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APOSTILAS DE DIREITO PENAL PARTE ESPECIAL ARTIGOS 121 A 183 DO CÓDIGO PENAL EDUARDO QUEIROZ DE MELLO Eduardo Queiroz de Mello 1 SUMÁRIO Capítulo 1 – Introdução ao estudo da Parte Especial do Código Penal Capítulo 2 – O Homicídio Capítulo 3 - Induzimento, instigação e auxílio ao suicídio Capítulo 4 – O Infanticídio Capítulo 5 – O Abortamento Capítulo 6 - Lesões corporais Capítulo 7 - Crimes de periclitação da vida e da saúde – Perigo de contágio venéreo; Perigo de contágio de moléstia grave; Perigo para a vida ou a saúde de outrem; Abandono de incapaz; Exposição ou abandono de recém-nascido; Omissão de socorro; Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial; Maus-tratos Capítulo 8 – Rixa Capítulo 9 - Crimes contra a honra Capítulo 10 - Crimes contra a liberdade individual – Constrangimento ilegal; Ameaça; Sequestro e cárcere privado; Redução a condição análoga à de escravo; Tráfico de pessoas Capítulo 11 - Violação de domicílio; Invasão de dispositivo informático Capítulo 12 - Crimes contra o patrimônio – Furto; Furto de coisa comum; Roubo; Extorsão; Extorsão mediante sequestro; Extorsão indireta Capítulo 13 – Crimes contra o patrimônio – Dano; Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia; Dano em coisa de valor artístico, arqueológico ou histórico; Alteração de local especialmente protegido Capítulo 14 – Crimes contra o patrimônio – Apropriação indébita Capítulo 15 – Crimes contra o patrimônio – Apropriação indébita previdenciária Capítulo 16 – Crimes contra o patrimônio – Estelionato; Duplicata simulada; Abuso de incapazes; Induzimento à especulação Capítulo 17 – Crimes contra o patrimônio – Receptação; Receptação de animal; Disposições gerais dos crimes contra o patrimônio Questionário Referências bibliográficas Eduardo Queiroz de Mello 2 CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL O crime: Conceitua-se crime como sendo a ação típica, ilícita e culpável, tendo-se, portanto, como elementos estruturais do conceito a ação, a tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade (há quem exclua a culpabilidade do conceito analítico, sob o argumento de que ela é inerente ao agente e não ao fato). A ação: Define-se ação como sendo o comportamento humano, manifestando vontade, direcionada a um fim previamente concebido. É o elemento nuclear do conceito analítico de crime. A omissão, de sua vez, não pode se diferenciar do conceito de ação, na medida em que nela também há uma manifestação de vontade dirigida a um fim, atuando o agente negativamente, ou seja, deixando de fazer. Assim, não há distinção conceitual entre ação e omissão. O tipo penal e a tipicidade: Define-se tipo penal como sendo a descrição do fato considerado criminoso na lei. Não há crime que não seja descrito por um tipo penal. Em síntese, tipo é a redação dada pelo legislador a um fato por ele considerado como crime. Tipicidade vem a ser a adequação de um fato a um tipo penal específico. Importante salientar da necessidade, para poder-se falar em crime, da tipicidade, ou seja, da subsunção do fato ao tipo penal. A ilicitude: Considera-se ilicitude ou antijuridicidade, como sendo a contrariedade do fato à norma. Ressalte-se, que é possível um fato ser típico e não ser ilícito, como nos casos em que o agente atua em defesa legítima, estado necessário, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito (causas legais de exclusão da ilicitude). Culpabilidade – reprovabilidade: Define-se culpabilidade, como sendo o juízo de reprovação que recai sobre o agente em face de sua conduta. Exterioriza-se este juízo de reprovação na imposição de uma sanção. Para que haja culpabilidade – reprovabilidade, necessário que se vejam atendidos determinados pressupostos: 1. Imputabilidade; 2. Consciência, ao menos potencial, da ilicitude do fato; 3. Exigibilidade de comportamento diverso. Elementos estruturais do tipo penal incriminador: 1. Elementos objetivos: verbo, objeto material, objeto jurídico, sujeito ativo, sujeito passivo, circunstâncias, etc.; 2. Elementos subjetivos: dolo (direto, eventual e específico) e culpa (consciente e inconsciente); 3. Elementos normativos: são os que necessitam de especial valoração por parte do intérprete, em face de serem compostos de expressões jurídicas ou extrajurídicas, como p. ex., o “estado puerperal”, no infanticídio (art. 123/CP). Eduardo Queiroz de Mello 3 CAPÍTULO 2 O HOMICÍDIO Art. 121. Matar alguém: Pena – reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. § 1º. Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. § 2º. Se o homicídio é cometido: I – mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II – por motivo fútil; III – com emprego de veneno fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV – à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; V – para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime; VI – contra a mulher por razões da condição de sexo feminino; VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até o terceiro grau, em razão dessa condição: Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. § 2º-A. Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: I – violência doméstica e familiar; II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher. § 3º. Se o homicídio é culposo: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. § 4º. No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. § 5º. Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção se torne desnecessária. § 6º. A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. § 7º. A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: I – durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; II – contra pessoa menor de 14 (quatorze), maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência; III – na presença de ascendente ou descendente da vítima. Eduardo Queiroz de Mello 4 Conceito: Trata-se da extinção da vida humana dada por alguém (outro ser humano), podendo o crime ser praticado na forma dolosa (dolo direto ou eventual) ou culposa (art. 121, § 3º). O crime tem por objeto jurídico a vida,e por objeto material o ser humano vivo. Tanto o sujeito ativo quanto o passivo podem ser quaisquer pessoas. O homicídio privilegiado – Art. 121, § 1º: São três as razões que motivam o chamado homicídio privilegiado, tecnicamente uma causa especial de diminuição de pena: 1. Motivo de relevante valor social – Justifica-se em razão do interesse coletivo, sendo o agente impulsionado pela satisfação de anseio social; 2. Motivo de relevante valor moral – Destaca-se a motivação nobre, aprovada pela moralidade média, correspondendo a interesse pessoal; 3. Estar o agente sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima – O agente se vê dominado por emoção violenta, que lhe perturba os sentidos, havendo tal emoção de ter sido provocada injustamente pela vítima, não se admitindo lapso temporal entre a provocação injusta e a ação do agente. O homicídio qualificado – Art. 121, § 2º: 1. Mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe – Faz previsão do homicídio praticado por motivo ignóbil, repugnante, destacando-se a vileza do agente, tendo como exemplo o “homicídio mercenário”, havendo, no caso, o concurso de pessoas, vez que necessária a figura do “contratante” e o homicida “contratado”. Há divergência se a qualificadora alcança o “mandante”, mas o entendimento dominante (STJ) é no sentido de que todos os dados que compõem o tipo básico ou fundamental, são elementares do crime, enquanto o que integra o acessório, configurando os chamados tipos derivados (qualificadoras, causas especiais de aumento e diminuição de pena) são circunstâncias, sendo assim, o fato de ter sido o homicídio praticado com torpeza ou mediante contratação de mercenário, será circunstância de caráter pessoal, que pode até caracterizar o privilégio, p.ex., o motivo de relevante valor moral; 2. Por motivo fútil – É a quase ausência de motivação, insignificante, irrelevante, apresentando uma desproporção entre o crime e sua causa; 3. Com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum – Qualificadora de meios de execução, genérica (ou outro meio insidioso ou cruel), dependendo de perícia técnica, na medida em que, p.ex., o veneno pode ter enorme amplitude (o açúcar em determinada quantidade pode ser “veneno” para o diabético; uma substância que mau nenhum causa, mas que aliada com outra – p. ex., um medicamento usado – pode provocar a morte, podendo ser considerado, portanto, como “veneno”). O fogo e o explosivo são meios que, inequivocamente, resultam em perigo comum. Asfixia é impedir, por qualquer meio (mecânicos – afogamento, esganadura, etc.; químicos – inalação de gases) a respiração. A tortura demonstra excessiva crueldade do agente, somente qualificando o homicídio se o resultado pretendido é a morte da vítima, vez que, a tortura em si mesma, não desejando o agente matar a vítima, caracteriza o crime de tortura previsto na Lei 9.455/97, com majoração da pena no caso de ocorrer o resultado morte (preterdolo); 4. À traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido – Qualificadora de modo de execução (modus operandi); 5. Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime – Qualificadora de finalidade, implicando sempre ter o homicídio conexão com outro crime, seja teleológica – quando praticado como meio para executar outro crime, seja consequencial – quando praticado para ocultar a prática de outro Eduardo Queiroz de Mello 5 crime ou assegurar a impunidade ou vantagem de outro crime. No primeiro caso, a qualificadora subsistirá ainda que o outro crime não venha a ser cometido; 6. Feminicídio – (Lei 13.104, de 09/03/2015) – Contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, considerando-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: violência doméstica e familiar; menosprezo ou discriminação à condição de mulher (art. 121, § 2º-A). Além de qualificar o homicídio, o feminicídio tem sua pena aumentada em 1/3 (um terço) caso praticado durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto; contra mulher menor de 14 ou maior de 60 anos, ou portadora de deficiência; na presença de ascendente ou descendente da vítima (art. 121, § 7º); 7. Contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da CF, respectivamente, Forças Armadas – Exército, Marinha e Aeronáutica, e Polícias Judiciárias Federal e Civil, Rodoviária Federal, Militares e Corpo de Bombeiros militares, e ainda integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, desde que no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra cônjuge, companheiro(a) ou parente consanguíneo até o 3º grau, em razão dessa condição. (Lei 13.142, de 06/07/2015) Importa ressaltar que em relação ao homicídio doloso, tem-se a causa especial de aumento de pena acrescida pela Lei 12.720, de 27/09/2012, e prevista no parágrafo 6º, ou seja, quando o crime for cometido por “... milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio”. Para que não haja dupla punição (bis in idem), essa causa especial de aumento só incide se não tiver havido também a responsabilização do agente pelo crime disposto no art. 288-A/CP, acrescentado pela mesma lei referida (“Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código ...”). Pluralidade de qualificadoras: Quando estiverem caracterizadas duas ou mais qualificadoras, uma única qualifica o homicídio, deslocando o fato para o art. 121, § 2º do CP. Quanto às demais qualificadoras, serão consideradas como agravantes genéricas ou como circunstâncias judiciais do art. 59/CP, já que o art. 61 é expresso ao dizer das circunstâncias que sempre agravam a pena, excetuando quando constituem ou qualificam o crime. Essa segunda corrente vem ganhando adeptos, inclusive, no STF. Homicídio privilegiado e qualificado: É perfeitamente possível verificar-se o homicídio privilegiado e qualificado ao mesmo tempo, contudo, o entendimento majoritário é no sentido de que somente quando a causa de privilégio for de natureza subjetiva e a qualificadora for objetiva. O conceito de morte: Para a consumação do homicídio, é necessário que se vejam cessadas as funções cardíaca, respiratória e cerebral da pessoa humana (vítima), contudo, a Lei 9.434/97, autorizou o transplante de órgãos ocorrendo a chamada “morte encefálica” – “estado irreversível de cessação de todo o encéfalo e funções neurais, resultante de edema e destruição dos tecidos encefálicos, apesar da atividade cardiopulmonar poder ser mantida por sistemas de suporte externos”. Para o Direito Penal não houve qualquer alteração no que tange ao conceito de morte com o advento da lei referida, na medida em que, havendo a “morte encefálica”, e não havendo interferência de métodos artificiais, fatalmente se verão cessadas as funções cardiorrespiratórias. Eduardo Queiroz de Mello 6 Meios e modos de execução: 1. mecânicos - disparo de arma de fogo, uso de facas, machados, foices, martelos, etc., destacando-se ainda a asfixia, afogamento, estrangulamento; 2. químicos - é o uso de medicamentos ou drogas, destacando-se o envenenamento; 3. morais ou psíquicos - atuam através da produção de traumas psicológicos na vítima, normalmente agravando uma enfermidade preexistente. Instrumentos e feridas mais comuns no homicídio: Extrai-se dos estudos de Medicina Legal que os mais comuns são: 1. contundente – pérfuro-contundente (projétil de arma defogo); corto-contundente (atua no corpo pelo corte e pelo peso, como p. ex., o machado, a foice, que dão causa à decapitação, ablação, esgorjamento – ferida aberta); contundente- habitual (limitam-se nas feridas ao ponto do traumatismo causado, como p. ex., o bastão, barra de ferro, martelo, etc.); 2. cortante – giletes e similares (que atuam somente pelo corte lateral); pérfuro-cortante (além de perfurar o organismo, atuam pela ação do corte lateral, como as facas, punhais, navalhas, canivetes, etc.); 3. perfurante – normalmente tem forma cilíndrica ou cilindro-cônica, como os pregos, agulhas, etc. (ZACHARIAS) Homicídio simples hediondo: O homicídio qualificado é tido pela Lei 8.072/90, como crime hediondo, portanto, com as conseqüências decorrentes. Contudo, a mesma lei considera o homicídio simples, art. 121, caput, também como crime hediondo, desde que praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que executado por um só agente. Segundo entendimento jurisprudencial, a capitulação da espécie pelo legislador tratou-se de momento de pouca reflexão, já que sempre se entendeu que a atividade de grupo de extermínio deve ser tida como motivação torpe, e, por conseguinte, homicídio qualificado. A atividade do “justiceiro”, que atua por conta própria, eliminando vidas, certamente age com desmedida indignidade, pelo que configurada a torpeza. Homicídio culposo – Art. 121, § 3º: Trata-se da figura típica prevista no caput do artigo 121, contudo, com outro elemento subjetivo – a culpa – ao contrário das modalidades simples, privilegiada e qualificada, onde o elemento subjetivo é integrado pelo dolo (direto ou eventual). A culpa: Sabe-se que a culpa deriva sempre da imprudência, negligência ou imperícia. Imprudência: é o agir sem precaução, precipitadamente, violando regras de conduta ensinadas pela experiência. Negligência: é o abster-se de um dever de diligência, cuidado. O negligente deixa de tomar as cautelas que deveria. Imperícia: consiste na falta de conhecimentos técnicos e/ou habilitação para o exercício de determinada atividade. Homicídio culposo e causas de aumento de pena – Art. 121, § 4º: 1. inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício – possui o agente conhecimentos técnicos para o exercício de atividade, deixando de aplicá-los, ou sendo negligente ou imprudente no exercício da profissão; 2. deixar o agente de prestar imediato socorro à vítima – consiste na omissão de socorro, que deve ser imediato. Se terceiro presta socorro, até por estar melhor preparado, sendo esta a vontade do agente, não há a causa de aumento; 3. não procurar o agente diminuir as consequências de seu ato – é na verdade seqüência da segunda causa de aumento, distinguindo-se tão somente pelo fato de que aqui, o agente, não tendo como prestar socorro, não busca auxílio de terceiros. Na parte final do parágrafo 4º Eduardo Queiroz de Mello 7 do art. 121, é dito que “... Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 se o crime é cometido contra menor de 14 anos ou maior de 60 anos”. Parece-nos uma incongruência, na medida em que, no caso, são tratadas das causas especiais de aumento de pena do homicídio culposo, dispondo o legislador, por força da Lei 10.741/2003, do aumento em se tratando do homicídio doloso. Homicídio culposo e perdão judicial – Art. 121, § 5º: Trata-se da clemência estatal, caracterizando-se como causa extintiva da punibilidade, art. 107/CP, sendo a decisão judicial meramente declaratória, não absolvendo, nem condenando. Pode ser, p. ex., o caso do cidadão que depois de ter tido sua casa invadida inúmeras vezes, se arma, e determinado dia vê um vulto entrando, disparando um tiro apenas para “assustar”, mas constatando em seguida que matou o próprio filho que chegava em casa vindo de uma festa. Homicídio no trânsito: Regulado pela Lei 9.503, de 23/09/1997, dispõe em seu art. 302: Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: Penas – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. § 1º. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) à metade, se o agente: I – não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação; II – Praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada; III – deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente; IV – no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros. Eduardo Queiroz de Mello 8 CAPÍTULO 3 INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO E AUXÍLIO AO SUICÍDIO Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Parágrafo único. A pena é duplicada: I – se o crime é praticado por motivo egoístico; II – se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. Conceito de suicídio: É a morte voluntária resultante de um ato positivo ou negativo, realizado pela própria vítima, chamando-se também “autocídio”. Deve o suicida não apenas querer, mas saber de que seu ato resultará sua morte. No Brasil não se pune o suicídio, tampouco sua tentativa, por motivos estritamente humanitários, assim como não se pune, p. ex., a autolesão e o exercício da prostituição. Verbos regentes: Induzir – significa criar a ideia suicida a quem não a possui; instigar – estimular uma ideia preexistente; prestar auxílio – cooperar materialmente, oferecendo auxílio na prática suicida. O auxílio por omissão: Trata-se de questão controvertida tanto na doutrina quanto na jurisprudência, havendo duas correntes: 1. Não se admite, vez que a expressão contida no tipo é “prestar auxílio”, implicando, portanto, em ação positiva; 2. Admite-se, desde que o agente tenha o dever jurídico (legal) de impedir o resultado, como no caso do pai ou mãe, que tendo o pátrio poder sobre filho, e sabendo das intenções suicidas deste, nada fazem para impedir o resultado; ou a enfermeira ou cuidadora que, tomando conhecimento da pretensão suicida do paciente, e tendo o dever legal de impedir o resultado, em razão da função ou contrato de prestação de serviços, se omite por completo. Sujeitos do delito e elemento subjetivo: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, enquanto o sujeito passivo há de ter discernimento, consciência, na medida em que não havendo, o crime será o de homicídio. O elemento subjetivo é sempre o dolo (direto ou eventual), não se admitindo a forma culposa. Causas especiais de aumento de pena – Art. 122, § único: 1. o motivo egoístico – configura-se o excessivo apego a si mesmo e ao que se tem (bens materiais), evidenciando um desprezo pelo semelhante. Pratica-se o crime com vistas ao auferimento de algum benefício concreto; 2. a menoridade da vítima – trata-se daquela que menor estando na faixa etária entre os 14 e 18 anos, vez que o menor de 14 anos, se não tem capacidade nem mesmo de consentir num ato sexual, certamente não a terá para a eliminação da própria vida. No caso, o crime será o de homicídio; 3. resistência diminuída – configura-se nos casos em que a vítima encontra-se mais suscetível à sugestão suicida, seja por conta de doenças graves (físicas ou mentais), senilidade, alcoolismo, etc. Tal pessoa, em regra, não tem a menor condição de resistir à idéia suicida que lhe foi passada, em razão da situação Eduardo Queiroz de Mello 9em que se encontra. Ressalte-se que a majorante especial fala de diminuição da capacidade de resistência, de modo que, se não houver como resistir, o crime que se configura é o de homicídio. O pacto de morte: O chamado suicídio conjunto ou pacto de morte deve ser encarado da seguinte maneira: 1. duas pessoas, pactuando o suicídio, cada qual com seu revólver, disparam conjuntamente, mas uma delas sobrevivendo – responde o sobrevivente por induzimento, instigação, auxílio ao suicídio; 2. duas pessoas pactuando o suicídio, mas com um único revólver, não tendo uma delas força suficiente para apertar o gatilho, no que é auxiliada pelo outro, que em seguida dispara contra si mesmo, contudo, sobrevivendo – responde por homicídio. Eduardo Queiroz de Mello 10 CAPÍTULO 4 O INFANTICÍDIO Art. 123. Matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena – detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Conceito: Trata-se do homicídio praticado pela mãe contra o próprio filho, seja nascente ou recém-nascido, sob influência do estado puerperal. Caracteriza-se como espécie de homicídio privilegiado, onde por circunstâncias peculiares e especiais, o legislador entendeu por dar tratamento diferenciado, cominando pena mais branda. É possível a tentativa. Sujeitos do delito: Quanto ao sujeito ativo só pode ser a mãe, enquanto o passivo é o ser nascente ou recém-nascido. É crime próprio. Por força do que previsto no art. 30/CP, a circunstância de caráter pessoal (ser o sujeito ativo a mãe), elementar do crime, se comunica aos demais concorrentes, de modo que aquele terceiro que coopera no crime há de responder por infanticídio, o mesmo se dando no caso da mulher puerpera que auxilia terceiro na morte do filho. Distinção entre infanticídio e abortamento: O tipo penal diz que o crime pode ser cometido durante o parto ou logo após. No último caso, não há dúvida: não há abortamento, vez que neste, a morte há de ser dada intrauterinamente. No primeiro caso, entretanto, tem- se a questão: qual o momento exato em que aquele que concebido deixa o estado fetal para considerar-se nascente? O processo de parto tem início com o rompimento da bolsa das águas (parte da membrana do ovo em correspondência com o orifício uterino), entendendo- se, portanto, que a partir daí, o feto se torna acessível às ações humanas externas. Assim, iniciado o parto, o ser vivo pode ser objeto do crime de infanticídio. Critérios adotados em relação ao infanticídio: 1. honoris causa - causa de honra, que era previsto no CP de 1890, onde a mãe se via punida com pena diminuída se matasse o filho durante ou logo após o parto para ocultar desonra própria; 2. fisiopsicológico - adotado pelo CP vigente, onde se exige que a morte dada pela mãe ao filho, durante ou logo após o parto, deve dar-se com aquela sob influência do estado puerperal. O estado puerperal: Trata-se de elemento normativo do tipo penal, na medida em que necessita de especial valoração por parte do intérprete, buscando-se a definição em outra ciência (medicina). Caracteriza-se pelo estado que envolve a parturiente durante a expulsão da criança de seu ventre. Há alterações de ordem psíquica e física, que podem dar causa a transtornos mentais. Sua origem pode decorrer de sentimentos de medo, dor, rejeição, etc., dando causa a depressões, que fazem com que a mãe não tenha plena consciência do que faz. Pode, portanto, ser considerada uma forma de semi-imputabilidade. Não se pode confundir o estado puerperal com a predisposição da mulher a certas psicoses, que se agravam com aquele estado. Eduardo Queiroz de Mello 11 A circunstância de tempo do crime: Caracteriza-se pelo fato de ter o crime que ser praticado “durante o parto ou logo após”. A perícia se mostra então necessária. O estado puerperal pode estender-se no tempo por algumas horas, ou mesmo por alguns poucos dias, presumindo-se, portanto, que os transtornos mentais vão desaparecendo. O mais correto, já que o Código não delimita, é que o estado puerperal e as alterações psíquicas dele derivadas podem durar do momento em que iniciado o parto até aquele em que a mulher retorna às condições pré-gravidez. Contudo, se a morte do recém-nascido ocorrer passados alguns dias, cabe à defesa demonstrar que os problemas decorrentes do estado puerperal persistiram no tempo. Eduardo Queiroz de Mello 12 CAPÍTULO 5 O ABORTAMENTO Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. Art. 125. Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Pena – reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos. Art. 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. Art. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte. Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico: I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante; II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. Conceito: Consiste na interrupção da gravidez, com a conseqüente destruição do produto da concepção. A vida deve ser interrompida intrauterinamente. Esta interrupção pode dar-se em qualquer das fases da gravidez (ovular – 3 primeiras semanas; embrionária – 3 primeiros meses; fetal – a partir do 3º mês). O objeto jurídico é a vida, protegendo-se o produto da concepção. Questão curiosa é a do embrião mantido fora do útero, em laboratório. Há polêmica a respeito, vez que, em tese, sua eliminação não configura abortamento, na medida em que não se trata de vida intrauterina. Tampouco se pode afirmar do cometimento de homicídio, vez que o embrião, afirmam alguns, não é considerado como pessoa humana. Menos ainda se pode afirmar de crime de dano, art. 163/CP, pois não se trata o embrião de “coisa alheia”. Portanto, é possível afirmar que o fato é, em princípio, atípico. Sobre o assunto, recomenda-se um didático artigo no endereço https://jus.com.br/artigos/31148/o-embriao-humano-diante-do-ordenamento-juridico. Meios e modos idôneos a dar causa ao abortamento: 1. químicos – normalmente substâncias ingeridas, que atuam através da intoxicação; 2. psíquicos – são meios de natureza psicológica, como p. ex., o susto, a sugestão abortiva insistente, etc.; 3. físicos ou mecânicos – constituem-se nos meios mais comuns, como p. ex., a curetagem (raspagem da cavidade uterina, com auxílio da “cureta”, para remoção do feto), que pode, em vários casos, despedaçar o feto na retirada, ou ainda, através de choques elétricos ou térmicos (bolsas de água quente ou gelada no ventre). O auto-abortamento – Art. 124/CP: Caracteriza-se por práticas abortivas feitas pela própria gestante, com vistas à eliminação da vida intrauterina. Trata-se no caso de crime próprio. Pode haver concurso de pessoas, na modalidade participação, como no caso do terceiro que fornece o meio abortivo, ou que induz a gestante à práticaabortiva. Eduardo Queiroz de Mello 13 O abortamento consentido – Art. 126/CP: Apresenta-se a hipótese da prática abortiva ser feita por terceiro, tendo-se o consentimento da gestante. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Mesmo que a gestante auxilie o terceiro nas manobras abortivas, responderá pelo crime previsto no art. 124/CP. A terceira pessoa que realiza a manobra abortiva na gestante, responde pela figura tipificada no art. 126/CP. Aquele que induz a mulher a consentir que outrem lho provoque o abortamento, haverá de responder como partícipe (art. 124/CP). Para que se caracterize a figura do abortamento consentido é necessário que o consentimento seja válido, do contrário, a hipótese será a do art. 125/CP. Consistem hipóteses de consentimento inválido as que dispostas no parágrafo único do art. 126/CP. Abortamento sem o consentimento – Art. 125/CP: Caracteriza-se na modalidade mais grave (pena de reclusão de 3 a 10 anos). As hipóteses do art. 126, parágrafo único, equiparam-se à ausência de consentimento (emprego de fraude, violência ou grave ameaça, ou se a gestante não é maior de 14 anos ou é alienada ou débil mental – inimputável). O abortamento legal – Art. 128/CP: 1. abortamento necessário ou terapêutico: quando não há outro modo de salvar a vida da gestante. Desnecessário o deferimento judicial, mas recomendável parecer de junta médica; 2. abortamento sentimental ou humanitário: quando a gravidez resulta de estupro (art. 213/CP), e a prática abortiva é precedida de consentimento da gestante, ou quando incapaz, de seu representante legal. Não pode o Estado obrigar a mulher a gerar um filho fruto de uma relação sexual violenta ou psicologicamente perturbadora. No caso do abortamento sentimental é necessário prova do estupro (laudo pericial, sentença judicial, ou mesmo, em último caso, boletim de ocorrência policial); 3. abortamento eugênico: É o que se realiza com vistas a impedir que o produto da concepção nasça com deformidade ou enfermidade incurável, não sendo permitido por lei. Contudo, tendo-se de prova cabal da deformidade ou enfermidade, bem como de sua incurabilidade, o Poder Judiciário tem autorizado o abortamento sob o pálio da eximente de culpabilidade denominada inexigibilidade de outra conduta, tanto para a gestante quanto para o médico, levando-se em consideração a lesão psicológica causada à gestante em razão de gravidez cujo produto da concepção dificilmente sobreviverá. Causa de aumento de pena – Art. 127/CP: Tanto no aborto com o consentimento, quanto no aborto sem o consentimento, as penas são aumentadas de 1/3, ou duplicadas, se em consequência do abortamento ou dos meios utilizados para provocá-lo, a gestante vem a sofrer, respectivamente, lesão corporal de natureza grave ou morte. Embora o legislador tenha denominado o dispositivo como qualificadoras do aborto, pela redação verifica-se que se trata de causa especial de aumento de pena (a majoração é fracionária, não havendo a imposição de pena abstrata diferenciada das que previstas nos art. 125 e 126/CP). Consumação e tentativa e elemento subjetivo: Como crime material, onde a consumação se dá com a extinção da vida intrauterina, é perfeitamente possível a tentativa. Há quem diga da impunibilidade do auto-abortamento tentado, com razões na Política Criminal, vez que entre nós não se pune a auto lesão. No tocante ao elemento subjetivo, só pode ser o dolo (direto ou eventual), não se admitindo a forma culposa. Eduardo Queiroz de Mello 14 CAPÍTULO 6 LESÕES CORPORAIS Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. § 1º. Se resulta: I – incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias; II – perigo de vida; III – debilidade permanente de membro, sentido ou função; IV – aceleração de parto. Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos. § 2º. Se resulta: I – incapacidade permanente para o trabalho; II – enfermidade incurável; III – perda ou inutilização de membro, sentido ou função; IV – deformidade permanente; V – aborto. Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos. § 3º. Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos. § 4º. Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. § 5º. O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa: I – se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior; II – se as lesões são recíprocas. § 6º. Se a lesão é culposa: Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano. § 7º. Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4º e 6º do art. 121 deste Código. § 8º. Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121. § 9º. Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. § 10º. Nos casos previstos nos §§ 1º a 3º deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9º deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). § 11º. Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência. § 12º. Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços. Eduardo Queiroz de Mello 15 Conceito: Consiste o crime na ofensa à integridade física ou à saúde (funcional ou mental) de outrem. Tem por bem jurídico a incolumidade do indivíduo, na perspectiva de sua saúde física, ou seja, funcional de qualquer membro, sentido ou função, bem como sua saúde mental. Os sujeitos do delito podem ser quaisquer pessoas, contudo, deverá ser mulher grávida nas qualificadoras do parágrafo 1º, inciso IV, e parágrafo 2º, inciso V. Classificação: A lesão corporal pode ser simples (art. 129, caput); grave (art. 129, § 1º) e gravíssima (art. 129, § 2º). A identificação da lesão simples faz-se por exclusão, ou seja, será qualquer uma, desde que não enquadrada nas hipóteses que a tornam grave. Lesão corporal – vias de fato – injúria real: Não se pode confundir a lesão corporal de natureza leve com a contravenção penal de vias de fato (art. 21 da LCP). Nas vias de fato, não há danos sensíveis no corpo, como p. ex., no pequeno empurrão. Tampouco se pode confundir a lesão corporal simples com a injúria real, pois nesta última o agente usa de violência com vistas a ultrajar a vítima, humilhando-a na dignidade ou decoro (p. ex., um “tapa” dado levemente). O consentimento do ofendido: Nas lesões corporais, ganha espaço a tese do consentimento do ofendido como causa supralegal excludente da ilicitude. É o caso das práticas esportivas (p. ex., pugilismo, MMA, UFC), as tatuagens, etc. A lesão corporal grave – Art. 129, § 1º: 1. Incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias: refere-se às ocupações laborais e cotidianas, incluindo as de lazer; ocupação deve ser lícita; período de incapacidade não se confundecom a duração da lesão; necessário exame pericial complementar esgotados os 30 dias; 2. Perigo de vida: necessidade de perigo concreto e não abstrato; demonstração através de exame pericial; 3. Debilidade permanente de membro, sentido ou função: redução da capacidade funcional; não necessariamente