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MICROECONOMIA 1 Departamento de Economia, Universidade de Bras´ılia Notas de Aula 8 - Graduac¸a˜o Prof. Jose´ Guilherme de Lara Resende 1 Dualidade Considere os dois problemas do consumidor: max x1,x2,...,xn u(x1, x2, . . . , xn) s.a p1x1 + p2x2 + · · ·+ pnxn = m (1) min x1,x2,...,xn p1x1 + p2x2 + · · ·+ pnxn s.a u(x1, x2, . . . , xn) = u0 (2) Se a func¸a˜o utilidade e´ estritamente crescente, cont´ınua e soluc¸o˜es para ambos os problemas existem (isso e´ garantido se a func¸a˜o de utilidade e´ bem-comportada), enta˜o valem as seguintes relac¸o˜es entre os dois tipos de problemas: 1) Maximizac¸a˜o da utilidade implica minimizac¸a˜o do dispeˆndio. Suponha que (x∗1, . . . , x ∗ n) seja soluc¸a˜o de (1) e considere o n´ıvel de utilidade u¯ definido como u¯ = u(x∗1, . . . , x ∗ n). Enta˜o (x∗1, . . . , x ∗ n) e´ soluc¸a˜o do problema (2), com o n´ıvel de utilidade u0 = u¯. 2) Minimizac¸a˜o do dispeˆndio implica maximizac¸a˜o da utilidade. Suponha que (x∗1, x ∗ 2) seja soluc¸a˜o de (2) e considere o n´ıvel de renda m¯ definido por m¯ = p1x ∗ 1 + p2x ∗ 2, m > 0. Enta˜o (x∗1, x ∗ 2) e´ soluc¸a˜o do problema (1), com o n´ıvel de renda m = m¯. A relac¸a˜o 1) acima tem como consequeˆncia que xMi (p,m) = x h i (p, v(p,m)), para todo bem i, i = 1, 2, . . . , n, e que e(p, v(p,m)) = m. A relac¸a˜o 2) acima tem como consequeˆncia que xhi (p, u0) = x M i (p, e(p, u0)), para todo bem i, i = 1, 2, . . . , n, e que v(p, e(p, u0)) = u0. Resumindo, para todo p > 0, m > 0, e u > 0, temos que: e(p, v(p,m)) = m e v(p, e(p, u0)) = u0 A primeira equac¸a˜o acima diz que o dispeˆndio mı´nimo necessa´rio para se alcanc¸ar o n´ıvel de utilidade v(p,m) e´ igual a m. A segunda equac¸a˜o acima diz que a utilidade ma´xima alcanc¸a´vel com um n´ıvel de renda e(p, u0) e´ u0. 1 Para as func¸o˜es de demanda, valem as seguintes relac¸o˜es: xMi (p,m) = x h i (p, v(p,m)) e x h i (p, u0) = x M i (p, e(p, u0)) (3) As relac¸o˜es descritas por 1) e 2) acima podem ser melhor compreendidas com o aux´ılio de gra´ficos. As figuras abaixo ilustram as relac¸o˜es entre os dois problemas do consumidor. 6 - x2 x1 Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ Problema Primal E � � rxM1 xM2 6 - x2 x1 Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ Problema Dual rE Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ rxh1 xh2 6 (xM1 , x M 2 ) e´ soluc¸a˜o de min p1x1 + p2x2 s.a u(x1, x2) = u¯, com u¯ = u(x M 1 , x M 2 ) (Relac¸a˜o 1) 6 - x2 x1 Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ Problema Dual E Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ rxh1 xh2 6 - x2 x1 Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ Problema Primal E � � rxM1 xM2 6 (xh1 , x h 2) e´ soluc¸a˜o de max u(x1, x2) s.a p1x1 + p2x2 = m¯, com m¯ = p1x h 1 + p2x h 2 (Relac¸a˜o 2) 2 No primeiro painel (relac¸a˜o 1)), o