de hidroxiapatita alinham-se ao longo das fibras de colágeno e são envolvidos por substância de base. Essa associação entre cristais de hidroxiapatita e colágeno confere a dureza e a resistência características do tecido ósseo (GONÇALVES, 2000). De acordo com BIANCO & FRAGA (2008), as células ósseas são responsáveis pela síntese e pela degradação dos compostos orgânicos do tecido, sendo que cada tipo de célula apresenta uma determinada função. Os osteoblastos são responsáveis pela síntese de tecido ósseo, possibilitando aumento da massa óssea e da regeneração tecidual. Os osteoclastos desencadeiam a degeneração do osso, a partir da reabsorção do tecido lesionado, podendo provocar perda de massa óssea. Já os osteócitos são osteoblastos aprisionados dentro da matriz de colágeno (osteoblastos secretam moléculas de colágeno e proteoglicanos durante a formação de fibras de colágeno). Os osteócitos são responsáveis pelo metabolismo ósseo e pela transformação de estresse mecânico em sinais bioquímicos, servindo como comunicação entre as células e influenciando a remodelação óssea. Todos os ossos são revestidos em suas superfícies externas e internas por membranas conjuntivas, o periósteo e o endósteo, respectivamente. O revestimento das superfícies ósseas é fundamental para a manutenção do tecido ósseo, pois áreas de reabsorção aparecem nos locais que perderam o revestimento conjuntivo ou a camada de osteoblastos. O periósteo é formado por tecido conjuntivo denso, muito fibroso na parte externa e mais celular e vascular na sua porção interna junto ao tecido ósseo. As células do periósteo, os fibroblastos, transformam-se muito facilmente em osteoblastos e têm importante papel no crescimento dos ossos e na reparação de fraturas. Ao longo dos ossos, uma membrana mais delgada, o endósteo, reveste a cavidade central ou medular (GONÇALVES, 2008). As células ósseas garantem a manutenção dos diferentes tipos de ossos (longo, chato ou plano, irregular e curto), os quais são compostos por dois tipos básicos de ossos: os compactos ou corticais e os esponjosos ou trabeculares. O osso cortical (que compõe o corpo do osso ou diáfise) é constituído de várias lamelas (camadas de fibras de colágeno) de tecido ósseo, compondo os osteônios (tubos formados por várias lamelas dispostas em camadas). Já o osso trabecular (que compõe as extremidades do osso ou epífise) possui uma rede de trabéculas interconectadas. Em todos os ossos, a porção trabecular é recoberta por uma camada de osso cortical, conferindo à estrutura óssea rigidez e elasticidade (FRANKEL & NORDIN, 2003). O osso cortical é encontrado predominantemente em ossos longos, como a tíbia, e desempenha um papel fundamental na sustentação de cargas mecânicas impostas pelo sistema musculoesquelético (BIANCO & FRAGA, 2008). ARTICULAÇÕES O sistema articular é formado por articulações, ou seja, por um ponto de contato entre os ossos. Geralmente, as articulações são classificadas de acordo com seu grau de mobilidade: as sinartroses são bastante fortes e imóveis, as anfiartroses são flexíveis e apresentam certa mobilidade, já as diartroses, além de flexíveis, propiciam ampla movimentação (HAY & REID, 1985). Os tipos de articulações serão descritos a seguir de acordo com KREIGHBAUM & BARTHELS (1996). As sinartroses apresentam estrutura fibrosa, as quais unem os ossos por meio de um tecido conjuntivo fibroso. Apesar de serem imóveis, as sinartroses auxiliam na absorção de choque. São exemplos de sinartroses: as sindesmoses que unem o rádio e a ulna (rádio-ulnar) e a tíbia e a fíbula (tíbio-fibular), as suturas cranianas (que propiciam a união dos ossos planos do crânio) e as gonfoses (unem os dentes aos ossos da mandíbula e maxilar). As anfiartroses apresentam estrutura cartilaginosa, unindo os ossos por meio de uma cartilagem, o que confere a essas estruturas uma mobilidade restrita. As sincondroses são anfiartroses que, geralmente, mostram-se como articulações temporárias, com a cartilagem sendo substituída por osso com o decorrer do tempo, como acontece com os ossos longos e entre alguns ossos do crânio. As articulações entre as dez primeiras costelas e as