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Teoria Unitária do Crime Eduardo Faustino Lima Sá Advogado e Sociólogo A Teoria Unitária do Crime parte da premissa de que o crime possui apenas o Tipo como elemento estruturante; assim, quando houver o Fato Típico haverá o crime. Para tanto considera que o Tipo possui como elementos característicos o Elemento Subjetivo (consistente na vontade final – contida no Título e Capítulo da parte especial do Código Penal; em regra, mas às vezes presente no próprio Artigo) e o Elemento Objetivo (consistente na conduta – contida no Artigo da parte especial do Código Penal); bastando, para verificar-se a presença ou não do crime, buscar-se a vontade final do autor (Elemento Subjetivo – por exemplo: atentar contra a vida de alguém) mais a conduta por este perpetrada (Elemento Objetivo do Tipo – por exemplo: matar alguém). A redação da lei penal criou diversos Elementos Subjetivos; dentre os quais alguns lícitos (contidos nas normas penais permissivas: artigo 23, Código Penal) e outros ilícitos (contidos nas normas penais incriminadoras: parte especial do Código Penal). Assim, o agente que mata alguém (Elemento Objetivo) para defender-se de agressão injusta atual (legítima defesa) não praticou crime porque não houve na sua vontade final o “animus” de atentar contra a vida (Elemento Subjetivo ilícito), mas sim um “animus” de defender-se/proteger-se (tal “animus” está contido em norma penal permissiva, sendo, portanto, lícito); assim, para o exemplo, tem-se o Elemento Objetivo (conduta – matar alguém), sem que haja o Elemento Subjetivo incriminador (dolo ou culpa). Veja-se, pois que se o fim contido na conduta do agente é o de proteger-se/defender-se, e o agente perpetra ação que pode culminar ceifando a vida de alguém, não se teria um Fato Típico, por inadequação de um Elemento Subjetivo incriminador ao Tipo Penal, pois que o fim, o de proteger-se, sobrepõe-se ao fim de atentar contra a vida de alguém. Daí a razão de ser das normas penais permissivas, que acabam por criar verdadeiros Elementos Subjetivos legais. A leitura do Fato Típico não pode localizar-se apenas na adequação da conduta a um Artigo contido na parte especial do Código Penal (fenômeno que, classicamente, é chamado de tipicidade); tal reducionismo eliminaria totalmente a compreensão de que o Artigo está contido em um Capítulo, que, por sua vez, está contido dentro de um Título. Assim, para ilustrar-se a questão com um exemplo, só haverá homicídio se o fim de um agente for o de atentar contra a vida (adequação ao Título I e Capítulo I, Código Penal) e perpetrar conduta útil a tal fim (desferir contra a vítima golpes de facão, por exemplo). Do contrário, caso o agente mate alguém por necessidade, para salvar bem jurídico próprio em situação para a qual não se exige outra forma de agir, não haverá crime, eis que lícito o Elemento Subjetivo (o de salvar-se; pois que não é fim do agente atentar contra a vida da vítima, mas sim, salvar-se. Veja-se que o atentar contra a vida pode servir como meio a um fim, o de salvar-se; estando tal fim protegido por norma penal permissiva). É comum, inclusive, a lei penal criar Elementos Subjetivos meios a outros Elementos Subjetivos fins; assim, no crime de latrocínio, cujo fim é o de atentar contra o patrimônio (Título II, Capítulo II, Código Penal) tem-se a morte do agente em decorrência da violência perpetrada para o roubo (conduta – matar alguém – art. 157, § 3º, “2ª parte”); veja-se, pois, que mesmo com a morte de alguém, não há homicídio, mas sim, latrocínio. Buscou-se o fim contido na subjetividade do agente (atentar contra o patrimônio), cujo meio é matar. A mesma compreensão está contida no Artigo 129, § 3º, Código Penal, para o qual a lesão corporal resulta em morte da vítima; veja-se que o matar alguém ocorreu, mas o agente não pretendeu tal fim, adequando-se sua conduta no Capítulo II do Título I, Código Penal. Do mesmo modo, um meio aparentemente ilícito pode estar contido em um fim lícito. Assim, a título de exemplo, o lutador de artes marciais (aquelas regulamentadas pela lei) apesar de lesionar, ou mesmo matar o adversário, não pratica crime; posto ter o fim de vencer a luta/combate, estando protegido, portanto, pelo exercício regular de um direito (Direito Desportivo); o que, por sua vez, tornaria a lesão ou morte, meio para o exercício regular de um direito. Outrossim, em qualquer mecanismo de interpretação sistemática da lei, não se pode perpetrar interpretação na qual um dispositivo de lei se choque frontalmente a outro dispositivo, ou seja, não se pode interpretar a lei de uma forma que as normas sejam contraditórias entre si. Assim, o que a lei penal trata como norma permissiva, torna lícita a conduta; enquanto a norma incriminadora a torna ilícita. Não se pode é dizer que primeiro a lei incrimina (antinormatividade), para que depois, através de juízo apertado e contraditório, se venha a desconsiderar-se a ilicitude da norma (antijuridicidade). Norma permissiva é norma legal; portanto em conformidade à lei. Norma incriminadora é norma ilegal; e em desconformidade com a lei. Assim, tal juízo interpretativo se aplica plenamente se a análise do Tipo levar em conta os passos preditos; deve-se ler a norma incriminadora na seguinte ordem: Título – Capítulo – Artigo. A leitura não conjecturada do Artigo induz compreensão torta e errada da lei penal, vez que o legislador dispôs o Artigo estando contido em um Capítulo, que, por sua vez, está contido