gra´fico a` esquerda ilustra o problema de maximizac¸a˜o da utilidade. O gra´fico a` direita ilustra o problema de minimizac¸a˜o do dispeˆndio. Se no problema de maximizac¸a˜o da utilidade a soluc¸a˜o e´ representada pela cesta E = (xM1 , x M 2 ) (ver gra´fico a` esquerda) enta˜o essa cesta E e´ soluc¸a˜o do problema de minimizac¸a˜o do dispeˆndio, quando a utilidade u0 desse problema e´ dada por u0 = u¯ = v(p,m) = u(x M 1 , x M 2 ). Similarmente, no painel abaixo (relac¸a˜o 2)), o gra´fico a` esquerda ilustra o problema de min- imizac¸a˜o de dispeˆndio. O gra´fico a` direita ilustra o problema de maximizac¸a˜o da utilidade. Se no problema de minimizac¸a˜o do dispeˆndio a soluc¸a˜o e´ representada pela cesta E = (xh1 , x h 2) (ver grafico a` esquerda), enta˜o essa cesta E e´ soluc¸a˜o do problema de maximizac¸a˜o da utilidade, quando a renda m desse problema e´ dada por m = m¯ = e(p, u0) = p1x h 1 + p2x h 2 . Observe tambe´m que as CSO dos dois problemas devem coincidir, como foi discutido anterior- mente. Se as prefereˆncias forem bem-comportadas, enta˜o os dois problemas esta˜o bem definidos e valem as relac¸o˜es de dualidade. Podemos provar que elas valem sob condic¸o˜es mais fracas, mas na˜o entraremos nesse n´ıvel de detalhamento. Finalmente, observe que apesar de a identidade (3) ser va´lida, as ana´lises de esta´tica compara- tiva dos dois problemas do consumidor sa˜o inteiramente diferentes. Por exemplo, os ajustamentos nas duas demandas devido a uma mudanc¸a de prec¸os sa˜o distintos, ja´ que varia´veis diferentes sa˜o mantidas constantes em cada problema. Vamos analisar o que ocorre em cada caso, supondo apenas dois bens, o que permite a visualizac¸a˜o gra´fica do efeito das mudanc¸as nas varia´veis. 6 - x2 x1 m p2 m p1 Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ sE e e e e e e e e e e e e e e e e e ee Prec¸o do bem 1 aumentou m pˆ1 ff Soluc¸a˜o muda de E para Eˆ sEˆ 3 A demanda Marshalliana xM(p,m), obtida do problema de maximizac¸a˜o da utilidade, mante´m o n´ıvel de renda constante. Se o prec¸o do bem 1 aumenta, por exemplo (de p1 para pˆ1), a reta orc¸amenta´ria se torna mais inclinada (ver figura acima). O consumidor, com o mesmo n´ıvel de renda, alcanc¸a um n´ıvel de utilidade mais baixo (a cesta o´tima se desloca de E para Eˆ). A demanda Hicksiana xh(p, u0), obtida do problema de minimizac¸a˜o do dispeˆndio, mante´m o n´ıvel de utilidade constante. Se o prec¸o do bem 1 aumenta, por exemplo, a inclinac¸a˜o da reta de dispeˆndio aumenta. O consumidor ira´ gastar mais para obter uma cesta que lhe da´ a mesma utilidade u0 (a cesta o´tima se desloca de E para Eˆ). 