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FD Aristóteles

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ARISTÓTELES (Capítulo 4)
	O desenvolvimento do tema justiça vem definido em sua teoria como saber prático. Aristóteles tratou a justiça entendendo-a como uma virtude, assemelhada a coragem, temperança, benevolência... A justiça, assim definida como virtude, torna-se o foco das atenções de um ramo do conhecimento humano que se dedica ao estudo do próprio comportamento humano; à ciência prática, intitulada ética, cumpre investigar o que é o justo e o injusto, o que é ser temerário e o que é ser corajoso... Dentro da filosofia aristotélica é que se encontra referência à tripartição das ciências em práticas, poéticas(ou produtivas) e teoréticas(teóricas). De acordo com essa divisão, dos conhecimentos humanos científicos, a investigação ética não se destina à especulação (ciência teórica) ou à produção (ciência produtiva), mas à pratica; o conhecimento ético, o conhecimento do justo e do injusto é uma primeira premissa para que a ação converta-se em uma ação justa ou conforme a justiça. A investigação política, a mais importante das ciências práticas tem por tarefa a de traçar as normas suficientes e adequadas para orientar as atividades da pólis e dos sujeitos que a compõem, para a realização palpável do Bem Comum. E esta ciência preocupa-se com os desdobramentos individuais sociais dos comportamentos humanos. Nesse sentido pode-se dizer, os conceitos éticos e políticos aparecem condicionados um pelo outro. O Bem que a todos alcança afeta o bem de cada indivíduo, assim como o bem de cada indivíduo acaba convertendo-se no Bem de toda a comunidade. A verdade conceptual apreende-se por meio do raciocínio indutivo que é a observação do homem em sua natural instância de convívio, a sociedade, que consente a formulação de juízos éticos; dessa experiência se extrai as noções do justo e do injusto. O estudo ético está marcado por definir sem constranger com conceitos, pois fica sempre aberta uma margem de variabilidade que torna o principio da ética flexível de indivíduo a indivíduo. Em outras palavras, os princípios éticos nao se aplicam a todos de forma única (a coragem não é a mesma para todos, a justiça não é a mesma para todos...).
	Toda virtude (um justo meio) se encontra numa posição mediana, em meio a dois extremos (dois vícios), um primeiro extremo por excesso e um segundo extremo por carência. Somente a educação ética, ou seja, a criação do hábito do comportamento ético poderia construir o comportamento virtuoso. Ética significa hábito em grego. Ser justo é praticar reiteradamente atos voluntários de justiça. A justiça é uma virtude. Contudo, diferentemente das demais virtudes, trata-se de uma virtude à qual não se opõem dois vícios diferentes, mas um único vício: que é a injustiça (seja o injusto por carência, seja o injusto por excesso). Portanto, não são dois vícios que se contrapõem por um meio termo, como ocorre com as outras virtudes, mas se trata de uma posição mediana entre o possuir mais e o possuir menos. A atividade do injusto é um vício mas sofrer uma injustiça não é uma situação viciosa. O justo meio na relação entre dois polos é a equilibrada situação dos envolvidos numa posição mediana, ou seja de igualdade. Esse equilíbrio reside no fato de ambos compartilharem de um médium, não se invadindo o campo do que é devido ao outro. Para Aristóteles, o caminho da felicidade é a prática ética. A virtude não é uma faculdade, em uma paixão inerente ao homem, encontra-se no próprio homem apenas a capacidade de discernir entre o justo e o injusto, e de optar pela realização de ações conformes a um ou a outro. A virtude, assim como o vício, adquire-se pelo hábito.
