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UNIVERSIDADE DE FORTALEZA Direito Penal I (PARTE GERAL) Período: 2013.1 Nota de Aula Prof. Antonio Sergio PENA RESTRITIVA DE DIREITO 1. CONCEITO: “as penas restritivas de direito, juntamente com a de multa, constituem as chamadas penas alternativas, que têm por finalidade evitar a colocação do condenado na prisão, substituindo-a por certas restrições (perda de bens, limitação de fim de semana, interdição de direitos) ou obrigações (prestação pecuniária).” (André Estefam & Victor Gonçalves, 2013, p. 507). 2. ESPÉCIES: o Código Penal, no artigo 43, elenca o rol taxativo das pe- nas restritivas de direitos, a saber: - prestação pecuniária; - perda de bens ou valores; - prestação de serviços à comunidade ou a entidade públicas; - interdição temporária de direitos; e - limitação de fim de semana. 3. CARACTERÍSTICAS: a) autonomia: trata-se de uma pena autônoma e não acessória, de modo que não pode ser cumulada com a pena privativa de liberdade (art. 44, caput, CP); b) substitutividade: “porque resultam do procedimento judicial que, depois de aplicar uma pena privativa de liberdade, efetua a sua substitui- ção por uma ou mais penas restritivas de direitos, desde que presentes os re- quisitos legais” (Cleber Masson, 2012, p. 676). Só estão presentes na parte ge- ral do CP, embora estejam presentes, também, em algumas leis especiais, como o Código de Trânsito Brasileiro. c) Precariedade: “as penas restritivas podem ser reconvertidas em privativa de liberdade no juízo das execuções caso o sentenciado cometa algu- ma das transgressões previstas em lei” (André Estefam & Victor Gonçalves, 2013, p. 508). 4. REQUISITOS PARA CONCESSÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DI- REITO (art. 44, CP): 4.1 Requisitos objetivos: a) quantidade da pena privativa de liberdade aplicada (art. 44, I, CP): deve ser igual ou inferior a 4 anos. No caso de condenação por crime culposo, a substituição será possível, independentemente da quantida- de da pena imposta, não existindo tal requisito; b) natureza da infração penal (art. 44, I, CP): crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa. O crime culposo, mesmo quando perpetrado com emprego de violência, como é o caso do homicídio culposo e das lesões corporais culposas, admite a substituição por pena restritiva. A lei, portanto, refere-se apenas à violência dolosa. 4.2 Requisitos subjetivos: a) não ser o réu reincidente em crime doloso (art. 44, II, CP). “Atualmente, o reincidente pode beneficiar-se da substituição, pois a nova lei vedou o benefício apenas ao reincidente em crime doloso. Dessa forma, so- mente aquele que, após ter sido definitivamente condenado pela prática de um crime doloso, vem a cometer novo crime doloso fica impedido de beneficiar-se da substituição. Se entre a extinção da pena do crime doloso anterior e a práti- ca do novo delito doloso tiverem decorrido mais de 5 anos, o condenado fará jus à substituição, não subsistindo a vedação (o chamado período depurador, também conhecido como prescrição quinquenal da reincidência)” (Capez, 2011, p. 432). A reincidência em crime culposo não impede a concessão da pena restritiva de direitos. Excepcionalmente, permite-se a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos ao reincidente em crime doloso, desde que (a) a medida seja socialmente recomendável; e (b) não se tra- tar de reincidente específico, isto é, cometimento do mesmo crime (art. 44, § 3º, CP) – há doutrinadores que discordam desta possibilidade. b) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta ou a perso- nalidade ou ainda os motivos e circunstâncias recomendarem a substi- tuição. Convém notar que esses requisitos constituem uma repetição das cir- cunstâncias constantes do art. 59, caput, do CP, salvo duas: comportamento da vítima e consequências do crime, coincidentemente as únicas de natureza objetiva. Assim, o art. 44, III, do CP somente levou em conta as circunstâncias subjetivas do mencionado art. 59. 