6 - x2 x1 Es Equil´ıbrio: E Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ Prec¸o do bem 1 aumentou T T T T T T T T T T T T T T T T TT Soluc¸a˜o muda de E para Eˆ Eˆs @ @@I Como esses ajustamentos sa˜o diferentes, mas vale a relac¸a˜o de dualidade (3) entre os dois tipos de demanda, a pergunta o´bvia e´ se existe alguma conexa˜o entre esses dois ajustamentos. A resposta e´ sim. Essa conexa˜o e´ descrita pela equac¸a˜o de Slutsky, que analisaremos agora. Exemplo: Utilidade Cobb-Douglas. Vimos que para a utilidade Cobb-Douglas u(x1, x2) = xα1x 1−α 2 , α ∈ (0, 1), as demandas Marshallianas e a func¸a˜o de utilidade indireta sa˜o: xM1 = α m p1 , xM2 = (1− α) m p2 e v(p1, p2,m) = α α(1− α)1−αp−α1 p−(1−α)2 m A relac¸a˜o v(p1, p2, e(p1, p2, u0)) = u0 permite encontrar e(p1, p2, u0): v(p1, p2, e(p1, p2, u0) = α α(1− α)1−αp−α1 p−(1−α)2 e(p1, p2, u0) = u0 ⇒ e(p1, p2, u0) = α−α(1− α)−(1−α)pα1p1−α2 u0 4 Vimos que as demandas Hicksianas geradas pela utilidade Cobb-Douglas sa˜o: xh1 = ( α 1− α )1−α pα−11 p 1−α 2 u0 e x h 2 = ( α 1− α )−α pα1p −α 2 u0 Logo, a func¸a˜o dispeˆndio, derivada usando a sua definic¸a˜o, e(p1, p2, u0) = p1x h 1 + p2x h 2 , e´: e(p1, p2, u0) = α −α(1− α)−(1−α)pα1p1−α2 u0, exatamente a expressa˜o que derivamos usando a identidade v(p1, p2, e(p1, p2, u0)) = u0, como esperado. Finalmente, a relac¸a˜o xM1 (p1, p2, e(p1, p2, u0)) = x h 1(p1, p2, u0) permite encontrar x h 1(p1, p2, u0), usando as demandas Marshallinas e a func¸a˜o dispeˆndio: xMi (p1, p2, e(p1, p2, u0)) = α ( α−α(1− α)−(1−α)pα1p1−α2 u0 p1 ) ⇒ xhi (p1, p2, u0) = α1−α(1− α)−(1−α)p−(1−α)1 p1−α2 u0, exatamente o que derivamos no problema dual, como esperado. 2 Equac¸a˜o de Slutsky Vimos que as demandas Marshallianas e Hicksianas sa˜o iguais quando a demanda Marshalliana e´ calculada com a renda igual ao dispeˆndio mı´nimo necessa´rio para alcanc¸ar a utilidade u: xhi (p, u) = x M i (p, e(p, u)) Se u e´ o n´ıvel de utilidade ma´ximoque o consumidor obte´m aos prec¸os p = (p1, p2) e renda m, ao derivarmos a identidade acima com relac¸a˜o a pj obtemos a equac¸a˜o de Slutsky : ∂xMi (p,m) ∂pj = ∂xhi (p, u ∗) ∂pj − ∂x M i (p,m) ∂m xMj (p,m), (4) onde usamos o Lema de Shepard e o fato de que xhj (p, u) = x M j (p,m) para chegarmos a` expressa˜o acima. A equac¸a˜o de Slutsky mostra que o efeito de uma mudanc¸a no prec¸o do bem j sobre a demanda do bem i pode ser decomposta em dois efeitos: ∂xMi (p,m) ∂pj︸ ︷︷ ︸ efeito total = ∂xhi (p, u) ∂pj︸ ︷︷ ︸ efeito substituic¸a˜o −xMj (p,m) ∂xMi (p,m) ∂m︸ ︷︷ ︸ efeito renda , 5 onde u e´ o n´ıvel ma´ximo de utilidade que o consumidor alcanc¸a aos prec¸os p e renda m. A equac¸a˜o de Slutsky relaciona a demanda Marshalliana, observa´vel, com a demanda Hicksiana, na˜o observa´vel, usando o efeito renda. O efeito total de uma mudanc¸a do prec¸o pj no consumo do bem i e´ igual a` mudanc¸a na quantidade demandada do bem i, mantendo a utilidade constante, menos a mudanc¸a na renda real, medida pela quantidade consumida do bem no qual o prec¸o muda multiplicado pelo impacto da mudanc¸a da renda no consumo do bem i. O primeiro efeito e´ chamado efeito substituic¸a˜o. O