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SIMMEL, Georg. Filosofia da moda e outros escritos

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FILOSOFIA DA MODAFILOSOFIA DA MODA
E OUTROS ESCRITOSE OUTROS ESCRITOS
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FILOSOFIA DA MODAFILOSOFIA DA MODA
E OUTROS ESCRITOSE OUTROS ESCRITOS
GEORG SIMMEL
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Autor: George Simmel
Tradução: Artur Morão
Grafismo: Cristina Leal
Edições Texto & Grafia, Lda.
Avenida Óscar Monteiro Torres, n.º55, 2.º Esq.
1000-217 Lisboa
Telefone: 21 797 70 66
Fax: 21 797 81 30
E-mail: texto.grafia@gmail.com
Impressão e acabamento:
Papelmunde, SMG, Lda.
1.ª edição
Lisboa, Fevereiro de 2008
ISBN 978-989-95689-2-1
Depósito legal n.º 271898/08
Esta obra está protegida pela lei. Não pode ser reproduzida, 
no todo ou em parte, qualquer que seja o modo utilizado, 
sem a autorização do Editor.
Qualquer transgressão à lei do Direito de Autor
será passível de procedimento judicial.F
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É em torno da ideia de conhecimento articulado com as 
necessidades de aquisição de uma cultura geral consistente 
que se projecta a colecção “Biblioteca Universal”.
Tendo como base de trabalho uma selecção criteriosa 
de autores e temas – dos quais se destacarão as áreas das 
ciências sociais e humanas –, pretende-se que a colecção 
esteja aberta a todos os ramos do saber, sejam de natureza 
técnica, científica ou artística.
O objectivo último é que os volumes que a integram 
representem um efectivo contributo para a restauração de 
um ambiente cultural e intelectual à altura das aspirações 
de uma sociedade moderna, aberta e esclarecida, que o 
promova e alimente.
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ÍNDICE
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
Origem dos textos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Filosofia da moda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
Psicologia do adorno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
Psicologia da coqueteria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
Cronologia da vida de Georg Simmel . . . . . . . . . . . . . . 89
Bibliogafia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
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9
A moda como sintoma antropológico em Georg Simmel
 S 
erve a moda a G. Simmel para concertar e jungir 
núcleos fundamentais e, poderia dizer-se, quase 
obsessivos do seu pensamento. Primeiro, o tema 
da sociedade como campo de tensões e interac-
ções, de que a moda em si mesma, na sua expressão, nas 
suas variações, nos seus ritmos, nos seus mecanismos, na 
sua ambiguidade, no seu significado, no seu lugar específico 
dentro da realidade social, é uma manifestação privilegiada, 
porque sempre presente como factor de socialização e de 
individualização. Depois, a antropologia em que a moda 
assenta, da qual vive, porque expressa e encarna a natu-
reza dualista e tensiva do ser humano que, mergulhado no 
todo social, dele procura libertar-se, isolar-se, sobressair, 
sem nunca todavia o poder abandonar. Por fim, a crítica da 
modernidade, época assinalada pela progressiva e dramática 
libertação do indivíduo de todas as dependências exclusivas 
e pessoais, que caracterizavam os tempos pré-modernos.
A moda expressa, da forma mais visível e concreta, a 
realidade essencialmente dialéctica e dinâmica da sociedade, 
feita de interconexões e liames, mas também de inevitáveis 
conflitos entre os indivíduos, entre as múltiplas e diferen-
tes formações sociais, entre os indivíduos e os grupos ou 
as classes. Por isso, nada é mais estranho a Simmel do que 
a visão da sociedade como um todo orgânico, ao jeito de A. 
Comte e de H. Spencer, que realçaram a essencial continui-
dade entre natureza e sociedade, sob o pressuposto de uma 
INTRODUÇÃO
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FILOSOFIA DA MODA E OUTROS ESCRITOS
analogia básica entre o processo social e o processo bioló-
gico; decerto porque estavam seduzidos pelo esplendor da 
clássica e tradicional metáfora da “grande cadeia de ser”, 
que se estendia desde o mais simples fenómeno natural ao 
mais diferenciado organismo social; terá sido essa também 
a razão por que eles apresentaram a proposta de uma meto-
dologia comum às ciências da natureza e ao estudo dos 
homens na sociedade, aliás, de harmonia com o rumo cada 
vez mais sensível e impositivo de um positivismo triun-
fante e optimista, casado com uma esperança ingénua no 
poder regenerador do progresso e da ciência.
