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01 APRESENTAÇÃO Este é um livro incomum. No começo era um Antonio, era um João. Os dois com perguntas incrédulas: “Por que não existe literatura técnica sobre os meios não motorizados? Por que o Brasil técnico não concede a atenção exigida às pessoas com deficiência – PcDs, aos pedestres, aos idosos, aos ciclistas? Serão minoria desprezível em nossas cidades? Será isto, será aquilo? Até quando?” O Brasil envelhece rapidamente, não tanto como as nações europeias, mas enve- lhece. E esses números não são pequenos, com tendência a crescerem bastante até 2050. Nas cidades brasileiras há muitos idosos, muitos ciclistas, muitas PcDs, e grande parte desses contingentes sente-se prisioneira de suas casas, em cidades despreparadas para suas mobilidades. A cada saída de casa, um risco. A cada saída uma queda, um atropelamento, um acidente. Cada saída uma incompre- ensão, como no dizer de um dos autores deste livro: idosos e ciclistas “eles atra- palham o trânsito”. Felizmente, temos técnicos interessados em apontar problemas e indicar soluções. Este livro reuniu um conjunto deles. Esperamos que logo sejam cen- tenas em prefeituras, nos governos estaduais, no governo federal, nas câmaras municipais, nas assembléias legislativas estaduais, no Congresso Nacional. A luta pela melhoria da acessibilidade e mobilidade dos não motorizados precisa ganhar corpo. São necessários recursos massivos anuais, alocados nas Leis de Diretrizes Orçamentárias, em todos os níveis da administração pública. Nossas cidades precisam se humanizar. Elas precisam diminuir a velo- cidade da mobilidade de alguns, para que todos possam se deslocar com qua- lidade. Não há saída para a mobilidade distante dos modos de transporte de massa. Os meios não motorizados são parceiros e não concorrentes dos modos coletivos. As cidades brasileiras precisam do conceito de vizinhança do Regi- naldo; precisam dos estudos comparativos do Francisco; da experiência holan- desa que Jeröen nos traz; de depoimentos fortes como o descrito por Mesquita; da indignação do Cascaes com nossas calçadas; de tantas outras experiências aqui relatadas. Acreditamos que este livro é um marco na mobilidade brasileira. Oxalá outros livros possam surgir e, em breve, possamos ter um Brasil Não Motoriza- do II, III, avançando na numeração romana até que nada mais precise ser acres- centado a não ser como história. Isto porque já teremos atingido o patamar de qualidade civilizatória, onde nossas cidades trarão não somente orgulho àque- les que nelas vivem, mas efetivamente alegria, conforto, bem-estar e mobilidade fácil para todos. Os dezoito autores desta obra agradecem ao editor, às revisoras, à diagra- madora, aos tradutores, aos patrocinadores, ao convidado especial que empres- tou seu depoimento pessoal, e a todos que, direta e indiretamente contribuíram para a realização deste projeto. Antonio Carlos M. Miranda O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú André Geraldo SOARES 1 Roberta RAQUEL 2 1. O que é ciclabilidade? Pode-se avaliar se uma cidade é ciclável – ou seja, se ela possui condi- ções adequadas para o uso da bicicleta – por meio, principalmente, de duas categorias de análise: a físico-geográfica e a política. A primeira diz respeito às condições de relevo e de clima; a segunda, às ações governamentais e ao com- portamento dos indivíduos e instituições em relação à comunidade. A respeito das condições físico-geográficas, elas serão tanto mais limi- tantes quanto menos expressivas forem as ações políticas pró-ciclismo. Por exemplo, cidades com muitos morros podem tornar-se mais acessíveis às bici- cletas se contarem com bicicletários adequados, bem distribuídos, estruturas de integração com o transporte coletivo (incluindo o transporte das bicicletas nos ônibus) e bicicletas de aluguel. Não necessitamos discorrer sobre condições climáticas extremadas, pois esse não é o caso de nenhuma cidade brasileira. Assim sendo, a ciclabilidade de uma cidade – a condição de ela ser ciclá- vel com segurança e conforto – depende muito de ações do Estado e que elas sejam concretizadas em legislação, em políticas públicas educativas, em infra- estruturas, em fiscalização e aplicação dos direitos. A história recente tem demonstrado que tais ações não são tomadas pelos gestores, legisladores e fiscalizadores públicos sem a intervenção, mais ou me- nos vigorosa, da sociedade civil organizada. Intervenções pró-ciclabilidade são tanto mais necessárias quanto maior for a cidade. Elas incluem, ainda, medidas não exclusivamente ciclísticas, tais como o fortalecimento do transporte públi- co e o disciplinamento do uso e da ocupação do solo. 1 Bacharel e Licenciado em Filosofia; Mestre em Sociologia Política; Secretário Executivo da União de Ciclistas do Brasil (UCB); e Coordenador de Mobilidade da Associação de Ciclismo de Balneário Camboriú e Camboriú (ACBC). E-mail: andre@viaciclo.org.br 2 Bacharel e Licenciada em Geografia; Mestre em Geografia; Professora e Pesquisadora do Insti- tuto Federal Catarinense - Campus Camboriú. E-mail: betasoares8@gmail.com O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. Não existe uma fórmula para determinar o quanto uma cidade é amiga da bicicleta, menos ainda há uma entidade certificadora da ciclabilidade. Por isso, ao abordar o caso de Balneário Camboriú, selecionamos algumas experi- ências nacionais e internacionais, que serão descritas no capítulo que analisa a mobilidade ciclística local. 1. Características de Balneário Camboriú Balneário Camboriú está situada na planície fluvial do Rio Camboriú, no litoral de Santa Catarina. Sua zona urbana é predominantemente plana, com altitude média de 2 m, e algumas áreas habitadas em encostas leves geralmente não alcançam 25 m de altitude (*) [1]. Fundada em 1964, desmembrou-se do município de Camboriú, com o qual está conurbada. O município é importante destino turístico praiano, sendo o turismo sua principal economia. Crescendo 3,7% ao ano, a sua população foi estimada em julho de 2012 em 111.319 habi- tantes [2]. Com 46,49 km² e 2.394 hab./km², é a segunda cidade mais verticalizada do País (57% dos seus imóveis são apartamentos) (*). Durante a passagem do ano de 2012 para 2013, foi estimada a presença de um milhão de pessoas na cidade (*). 2. A mobilidade urbana de Balneário Camboriú Por ser cidade verticalizada em território pequeno, Balneário Camboriú tem um trânsito saturado. Apesar de o seu perímetro urbano ter desenho alon- gado, e excetuando-se a rota de praias mais “agrestes” (onde vive apenas 1,5% da população), a distância de um extremo a outro, por rodovia, é de apenas 11 km. Do extremo mais longínquo até o centro da cidade, o trajeto perfaz 6,5 km. Caso consideremos apenas a região central e bairros contíguos (onde vi- vem 83% da população), de um extremo a outro percorrem-se não mais do que 7 km; e do limite mais distante ao centro, não são mais do que 4 km. Ou seja, adiantando-se o tema que será abordado mais adiante, para a maior parte da sua população, trata-se de uma cidade plenamente ao alcance dos pés e dos pedais. O Município de Balneário Camboriú não dispõe de levantamentos ou pesquisas do tipo Origem/Destino para quantificar os meios de transporte uti- lizados por seus moradores, segundo nos informou, em entrevista, o seu Secre- tário de Planejamento, Sr. Auri Pavoni [3]. No entanto, é nítido que nele se repete a situação de cidades congêneres: não menos do que um terço dos deslocamentos é realizado por meio de veículos motorizados particulares: automóveis e motocicletas. Enquanto a população da cidade cresceu 51,55% nos últimos dez anos, a frota de automóveis cresceu O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. 132,40%; e a frota de motocicletas, 267,27%,alcançando o índice de um veículo motorizado para cada 1,63 pessoa (Quadro 1). Acrescentem-se a esse montante os veículos dos trabalhadores residentes em Camboriú, que possuem 19.353 automóveis e 17.184 motocicletas. Essa frota é 250,75% maior do que há dez anos, e no período de verão e nos feriados pro- longados 74,90% dos turistas chegam até o município vizinho por automóvel, o que aumenta mais ainda a pressão sobre o Balneário. O transporte público em Balneário Camboriú é reduzido. A em- presa Expressul faz o serviço municipal com 23 ônibus, transportan- do 160 mil passageiros/mês, o que representa apenas 5% da popula- ção. Em entrevista, o Sr. Anderson Ferreira, Encarregado de Tráfego da empresa, disse que a quantidade de passageiros vem decaindo ano após ano [4]. Figura 1: Balneário Camboriú - Centro, bairros contíguos e bairros periféricos principais. O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. O município ainda não possui corredores exclusivos para ônibus ou ou- tras políticas de incentivo ao uso do transporte coletivo. A malha viária da cidade vem sofrendo, nos últimos anos, muitas in- tervenções para tentar facilitar o escoamento dos motorizados. As principais avenidas da cidade estão sendo reestruturadas para acomodar quatro faixas de rolamento em sentido único. Também extenso programa de desapropriações está sendo executado, visando à abertura de novas avenidas com as mesmas características. A atual gestão pública planeja ainda a construção de dois viadu- tos, marcando definitivamente a opção pelo modelo rodoviarista. Além disso, destaque-se que a cidade é cortada pela Rodovia Federal BR- 101, cujos 14 km de vias marginais, com tráfego rápido e pesado, condicionam o tráfego local. Apesar dos apelos constantes da sociedade, a Concessionária Au- topista Litoral Sul se mostra absolutamente indiferente aos ciclistas e pedestres, e não construiu até hoje nenhuma ciclovia nas vias marginais. Os 2.360 metros de vias cicláveis ali instaladas devem-se a antigas obras municipais. 