segundo efeito e´ chamado efeito renda. Vamos analisar os dois efeitos quando consideramos o efeito da mudanc¸a de prec¸o do bem no consumo desse mesmo bem. Nesse caso a equac¸a˜o de Slutsky e´: ∂xMi (p,m) ∂pi︸ ︷︷ ︸ efeito total = ∂xhi (p, u) ∂pi︸ ︷︷ ︸ efeito substituic¸a˜o −xMi (p,m) ∂xMi (p,m) ∂m︸ ︷︷ ︸ Efeito Renda Os dois efeitos possuem a seguinte intuic¸a˜o econoˆmica: 1) Efeito substituic¸a˜o (Hicksiano): se o prec¸o do bem aumentou, o consumidor substitui o consumo desse bem pelo consumo de outros bens, dada a nova relac¸a˜o de prec¸os dos bens e mantendo-se o bem-estar do consumidor constante. O efeito substituic¸a˜o e´ sempre negativo (mais exatamente, sempre na˜o positivo). 2) Efeito Renda (Hicksiano): com o aumento do prec¸o, ha´ uma diminuic¸a˜o da renda dispon´ıvel a ser gasta. Esse efeito pode ser negativo ou positivo, dependendo se o bem e´ normal ou inferior, respectivamente. O efeito de uma mudanc¸a de prec¸os na demanda observa´vel e´ portanto dividido em duas partes. Note que o consumidor, quando o prec¸o muda, na˜o calcula o seu efeito subsituic¸a˜o e o seu efeito renda. Ele apenas escolhe uma nova cesta de bens. Essa divisa˜o e´ apenas uma decomposic¸a˜o teo´rica que auxilia na compreensa˜o do efeito de uma mudanc¸a de prec¸os na quantidade demandada do bem. Na primeira parte da divisa˜o, os prec¸os relativos mudam, mas a utilidade e´ mantida constante. Na segunda parte, com a nova relac¸a˜o de prec¸os valendo, a renda real (que se altera quando ocorre uma mudanc¸a de prec¸o) do consumidor varia. A soma dessas duas partes e´ o efeito total da mudanc¸a do prec¸o na demanda do bem. Por exemplo, suponha que o prec¸o do bem 1 diminuiu. A decomposic¸a˜o gra´fica do efeito total na demanda Marshalliana da diminuic¸a˜o do prec¸o p1 nos dois efeitos acima e´ representada no gra´fico abaixo. 6 O efeito total na demanda devido a uma diminuic¸a˜o do prec¸o do bem 1 e´ x∗∗1 − x∗1. O efeito substituic¸a˜o e´ x∗∗∗1 − x∗1. O efeito renda e´ x∗∗1 − x∗∗∗1 . O efeito total e´ a soma desses dois efeitos: x∗∗1 − x∗1︸ ︷︷ ︸ Efeito Total = (x∗∗∗1 − x∗1)︸ ︷︷ ︸ Efeito Substituic¸a˜o + (x∗∗1 − x∗∗∗1 )︸ ︷︷ ︸ Efeito Renda 6 - x2 x1 m p2 e e e e e e e e e e e e e e e e e ee E x∗1 Equil´ıbrio inicial: E, consumo de x∗1 unidades do bem 1 s s Prec¸o do bem 1 diminuiu Efeito Substituic¸a˜o: x∗1 → x∗∗1 Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ s s Eˆ x∗∗1- Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ ˆˆ Es s x∗∗∗1- Efeito Renda: x∗∗1 → x∗∗∗1 Efeito Total: x∗1 → x∗∗∗1 x ∗∗∗ 1 − x∗1︸ ︷︷ ︸ Efeito Total = (x ∗∗ 1 − x∗1)︸ ︷︷ ︸ Efeito Substituic¸a˜o + (x ∗∗∗ 1 − x∗∗1 )︸ ︷︷ ︸ Efeito Renda Vimos que a demanda Marshalliana quase sempre responde negativamente a uma mudanc¸a de prec¸o, todo o resto mantido constante. Pore´m existe a possibilidade teo´rica de a quantidade consumida de um bem aumentar (diminuir) com um