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Violência Doméstica

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INTRODUÇÃO
O estudo a ser exposto tem como objetivo analisar o avanço da violência sexual intrafamiliar na infância e as marcas do silêncio deixadas pela prática do abusador e na maioria das vezes a omissão de seus familiares, de forma delimitada abordando os aspectos gerais e jurídicos que envolvem o assunto.
A violência sexual intrafamiliar na infância, não é, infelizmente, um problema dos nossos dias, assim como não é um problema especialmente nacional. Muito pelo contrário, a sua prática atravessa os tempos, e o fenômeno tem características muito semelhantes em países cultural e geograficamente distintos, mais e menos desenvolvidos.
A violência sexual intrafamiliar tornou-se tema bastante comentado nos últimos anos. Isso se deve a indignação da sociedade com os crescentes números de episódios envolvendo a prática da violência em menores em seu seio familiar. Violência essa que é muito abstrusa de se descobrir, uma vez que o perigo está dentro do ambiente familiar, e na maioria das vezes não deixam vestígios dificultando assim a constatação do crime e a punição do culpado. Estas circunstâncias fazem com que este seja um problema especialmente complexo, com facetas que entram na intimidade das famílias e das pessoas (agravado por não ter, regra geral, testemunhas, e ser exercida em espaços privados). Abordá-lo é delicado, combatê-lo é muito difícil. É verdade, no entanto, que mercê do grande interesse que as principais organizações internacionais têm dedicado a este tema nas últimas décadas, temos atualmente a consciência mais desperta para conhecer o problema e, conseqüentemente, para enfrentá-lo.
Assim a presente pesquisa visa analisar como o sistema judiciário esta atuando no que se refere ao crime de violência sexual intrafamiliar na infância, uma vez que se trata de um crime de difícil comprovação pela baixa efetividade dos meios probatórios.
O objetivo deste estudo é conceituação da violência sexual intrafamiliar na infância e a exposição dos motivos que levam a maioria desses fatos ficarem impunes, e quando denunciados quais as dificuldades encontradas pelo judiciário para a produção de provas, processo de revitimização e a condenação do acusado.
Este trabalho visa sanar todas as dúvidas pertinentes ao tema através de pesquisas realizadas abordando os aspectos jurídicos e sociais, sempre embasadas em literatura existente.
Pretende-se dimensionar a importância que deve ser dado ao assunto uma vez que as conseqüências de uma violência sexual praticada na infância podem ser físicas, psicológicas, ou de comportamento, todas igualmente prejudiciais para quem sofre a violência.
1 RETROSPECTIVA HISTÓRICA 
1.1 Conceituando violência 
A violência doméstica é espécie do gênero violência, portanto, faz-se necessário obter o conceito desta antes daquela.
O termo violência vem do latim violentia, que significa caráter violento ou bravio. Esta expressão, por sua vez, é oriunda de vis, ou seja, a força em ação ou o caráter essencial de uma coisa, a força vital. É também agir sobre alguém ou fazê-lo agir contra sua vontade, obrigando-o a algo.
Violência Doméstica → Violência Doméstica ou intrafamiliar é aquela explícita ou velada, praticada dentro do lar, no âmbito familiar, entre indivíduos que possuam parentesco civil (marido, mulher, sogra, padrasto) ou parentesco natural (mãe, pai, irmão, filhos, etc.), ambos podendo existir na forma de linha reta, por afinidade ou por vontade expressa (como na adoção).
Consiste em atos que exprimem a vontade do homem em fazer mal a seus familiares, agindo com brutalidade e/ou agressividade, e causando-lhes lesões e traumatismos mais ou menos graves, não necessariamente sendo estes danos, físicos.
Pode ocorrer contra diversos familiares, entre eles:
crianças/adolescentes, mulher/homem e até mesmo idosos. E pode se manifestar sobre diversos aspectos, tais como: violência sexual, psicológica, sócio-econômica, privação, abandono e super-proteção.
1.2 Conceituando Abuso Sexual
O abuso sexual ocorre quando existe um jogo, ou até mesmo o ato sexual, entre pessoas de sexo diferente, (ou do mesmo sexo), em que o agente abusador já tem experiência, e  visa sua satisfação sexual.
Estas práticas geralmente são impostas às crianças ou adolescentes, através de violência física, ameaças, ou em alguns casos, induzindo-as, convencendo-as.
No abuso sexual, a criança é despertada para o sexo precocemente, de maneira deturpada, traumática, ficando com marcas para o resto da vida, podendo desenvolver comportamentos patológicos como aversão a parceiros do mesmo sexo do abusador ou, por outra, promiscuidade e uma sexualidade descontrolada, entre outros. 
A criança ao ser abusada sexualmente é desrespeitada como pessoa humana, tem seus Direitos violados, e o pior: na maioria das vezes, dentro de seu próprio lar, por quem tem a obrigação de protegê-la.
As marcas, as conseqüências do abuso sexual podem ser físicas ou psicológicas. Geralmente ficam as duas.
O abuso sexual pode se dá de várias formas, e com ou sem contato físico.
O abusador geralmente ao praticar o abuso sexual toca fisicamente a vítima, mas pode haver abuso sexual sem o toque físico.
O abusador pode tocar a vítima sob forma de carícias, tanto como um beijo, ou  alisadas, seja nos seios ou em outras partes do corpo (inclusive os órgãos sexuais), às vezes chegando a manter relações sexuais: tanto vaginal quanto anal. Há muitos casos de gravidez decorrente de abuso sexual. 
O sexo oral é uma forma de sexo muito utilizada pelos abusadores, e   transmite doenças sexualmente transmissíveis da mesma forma que o sexo vaginal e anal, o que significa também risco de contaminação pelo vírus da AIDS. 
 Já no abuso sexual sem contato físico, alguns abusadores se limitam a olhar suas vítimas trocarem de roupa, tomar banho, etc.  É o "voyeur".
Há o tipo de abusador que expõe os órgãos sexuais para suas vítimas. Este tipo tanto acontece na rua, como em casa. É o "exibicionista". 
Alguns abusadores vêem fitas e revistas pornográficas com suas vítimas, alegando que precisam "ensiná-las”, despertando sua sexualidade de uma forma precoce e  deturpada. Às vezes, nestes casos, o abusador chega a manter contatos mais íntimos, sob a desculpa que "está apenas ensinando", à vítima. 
Acontece ainda com freqüência, que o abusador "paga" à criança em dinheiro ou em doces, dá presentinhos, para que ela permita que ele a toque intimamente, abuse de seu corpo de diversas formas. Esta forma é mais utilizada nas comunidades de baixa renda.
Os adultos abusadores na maioria das vezes são parentes de sangue da criança ou adolescentes: (pai, irmãos, avós, tios, etc.) ou parentes  por afinidade: (padrasto, esposo da tia, etc.) ou são simplesmente  responsáveis pelos mesmos: (tutor, padrinho, etc.).
1.3 O Tratamento dispensado a criança ao longo da história 
A humanidade tem dispensado à criança tratamento legislativo que se coaduna com a compreensão do significado da infância presente em cada momento histórico. Já em seus primórdios, os homens praticavam várias formas de violência à criança, “desde os egípcios e mesopotâneos, passando pelos romanos e gregos, até os povos medievais e europeus, não se considerava a infância como merecedora de proteção especial” (ANDRADE, 2000, p. 02), muitas vezes contando com o beneplácito da própria legislação e da cultura dominante. A proteção aos infantes inicia-se na época Brasil Colônia, e tinha como alvo somente os menores abandonados. A política de assistência social era exercida exclusivamente pela igreja. 
Ao tempo do Código de Hamurábi (1700 a.C-1600 a.C), no Oriente Médio, ao filho que batesse no pai havia a previsão de cortar a mão, uma vez que a mão era considerada o objeto do mal. Também o filho adotivo que ousasse dizer ao pai ou à mãe adotivos que eles não eram seus pais, cortava-se a língua; ao filho adotivo que aspirasse voltar à casa paterna, afastando-se dos pais adotivos,extraíam-se os olhos. Em Roma (449 a. C), a Lei das XII Tábuas permitia ao pai matar o filho que nascesse disforme mediante o julgamento de cinco vizinhos (Tábua Quarta, nº 1), sendo que o pai tinha sobre os filhos nascidos de casamento legítimo o direito de vida e de morte e o poder de vendê-los (Tábua Quarta, nº 2). Na Grécia antiga, as crianças que nascessem com deficiência eram eliminadas nos Rochedos de Taigeto. Em Roma e na Grécia a mulher e os filhos não possuíam qualquer direito. O pai, o Chefe de Família, podia castigá-los, condená-los à prisão e até excluí-los da família. 
É no final do século XVIII que a infância começa a ser vista como uma fase distinta da vida adulta. Até então, as escolas eram freqüentadas por crianças, adolescentes e adultos. Com o surgimento do entendimento de que a infância é uma fase distinta da vida adulta, os castigos, a punição física, os espancamentos através de chicotes, paus e ferros passam a ser utilizados como instrumentos necessários à educação. Na Inglaterra, em 1780, as crianças podiam ser condenadas à pena de enforcamento por mais de duzentos tipos penais. Em 1871, é fundada em Nova York a Sociedade para a Prevenção da Crueldade contra as Crianças, a partir do caso da menina Mary Ellen. Mary Ellen era uma menina órfã de mãe, abandonada pelo pai, que sofreu severos maus-tratos na família substituta. O fato causou profunda indignação na comunidade da época que percebeu não haver um local próprio destinado a receber este tipo de denúncia. Em razão disto, o caso da menina Mary Ellen foi denunciada na Sociedade para a Prevenção da Crueldade contra os Animais. Necessitou ser equiparada ao animal para que seu caso pudesse ser examinado pelo Tribunal da época. Pouco tempo depois, na Inglaterra, é fundada uma sociedade semelhante, voltada à proteção da criança. 