1. A mobilidade ciclística em Balneário Camboriú Apesar da ausência de dados e pesquisas a respeito da mobilidade ur- bana [5], é perceptível que o uso de bicicleta em Balneário Camboriú é maior que o verificado na média da Região Sul – estimada em 3% (IPEA, 2011, p. 4). Isso porque em Balneário a estimativa aponta para um percentual situado entre 4% e 5% das viagens realizadas. Também é muito difícil deter- minar a frota do município. No entanto, considerando-se a proporção brasilei- ra de bicicletas [6] por habitante e a dos automóveis por habitante, bem como o percentual de viagens fazendo uso de bicicleta, podemos conjeturar que a frota local situa-se entre 30 e 45 mil bicicletas [6], [7]. Proporcionalmente à população, outrora já foi maior a quantidade de bi- cicletas e menor a quantidade de veículos motorizados no trânsito da cidade. Esse ponto de vista foi corroborado pelos membros da Associação de Ciclismo de Balneário Camboriú e Camboriú (ACBC), em debate coordenado pelos au- tores durante reunião da entidade [8]. Todavia, a situação começou a mudar no final da década de 1980, com o aumento gradativo da frota de veículos motorizados particulares – ritmo que se acelerou na década de 2000. A melhoria da economia nacional, o feti- chismo do automóvel e o poder de interferência da indústria automotiva leva- ram à ampliação da malha rodoviária, que, mesmo assim, está cada vez mais saturada. Com as ruas cada vez mais tomadas por veículos motorizados, a falta de infraestrutura destinada à segurança dos ciclistas, o comportamento preva- lecido dos motoristas, a ausência de programas educativos e a falta de fiscaliza O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. ção do trânsito, declinou sensivelmente o uso da bicicleta em todas as idades e em todas camadas sociais. Paradoxalmente, essa exacerbação do automobilismo se converteu em uma das causas da retomada do uso da bicicleta. Isso porque o conforto do automóvel deixou de ser atraente, em face da demora para vencer curtas dis- tâncias; porque o transporte coletivo tornou-se caro, escasso e pouco atra- ente à população; porque a motocicleta é considerada perigosa, sobretudo pelos mais idosos; e em razão de se exigir idade superior a 18 anos para guiá- -la. Assim, apesar das dificuldades, a bicicleta continua sendo a modalidade de transporte usual na cidade. Além disso, a condição geográfica de Balneário Camboriú favorece o uso da bicicleta. Sabemos que esse veículo, em meio urbano, é o meio de transporte mais eficiente em trajetos de até 8 km (European Comission, apud BRASIL, 2007, p. 60) – extensão que abrange a maior parte da cidade (Figura 1). Tais características fazem de Balneário Camboriú uma só “bacia ci- cloviária” (RAQUEL, 2010). Ou seja, uma unidade de planejamento e gestão que circunscreve a área de interesse do ciclismo – aquela onde o desloca- mento de ciclistas mantém a eficiência –, tendo como seu centro a região para onde ocorre o maior número de viagens. Dito isso, é bastante claro que deixar de investir na mobilidade ciclística em Balneário Camboriú consti- tui, mais do que a negação da vocação da cidade, uma afronta ao bom senso. 1. Avaliação da ciclabilidade de Balneário Camboriú Com efeito, tem havido investimentos municipais para melhorar a ci- clabilidade de Balneário Camboriú. Esse fator também é responsável pelo modesto, mas perceptível, aumento na quantidade de ciclistas na cidade – assim pensam os membros da ACBC, entrevistados em 01/07/2013. Entretanto, ainda estamos bastante distantes da condição ideal, e cum- pre avaliarmos se realmente alcançaremos uma ciclabilidade plena. O estudo das cidades mais cicloinclusivas permite-nos identificar tanto as característi- cas da ciclabilidade quanto os fatores responsáveis por essa condição. A seguir, mesclando experiências internacionais e interpretações nacionais, elencamos os principais critérios para avaliar a situação local. Começamos pelo grupo de consultores dinamarqueses, provenientes de Copenhague, que publica o ranking das “Cidades amigas da bicicleta”, que se baseia em 13 critérios, entre os quais os principais são: sociedade civil organiza- da e atuante; cultura ciclística reconhecida e visível; bicicletários e outras facili- dades; bicicletas de aluguel ou compartilhadas; percentual de ciclistas mulheres; percentual de ciclistas em relação às demais modalidades; interesse político pela bicicleta; estruturas de tráfego acalmado. O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. Em seguida, aproveitamos os Indicadores de qualidade de mobilidade ciclística em Florianópolis, elaborados pela pesquisa da UDESC (com fundos do MCT/CNPq) denominada “Transporte por bicicleta em cidades catarinenses: metodologia para levantamento da realidade e recomendações para incremento da sua participação na mobilidade urbana” (UDESC, 2011) [9]. Dentre os 17 indicadores, os principais são: rede cicloviária abrangendo toda a cidade; aten- dimento das recomendações do Ministério das Cidades; existência e aplicação de legislação; programas educativos; sinalização adequada; planejamento de médio e longo prazos; alocação de recursos no Orçamento do Municipal; pesquisas e monitoramento; incentivos ou recomendações às empresas privadas; departa- mento administrativo responsável pelo planejamento e gestão cicloviários; órgão colegiado democrático, com atribuições relativas à mobilidade ciclística. Especificamente, sobre a qualidade da infraestrutura cicloviária, citamos as “cinco principais exigências para o planejamento cicloviário”, defendidas por técnicos da consultora holandesa Interface for Cycling Expertise – I-Ce (BUIS, 2007). Por trás da aparente simplicidade, está um conjunto de princípios que orientam a confecção dos projetos cicloviários: atratividade, conforto,lineari- dade, segurança e coerência da rede. Também pode ser aproveitada a metodologia do Ciclobservatório - Ob- servatório da Mobilidade Ciclística de Florianópolis, uma iniciativa da ViaCi- clo - Associação dos Ciclousuários da Grande Florianópolis, sob supervisão do holandês Cycling Lab - Metropolitan Cycling Laboratory (SOARES, 2010). A avaliação fica a cargo de usuários, ciclistas experientes, técnicos profissionais e gestores públicos, abrangendo 28 questões. Entre elas estão: velocidade dos motorizados; largura da via; qualidade do pavimento das vias; segurança nas in- terseções; integração com o transporte coletivo; drenagem; sombreamento das in- fraestruturas viárias; respeito dos condutores de veículos motorizados; a acessibi- lidade infantil; o potencial de atratividade; e a sensação de segurança e conforto. Não é possível, no espaço deste artigo, avaliar a cidade a partir de todos esses critérios. Portanto, selecionaremos alguns dos que consideramos os mais importantes e que expõem os aspectos positivos e negativos da experiência lo- cal. Inicialmente, é preciso destacar que existe uma cultura ciclística na cida- de. Acresça-se a esse fato a adoção da bicicleta por camadas sociais que até então não faziam uso dela – notadamente, a classe média –, tanto na modalidade de lazer e esporte quanto de transporte. É importante saber que a sociedade civil exerce influência local. Destaca- -se nesse contexto a ACBC. Segundo a avaliação dos seus dirigentes, a ACBC, que se relaciona nacionalmente com organizações congêneres, é entidade que recebe reconhecimento local. Ela contribui efetivamente para o aumento do respeito à bicicleta na cidade, em ações como: campanhas educativas; pesqui O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. sas; compartilhamento de boas práticas; requerimentos às instituições governamentais; e participação em espaços de uso público. Apesar disso, a so- ciedade civil é raramente requisitada a participar das decisões públicas. Entre- tanto, neste momento inicia-se entendimento entre a ACBC e a Prefeitura para construir, ainda em 2013, uma agenda de encontros regulares. A legislação de Balneário Camboriú é favorável ao ciclismo, revelando que existe compreensão política da sua importância. A sua Lei Orgânica (Lei n.º 933/1990), o seu Plano Diretor (Lei n.º 2686/2006) e suas normas de uso e ocupação do solo (Lei n.º 2.794/2008), tratam da inclusão da bicicleta e da im- plantação de um sistema cicloviário integrado para proporcionar a melhoria da qualidade ambiental da cidade e da mobilidade urbana. Existe um Conselho Municipal de Trânsito (Lei n.º 1.958/2000) com atri- buições para a “circulação e segurança de ciclistas”. Entretanto, ele não reserva cadeira para representantes de ciclistas. Segundo o Secretário de Planejamento, o Conselho não funciona e é dispensável, porque existe troca de informações entre os órgãos públicos. O Departamento de Trânsito e Engenharia (Lei n.º 3.029/2009) deve incumbir-se da circulação e da segurança de ciclistas, mas, como afirma o Se- cretário, o corpo técnico é restrito e não há um funcionário ou setor destacado especialmente para a mobilidade ciclística. Também existe uma Lei que trata do “programa de educação especial de trânsito de ciclistas” (Lei n.