aumento (queda) do seu prec¸o (bem de Giffen). Por que isso pode ocorrer na teoria? Vamos usar a equac¸a˜o de Slutsky para estudar essa questa˜o. O efeito substituic¸a˜o e´ sempre na˜o-positivo. O efeito renda sera´ positivo se o bem for normal ou negativo se o bem for inferior. Para que o bem seja um bem de Giffen, o efeito renda tem que ser na˜o somente negativo, mas negativo o suficiente para suplantar o efeito substituic¸a˜o. Portanto todo bem de Giffen e´ um bem bastante inferior (a elasticidade-renda dele tem que ser muito negativa). Para qualificar melhor essa u´ltima afirmac¸a˜o, a representac¸a˜o da equac¸a˜o de Slutsky em termos de elasticidades, dada por: εMij = ε h ij − sjηi, 7 onde εMij e´ a elasticidade Marshalliana cruzada do bem i com respeito ao prec¸o pj, ε h ij e´ a elasticidade Hicksiana (ou compensada) cruzada do bem i com respeito ao prec¸o pj, sj e´ a frac¸a˜o da renda gasta no bem j, e ηi e´ a elasticidade-renda do bem i. Para o caso de i = j, temos que: εMii = ε h ii − siηi Portanto, um bem de Giffen tem elasticidade-renda negativa e frac¸a˜o da renda gasta no con- sumo desse alta o suficiente para suplantar o termo εhii, sempre na˜o positivo. Por que e´ improva´vel a existeˆncia de um bem de Giffen na pra´tica? Primeiro, para achar bens inferiores, temos que olhar para categorias estreitas de bens. Categorias amplas de bens teˆm usualmente elasticidade-renda positiva. Por exemplo, transporte quase sempre e´ um bem normal para qualquer faixa de renda, mas passagem de oˆnibus pode ser um bem inferior para certas faixas de renda. Consequentemente, bens inferiores sa˜o bens nos quais a frac¸a˜o da renda gasta com eles e´ pequena. Segundo, um bem e´ inferior porque consumidores substituem o consumo dele por outros bens. Portanto εhij sera´ alto para va´rios bens j e, consequentemente, esse bem tera´ uma elasticidade εhii alta (recorde-se da relac¸a˜o 2 entre elasticidades que estudamos anteriormente). Exemplo: Equac¸a˜o de Slutsky para utilidade Cobb-Douglas. As demandas Marshalliana e Hicksiana do bem 1 e a func¸a˜o de dispeˆndio para um consumidor com utilidade Cobb-Douglas com dois bens sa˜o: xM1 (p,m) = α m p1 xh1(p, u0) = ( α 1− α )1−α pα−11 p 1−α 2 u0 v(p,m) = (1− α)1−αααp−α1 pα−12 m As derivadas das demandas Marshalliana e Hicksiana, relevantes nesse caso, sa˜o: ∂xM1 (p,m) ∂p1 = −αm p21 ∂xh1(p, uo) ∂p1 = − ( α 1− α )1−α (1− α)pα−21 p1−α2 u0 ∂xMi (p,m) ∂m = α 1 p1 Juntando tudo, obtemos: ∂xhi (p, v(p,m)) ∂pi − xMi (p,m) ∂xMi (p,m) ∂m = −α(1− α)p−21 m− α 1 p1 α m p1 = −αm p21 = ∂xM1 (p,m) ∂p1 , 8 ou seja, a equac¸a˜o de Slutsky e´ va´lida, como esperado. Se as prefereˆncias forem bem-comportadas, enta˜o sera´ poss´ıvel substituir o consumo de um bem pelo outro de modo a manter a utilidade constante. Isso implica que o efeito substituic¸a˜o sera´ negativo. Um efeito substituic¸a˜o nulo esta´ associado a` impossibilidade de substituir o consumo de um bem pelo consumo do outro. Essa situac¸a˜o ocorre no caso de uma utilidade de Leontief, em que o efeito total de uma mudanc¸a no prec¸o do bem e´ gerado apenas pelo efeito renda, ja´ que o efeito substituic¸a˜o e´ nulo. Observe que nesse caso a func¸a˜o dispeˆndio e´ uma reta, indicando tambe´m a impossibilidade de substituir o consumo de um bem pelo consumo do outro. 