cartilagens costais são sincondroses permanentes. As sínfises constituem-se em outro tipo de anfiartrose, as quais apresentam discos fibrocartilaginosos que, por serem compressíveis, permitem que a sínfise absorva impactos. A articulação entre os ossos púbicos e a articulação entre os corpos vertebrais são exemplos de sínfises. Já as diartroses ou articulações sinoviais são articulações mais complexas, que permitem a realização de movimentos e cujas funções são reduzir o atrito e aumentar a área de contato. Essas articulações incluem a maioria das articulações do corpo, sendo as superfícies ósseas recobertas por cartilagem articular e unidas por ligamentos revestidos por membrana sinovial. As diartroses podem ser divididas completamente ou incompletamentepor discos ou meniscos articulares, cuja periferia é composta por uma cápsula fibrosa, enquanto que suas faces livres são recobertas por membrana sinovial. As diartroses possuem algumas estruturas, como ligamentos, cápsula articular, discos e menisco, que auxiliam na produção de movimento e na redução do atrito. Os ligamentos são estruturas flexíveis, constituídas por fibras colágenas dispostas paralelamente ou intimamente entrelaçadas umas às outras, que permitem liberdade de movimento, apesar de serem muito fortes, resistentes e inelásticas (não cedem facilmente à ação de forças). A cápsula articular é uma membrana conjuntiva que envolve as articulações sinoviais como um manguito. Apresenta duas camadas: a membrana fibrosa (externa), que constitui os ligamentos capsulares, destinada a aumentar sua resistência; e a membrana sinovial (interna), que forma uma cavidade sinovial muito vascularizada e inervada, sendo encarregada da produção de líquido sinovial, o qual contém ácido hialurônico, o que lhe confere a viscosidade necessária à sua função lubrificadora. Os ligamentos e a cápsula articular impedem o movimento em planos indesejáveis e limitam a amplitude dos movimentos considerados normais. Os discos e meniscos intra-articulares são estruturas destinadas a receber pressões, agindo como amortecedores. Meniscos, com sua forma em meia lua, são encontrados na articulação do joelho; já o disco intra-articular é encontrado nas articulações esternoclavicular e na articulação têmporo-mandibular. Os tendões são tecidos conectivos que ficam fora da cápsula articular unindo os músculos aos ossos. Eles têm como função: concentrar a força que movimenta o músculo em uma pequena área do osso e propiciar maior grau de liberdade na mudança de angulação quando o músculo movimenta o osso. Os tendões se inserem na origem do osso e são associados com grandes músculos, os quais podem desenvolver grande força e movimentar relativamente grandes ossos, tais como a pelve e a escápula. Porém, nem todo músculo possui ligação com o osso por meio de tendões. Em alguns músculos, suas fibras se ligam diretamente ao periósteo do osso. Há ainda a bainha sinovial dos tendões, que facilita o deslizamento de tendões, que passam através de túneis fibrosos e ósseos, e as bolsas sinoviais ou bursas, as quais se constituem em fendas no tecido conjuntivo com revestimento sinovial entre os músculos, tendões, ligamentos e ossos, facilitando o deslizamento de músculos ou de tendões sobre ossos ou ligamentos. MÚSCULO ESQUELÉTICO O músculo esquelético apresenta estrutura complexa, sendo constituído por fibras musculares (células) compostas por feixes de miofibrilas. Cada miofibrila é composta de sarcômeros organizados em série e por feixes de miofilamentos finos (actina) e grossos (miosina). Esses miofilamentos estão organizados na forma de “pontes-cruzadas”, que interagem na contração muscular. O músculo interage com os ossos por meio dos tendões, respondendo às forças aplicadas sobre o corpo (KREIGHBAUM & BARTHELS, 1996). O músculo esquelético possui várias propriedades, como: Irritabilidade: capacidade de gerar tensão quando estimulado (potenciais de ação); Capacidade de gerar tensão: a partir das proteínas contráteis, como actina e miosina (componente contrátil); Extensibilidade: capacidade de aumentar seu comprimento; Elasticidade: capacidade de voltar a seu comprimento