º 2612/2006); entretanto, sobre tal programa, nada se conhece de ação efetiva praticada. Ape- sar de a aplicação dessa legislação ser bastante tímida, a lei constitui um instru- mento à disposição da sociedade. Ainda que faltem detalhamentos nos textos de leis como esta, elas expressam princípios que têm validade inclusive para questionamento judicial. Como não há definição de prazos, tampouco obriga- ções orçamentárias expressas, fica a cargo dos interessados fiscalizar o seu cum- primento e demandar o ritmo e o volume necessários para a inclusão ciclística. O incremento da infraestrutura cicloviária é um fator que tem favorecido a ciclabilidade da cidade. A quantidade de vias ciclísticas exclusivas mais do que duplicou nos últimos seis anos. Hoje, segundo levantamento realizado pela ACBC, soma 17.195 metros (Quadro 2) (*). O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. Tais vias têm sido construídas concomitantemente à reforma das vias ro- doviárias, o que demonstra estarem os gestores cientes de que o alargamento viário e a ampliação da capacidade de tráfego e da velocidade dos motorizados aumentarão a incidência de acidentes com ciclistas. Entretanto, devido a esse atrelamento, as vias ciclísticas não compõem uma malha ou rede interligada, mas um conjunto desconectado, forçando os ciclistas a disputar espaço com os veículos motorizados entre um e outro trecho. Segundo a Secretaria de Planeja- mento, essa estratégia continuará sendo adotada, já que a prioridade é continu- ar alargando os principais eixos rodoviários de ligação. De qualquer forma, constata-se que a conexão está ocorrendo aos poucos. A extensão total da rede cicloviária tem crescido a cada ano, o que se converte em estímulo para o uso da bicicleta na cidade, sobretudo pelas pessoas mais inseguras. Ou seja, a ampliação da infraestrutura cicloviária deve ser conside- rada fator que contribui ao aumento da participação da bicicleta na mobilidade urbana em Balneário Camboriú. Apesar de as vias ciclísticas serem implantadas durante as reformas vi- árias, nem sempre elas são entregues com a qualidade adequada. Para falar da qualidade das vias ciclísticas, citamos alguns exemplos baseados nas discussões internas e nos pronunciamentos públicos da ACBC, ao que acrescentamos dois levantamentos entregues à Secretaria de Planejamento do Município e à Câma- ra de Vereadores (*). A via de tráfego geral da Terceira Avenida ganhou novo pavimento, mas a ciclovia ali construída continuou com o original danificado. Também os pavi- mentos das ciclovias na Avenida do Estado e na Avenida Martin Luther, apesar de novos, são demasiadamente ondulados. Citamos, ainda, que a sinalização Figura 2: Ciclovia da Quarta Avenida FOTO: André Geraldo Soares O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. nas intersecções é inexistente ou deficiente em conceder prioridade aos ciclistas, o que tem causado constantes acidentes; que os semáforos não são dotados de indicação e de tempo para ciclistas e pedestres; que diversas vias ciclísticas alagam durante as chuvas; que a maior parte das vias ciclísticas é es- treita (Quadro 2); e que algumas vias rodoviárias requererem estrutura do tipo ciclovia, em vez de ciclofaixa. Embora a resolução seja bastante fácil e barata, some-se a esse quadro a falta de integração acima mencionada. O fato é que o somatório das imperfeições, que poderiam ser facilmente corrigidas, configura um conjunto de baixa qualidade, um sistema desconfortá- vel, perigoso e pouco atrativo, gerando críticas e resistências sociais. Além disso, as demais medidas acessórias, necessárias à segurança e ao conforto do ciclismo e à adaptação geral da sociedade, inexistem ou não são perceptíveis. O único bicicletário público é danoso às bicicletas; não há progra- ma educativo para nenhum dos usuários da via pública; e a fiscalização para a garantia dos direitos dos ciclistas é deficiente. Do mesmo modo, os ciclistas não são alertados nem educados quando cometem infrações ou imprudências. Dessa forma, pode-se avaliar que a municipalidade perde uma boa opor- tunidade de potencializar ainda mais a ciclabilidade de Balneário e de, con- sequentemente, aumentar a quantidade de adesões à bicicleta. Caso o poder público deseje obter maior respaldo para prosseguir com suas ações, diminuin- do a resistência principalmente dos comerciantes que se aferram às vagas de estacionamento em vias públicas, deverá conferir qualidade à infraestrutura, para que mais ciclistas possam usá-las sem receio. A Secretaria de Planejamento,contudo, argumenta que a adesão à bici- cleta dará um salto, chegando a “perto de 20%” das viagens diárias. Mas não soube precisar o prazo. Referindo-se ao mapa Sistema Cicloviário de Balneário Camboriú 2013 (*), afirma, ainda, que até o final do mandato a cidade terá, se- não os 75,47 km de ciclovias e ciclofaixas ali assinalados, algo “bem próximo a isso”. Entretanto, a soma das vias ciclísticas projetadas no citado mapa alcança 83.870 m. Adicionando-se os 17.195 m de vias ciclísticas já implantadas, che- garemos ao total de 101.065 m. Se isso ocorrer, a quantidade de vias ciclísticas por habitante será elevada dos atuais 15,45 cm/hab. (semelhante e até superior a outras cidades brasileiras mais destacadas) para 80,21 cm/hab., um índice so- mente alcançado pelas cidades europeias mais amigas da bicicleta. Outra infraestrutura planejada é a instalação de 87 bicicletários em áreas públicas, seguindo o modelo “de encosto” recomendado pela União de Ciclistas do Brasil (UCB) e pela própria ACBC. Entretanto, como não há verba específica destinada para essas obras, estando elas condicionadas à reforma viária em an- damento, sua instalação efetiva é igualmente incerta. O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. Resgatar a ciclabilidade de um município com as características de Balne- ário Camboriú não é uma tarefa nem simples, nem rápida. A cidade tornou-se um organismo complexo e disputado por diversos interesses. Sua dimensão, o adensamento automobilístico e os hábitos dos munícipes, formados em décadas de investimentos financeiros e ideológicos no automobilismo, requerem ações continuadas e com a cooperação de todos os setores sociais. Nesse sentido, res- gatar a ciclabilidade significa construí-la para um novo formato de cidade. A saída pode estar em um pacto, a ser coordenado pela municipalidade, com a participação de toda a sociedade, propondo metas de curto, médio e longo prazos. A ferramenta principal para isso seria um Plano Municipal de Mobilidade Urbana, que agora tornou-se exigência federal com a recente Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei n.o 12.587/2012). A Secretaria de Planejamento afirmou publicamente em 06/03/2013, na Câmara de Vereadores, que tal plano existe; repetiu a afirmação durante a entrevista concedida para este artigo, mas não apresentou nem soube informar sua localização. Não parece esse pacto que será iniciado dentro da estrutura adminis- trativa da prefeitura, já que a Secretaria de Planejamento, que deveria coorde- nar o processo (ainda de acordo com a entrevista), não pensa em agir de forma integrada com as demais pastas antes de que as condições de segurança para o ciclismo estejam garantidas. Enquanto isso, as críticas ao sistema vão sendo re- distribuídas de um órgão para outro, sem o esforço por uma solução conjunta. Resta à sociedade civil prosseguir atuando e buscando meios de exercer mais influência sobre a política urbana, pois apenas a boa intenção de uma ad- ministração não oferece garantias de continuidade dos projetos nas sucessões eleitorais. Ao final do mandato, certamente teremos uma cidade remodelada para o automóvel (e, muito provavelmente, sem o sucesso esperado), mas não é tão certo que teremos uma cidade segura para quem usa a bicicleta. Como resultado, persiste a incerteza não somente quanto ao resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú, mas também quanto à possibilidade de que o município possa, servindo de exemplo para as demais cidades, em um prazo compatível com as expectativas sociais, tornar-se autenticamente huma- nizado, democrático e sustentável, tal como se exige de uma sociedade inteli- gente e próspera que pretende ser. 1. Conclusões e recomendações Aos cidadãos e instituições interessados em construir uma cidade amiga da bicicleta, cabe, inicialmente, reconhecer que essa tarefa não é incumbência de nenhum setor específico, mas sim de toda a sociedade. A sociedade civil deve, portanto, exigir que o Estado, o poder público, efetivamente cumpra sua função de promover o bem comum – no caso, o de executar políticas e de intervir junto à iniciativa privada com a finalidade de O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. conceder prioridade à mobilidade de pedestres, de ciclistas e do transpor- te público, tendo em vista os inúmeros benefícios gerados por esse modelo, tan- to para a comunidade quanto para a natureza e os para os próprios indivíduos. Dessa forma, os prazos e as metas devem ser estabelecidos pela comuni- dade, e este artigo apenas contribui para o debate, ressaltando a importância, entre outras medidas, da democracia na gestão municipal, da pesquisa e do monitoramento, do investimento maciço em infraestrutura de qualidade, do planejamento de curto e longo prazos, dos programas educacionais e da fiscali- zação para garantir os direitos de uso do espaço público. Notas [1] (*) O asterisco entre parênteses indica que a respectiva referência bi- bliográfica foi omitida em função das limitações de espaço do artigo. Adotamos essa estratégia para