3 Efeito Substituic¸a˜o de Slutsky A equac¸a˜o de Slutsky pode ser obtida de uma maneira diferente. Suponha que o prec¸ode um bem qualquer se alterou. A relac¸a˜o entre os prec¸os dos bens se alterou, e a taxa de troca de mercado entre bens e´ diferente. Com essa mudanc¸a no prec¸o, o valor da renda que o consumidor possui mudou. Se o prec¸o do bem subiu, a sua renda real diminuiu: ele na˜o vai alcanc¸ar o mesmo n´ıvel de utilidade que antes. Se o prec¸o do bem diminuiu, a sua renda real aumentou: ele vai alcanc¸ar um n´ıvel de utilidade mais alto. Suponha agora que compensamos a renda do consumidor de modo a manter o seu poder de compra original (isto e´, de modo que ele possa comprar a cesta escolhida originalmente). Esse efeito e´ um efeito substituic¸a˜o, pois o consumidor mante´m o seu poder aquisitivo, mas como os prec¸os relativos mudaram, ele provavelmente escolhera´ uma outra cesta para consumir. O gra´fico abaixo ilustra essa situac¸a˜o. Note que a reta paralela a` nova relac¸a˜o de prec¸os passa pelo ponto E, o ponto de equil´ıbrio antes de o prec¸o do bem 1 diminuir. Ou seja, o consumidor e´ compensado de modo que a cesta original continue poss´ıvel de ser adquirida. Como a relac¸a˜o de prec¸os mudou, ele muda sua escolha o´tima, de E para Eˆ. Essa mudanc¸a de E para Eˆ e´ o efeito substituic¸a˜o de Slutsky. A diferenc¸a entre esse efeito substituic¸a˜o, chamado de efeito substituic¸a˜o de Slutsky, e o efeito substituic¸a˜o Hicksiano e´ que, no primeiro, a renda do consumidor e´ compensada de modo que a cesta o´tima original ainda e´ “compra´vel” e, no segundo, a utilidade do consumidor obtida com o consumo da cesta original e´ mantida constante, e apenas os prec¸os relativos mudam. 9 6 - x2 x1 m p2 e e e e e e e e e e e e e e e e e ee sE s x∗1 Equil´ıbrio: E, consumo de x∗1 unidades do bem 1 Prec¸o do bem 1 diminuiu Efeito Substituic¸a˜o de Slutsky: x∗1 → x∗∗1 Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ sEˆ s x∗∗1- Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q QQ sˆˆE s x∗∗∗1- Efeito Renda: x∗∗1 → x∗∗∗1 Efeito Total: x∗1 → x∗∗∗1 Vamos derivar a versa˜o da equac¸a˜o de Slutsky com esse novo efeito substituic¸a˜o, para o caso de dois bens. Represente por (x1, x2) a escolha o´tima do consumidor quando os prec¸os sa˜o (p1, p2) e a renda m. A demanda de Slutsky aos prec¸os (p1, p2) e´ a quantidade dos bens que o consumidor escolhera´ se a sua renda fosse modificada de modo que a