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DISCIPLINA: LITERATURA BRASILEIRA II Conteudistas: Luiz Fernando Medeiros de Carvalho e Marcélia Guimarães Paiva Aula 3 - Romantismo e liberdade em Castro Alves Meta Apresentar uma reflexão a respeito da poesia romântica brasileira condoreira a partir da interpretação de um poema de Castro Alves. Objetivos: Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Contextualizar a poesia de Castro Alves na sociedade brasileira do século XIX; 2. avaliar a importância de Castro Alves na poesia política; 3. refletir sobre a importância da questão da liberdade e da justiça social – tema da poesia de Castro Alves – na literatura e na sociedade brasileiras atuais. 1. INTRODUÇÃO O Brasil do século XIX conheceu a instabilidade política com a disputa de liberais e conservadores pelo poder após a abdicação ao trono de Pedro II. A economia, ancorada na produção escravista e exportadora, recebia pressão do mundo capitalista pela abolição do trabalho escravo. A população brasileira livre também pressionava para que houvesse valorização do trabalho e parcelas mais liberais da sociedade engajavam-se pela fim da escravidão, influenciadas por valores europeus. Pode-se observar no Brasil reflexos da Revolução Industrial e da criação do trabalho livre, que foram determinantes de uma lógica econômica com interesse pelo aumento, tanto do número de consumidores como da mão de obra disponível. Havia uma crise do Brasil puramente rural ao passo que surgia uma sociedade urbana. Com o fim do tráfico negreiro em 1850, o investimento do capital é diversificado e direcionado às atividades urbanas. Ao fim da guerra do Paraguai, aumentaram os questionamentos a respeito da escravidão, visto que negros alforriados formavam o contingente do exército brasileiro. Em paralelo, as ideias republicanas se disseminavam. Mas a história da abolição da escravidão caminhou muito devagar no Brasil. Atitudes para retardar seu fim foram tomadas, como a Lei do Ventre Livre, de 1871, 2 e a Lei dos Sexagenários, de 1885. Por fim, foi assinada a Lei Áurea, já com a imigração recebendo incentivos governamentais. É nessa sociedade profundamente desigual e injusta que se desenvolve o Romantismo na literatura brasileira com a preocupação de valorizar uma cultura que se diferenciasse da metrópole e destacasse as características da ex-colônia. É também no século XIX que aparece um público leitor no Brasil. Este fato contribuiu para a criação do caráter sistêmico da literatura brasileira e para o crescimento da cultura urbana. O Romantismo é classificado em três fases, especialmente, na poesia romântica a partir de 1836, ano de publicação da primeira obra considerada do Romantismo brasileiro, Suspiros poéticos e saudades, de Gonçalves de Magalhães. A primeira fase é a nacionalista, indianista e religiosa; a segunda valoriza a morte, o pessimismo e tem uma estética macabra. Devido à educação de caráter europeu dada aos jovens de famílias mais abastadas, a produção literária acompanhava as respostas que a “[...] inteligência europeia dava a seus conflitos” (BOSI, 2006, p. 92). Essa literatura aspirava fundar, como na obra de Gonçalves Dias e José Alencar, uma nobreza brasileira em um passado mítico. Nesse esquema não cabia a figura do escravo ou do negro. Mas, na segunda metade do século XIX, as “nostalgias aristocráticas” já não têm função na dinâmica social, quando os ideais de progresso das “classes médias avançadas” se adensam, conforme escreve Alfredo Bosi (2006, p. 93). É nessa época que se desenvolve a terceira fase do Romantismo – a do grupo condoreiro –, que cria uma poesia comprometida com as lutas sociais e políticas. Em meio aos movimentos abolicionista e republicano, surge o poeta como porta-voz das novas aspirações sociopolíticas da nascente sociedade democrática. É nesse grupo que se encontra Castro Alves, poeta baiano nascido em 1847 e morto em 1871. 3 Figura 3.1: Fotografia de Castro Alves. Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/d8/Castro_Alves.jpg A poesia de Castro Alves tem um forte cunho social, mas é também épica, erótica e lírica. Suas descrições da natureza sempre exuberante, como convém à estética romântica, são acompanhadas por autêntica solidariedade aos mais fracos socialmente. Seu canto a favor da libertação dos escravos resulta de um sentimento feito de “[...] imagens grandiosas que tomam à natureza, à divindade, à história personalizada o material para metáforas e comparações” (BOSI, 2006, p. 121). Castro Alves publicou em vida apenas Espumas flutuantes. Sua obra é grande e de temas variados. Também publicava em jornais e declamava suas obras em lugares públicos, saraus e sacadas. Dois dos poemas mais famosos de Castro Alves, “O navio negreiro” e “Vozes d’África”, são exemplos dessa poesia para ser ouvida. Ambos foram compostos em 1868, bem depois do último desembarque clandestino de escravos, em 1855, no Brasil. Assim, são “fragmentos épicos” e não “poesia política didática, de intenção circunstancial imediata” (ZAGURY, 1971, p. 39). Os poemas foram publicados em 1883, no livro Os escravos, inteiramente inseridos na campanha abolicionista. A respeito dos poemas “Vozes d’África” e “O navio negreiro”, Bosi (1996, p. 249), comenta que “O protesto e a denúncia expressos nos dois poemas são reais e 4 vividos, e a sua eloquência mana da mais pura indignação”. A seguir, veremos em “O navio negreiro” como Castro Alves utiliza o texto para denunciar a escravidão. BOXE DE CURIOSIDADE Antes de continuarmos, veja um exemplo da popularidade de Castro Alves: seu nome já foi uma marca de cigarros. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do? select_action=&co_obra=21611 5 FIM DO BOXE DE CURIOSIDADE 2. O POEMA “O NAVIO NEGREIRO” O poema é organizado em seis partes. Como tem um ritmo musical, pode-se considerar que são seis cantos nos quais o poeta muda de tema e de ritmo, determinado pela posição das sílabas tônicas e pelo número de sílabas nos versos. A primeira parte é constituída por nove quadras de versos decassílabos. Esse detalhe dá um caráter popular como se o poeta quisesse que o leitor se entregasse descuidadamente à descrição de uma natureza exuberante e alegre, na qual luar e ondas brincam como crianças. Poeta e leitor têm uma visão distanciada, panorâmica, ampla, como indicam as reticências. A descrição é de uma cena sagrada e harmoniosa ao ponto de ser possível a fusão das figuras do mar e do firmamento: ‘Stamos em pleno mar... Doudo no espaço Brinca o luar – dourada borboleta; E as vagas após ele correm... cansam Como turba de infantes inquieta. ‘Stamos em pleno mar... Do firmamento Os astros saltam como espumas de ouro... O mar em troca acende as ardentias, - Constelações do líquido tesouro... (ALVES, 2013, p. 60) Bosi (2006, p. 123) chama a atenção para a preferência de Castro Alves por aspectos da natureza que, como nessas estrofes, dão ideia de imensidade e infinitude nos poemas. No início de “O navio negreiro”, há uma cena grandiosa contendo movimentos leves e orquestrados. O navio do tipo brigue que aparece é rápido, como um pássaro ou um corcel. Depois de usar a primeira pessoa do plural para mostrar-se plenamente identificado com o objeto do poema e envolver o leitor com o intuito de persuadi-lo a abraçar uma causa, na sexta estrofe o eu lírico marca a importância de sua presença no cenário. Daí para frente, sem desequilibrar a cena, o poeta é o sujeitofeliz que se dirige aos marinheiros para beber a “selvagem, livre poesia” e é responsável pela narração ao leitor. A voz no poema é sempre a do poeta. É ele quem se dirige ao navio, aos marujos, aos elementos da natureza, a Deus e a si mesmo. 6 É nessa primeira parte que aparece o poeta romântico, assim descrito por Eliane Zagury (1971, p. 14): “[...] ar distante, quase mediúnico, semblante melancólico; súbito êxtase e palavras de fogo para revelar o mundo e o homem, face iluminada, momento de pública e coletiva transcendência”. Para surpresa do leitor, no poema “O navio negreiro”, o eu lírico afirma estar aterrorizado na penúltima estrofe da primeira parte. Depois de uma longuíssima reticência, estão suspensas a descrição da natureza e a invocação dos marinheiros. O eu lírico também está surpreso e pede ajuda àquele que está acima de todos, capaz de ver de longe e através do véu que engana, o poeta condor: Por que foges assim, barco ligeiro? Por que foges do pávido poeta? Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira Que semelha no mar – doudo cometa! Albatroz! Albatroz! águia do oceano, Tu que dormes das nuvens entre as gazas, Sacode as penas, Leviathan do espaço, Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas. (ALVES, 2013, p. 62) Sobrepondo-se ao eu lírico atemorizado, surge o poeta como um ser mitológico, poderoso, monumental como a natureza, qualificado como “albatroz”, “águia”, “Leviathan”. Ao dizer que o pássaro dorme “entre as gazas” das nuvens, o poeta parece se comparar ao sol, isolando-se. No entanto, tem o propósito de aproximar-se cada vez mais da cena, como se pode perceber nas partes seguintes. ATIVIDADE 2 (Atende ao objetivo 1) Vamos nos deter mais nessa figura do albatroz. Leia o poema “L’albatros” de Charles Baudelaire, publicado em 1857, e sua tradução: L'albatros Souvent, pour s'amuser, les hommes d'équipage Prennent des albatros, vastes oiseaux des mers, Qui suivent, indolents compagnons de voyage, Le navire glissant sur les gouffres amers. A peine les ont-ils déposés sur les planches, Que ces rois de l'azur, maladroits et honteux, Laissent piteusement leurs grandes ailes blanches Comme des avirons traîner à côté d'eux. 7 Ce voyageur ailé, comme il est gauche et veule! Lui, naguère si beau, qu'il est comique et laid! L'un agace son bec avec un brûle-gueule, L'autre mime, en boitant, l'infirme qui volait! Le Poète est semblable au prince des nuées Qui hante la tempête et se rit de l'archer; Exilé sur le sol au milieu des huées, Ses ailes de géant l'empêchent de marcher. Fonte: BAUDELAIRE, Charles. Les fleurs du mal. In: BAUDELAIRE, Charles. Oeuvres complètes. Paris: Robert Laffond, 1980. O albatroz Às vezes, por prazer, os homens de equipagem Pegam um albatroz, enorme ave marinha, Que segue, companheiro indolente de viagem, O navio que sobre os abismos caminha. Mal o põem no convés por sobre as pranchas rasas, Esse senhor do azul, sem jeito e envergonhado, Deixa doridamente as grandes e alvas asas Como remos cair e arrastar-se a seu lado. Que sem graça é o viajor alado sem seu nimbo! Ave tão bela, como está cômica e feia! Um o irrita chegando ao seu bico em cachimbo, Outro põe-se a imitar o enfermo que coxeia! O poeta é semelhante ao príncipe da altura Que busca a tempestade e ri da flecha no ar; Exilado no chão, em meio à corja impura, A asa de gigante impedem-no de andar. Fonte: BAUDELAIRE, Charles. O albatroz. Tradução de Guilherme de Almeida. In: MAGALHÃES JÚNIOR, R. Antologia de poetas franceses do século XV ao século XX. Rio de Janeiro: Gráfica Tupy, 1950. Observe o que há de comum e diferente entre as imagens do albatroz nos dois poemas “O albatroz” e “O navio negreiro” e redija um texto a respeito. DEIXAR 15 LINHAS Resposta comentada: 8 Espera-se que o aluno destaque, a partir da leitura dos dois poemas, a respeito da figura do albatroz: 1) representa o poeta; 2) é a imagem de um ser majestoso; 3) está em tensão com a figura dos homens do navio; 4) representa o poeta em uma missão de beleza ou justiça, em “O navio negreiro”, conforme escreve Antonio Candido no livro Formação da literatura brasileira: momentos decisivos, 1750-1880. A respeito dos dois poemas, espera-se que o aluno destaque que: 1) a presença do mar sugere imensidade, profundidade, abismo; 2) enquanto “O albatroz” rompe com o mito do poeta com aura, “O navio negreiro” ressalta o lugar elevado do poeta; 3) os poemas são criação de dois poetas contemporâneos; mas enquanto Castro Alves é considerado um autor romântico, Charles Baudelaire é considerado um dos precursores do Simbolismo e fundador da tradição moderna em poesia. FIM DA ATIVIDADE Na parte II do poema “O navio negreiro”, o eu lírico interpela os marinheiros do navio e os descreve referindo-se às glórias de cada nação de sua origem. Além de possuir nobreza, os marinheiros são amantes da poesia, cantam como personagens que vêm à frente do palco. Sua presença valoriza a cena e denota uma comunhão entre a natureza e os seres humanos. A terceira parte é constituída por apenas uma estrofe na qual o poeta incita o albatroz a aproximar-se mais: Desce do espaço imenso, ó águia do oceano! Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano Como o teu mergulhar no brigue voador! Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras! É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ... Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror! (ALVES, 2013, p. 64) A surpresa do eu lírico torna-se maior. Ele sente necessidade de aproximar- se mais devido à sua natureza humana. Em “O navio negreiro”, Casto Alves mostra como se afasta, em sua obra, dos ideais do condoreirismo devido ao reconhecimento de sua humanidade que leva o albatroz ao tombadilho. No entanto, reforça a importância da influência de Victor Hugo em sua obra com o uso de versos alexandrinos franceses, ou seja, versos de doze sílabas com acento na sexta e na décima segunda sílabas. 