 Mas não se depreenda daí que Simmel tenha optado, 
sem mais, por uma aceitação incondicional da tradição alemã 
das ciências do espírito (Geisteswissenschaften), acentuada e 
expressa teoricamente no seu tempo por Wilhelm Dilthey, 
W. Windelband e H. Rickert, e presente igualmente no seu 
amigo Max Weber e em muitos outros. Para estes, o método 
adequado para indagar a cultura e os fenómenos humanos, 
reino da liberdade na linha do idealismo germânico, era 
(segundo a terminologia adoptada) o ‘idiográfico’, centrado 
em obras singulares, nos indivíduos e em acontecimentos 
únicos e irrepetíveis, e não o ‘nomotético’, formulador de 
leis gerais e uniformes para todos os casos possíveis, como 
acontecia no campo das ciências naturais (Naturwissenschaf-
ten), afeito à “explicação” (Erklären) mediante uma nuvem 
ou rede de hipóteses conjugada ainda, se possível, com uma 
abordagem matemática, mas estranho ao giro da “compre-
ensão” (Verstehen). Este último reclamava antes a empatia e 
a solidariedade identificativa com o autor nas suas obras ou 
com os seres humanos no drama da sua existência histórica. 
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INTRODUÇÃO
O nosso filósofo e sociólogo opunha-se tanto às 
escolas organicistas como às idealistas; a sociedade não era, 
para ele, um organismo coeso e unitário, de vibração homo-
génea ou de intencionalidades e finalidades comuns e har-
monicamente compartilhadas, nem um simples rótulo para 
o entrançado de opções e experiências subjectivas de vária 
ordem. Constituía antes um emaranhado de múltiplas e dís-
pares relações entre indivíduos, numa incessante interacção 
de uns com outros, inseridos, por seu turno, em estruturas 
superindividuais mais amplas – o Estado, o clã, a cidade, 
a família ou o sindicato – que, afinal, não passam de cris-
talizações dessa interacção, embora possam obter uma real 
autonomia e contrapor-se ao indivíduo como poderes estra-
nhos e externos, simultaneamente tutelares e opressores. 
Desconfiando, pois, do esforço de conectar todos os fenó-
menos numa única visão teórica – o que é impossível, dada 
a disparidade multiforme dos anelos, propósitos e desejos 
que configuram e agitam a vida dos homens –, Simmel 
reconhece e confessa que não é possível nem aconselhável 
semelhante ciência social totalizante ou holística. Tal não 
obsta a que o comportamento humano, enquanto compor-
tamento de indivíduos, se possa elucidar emtermos da sua 
filiação em grupos e associações ou mediante categorias 
típicas que desenham, de modo plausível, a trama das inte-
racções que entre eles nascem e fluem. A atenção simme-
liana centra-se, por isso, na construção de uma galeria de 
tipos sociais – “o estrangeiro”, “o mediador”, “o pobre”, 
“o aventureiro”, “o renegado” e, claro está, o “maníaco da 
moda” – que, nos seus papéis, se devem complementar 
com a análise das formas sociais, de que sempre são parte 
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FILOSOFIA DA MODA E OUTROS ESCRITOS
e elemento, dentro e fora das quais simultaneamente se 
encontram, mesmo quando a elas se possam opor. De facto, 
o seu comportamento e as suas atitudes ou posturas, por 
vezes anómalas, ambivalentes, cumprem a função de “vál-
vulas de segurança”, que lhes permitem baixar o vapor e 
suportar o peso rígido das relações sociais. Por outro lado, 
eles só se entendem dentro da realidade do conflito social, 
que supõe a acção interdependente e se baseia mais na reci-
procidade do que na imposição unilateral.
 Vislumbra-se assim a concepção antropológica que 
sustém o edifício sociológico do nosso autor. Próximo da 
filosofia da vida, ele assinala nesta polaridades determinan-
tes e omnipresentes. Caracteriza a vida um dualismo entra-
mado de oposições entre particular e universal, igualdade 
e diferenciação, imitação e distinção, sujeição e auto-afir-
mação, coesão e separação. Semelhante dualismo assedia já 
a fisiologia:
 “O primeiro indício é brindado pelo fundamento 
fisiológico da nossa natureza: ela precisa tanto do movi-
mento como do repouso, da produtividade como da recep-
tividade. Retomando isto para a vida do espírito, seremos 
guiados, por um lado, pela tendência para o geral e, por 
outro, pela necessidade de captar o individual; aquela 
garante o repouso ao nosso espírito, a particularização per-
mite-lhe mover-se de caso para caso. E não é diferente na 
vida do sentimento: procuramos tanto a dedicação serena 
aos homens e às coisas como a auto-afirmação enérgica 
perante ambos”.