normal após deformação. Quem responde por extensibilidade e elasticidade no músculo é a titina, a qual fica presa no sarcômero evitando que actina e miosina entrem em colapso. Outro importante componente é a fáscia (endomísio, perimísio e epimísio), a qual, junto com o tendão, forma o componente elástico do músculo. A fáscia forma o componente elástico em paralelo e os tendões e a titina o componente elástico em série. Os músculos apresentam diversas classificações, como quanto ao arranjo de fibras (longitudinal, unipenado, bipenado, multipenado) ou quanto à interação com as articulações, como uniarticular (relaciona-se com uma articulação), biarticular (relaciona-se com duas articulações) e multiarticular (relaciona-se com mais de duas articulações) (KREIGHBAUM & BARTHELS, 1996). Os músculos respondem a um estímulo externo por meio de contrações, sendo que cada músculo ou grupo muscular desempenha uma determinada função. O agonista é o músculo principal, responsável pela realização do movimento. Já o antagonista é o músculo que resiste ao movimento. Ainda há o músculo estabilizador, que mobiliza uma articulação criando condições ótimas para a realização do movimento desejado – geralmente, durante movimento isométrico. O músculo esquelético tem um papel fundamental no desenvolvimento do movimento; ele apresenta diversas adaptações quando submetido ao treinamento físico. Em doenças crônicas, como diabetes, e até em doenças cardíacas, alterações no trofismo muscular, como a redução de massa muscular, podem ser determinantes para o aumento de morbidade e mortalidade nessas doenças. Por isso, o músculo esquelético será retratado em detalhes em outra Leitura Fundamental, para que todos os aspectos relacionados a ele sejam abordados. 3. SOLICITAÇÕES MECÂNICAS OSSOS O osso é submetido a vários tipos de solicitação mecânica, tais como compressão, tração ou tensão, flexão, torção, cisalhamento ou a combinação de duas ou mais forças. Para analisar as respostas do tecido ósseo às diferentes solicitações mecânicas, é necessário realizar testes utilizando equipamentos adequados, que aumentem progressivamente a força até que aconteça a fratura. Esses testes permitem observar a resposta do tecido às solicitações mecânicas e a influência de diferentes condições, como a osteoporose. O osso, dessa forma, apresenta um comportamento mecânico frente às diferentes forças a que é submetido, como podemos observar na curva de estresse- deformação, que ilustra a forma como o osso se deforma sob a ação de uma força (Figura 1). Figura 1. Curva estresse-deformação (Adaptado de FRANKEL & NORDIN, 2003). O osso apresenta duas fases distintas de deformação: a fase elástica, que marca o limite fisiológico, e a fase plástica, que delimita a sobrecarga total que o osso pode suportar. A seguir, faremos uma descrição dessas duas fases, segundo BIANCO & FRAGA (2008). Na fase elástica, a sobrecarga acarreta grande deformação no osso; porém, ele consegue absorver energia mecânica, evitando fraturas. A deformação ocorre na parte orgânica da matriz óssea, onde, para uma pequena deformação, é necessária grande sobrecarga. Quando a sobrecarga cessa, o osso retorna às suas características iniciais (deformação reversível). Na fase plástica, observa-se grande deformação, mas com pequena sobrecarga. O osso perde sua capacidade de suporte de carga: muitas microfraturas e perda de rigidez. Dessa forma, mesmo cessando a aplicação da força, o tecido não voltará mais ao seu estado original, pois uma lesão foi instalada (ponto de fratura). A solicitação mecânica gerada depende da geometria de aplicação da força. Segundo GONÇALVES (2008), a compressão é um tipo de força que, ao atuar sobre o osso, tende a diminuir o seu comprimento e alargá-lo. A tração ou tensão tende a aumentar o comprimento do osso, quando ele é tracionado (a tração acontece ao longo do comprimento do osso). A força de flexão, por sua vez, se expressa quando uma força excêntrica é aplicada à extremidade do osso, tornando-o curvo, provocando, de um lado, estresse compressivo, e de outro, estresse de tensão. Já a força de torção consisteem uma posição fixa de uma