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1 O pensamento de Locke Eis que o pensamento de Locke inova a ciência jurídica dada, na medida em que reconhece ao cidadão comum a prerrogativa de resistir às autoridades tirânicas. Atingido o ponto de não direito, abre-se a perspectiva de aplicação do direito de resistência, caracterizando o pacto de consentimento, cuja essência está na limitação do poder do Estado, vale dizer, o pacto de consentimento somente legitima as ações do Estado voltadas para a garantia dos direitos civis e políticos do cidadão. Com isso, Locke justifica a ideia-força de Estado liberal. Destarte, a natureza do contrato social na obra de Locke o faz precursor do liberalismo, seja pela negação da cessão de direitos naturais (cada cidadão entrega ao Estado apenas a prerrogativa de resolver conflitos, permanecendo com o restante dos direitos naturais), seja pela intervenção mínima do Estado nas relações jurídicas privadas. Em consequência, os direitos naturais atuam como limites à ação do estado, cuja legitimação depende da garantia das liberdades individuais. Por conta disso, o núcleo central do ideário liberal é a garantia dos direitos civis e políticos, cuja lógica estatal minimalista rejeita o estado absolutista. Com esse tipo de intelecção em mente, fica mais fácil compreender o espírito que anima o paradigma contratual de Locke, qual seja sufragar as liberdades individuais ante o arbítrio do poder estatal. Eis aqui estampadas, com todas as letras, as razões pelas quais John Locke é apontado como sendo o pai do Estado liberal burguês. No âmbito do contratualismo liberal lockiano, não se pode falar em direitos sociais ou em proteção dos hipossuficientes ou ainda em igualdade real ou material. Tal perspectiva somente vai ser alcançada com o pensamento contratualista de Jean Jacques Rousseau e a sua defesa da democracia plebiscitária. Com efeito, a teorização do contrato social de Rousseau, terceira grande corrente do contratualismo jurídico é calcada na vontade geral, que, em essência, é uma vontade própria que não se confunde com a simples soma das vontades individuais, sendo, com rigor, sua síntese. 2 Para além disso, o contrato social faz referência ao conceito de igualdade natural que por sua vez projeta a idéia de que o pacto rousseauniano visa a reduzir as desigualdades físicas, transformando-as em igualdades em direitos.1 Com isso, acreditamos que dentre todos os contratualistas, Rousseau é aquele que mais se aproxima do princípio democrático. Na verdade, a posição teorizante de Rousseau o coloca na vanguarda da defesa da democracia plebiscitária, vez que sua ideia de mandato imperativo classifica o representante político como mero comissionário do povo. A partir da obra de Rousseau, é possível vislumbrar a formação de um núcleo essencial de uma democracia participativa de viés plebiscitário, que garanta efetivamente a igualdade de oportunidades. Em Rousseau, colhem-se conceitos deveras avançados, muito superiores à formulação hobbesiana de Estado-Leviatã e do Estado-burguês liberal de Locke e que podem servir de fonte de inspiração para o aperfeiçoamento da democracia participativa no Estado contemporâneo. 1 Dalmo de Abreu Dallari em feliz síntese acerca da matéria preleciona, verbis: “Em resumo, verifica-se que várias das idéias que constituem a base do pensamento de ROUSSEAU são hoje consideradas fundamentos da democracia. É o que se dá, por exemplo, com a afirmação da predominância da vontade popular, com o reconhecimento de uma liberdade natural e com a busca de igualdade, que se reflete, inclusive, na aceitação da vontade da maioria como critério para obrigar o todo, o que só se justifica se for acolhido o princípio de que todos os homens são iguais”. Cf. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. São Paulo: Saraiva, 2005, p.18.
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