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13
INTRODUÇÃO
 A vida é, pois, a oscilação entre estes dois pólos, 
entre a unidade do todo e o ser-para-si de cada elemento do 
mundo, entre hereditariedade e variabilidade, entre a ordem 
social e o destino individual. Aqui entronca naturalmente a 
moda, concretização da tendência para a imitação, mas – de 
modo paradoxal – daquilo que quase sempre é impessoal 
e quase nunca nasce da criatividade individual, antes não 
passa de uma reacção reflexa perante a angústia de perma-
necer sozinho no seu agir e a dor da responsabilidade.
 “Ela é imitação de um modelo dado e satisfaz assim 
a necessidade de apoio social, conduz o indivíduo ao tri-
lho que todos percorrem, fornece um universal, que faz do 
comportamento de cada indivíduo um simples exemplo. E 
satisfaz igualmente a necessidade de distinção, a tendência 
para a diferenciação, para mudar e se separar. E este último 
aspecto consegue-o, por um lado, pela mudança dos con-
teúdos, que marca individualmente a moda de hoje em face 
da de ontem e da de amanhã, consegue-o ainda de modo 
mais enérgico, já que as modas são sempre modas de classe, 
porque as modas da classe superior se distinguem das da 
inferior e são abandonadas no instante em que esta última 
delas se começa a apropriar. Por isso, a moda nada mais é 
do que uma forma particular entre muitas formas de vida, 
graças à qual a tendência para a igualização social se une à 
tendência para a diferença e a diversidade individuais num 
agir unitário.”
E insinua-se assim o tema da modernidade, de que 
Simmel é igualmente um dos grandes intérpretes ou 
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FILOSOFIA DA MODA E OUTROS ESCRITOS
hermeneutas, embora sob um ângulo parcialmente trá-
gico, e ao qual dedicou numerosos e cintilantes ensaios. É 
verdade que a idade moderna compõe um complexíssimo 
novelo cultural passível, como foi e assim continuará a 
ser, das mais contrastadas interpretações; perante ela e a 
nossa actualidade social e histórica, o nosso filósofo hesita, 
pois, entre o progressivismo liberal e o pessimismo cul-
tural. Sublinha com força a libertação cada vez ampla do 
indivíduo dos vínculos exclusivos e das múltiplas depen-
dências no seio dos anteriores círculos sociais, que eram 
poucos e relativamente restritos. De facto, nas sociedades 
pré-modernas, as associações, como por exemplo as guildas 
ou corporações medievais, não tinham apenas uma fun-
ção específica, em vista um propósito claramente articu-
lado; abarcavam a vida inteira do indivíduo, num plexo de 
subordinações e lealdades; exigiam a personalidade inteira 
e um forte sentido identitário, expresso por vezes em sinais 
externos muito visíveis. 
A tribo com os seus clãs, as linhagens ou outros gru-
pos exigiam a participação directa, e os círculos sociais 
não admitiam entre si profundas intersecções, cruzamen-
tos ou sobreposições. Tudo muda com os tempos moder-
nos: multiplicam-se progressivamente as esferas sociais, 
um indivíduo pode ser membro de muitos círculos bem 
definidos que se concatenam e co-implicam à maneira 
de círculos concêntricos, nenhum destes controla já a 
sua personalidade total. Em vez da simples inclusão num 
âmbito singular que decretava e determinava a existência 
pessoal e demarcava o horizonte do seu agir ou pensar, o 
indivíduo descobre-se cada vez mais na encruzilhada ou 
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INTRODUÇÃO
na intersecção de muitos círculos com fidelidades diver-
sas e, por vezes, antagónicas. Cessa o nexo entre lugar, 
parentesco e filiação religiosa que, por seu turno, se torna 
cada vez mais distinta de outras preocupações e cresce em 
individualização. Desponta, por conseguinte, uma maior 
consciência ou um sentimento mais vivo de libertação. O 
individualismo nasce precisamente desta compenetração 
de círculos sociais, cujos imperativos e exigências se fazem 
sentir e se mesclam na consciência do indivíduo. Diminui 
também a pressão ou a dominação dos outros (por ex. do 
patrão sobre o trabalhador) e torna-se inevitável a transi-
ção da homogeneidade para a heterogeneidade, da unifor-
midade para a individualização, da fidelidade à tradição 
para a participação num mundo cheio de novas e inéditas 
possibilidades. Do estatuto desliza-se para o contrato, da 
solidariedade mecânica do grupo restrito e fechado para a 
solidariedade orgânica entre associações de fins e valores 
divergentes que obrigam à escolha e à contaminação, da 
rigidez do costume para um cenário de inúmeros empe-
nhamentos e acordos que fomentam a emergência da uni-
cidade e da autonomia individual.