extremidade óssea, ocorrendo torção na outra. Há ainda a força de cisalhamento, que decorre da aplicação de cargas paralelas, mas de forma transversal à superfície da estrutura, sendo contrárias entre si. A ação muscular auxilia no suporte de sobrecarga frente à aplicação de diferentes tipos de força, atuando no amortecimento e no controle de choque. Componentes elásticos musculares acumulam energia mecânica em contrações excêntricas, funcionando como amortecedores. O músculo alonga e acumula energia, impedindo que a energia mecânica chegue ao osso ou à cartilagem articular. Essa energia mecânica é acumulada e devolvida na forma de propulsão, como maneira de restituição e economia de energia (GONÇALVES, 2008). Porém, a aplicação de sobrecarga sobre o osso é necessária para estimular a síntese de tecido ósseo; a compressão é a força mais relacionada a essa resposta. A força de compressão acarreta o efeito piezoelétrico, que corresponde a um potencial elétrico negativo desenvolvido no local da compressão, e um potencial positivo nos outros pontos do osso (GONÇALVES, 2008). Pequenas quantidades de corrente elétrica acarretam aumento da síntese óssea pelos osteoblastos na extremidade negativa da corrente, acarretando deposição óssea; já a tração gera cargas positivas, desencadeando aumento da atividade dos osteoclastos e, assim, aumento da reabsorção óssea (GUYTON, 1984). Dessa forma, podemos dizer que a compressão ocasiona síntese óssea (carga negativa) e que a tração ocasiona reabsorção óssea (carga positiva). ARTICULAÇÕES As articulações, assim como os ossos, apresentam propriedades mecânicas que também são expressas por uma curva de estresse-deformação. KREIGHBAUM & BARTHELS (1996) descrevem que, quando o tecido é estirado, geralmente ele retorna ao seu tamanho original, sendo essa propriedade chamada de elasticidade. Se o tecido é estirado até o seu limite elástico, ele não retornará ao seu comprimento original, permanecendo estirado. Essa propriedade é chamada de plasticidade. Algumas evidências sugerem que o limite elástico de tendões e ligamentos pode ser aumentado pelo exercício e treinamento físico; por outro lado, o envelhecimento e a inatividade podem reduzir seu limite elástico (WOO, 1986). Outra importante propriedade das articulações é a estabilidade, que se refere à habilidade de absorver choque e manter um movimento sem prejuízo das articulações e dos tecidos ao redor. Pouca mobilidade articular pode desencadear deslocamento da articulação, entorse de ligamentos ou aumento da tensão sobre os músculos (KREIGHBAUM & BARTHELS, 1996). As três principais formas de manter a estabilidade articular são: uma forte ligação entre osso e articulação, um forte arranjo ligamentar (ligamentos fortes ao redor das articulações para resistir à aplicação de forças) e forte arranjo muscular (ao redor da articulação, propiciando que músculo e articulação puxem juntos os ossos, como na articulação do ombro) (KREIGHBAUM & BARTHELS, 1996). A mobilidade da articulação também é um fator a ser considerado, já que consiste na habilidade de mover os tecidos (ossos e músculos) que estão ao seu redor. A mobilidade é determinada pelo alcance de movimento da articulação, geralmente medido em graus. O alcance de movimento de uma articulação (amplitude de movimento) depende das partes articuladas do osso e da associação entre ligamentos e músculo ao redor da articulação. Como na resposta à aplicação de forças sobre osso e articulações, a amplitude de movimento de uma articulação também apresenta um limite fisiológico, o qual, sendo ultrapassado, pode ocasionar uma lesão. Um fator limitante a essa amplitude de movimento é o tamanho da massa muscular: uma grande massa muscular gera uma restrição ao movimento articular, diminuindo sua amplitude (KREIGHBAUM & BARTHELS, 1996). 