No Brasil, a situação da criança não foi diferente. Contam os historiadores que as primeiras embarcações que Portugal lançou ao mar, mesmo antes do descobrimento, foram povoadas com as crianças órfãs do rei. Nas embarcações vinham apenas homens e as crianças recebiam a incumbência de prestar serviços na viagem, que era longa e trabalhosa, além de se submeter aos abusos sexuais praticados pelos marujos rudes e violentos. Em caso de tempestade, era a primeira carga a ser lançada ao mar. 
O Direito positivo referente aos menores inicia-se somente em 1921 com a Lei 4.242 de 05 de janeiro. Esta lei referia-se ao orçamento da República para aquele ano, a chamada Lei Orçamentária, mas, além de fixar a receita e a despesa, continha um artigo que autorizava o Poder Executivo a organizar a assistência e a proteção à infância abandonada e delinqüente.
Logo após em 1926 o Congresso concedeu ao Poder Executivo uma autorização para consolidar as leis sobre menores, sob a denominação de Código. No dia 12 de outubro de 1927, o Decreto 17.943-A consolidou as leis relativas a menores, instituindo o Código de Menores.
Entre os princípios mais significativos do Código de Menores destaca-se a instituição de um juízo privativo de menores e a instituição da responsabilidade penal apenas para os maiores de 14 anos.
E importante salientar que o Código só reproduzia ainda como modelo de criança e adolescente o menor abandonado e delinqüente.
Seguiu-se ao Código de 1927, inúmeros e significativos diplomas legais vinculados à proteção da infância e adolescência. Dentre ele um dos mais importantes estava o novo Código Penal de 1940, que fixava a responsabilidade penal a partir dos 18 anos. Através do decreto 6.026/1943 alterou-se também o Código de Menores, passando de 14 para 18 anos a responsabilidade penal, harmonizando assim os dispositivos vigentes.
O Código de Menores de 1927 ficou vigente até ser promulgada em 10 de outubro de 1979 a lei de nº 6697, que revogava o Código anterior e preceituava o conceito de infantes como aquele que estivesse em situação irregular, e dispunha que o Juiz de Menores estava autorizado a aplicar as medidas cabíveis se o menor de 18 anos estivesse classificado em situação irregular. O Código de Menores de 1979 era em taxativo que considera apenas em situação irregular o menor que se encontrava na situação do art. 2º do Código no qual preceituava:
Art. 2º - Para efeitos deste código, considera-se em situação irregular o menor:
I - Privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente em razão de:
a) falta, ação ou omissão dos pais e responsável;
b) manifesta impossibilidade os pais ou responsáveis provê-las;
 II - Vítimas de maus-tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável;
III - Em perigo moral, devido a:
a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes;
b) exploração em atividades contraria aos bons costumes;
IV - Privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável;
V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária; 
VI - Autor de infração penal. (BRASIL, 1979 p. 01)
As situações mencionadas no art. 2º eram exaustivas, isto é, quaisquer casos diferentes dos descritos não seriam de competência do Juiz de Menores e também não seriam do Direito dos menores.
Passado alguns anos o Brasil começa a seguir a tendência mundial de proteção ao menor, na década de 80 o país passava por um processo de redemocratização política e a sociedade buscava efetivação dos seus direitos e garantias fundamentais com base no humanismo. Até o advento da Constituição Federal de 1988, a criança não era considerada sujeito de direitos, pessoa em peculiar fase de desenvolvimento e tampouco prioridade absoluta. Da necessidade de um novo ordenamento Jurídico, foi promulgada em 1988 a nova Constituição Federal, fato importante para evolução e concepção dos direitos das crianças e adolescentes. Pois, a Carta Magna não fazia mais distinção de criança e adolescente todos eram iguais perante a lei. E ainda proporcionava em seu artigo 227 o direito da criança e adolescente à proteção integral com a inclusão de todos os direitos fundamentais da pessoa humana, além de prioridade absoluta na execução e cumprimento desses direitos.
Com o direito dos infantes assegurados pela Carta Magna brasileira, um novo cenário foi descortinado, embasado na condição de pessoa em desenvolvimento e com prioridade absoluta. A nova Ordem Constitucional impõe a atuação do Estado de forma não só reparativa, mas também de forma preventiva de maneira a garantir condições para que os todos os infantes usufruam de todos seus direitos através de políticas públicas.
Com essa nova mudança se fez necessária a elaboração de uma norma que regula-se a execução dessa nova Ordem Constitucional, sendo criada a lei 8069 de 13 de julho de 1990, denominada Estatuto da Criança e do Adolescente. 
O novo ordenamento jurídico vigente até a presente data visa o interesse superior da criança e adolescente assegurando-lhes direito em todos os âmbitos sociais. 
2 ESPÉCIES DE VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR 
2.1 Violência Física 
A violência física consiste em qualquer ato agressivo que o objetive causar dor a alguém, desde o mais simples gesto buscando apenas a repreensão, até os mais graves, buscando lesões corporais ou mesmo o espancamento fatal.
O agressor, que se utiliza desta prática geralmente possui uma relação de sujeito-objeto com a vítima, ou seja, vêem nesta uma pessoa causadora de problema por suas necessidades não satisfeitas.
O pai que bate no filho pode idealizar uma criança de tal forma que não corresponde a seu filho, e tudo pode representar um motivo para sua rejeição.
Alguns estudos comprovam que a pessoa que é violenta com seu filho já sofreu violência no passado, em sua própria infância. Isso porque a marca da dor fica gravada tão profundamente na vítima que não é esquecida, criando assim um ciclo de violência. Resumindo, o pai que hoje agride seu filho pode ter sido agredidono passado; e este filho poderá agredir ao seu no futuro.
A violência física contra cônjuges pode ser resultado de frustrações com a união; comportamento “desobediente” da vítima; ciúmes; ou mesmo ser mera causa de caráter agressivo do espancador.
A grande maioria dos agressores possui baixo nível de desenvolvimento intelectual, fato que pode resultar em uma difícil assimilação de regras comportamentais, morais e principalmente, normas jurídicas.
Muitas vezes o abuso da violência física não é motivado somente pelo intuito de o agressor querer repreender ou punir sua vítima, mas pode ser resultado de sua própria personalidade violenta ou alívio de tensões oriundas de suas frustrações. A agressão então pode funcionar como uma válvula de escape.
2.2 Violência Sexual
É atualmente, a forma que mais causa revolta na sociedade em geral, pois o incesto é a forma mais extrema de abuso sexual, e também porque o ato sexual forçado pode causar tanto lesões físicas como psicológicas à vítima.
O abuso sexual, que é o ato pelo qual se obriga alguém a praticar atos libidinosos de diversas naturezas, podendo ser homossexual ou heterossexual. 
Pode variar desde abusos sem contato sexual (exibicionismo, produção de material pornográfico, indução à prostituição, etc.), até atos sem penetração (sexo oral) ou com penetração (digital, com objetos, introdução genital ou anal).
A vítima pode ser qualquer pessoa do seio familiar, sendo mais comum com crianças/adolescentes (filhos, enteados) ou cônjuges (marido, mulher). Ela pode ser estimulada sexualmente ou servir de estímulo sexual para o agressor.
O abuso sexual infantil geralmente é caracterizado pelo fato de o agressor estar em estágio de desenvolvimento psicossocial mais avançado do que a criança ou adolescente. O agressor se impõe de diversas maneiras, como uso da força, métodos de persuasão/indução, ou ameaça. Isto, pois o adulto, independentemente do sexo, detém o poder sobre a criança, estabelecendo-se assim, uma relação de dominação-exploração.
O abuso contra cônjuges geralmente está relacionado a problemas no casamento/união, podendo se dá pela recusa do parceiro ao ato sexual, ou quando o agressor possui distúrbios psicológicos, tais como a insaciedade sexual.
A violência sexual está inserida na modalidade da violência física.
2.3 Violência Psicológica
Também chamada de Agressão Emocional, se caracteriza por não deixar marcas no corpo, mas sim por deixar marcas emocionais tão profundas que muitas vezes podem ser até mais prejudiciais que as físicas.
O agressor pode agir de diversas formas, entre elas: depreciando, humilhando, punindo exageradamente, desrespeitando, rejeitando, etc.
A mera ameaça a agressões físicas ou danos a objetos e bens pessoais também pode caracterizar a violência psicológica. Ainda existe e Violência Verbal, na qual o agressor desfere palavras depreciativas, muitas vezes vulgares e jocosas, e ainda na presença de outros dentro do lar ou até mesmo na frente de terceiros estranhos.
Entre cônjuges, o parceiro faz o outro se sentir inferior, dependente e culpado, tratando-o como se fosse incompetente, ridicularizando-o. Muitas vezes resulta da falsa afirmação de que o marido/esposa possui um amante, sendo conseqüência direta de uma relação embasada no ciúme e desconfiança.
Entre pais e filhos, as agressões morais ocorrem quando o pai menospreza o filho, colocando-o em situações constrangedoras, inferiorizando-o, fazendo-o se sentir incapaz, rejeitando-o, exigindo muito da criança, etc. Pode resultar na formação de um padrão destrutivo, fazendo a criança ou adolescente se sentir sem competência social, e tendo reflexos muito negativos na formação do indivíduo para a vida adulta.