cesta o´tima (x1, x2) continuasse dentro da sua possibilidade de compra. Portanto, essa demanda e´ func¸a˜o dos prec¸os e da cesta de bens o´tima que fixamos. A demanda de Slutsky e´ obtida da demanda Marshalliana, do seguinte modo: xSi (p1, p2;x1, x2) = x M i (p1, p2, p1x1 + p2x2), i = 1, 2. Se diferenciarmos a demanda de Slutsky do primeiro bem com relac¸a˜o ao prec¸o desse bem, obtemos ∂xS1 (p1, p2;x1, x2) ∂p1 = ∂xM1 (p1, p2,m) ∂p1 + ∂xM1 (p1, p2,m) ∂m x1 Ou seja, ∂xM1 (p1, p2,m) ∂p1 = ∂xS1 (p1, p2;x1, x2) ∂p1 − ∂x M 1 (p1, p2,m) ∂m x1 Essa u´ltima expressa˜o e´ a equac¸a˜o de Slutsky quando o efeito substituic¸a˜o considerado e´ o de Slutsky. A intuic¸a˜o e´ similar a` da equac¸a˜o de Slutsky vista na sec¸a˜o anterior. O efeito total de uma variac¸a˜o no prec¸o do bem pode ser decomposto em dois efeitos. O primeiro, o efeito substituic¸a˜o (de Slutsky), mede a mudanc¸a na escolha da cesta o´tima que ocorre quando os prec¸os relativos mudam, mas a renda do consumidor e´ compensada de modo que ele possa comprar a cesta o´tima original (note que se houver uma diminuic¸a˜o no prec¸o, essa compensac¸a˜o e´ negativa). 10 O segundo, o efeito renda, mede a mudanc¸a na escolha que ocorre quando a renda do consumidor varia, mantida a nova relac¸a˜o de prec¸os. Podemos enta˜o novamente dividir o efeito de uma mudanc¸a de prec¸os na demanda observa´vel em duas partes. Na primeira parte, os prec¸os relativos mudam, mas o poder aquisitivo do consum- idor e´ mantido constante, de modo que ele continua podendo adquirir a cesta original aos novos prec¸os (a utilidade na˜o e´ mantida constante, como no caso do efeito substituic¸a˜o Hicksiano). Na segunda parte, ja´ com a nova relac¸a˜o de prec¸os, a renda real (que se altera quando ocorre uma mudanc¸a de prec¸o) do consumidor varia. Mais uma vez, a soma das duas partes e´ o efeito total da mudanc¸a do prec¸o na demanda do bem. Os dois efeitos substituic¸a˜o de Slustky e de Hicks podem ser iguais? Sim, se considerarmos variac¸o˜es muito pequenas no prec¸o (mais precisamente, variac¸o˜es infinitesimais no prec¸o). Nesse caso, os dois efeitos sa˜o ideˆnticos. Pore´m, para variac¸o˜es discretas, os dois efeitos na˜o necessaria- mente sa˜o iguais, como as figuras abaixo ilustram. 6 - x2 x1 m p2 e e e e e e e e e e e e e rE r x∗1 Efeito Substituic¸a˜o de Hicks Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q r Eˆ r x∗∗1- Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q r ˆˆE r x∗∗∗1- 6 - x2 x1 m p2 e e e e e e e e e e e e e rE r x∗1 Efeito Substituic¸a˜o de Slutsky Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q rEˆ r x∗∗1- Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q Q r ˆˆE r x∗∗∗1- Leitura Recomendada • Varian, cap. 8 - “A equac¸a˜o de Slutsky”. • Nicholson e Snyder, cap. 5 “Income and Substitution Effects”. 11
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