4. EXERCÍCIO FÍSICO E ASPECTOS OSTEOMIOARTICULARES OSSOS O tecido ósseo está continuamente se remodelando, o que significa que as células ósseas responsáveis pela gênese e pela reabsorção do tecido estão continuamente sob atividade ao longo da vida (BIANCO & FRAGA, 2008). O exercício físico é um meio de aplicação dessa solicitação mecânica, porém não há consenso na literatura se qualquer tipo de atividade física ou modalidade esportiva pode desencadear efeito positivo na massa óssea, já que esse efeito depende do tipo, da direção, da frequência e da magnitude do estresse imposto sobre a estrutura. EGAN e colaboradores (2006), por exemplo, relatam que exercícios físicos de alto impacto parecem apresentar efeito positivo no osso, com aumento de mineralização óssea, enquanto exercícios com baixo impacto podem ter efeitos negativos ou nenhum efeito sobre a massa óssea. Já VAINIONPAA e colaboradores evidenciaram que mesmo exercícios de baixo impacto podem acarretar efeitos positivos à massa óssea. Quanto às modalidades esportivas, um estudo interessante de FEHLING et al. (1995) investigou o efeito de algumas modalidades sobre o aumento da massa óssea. Os autores verificaram que, dependendo da solicitação mecânica gerada pela modalidade (tipos de movimentos realizados), há uma determinada resposta da massa óssea. Modalidades esportivas como voleibol e ginástica apresentaram maior geração de forças compressivas, desencadeando aumento da massa óssea. Já na natação, a força compressiva existe, mas é de menor magnitude, devido à força de empuxo e ao seu efeito sobre o corpo. É observado aumento da carga interna, a qual se refere à carga imposta sobre os músculos, e não da carga externa, carga imposta sobre os ossos. A resposta do exercício físico seria decorrente do efeito piezoelétrico mencionado anteriormente, que desencadea maior mineralização de cálcio e fosfato no local de aplicação da força de compressão (cargas negativas). O músculo esquelético também parece participar do aumento da síntese de massa óssea, mas de forma indireta, por meio da contração muscular (BIANCO & FRAGA, 2008). Isso ocorreria em virtude do fato de a contração muscular ser capaz de transformar forças de flexão em forças compressivas (FRANKEL & NORDIN, 2003). Por exemplo, quando o colo e a cabeça do fêmur formam um ângulo com a diáfise (corpo do osso) do fêmur, toda vez que uma pessoa permanece em pé ou realiza qualquer movimento, este osso estará sujeito a forças de flexão. Para proteger o osso, a musculatura abdutora do quadril contrai-se, gerando uma força de flexão em sentido contrário, resultando em uma força compressiva que, por sua vez, estimula a mineralização óssea. Vale a pena ressaltar que o desenvolvimento da massa óssea é local específico e que a intensidade e a frequência de aplicação das cargas sobre o tecido ósseo não necessita ser grande – é melhor aplicar uma pequena sobrecarga mais vezes, do que aplicar uma grande sobrecarga uma única vez (BIANCO & FRAGA, 2008). ARTICULAÇÕES Os exercícios físicos podem ser utilizados para melhorar a amplitude de movimento das articulações, como para recuperá-las de lesões ou períodos de imobilização. Exercícios de flexibilidade, assim como exercícios estáticos e dinâmicos, podem ser utilizados para esses fins, cabendo ao profissional de Educação Física avaliar cada situação e orientar sobre o melhor exercício e em que intensidade ele deve ser executado. 5. ALTERAÇÕES NO TECIDO ÓSSEO E NAS ARTICULAÇÕES OSSOS O tecido ósseo sofre várias alterações ao longo da vida, as quais se apresentam em decorrência de diversos fatores, tais como faseS de desenvolvimento, alterações hormonais, aspectos nutricionais e práticaou não de atividade física. O envelhecimento, por exemplo, acarreta redução na atividade dos osteoblastos, o que na mulher é agravado pela menopausa (pela redução hormonal de estrógeno). HAYES (1986) relata que a força e a elasticidade dos ossos diminuem 2% por década dos 20 aos 90 anos. Essa redução na síntese óssea pode se refletir em osteopenia, culminando em um quadro mais grave: a osteoporose. A osteoporose caracteriza-se por uma perda excessiva de massa óssea, tornando o osso mais frágil e quebradiço, para a qual ainda não existe um tratamento efetivo, sendo a prevenção a melhor forma de combate (NORDSTROM et al., 1996). A ausência de aplicação de sobrecarga sobre o osso, como a microgravidade e o acamamento, também interfere negativamente na massa óssea. Astronautas, por exemplo, apresentam