Tudo isto, porém, tem um preço. O indivíduo vê-se 
confrontado com uma multiplicidade de objectos cultu-
rais, desde a religião à moralidade, dos costumes à ciência, 
da arte aos sistemas económicos, e no seio de um mundo 
cada vez mais marcado pelo pluralismo, pela diferença, pelo 
contraste entre estilos de vida. Interioriza, sem dúvida, tais 
objectos, mas estes surgem cada vez mais aos seus olhos 
como “alteridades”, como poderes extrínsecos que também 
o ameaçam e podem alienar; não consegue subvertê-los, 
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FILOSOFIA DA MODA E OUTROS ESCRITOS
porque a sua riqueza humana singular se conquista justa-
mente através da absorção dos valores culturais exteriores. 
Além disso, o homem moderno sente-se rodeado por um 
mundo de objectos que constrangem,acirram e controlam 
as suas necessidades e os seus desejos. Efeito de semelhante 
situação será, então, transformar-se ele próprio em pere-
grino e vagabundo, em flanêur, sempre in itinere, a caminho 
ou em debandada, sem fins ou objectivos seguros. A sua 
vida corre o perigo de se esgotar na paixão do movimento, 
numa trajectória indefinida, própria de alguém que aprecia 
“os caminhos sem metas e as metas sem caminhos”, como 
Simmel refere no seu belo ensaio sobre Rodin.
Como vemos, embora ele alinhe pela mundividên-
cia da concepção liberal progressiva, típica dos pensadores 
franceses e ingleses que, com a sua fé na perfectibilidade 
humana, o influenciaram, ressoam igualmente no seu vere-
dicto acerca da cultura moderna sombrios acordes deriva-
dos da visão metafísica de Schiller ou de Nietzsche. Paira 
assim, insolúvel, sobre o seu horizonte mental e filosófico 
uma contradição, que o leva a anunciar novas prisões em 
que os indivíduos permanecem enredados e como que con-
gelados nas suas funções sociais.
E ressalta igualmente o significado da moda: como 
forma de vida, como marca das distinções de classe, como 
jogo da incessante imitação de uma classe por outra, como 
meio da inserção dos indivíduos num grupo ou numa cor-
rente, traduz justamente essa efervescência sem rumo, por-
que é indiferente aos conteúdos, inclusive da beleza ou do 
conveniente; é simples variação, mero arreio, desprovida 
de motivação, entregue apenas à vertigem do movimento 
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17
INTRODUÇÃO
e do momento, da novidade injustificada, porque vive do 
capricho e da extravagância. Encarnação da nervosa vida 
moderna, vive do transitório, do fugitivo, do contingente; 
persiste destruindo, mas é simultaneamente recuperação 
lúdica de formas do passado e invenção de gestos futuros 
também condenados à evanescência.
“A moda, com o seu jogo entre a tendência para uma 
expansão universal e a aniquilação do seu próprio sentido 
que comporta justamente essa expansão, possui o atrac-
tivo singular do limite, o atractivo simultâneo do começo 
e do fim, da novidade e, ao mesmo tempo, da caducidade”. 
Porque movimento autónomo, com poder objectivo, ali-
menta-se das suas próprias forças e, por isso, altera-se, 
metamorfoseia-se e recorre a novos disfarces fora da inter-
venção dos indivíduos, sobre os quais plana numa sobre-
individualidade indiferente, que constitui precisamente a 
sua essência. Surge assim como um eterno retorno, sósia da 
aventura, ávida de experiências e de sensações, mas fora do 
contexto da vida, a ela estranha e dela distraída. 
Nesta indiferença ontológica consiste a sua ‘tragé-
dia’: votada à caducidade, é irmã da morte, como vislum-
brou o grande poeta italiano Giacomo Leopardi (“Dialogo 
della moda e della morte”, Operette morali), e o seu reino 
é o infinito ilimitado, o ápeiron, a ausência de medida ou 
de modus, em cuja circulação e vórtice imergem, despontam 
e se aniquilam os perfis, os conteúdos, os rostos. Surge, 
por isso, não só como emblema da modernidade inquieta 
e impaciente, mas também como sintoma da contradição 
profunda e de muitos níveis que caracteriza e define a 
estrutura dos seres humanos.
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18
FILOSOFIA DA MODA E OUTROS ESCRITOS
* * *
A presente tradução do tratado Philosophie der Mode 
pretende ser fiel ao estilo do autor e baseia-se na sua edi-
ção em livro de 1905, que Simmel republicou mais tarde, 
em 1919, sob o título Die Mode, com alterações bastante 
reduzidas e integrado no conjunto de estudos editado sob 
a designação de Philosophische Kultur, Leipzig, Alfred Kröner 
Verlag, 1919; este ensaio, um dos mais notáveis em toda a 
produção simmeliana, constitui, por sua vez, uma amplia-
ção ou remodelação muito pronunciada de um artigo 
sociológico mais antigo, intitulado Zur Psychologie der Mode 
de 1895. 