A violência psicológica, em sua maioria, não ocorre de forma isolada, vem acompanhada de uma agressão física ou de um abuso sexual caracterizado pelo sofrimento causado pelas agressões e investidas de seus agressores.
2.4 Violência Sócio-econômica
Também chamada de violência patrimonial, se caracteriza quando o agente usa de meios financeiros para atingir a vítima, podendo ocorrer pela ação ou omissão.
Na relação conjugal, ocorre principalmente quando o parceiro ou parceira que é o principal mantenedor do lar (detém o poder financeiro) se utiliza desta situação para ridicularizar o outro, expondo-o a constrangimentos. É o exemplo do marido que sustenta a mulher e com isso acaba controlando seus gastos de forma severa, deixando de dar dinheiro a esta.
Parentalmente, geralmente ocorre quando o pai deixa de dar subsistência ao filho, coisa que é sua obrigação. Neste caso, pode até ser caracterizado o crime de abandono material, assunto este que será trataremos mais adiante.
A violência sócio-econômica raramente acontece isoladamente, geralmente vem acompanhada da violência física ou sexual.
2.5 Super-proteção 
Embora não seja comum vê-la deste aspecto, a super-proteção dos pais com os filhos também é uma forma de violência, mas em sua maioria ocorre de forma velada.
Os pais que a cometem, muitas vezes são bem educados, instruídos, etc., mas o abuso acaba se configurando pelo fato do isolamento da criança/adolescente do restante da sociedade.
Muitas vezes ocorre pelo medo que os pais têm em relação aos filhos, podendo este existir por diversos motivos, como achar que os filhos são incapazes de lidar com os sofrimentos e desafios da vida fora do lar; alta criminalidade na sociedade atual; temor de envolvimento com más companhias, álcool e drogas (principalmente na adolescência), etc.
Porém os pais devem entender que passar por situações controversas faz parte da vida de alguém, sendo essencial para a aprendizagem da criança e a formação de um bom caráter no futuro.
2.6 Privação e Negligência
Estas duas modalidades são mais freqüentes nas relações de pais e filhos, muito embora também possam ocorrer entre homem e mulher.
A privação está relacionada ao abandono material, “que é definido pelo art. 244 do CP como deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia; deixar, sem justa causa, de socorrer-lhes quando gravemente enfermos” (VERONESE, 2006, p. 148).
Já a negligência é muito ampla, sendo a raiz de todas as violências intrafamiliares, por isso, comporta os outros tipos de abandono (moral ou intelectual), e também os maus-tratos. Negligenciar é tratar de forma indiferente as necessidades interiores e exteriores da criança/adolescente, podendo se dá de forma intencional ou não. A indiferença é o contrário do amor, da compaixão, sendo uma forma áspera de insensibilidade afetiva. A negligência também pode se dá pela falta de atenção e interesse dos pais para com os filhos – pois educar, informar, esclarecer e determinar limites são deveres daqueles, e isso pode ocorrer principalmente pela vida apressada dos tempos modernos.
O abandono intelectual se dá com relação à educação dos filhos, ou seja, quando os pais deixam, se justa causa, de prover a educação em qualquer nível a seus filhos, podendo ocorrer, por exemplo, quando o pai deixa de matricular o filho na escola ou permite freqüentes faltas injustificadas deste. Está tipificado no art. 1634, I do Código Civil.
O abandono moral pode ocorrer em casos como: deixar o filho freqüentar casa de prostituição, bares, casas de jogos, permitirem o uso de álcool ou drogas, etc. Fatos estes que podem favorecer uma futura marginalidade do filho.
3 MARCAS DO SILÊNCIO
O abuso sexual contra a criança é uma forma presente de violência doméstica, geralmente mantida em silêncio, mascarado pela revolta, pela conspiração dos sentimentos de impotência, passividade e submissão. Tem uma distribuição “democrática” ocorrendo em todos os níveis sócio-econômicos (Santos, 1991p. 10). Nos últimos anos tem havido um aumento de consciência de que a freqüência do incesto é mais alta do que se imaginava. Isso tem sido enfatizado pela literatura profissional, na prática clínica e nas agências de cuidados e proteção à infância, que tem numerosos casos relatados. Apesar disso, alguns profissionais ainda escutam os relatos de molestação sexual como fantasias.
Segundo Rosenfeld (1979 p. 09), 
A linha de demarcação entre a fantasia e a realidade é com freqüência obscura, pois, a fantasia pode ser baseada em experiências reais familiares que foram deslocadas ou distorcidas. Embora pareça simples separar o que é incesto do que não é a realidade das interações familiares confronta-nos com inúmeros dilemas.
Ferenczi, citado por Rosenfeld (1979 p. 09), 
Notou que muitas crianças pequenas que tinham de fato sido envolvidas sexualmente com adultos ficavam freqüentemente confusas se o evento tinha realmente acontecido, uma confusão que foi atribuída a uma sobrecarga de sentimentos de desamparo acompanhados pela molestação. Tais confusões podem ser compreendidas não só em termos do desenvolvimento psicossexual e a repressão do que é traumático, mas, também, em termos de fase do desenvolvimento cognitivo da criança. 
Outra dificuldade na descrição e interpretação dos abusos sexuais em pesquisas é a falta de organização teórica e conceitual. O que é o incesto? A resposta a essa pergunta é bastante complexa e não existe uma concepção única a esse respeito. Segundo Cohen (1993, p. 03), “a palavra incesto deriva do latim incestus, que significa impuro, manchado, não casto, ou seja, in - não e cestus – puro”.
Existem diversas interpretações quanto à definição do que seja um comportamento incestuoso, e o fato é que, devido à complexidade do tema, nenhuma delas se mostra totalmente satisfatória. No entanto, todas as interpretações têm em comum a repulsa ao ato incestuoso.
Forward e Buck (1989, p. 05) diferenciam a visão legal, da visão psicológica.
A definição legal trataria o incesto como à relação sexual entre indivíduos com um grau máximo de parentesco e que está proibida por algum código religioso ou civil. A abordagem psicológica, deste fenômeno classificaria o incesto como qualquer contato abertamente sexual entre pessoas que tenham um grau de parentesco, por consangüinidade ou por afinidade, ou que acreditam tê-lo. Esta definição incluiria padrasto, madrasta, sogro, sogra, meio-irmão, avós e companheiros que morem junto com o pai ou a mãe, caso eles assumam a função de pais.
A experiência do abuso sexual intrafamiliar assim como outras experiências traumáticas (tais como, a guerra, campos de concentração, e etc) chama a atenção sobre o ajustamento cognitivo e afetivo do indivíduo. “O trauma, no sentido mais popular do termo, significa uma quebra de fé” (Winnicott, 1969 p. 12a). Segundo Winnicott (1969, p. 12b), “o trauma é um impacto provindo do meio ambiente e da reação do indivíduo a ele, que ocorre anteriormente ao desenvolvimento, por esse indivíduo, de mecanismos que tornem a experiência previsível”. É aquilo contra o qual o indivíduo não possui uma defesa organizada de maneira que um estado de confusão sobrevém, seguido talvez de uma reorganização das defesas, estas de um tipo mais primitivo do que as que eram suficientemente boas antes da ocorrência do trauma (Winnicott, 1969, p. 12c).
O trauma, portanto, varia de significado de acordo com o estágio de desenvolvimento emocional da criança. De início, o trauma implica em um colapso na área de confiabilidade da criança em um meio ambiente. O resultado de tal colapso mostra-se no fracasso ou no relativo fracasso no estabelecimento da estrutura da personalidade e organização do ego. (Winnicott, 1969, p. 12a).
Para Cole e Putnam (1992, p. 04), 
A maioria das vítimas de incesto se defronta com múltiplos aspectos desta experiência:
a) trauma físico e psicológico na forma de experiências sexuais atuais, incluindo violação do corpo;
b) extensos períodos de apreensão, culpa e medo nos contatos sexuais;
c) perda da confiança nas relações com pessoas emocionalmente significantes.
Observamos os efeitos de difusão e permanência do estresse no incesto entre os mais importantes domínios do desenvolvimento da criança, especificamente em termos de desenvolvimento da auto-integridade física e psicológica e no desenvolvimento de processos auto-regulatórios, particularmente na regulação dos afetos e controle dos impulsos.
Schilder, citado por Arvanitakis (1993, p. 01),
Conceituou imagem corporal ou esquema corporal para se referir a uma estrutura mental integrada da totalidade das experiências corporais, sensórias, motoras e afetivas. O desenvolvimento da representação do corpo é um processo dinâmico envolvendo desde o início os estágios psicossexuais. Está continuamente sujeito a reorganizações e elaborações sobre a ascendência de diferentes zonas erógenas e relações objetais associadas com elas.
Uma criança abusada sexualmente recebendo diretamente sob o seu corpo o impacto do erotismo do agressor e os impulsos agressivos, deve ficar profundamente abalada pelo comportamento do agressor e algumas das mudanças que ela pode perceber em seu corpo (pênis ereto, ejaculação, etc.), em adição ao que ela experimenta no seu próprio corpo. A falta de controle e a inabilidade da criança para compreender claramente o que está acontecendo, freqüentemente intensificado pelo comportamento de negação do agressor da sua contribuição nos eventos, levariam particularmente a uma dificuldade da criança não somente em manter algum nível de realidade, mas, também, em estabelecer uma clara diferenciação entre o seu corpo e o do seu abusador. Nas fantasias da criança, o corpo poderia tornar-se o local das mudanças aterrorizantes e misteriosas, estas gerando ansiedade. Segundo Arvanitakis (1993, p. 01), “tais representações persecutórias e prejudicadas do corpo podem levar a criança a múltiplas somatizações, ocasionalmente automutilações e tentativas de suicídio”.