4.3 Alguma situações peculiares: a) Tráfico de drogas e penas restritivas de direitos: a lei n. 11.343/2006 prevê a pena mínima para o tráfico em 5 anos, logo, em regra, é incabível a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direi- tos. Contudo, a mesma lei, no seu artigo 33, § 4º, prevê a possibilidade de re- dução desta pena de 1/6 a 2/3, logo, a pena in concreto poderia ficar abaixo dos 4 anos e, portanto, atenderia o requisito objetivo do tempo para a conces- são da pena restritiva de direito. Acontece que, na mesma lei, no artigo 44, ca- put, há a vedação legal de substituir a pena privativa de liberdade em restritiva de direitos para os crimes de tráfico. O STF, entretanto, no julgamento do HC 97.256/RS, julgou inconstitucional o artigo 44, caput, da Lei n. 11.343/2006, por violar o princípio da individualização da pena e, por- tanto, o condenado pela prática do crime de tráfico de entorpecentes que faça jus ao redutor de 1/6 a 2/3 (precisa ser primário, de bons antece- dentes e não integrar organização criminosa e não se dedicar costumeiramente ao tráfico), atende ao requisito da quantidade da pena (não ultrapassa 4 anos), fazendo jus a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, desde que atenda aos demais requisitos. b) Crimes hediondos e penas restritivas de direitos: nos casos em que a pena aplicada não ultrapassar 4 anos e não ocorrer violência contra a pessoa, a exemplo do crime tentado de estupro de vulnerável pratica- do sem violência (esta é presumida), o STJ vem permitindo a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos (STJ, HC 90.380/ES). Há setores da doutrina que afirmam ser incompatível a substituição da pena priva- tiva de liberdade por restritiva de direitos nos crimes hediondos, em face do re- gime inicial para tais delitos ser o fechado, contudo, o STF, no julgamento do HC 111.840/ES, declarou inconstitucional este dispositivo da Lei dos Crimes He- diondos que fixava o regime inicialmente fechado. c) Infrações de menor potencial ofensivo cometidas com violência ou grave ameaça contra a pessoa: como as infrações de menor potencial ofensivo (pena máxima in abstrato não superior a 2 anos) se caracterizam pela possibilidade do infrator obter pena restritiva de direitos ou multa, decorrente da transação penal (art. 76 da Lei n. 9099/95), não faz sen- tido que, em caso de condenação, não possa receber o benefício, desde que presentes os demais requisitos legais, como primariedade e bons antecedentes. d) Violência doméstica ou familiar contra a mulher: o art. 17 da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) estabelece: “é vedada a apli- cação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa”. Observa-se que esta lei veda, parcialmente, a concessão da pena restritiva de direitos. Permite-se, por- tanto, a substituição da pena privativa de liberdade de restritivas de direitos, exceto as pecuniárias e de cestas básicas, bem como a substituição por multa, desde que não haja violência física ou grave ameaça contra a mulher. 5. DURAÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO: nos termos do art. 55 CP, as penas restritivas de direito têm a mesma duração da pena priva- tiva de liberdade aplicada na sentença. Logo, se o réu foi condenado a 2 anos de reclusão, o juiz poderá substitui-la por 2 anos de prestação de serviços à co- munidade. Saliente-se, no entanto, que, caso o juiz substitui esta pena de 2 anos de reclusão por prestação pecuniária ou perda de bens, não haverá relação com o limite temporal da pena privativa de liberdade. 6. REGRAS PARA A SUBSTITUIÇÃO (art. 44, § 2º, CP) a) Pena fixada na sentença igual ou inferiora 1 ano: substitui-se por multa ou por uma pena restritiva de direitos; b) Pena fixada na sentença superior a 1 ano: substitui-se por duas pe- nas restritivas de direitos, ou por uma pena restritiva e outra de multa. 