As rubricas contidas no parêntesis recto, no início de 
alguns parágrafos, não aparecem no original alemão; desti-
nam-se tão-só a assinalar pontos nevrálgicos da reflexão de 
Simmel, para orientação do leitor nos veios do seu compli-
cado discurso. Quem estiver interessado em conhecer todas 
as vertentes da sua ampla produção e do seu pensamento 
dispõe agora, se dominar a língua alemão, da totalidade 
das suas obras no electro-sítio do Instituto Sociológico da 
Universidade de Zurique: http://socio.ch/sim/.
Propõe-se ainda uma cronologia da vida de G. Sim-
mel e, no fim do volume, a lista das suas obras e um con-
junto de referências bibliográficas auxiliares.
Artur Morão
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19
Filosofia da moda
In: «Reihe Moderne Zeitfragen», dir. de Hans Land-
berg, Nº 11, Berlim, Pan-Verlag (1905), 41 pgs.
Psicologia do adorno
In: Der Morgen. Wochenschrift für deutsche Kultur, fundado 
e publicado por Werner Sombart juntamente com 
Richard Strauß, Georg Brandes e Richard Muther, 
com o colaboração de Hugo von Hofmannstahl, 2, 
Nº 15 de 10 de Abril 1908, pp. 454-459, Berlim.
Psicologia da coqueteria 
In: Der Tag. Moderne illustrierte Zeitung, Nº 344, Mor-
genblatt 11 Maio 1909, Illustrierter Teil, Nº 109, 
p. 1-3 e Nº 347, Morgenblatt 12 Maio 1909, Illus-
trierter Teil, Nº 110, p. 1-3 (Berlim).
ORIGEM DOS TEXTOS
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21
[A vida como dualismo] 
 O modo como nos é dado interpretar as manifes-tações da vida permite-nos, em cada ponto da existência, sentir uma multiplicidade de forças; e de tal maneira que cada uma delas tenta ir 
além da manifestação real, limita a sua infinidade em rela-
ção às outras e transforma-a em simples tensão e anelo. O 
homem é, de facto, desde o início, um ser dualista; e isto 
de nenhum modo impede a homogeneidade do seu fazer, 
antes ele ostenta justamente, como resultado da sua multi-
plicidade de elementos, uma poderosa unidade. Uma mani-
festação a que faltasse semelhante ramificação de forças 
radicais seria para nós pobre e vazia. Só porque cada ener-
gia íntima impele para lá da medida da sua exteriorização 
visível é que a vida ganha aquela riqueza de possibilidades 
inexauríveis, que completa a sua realidade fragmentária; só 
assim as suas manifestações deixam pressentir forças mais 
profundas, tensões mais insolúveis, luta e paz de tipo mais 
vasto do que deixa adivinhar o seu dado imediato.
Este dualismo não se pode descrever directamente, 
mas apenas sentir nas oposições singulares, que são típicas 
da nossa existência, como sua forma derradeira, configu-
radora. O primeiro indício é fornecido pelo fundamento 
fisiológico da nossa natureza: ela precisa do movimento e 
do repouso, da produtividade e da receptividade. Também 
na vida do espírito somos guiados, por um lado, pela ten-
dência para o geral e, por outro, pela necessidade de captar 
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o individual; aquela garante o repouso ao nosso espírito, a 
particularização permite-lhe mover-se de caso para caso. E 
não é diferente na vida do sentimento: procuramos tanto a 
dedicação serena aos homens e às coisas como a auto-afir-
mação enérgica perante ambos. A história inteira da socie-
dade pode desenrolar-se na luta, no compromisso, nas con-
ciliações lentamente adquiridas e depressa perdidas, que 
surgem entre a fusão com o nosso grupo social e o esforço 
individual por dela sair.
Embora a oscilaçãoda nossa alma entre estes dois 
pólos se possa materializar no antagonismo da doutrina 
da unidade do todo e do dogma da incomparabilidade, do 
ser-para-si de cada elemento do mundo, embora eles se 
digladiem praticamente como os opostos partidários do 
socialismo e do individualismo, é sempre uma só e a mesma 
forma fundamental da dualidade que, por fim, se revela na 
imagem biológica como o antagonismo entre hereditarie-
dade e variabilidade – a primeira como portadora do geral, 
da unidade, da igualdade consolidada de formas e conteú-
dos da vida, a outra como a mobilidade, a multiplicidade de 
elementos particulares, o desdobramento inquieto de um 
conteúdo de vida individual que gera outro. Cada essen-
cial forma de vida na história do nosso género representa, 
na sua área, uma forma particular de unir o interesse pela 
duração, pela unidade e pela igualdade com o interesse pela 
mudança, pelo particular, pelo único.