perpétua, mas duradoura; não importa correção através de procedimentos cirúrgicos; se o sentido ou função manifestar-se através de órgãos duplos, a perda de um caracteriza a qualificadora; 4. Aceleração de parto: antecipação do momento do parto; necessário que o agente saiba que a vítima esteja grávida. A lesão corporal gravíssima – Art. 129, § 2º: 1. Incapacidade permanente para o trabalho: refere-se à atividade laborativa; incapacidade deve ser duradoura, não perpétua; necessita de exame pericial; 2. Enfermidade incurável: doença física ou mental não sanável e evolutiva; não se exige certeza da incurabilidade; necessário perícia; recusa da vítima a tratamento arriscado e incerto não afasta a qualificadora; 3. Perda ou inutilização de membro, sentido ou função: é a ablação ou inutilização para funcionamento; o uso de prótese não afasta a qualificadora; 4. Deformidade permanente: dano estético de certa gravidade, permanente; visível, causando impressão vexatória e desconforto a terceiros; uso de próteses não afasta a qualificadora; não está a vítima obrigada a cirurgias, contudo, se feita com sucesso a qualificadora é afastada; 5. Abortamento: comportamento do agente é dirigido à lesão, havendo o preterdolo; deve o agente saber que a vítima está grávida. A lesão corporal seguida de morte e a substituição de pena – Art. 129, §§ 3º e 5º: A hipótese, no caso, é o preterdolo. O resultado mais grave não é desejado, tampouco se assume o risco. A culpa de que se fala há de ser a consciente (com previsão). Se não há Eduardo Queiroz de Mello 16 previsão, ou se a morte decorre de caso fortuito, o agente responde tão só por lesões corporais. O juiz pode substituir a pena de detenção nas lesões leves por multa nos seguintes casos – lesão privilegiada; lesões recíprocas (não se sabe ao certo quem deu início às lesões, tampouco se provou estar um dos agentes em legítima defesa). Art. 129, § 4º: É causa especial de diminuição de pena (lesão corporal privilegiada), se o crime é cometido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo após injusta provocação da vítima. A consumação e a tentativa: Nas lesões corporais, a consumação se dá no momento da ofensa à integridade da vítima. É controversa a possibilidade de tentativa, contudo, acredita-se ser possível, só havendo dificuldade na aferição da lesão pretendida pelo agente (leve, grave ou gravíssima). Não há, entretanto, possibilidade de tentativa na lesão seguida de morte e na lesão culposa. Observações: 1. O elemento subjetivo é o dolo (direto ou eventual), admitindo a forma culposa, art. 129, § 6º; 2. É possível o chamado perdão judicial, causa extintiva da punibilidade, com justificativa na Política Criminal, art. 129, § 8º; 3. Com o advento da Lei 9.099/95, a lesão leve e a culposa passaram a ser de ação penal pública condicionada; 4. Pelo princípio da insignificância, pequenas lesões (simples), que não acarretam maiores ofensas, tais como beliscões, tapas ou palmadas leves, etc., têm sido consideradas como bagatelas, portanto, atípicas; 5. A Lei 10.886, de 17/6/2004, acresceu o parágrafo 9º ao art. 129, versando sobre a violência doméstica, que é a lesão praticada contra “... ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou ainda, prevalecendo-se o agente de relações domésticas, coabitação ou hospitalidade”, punindo com pena de detenção de 03 meses a 03 anos (Lei 11.340/2006); 6. Lesão corporal e tortura – A Lei 9.455, de 07/04/97 prevê o crime de tortura, entretanto, com fins específicos ou mesmo em condições ou situações definidas expressamente. Se da tortura resulta lesão corporal no mínimo grave, há qualificação do crime de tortura; 7. Também em relação à violência doméstica, se a lesão for grave, gravíssima ou seguida de morte, ou ainda se praticada contra pessoa portadora de deficiência, a pena é aumentada em 1/3 (art. 129, § 10º); 8. Aumenta-se a pena de um a dois terços (art. 129, § 12º), se o crime é cometido contra as mesmas vítimas previstas no parágrafo 2º, inc. VII do art. 121/CP. Lesão corporal no trânsito: Regulada pela Lei 9.503, de 23/09/1997, dispõe em seu art. 303: Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor: Penas – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Parágrafo único. Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) à metade, se ocorrer qualquer das hipóteses do § 1º do art. 302. Eduardo Queiroz de Mello 17 CAPÍTULO 7 CRIMES DE PERICLITAÇÃO DA VIDA E DA SAÚDE Art. 130. Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. § 1º. Se é intenção do agente transmitir a moléstia: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 2º. Somente se procede mediante representação. Art. 131. Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de está contaminado, ato capaz de produzir o contágio: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Art. 132. Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, se o fato não constitui crime mais grave. Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço) se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais. Art. 133. Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos. § 1º. Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos. § 2º. Se resulta morte: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos. Art. 134. Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. § 1º. Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. § 2º. Se resulta morte: Pena – detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Art. 135. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa. Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta morte. Art. 135-A. Exigir cheque caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte. Eduardo Queiroz de Mello 18 Art. 136. Expor a perigo a vida o a saúde de pessoasob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina: Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano, ou multa. § 1º. Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. § 2º. Se resulta morte: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos. § 3º. Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) anos. Crimes de perigo: No capítulo, o CP contempla os chamados crimes de perigo, onde inexiste um resultado lesivo a terceiro, mas sim, a potencialidade de ver-se aferido um resultado com a simples exposição a perigo de alguma coisa em face da conduta do agente. Assim, a consumação destes crimes se dá tão só com a mera exposição ao perigo. O elemento subjetivo: No tocante aos crimes de perigo, o elemento subjetivo será sempre o chamado dolo de perigo (direto ou eventual), caracterizado pela vontade de criar situação de risco para a vítima. Os Artigos 130, 131 e 132/CP: 1. Art. 130: Modo de execução – relações sexuais ou atos libidinosos; moléstia venérea – norma penal em branco; necessário contato físico entre os agentes; a exposição a perigo deve ser analisada caso a caso, posto que inexistirá crime, p. ex., se o sujeito passivo for imune a doença; elementos subjetivos – dolo direto de perigo (“... de que sabe”), dolo eventual (“... ou deve saber que está contaminado”) e o dolo direto de dano (§ 1º); a tentativa é possível, p. ex., no caso do sujeito que, portador de doença venérea, não iniciada a “penetração”, tem interrompida a prática. 2. Art. 131: Modo de execução – qualquer ato capaz de produzir o contágio, inclusive, a relação sexual e/ou atos libidinosos; moléstia grave – norma penal em branco; não é necessário o contato físico entre os agentes; elemento subjetivo – dolo direto de perigo; a tentativa é possível, vez que se trata de crime plurissubsistente, portanto, podendo ser fracionada a execução. 3. Art. 132: Trata-se de tipo penal genérico de perigo, válido para todas as formas de exposição da vida ou da saúde de terceiros a perigo de dano, sendo, portanto, crime subsidiário; caracteriza a conduta na exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo direto ou iminente, devendo ser a vítima pessoa certa e determinada, havendo o risco de ser concreto, e podendo o crime ser praticado omissivamente; o elemento subjetivo é o dolo direto de perigo; consuma-se no momento em que por ação ou omissão o agente expor a vítima a risco concreto, direto e iminente quanto a sua vida ou saúde, sendo admissível a tentativa desde que seja possível fracionar os atos de execução; na causa de aumento de pena visou- se punir mais gravemente aqueles que fazem transporte de trabalhadores para prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, sem garantir-lhes a segurança necessária. Eduardo Queiroz de Mello 19 Os Artigos 133 e 134/CP: 1. Art. 133: Consiste o crime em largar a vítima à própria sorte em local onde a mesma se vê desprotegida; os sujeitos do delito são próprios, posto que necessário que o sujeito passivo esteja sob o cuidado, guarda, vigilância ou autoridade do sujeito ativo; a incapacidade da vítima não é jurídica, mas real; necessário a prova concreta do perigo, sendo possível a tentativa desde que praticado o crime em vários atos; o elemento subjetivo é o dolo direto de perigo. 