as consultas realizadas na Internet, que podem ser efetua- das também pelos leitores. [2] Todos os dados populacionais são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). [3] Entrevista com o Sr. Auri Pavoni, Secretário de Planejamento de Bal- neário Camboriú, e com Helvys Zermiani, Arquiteto do mesmo órgão, realiza- da em 26/06/2013. [4] Entrevista realizada em 05/07/2013. O entrevistado não dispunha do relatório para informar o percentual de decréscimo anual de passageiros trans- portados. [5] Não há consenso sobre a estimativa da frota de bicicletas nacional. A Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motone- tas, Bicicletas e Similares (ABRACICLO), em artigo de 2012, informa ser de 70 milhões. Entretanto, a Associação Brasileira da Indústria, Comércio, Importa- ção e Exportação de Bicicletas, Peças e Acessórios (ABRADIBI) afirma que em 2011 ela era de 80 milhões. [8] O debate ocorreu em 01/07/2013; estavam presentes os seguintes membros: Carlos Beppler, Daniela Serpa, Fernando Baumman, Gil Silva, Hen- rique Wendhausen, Luiz Matos, Mário Bazan e Ricardo Macedo. [9] A pesquisa “Transporte por bicicleta em cidades catarinenses: metodo- logia para levantamento da realidade e recomendações para incremento da sua participação na mobilidade urbana”, da UDESC, com fundos do MCT/CNPq, levantou diversos outros importantes dados e, também, envolveu Balneário Camboriú. Com o intuito de fundamentar suas atividades sociais, a ACBC bus- cou – mas não conseguiu – obter os resultados até a data limite da publicação deste artigo. O resgate da ciclabilidade de Balneário Camboriú. Referências Bibliográficas BALNEÁRIO CAMBORIÚ. Prefeitura Municipal de Balneário Cambo- riú. Sistema Cicloviário Balneário Camboriú 2013. Disponível em: http://www. acbc.com.br/mobilidade/projetada/baln-camboriu/. Acesso em: 19/06/2013. BRASIL. Ministério das Cidades. Caderno de referência para a elabora- ção de Plano de mobilidade por bicicleta nas cidades. Brasília: Ministério das Cidades, 2007. IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. 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Florianópolis, Cycling Lab/ViaCiclo - Julho de 2010. Disponível em: http://bicicletadanacional.files.wordpress.com/2013/01/anexo-5b-guia-viaciclo. pdf. Acesso em: 07/06/2013. UDESC - Universidade do Estado de Santa Catarina. Indicadores da qualidade da mobilidade ciclística. Florianópolis, 2011. Disponível em: http:// www.slideshare.net/pqbicisc/indicadores-qualid-mobilid-ciclstica-fpolis-cn- -pq-udesc. Acesso em: 16/06/2013. BUIS, Jeroen. 5 principais exigências para o planejamento cicloviá- rio. I-Ce, Rio de Janeiro, 2007. Disponível em: http://www.cefid.udesc.br/ciclo/ Apresentacao.Jeroen.Buis.Exigencias.pdf. Acesso em: 09/06/ 2013. 02 A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais Antonio Carlos M. MIRANDA 1 1. Considerações Preliminares A bicicleta é um veículo seguro para circular no meio urbano brasileiro? Respondendo de forma direta, apesar das muitas opiniões contrárias de cicloa- tivistas, diríamos: não! No entanto, é preciso relativizar esta negação. Algumas cidades prepararam espaços apropriados, investiram em cam- panhas educativas, trabalharam para reintroduzir a bicicleta no cenário do trânsito urbano. Foi dito “reintroduzir” porque mesmo com o início do fordis- mo, na primeira década do século XX, ela sempre esteve presente no trânsito das cidades, até meados dos anos 40. Somente após a Segunda Guerra Mundial, ela foi gradualmente sendo expulsa das ruas das urbes, em todos os continentes. Mesmo onde sempre encontrou ambiente favorável – China e Índia, além de outros países do sudeste asiático –, a chegada tardia da “modernidade” e da automovelcracia, nos anos 90 do século XX, fez o livre trafegar da bicicleta pelas ruas um risco para a integridade física dos ciclistas. Para muitos governantes, ela representa perigo para as classes médias emergentes motorizadas. Por isto, preferem adotar medida nunca antes imaginada. Ou seja, apartá-las do tráfego motorizado, com a criação de pistas especiais para sua circulação. O problema, entretanto, é que administradores públicos, em muitas ci- dades brasileiras, imaginam que com a criação de ciclovias ou ciclofaixas, em poucas vias, estará resolvido o conflito – como se ciclistas quisessem ir apenas a poucos lugares. Não compreendem, ou não querem compreender, que ciclistas precisam e têm como desejo de viagem todos os lugares das cidades, por diver- sas razões, sendo o lazer apenas um dos motivos. 1 Arquiteto/Urbanista; Ex-presidente da União de Ciclistas do Brasil - UCB; Membro do Conselho Fiscal da Associação de Ciclistas do Alto Iguaçu – Cicloiguaçu; Coordenador do Programa Cicloviário de Curitiba pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba/ IPPUC; E-mail: antomiranda@ ippuc.org.br A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. No mundo ocidental, a redenção da bicicleta somente viria a ocorrer com as crises do petróleo, nos anos 70 do século XX. No entanto, após esta década, as mudanças ocorreram apenas em alguns países do norte europeu, com desta- que para Holanda, Alemanha e Dinamarca, cujas populações passaram a exigir mais e mais espaços para a sua circulação segura. A segurança da bicicleta sempre foi tema recorrente no mundo técnico. Entretanto, qual uma moeda, ela tem duas faces. Numa delas se apresenta a se- gurança, vista por aqueles que não a utilizam e a veem como veículo de alto ris- co no trânsito urbano. No outro lado, têm os ciclistas que entendem a questão da segurança muito mais como ausência de campanhas educativas e controle da velocidade dos veículos motorizados. 2. Os problemas e recomendações afetas aos ciclistas Ciclistas do mundo moderno podem ser comparados a cavaleiros andan- tes destemidos da Idade Média europeia ou às famosas amazonas, lendárias figuras mitológicas gregas sobre cavalos (1), tais são os riscos que mulheres e homens ciclistas vivem no trânsito das cidades. Por serem poucos os espaços dedicados aos ciclistas, há a necessidade de o condutor da bicicleta se precaver, adotando alguns procedimentos. Do ponto de vista da visibilidade, é fundamental que use roupas claras ou refletivas. En- tretanto, como tal condição nem sempre é possível, é desejado que tenha em sua bicicleta luzes refletoras; catadióptico (olho de gato) no paralama da sua bicicleta, e outros elementos refletivos nas rodas e em outras partes do veículo. Nas bicicletas dos países do norte europeu são exigidos apenas três ele- mentos: catadióptico, farol e paralama. Uma vez que a maioria dos ciclistas não faz uso de capacete, estas são condições básicas de segurança. No entanto, é im- prescindível que não faltem os elementos básicos da bicicleta, como freios (dian- teiro e traseiro), espelho retrovisor e pedais. Existem muitas bicicletas circulan- do em cidades brasileiras com péssima condição de manutenção, até mesmo sem pedais, sendo o impulso concedido pelo pé diretamente sobre o pedivela. Muito ciclista brasileiro faz pouco caso de sua segurança. Não querem entender que o parachoque no acidente é o seu próprio corpo. Portanto, vestir- -se adequadamente, assim como cuidar das condições da condução da sua bi- cicleta são fatores fundamentais para diminuir riscos de acidentes. Também o comportamento na via pública muito ajuda na sua segurança. É sempre im- portante indicar aos demais usuários da via, motorizados ou não, qual é a sua intenção. Neste sentido, o ciclista deve sempre avisar com os braços o que pre- tende realizar. A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. Muitos manuais mostram, de forma clara, como devem ser adotados pelos ciclistas procedimentos mostrando suas intenções na condução dos seus veículos. O Manual do Ciclista de Florianópolis (2), em sua página 72 (Figura 2.1), mostra como deve o ciclista se comportar na via pública antes de fazer uma manobra. Também destaque é feito ao manual da Universidade Federal do Paraná (UFPR), através do Programa Ciclovida – Pedalando na Cidade (3), que em sua página 21 mostra como o ciclista deve se comportar no trânsito, entre outras recomendações de segurança à condução da bicicleta. Um dos destaques do manual é o item “Saúde da Bicicleta”, onde é pedida atenção para a regulagem periódica dos freios, assim como para a revisão de todos seus componentes. Na página 28 são ressaltados os “Equipamentos de Segurança da Bici- cleta” (ver Figura 2.2). Destaque é dado ao espelho retrovisor e à campainha, este último também equipamento obrigatório nas bicicletas europeias. Quanto à segurança dos ciclistas, na página seguinte, são destacados o uso de roupas claras, luvas, óculos e capacete. Sobre o uso do capacete há grande polêmica em nível internacional e começa a surgir também entre os grupos de ciclistas brasileiros mais ativos. Figura 2.1: Mostrando como o ciclista deve indicar manobras no trânsito. FONTE: IPUF, Prefeitura de Florianópolis, “Pedalando em Florianópolis - Manual do Ciclista”, 2003. Figura 2.2: Uso dos refletivos na bicicleta. FONTE: Pedalando na Cidade - Programa Ciclovida da UFPR, Julho, 2013. (http://www.ciclovida.ufpr.br/?cat=5) A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. O fato é que ninguém tem dúvida de que o capacete oferece proteção efetivana maioria das quedas. Há forte debate sobre a eficácia da maioria desses equipamentos vendidos no comércio. Em verdade, há a certeza de que os capa- cetes protetores são somente aqueles com custo igual ou superior ao