em um Título. Portanto, a título de exemplo, matar alguém só será crime se houver dolo ou culpa no Elemento Subjetivo, se outro for o fim, ter-se-á conduta Atípica, posto ausência de Elemento Subjetivo ou posto presença de Elemento Subjetivo lícito, tais quais os de salvar-se, defender-se, agir conforme o direito, o cumprimento de dever legal etc. Não há, pois, conflito, nem mesmo o aparente, de normas; vez que a lei permissiva autoriza a conduta do agente, que, nesse caso, não precisa temer qualquer reprimenda da lei penal ou civil, pois agiu de forma lícita. Portanto, o crime está ligado diretamente ao Tipo. Assim, dizer que a conduta é Típica implica em considerar-se, intrinsecamente, a existência de uma antijuridicidade; para, do outro ponto, dizer que a conduta não é Típica, ou é Atípica, implica em admitir-se sua licitude e conformidade à lei permissiva. A antijuridicidade ou a legalidade estão contidas, portanto, no Elemento Subjetivo do agente. Se ilícito quanto unido a uma conduta, há crime; se lícito, mesmo unido a uma conduta contida em Artigo da parte especial do Código Penal, não há crime. Quanto à culpabilidade, por constituir-se em elemento acidental ao crime, externo a ele e não submetido a qualquer relação causal (não há nexo de causalidade entre o crime e a pena), tratamo-la como pressuposto exclusivo da aplicação da sanção penal. Não se pode definir um conceito ideal/material (o de crime) inserindo neste um conceito prático/processual (o de pena). A análise dos elementos do crime não está submetida à existência de um processo; enquanto a análise da pena está. É clara a definição da lei penal ao definir que não há crime sem lei anterior que o preveja (conceito ideal/material), e que não há pena sem prévia cominação legal (ou seja, sem a existência de um processo, conduzido por um juiz natural, e que culmine em sentença penal condenatória). Basta dizer que o fato de não descobrir-se um crime ocultado não implica em dizer que o crime não ocorreu, simplesmente por que não se aplicou a pena; mais ainda, a prescrição de um crime não retira dele sua ilicitude, mas impede a persecução penal. O absurdo é incluir-se no crime a pena, condicionando-se a sua existência (do crime)a aplicação desta (a pena). Assim, a título de exemplo, o crime contido no Artigo 122, Código Penal (Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio), se pratica sem que seja necessário um resultado (pressuposto apenas da pena); de modo que não é lícito a ninguém induzir, instigar ou auxiliar pessoas a prática do suicídio. A lei penal proibiu tal desígnio. Do contrário, absurdamente não se admitiria legitima defesa de terceiro em favor da vítima para tal crime, posto haver verdadeira licitude na conduta, que ainda não provocou o resultado morte ou lesão corporal grave. Tal ideia, portanto, a de que a culpabilidade é elemento do crime, deve ser sistematicamente afastada e repudiada, como forma de analisar-se o crime apenas com os elementos essenciais a ele, afastando-se aqueles que não o compõem. Não se pode definir um homem pela indumentária que ele traja; esta não constitui elemento essencial a ele, posto ser acidental a ele; entretanto, para o observador desatento, todos os homens, por usarem roupa, contêm na sua fisiologia uma indumentária. Mero engano de um observador desatento. Ademais, uma série de implicações práticas deriva da inclusão da pena no crime; tais qual a assertiva de que o menor ou o insano mental não praticam crime. Tal concepção, em relação ao menor, atentaria frontalmente o disposto no Artigo 103, Estatuto da Criança e do Adolescente, que dispõe haver ato infracional quando o menor praticar crime ou contravenção penal. Portanto o próprio legislador tratou de dispor, em norma explicativa, que o menor pratica o crime; apenas não é apenado, mas, educado. O mesmo ocorre com o insano mental; este só será objeto de medida de segurança se tiver praticado o crime. Entender-se de outra forma seria admitir a prisão de um verdadeiro inocente, já que nada de ilícito haveria na sua conduta. Assim, para a Teoria Unitária do crime o Fato Típico é aquele que contém um Elemento Subjetivo (dolo ou culpa) e um Elemento Objetivo (conduta prevista em Artigo da parte especial do Código Penal). Verificando-se a presença de ambos, há o crime. Do contrário, se um está ausente, não há crime. Para sedimentarmos os exemplos, tomemos a conduta de alguém que faz circular, e é surpreendido e preso em flagrante, moeda falsa, sem o prévio conhecimento da falsidade desta; pratica-se a conduta (restituir à circulação moeda falsa), mas não se pratica o crime, por completa ausência de elemento subjetivo (para o caso: o dolo). É, portanto, Atípica tal conduta. Ou seja, a ausência de uma vontade especial (a de atentar contra o Título X, Capítulo I, Artigo 289, § 2º, Código Penal) retira um dos elementos estruturantes do crime, não havendo falar-se em ocorrência de crime. A ideia supra postulada, portanto, parece coadunar a interpretação da lei penal permissiva e das leis não penais permissivas (que criam direitos ou impõem deveres) a parâmetros juridicamente seguros, ou com segurança jurídica, vez que não há antinormatividade ou antijuridicidade em conduta, qualquer que seja ela; mas sim no fim especial do agente (Elemento Subjetivo), que consiste no fim último de atentar contra o bem juridicamente tutelado; inserido no Título e Capítulo da parte especial do Código Penal.
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