7. RECONVERSÃO DA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS EM PRIVATI- VA DE LIBERDADE (art. 44, § 4º, CP): o Código Penal e a LEP estabelecem hipóteses em que a pena restritiva de direitos será convertida em privativa de liberdade: a) descumprimento injustificado da restrição imposta (art. 181, LEP); b) superveniência de condenação a pena privativa de liberdade por outro crime, desde que a nova condenação torne inviável o cumpri- mento da pena restritiva de direitos anteriormente imposta (art. 45, § 5º, CP). Portanto, se o acusado foi condenado a uma pena privativa de liberda- de que foi substituída por prestação pecuniária, não haverá a conversão desta pena restritiva em privativa de liberdade, posto que a nova condenação não in- terferirá no cumprimento da pena restritiva anterior. c) prática de falta grave (art. 51, LEP). 8. PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO EM ESPÉCIE 8.1 Prestação pecuniária: consiste no pagamento em dinheiro à ví- tima, aos seus dependentes, ou à entidade pública ou privada com destinação social, em montante não inferior a 1 salário-mínimo e nem superior a 360 salário míninos (art. 45, § 1º, CP). Quando o valor for pago à vítima, será descontado do montante de eventual condenação em ação de repara- ção civil, se coincidentes os beneficiários (art. 45, § 1º, CP). Se houver aceita- ção do beneficiário, a prestação pode consistir em prestação de outra natu- reza (Ex: entrega de cestas básicas a entidades assistenciais). Em caso de descumprimento, o juiz determina a conversão em pena privativa de liberda- de. No caso de violência doméstica contra a mulher, é vedada a aplicação de pena de prestação pecuniária ou de entrega de cestas básicas (art. 17. Lei n. 11.340/2006). 8.2 Perda de bens ou valores: consiste na retirada de bens e valo- res integrantes do patrimônio lícito do condenado, transferindo-os ao Fundo Penitenciário Nacional. Seu valor terá como teto - o que for maior - o mon- tante do prejuízo causado ou do proveito obtido pelo agente ou por terceiro, em consequência da prática de crime (art. 45, § 3º, CP). 8.3 Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públi- cas: "consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas em estabeleci- mentos assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos ou outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais (art. 46, §§ 1º e 2º, CP)" (André Estefam & Victor Gonçalves, 2013, p. 517). Só se adota a prestação de serviço à comunidade se a pena aplicada na sentença for superior a 6 me- ses. Os serviços devem ser prestados à razão de 1 hora de trabalho por dia de condenação. 8.4 Interdição temporária de direitos: "consiste na proibição do exercício de determinados direitos pelo prazo correspondente ao da pena subs- tituída. Algumas são específicas, porque aplicáveis apenas aos crimes que o próprio Código menciona, e outras são genéricas, porque passíveis de aplicação a qualquer infração penal" (André Estefam & Victor Gonçalves, 2013, p. 517). a) Específicas: - Proibição do exercício de cargo, função pública ou mandato eletivo (art. 47, I, CP). Só se aplica ao crime cometido no exercício do cargo, função ou mandato eletivo, com violação de deveres a eles inerentes, nos termos do art. 56, CP. Quando à proibição do exercício do mandato eletivo, há quem defenda a inconstitucionalidade deste dispositivo legal, por colidir com o art. 55, VI e § 2º, da CF. - Proibição do exercício de atividade, profissão ou ofí- cio que dependa de licença especial ou autorização do poder público (Ex: dentista, médico, corretor, etc). Trata de restritiva específica, pois só se aplica aos crimes cometidos no exercício da profissão ou atividade e se houver violação de deveres a estas relativos (CP, art. 56); - Suspensão de autorização ou de habilitação para di- rigir veículo: (art. 47, III, CP): só se aplica aos crimes culposos no trânsito. Este dispositivo legal deve ser harmonizado com o Código de Trânsito Nacional, posto que este estabelece, como pena autônoma, a suspensão de habilitação e permissão para dirigir veículo. Logo, esta pena restritiva de direitos só seria aplicada no caso de suspensão de autorização para dirigir veículo (exigida para condução de ciclomotores, isto é, veículo de duas ou três rodas, provido de um motor de combustão interna, cuja cilindrada não exceda a 50 cm cúbicos e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a 50 km/h. - Proibição de inscreve-se em concurso, avaliação ou exames públicos: destinada a pessoas condenadas por fraude em certame de interesse público. b) Genéricas: proibição de frequentar determinados lugares (art. 47, IV, do CP). 