[Moda e imitação]
No interior da materialização social destes opostos, 
uma das vertentes dos mesmos é sustentada sobretudo pela 
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tendência psicológica para a imitação. A imitação poderia 
designar-se como uma transmissão psicológica, como a 
transição da vida do grupo para a vida individual. O seu 
fascínio consiste, antes de mais, em que ela nos possibilita 
um fazer apropriado e significativo mesmo onde, no plano, 
nada de pessoal e criativo emerge. Ela poderia denominar-
se como o filho da reflexão e da irreflexão.
Proporciona ao indivíduo o sossego de não perma-
necer sozinho no seu agir, mas apoia-se nos exercícios 
habituais da mesma actividade como num firme alicerce, 
que alivia o acto presente da dificuldade de se suster a si 
próprio. Onde imitamos, deslocamos não só a exigência 
da energia produtiva de nós para o outro, mas também ao 
mesmo tempo a responsabilidade por este agir: ela liberta 
assim o indivíduo da dor da escolha e deixa-o, sem mais, 
aparecer como um produto do grupo, como um receptáculo 
de conteúdos sociais. O impulso imitativo enquanto prin-
cípio caracteriza um estádio evolutivo, no qual está vivo o 
desejo de actividade pessoal conveniente, mas falta ainda a 
capacidade de a esta fornecer conteúdos individuais.
 O progresso para lá deste estádio consiste em que, 
fora do dado, do passado, do transmitido, o futuro deter-
mina o pensamento, a acção e o sentimento: o homem 
teleológico é o pólo oposto do imitador. Assim a imita-
ção em todas as suas manifestações, para as quais ela é um 
factor configurador, corresponde a uma das orientações 
básicas do nosso ser, àquela que se satisfaz com a fusão 
do indivíduo na generalidade, que acentua o permanente 
na mudança. Mas onde a mudança se busca, pelo contrá-
rio, no permanente, a diferenciação individual, o separar-se 
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da generalidade, a imitação é o princípio negador e inibi-
dor. E porque o anseio de se arrimar ao dado, de fazer o 
igual e de ser como os outros é o inimigo irreconciliável da 
ânsia que quer avançar para novas e específicas formas de 
vida, a vida social surgirá então como o lugar de batalha, 
onde cada palmo é disputado por ambos, e as instituições 
sociais como conciliações – nunca duradouras – em que o 
seu antagonismo persistente toma a forma externa de uma 
cooperação.
 As condições vitais da moda como uma manifestação 
constante na história da nossa espécie podem assim descre-
ver-se. Ela é imitação de um modelo dado e satisfaz assim 
a necessidade de apoio social, conduz o indivíduo ao tri-
lho que todos percorrem, fornece um universal, que faz do 
comportamento de cada indivíduo um simples exemplo. E 
satisfaz igualmente a necessidade de distinção, a tendência 
para a diferenciação, para mudar e se separar. E este último 
aspecto consegue-o, por um lado, pela mudança dos con-
teúdos, que marca individualmente a moda de hoje em face 
da de ontem e da de amanhã, consegue-o ainda de modo 
mais enérgico, já que as modas são sempre modas de classe, 
porque as modas da classe superior se distinguem das da 
inferior e são abandonadas no instante em que esta última 
delas se começa a apropriar. Por isso, a moda nada mais é 
do que uma forma particular entre muitas formas de vida, 
graças à qual a tendência para a igualização social se une à 
tendência para a diferença e a diversidade individuais num 
agir unitário. Se indagássemos a história das modas, que 
até agora só foi pesquisada na evolução dos seus conteú-
dos, segundo o seu significado para a forma do processo 
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social, então ela seria a história das tentativas de adaptar, 
cada vez mais perfeitamente, a satisfação destas duas ten-
dências contrárias ao estado da respectiva cultura indivi-
dual e social. Nesta natureza básica da moda ordenam-se os 
traços psicológicos individuais que nela observamos. 
Ela é, como eu dizia, um produto da divisão de classes e 
comporta-se como muitas outras configurações, sobretudo 
como a honra, cuja dupla função é formar um círculo social 
fechado e, ao mesmo tempo, isolá-lo dos outros. Assim 
como a moldura de um quadro dá à obra de arte o carácter 
de um todo unitário, em si concentrado, de um mundo para 
si e, ao mesmo tempo, actuando para o exterior, corta todas 
as relações com o ambiente espacial, assim como a energia 
unitária de tais formas não é para nós expressável a não ser 
enquanto a decompomos na dupla acção para dentro e para 
fora – assim também a honra extrai o seu carácter, e sobre-
tudo os seus direitos morais – direitos que, com muita fre-
quência, são percebidos como injustiça pelo ponto de vista 
dos que estão fora da classe – do facto de o indivíduo na 
sua honra representar e preservar simultaneamente a honra 
do seu círculo social, do seu estado. 