2. Art. 134: Consiste em expor ou abandonar recém-nascido, criando-se situação de perigo concreto; trata-se de crime próprio, pois praticado pela mãe que, p. ex., concebeu o filho fora do matrimônio, vez que a intenção é ocultar a própria desonra. Admite-se que o pai adulterino ou incestuoso possa ser sujeito ativo; o elemento subjetivo é o dolo direto de perigo; consuma-se o crime na exposição ou abandono do recém-nascido, sendo a tentativa possível na conduta omissiva. A omissão de socorro – Art. 135/ CP: Trata-se de crime omissivo próprio, consistindo em deixar o agente de prestar assistência quando possível, desde que não havendo risco pessoal, ou não pedir o socorro à autoridade competente, quando estiver diante de criança extraviada ou abandonada, pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo. Justifica-se a criminalização, face os deveres de solidariedade e humanidade que a todos alcança. Condutas: Cuida-se, no caso, de omitir-se na prestação de assistência imediata, desde que possível sem risco pessoal. Havendo risco, deve o agente pedir socorro à autoridade competente, sob pena de não o fazendo, responder pelo crime. O risco pessoal: Ninguém está obrigado a enfrentar o perigo, atuando heroicamente, posto que, sendo a situação de risco elementar do crime, é ela excludente da tipicidade. O risco pessoal há de ser aferido diante do caso concreto, sendo certo, entretanto, que havendo aludido risco, excluída a tipicidade em qualquer das formas de conduta. Sujeitos do delito: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, contudo, o sujeito passivo há que estar enquadrado nas situações previstas no tipo penal. Elemento subjetivo: É o dolo direto ou eventual de perigo, devendo o agente ter a vontade dirigida a não prestação do socorro ou não solicitação do mesmo à autoridade, havendo necessidade da consciência da situação da vítima. O dolo eventual pode caracterizar-se pela dúvida quanto à situação da vítima, e conseqüente assunção do risco na não prestação do socorro ou não solicitação do mesmo. Consumação e tentativa e concurso de pessoas: Consuma-se no momento exato da abstenção do comportamento devido, não havendo possibilidade de tentativa, vez que praticado o crime em ato único. É possível o concurso de agentes, seja sob a égide da coautoria, seja da participação (por instigação). Causas de aumento de pena: A pena aumenta-se, se da omissão resulta lesão corporal grave ou morte. No caso, o elemento subjetivo é o preterdolo (dolo no que se refere à omissão, e culpa no que respeita ao resultado mais gravoso). Eduardo Queiroz de Mello 20 Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial – Art. 135-A/CP – (Lei 12.653, de 28/05/2012): Caracteriza o crime o “exigir” (obrigar, determinar, impor) qualquer garantia (cheque-caução, nota promissória, ou qualquer documento que implique em reconhecimento de uma dívida que possa ser cobrada adiante – elementos normativos do tipo), ou preenchimento de formulários, como condição prévia para atendimento médico-hospitalar de emergência. O que se pune, é fazer tal exigência antes do devido atendimento de urgência, não significando que hospitais, casas de saúde e similares não possam, no seu devido tempo, cobrar regularmente por tais serviços. O sujeito ativo, evidentemente, será aquele que determina tal exigência (diretor, gerente, etc.), enquanto o sujeito passivo, obviamente, é o paciente necessitado de atendimento emergencial. Elemento subjetivo é o dolo genérico, não havendo um fim especial de agir, consumando- se o crime no momento em que é feita a exigência, não sendo possível, a princípio, a tentativa. Maus-tratos – Art. 136/CP: Constitui o crime na exposição a perigo da vida ou saúde de pessoa que se encontra sob a autoridade, guarda ou vigilância do sujeito ativo, para fins de educação, ensino, tratamento ou custódia, privando-se o sujeito passivo seja de alimentação, seja de cuidados indispensáveis, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado, ou abusando dos meios de correção ou disciplina.Sujeitos do delito: Pela redação típica, deve o sujeito passivo encontrar-se sob a autoridade, guarda ou vigilância do sujeito ativo para fins de 1. Educação – É a atividade com o fim de aperfeiçoamento intelectual, moral, profissional, etc.. É, portanto, o caso de pais, tutores, curadores, professores do ensino médio ou superior); 2. Ensino – Onde são ministrados conhecimentos na formação da personalidade. Assim, os pais, tutores, curadores, professores do ensino básico e fundamental); 3. Tratamento – Abrange não só a busca da cura para doenças, como também a continuidade na assistência. É o caso dos médicos, enfermeiros, cuidadores, pais, etc.; 4. Custódia – Refere-se exclusivamente à “detenção” no sentido amplo da palavra, desde que autorizado por lei, como p. ex., delegados e carcereiros em relação a presos. Inexistindo a relação, não haverá crime. A mulher não pode ser sujeito passivo em relação ao marido, exceto se estiver sob os cuidados dele na seqüência, p. ex., de tratamento médico em face de enfermidade. Modos de execução do crime: 1. privação de alimentação – conduta omissiva, bastando que a privação seja relativa (deixar de dar comida em quantidade necessária e condizente); 2. privação de cuidados necessários – conduta omissiva, negando-se os cuidados indispensáveis, como p. ex., negativa de assistência médica, de condições mínimas de higiene, etc.; 3. sujeição a trabalho excessivo ou inadequado – será trabalho excessivo aquele que supera os limites do sujeito passivo, levando-o ao cansaço extremo. Inadequado é o trabalho incompatível com as condições pessoais da vítima (idade, sexo, desenvolvimento físico ou mental); 4. abuso dos meios de correção ou disciplina – consiste na pouca ou nenhuma moderação no uso de meios corretivos ou para imposição de disciplina. Elemento subjetivo: É o dolo direto de perigo, agindo o agente de modo a maltratar a vítima expondo-a a perigo sua integridade física ou mental, devendo o agente ter consciência dos abusos praticados. Eduardo Queiroz de Mello 21 Consumação e tentativa: Consuma-se com a prática pelo agente dos atos descritos na redação típica, pondo em risco a vida ou a saúde da vítima, sendo o crime de perigo concreto, pelo que o risco há de ser provado. A tentativa é inadmissível nas formas omissivas. Qualificadoras e causa de aumento de pena – Art. 136, §§ 1º, 2º e 3º: Caracterizam-se as qualificadoras pelo resultado mais grave, sendo o elemento subjetivo o preterdolo (dolo no antecedente – maltratar, culpa no conseqüente – lesão grave ou morte). A causa especial de aumento de pena é relativa à menoridade de 14 anos da vítima. Eduardo Queiroz de Mello 22 CAPÍTULO 8 O CRIME DE RIXA Art. 137. Participar de rixa, salvo para separar os contendores: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 2 (dois) meses, ou multa. Parágrafo único. Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. Conceito: Caracteriza-se pelo confronto generalizado envolvendo três ou mais pessoas, não havendo necessidade do contato físico entre os rixosos, sendo crime plurissubjetivo. “A rixa, popularmente chamada de sarrilho, furdunço, baderna, rolo, banzé, fuzuê, barulho, é a briga desordenada, o conflito generalizado, o tumulto de imprevisíveis conseqüências, na qual se envolvem, segundo a maioria dos tratadistas, três ou mais pessoas”. (PIRES) Sujeitos do delito: Podem ser quaisquer pessoas, onde todos são ao mesmo tempo sujeitos ativos e passivos. Os rixosos serão todos coautores, desde que envolvidos na refrega, podendo haver participação, no caso daquele que, não se envolvendo no confronto, o atiça, criando, p. ex., animosidades. O elemento subjetivo, consumação e a tentativa: O elemento subjetivo é caracterizado pelo dolo (animus rixandi), consistente na vontade livre e consciente de tomar parte no conflito. Consuma-se o crime no momento em que iniciado o confronto. Não há rixa, se o conflito se formou em virtude de agressão levada a efeito por um grupo contra outro, isto porque perfeitamente identificados os autores da agressão. A possibilidade de tentativa é duvidosa, entretanto, alguns acreditam ser possível no caso, p. ex., da rixa planejada, vez que os grupos rivais ao se dirigirem para o local do conflito podem ser impedidos. Rixa qualificada – Art. 137, § único: Dá-se no caso de haver morte ou lesão corporal grave em virtude da rixa. 1. Identificado o autor da lesão ou morte – responde pela lesão ou morte em concurso material de crimes com a rixa qualificada. Os demais respondem pela rixa qualificada, inclusive a vítima das lesões; 2. Não identificado o autor da lesão ou morte – todos os rixosos respondem pela rixa qualificada, inclusive a vítima das lesões; 3. Na hipótese de haver quando da rixa, mera tentativa de homicídio, seu autor responde pelo crime tentado em concurso com a rixa simples, enquanto os demais rixosos respondem somente pela rixa simples. Eduardo Queiroz de Mello 23 CAPÍTULO 9 CRIMES CONTRA A HONRA Art. 138. Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. § 1º. Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. § 2º. É punível a calúnia contra os mortos. § 3º. Admite-se a prova da verdade, salvo: I – se, constituindo o fato imputado crime de ação penal privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; II – se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no n. I do art. 141; III – se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível. Art. 139. Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. Parágrafo único. A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções. Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa. § 1º. O juiz pode deixar de aplicar a pena: I – quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II – no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. § 2º. Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. § 3º. Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Art. 141. As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: I – contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro; II – contra funcionário público, em razão de suas funções; III – na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria: IV – contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria. Parágrafo único. Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro. Eduardo Queiroz de Mello 24 Art. 142. Não constituem injúria ou difamação punível: I – a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador; II – a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica,salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar; III – o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício. Parágrafo único. Nos casos dos n. I e III, responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade. Art. 143. O querelado que, antes da sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena. Parágrafo único. Nos caso em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa. Art. 144. Se, de referências, alusões ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não a dá satisfatórias, responde pela ofensa. Art. 145. Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3º do art. 140 deste Código. Conceito de honra: É o conjunto de atributos morais, éticos, de honestidade, respeitabilidade, que tornam alguém bem conceituado socialmente. Honra objetiva é o julgamento que a sociedade faz do cidadão, ou seja, a imagem que ele desfruta no meio social. Honra subjetiva é o conceito que o cidadão tem de si mesmo, ou seja, é um sentimento de autoestima, de autoimagem. Honra comum é aquela inerente a todo cidadão, enquanto honra especial é a relativa a certos grupos sociais ou a determinados indivíduos, relacionada às atividades exercidas. Chamar por exemplo, um médico-cirurgião de “açougueiro” é atentar contra a honra especial, enquanto chamar alguém de “burro”, é ofender a honra comum. A calúnia – Art. 138/CP: Constitui-se na atribuição falsa a alguém de um fato definido como crime. Ofende a honra objetiva, pois fere a honorabilidade da pessoa perante a comunidade. Não é exigido rigor técnico na imputação, contudo, dizer que alguém é “ladrão” ou “estelionatário” caracteriza-se em injúria e não calúnia, assim como atribuir a alguém a prática de uma contravenção penal é difamação. Sujeitos do delito: Os sujeitos do delito podem ser quaisquer pessoas, havendo inclusive a possibilidade dos mortos serem sujeitos passivos, porquanto se leva em consideração a memória e o respeito devido aos mesmos. Também as pessoas “desonradas” podem figurar no pólo passivo do crime, vez que, em princípio, não existem pessoas totalmente desonradas, portanto, num determinado contexto, aqueles que desonrados podem ser sujeitos passivos da calúnia. Eduardo Queiroz de Mello 25 A pessoa jurídica: Discute-se se pode a pessoa jurídica ser sujeito passivo do crime de calúnia. A princípio, impossível a hipótese, muito embora exista corrente defendendo da possibilidade, face entendimento onde admitida a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Diferente no caso de difamação, onde a pessoa jurídica pode ser sujeito passivo. A falsidade da imputação e o elemento subjetivo: Na redação típica, necessário que o fato criminoso imputado seja falso, havendo o agente que ter consciência dessa falsidade, contudo, autores acreditam que estando o agente na dúvida quando a falsidade, o crime pode ser caracterizado (HUNGRIA). Quanto ao elemento subjetivo, a corrente majoritária é no sentido de exigir o dolo específico, ou seja, a vontade livre, consciente e especial de macular a honra alheia, atribuindo-lhe fato criminoso, o chamado animus caluniandi. O denominado animus jocandi, ou seja, a brincadeira de péssimo gosto no dizer da pessoa alheia, para a corrente majoritária, não caracteriza o crime. A classificação e a consumação: Trata-se a calúnia de crime comum, comissivo, caracterizado numa ação positiva, sendo admitida a tentativa se praticado em dois ou mais atos. Pune-se ainda a calúnia, se ela é propalada, divulgada. A consumação ocorre quando terceiro toma conhecimento da imputação, portanto, bastará que uma única pessoa tome conhecimento da imputação, daí, ferir a honra objetiva. A exceção da verdade: Trata-se de incidente processual, merecendo, portanto, solução antes da decisão da causa ser proferida. Caracteriza-se em forma de defesa indireta, através da qual o agente demonstra sua pretensão de provar a veracidade da imputação. Vedações à exceptio veritatis – Art. 138, § 3º: Não pode o querelado ou réu intentar a exceção da verdade quando o fato imputado à vítima (querelante) constitua crime cuja ação penal é de iniciativa privada. Tome-se o exemplo: João imputa a Joaquim ter chamado Manoel de “ladrão, vigarista” e “corno”. Manoel entende por não processar Joaquim por injúria. No caso, Joaquim processando João por calúnia, não pode este último pretender a exceção da verdade. Também não se admite a exceção, quando a calúnia envolve o Presidente da República ou chefe de Governo estrangeiro. Visa-se aqui, não a proteção da pessoa do Presidente, mais sim, do cargo. Finalmente, não pode haver exceção da verdade, quando pelo crime imputado, de ação penal pública, já houve absolvição em sentença irrecorrível. Por exemplo: O mesmo João agora atribui a Joaquim a prática de um homicídio anos atrás, contudo, levado a julgamento na época, Joaquim foi absolvido, tendo a sentença transitada em julgado. Não pode João pretender a exceção da verdade caso seja processado por calúnia por Joaquim. A difamação – Art. 139/CP: Consiste a difamação na atribuição a alguém de fato ofensivo à reputação. É crime que atenta contra a honra objetiva, pois fere a respeitabilidade desfrutada pela vítima perante o meio social. Diferentemente da calúnia, aqui o fato imputado não se caracteriza como criminoso, tampouco necessário que seja falso, bastando que seja ofensivo à reputação. Eduardo Queiroz de Mello 26 Sujeitos do delito: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, contudo, o sujeito passivo há de ser pessoa determinada, na medida em que o fato ofensivo imputado deve ser concreto, determinado. Em princípio, os menores e doentes mentais podem ser sujeitos passivos da difamação, assim também a pessoa jurídica, vez que possui reputação, que pode ser denegrida ante a imputação de fatos desabonadores. Elemento subjetivo: Caracteriza-se na vontade livre e consciente de atentar contra a reputação alheia, atribuindo-lhe fato desabonador. É o chamado dolo específico, ou seja, o animus diffamandi, exigindo-se, portanto, um fim especial de agir. Não há crime, se o agente