8.5 Limitação de fim de semana: a limitação de fim de semana consiste na obrigação do condenado de permanecer aos sábados e domingos, por 5 horas diárias, na Casa do Albergado (LEP, art. 93) ou outro estabeleci- mento adequado. O estabelecimento encaminhará mensalmente ao juiz da exe- cução relatório sobre o aproveitamento do condenado. PENA DE MULTA 1. CONCEITO: "é uma modalidade de sanção penal de caráter patrimonial consistente na entrega de dinheiro ao Fundo Penitenciário" (André Estefam & Victor Gonçalves, 2013, p. 523). Observe que o destino da multa não é o Fundo Penitenciário Nacional, portanto, os Estados podem legislar sobre o tema, crian- do seus próprios fundos. 2. ESPÉCIES DE MULTA: pode ser originária, ou substitutiva. 2.1 Multa originária: é aquela descrita em abstrato no tipo penal incriminador. Pode ser prevista de forma isolada (nas contravenções pe- nais, a exemplo do art. 61), cumulativa (exemplo: art. 155, caput, CP) ou alternativa (exemplo: art. 147, CP). 2.2 Substitutiva ou Vicariante: "é a prevista no art. 60, § 2º, CP: 'a pena privativa de liberdade aplicada, não superior a 6 meses pode ser substituí- da pela de multa, observados os critérios dos incisos II e III do art. 44 do CP" (Cleber Masson, 2012, p. 710). Os requisitos, portanto, são: pena privativa de liberdade não superior a 6 meses, que o réu não seja reincidente em crime do- loso e que as circunstâncias do art. 59 CP lhe sejam favoráveis (pouco impor- ta se o crime é praticado mediante violência ou grave ameaça contra a pessoa). Há doutrinadores, a exemplo de Damásio e Capez, que entendem que o art. 60, § 2º, CP foi revogado tacitamente pela Lei 9714/98 que deu nova redação ao artigo 44, § 2º do CP, possibilitando a substituição da pena privati- va de liberdade por multa quando a pena for igual ou inferior a 1 ano. 2.3 Cálculo do valor da multa: de acordo com o artigo 49, CP, a pena de multa deverá ser de 10 a 360 dias-multa. Como calcular o número de dias-multa? Segue-se o critério trifásico delineado no artigo 68 do CP, isto é, fixa a pena-base de dias-multa com observância das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, CP; depois, aplica as agravantes e atenuantes genéricas e, por fim, as causas de aumento e de diminuição da pena. Depois de calcular o número de dias-multa, passa-se a calcular o valor de cada dia-multa. Como calcular o dia-multa? Leva-se em consideração a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, CP, não podendo ser inferior a 1/30 do maior salário-mínimo vigente ao tempo fato e nem superior a cinco vezes esse salá- rio. Após o cálculo, se o juiz verificar que o valor é ineficaz e insuficiente diante da situação econômica do réu, poderá triplicar o valor da multa. 2.4 Pagamento da multa: transitada em julgada a sentença que im- pôs a pena de multa, o condenado será intimado para pagá-la no prazo de 10 dias, podendo, inclusive, ser parcelado a pedido do condenado (art. 50, caput, CP). 2.5Execução da pena de multa: caso o condenado não pague a pena de multa, não poderá o juiz convertê-la em pena privativa de liberdade. De acordo com o artigo 51 do CP, a multa não paga passará a ter a natureza de dívida tributária, ocasião em que será encaminhada ao órgão competente para que seja extraída certidão da dívida ativa, cabendo à Procuradoria da Fazenda ingressar com a execução do valor da multa perante o juízo das execuções fiscais. BONS ESTUDOS NOS LIVROS!
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