Os vários significados pelos quais as vítimas de abuso sexual tenta descarregar, administrar ou defender-se contra a excessiva estimulação sobre o seu corpo e o efeito de tempestade que o acompanha, isto é, a dissociação e distanciamento, a auto-estimulação e a automutilação, a repetição na fantasia e realidade, todos esses significados afetarão a representação corporal e, por conseguinte, a auto-representação.
Para Cole e Putnam (1992, p. 04), o abuso sexual por um dos pais viola a crença básica da criança sobre segurança e verdade nas relações, causando distúrbios no julgamento e na habilidade de ter relações satisfatórias nas quais estejam envolvidos sentimentos de amor e proteção. De fato, o suporte social típico, nas famílias incestuosas, é à força do sofrimento,
O risco das vítimas de incesto que interfere no desenvolvimento normal não é estático. Diferenças individuais no ajustamento devem ser compreendidas em termos de processo de desenvolvimento. Cada transição de desenvolvimento proporciona à vítima oportunidade de reprocessar a experiência.
Embora diferentes orientações teóricas possam ser ampliadas para o estudo do abuso sexual intrafamiliar na infância, alguns modelos necessitam incorporar uma perspectiva desenvolvimental. Por definição, o abuso na infância ocorre e em muitos casos persiste, durante toda a infância. Assim, é necessário compreender:
a) como os efeitos do abuso sexual se manifestam em diferentes pontos do desenvolvimento; 
b) como os fatores do desenvolvimento influenciam específicos resultados;
c) como esse impacto na infância influencia o ajustamento mais tarde.
Vejamos, em síntese, alguns momentos do desenvolvimento e as conseqüências do abuso sexual na infância:
( Primeira infância
As tarefas necessárias neste período para o desenvolvimento social e do ser são: a) a descoberta do mundo das pessoas e dos objetos; b) estabelecimento de relações sociais seguras na família; c) o estabelecimento deum sentido básico do ser; d) o desenvolvimento de uma consciência autônoma; e d) a aquisição de um sentido inicial de bom e mau.
O abuso sexual nesta idade parece ocorrer com relativa baixa freqüência comparada com outros grupos de idade. Crianças abusadas nesta etapa são incapazes de ter uma compreensão da impropriedade dos atos sexuais perpetrados contra elas, mas, são afetadas pelos atos de trauma físicos, tais como, a penetração de uma pessoa ou de um objeto. O mais importante é que, o sentimento básico da criança de integridade física de um ser separado, confiança básica na resposta de amor e proteção dos pais e o sentimento de controle sobre os eventos estão ameaçado. 
( Anos pré-escolares
Os anos pré-escolares são geralmente marcados pelas idades de 2 a 5 anos ou pela entrada na escola e eles marcam a transição da primeira infância para a segunda infância. Em termos de desenvolvimento de si e social, os desafios da criança são aprender a integrar seu sentimento de segurança de uma representação de si, com as restrições do mundo social. 
Os pré-escolares são conscientes das regras básicas dos papéis sociais e se angustiam quando as regras são violadas. Os pré-escolares vitimados se refugiam na negação e dissociação. A opção de se voltar para o outro adulto no sentido de buscar ajuda está limitada pela confusão sobre o que está acontecendo, sentimentos de culpa e vergonha e medo das conseqüências da descoberta. Alguns pais ameaçam ou aterrorizam suas crianças sobre a revelação. De fato, muitos casos de abuso sexual na idade pré-escolar são reconhecidos através do conhecimento precoce da atividade sexuais mais do que a auto-revelação. Além disso, o abuso sexual nessa idade compromete a continuidade da auto-organização e da auto-regulação que são os maiores desafios deste período.
( Período escolar
O desenvolvimento pessoal e social é estabelecido em torno de um aumento da cognição e da competência social e do controle. Durante este período, a compreensão de si vai, gradualmente, incluindo a consciência do não alcançável, características psicológicas (pensamentos, sentimentos, motivações) e, mais profundamente, o sentido de comparação de si e dos outros. Por volta dos 8 (oito) ou 9 (nove) anos, a autocrítica e a consciência de sentimentos como vergonha e orgulho são mais evidentes. Durante este período, a criança também começa a desenvolver a habilidade de conceitualizar a si mesma como tendo qualidades positivas e negativas. 
A média de idade em que o primeiro contato sexualizado entre pai e filha ocorre está entre os 7 (sete) e 9 (nove) anos. Na situação de abuso a probabilidade das vítimas aumentarem suas experiências sociais e estabelecer um sentido de auto-competência no mundo social além da sua casa diminui. Intensa culpa, vergonha e confusão diminuem a probabilidade do sentimento de segurança suficiente para construir novas amizades e suporte social fora de casa. A impossibilidade de relatar realisticamente suas experiências emocionais e a falta de um modelo adequado de autocontrole flexível pelo menos em relação a um dos pais leva a criança a poder exibir um comportamento descontrolado ou variar entre a rigidez e o controle pobre. Embora a dissociação e a negação normalmente diminuam neste período, elas parecem permanecer elevadas nas crianças abusadas sexualmente. Estas circunstâncias interferem na integração de aspectos positivos e negativos do ser e numa avaliação realística de si mesmo. 
 ( Adolescência
As mudanças físicas da puberdade envolvem ajustamentos psicológicos e sociais, assim como o indivíduo deve integrar a aquisição de características secundárias sexuais e alterações na forma de outros relatos ao adolescente de sua auto-definição e comportamento social. O desenvolvimento social durante este período é marcado pela transição das relações com o mesmo sexo e das relações com o sexo oposto. Claramente, a relação sexualizada com o pai representa uma experiência social altamente desviada, em um momento em que o adolescente está tentando absorver suas mudanças sexuais e explorar as relações com o sexo oposto.
A natureza do incesto sugere que esta integração não pode ser estabelecida. A confiança sobre atitudes relativamente imaturas de estratégias, as quais levam ao raciocínio, reflexão e planejamento, aumentam a probabilidade de agir impulsivamente quando frustradas, deprimidas ou ansiosas (tipicamente tendo condutas anti-sociais, tais como abuso de drogas, atuações sexuais, fugas e outros comportamentos autodestrutivos). 
No que diz respeito ao abusador, vários são os disfarces do lobo mau (Veja 1994, p. 11). A criança vítima deste tipo de abuso precisaria ter pós- graduação em Psiquiatria e, nem mesmo assim, para adivinhar o que se passa na mente do lobo mau que a agride sexualmente. Segundo Iencarelli (1996, p. 08),
O medo do lobo mau é um mito reativado em crianças e adolescentes que sofrem abuso sexual praticado por um adulto. O lobo é o símbolo da agressividade e da destruição. Uma de suas características mais conhecidas é o disfarce e a tentativa permanente de se mostrar familiar e inofensivo. A violência é o componente básico do imaginário do abusador. A sexualidade deste adulto é infantil e ele busca o prazer na fantasia de exercer o poder em relação à criança. Mais do que um distúrbio mental, o incesto configura uma relação de poder, que envolve raiva, ódio e rancor. 
Essa forma de violência, raramente, deixa marcas visíveis e poucas vezes, a criança reclama, preferindo o silêncio. Esta atitude parece atingir a família, os amigos e, até mesmo, os profissionais de saúde. Considerado como um problema de saúde, o abuso sexual na infância é passível de prevenção. A primeira medida é quebrar a barreira do silêncio. As pessoas precisam se conscientizar de que este fenômeno existe.
3.1 Motivos que levam a impunidade
Por se tratar de um crime de caráter sexual, e cometido no âmbito intrafamiliar, ele acaba se tornando um tabu cercado de constrangimentos e segredos. Como preceitua Patrícia Rangel (2008, p.47):
A concepção da família como algo sagrado, onde os pais só querem o bem dos filhos, e o respeito á privacidade do lar, esfera delimitada onde não é bom tom “se meter a colher”, compõe um rol dos fatores que dificultam a intervenção de terceiros nas questões familiares.
A violência sexual doméstica apresenta particularidades que acarretam maiores dificuldades para a prevenção, identificação e diagnóstico, assim como para o atendimento, os encaminhamentos e tratamentos que passam a necessitar, tanto da vítima, como do agressor e o grupo familiar.
Um dos principais motivos que levam a maioria dos crimes sexuais intrafamiliar ficarem ocultos é o medo que a vítima tem em relatar o ocorrido. Ordinariamente aqueles que abusam sexualmente do infante, faz com que suas vítimas fiquem extremamente amedrontadas em revelar suas ações, incutindo nelas uma série de pensamentos torturantes, tais como culpa e medo de ser recriminada de ser punida.
Outro motivo não menos relevante é caracterizado pela reação da família diante da notícia, muitas crianças e adolescentes temem ser castigadas, não acreditada. A criança teme a punição ou a incapacidade do adulto de protegê-la da violência do seu agressor, e, além disso, sente que sua palavra é desvalorizada, que corre o risco de não ser acreditada no que diz, e, por isso mantém-se em silêncio sobre o assunto. (RANGEL, 2008, p. 45).
“O menor pode ter a atitude de relatar o acontecido, mas, em muitos casos mesmo depois de uma clara revelação, o segredo permanece em família, isso faz com que a criança ou adolescente volte atrás e comece a negar o ocorrido” (FURNISS, 1993, p.31). Afirma que a negação constitui um mecanismo de defesa utilizado pelos membros da família.