A moda significa, pois, por um lado, a anexação do 
igualitariamente posto, a unidade de um círculo por ela 
caracterizado, e assim o fechamento deste grupo perante 
os que se encontram mais abaixo, a caracterização destes 
como não pertencendo àquele. Unir e diferenciar são as 
duas funções básicas que aqui se unem de modo insepará-
vel, das quais uma, embora constitua ou porque constitui a 
oposição lógica à outra, é a condição da sua realização.
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[Arbitrariedade da moda]
Que a moda seja, pois, um mero produto das necessi-
dades sociais talvez não se demonstre de modo mais forte 
do que pelo facto de, numa relação teleológica objectiva, 
estética ou outra, inúmeras vezes se não encontrar o mínimo 
fundamento para as suas configurações. Embora em geral 
o nosso vestuário, por ex., se ajuste objectivamente às nos-
sas necessidades, não impera qualquer vestígio de conve-
niência nas decisões com que a moda as forma: se hão-de 
usar-se saias compridas ou curtas, penteados pontiagudos 
ou largos, gravatas coloridas ou pretas. Coisas tão odio-
sas e adversas são, por vezes, modernas, como se a moda 
quisesse mostrar o seu poder justamente porque tomamos 
sobre nós, por causa dela, o mais horroroso; a casualidade 
com que ela, umas vezes, ordena o conveniente, outras o 
abstruso, e uma terceira vez o totalmente indiferente do 
ponto vista objectivo e estético, mostra precisamente a sua 
plena indiferença em face das normas objectivas da vida, 
com que justamente se refere a outras motivações, isto é, as 
formalmente sociais, como as únicas que restam. 
Pode ela decerto, de vez em quando, alojarconteúdos 
objectivamente fundados, mas, como moda, actua quando 
a independência perante qualquer outra motivação se faz 
sentir de modo positivo, da mesma forma que o nosso agir 
por dever só se impõe, como totalmente moral, quando 
o seu conteúdo externo e o seu fim a tal não nos deter-
minam, mas apenas o facto de ele ser justamente dever. 
Por isso, o domínio da moda é sobretudo intolerável nos 
recintos em que apenas devem imperar decisões objecti-
vas: religiosidade, interesses científicos, e até socialismo e 
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individualismo, tornaram-se decerto coisas de moda; mas 
os motivos por que se deveriam acatar estes conteúdos 
vitais estão em absoluta contradição com a plena insubs-
tancialidade nas mudanças da moda.
[Moda e classes]
Quando as formas sociais, o vestuário, os juízos esté-
ticos, o grande estilo em que o homem se expressa, se con-
cebem em contínua remodelação através da moda, então 
esta, ou seja, a moda recente, compete em tudo apenas às 
camadas superiores. Logo que as classes inferiores come-
çam a apropriar-se da moda, ultrapassando assim a fronteira 
instituída pelas superiores e rompendo, destas, a homoge-
neidade da co-pertença assim simbolizada, as classes supe-
riores desviam-se desta moda e viram-se para outra, graças 
à qual de novo se diferenciam das grandes massas, e na qual 
o jogo mais uma vez se inicia. Pois, naturalmente, as classes 
inferiores olham para cima e procuram subir e conseguem 
isto sobretudo nas áreas que estão sujeitas à moda, porque 
estas são, de longe, as mais acessíveis à imitação externa. O 
mesmo processo se desenrola – nem sempre de modo tão 
evidente como, porventura, entre as senhoras e as criadas 
– entre as diversas camadas das classes mais altas. Pode 
observar-se de muitas formas que quanto mais se aproxi-
mam os círculos tanto mais desatinada é a caça da imitação 
pelos de baixo e a fuga para a novidade pelos de cima; a 
actual economia financeira acelerará e tornará assaz visível 
este processo, porque os objectos da moda, tais como as 
exterioridades da vida, são muito particularmente acessí-
veis à simples posse do dinheiro, e neles se estabelece, por 
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isso, de modo mais fácil a paridade com o estrato superior 
do que em todas as áreas que exigem uma prova individual, 
que não se pode comprar com dinheiro. 