perda significante de massa óssea cortical, mas principalmente trabecular, com a microgravidade, gerando risco potencial de osteoporose e deterioração da massa óssea (GEFEN, 2003). Pessoas acamadas também apresentam perda significativa de massa óssea, além de alterações no músculo esquelético (ZWART et al., 2007). Como o osso é um tecido que requer estimulação regular para manter sua massa, a atividade física consiste em uma maneira eficaz (como mencionado acima) de prevenir a osteoporose, pois promove espessamento do tecido ósseo na inserção dos músculos mais ativos, aumento da densidade óssea na região de maior estresse (compressivo) ou até mesmo mudança no formato do osso (GONÇALVES, 2008). O exercício físico pode influenciar o aumento de massa óssea em diferentes faixas etárias; quando praticado na infância e na adolescência, parece ter grande influência positiva na prevenção da osteoporose. Contudo, os benefícios da atividade física para o aumento da massa óssea só irão trazer proteção se a massa óssea acumulada for retida (BIANCO & FRAGA, 2008). Quando comparamos indivíduos sedentários (sem histórico de prática regular de exercícios físicos) e ex-atletas, verificamos que, mesmo após um longo período de inatividade (alguns anos), a densidade óssea desses ex-atletas ainda é maior que a dos sedentários, sugerindo que ao menos parte do ganho obtido pelo período de prática foi mantido (ZANKER et al., 2004). Isso demonstra que a prática de atividades físicas durante a infância e a adolescência pode ser uma forma válida de prevenir perdas maiores de massa óssea ao longo da vida (BIANCO & FRAGA, 2008). De qualquer forma, a prática de exercícios físicos em qualquer idade apresenta benefícios à massa óssea, desde que o estímulo seja compressivo. ARTICULAÇÕES Com o avanço da idade, a produção de líquido sinovial nas articulações é diminuída; a partir daí, começam a surgir os efeitos do envelhecimento nas articulações, que podem ser aumentados tanto por fatores genéticos quanto pelo seu desgaste. Um desses efeitos é a artrite, inflamação no tecido conjuntivo (principalmente das articulações), ou uma degeneração não inflamatória desses tecidos. As formas mais comuns de artrite são a osteoartrite, doença degenerativa causada pelo uso e peladesgaste da articulação, e a artrite reumatóide, doença inflamatória resultante de uma alteração no sistema imunológico (HERNANDEZ & RESENDE, 2008). A artrose é outra doença degenerativa que atinge as articulações, alterando principalmente a cartilagem. A forma mais frequente é a osteoartrose do joelho, que costuma surgir a partir da 5ª década de vida (HERNANDEZ & RESENDE, 2008). Outras alterações também acontecem no tecido articular com o desgaste e o decorrer da idade, como tendinites e bursites, além de lesões no joelho e tornozelo devido ao enfraquecimento de músculos e ossos. A atividade física nessas doenças tem o papel de aliviar a dor e melhorar a amplitude articular. Na artrose de joelho, o fortalecimento muscular é bastante recomendado para auxiliar na adaptação de carga sobre as articulações. Recomendam-se exercícios físicos resistidos para a realização desse fortalecimento. Atividades na água também são recomendadas por apresentarem pouco ou nenhum impacto. Além disso, programas de correção da postura também são indicados (HERNANDEZ & RESENDE, 2008). 6. POPULAÇÕES ESPECIAIS, EXERCÍCIO FÍSICO E ASPECTOS OSTEMIOARTICULARES O envelhecimento, a obesidade e a inatividade são fatores que se relacionam com a incidência de alterações ósseas e articulares em populações especiais, tais como diabéticos, cardiopatas e hipertensos. Como relatado anteriormente, o envelhecimento acarreta diversas modificações nessas estruturas, como redução da massa óssea (osteopenia e osteoporose) e desgaste das articulações. Com a obesidade, há aumento de sobrecarga sobre as articulações e dificuldade na realização de exercícios que forneçam carga compressiva para desencadear a atividade dos osteoblastos. Dessa forma, realizar exercícios físicos pode auxiliar não apenas na manutenção ou no aumento da massa óssea, mas também na redução da sobrecarga nas articulações, também