Da mesma maneira Arthur H. Green (1995, p.1033) relata:
O pai pode utilizar a negação por considerar o incesto como educação sexual para a sua filha. A mãe é incapaz de reconhecer e processar os óbvios sinais de incesto,porque isto colocaria em risco seu relacionamento com o marido. A filha utiliza a negação e a constrição de afeto para diversos propósitos: como proteção contra a vergonha e a culpa, para obscurecer a consciência da perversão do pai e preservar a família intacta.
A manutenção desse segredo provoca danos conforme também dispõe Patrícia Rangel (2008, p.47):
Pode se permear pelas dificuldades materiais e emocionais que permeiam o divórcio, quando essa se torna a opção mais provável a ser escolhida pelos pais, o fato de a criança se sentir responsável pela prisão do pai, o medo do abandono são alguma das causas que levam as crianças, e, não raro, os demais membros da família a guardarem este segredo.
Outro motivo que podemos enfatizar é a baixa efetividade dos meios probatórios, por ser um crime de difícil constatação e a sua predominante recorrência, esse quando encaminhado ao Judiciário, é muito complicado de se provar. É que a violência na maioria das vezes já se consuma por muito tempo, e muitas das situações não resultam marcas físicas ou biológicas, e sim somente marcas psicológicas. Por outro lado ainda naquelas práticas em que existe o contato físico, pode não ser possível encontrar vestígios físicos ou biológicos, o que acontece numa elevada porcentagem de casos. Pode ser pela delonga do tempo entre a agressão e o exame médico-legal, pela cicatrização rápida das lesões, anogenitais, pela elasticidade de certos tecidos, ou até mesmo da destruição involuntária ou intencional dos vestígios biológicos.
É comum também que as crianças ao chegarem ao Judiciário tenham dificuldades em relatar sobre o que as vitimou, e na maioria das vezes, mãe das vítimas não está totalmente envolvida no processo de revelação, e quando chega à hora da entrevista, essa mães transmitem a criança ou adolescente a mensagem direta ou indireta de não revelar, ou as crianças ficam tão ansiosas que se fecham para proteger as mães. (FURNISS, 1993, p. 198).
Dobke (2001, p. 34-35) nos ensina utilizando como fatores externos e internos os motivos que dificultam a constatação do crime sexual,
Fatores externos como fatores psicológicos, contribuem para a manutenção do segredo do abuso sexual intrafamiliar. Entre os fatores externos, pode citar a inexistência de evidencias médicas, o que leva a família a não ter como comprovar o fato; ameaças contra a vítima e suborno; falta de credibilidade na palavra da criança leva-a, muitas vezes, a não revelar o abuso com medo de ser castigada pela “mentira”, temor pelas conseqüências da revelação, com a concretização das ameaças que recebeu. Entre os fatores psicológicos, é também da criança, a negação, no sentido psicológico, é diferente da mentira, no mecanismo de defesa conhecido como dissociação, a vitima separa o abuso sexual. (fato real) dos sentimentos que lhe provoca. 
4 A POSSIBILIDADE DE PROTEÇÃO A CRIANÇA?
4.1 De onde provêm os encaminhamentos? 
Os casos de violência sexual intrafamiliar praticados contra a criança chegam ao Sistema de Justiça através do Conselho Tutelar, da Delegacia de Polícia ou nas disputas familiares envolvendo guarda, visitas ou processos de suspensão e destituição do poder familiar. 
Cabe ao Conselho Tutelar receber, entre outras situações de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente, os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos praticados contra a referida população, mostrando-se de extrema urgência a sua criação e instalação, em todos os municípios, “para a efetivação da política de atendimento à criança e ao adolescente, tendo em vista assegurar-lhes os direitos básicos, em prol da formação de sua cidadania” (CARVALHO, 1992, p. 419-420).
Embora as formas de maus-tratos e violência praticados contra as crianças sejam muitas, o texto aborda a violência sexual, especificamente a intrafamiliar, pois, “ainda que a violência com visibilidade seja a que ocorre fora de casa, o lar continua sendo a maior fonte de violência” (KRISTENSEN, OLIVEIRA e FLORES, 1998, p. 115). Pesquisa realizada em 1997, pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, apontou que, em uma amostra de 1.579 crianças e adolescentes em situação de rua, 23,4% não retornavam para casa porque seriam vítimas de maus-tratos. Flores e cols., em 1998, “estimaram que 18% das mulheres de Porto Alegre, com menos de 18 anos, sofreram algum tipo de assédio sexual cometido por pessoas de sua família” (KRISTENSEN, OLIVEIRA e FLORES, 1998, p. 73). 
Pode-se afirmar que a violência doméstica contra a criança e o adolescente 
representa todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e adolescentes que – sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico à vítima – implica, de um lado, uma transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, uma coisificação da infância, isto é, uma negação do direito que crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento (GUERRA, 1998, p. 32-33).
A violência sexual ou exploração sexual “se configura como todo ato ou jogo sexual, relação hetero ou homossexual entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança ou adolescente ou utilizá-la para obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa” (GUERRA 1998, p. 31). É também definida como o envolvimento de crianças e adolescentes, dependentes e imaturos quanto ao seu desenvolvimento, em atividades sexuais que não têm condições de compreender plenamente e para as quais são incapazes de dar o consentimento informado ou que violam as regras sociais e os papéis familiares. Incluem a pedofilia, os abusos sexuais violentos e o incesto, sendo que os estudos sobre a freqüência da violência sexual são mais raros dos que os que envolvem a violência física (KEMPE e KEMPE, 1996, p. 84). O abuso sexual pode ser dividido em familiar e não familiar. Autores apontam que “aproximadamente 80% são praticados por membros da família ou por pessoa conhecida confiável”, sendo que cinco tipos de relações incestuosas são conhecidas: pai-filha, irmão-irmã, mãe –filho, pai-filho e mãe-filha, sendo possível que o mais comum seja irmão-irmã; o mais relatado é entre pai-filha (75% dos casos), sendo que o tipo mãe-filho é considerado o mais patológico, freqüentemente relacionado com psicose (ZAVASCHI et al., 1991, p. 131). A violência sexual doméstica praticada contra a criança, de cunho intrafamiliar, “retém os aspectos do abuso relativos ao apelo sexual feito à criança, bem como destaca tal ocorrência no interior da família” (MEES, 2001, p. 18). Insere-se o abuso sexual da criança em uma gama extensa de situações de violação dos direitos da infância.
A demanda do Conselho Tutelar, no que se refere à violência intrafamiliar, abarca situações difíceis de serem enfrentadas, podendo ser apontado, entre outros fatores, que ao mesmo grupo familiar pertencem os dois pólos da ação, agressor e vítima, sendo que “as crianças - vítimas inocentes e silenciosas do sistema e da prática de velhos hábitos e costumes arraigados na cultura do nosso povo - são as maiores prejudicadas neste contexto calamitoso” (ALBERTON, 1998, p. 26). 
Aponta SALVADOR CÉLIA (1990, p. 43), referindo-se à situação da infância brasileira: 
A maioria das crianças brasileiras começa a ser agredida ainda no ventre materno, pela desnutrição materna e pela violência contra a mulher, e quando sobrevive às doenças perinatais, respiratórias e preveníveis por vacinação, quando sobrevive à fome e à diarréia, chega à idade adulta agredida pela falta de oportunidade do mercado de trabalho, depois de sofrer o fenômeno da evasão (diga-se “expulsão escolar”), quando então poderíamos falar no maltrato da instituição escolar, que entre outras causas multifatoriais apresenta um currículo completamente desligado da aplicação para as reais necessidades da maioria da população brasileira.
Sempre que estiver presente notícia de fato que constitua infraçãoadministrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente (art. 136, inciso IV, ECA), bem como se mostrar necessário o ajuizamento de ações de suspensão ou destituição do poder familiar (art. 136, inciso XI, ECA), independentemente das medidas de proteção ou aplicáveis aos pais (arts. 101 e 129 ECA), o Conselho Tutelar encaminhará ou representará ao Promotor de Justiça. De posse das informações, o Ministério Público avaliará a necessidade do ajuizamento de ação de suspensão ou destituição do poder familiar, assim como a adoção das medidas legais cabíveis, tanto na área cível como criminal. Ao propor a ação, no âmbito cível ou mesmo criminal, o Ministério Público aciona o sistema de Justiça, dando início a uma nova fase na vida da criança ou do adolescente e de seus pais.
As causas motivadoras da ação de suspensão ou destituição do poder familiar vêm elencadas nos artigos 1.637 e 1.638 do Novo Código Civil, assim como no artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente. O desvirtuamento do instituto do poder familiar “legitima o agente ministerial a intentar Ação de Suspensão ou Destituição do Pátrio Poder, sempre que constatar a ocorrência de casos de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável” (SCHREIBER, 2001, p. 137). 
A legitimidade para a propositura da ação de suspensão ou destituição do poder familiar é atribuída ao Ministério Público ou a quem tenha legítimo interesse, onde se destaca, por exemplo, o guardião que pretende pleitear a adoção da criança que se encontra sob sua guarda. Nas hipóteses em que estiver presente o motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar, em caráter liminar ou incidental, a suspensão do poder familiar, ficando a criança confiada a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade (artigo 157 do ECA).
Verifica-se, pelo alerta que o mencionado dispositivo traz, que a nova lei, regulamentadora do art. 227 da Constituição Federal, passa a significar um “movimento mais amplo de melhoria, ou seja, de reforma da vida social no que diz respeito à promoção, defesa e atendimento dos direitos da infância e da juventude” (CURY, SILVA e MENDEZ, 1992, p. 38). Por sua vez, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, em seu art. 3.1, salienta que “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança”. 