da bicicleta nova mais barata do mercado. Neste sentido, passa a ser um equipamento incapaz de ser banalizado entre os ciclistas comuns. Assim, muitos usuários da bicicleta, os mais cons- cientes dos riscos da circulação cotidiana no espaço urbano, preferem não fazer uso deste tipo de equipamento para não se distanciar dos ciclistas mais comuns – trabalhadores e estudantes com parcos recursos financeiros. No entanto, as autoridades e grande parcela da sociedade, em especial usuários cativos do au- tomóvel, veem com maus olhos aqueles que não se utilizam deste acessório. Sobre o uso do capacete, ainda, citamos artigo intitulado “Capacete – Usar ou não Usar?” (4), publicado nos anais do XV Congresso da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), em 2005, que apresentou, de forma mais abrangente, a polêmica gerada na Europa e na Austrália, sobre a obrigato- riedade do seu uso. Alguns aspectos da segurança não estão afetos à conduta e consciência dos ciclistas, às suas vestimentas ou aos equipamentos que carregam em sua bicicleta. Uma grande parcela da segurança dos condutores das duas rodas leves depende dos demais modos de transporte que circulam nas vias públicas. É pre- ciso que as autoridades compreendam, de uma vez por todas, que a velocidade mata. Em acidentes com velocidade de até 45 km/h, as chances de sobrevivência dos ciclistas, e mesmo dos pedestres, é superior a 70%. No entanto, a partir des- te limite, a curva se acentua rapidamente, ou seja, a parábola tem uma inflexão ascendente, e os riscos à vida aumentam de forma exponencial. É importante observar que ao dobrar a velocidade de um automóvel, o tempo necessário para efetuar uma parada repentina cresce exponencialmente. Assim, veículos motorizados trafegando a uma velocidade de 36 km/h, TABELA 2.1: Distância percorrida após acionamento do freio de um automóvel, segundo diferentes velocidades. FONTE: http://zonaderisco.blogspot.com.br/2009/11/velocidade-colisao-e-tempo-de-reacao.html A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. ou 10m/s, ao perceber um obstáculo precisam de 12 metros para efetuar a parada. No entanto, se esta velocidade for dobrada para 72 km/h, ou 20 m/s, ele precisará do triplo de distância (Ver Tabela 2.1). Portanto, acima de 60 km/h, o automóvel já terá atingido o obstáculo visto ini- cialmente pelo motorista, antes de ocorrer a parada total do veículo. Reduzir a velocidade nas vias públicas é fator decisivo à segurança dos ciclistas, contribuindo para aumentar a humanização do trânsito urbano. Esta medida deve ser acompanhada de outras ações relacionadas à sinalização e ado- ção de dispositivos de segurança, como a canalização da circulação de pedestres e de veículos nos cruzamentos. Nas travessias de pessoas, através da implan- tação de gradis, e na circulação de veículos motorizados, através da implan- tação de ilhas físicas, minirotatórias e outros dispositivos voltados a acalmar o tráfego. É recomendado que o pavimento das vias nos cruzamentos receba intervenção, pelo uso de material corrugado, gerando trepidação nos veículos e contribuindo assim para reduzir a velocidade da via. A segurança dos ciclistas também está vinculada à sua capacida- de de percepção quanto à movimentação geral do trânsito, assim como à sua maior exposição à visão dos demais condutores dos veículos motoriza- dos. Não é à toa que muitos acidentes graves com ciclistas ocorrem devi- do a estarem eles posicionados em pontos cegos de veículos de grande porte. Também porque o conjunto bicicleta-ciclista é tido como transparente, não sen- do perceptível pelos motoristas. Um fato gerador de dificuldade aos ciclistas – assim como aos pedestres, é o uso em larga escala nos automóveis do dispositivo conhecido como “insul Figura 2.3: Legislação - Resolução 254 de 26/10/2007 do CONTRAN Conjunto de transparências permitidas por lei. FONTE: http://www.insulfilmautomotivo.com.br/legislacaoinsulfilm A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. film”. Este emprego, até certo ponto criminoso, impede que ciclistas e pedestres percebam a intenção dos motoristas e se estes têm inteira percepção da presença das pessoas não motorizadas circulando na via. O problema não é tanto o uso do insufilm, mas sim o grau de opacida- de adotado pelos motoristas em seus vidros, que vai além do permitido pela legislação É comum encontrarmos automóveis portando vidros traseiros com menos de 28% de visibilidade, e assim fazendo com que ciclistas e pedestres fiquem invisíveis aos motoristas. Ainda que a legislação impeça que no vidro dianteiro este percentual seja menor que 75%, e as fábricas não possam entregar ao mercado vidros com tal dispositivo, há complacência generalizada dos ór- gãos fiscalizadores de trânsito no rigor ao controle da legislação. A Escola de Bicicleta nos ensina: “motoristas precisam prestar atenção em muita coisa ao mesmo tempo. A bicicleta é visualmente o menor dos veí- culos no trânsito, portanto o mais difícil de ser percebido” (6). Assim, não ter a visão plena dos ciclistas na via pública é aumentar muito as possibilidades de acidentes, com consequências graves para os condutores de bicicletas. 3. O Cavalo de Tróia administrativo capaz de gestar mudanças A gestão dos recursos públicos depende do controle e distribuição dos gastos, assim como do planejamento de ações para o presente e para o futuro. Em países não desenvolvidos, a tarefa de distribuição dos recursos obtidos com a cobrança dos impostos visa ao atendimento tanto de novas como de velhas demandas. Os recursos são sempre escassos diante das demandas de educa- ção, saúde, moradia e medidas voltadas à oferta de empregos para a população. Ressalte-se que os poderes públicos sempre encontram espaço em alguma ru- brica orçamentária para incluir ações voltadas ao provimento de mais recursos visando à ampliação do sistema viário e à mobilidade dos automóveis. O fato é que os técnicos dos muitos órgãos públicos nas prefeituras, e mesmo nos órgãos governamentais federais, são resistentes ao provimento de recursos voltados à mobilidade de pedestres e ciclistas. Na maioria dos casos, entendem que realizar algum tratamento nas interseções satisfaz plenamente as necessidades dos usuários da bicicleta e do modo a pé de deslocamento. Este, porém, não é somente um equívoco, é um preconceito. Mais do que isto, repre- senta a ditadura da preferência pela carrocracia. Assim, é fundamental que os administradores criem divisões e/ou depar- tamentos, no interior dos órgãos de transportes e/ou de trânsito, com a tarefa exclusiva de organizar e acompanhar as ações em prol dos meios não motoriza- dos. Caso já exista órgão específico de planejamento na cidade, algumas pessoas devem ser incumbidas desta tarefa. Isto tanto na organização dos planos, pro- gramas e projetos, como no acompanhamento das operações e ações voltadas à implantação das obras, além da recepção das demandas da comunidade. Tais A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. servidores deverão dedicar-se integralmente às ações da mobilidade ur- bana dos deficientes, dos pedestres e dos ciclistas. Somente assim poderá ser dito que um município ou cidade tem efetivamente compromisso com a mobi- lidade não motorizada. A importância da criação de um departamento se deve ao fato de que assim é possível à administração pública alocar, para o mesmo, recurso orça- mentário anual. Com talprocedimento é estabelecida certa independência das ações voltadas à mobilidade não motorizada, porque as mesmas deixam de ser dependentes de “sobras” das políticas destinadas a outros meios de transporte, em especial as voltadas ao provimento de recursos para a circulação dos auto- móveis. Um dos grandes desafios para os novos administradores das políticas e ações em prol da mobilidade não motorizada é o “enfrentamento” com os técnicos há muito presentes na administração pública, que se dedicam a pro- jetos do sistema viário. Ao longo de anos, esses técnicos estiveram voltados à produção de mais e mais espaços para o automóvel, estimulados pelas mídias, pelas empresas do setor e pela cultura geral da motorização. O foco sempre foi produzir mais fluidez à movimentação dos veículos motorizados; eliminar con- gestionamentos; produzir caminhos alternativos. De repente, aparece um novo foco nas ações da mobilidade – o transporte não motorizado. Juntamente com a estupefação, surge um quê de desaprovação diante da perda de espaço, perda de recursos financeiros, mudança de prioridades. E isto normalmente é enfrentado com meios-boicotes, meias-vontades colaborativas, meios-preconceitos, meias- -discordâncias sobre os trabalhos a realizar. Neste sentido, o comportamento dos técnicos responsáveis pelos servi- ços e projetos para os não motorizados deverá ser o de atuar sempre de forma colaborativa, de maneira a convencer sobre a importância da inclusão de novos modais em uma nova escala de considerações da mobilidade urbana. Sem per- der de vista as ações voltadas ao transporte coletivo, devem tais agentes mostrar que há espaço para todos e que a bicicleta, o pedestre e o deficiente são apenas partes do conflito a ser resolvido, e não representantes de modos de transporte concorrentes. 