por redução de peso. Além do aspecto da sobrecarga, a obesidade acarreta aumento da inflamação (aumento de marcadores inflamatórios, como as citocinas), o que contribui para a limitação funcional e para a progressão de doenças articulares, como a osteoartrite (MESSIER, 2009). Além dos efeitos diretos nas articulações, esse quadro inflamatório pode afetar a função muscular e diminuir o limiar de dor (MESSIER, 2009), como é visto também na diabetes, por meio das neuropatias (tomar cuidado com os pés: verificar sempre o estado dos pés, utilizar palmilhas). Por isso, realizar exercícios físicos é de fundamental importância para a preservação e a melhoria das condições de ossos e articulações, seja indiretamente, pela perda de peso, ou pelos benefícios diretos nessas estruturas. Contudo, é importante considerar a população que será submetida ao exercício físico, para que se verifique não apenas o tipo de exercício eficaz para ossos e articulações, mas o exercício que também propicie (e não atrapalhe) umaa melhora da doença primária – por exemplo, para uma cardiopatia é essencial analisar as variáveis cardiovasculares. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como visto nesta apostila, ossos, articulações e músculos interagem para a produção do movimento humano, cada um exercendo um determinado papel. O exercício físico acarreta vários benefícios a essas estruturas: nos ossos, promove aumento de síntese óssea, por responder ao estímulo compressivo; nas articulações, auxilia no aumento da amplitude de movimento. Populações especiais (cardiopatas, diabéticos e hipertensos) apresentam a obesidade como fator comum, o que faz aumentar a sobrecarga sobre as articulações, dificultando a realização de exercícios que forneçam carga compressiva para desencadear a atividade dos osteoblastos. Para essas pessoas, exercícios físicos podem auxiliar não apenas na manutenção ou no aumento da massa óssea, mas também na redução de sobrecarga nas articulações, também por redução de peso. 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIANCO, R. & FRAGA, C.H.W. Atividade física e sua influência sobre a osteoporose. In: Atividade Física Adaptada: qualidade de vida para pessoas com necessidades especiais. 2ª ed. Barueri –SP, Manole, 2008. EGAN, E.; REILLY, T.; GIACOMONI, M.; REDMOND, L.; TURNER, C. Bone mineral density among female sports participants. Bone. v.38, p.227-33, 2006. FEHLING, P.C.; ALEKEI, L.; CLASEY, J.; RECTOR, A.; STILLMAN, R.J. 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Bone. v.40, p.529-37, 2007 Tema: Aspectos osteomioarticulares e atividade física Exercícios: 1) A matriz orgânica que compõe os ossos é constituída de: A) Colágeno, cálcio e fósforo; B) cálcio, proteoglicanos e células ósseas; C) Colágeno, proteoglicanos e células ósseas; D) Bicarbonato, magnésio e fósforo; E) Nenhuma das anteriores. 2) Em ordem de mobilidade, da mais móvel para a menos móvel, as articulações podem ser classificadas respectivamente em: A) sinartroses, diartroses e anfiartroses; B) diartroses, sinartroses e anfiartroses; C) anfiartroses, diartroses e sinartroses; D) diartroses, anfiartroses e sinartroses; E) Nenhuma das anteriores. 3) Assinale a alternativa correta: A) O osso apresenta duas fases de deformação: a fase elástica, limite fisiológico, e a fase plástica, sobrecarga total que o osso pode suportar; B) A força de tração ou tensão consiste na solicitação mecânica capaz de aumentar a atividade osteoblástica; C) A estabilidade articular apresenta três propriedades, sendo uma delas a forte ligação entre tendão e articulação; D) A ação muscular não auxilia ossos e articulações no suporte de sobrecarga diante da aplicação de forças; E) Nenhuma das anteriores. 4) O exercício físico aumenta a síntese óssea através: A) do estiramento; B) do efeito piezoelétrico; C) da plasticidade; D) dos osteoclastos; E) Nenhuma das Anteriores. 5) Não se relaciona com a perda de massa óssea: A) a osteoporose; B) a inatividade; C) o envelhecimento; D) a ausência de sobrecarga; E) Nenhuma das Anteriores. RESPOSTAS 1 – C 2 – D 3 – A 4 – B 5 – E
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