Não há mais como admitir, neste nascer de século, por parte do Poder Público, uma atuação descomprometida com a “defesa dos interesses da criança que sofre maus-tratos praticados, muitas vezes, por aqueles que teriam legitimidade e possibilidade de defendê-las” (SCHREIBER, 2001, p. 80). 
Assim, embora as causas que autorizam a suspensão ou a perda do poder familiar venham elencadas no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente, há que se buscar, sempre, o melhor interesse da criança. Na prática, uma das tarefas mais desafiadoras e difíceis para os profissionais do Direito reside em identificar o melhor interesse da criança, especialmente nas demandas que aportam ao Poder Judiciário, envolvendo pedido de suspensão ou destituição do poder familiar. Observa-se a existência de casos de “prova mal formada, prova mal produzida, prova precária, em que, mesmo assim, ajuíza-se temerariamente a ação de destituição do pátrio poder, como se esta fosse à cura para todos os males da criação e da má orientação dos pais” (FONSECA, 2000, p. 10).
Mesmo que os casos de violência sexual intrafamiliar praticados contra a criança, recebidos pelo sistema de Justiça, sejam muito inferiores aos números que realmente ocorrem, como sugerem os estudos realizados em outros países, passa a ser, o sistema de Justiça, o destinatário da demanda que o Conselho Tutelar não conseguiu, dentro de sua esfera de atribuições, assegurar a proteção integral às crianças cujos direitos foram ameaçados ou violados. 
Estarão os integrantes do sistema de Justiça capacitados para enfrentar a demanda envolvendo violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança? 
O tema exige constante reflexão, atenção, e avaliação por parte dos profissionais que integram as diversas instituições que compõem o sistema de Justiça, sob pena de ser a criança exposta a uma nova forma de violência, praticada em nome do Poder Público, por órgão ou instituição que têm o dever de zelar pelo cumprimento das disposições legais previstas na Constituição Federal e na Lei nº 8.069/90.
 
4.2 Como fica o direito da criança à convivência familiar? 
Sempre que os casos de violência sexual intrafamiliar chegam ao sistema de Justiça, já houve o afastamento da criança de sua família natural, quer pela sua colocação em abrigo, quer retirada do abusador do lar, ou presente está o risco de que o afastamento venha a ocorrer gerando a negação ou a ameaça a um dos direitos fundamentais que lhe vem assegurado na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
O direito à convivência familiar é, antes de tudo, um direito que integra a condição humana. No dizer de Hannah Arend (1999, p. 17):
A condição humana compreende algo mais que as condições nas quais a vida foi dada ao homem. Os homens são seres condicionados: tudo aquilo com o qual eles entram em contato torna-se imediatamente uma condição de sua existência.
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança sinaliza para o direito de a criança “viver com seus pais a não ser quando incompatível com seus melhores interesses; o direito de manter contato com ambos os pais caso seja separada de um ou de ambos e as obrigações do estado nos casos em que tal separação resulta de ação do Estado”, assim como “a obrigação do Estado de promover proteção especial às crianças desprovidas do seu ambiente familiar e assegurar ambiente familiar alternativo apropriado ou colocação em instituição apropriada, sempre considerando o ambiente cultural da criança” (CURY, PAULA e MARÇURA, 2002, p. 238). 
A família desempenha um papel essencial na vida, na formação e no desenvolvimento da criança, justificando a sua inclusão entre os seus direitos fundamentais, na medida em que se constitui instrumento essencial na formação do “ego maduro”, capaz de “discriminar a realidade, pensar sobre ela e, a partir de sua capacidade de antecipação, analisar os possíveis caminhos a serem escolhidos, até assumir, por opção e com responsabilidade, a ação a ser realizada, a qual anteriormente passou por um processo de reflexão, decisão, planejamento, para culminar na sua execução” (VASCONCELLOS, 1997, p. 60). As crianças, seres humanos estruturalmente dependentes, embora titulares de direitos necessitam de proteção e cuidado dos pais ou substitutos a fim de que possam vencer as etapas iniciais do seu desenvolvimento, pois “o desenvolvimento pleno de um bebê só poderá ocorrer se contar com o amor de seus pais, que vai-se expressar como uma íntima relação que os estudiosos denomina de apego” (ZAVASCHI, COSTA e BRUNSTEIN, 2001, p. 43). 
As disfunções apresentadas pela família, especialmente as que envolvem a violência sexual, repercutem diretamente na vida e na saúde das crianças, porquanto pessoa em desenvolvimento como bem foi salientado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, “sendo do interesse da sociedade e do Estado o desenvolvimento biopsicológico da população infanto-juvenil em condições de normalidade” (BRANCHER, 1997, p. 69). Traz a nova lei, para o sistema de Justiça, conceitos e achados que há muito vinham sendo considerados no campo da educação e saúde, sem que o mundo do Direito tivesse deles se apropriado, como era de se esperar no decorrer do século passado.
Os casos que desembocarem no sistema de Justiça está a exigir, muitas das vezes, a adoção de medidas que implicam no afastamento da criança do agressor, quer pela sua retirada do lar, quer pelo afastamento compulsório do abusadordo ambiente familiar.
A Lei nº 8.069/90 traz a possibilidade, há muito esperada pelos profissionais envolvidos com a proteção da criança, de afastamento do agressor da moradia comum, sempre que verificada a hipótese de opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável (art. 130 do ECA), sendo que “a provisional autorizada pelo artigo deve ser concedida liminarmente, sem audiência do agressor, ad cautelam, exatamente para não frustrar a proteção, apesar de terapêutica” (VIEIRA, 1992, p. 403). Trata-se de providência que vem ao encontro do princípio da doutrina da proteção integral da criança, uma vez que, historicamente, a vítima, já com as marcas da violência, era sistematicamente institucionalizada, arcando com o prejuízo adicional de se ser privada do convívio com o restante do grupo familiar, permanecendo o agressor a usufruir do conforto do lar.
A prática tem mostrado que a aplicação do novo dispositivo legal nem sempre se mostra eficaz, porquanto a ordem judicial não tem o condão de manter o agressor longe da moradia comum, especialmente nos casos em que conta o abusador com a conivência da mulher ou companheira, “na medida em que, não implicando restrição ou privação de liberdade do agressor, não impede que venha a retornar em momento posterior ao do afastamento coercitivo por ato judicial, ficando a moradia da vítima e restante do grupo familiar desguarnecidos de qualquer proteção” (BRANCHER, 1997, p. 71).
MURILLO JOSÉ DIGIÁCOMO (2000, p. 7-8) afirma que a lei “privilegia a manutenção da criança ou adolescente em sua família de origem, determinando o afastamento cautelar não do vitimizado (o que consistiria em mais uma violência contra ele), mas sim do vitimizador, que dependendo da situação pode mesmo ter sua custódia decretada”, porquanto o descumprimento da ordem judicial de afastamento, em tese, caracteriza o tipo penal previsto no artigo 330 do Código Penal, autorizando a decretação da prisão preventiva.
Especialistas apontam que, em estudo sobre famílias fisicamente abusivas que tinham um filho alocado fora de casa devido ao abuso, a baixa condição sócio-econômica, idade mais avançada da criança, maior gravidade do abuso e/ou problema comportamental escolar na vítima foram preditivos de má evolução no esforço de reabilitação da agência de assistência social, e de uma necessidade de cuidado institucional permanente para as vítimas. (KAPLAN, 1995, p. 1.029).
Um dos aspectos mais relevantes nas demandas que envolvem a violência sexual contra a criança consiste em avaliar adequadamente a viabilidade ou não da permanência ou do retorno do agressor ou da vítima para a moradia comum. Como avaliar corretamente a situação? 
Entre as medidas a serem adotadas, encontramos a oitiva do grupo familiar, a fim de averiguar “se é seguro o retorno da criança/adolescente para a companhia imediata dos agressores”, bem como o encaminhamento da família para programas de ajuda especializada, além da necessidade de se “pensar na recuperação dos agressores”, uma vez “que agressores de crianças e adolescentes foram quase sempre vítimas de agressão em sua própria infância” (GOLDENBERG, 1994, p. 191).
Necessário adotar medidas que visem à interrupção física do abuso, nos casos em que presente está à violência sexual, sendo que “a primeira preocupação deve ser a de avaliar a capacidade da família de proteger a criança de novos abusos e a necessidade ou não do afastamento imediato da criança (hospitalização, casa de parente, vizinho ou instituição)”. No Hospital de Clínicas de Porto Alegre, “a suspeita de abuso leva à realização de uma avaliação breve que muitas vezes requer a hospitalização da criança” (ZAVASCHI, TETELBOM, GAZAL e SHANSIS, 1991, p. 139).
Como já se afirmou, uma das decisões mais difíceis e delicadas a ser tomada no âmbito do sistema de Justiça refere-se à decisão de afastar ou não a criança abusada sexualmente de sua família. Não raras vezes nos deparamos com situações em que a mãe não consegue reconhecer o abuso a que foi submetida sua filha, fator impeditivo ao desempenho da necessária proteção que a criança necessita. Nestes casos, faz-se necessário investir na possibilidade de a mãe vir a perceber o risco enfrentado pela filha, cabendo salientar:
O trabalho da negação geralmente leva a mudanças psicológicas e inter-racionais que possibilitam à mãe reconhecer e acreditar na criança, e tornar-se protetora. O trabalho da negação também pode mostrar que não é possível nenhuma mudança e que a criança não deve ficar com a mãe, quando o abusador entrar novamente em cenário familiar. (FURNISS, 1993, p. 286).