4. Conceitos gerais sobre a mobilidade urbana por bicicleta Existe a crença generalizada de que viagens por bicicleta devem ser reali- zadas em distâncias de até 5 km. Porém, pesquisas em várias cidades, no Brasil e em países da Europa, têm revelado que havendo infraestrutura e ocorrendo condições favoráveis de topografia e clima, as viagens por este modal no meio urbano podem atingir números muito superiores ao patamar do senso comum. Assim como a escolha modal depende da extensão da viagem, também tem-se o fator topografia para que os ciclistas façam uso de suas bicicletas. O A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. Gráfico 4.1 demonstra que a maioria dos ciclistas nas cidades dinamar- quesas pedala distâncias de até 5 km. No entanto, quando ocorre a junção de se ter um sítio físico plano e infraestrutura exclusiva, como é o caso de Floria- nópolis e Sorocaba (Tabela 4.1), os ciclistas mencionam distâncias percorridas superiores a 5 km. E não raro podem ser encontrados ciclistas que pedalam cerca de 40 km diariamente para ir ao trabalho e voltar para casa, em muitas cidades brasilei- ras. Também menciona-se o resultado da pesquisa do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), realizada em 2008, em 80 locais do município. Na pesquisa, dos 12 primeiros destinos de viagens dos ciclistas, cin- co foram para municípios vizinhos de Curitiba, representando 27,9% de todos os deslocamentos por bicicleta. Portanto, percursos diários que superam em Gráfico 4.1: Extensão de viagens por todos os modos, de pessoas com idade de 10 a 84 anos na Dinamarca, 1998. FONTE: Søren Underlien, Jensen e outros. Road Directorate Danish Cyclists Federation. Collection of Cycle Conceptions. Tabela 4.1: Comparativo de dados gerais dos ciclistas em quatro cidades selecionadas no início da década de 2000. FONTE: Acervo pessoal de Antonio C. M. Miranda - Curitiba, 2003 A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. muito os 5 km de trajetos entre ida e volta ao trabalho e ao estudo, moti- vos que juntos representaram mais de 90% das viagens realizadas. É importante observar que há grande dúvida daqueles que não fazem uso da bicicleta quanto às condições climáticas. É frequente a pergunta aos ciclistas sobre como procedem em períodos ou dias chuvosos. Em muitos países euro- peus a chuva e a neve, ambas com intensidade moderada, não constituem em- pecilho à circulação dos ciclistas. A Figura 4.1 apresenta exemplo de circulação em dia chuvoso na cidade de Utrecht, na Holanda. No Brasil, em que as chuvas tropicais possuem precipitação mais intensa, este fato é considerado como problema e desestímulo ao uso da bicicleta. Como atenuante a essa condição climática, observe-se que se por um lado as chuvas têm muitos milímetros em sua intensidade, por outro lado têm curta duração, não passando de 20 a 30 minutos em cada precipitação. À exceção do litoral nordestino e da Região Norte, as chuvas com preci- pitação continuada, ao longo de todo o dia, ocorrem em meses específicos, não sendo superior a quatro meses. Neste sentido, em dois terços do ano a chuva não constitui fator de desestímulo à pedalada. Como o uso da bicicleta está muito mais associado às condições da in- fraestrutura do que ao clima, apresenta-se na Tabela 4.2 um comparativo da pluviometria na cidade de Amsterdam, na Holanda, e em uma das áreas homo- gêneas da Região Sul, que envolve a região de Curitiba. De fato, a precipitação nesta região, em média, é quase duas vezes superior à apresentada na capital holandesa. Este fator deve ser ponderado levando-se em conta a duração da precipitação, que no caso brasileiro é muito menor do que aquelas observadas no caso holandês. Ou seja, muitas precipitações na região de Curitiba ocorrem em curtos períodos do dia. Figura 4.1: Ciclistas circulando em dia chuvoso, Utrecht, Holanda, 2007. FOTO: Antonio C. M. Miranda A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. 5. O sapato do ciclista e os armários da bicicleta Sendo a bicicleta o sapato ou o tênis do ciclista, o estacionamento é o armário da pedalada. Sem a existência de espaços para a guarda da bicicleta é difícil se ter estímulo ao seu uso. Existe uma polêmica brasileira quanto a se considerar o paraciclo como equipamento ou como estacionamento de curta duração para a bicicleta. A maioria dos ciclistas ativistas compreende o bicicle- tário como estacionamento com controle de acesso. No entanto, a população em geral continua chamando de bicicletário qualquer estacionamento de bici- cleta. Como se houvesse uma norma culta para as questões da bicicleta, tentati- vas ocorreram para mostrar diferenças e definir normas a serem seguidas pelos executores de projetos. A verdade, porém, é que faltam estacionamentos em profusão nas cida- des brasileiras. E pouco importa se são paraciclos, bicicletários ou apenas esta- cionamentos para bicicletas. Um ponto crucial é fazer com que as autoridades entendam que o dispositivo mais importante a ser adotado para a guarda da bicicleta é o conhecido “U” invertido, com apenas uma haste (ver Figura 5.1). O restante são variações arquitetônicas ou de design que podem acrescentar ao espírito, à estética, mas que cumprem papel idêntico ao do “U” invertido ou do “C” deitado. Construir bicicletários integrados à rede de transporte coletivo é tarefa das mais importantes a ser empreendida pelas administrações públicas respon- sáveis pelos transportes, tanto no meio urbano como no meio rural. Esta é uma tarefa essencial nos bairros periféricos das grandes áreas urbanas, estejam elas no Brasil ou em qualquer parte do planeta. Tal afirmação tem por base o fato de que a capilaridade da bicicleta, assim como a do automóvel, não pode ser repetida sem alto custo pelos serviços de transporte coletivo. Os bicicletários com controlede acesso, seja junto aos terminais de trans- porte coletivo de ônibus, trem ou barcas, seja junto a polos geradores de viagem, nas médias e grandes cidades, requerem serviços especiais. Tabela 4.2: Comparativo da precipitação pluviométrica anual de uma das áreas homogêneas do Sul do Brasil, em que se situa Curitiba e a cidade de Amsterdam, Holanda FONTES: http://www.guiaviagem.org/holanda-clima/# e http://mtc-m16.sid.inpe.br/col/sid.inpe.br/jeferson/2004/06.02.15.12/doc/publicacao.pdf A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. Eles devem conter: controle de acesso, bomba de ar comprimido, nume- ração de vagas, dispositivos para deposição das bicicletas (paraciclos), operação da guarda e retirada da bicicleta realizada por operador especializado, banheiro com chuveiro em bom estado e elevado padrão, entre outros atributos. Aqueles que se interessem em produzir bicicletários de integração junto a terminais de transporte deverão considerar alguns passos essenciais. Primeiro, estudar as condições locacionais do terminal – ou seja, se existe espaço para sua instalação considerando o número de bicicletas a ser atendido. Ainda que o Ja- pão, com seus bicicletários subterrâneos automatizados, venha mostrando que o espaço não representa um entrave à colocação de muitas vagas (Figuras 5.3 e 5.4), é fundamental a análise do entorno dos terminais para que haja acessibili- dade adequada na chegada e partida dos ciclistas com suas bicicletas. O segundo passo corresponde ao estudo da forma como a integração fí- sica deverá ocorrer, no caso de não existir bilhete temporal na cidade. Isto sig- nifica que é necessário definir como o(a) ciclista após guardar a sua bicicleta irá adentrar ao espaço pago do terminal, ou como sairá do bicicletário para acessar a via pública lindeira a ele. Também, de forma inversa, como o ciclista irá obter de volta a sua bicicleta após ter cumprido uma viagem ou retornar das edifica- ções lindeiras ao terminal para realizar sua viagem de retorno a casa. Figuras 5.1 e 5.2: Exemplos de paraciclos em “U” invertido, São Carlos - SP e paraciclo em “C” deitado, em Curitiba, PR. Figuras 5.3 e 5.4: Bicicletário subterrâneo em Tóquio. FONTE: http://www.designboom.com/technology/giken-automatic-underground-bike-parking-system/ A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. Um bom exemplo de integração bicicleta x transporte coletivo pode ser encontrado na cidade de Bogotá, com o sistema de ônibus Transmilênio (vide Figuras 5.5 e 5.6). O terceiro passo corresponde ao modo operacional como a cobrança da tarifa do estacionamento será realizada. É claro que em casos de estacionamen- tos gratuitos, bancados pelo sistema como forma de atrair o usuário da bici- cleta para o uso do transporte coletivo, tudo fica resolvido. Assim, basta obter comprovante do depósito da sua bicicleta, para ser retirada ao final da viagem. No entanto, quando a guarda da bicicleta tem um custo tarifário (integrado ou não), e a tarifa paga pela guarda corresponde ao valor da passagem do transpor- te coletivo, a equação e o estudo dessa integração são maiores. A complexidade está na conjugação harmoniosa dos três passos para a implantação de um bicicletário de integração, quais sejam: a locação, a integra- ção física e o modo operacional de funcionamento. Somente após cumprir estas três fases é possível imaginar a edificação e pensar em um volume arquitetônico voltado a abrigar bicicletas. Não se deve, porém, esquecer que além da área de bloqueio para acesso ao bicicletário, deve ser estudada a possibilidade de que o mesmo possua banheiro com chuveiro. Este aparente luxo é fator essencial para atração dos ciclistas, pois os que pedalam longas distâncias não pretendem entrar nos coletivos, depois em seus locais de trabalho, em condições de higiene insatisfatórias para os demais usuários ou colegas. No tocante aos estacionamentos, é importante observar que ciclistas são muito atentos aos danos e à segurança