Em que medida este momento da segregação – a 
par do momento imitativo – constitui a essência da moda 
mostram-no as suas manifestações onde a estrutura social 
não possui nenhumas camadas sobrepostas; então, é des-
sas camadas postas lado a lado que ela, muitas vezes, se 
apodera. Conta-se de alguns povos primitivos que grupos 
muito vizinhos e vivendo em condições exactamente idên-
ticas instituem, por vezes, modas fortemente discriminan-
tes, pelas quais cada grupo assinala tanto o isolamento para 
dentro como a diferença para fora.
[A moda e o estrangeiro]
Por outro lado, a moda é importada do exterior com 
particular predilecção e é muito mais apreciada dentro de 
um círculo, se ela não tiver surgido no seu seio; já o profeta 
Sofonias fala, indignado, da ostentação com a indumen-
tária estrangeira. Na realidade, a origem exótica da moda 
parece favorecer com especial intensidade a fusão dos cír-
culos em que ela se aplica; justamente por vir de fora, sus-
cita aquela forma particular e significativa de socialização, 
que se inicia através da comum referência a um ponto situ-
ado no exterior. Por vezes, é como se aparentemente os 
elementos sociais, tal como os eixos dos olhos, convergis-
sem melhor para um ponto que não se encontra demasiado 
perto. Assim, entre os povos primitivos, o dinheiro, por-
tanto o valor económico sem mais, o objecto do interesse 
geral mais extremo, consiste muitas vezes em sinais que se 
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importam de fora; por isso, em várias regiões (nas ilhas 
Salomão, em Ibo no Níger) existe uma espécie de indústria 
para elaborar, a partir de conchas ou de outra coisa, sinais 
pecuniários que circulam como dinheiro, não no lugar de 
fabrico, mas nas regiões vizinhas, para onde são exportados 
– tal como as modas são produzidas em Paris com o sim-
ples fito de se tornarem modas em qualquer outro lugar. 
Também em Paris a moda ostenta a mais ampla tensão e 
reconciliação dos seus elementos dualistas. O individua-
lismo, a adaptação ao assentar-bem pessoal, é muito mais 
profundo do que na Alemanha; mas persiste aí com força 
um certo enquadramento mais amplo do estilo geral, da 
moda vigente, de modo que a aparência individual nunca 
sai do universal, antes dele se destaca.
Quando falta mesmo só uma das duas tendências 
sociais que se devem reunir para a formação da moda – a 
necessidade de união, por um lado, e a necessidade de sepa-
ração, por outro – ela não chegará a constituir-se, acabará o 
seu reino. Por isso, as classes inferiores têm muito poucas 
e raras modas específicas; e as modas dos povos primitivos 
são, por isso, também muito mais estáveis do que as nos-
sas. Falta nas últimas, em virtude da sua estrutura social, o 
perigo da mistura e da confusão que induz as classes dos 
povos civilizados a diferenciar-se pela indumentária, pela 
conduta, pelo gosto, etc.
[O vestuário novo]
É precisamente através destas diferenciações que os 
sectores de grupos interessados na separação se mantêm 
unidos: o modo de andar, a cadência, o ritmo dos gestos 
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são, sem dúvida, essencialmente determinados pelo vestu-
ário; homens vestidos de modo semelhante comportam-se 
de modo relativamente semelhante. 
Para a vida moderna, com a sua cisão individualista, 
isto tem um valor de todo especial. E, entre os povos pri-
mitivos, a moda será também menor, ou seja, mais estável, 
porque a necessidade da novidade das impressões e das for-
mas de vida, abstraindo inteiramente do seu efeito social, é 
neles muito menor. A mudança da moda mostra a medida 
do embotamento da sensibilidade; quanto mais nervosa for 
uma época, tanto mais depressa se alteram as suas modas, 
porque a necessidade de estímulos diferenciadores, um dos 
sustentáculos essenciais de toda a moda, caminha de braço 
dado com o esgotamento das energias nervosas. Esta é já 
por si uma razão por que as classes superiores constituem 
o lugar genuíno da moda.
Em relação aos motivos puramente sociais que a ori-
ginam, dois povos primitivos muito chegados entre si for-
necem exemplos muito comprovativos para o seu objectivo 
de inclusão e de exclusão. Os cafres possuem uma hierar-
quia social ricamente articulada e, no meio deles, encon-
tra-se uma mudança bastante rápida da moda, embora o 
vestuário e o adorno se achem sujeitos a certas limitações 
legais; em contrapartida, os bosquímanos, nos quais não 
teve em geral lugar uma formação de classes, não elabora-
ram nenhuma moda, ou seja, não há neles nenhum interesse 
fixo pela mudança de vestuário e ornamento. Estas razões 
negativas impediram, de vez em quando, justamente nos 
pináculos da cultura, mas agora com plena consciência, a 
formação da moda. Em Florença, por volta do ano 1390, 
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