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AMERICANISMO E FORDISMO Antonio Gramsci [Americanismo e Fordismo.] A tendência de Leone Davidoci (i.e. Trotsky) estava ligada a esse problema. O seu conteúdo essencial era dado pela « vontade » de conferir supremacia à indústria e aos métodos industriais, acelerar com meios coercitivos a disciplina e a ordem na produção, adequar os costumes às necessidades do trabalho. Teria desembocado necessariamente em uma forma de bonapartismo, por isso foi necessário despedaçá-la inexoravelmente. As suas soluções práticas eram erradas, mas as suas preocupações eram corretas. Nesse desequilíbrio entre prática e teoria, encontrava-se ínsito o perigo. Isso já se havia manifestado precedentemente, em 1921. O princípio da coerção no mundo do trabalho era correto (discurso relatado no volume sobre o Terrorismo e pronunciado contra Martov), mas a forma que havia assumido era errada : o « modelo » militar havia-se tornado um preconceito funesto, os exércitos de trabalho faliram. O interesse de Leone Davidoci (i.e. Trotsky) pelo americanismo. Seu interesse, seus artigos, suas investigações sobre a « byt (i.e. a vida, o modo de vida) » e sua literatura : essas atividades eram menos desconexas entre si do que então poderia parecer. O novo método de trabalho e o modo de viver são indissolúveis: sucessos não podem ser obtidos em um campo, sem obter resultados tangíveis no outro. Na América, a racionalização e o proibicionismo estão indubitavelmente conexos : as pesquisas dos industriais sobre a vida privada dos operários, o serviço de inspeção, criado por alguns industriais, para controlar a « moralidade » dos operários constituem necessidade do novo método de trabalho. Quem risse dessas iniciativas e nelas visse apenas uma manifestação hipócrita de « puritanismo », rejeitaria toda a possibilidade de compreender a importância, o significado e a dimensão objetiva do fenômeno americano que é também o maior esforço coletivo, existente, até agora, para criar, com uma rapidez inaudita e com uma consciência acerca do fim jamais vista na história, um novo tipo de trabalhor e de homem. A expressão «consciência acerca do fim » pode parecer, pelo menos, exagerada, para as almas benévola que recordam a frase de Taylor sobre o « gorila amestrado » Taylor exprime, com cinismo e sem vaga referência, o fim da sociedade americana : desenvolver ao máximo no homem trabalhador a parte maquinal, despedaçar o velho nexo psico-físico do trabalho profissional qualificado que exigia uma certa partecipação da inteligência, da iniciativa, da fantasia do trabalhador, para reduzir as operações de produção ao aspecto físico apenas. Mas, na realidade, não se trata de uma coisa nova. Trata-se da fase mais recente de um processo que se iniciou com o nascimento do próprio industrialismo : essa fase mais recente é mais intensa do que a precedente e manifesta-se em uma forma mais brutal, porém também essa será superada e um novo nexo psico-físico será criado, de tipo diverso dos precedentes e, indubitavelmente, de tipo superior. Existirá, sem dúvida, uma seleção forçada e uma parte da velha classe trabalhadora há de ser implacavelmente eliminada do mundo da produção e do mundo todo, sem maiores explicações. Desde esse ponto de vista, é que cabe entrever as iniciativas « puritanas » dos industriais americanos de tipo Ford.(...) Notas: Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Quaderni del Carcere, Nr. 4 (Cadernos do Cárcere, Nr. 4)(1930 - 1932) – Americanismo e Fordismo, in : Antonio Gramsci. Quaderni del Carcere (Cadernos do Cárcere), Vol. 1, ed. V. Gerratana, Torino : Einaudi Editore, 1975, p. 489. Gramsci refere-se, aqui, de modo inteiramente solerte à seguinte obra de TROTSKY, LÉON DAVIDOVITCH BRONSTEIN. Terrorizm i Kommunism (Terrorismo e Comunismo) especialmente Cap. 8 : Voprocy Organizatsii Truda (Questões de Organização do Trabalho), 1920, Leningrad : Gosud. Izd-vo, pp. 3 e s. Seus argumentos procuram justificar para o stalinismo a “necessidade inexorável de despedaçar”, após a morte de Lenin, a tendência de Trotsky, a qual, segundo Gramsci, “teria desembocado necessariamente em uma forma de bonapartismo”. Precisamente o capítulo 8 da obra de Trotsky em realce reproduz seu discurso, pronunciado no III Congresso dos Sindicatos da Rússia, em que Trotsky, defendendo a militarização do trabalho, naquelas condições histórico-políticas específicas, polemiza não contra o menchevique Martov, senão contra menchevique Abramovitch. A respeito da temática vertente, vide, em particular, além do livro expressamente retro-indicado, também TROTSKY, LÉON DAVIDOVITCH BRONSTEIN. Literatura i Revoliutsia. Petchataietsa po Izdaniu 1923 g. (Literatura e Revolução. Publicação Impressa Segundo a Edição de 1923), Moscou : Izd. Polititcheskoi Literatury, 1991, pp. 30 e s. Cumpre frisar que, nessa mesma obra de Trotsky, vinda à luz pela primeira vez em 1923, encontra-se publicado, em anexo, em língua russa, o seguinte material de autoria de Gramsci : Pis’mo t. Gramshi ob Ital’ianskom Futurizmie (Carta do Companheiro Gramsci sobre o Futurismo Italiano)(08.09.1922), 127 e s. Destaque-se que referida carta sobre o futurismo italiano foi, naquele então, elaborada por Gramsci com base em pedido expressamente formulado por Trotsky, por ocasião da presença de Gramsci na cidade de Moscou, no curso de 1922. No que respeita às investigações e aos artigos de Trotsky sobre a « byt (a vida, i.e. o modo de vida)», vide também IDEM. Problemy Kul’tury. Kul’tura Perekhodnovo Perioda, in : Sotchinienie (Obras de Trotsky), Vol. 21, Moscou-Leningrado, 1927, pp. 7 e s. Julgo conveniente assinalar que a autoria da expressão « gorila amestrado » foi atribuída, pela primeira vez, por André Philip a Frederick Winslow Taylor, o « pai da administração científico-empresarial », segundo os pregoeiros das supostas virtudes do capitalismo imperialista. Em seu estudo, intitulado “O Problema Operário nos Estados Unidos”, André Philip referiu-se ao conceito tayloriano em destaque com as seguintes palavras : “O trabalhador encontra-se, assim, absorvido em uma engrenagem mecânica à qual deve submeter-se, sem tentar compreendê-la. Isso conduz à degradação da função operária na vida industrial do país, à diminuição da personalidade que poderia tornar-se de extrema gravidade. Taylor não chegou ao ponto de dizer que, em breve, um gorila amestrado poderia executar o trabalho, atualmente realizado por um trabalhador?.” Cf. PHILIP, ANDRE. Le Problème Ouvrier aux Etats-Unis, Paris : Librairie Félix Alcan, 1927, p. 124. A expressão « gorila amestrado » de Taylor foi referida, a seguir, na Itália, em uma recensão do livro de André Philip em foco, publicada in : “Nuova Rivista Storica”, Janeiro-fevereiro de 1929, 13° Ano, Fasc. 1.
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