de suas bicicletas. Usuários com mais recursos financeiros procuram ter bicicletas mais caras, com mais tecnologia, também mais leves. Esse tipo de usuário não está disposto a deixar seu veículo estacionado ao ar livre, ou mesmo em um bicicletário que apresente média se- gurança. Por isto mesmo, alguns dispositivos já começam a ser colocados nos espaços públicos para atendimento desta demanda. Tais equipamentos, mais Figuras 5.5 e 5.5: Bicicletário integrado ao sistema de ônibus Transmilênio em Bogotá, Colômbia. FONTE: Fotos de Carlos Pardo, em http://www.ta.org.br/site/BAnco/7manuais/t5wsp/WSIPPBPP/files/03_Jonas_Hagen.pdf A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. conhecidos nos EUA e no Canadá como “lockers”, são em verdade caixas metálicas individuais para a guarda de apenas uma bicicleta. As Figuras 5.7, 5.8 e 5.9 mostram alguns desses equipamentos. Implantar este tipo de equipamento em áreas de parque, em áreas cen- trais das cidades ou junto a polos geradores de viagens, garante o uso da bicicle- ta por ciclistas possuidores de veículos mais caros. Também porque esta é uma forma de atrair usuários do automóvel para o modal bicicleta. Os usuários da bicicleta na Holanda, em geral, têm mais de um veículo, por vezes até três biciclos. Dois deles com característica popular, diariamente estacionado em terminais de transporte, e um terceiro veículo, mais caro, de- dicado a passeios dominicais, ou para pequenas viagens nos finais de semana. Esta é condição banal, comum entre pessoas de baixa, média ou alta renda. No caso do Brasil, esta variação somente é encontrada nas classes médias mais abastadas. A grande maioria dos usuários da bicicleta faz uso de veículos simples, cujo custo de aquisição não ultrapassa mais de dois terços do salário mínimo nacional. Neste sentido, o uso de lockers, que poderíamos chamar de “biciclex” – pois opera de modo semelhante ao sistema “malex”, onde se guar- dam malas nas estações rodoviárias –, ainda não é uma preocupação dos técni- cos e dos administradores. Figuras 5.7, 5.8 e 5.9: Exemplos de “lockers” utilizados nos EUA, na Europa e no Canadá. Fonte: http://cyclesafe.com/bike-lockers/; http://www.cyclehoop.com/products/bike-lockers/; http://www.cyclehoop.com/ product/bike-lockers/single-bike-locker/ A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. Acredita-se que com o aumento da infraestrutura cicloviária nas cidades brasileiras, e uma certa generalização do uso da bicicleta, demandas passarão a surgir dos grupamentos organizados dos ciclistas. Assim tais equipamentos passarão a fazer parte da paisagem urbana, como novo mobiliário, a exemplo das lixeiras de metal à frente dos edifícios nos bairros da classe média urbana. O importante para os atuais usuários da bicicleta, e mesmo para a atração de novos usuários, é a segurança física nos espaços destinados à circulação, e a guarda da bicicleta em ambiente ou equipamento seguro. 6. A via acalmada, um bom exemplo a ser seguido A inovação é fundamental e medidas de caráter simples podem apresen- tar resultados fabulosos para garantir espaços seguros à circulação de bicicletas. Ciclistas há tempo estão convencidos de que ciclofaixas e vias acalmadas são os melhores espaços à sua circulação. No entanto, administradores e técnicos municipais continuam errando ao insistir na construção de ciclovias. Ciclovia é o luxo da infraestrutura cicloviária. Nem as cidades têm mais espaços para construí-la, nem existem recursos suficientes para implantá-la em todos os quadrantes do território urbano. Também, não basta construí-la em umou outro lugar. O ciclista, como qualquer cidadão, quer ir a todos os lugares. Assim, se é para construir uma rede cicloviária, ela precisa estar em todas as vias da cidade. E se espaços não existem para produzir infraestruturas exclu- sivas, a velocidade das vias tem de ser reduzida para existir compartilhamento entre a bicicleta e o tráfego geral. Um bom exemplo para o aumento da segurança na circulação dos ci- clistas é o projeto da Via Calma, na Av. Sete de Setembro, em Curitiba. A via opera como eixo central do sistema trinário, dentro do binômio uso do solo x transporte. As ruas paralelas – Av. Visconde de Guarapuava e Av. Silva Jardim – têm tráfego unidirecional, entrando e saindo do centro urbano, com seis faixas de tráfego em cada uma delas. Por sua vez, a Av. Sete de Setembro possui uma canaleta (pista exclusiva para ônibus) central e duas vias laterais, conhecidas até então como vias lentas. Considerando o disposto no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), em seu Artigo 58, foi proposto que as vias lentas da Sete de Setembro operem com faixa tracejada em sua direita, delimitando o espaço de circulação dos ciclistas (ver Figuras 6.1 e 6.2). O projeto propôs também a implantação de avanço das bici- cletas sobre os veículos motorizados, em esquinas com semáforos, chamado de bicicaixa – tradução literal do “bike box”, usado pelos americanos (ver Figuras 6.3 e 6.4). Consultados, os ciclistas de Curitiba concordaram ser esta solução uma iniciativa desejável, que tanto fará com que os usuários da bicicleta deixem de circular no interior da canaleta dos ônibus, como estimula A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. rá outros que fazem uso de vias paralelas a utilizar a Av. Sete de Setembro. Dois fatos que irão contribuir muito para este uso serão a redução da velocidade das vias lentas, agora Via Calma, com a velocidade diminuída de 40 km/h para 30 km/h, e a implantação de bicicaixas nas esquinas dos cruzamentos semafo- rizados. A Prefeitura de Curitiba e o IPPUC esperam que esta medida, em caráter piloto, possa se replicar em outros corredores da cidade. Também esperam que o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) e seu órgão técnico, o Departa- mento Nacional de Trânsito (DENATRAN), apoiem a ideia, na medida em que o projeto apenas aplica de forma mais clara o que está disposto no Artigo 58. Também porque as bicicaixas a serem criadas serão situadas à frente de apenas uma linha de veículos motorizados, numa via com velocidade acalmada. Figuras 6.1, 6.2 e 6.3: Projeto da Via Calma na Av. Sete de Setembro, em Curitiba FONTE: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba – IPPUC, Set./2013. http://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/curitiba-tera-mais-300-km-de- -vias-ciclaveis-e-investimento-de-r-90-milhoes-para-consolidar-novo- -modal/30592 A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. 7. Bons projetos vão além da definição da infraestrutura O debate sobre infraestruturas cicloviárias em geral se situa na adoção de certa tipologia em vez de outra. Assim, as discussões giram sobre adotar trechos lineares de ciclovia, ciclofaixa, passeio compartilhado etc. No entanto, pouco estudo é realizado quanto ao tratamento das interseções. Em geral, prefeituras costumam implantar ciclovias e ciclofaixas em trechos lineares ou segmentos curvos, mas ao chegar nos cruzamentos, como num passe de mágica, a infraes- trutura se desmancha no ar, e some. E o ciclista? Exatamente onde é mais necessária a separação física entre o tráfego mo- torizado e o não motorizado nada é projetado ou construído. Assim, ciclistas ficam entregues à própria sorte, correndo riscos muitas vezes superiores aos enfrentados em trechos lineares contínuos. Algumas empresas se introduziram no estudo dessas situações, apresen- tando projetos para solucionar tais problemas. Entre elas, incluem-se a Arquite- tura Humanista S.A. – AH-8; a Oficina Engenheiros Consultores – OFICINA; a Arquitetura, Planejamento e Transportes Ltda. – AeT; a Engenharia Consultiva Ltda. – LOGIT, entre outras. Figuras 6.4: Exemplo de bicicaixa a ser empregada nas esquinas do novo projeto. FONTE: http://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/curitiba-tera-mais-300-km-de-vias-ciclaveis-e-investimento-de-r-90-milhoes-para-consolidar- -novo-modal/30592 A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. Reproduzimos neste texto, muito ligeiramente, dois exemplos de projetos que fizeram tratamento de interseções após segmentos contínuos de ciclovias e ciclofaixas em cidades brasileiras, que podem ser vistos nas Figuras 7.1, 7.2 e 7.3. Figura 7.1 e 7.2: Projeto da Rede Cicloviária do Bairro Santa Paula, em Campinas – SP, elaboração Empresa AH8 FONTE: Acervo da Empresa Arquitetura Humanista Ltda. – AH8 A rotatória foi ajustada para conter também rotatória cicloviária, para que os ciclistas cumpram o mesmo trajeto unidirecional do tráfego geral das vias lindeiras e da interseção. Observar que a necessidade de integrar tramos cicloviários distintos faz com que o projeto proponha uma minirrotatória cicloviária no interior do segmento cicloviário que contém a ciclovia bidirecional. Também observar a criação de ilhas de acomodação do tráfego de bicicletas apartadas em pontos-chave da rotatória do tráfego geral. Figura 7.3: Exemplo de tratamento em cruzamento de via arterial, em Londrina – PR FONTE: Acervo pessoal de Antonio C. M. Miranda, Aet e AH-8, 2010. A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. 