Há que se considerar que a separação da criança da família, em razão do abuso sexual intrafamiliar, somente deve ocorrer na impossibilidade de afastar o abusador da moradia comum, hipótese em que a criança deve receber uma completa explicação dos motivos de seu afastamento, pois, caso contrário, “se sentirá acusada, punida e abandonada”, não havendo razão para impedir “o contato entre a criança e sua mãe, irmãos e amigos, exceto quando as mães não acreditam na criança, a acusam e rejeitam pelos problemas que se seguem à revelação” (FURNISS, 1993, p. 225).
Não havendo possibilidade de a criança retornar ao lar, em caráter temporário ou definitivo, por absoluta falta de condições de os pais assumirem os deveres para com o filho, oferece a lei, a medida de proteção, prevista no art. 101, inciso VIII, do Estatuto da Criança e do Adolescente, consistente na colocação em família substituta, através da guarda, tutela e adoção. A primeira não pressupõe a prévia suspensão ou destituição do poder familiar; a segunda exige, no mínimo, a anterior suspensão do poder familiar, ao passo que a adoção vai implicar sempre em perda ou extinção do poder familiar.
Na prática, assegurar o direito à convivência familiar à criança vítima de violência intrafamiliar, em especial a violência sexual, não se mostra uma tarefa simples, especialmente pela presença de inúmeros fatores que passam a se constituir em empecilhos ou complicadores para que se opere o direito fundamental em comento.
 
4.3 A negação e o segredo: como o Judiciário lida com as duas facetas da violência sexual praticada contra a criança?
Todas as formas de violência contra a criança produzem conseqüências nefastas ao desenvolvimento infantil. A violência, o abuso ou a exploração sexual, no entanto, apresentam particularidades que acarretam maiores dificuldades para a prevenção, identificação e diagnóstico, assim como para o atendimento, os encaminhamentos e tratamentos que passam a necessitar, tanto a vítima como o agressor e o grupo familiar.
A violência doméstica, de um modo geral, em face de suas características, é uma violência interpessoal; um abuso de poder disciplinador e coercitivo dos pais ou responsáveis; um processo de vitimização que às vezes se prolonga por vários meses e até anos; um processo de imposição de maus-tratos à vítima de sua completa objetalização e sujeição; uma forma de violação dos direitos essenciais da criança e do adolescente como pessoas e, portanto, uma negação de valores humanos fundamentais como a vida, a liberdade, a segurança; tem na família sua ecologia privilegiada. (GUERRA, 1998, p. 32)
Na sociedade, é observada sensível diferença na forma de encarar a violência física e a sexual da criança. Um dos fatores responsáveis pela diferença de visão vem apontado na assertiva de que “no abuso físico, um pouquinho de violência física é considerada aceitável, e somente as formas severas de violência ou punição física são identificadas como abuso” (FURNISS, 1993, p. 13). Em contrapartida, “qualquer violação sexual da integridade da criança é rotulada como abuso e a definição normativa é muito mais estreita para o abuso sexual do que para o abuso físico”, sendo que, “enquanto nenhum dos pais é levado ao tribunal e nenhuma criança recebe cuidados se eles dão uma palmada no traseiro da criança, um pai bem pode acabar na prisão por ter esfregado levemente os genitais da criança”(FURNISS, 1993, p. 13).
O abuso sexual ganhou espaço nas pesquisas e estudos há aproximadamente três décadas, tendo como fato propulsor o contexto cultural de proteção aos direitos da mulher e da criança. Há trinta anos, o ingresso de uma criança em um hospital, em decorrência de maus-tratos, era considerado um caso raro e dramático, sendo vista a criança como vítima inconfundível de uma ação criminal (KEMPE e KEMPE, 1996, p. 32).
Na atualidade, conhecimentos científicos disponíveis alertam para os graves prejuízos ocasionados pela violência sexual. Estudos apontam para “a influência do trauma na configuração do aparato neuroendócrino, da arquitetura cerebral, da estruturação permanente da personalidade e dos padrões de relacionamento posteriores”, além de “as experiências ficarem marcadas na herança genética e nos padrões de vínculo, sendo, portanto, repassadas de uma forma ou outra para a descendência” (AZAMBUJA, 2004, p. 125).
A violência sexual da criança, manifestada através da pedofilia (preferência de um adulto por relações sexuais com crianças, através da adição), de atos violentos de abuso sexual ou através do incesto, por pertencer à esfera privada, “acaba se revestindo da tradicional característica de sigilo” (GUERRA, 1998, p. 32). A negação, via de regra, acompanha a situação de violência sexual, sendo-lhe atribuída natureza específica de síndrome de segredo, para a criança e a família, e síndrome de adição, para a pessoa que comete o abuso (FURNISS, 1993, p. 29). 
O medo de ser castigada, não acreditada e protegida pode levar a criança a não revelar o abuso sexual, que “permanece um segredo de família, até mesmo depois de uma clara revelação, e inclusive quando as ameaças legais e estatutárias há muito tempo já foram removidas; este é o resultado da negação, não da mentira; a mentira relaciona-se ao conceito legal de prova, a negação pertence ao conceito psicológico de crença e assunção da autoria” (FURNISS, 1993, p. 31). Afirma-se que a negação constitui um mecanismo de defesa utilizado pelos membros da família: 
O pai pode utilizar a negação por considerar o incesto como educação sexual para sua filha. A mãe é incapaz de reconhecer e processar os óbvios sinais de incesto, porque isto colocaria em risco seu relacionamento com o marido. A filha utiliza a negação e a constrição de afeto para diversos propósitos: como proteção contra a vergonha e a culpa, para obscurecer a consciência da perversão do pai e preservar a família intacta. (GREEN, 1995, p. 1.033).
 
Fatores externos, assim como fatores psicológicos, contribuem para a manutenção do segredo no abuso sexual intrafamiliar. Entre os fatores externos, podemos citar a inexistência de evidências médicas, o que leva a família a não ter como comprovar o fato; ameaças contra a criança vítima e suborno; falta de credibilidade na palavra da criança leva-a, muitas vezes, a não revelar o abuso com medo de ser castigada pela “mentira”; temor pelas conseqüências da revelação, com a concretização das ameaças que recebeu. Entre os fatores psicológicos, destaca-se: a culpa, no sentido legal, é do abusador, mas, no sentido psicológico, é também da criança; a negação, no sentido psicológico, é diferente da mentira; no mecanismo de defesa conhecido como dissociação, a vítima separa o abuso sexual (fato real) dos sentimentos que o ato lhe provoca (DOBKE, 2001, p. 34-35).
O rompimento do segredo, levando à denúncia do fato, pode ser influenciado por alguns fatores, como por exemplo, a ameaça isolada ou combinada com medo da perda de integridade física; tentativa de suicídio; contágio por doença sexualmente transmissível; receio da perpetuação da vitimização com irmãs/irmãos; risco de gravidez; restrição das atividades típicas da adolescência; desconfiança da mãe e disque denúncia (OLIVEIRA e PINHEIRO, 1999, p. 261).
A adição, por sua vez, é complementar ao abuso sexual como síndrome de segredo para a criança; “para o abusador, o abuso sexual da criança funciona como adição (abusador = adito; criança = droga); ele sabe que o abuso é prejudicial à criança e mesmo assim abusa” (DOBKE, 2001, p. 36). Para a melhor compreensão da síndrome da adição, TILMAN FURNISS (1993, p.18) descreve: 
Eu atendi pais que relatavam quão desesperadamente haviam tentado parar de abusar sexualmente de seus filhos, mas a qualidade aditiva do abuso sexual da criança como uma síndrome de adição fazia-os prosseguir. 
O abuso sexual da criança, como síndrome da adição, “se desenvolve pela compulsão à repetição; os sentimentos de culpa e conhecimento de estar prejudicando a criança podem levar a uma tentativa de parar o abuso, mas em razão da compulsão à repetição, o abusador não consegue seu intento” (DOBKE, 2001, p. 36). A dependência psicológica decorre do alívio das tensões, constituindo-se a “excitação do abusador” o elemento aditivo central (DOBKE, 2001, p. 36). 
Há que se considerar que a criança, por ser uma pessoa em desenvolvimento, carece biologicamente de “maturação nos níveis emocional, social e cognitivo”, levando-a a comportar-se, relacionar-se e a pensar de uma forma diferente dos adultos (FURNISS, 1993, p. 14). A diferença de condições encontradas na criança e no adulto acaba por se refletir na forma como a primeira enfrenta e reage a uma situação de abuso sexual, bem como pela maneira como se manifesta quando é chamada a falar sobre o fato ocorrido; enquanto a criança tem medo de falar, o adulto teme ouvi-la, favorecendo a clandestinidade. 
Nos casos de abuso sexual intrafamiliar da criança, torna-se necessário envolver a mãe no processo de revelação, sem desconhecer que, até as mães apoiadoras, muitas vezes, “ficam tão perturbadas durante a entrevista, que transmitem à criança a mensagem direta ou indireta de não revelar; ou as crianças ficam tão ansiosas que se fecham para protegerem as mães” (FURNISS, 1993, p. 198). 
Fator facilitador da manutenção do segredo é encontrado no mito, construído ao longo do tempo, de que a família é um “bom meio natural”. A assertiva “encobre uma verdadeira ditadura familiar, corroborando para a construção de um imaginário social denegatório e permitindo que a família incestogênica se perpetue imune e intacta a intervenções externas” (OLIVEIRA e PINHEIRO, 1999, p. 229). 