atua p. ex., com animus jocandi, ou mesmo, se o agente age em estado de exaltação emocional ou durante discussão verbal. Consumação e tentativa: Consuma-se o crime no momento em que terceiro toma conhecimento da imputação, e por conta disso, fere a chamada honra objetiva. Não há possibilidade de tentativa, se perpetrada a difamação pela forma oral, vez que não há como ser a ação fracionada, contudo, se por escrito, é perfeitamente possível, bastando imaginar o agente que prepara folhetos difamatórios contra alguém, estando prestes a fazer a distribuição ou quando vai erguer um cartaz ofensivo, sendo então interceptado ou impedido. Por certo, houve início da realização do tipo penal, que não se integralizou por circunstâncias alheias à vontade do agente. A exceção da verdade – Art. 139, § único: Por não importar na difamação que o fato imputado sejafalso ou verdadeiro, não se admite em regra a exceptio veritatis, contudo, ela se apresenta possível quando a ofensa for contra funcionário público, desde que a ofensa guarde relação direta com a atividade funcional do ofendido. A injúria – Art. 140/CP: Ao contrário da calúnia e da difamação, onde a ofensa constitui- se na imputação de fato (criminoso ou ofensivo à reputação, respectivamente), na injúria tem-se uma adjetivação, ou mesmo uma atitude, caracterizadas pela manifestação de menosprezo do agente em relação à vítima. Atenta contra a denominada honra subjetiva. Modos de injuriar: 1. imediata – quando proferida pelo próprio agente; 2. mediata – quando usada uma terceira pessoa para ofender (p. ex., uma criança); 3. direta – quando atenta contra o próprio ofendido; 4. oblíqua ou reflexa – quando além do ofendido atinge-se terceiro; 5. simbólica – quando, no ofender, usa-se de objetos, como no caso de dar-se o nome de alguém a um animal, ou quando, p. ex., se despreza ou ignora um gesto amistoso (deixar alguém com o braço estendido, recusando o aperto de mão). Dignidade e decoro: Embora não tendo maior importância, há diferença entre dignidade e decoro, sendo a primeira, o sentimento de respeitabilidade ou amor próprio, enquanto o segundo diz respeito ao mesmo sentimento de respeitabilidade, contudo, vinculado aos atributos morais, de postura. Sujeitos do delito: Os sujeitos do delito da injúria podem ser quaisquer pessoas, contudo, exige-se do sujeito passivo capacidade de compreensão da adjetivação vilipendiosa ou do desrespeito ofensivo, de modo que é importante se aferir no caso concreto se, p. ex., os doentes mentais e as crianças podem ser sujeitos passivos do crime. Eduardo Queiroz de Mello 27 Elemento subjetivo: Tal qual na calúnia e na difamação, também na injúria o elemento subjetivo há de ser o dolo específico, consistente na vontade livre, consciente e especial de macular a honra alheia, o chamado animus injuriandi. Se o agente age com animus jocandi ou narrandi, não há crime. Consumação e tentativa: A injúria consuma-se quando o ofendido toma conhecimento da ofensa, sendo irrelevante que venha a se sentir ofendido, bastando ter a ofensa idoneidade para macular a honorabilidade. Não precisando ser praticada na frente do ofendido, basta que chegue ao seu conhecimento para efeitos da consumação. Admite tentativa somente na forma escrita, onde poderá haver um fracionamento da ação. O perdão judicial na injúria – Art. 140, § 1º: Pode o juiz deixar de aplicar a pena, concedendo o perdão judicial, causa extintiva da punibilidade, nos casos de: 1. provocação reprovável da vítima, e, 2. retorsão imediata que consista em outra injúria. No primeiro caso, assemelha-se à violenta emoção, seguida de injusta provocação da vítima. A provocação pode consistir num fato criminoso ou inadequado, não revestido de tipicidade e ilicitude. A retorsão imediata caracteriza-se pela troca mútua de insultos, justificando-se o perdão pelo ditado “chumbo trocado não dói”. A injúria qualificada – Art. 140, §§ 2º e 3º: 1. violência ou vias de fato – Pode a injúria consistir em violência ou vias de fato, que por sua natureza ou pelo meio empregado são considerados aviltantes. No caso, o agente no intuito de infamar, humilhar excessivamente a vítima, emprega de violência (bofetada no rosto), ou vias de fato (puxões de orelha, cabelo, cusparada, leves tapas em certas partes do corpo). Se da violência derivar lesões corporais, responde o agente pelo resultado mais grave em concurso com injúria real. Se forem apenas vias de fato, esta é absorvida pela injúria qualificada; 2. injúria racial – Com redação determinada pela Lei 10.741, de 01/10/2003, caracteriza-se em injúria qualificada o dirigir-se a alguém com argumentos ou palavras de conteúdo pejorativo atinentes a raça, cor, etnia, religião ou origem. Visou-se punir aqueles que ofendem outros com insultos de forte conteúdo discriminatório. É diferente, portanto, dos crimes resultantes de preconceitos de raça e de cor (Lei 7.716, de 05/01/1989), como no caso, p. ex., de racismo, onde o objetivo do agente é sempre a segregação; 3. injúria contra idoso e deficiente - Caracteriza injúria qualificada a ofensa praticada contra pessoa idosa ou portadora de deficiência. Exclusão do crime – Art. 142/CP: Não constitui injúria ou difamação quando – 1. A ofensa for irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou procuradores. Tem- se aqui a chamada imunidade judiciária, prevista na Constituição Federal e no Estatuto da Advocacia e da OAB. Necessário, entretanto, que a ofensa se dê em juízo (alegações orais ou escritas, audiência, etc.), devendo ter nexo com a discussão da causa, e que seja proferida pelas partes (litigantes, membro do Ministério Público, ao entendimento de que parte processual) ou pelos procuradores. O entendimento majoritário é de que a ofensa a juiz não é alcançada pela imunidade. 2. Também não constitui injúria ou difamação a opinião desfavorável de crítica literária, artística ou científica. Ancora-se a eximente na liberdade de expressão (imunidade crítica) e no risco de sujeitar-se à crítica todo aquele que expõe seu trabalho. Entretanto, necessário que não haja a inequívoca intenção de injuriar ou difamar, podendo a crítica ser dura, ferina. “Não comete crime se o crítico diz que o livro Eduardo Queiroz de Mello 28 revela a “ignorância” do autor, contudo, há crime se diz que a obra mostra ‘um notório plagiário’” (HUNGRIA). 3. Também não há crime de injúria ou de difamação em face da imunidade funcional, caracterizada pelo conceito desfavorável de funcionário público no cumprimento do dever de ofício. Ao funcionário público é permitido emitir parecer onde extravasada opinião negativa a respeito de alguém. Não fosse essa imunidade, não poderia, p. ex., o delegado de polícia, no relatório que encerra o inquérito policial, manifestar-se desfavoravelmente sobre os antecedentes do indiciado. Retratação e ação penal nos crimes contra a honra – Art. 143, § único e Art. 145/CP: Na calúnia e na difamação é possível a retratação, desde que feita antes da sentença. É causa extintiva da punibilidade expressa no art. 107/CP. Entretanto, para ser válida, tem que ser “cabal”, ou seja, irrestrita, de forma a restituir a honra ofendida ao estado anterior à ofensa. Sua validade independe da aceitação do ofendido. Se praticado os crimes através de meios de comunicação, a retratação se dará, se for a vontade do ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa. No tocante à ação penal, em regra nos crimes contra a honra, ela é de iniciativa privada. Contudo, na injúria qualificada onde da violência empregada resulta lesão corporal tem-se das seguintes hipóteses: 1. se lesões graves ou gravíssimas, a ação penal é pública incondicionada; se lesões leves, a ação penal é pública condicionada à representação; 2. dependerá a ação penal de requisição do Ministro da Justiça, se os crimes forem praticados contra o Presidente da República ou chefe de Governo estrangeiro, e de representação do ofendido, se praticados contra funcionário público no exercício de suas funções; 3. também será condicionada à representação a injúria consistente em elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem, e contra idoso ou portador de deficiência. Do pedido de explicações – Art. 144/CP: Nos crimes contra a honra, é prevista a chamada interpelação judicial, onde o ofendido pode solicitar sejam dadas explicações em Juízo acerca das ofensas. Não é uma preliminar para o efeito de ajuizar-se a ação penal, pois pode esta ser interposta independentemente da interpelação. Ocorre que,
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