8. Considerações Finais A segurança dos ciclistas depende do modo como se comportam no trân- sito, de como se vestem, como cuidam dos seus veículos, mas também de uma infraestrutura exclusiva para sua circulação. Também é necessário conscienti- zar motoristas, ciclistas e os corpos técnicos dos diferentes níveis de governo, sobre o respeito do uso dos espaços públicos e as prioridades definidas pelo CTB. A segurança dos ciclistas está muito comprometida. Não existem boas infraestruturas para circular com bicicleta nas cidades brasileiras. Há muito ainda por realizar. Em especial, é necessário convencer a todos de que a bicicleta é sim um modal de transporte. Neste sentido, para ela devem ser criadas infra- estruturas capazes de diminuir os riscos de acidentes. Campanhas voltadas à consciência pública sobre o uso da bicicleta são importantes, a exemplo do programa “Rotas Seguras para a Escola” e do Pro- grama “Bike angels” – monitoramento feito por instrutores de viagens urbanas realizadas por ciclistas novatos, entre outros programas educativos. Por fim, retornamos à pergunta inicial: “A bicicleta é um veículo seguro para circular no meio urbano brasileiro?” Agora respondemos de forma inequí- voca: hoje ainda não, mas em breve terá de ser. Referências bibliográficas http://www.infoescola.com/mitologia/a-lenda-das-amazonas/ Acessado em 01-09-2013, às 23h. http://bicicletanarua.files.wordpress.com/2009/03/manual-do-ciclista- -versao-final1.pdf Acessado em 01-09-2013, às 23h 27min. http://www.ciclovida.ufpr.br/?cat=5 Acessado em 07-09-2013. Às 14h 45min. http://www.ta.org.br/site2/Banco/3seguranca/Capacete.pdf Acessado em 07-09-2013, às 15h 18min. http://www.insulfilmautomotivo.com.br/legislacaoinsulfilm Acessado em 04-09-2013, às 22h 20min. http://www.escoladebicicleta.com.br/notransito.html Acessado em 07-09-2013, às 16h 49min. http://www.guiaviagem.org/holanda-clima/# Acessado em 09-09-2013, às 15h 21min. A segurança no uso da bicicleta: a mobilidade dos ciclistas em meio urbano, exemplos de projetos especiais. MIRANDA,Antonio C. M., in pg. 30, no Caderno de Referência para elaboração de: Plano de Mobilidade por Bicicleta nas Cidades. Ministé- rio das Cidades, Coleção Bicicleta Brasil, Brasil, 208 pg, http://www.cida- des.gov.br/images/stories/ArquivosSEMOB/Biblioteca/LivroBicicletaBrasil.pdf. Acessado em 12-09-2013, às 22h 05min. ROJAHN da Silva, Iuri. Dissertação de Mestrado do Curso de Pós-Gra- duação em Metereologia, INPE - SP. Variabilidade sazonal e interanual das precipitações na Região Sul do Brasil associadas às temperaturas dos Oceanos Atlântico e Pacífico, São José dos Campos - SP, BR., 2001, 100 pg. http://mtc- -m16.sid.inpe.br/col/sid.inpe.br/jeferson/2004/06.02.15.12/doc/publicacao.pdf. Acessado em 09-09-2013, às 16h 37min. http://www.designboom.com/technology/giken-automatic-under- ground-bike-parking-system/ Acessado em 14-09-2013, à 0h 39min. PARDO, Carlos Pardo, em http://www.ta.org.br/site/BAnco/7manuais/ t5wsp/WSIPPBPP/files/03_Jonas_Hagen.pdf. Acessado em 14-09-2013, à 0h 48min. http://cyclesafe.com/bike-lockers/; http://www.cyclehoop.com/products/ bike-lockers/; http://www.cyclehoop.com/product/bike-lockers/single- -bike-locker/ “Links” acessados em 14-09-2013, entre 11h 02min e 11h 27min. PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA, IPPUC. Plano Diretor Ci- cloviário de Curitiba, Set., 2013. Projeto da Via Calma na Avenida 7 de Setembro. http://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/curitiba-tera-mais-300-km-de-vias-ci- claveis-e-investimento-de-r-90-milhoes-para-consolidar-novo-modal/30592. Acessado em 14-09-2013, às 16h 55min. ARQUITETURA HUMANISTA LTDA. Projeto da Rede Cicloviária do Bairro Santa Paula, Campinas – SP, 2010. Arquitetura, Planejamento e Transportes Ltda. – AeT. Projeto da ciclovia ao redor do Lago Igapó, Londrina, 2010. 03 Estudo de Caso: uso de microssimulação de tráfego para revisão do projeto da Av. Manoel Ribas, em Curitiba, com inclusão de ciclofaixa. Estudo de Caso: uso de microssimulação de tráfego para revisão do projeto da Av. Manoel Ribas, em Curitiba, com inclusão de ciclofaixa Francisco Caron MALUCELLI 1 1. Considerações iniciais A Avenida Manoel Ribas tem grande importância no sistema viário de Curitiba, pois faz a ligação entre o centro histórico do bairro gastronômico de Santa Felicidade e o município de Campo Magro, na região metropolitana da capital paranaense. Neste trajeto, também permite a ligação com o Contorno Norte de Curitiba. Em seu trecho mais a noroeste, entre a Rua Domingos Stra- passon e o Contorno Norte, a Manoel Ribas carece de estrutura e capacidade para dar a fluidez necessária ao tráfego, especialmente às doze linhas de trans- porte coletivo que servem a região. Com o objetivo de ampliar a capacidade da via e aumentar a velocidade operacional do transporte coletivo, o IPPUC decidiu contratar o projeto execu- tivo de requalificação da avenida no ano de 2012. No início de 2013, com a nova administração municipal, foi aventada a possibilidade e a viabilidade de se im- plantar uma ciclofaixa ao longo da via, ofertando aos munícipes uma alterna- tiva de transporte sustentável e barata. No entanto, devido à restrição espacial existente no local, esta alternativa requer que um dos sentidos de circulação da via tenha apenas uma faixa de circulação. Para auxiliar o processo de tomada de decisão quanto à solução a adotar, foi desenvolvido estudo de verificação de desempenho do sistema viário, através de microssimulação de tráfego para a Av. Manoel Ribas, entre as ruas Domin- gos Strapasson e Napoleão Manosso. Estes dois cruzamentos são semaforizados e determinantes na capacidade operacional da via. Assim, foram estudadas três configurações distintas: 1 Engenheiro Civil pela UFPR, Engenheiro de Tráfego do IPPUC, Curitiba - PR. E-mail: fmalucelli@ippuc.org.br Estudo de Caso: uso de microssimulação de tráfego para revisão do projeto da Av. Manoel Ribas, em Curitiba, com inclusão de ciclofaixa. Situação atual – uma faixa de tráfego por sentido, com estacionamento em reman- sos e paradas de ônibus na pista de rolamento; Projeto IPPUC, 2012 – o projeto con- tratado pelo IPPUC, desenvolvido no ano de 2012, contempla duas faixas de tráfego por sentido na maioria do trecho, sendo que nas aproximações mais críticas dos cruzamentos semaforizados foram previstas três faixas para aumento de capacidade; Proposta com ciclofaixa, 2013 – propos- ta com a inclusão de ciclofaixa na pista de ro- lamento, onde for possível, e com ciclovia no passeio nos trechos mais estreitos. 1. Levantamento dos dados Os volumes de tráfego foram levantados através de pesquisas de conta- gem veicular, realizadas pelo Setor de Pesquisas do IPPUC, entre 17 e 19 horas, nos seguintes cruzamentos: • Av. Manoel Ribas x R. Napoleão Manosso • Av. Manoel Ribas x R. Domingos Strapasson Figura 1: Localização da Av. Manoel Ribas no município de Curitiba Fonte: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba - IPPUC Figura 2 Perfil de fluxo de tráfego para a Av. Manoel Ribas dentro das duas horas pesquisadas Fonte: IPPUC, 2013 Estudo de Caso: uso de microssimulação de tráfego para revisão do projeto da Av. Manoel Ribas, em Curitiba, com inclusão de ciclofaixa. Os veículos foram contados e separados em três categorias (carros, ôni- bus e caminhões), sendo acumulados em intervalos de 15 minutos. A Figura 2 mostra o perfil de fluxo para a Av. Manoel Ribas, dentro das duas horas de realização da pesquisa. Como o estudo tem por objetivo avaliar a capacidade máxima e o nível de serviço na situação mais crítica para o sistema viário, os dados da contagem de duas horas foram agrupados de forma a se obter a hora de pico, onde ocorre o maior carregamento possível dos cruzamentos. Para este trecho da Av. Manoel Ribas, a hora de pico ocorre das 17h30 às 18h30. Os fluxos direcionais nas apro- ximações dos cruzamentos são mostrados na Figura 3. Os dados referentes à geometria, configuração de circulação e formação de filas no trecho foram retirados de fotos aéreas, projetos disponíveis e de vis- torias em campo. 1. Avaliação de desempenho do sistema 3.1 Metodologia utilizada O trabalho foi desenvolvido com base em microssimulação de tráfego, através do software AIMSUN, da empresa TSS, que é um programa computa- cional para modelagem de redes viárias e simulação microscópica, o qual usa a teoria do “car following” (lei da perseguição)1 com base nas distâncias, ou “hea- dways” entre veículos. A escolha de modelos de microssimulação em oposição a outros métodos e pacotes de software, como Highway Capacity Software (HCS), se deve ao 1 Na teoria do fluxo de tráfego, o modelo de “car following”, de Newell, é um método utilizado para determinar como os veículos seguem uns aos outros em uma estrada. A ideia principal deste modelo é que um veículo irá manter um mínimo de espaço e tempo entre ele e o veículo que o precede. Assim, sob condições de congestionamento, se o veículo líder mudar sua velocidade, o veículo seguidor também mudará sua velocidade em algum ponto no espaço-tempo, ao longo da onda de velocidade e do tráfego. Figura 3: Fluxogramas para a hora de pico (2013) nos cruzamentos da Av. Manoel Ribas com a R. Napoleão Manosso e com a R. Domingos Strapasson. Base: Google Earth Fontes: IPPUC e Google Earth, 2013 Estudo de Caso: uso de microssimulação de tráfego para revisão do projeto da Av. Manoel Ribas, em Curitiba, com inclusão de ciclofaixa. fato de que a simulação através de micromodelagem permite avaliar os efeitos que diferentes elementos do sistema viário causam uns sobre os outros. Efeitos como a proximidade entre interseções ou estreitamentos de pista, ou então a formação e dissolução de congestionamentos em vias urbanas, em de- terminados períodos de tempo, são situações complexas de ser avaliadas
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