Nos casos de abuso sexual da criança, de cunho intrafamiliar, que se constitui o objeto de estudo do presente trabalho, raramente é feito o diagnóstico, o que impede a chegada do caso ao sistema de Justiça. As famílias, aparentemente, levam “uma vida normal e tranqüila na comunidade”. A realização de um exame mais aprofundado, no entanto, permite perceber que a família “apresenta um contato limitado com o mundo extrafamiliar” (ZAVASCHI et al., 1991, p. 131). A relação incestuosa intrafamiliar, que tende a se protelar por vários anos, pode apresentar as seguintes características: 
O pai pode ter uma personalidade passiva e introvertida e geralmente a vida sexual do casal é pobre. Inicia a relação com sua filha num período de ‘stress’, solidão e dependência. A atividade incestuosa pode não ser motivada pelo sexo, mas representar uma necessidade de afeto” (ZAVASCHI et al., 1991, p. 131). A mãe, por sua vez, mesmo conhecendo a relação incestuosa, pode ignorá-la ou mesmo incentivá-la, “pois assim sua filha a estará substituindo num papel onde se sente incapaz”, sendo comum as crianças vítimas do incesto “se tornarem pequenas mães, assumindo deveres domésticos que seriam tarefas da mãe” (ZAVASCHI et al., 1991, p. 131). Já a filha “utiliza a negação e a constrição de afeto para diversos propósitos: como proteção contra a vergonha e a culpa, para obscurecer a consciência da perversão do pai e preservar a família intacta. A persistência da negação da criança sobre o abuso sexual previsivelmente complica sua avaliação e tratamento” (GREEN, 1995, p. 1.033). Nas famílias incestuosas “há confusão referente às fronteiras intergeracionais e há pouco respeito pelo espaço físico, privacidade e pertences dos membros”, observando-se “faltade recato com relação à nudez e toalete, e também deficiências no estabelecimento de limites”, sendo que “as fronteiras rígidas entre a família incestuosa e o mundo externo contrastam de forma aguda com a indistinção de fronteiras entre as gerações dentro da família” (GREEN, 1995, p. 1.033). MARCELINE GABEL (1997, p. 176) afirma que “as fronteiras das gerações não são respeitadas na transgressão que representa uma relação sexual pai-filha”, pois, ao mesmo tempo que a relação coloca o casal pai/filha, mantém, no mesmo nível, mãe e filha.
A negação ou síndrome do segredo envolve todo o desenrolar do processo de abuso sexual intrafamiliar, tanto nas etapas em que o fato ainda não foi identificado, e que pode durar vários anos, acompanhado de freqüentes ameaças; como nas etapas que se desenvolvem junto ao sistema de saúde ou de Justiça, cabendo referir que, “sobreviver ao abuso sexual da criança como pessoa intacta pode ser tão difícil para o profissional como é para a criança e para os membros da família” (FURNISS, 1993, p. 1).
É necessário envolver a mãe no processo de revelação, assim como os irmãos da vítima, devendo ser cada caso avaliado para buscar a melhor forma de trabalhar com o grupo familiar. O índice de admissão da prática do abuso por parte dos abusadores aumenta na medida em que “a intervenção é bem preparada pela rede profissional, existem mais fatos disponíveis e a pessoa que confronta o suposto abusador é bem apoiada pela rede profissional e pelos fatos da evidencia perante ele” (FURNISS, 1993, p. 200). 
A falta de compreensão e entendimento do abuso sexual intrafamiliar, verificado, com freqüência, tanto nas agências de saúde, como no sistema de Justiça, pode gerar intervenções inadequadas, com sensíveis prejuízos especialmente à criança. A nomeação do abuso sexual da criança “cria o abuso como um fato para a família”, podendo “refletir-se na rede profissional e no nosso próprio pânico e crise profissionais, quando intervimos cegamente em um processo que muitas vezes não compreendemos” (FURNISS, 1993, p. 200). 
Além da negação, por parte dos envolvidos no abuso sexual da criança, no âmbito intrafamiliar, que permite que a violência seja mantida em segredo por longos anos, escapando, por vezes, inclusive, da percepção do sistema de Justiça, encontramos também, de um modo geral, um evidente despreparo dos profissionais que compõem o sistema de Justiça para intervir de modo adequado nos casos que uma suspeita é levantada. Entre os aspectos que apontam o despreparo dos profissionais que integram o sistema de Justiça podemos citar a inabilidade para a oitiva da vítima criança. Sabe-se que ouvir uma criança não é o mesmo que ouvir um adulto, principalmente uma criança abusada sexualmente é preciso preparo técnico-emocional e, ainda, muita sensibilidade, até mesmo para entender que não podemos ficar nos lugares em que, normalmente, estamos, no sentido mais amplo, e permanecer ao lado da criança de modo a não deixá-la ainda mais oprimida e humilhada. (DOBKE, 2001, p. 96).
É preciso que os integrantes do sistema de Justiça tenham consciência de que “o processo de renovado segredo e a recaída na negação psicológica secundária são parte de um processo terapêutico no abuso sexual da criança como síndrome de segredo e de adição, que tem como núcleo terapêutico a transição da negação e do segredo para a realidade, privacidade e responsabilidade” (FURNISS, 1993, p. 290), o que poderá evitar a tomada de decisões que venham de encontro ao melhor interesse da criança. Indiscutivelmente, os profissionais do Direito “necessitam de conhecimentos específicos sobre a dinâmica do abuso sexual infantil, sobre a estrutura familiar, no caso de o abuso ser intrafamiliar, e noções sobre conceitos básicos de psicologia para melhor inquirir a criança” (DOBKE, 2001, p. 96). Igualmente, “é de crucial importância comunicar-se no nível real de desenvolvimento cognitivo, intelectual, psicossocial e psicossexual da criança” (FURNISS, 1993, p. 197), pois, caso contrário, nossa intervenção se distanciará da realidade, diminuindo as possibilidades de proteção para a vítima.
 
4.4 Alternativas à proteção da criança 
Para que as Instituições possam se adequar às normas constitucionais que elegeram a criança como prioridade absoluta, é necessário investir em novos recursos. Entre as formas de violência praticadas contra a criança, a violência sexual intrafamiliar é a que apresenta maior dificuldade de manejo. Há que se investir em novos recursos como a constituição de equipes interdisciplinares nas Instituições de Saúde, Proteção e Justiça e a capacitação dos profissionais, bem como dos estudantes, em especial nos cursos de Direito, Enfermagem, Serviço Social, Educação, Psicologia e Medicina. Também não podemos esquecer o abusador, havendo que se pensar em desenvolver programas destinados a esta população, em especial aos que cumprem pena privativa de liberdade.
Iniciativas desenvolvidas em outros países, como o Canadá, “busca uma intervenção integrada e coordenada em relação ao problema da violência doméstica, possibilitando serviços às mulheres e crianças (assistência psicológica, jurídica, grupos de auto-ajuda, encaminhamento a abrigos, se necessário) treinamento profissional no manejo de questões envolvendo violência doméstica (como identificar a vítima de abuso, como abordar o problema, como fazer o encaminhamento e acompanhamento do caso), paralelamente ao trabalho realizado com os homens agressores” (GROSSI, 2001, p.97). 
Nos feitos judiciais, seja na esfera cível como criminal, é preciso assegurar, à criança, a proteção integral, evitando buscar a prova da materialidade nos crimes que envolvem violência sexual intrafamiliar através do seu depoimento. É momento de pensarmos em mecanismos de avaliar o dano psíquico causado à criança, através de perícia psiquiátrica, a ser realizada por especialistas na área da infância, em substituição à oitiva da criança como meio de obter a prova da materialidade. Raramente é possível apurar os danos físicos, sem que com isto o crime não tenha acontecido. As marcas mais importantes, segundo apontam os especialistas, situam-se na esfera psíquica das pequenas vítimas cujas seqüelas podem se estender por toda a vida, ao passo que, os danos físicos, tendem a ser superados. 
5 O ESTADO FACE A VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR
5.1 Judiciário e suas dificuldades encontradas na constatação do crime e na punição do acusado
Os casos de violência sexual intrafamiliar praticados contra crianças ou adolescentes chegam ao sistema de Justiça especializada da infância e juventude através do Conselho Tutelar, da delegacia de Polícia ou das Varas de Família.
Conforme preceitua Marisa Silveira Albertoni (1998, p. 26): 
Demanda do Conselho Tutelar, no que se refere á violência sexual intrafamiliar, abarca situações difíceis de serem enfrentadas, podendo ser apontado, ente outros fatores, que ao mesmo grupo familiar pertencem dois pólos da ação, agressor e vítima, sendo que “as crianças - vítimas inocentes e silenciosas do sistema e da pratica de velhos hábitos e costumes arraigados na cultura do nosso povo – são as maiores prejudicadas neste contexto calamitoso”. 
As esfinges encontradas iniciam-se bem logo na fase policial, realizada a denúncia do crime as autoridades competentes, estas recebem a denúncia e remetem à vítima aos cuidados de um médico legista para que seja efetuado o exame de corpo de delito. O médico realiza o exame e envia o resultado a autoridade solicitante. Com o exame de corpo e delito na mão é que se inicia o processo judicial, mas do período da denúncia até o resultado do exame já ocorreu um longo tempo o que acaba por implicar em perdas de indícios e provas, e logo a eventual incriminação do agressor.
Passada a fase policial e iniciada a fase processual outra esfinge é encontrada, a infra-estrutura do judiciário, esta não é adequada para a realização dos interrogatórios dos menores, com uma infra-estrutura

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