Ao vocábulo justiça podem-se atribuir muitos sentidos. 1) A justiça total consiste na virtude de observância da lei, no respeito àquilo que é legítimo e que vige para o bem da comunidade. A lei é uma prescrição de caráter genérico e que a todos vincula e seu fim é a realização do Bem Comum. A ação vinculada a lei corresponde a um justo legal e consequentemente à justiça legal. Aquele que observa os conteúdos legais pode ser chamado de justo. A justiça total também é chamada de justiça universal ou integral e tal se deve ao fato de a abrangência de sua aplicação ser a mais extensa possível (as leis valem para o Bem de todos). Pode-se entende-la como sendo a virtude completa ou perfeita em relação ao semelhante (nenhum prejuízo a outrem se efetuará pelo homem que pratica atos de justiça). Aquele que contraria as leis contraria a todos que são por elas protegidos e beneficiados; aquele que as acata, serve a todos que por elas são protegidos ou beneficiados. O hábito humano de conformar as ações ao conteúdo da lei é a própria realização da justiça total. Um homem é justo ao agir na legalidade e é virtuoso quando por disposição de caráter, orienta-se segundo esses mesmos vetores, mesmo sem a necessária presença da lei ou conhecimento da mesma. Por ser a mais completa das virtudes, é esta a forma de justiça mais difícil de ser exigida e também, justamente por isso, a mais excelente de todas. É a justiça que envolve o todo, ou seja, a legislação e toda a comunidade por ela protegida. 2) A justiça particular corresponde a uma parte da virtude e refere-se ao outro singularmente no relacionamento direto entre as partes. É a justiça na relação entre particulares. O justo particular é, de certa forma, espécie do gênero justo total, pois quem comete um injusto particular não deixa de violar a lei, e como tal, praticar um injusto. O justo particular admite divisões: a) O justo distributivo relaciona-se com todo tipo de distribuição levada a efeito no Estado (dinheiro, honras, cargos, ou qualquer outro bem passível de ser participado aos governados). Em suma, refere-se à repartição igualitária dos bens entre todos os cidadãos, sem distinção. A distribuição atingirá seu justo objetivo se proporcionar a cada qual aquilo que lhe é devido, dentro de uma razão de proporcionalidade participativa na sociedade (meritocracia). Assim não haveria o excesso e a falta. Pressupõe-se aqui um (ou vários) exercente(s) do poder de distribuir e outro(s) apto(s) a receber(em). b) O justo corretivo (ou signalagmático) consiste no estabelecimento e aplicação de um juízo corretivo nas transações entre indivíduos . Trata-se de uma justiça apta a produzir a reparação nas relações. Vincula-se a ideia de igualdade perfeita ou absoluta; aqui nao se está a observar o mérito dos indivíduos, a condição dos mesmos para a averiguação do que é justo ou é injusto. Essa justiça corretiva pode ser comutativa que abrange as relações e trocas baseadas na voluntariedade do vínculo entre pessoas. O justo comutativo conduz à noção de reciprocidade proporcional das trocas dentro da complexa malha social. São essas relações a compra e venda, locação, garantia, depósito, pagamento, etc. Essa justiça corretiva também pode ser judicial ou reparativa que abrange as relações involuntárias, que surgem como consequência de uma clandestinidade ou de uma violência, que atingem a uma ou a ambas as partes. São elas o roubo, o adultério, o homicídio, o sequestro, o furto, a difamação, a lesão física, injúria, etc. O sujeito ativo de uma injustiça recebe o respectivo sancionamento por ter agido como causador de um dano indevidamente provocado a outrem, assim como o sujeito passivo da injustiça vê-se ressarcido pela concessão de uma reparação ou compensação a posteriori com relação ao prejuízo que sofreu. A injustiça é, em qualquer desses casos, desigualdade aritmética, cabendo ao juiz num exercício racional de apreciação do caso particular, igualar novamente as partes aplicando ao causador de uma lesão a pena que corresponde ao delito por este cometido. Esse justo judicial se divide em controvérsias civis (relações voluntárias) e na própria justiça penal (relações involuntárias). 
A justiça aqui é entendida como sendo uma virtude e, portanto, trata-se de uma aptidão ética humana que apela para a razão pratica, ou seja, para a capacidade humana de eleger comportamentos para a realização de fins. A ciênciapratica que discerne o justo e o injusto. Se por natureza, o homem é um ser político e racional, então o homem exerce essa sua racionalidade no convívio social. Para Aristóteles, a pólis é uma comunidade humana soberana e autossuficiente, autárquica, com vistas ao melhor e não simplesmente à satisfação das necessidades básicas de subsistência, Tende, esta comunidade assim organizada, ao bem, à realização da felicidade, ao que corresponda a um benefício para todos, sobretudo, acessível a todos. Se se trata de uma virtude, que se exerce em função da racionalidade (razão prática), então o homem é capaz de deliberar e de escolher o melhor para si e para o outro. A justiça participa da razão pratica, pois trata-se mais de algo que se pratica e do qual se extrai um resultado ativo; trata-se menos de algo que se pensa. O campo da justiça é o da ponderação entre dois extremos. Com o apelo ao virtuosismo, reclama-se maior espaço para a atuação da prudência e dos demais atributos da racionalidade humana. 
A justiça não se realiza sem a plena aderência da vontade do praticante do ato justo a sua conduta. Aquele que pratica atos justos não necessariamente é um homem justo; pode ser um bom cidadão. O bom cidadão, desaparecida a sociedade, nada carregaria consigo se não a consciência livre de ter cumprido seu dever social. O homem bom é ao contrario, por si mesmo, independentemente da sociedade, completo em sua interioridade; a justiça lhe é uma virtude vivida por meio da ação voluntária. A justiça requer o juízo de proporcionalidade ou seja, equidade, que seria o julgamento justo, imparcialidade, senso de justiça. A justiça também será exercida nas relações domesticas (justo para com a mulher, justo para com os filhos, justo para com os escravos) ou políticas (legal e natural). Cumpre o juiz debruçar-se na equanimização de diferenças surgidas da desigualdade; é ele quem representa a justiça personificada.

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