9 O uso do “eu” dá ao poeta o status de testemunha por excelência da verdadeira cena até então não percebida. Nessa estrofe percebe-se a ‘missão do vate’ como conceitua Antonio Candido (2007, p. 344): A contribuição típica do Romantismo para a caracterização literária do escritor é o conceito de missão. Os poetas se sentiram sempre, mais numas fases que noutras, portadores de verdades ou sentimentos superiores aos dos outros homens; daí o furor poético, a inspiração divina, o transe, alegados como fonte de poesia. [...] O poeta romântico não apenas retoma em grande estilo as explicações transcendentes do mecanismo da criação, como lhes acrescenta a ideia de que a sua atividade corresponde a uma missão de beleza, ou de justiça, graças à qual participa duma certa categoria de divindade. Missão puramente espiritual, para uns, missão social, para outros – para todos, a nítida representação de um destino superior, regido por uma vocação superior. É o bardo, o profeta, o guia. Pousada no navio, a “águia do oceano” denuncia que não se trata de um jogo, de uma brincadeira agradável entre elementos naturais, mas de uma cena “infame e vil” ao som de um “canto funeral”. Imagine-se a surpresa da plateia ou do leitor. De início, apresenta-se uma natureza pujante que se revela “[...] pano de fundo de cenas que a mancham” (BOSI, 1996, p. 247) como descrito na parte IV do poema: Era um sonho dantesco... o tombadilho Que das luzernas avermelha o brilho. Em sangue a se banhar. Tinir de ferros... estalar de açoite... Legiões de homens negros como a noite, Horrendos a dançar... (ALVES, 2013, p. 64) Esse contrasteentre as imagens agradáveis e a cena real remete ao contraste entre a situação do país e o mundo civilizado (BOSI, 1996, p. 247). Entretanto, o poeta deu pistas de que havia algo por trás da natureza harmoniosa em que estão gloriosos marujos ou, do mesmo modo, de que havia um outro poema por atrás do lido. É interessante notar o uso de palavras e expressões que dão uma sensação de desconforto ou dificuldade, nas estrofes da primeira parte, como “turba”, “abraço insano”, “quente arfar”, “saara”, “canto ardente”, “procela”, “pélagos profundos”, “mar que ruge”. A parte IV do poema “O navio negreiro” mostra um movimento frenético, mas orquestrado como o movimento da natureza descrito no início do poema. Esse frenesi é alimentado pelo uso de dois decassílabos e um hexassílabo alternadamente nas estrofes. A descrição da cena dos homens dançando é carregada de sensações visuais fortes, com a alusão às cores vermelha e preta, e auditivas, com o uso dos verbos tinir e estalar e do adjetivo “estridente”. O mesmo se dá na estrofe seguinte dedicada às mulheres na qual as referências ao sangue e 10 às cores se repetem. Há um tom fantástico no movimento, com um “turbilhão de espectros” e uma “ronda fantástica”: E ri-se a orquestra irônica, estridente... E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais ... Se o velho arqueja, se no chão resvala, Ouvem-se gritos... o chicote estala. E voam mais e mais... (ALVES, 2013, p. 64) O movimento dos personagens torna-se o movimento da serpente, de maneira ascendente para abarcar todo o mundo: homens, mulheres, crianças, jovens e velhos. A parte IV é sumarizada por sua sexta estrofe. Repetem-se as referências ao inferno e à serpente: E ri-se a orquestra irônica, estridente... E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais ... Qual um sonho dantesco as sombras voam!... Gritos, ais, maldições, preces ressoam! E ri-se Satanás!... (ALVES, 2013, p. 65) A imagem inicial suavizada do inferno como um “sonho dantesco” é substituída por “Satanás” em um “[...] fecho retórico grandiloquente que permite, por contraste, a apóstrofe famosa, seguida imediatamente da animização da natureza – panteísta ou não, não vem ao caso” (ZAGURY, 1971, p. 43) que ocorre na parte V: Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura... se é verdade Tanto horror perante os céus?! Ó mar, por que não apagas Co'a esponja de tuas vagas De teu manto este borrão?... Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades! Varrei os mares, tufão! (ALVES, 2013, p. 65-66) Nessa primeira estrofe, o poeta provoca Deus, mas também o público e a natureza. Ao evocar Deus, o poeta não tem intenção religiosa, mas não é pura retórica, segundo o entendimento de Zagury (1971). Essa e a outra apóstrofe famosa do poema “Vozes d’África” (“Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?”) “[...] fazem parte do megalo-mundo que o poeta cria: a quem se irá dirigir um continente que se personifica? Aos homens – átomos de si próprio?” (ZAGURY, 1971, p. 39-40). No poema, o deus convocado deveria solidarizar-se com os desgraçados, mas é o eu lírico que terá essa atitude ao responder à pergunta, na estrofe seguinte, dirigida ao poeta condor. São destacadas suas qualidades – severidade, 11 liberdade e audácia –, que estão de acordo com a ideia citada de poeta romântico expressada por Candido (2007). O eu lírico se põe como porta-voz desses desgraçados, porquanto nem Deus nem a natureza ouvem os gemidos. O poeta convoca a si mesmo para observar mais detidamente os homens e mulheres e faz uma descrição de outra natureza majestosa e hostil na qual um deserto continua o outro. Em paralelo às qualidades do poeta condor, são ressaltadas a pureza, a ousadia e a coragem dos homens e a beleza, a juventude e a inocência das mulheres. Mas um destino cruel é destinado às mulheres tão desgraçadas quanto o personagem bíblico Agar. Ao aproximar a figura das mulheres à figura de Agar, Castro Alves dá uma origem bíblica ao povo africano. E, mais: tendo uma mãe escrava, esse povo está condenado à danação hereditária: São mulheres desgraçadas, Como Agar o foi também. Que sedentas, alquebradas, De longe... bem longe vêm... Trazendo com tíbios passos, Filhos e algemas nos braços, N'alma — lágrimas e fel... Como Agar sofrendo tanto, Que nem o leite de pranto Têm que dar para Ismael. (ALVES, 2013, p. 66) No Gênesis, Agar é a serva egípcia de Sara, esposa de Abraão. Agar gerou um herdeiro para Abraão por determinação de Sara que era estéril. Na nova situação, Sara foi humilhada por Agar. No entanto, Deus estabelece uma aliança com Abraão e lhe promete que essa aliança será perpétua e se estenderá a seu filho, e de Sara, e a sua descendência. Posteriormente, Sara teve um filho chamado Isaque. O texto bíblico reforça que a aliança divina será feita com o filho de Sara, e não com Ismael, o filho de Agar. Ismael caçoava de Isaque, o que irritou Sara. Sara disse a Abraão: “Rejeita essa escrava e seu filho; porque o filho dessa escrava não será herdeiro com Isaque, meu filho” (Gênesis, 21, 10). A seguir, Abraão expulsou Agar e o menino para o deserto. Ao acabar a água de seu odre, a mãe chora e seu pranto comove Deus que os salva. Além de escrava, Agar é a mulher expulsa duas vezes de sua comunidade. Quando são cortados seus laços com a família de Abraão e Sara, o objetivo não é livrá-la da escravidão. Agar e Ismael tornaram-se apátridas, renegados. Ismael é o primogênito sacrificado realmente para que haja uma aliança. Seu sacrifício 12 antecede o sacrifício simbólico do primogênito Isaque com quem Deus faria a verdadeira aliança. Os dois filhos são como gêmeos: um deve ser morto para que o outro tenha vida eterna. BOXE DE CURIOSIDADE Compare as figuras de Agar e de Sara na tela do pintor Julius Schnorr von Carolsfeld (1794–1872) cujo tema é o momento em que Abraão despede-se de Agar e seu filho. Disponível em: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/6/6b/Schnorr_von_Carolsfeld_ Bibel_in_Bildern_1860_027.png/737px- Schnorr_von_Carolsfeld_Bibel_in_Bildern_1860_027.png 13 FIM DO BOXE DE CURIOSIDADE Assim são as mulheres do poema “O navio negreiro”: sedentas, excomungadas, eliminadas quando não têm mais utilidade. Seus filhos são deserdados não por uma lei, mas pelo próprio pai em vida. O eu lírico nomeia todos esses filhos como “Ismael” ao enfatizar que, de modo diferente de Agar, as mulheres do poema são incapazes de chorar. Como Ismael, seus filhos são escravos e não partícipes da aliança entre Deus e os filhos da mulher livre, Sara. Ainda há uma reiteração da ideia do destino do qual não se escapa quando, na estrofe seguinte, o poema faz menção ao desamparo de crianças e jovens expostos aos caprichos de uma caravana. O movimento entre ontem e hoje na descrição do espaço revela uma inversão em relação ao espaço descrito no início do poema e aumenta a estridência do contraste: Ontem plena liberdade, A vontade por poder... Hoje... cúm'lo de maldade, Nem são livres p'ra morrer. . Prende-os a mesma corrente — Férrea, lúgubre serpente — Nas roscas da escravidão. E assim zombando da morte, Dança a lúgubre coorte Ao som do açoute... Irrisão!...(ALVES, 2013, p. 68-69) A estridência não é só do poema, mas também do poeta. Essa é uma arma para conquistar a plateia. Em um jogo de ironia com essa plateia, o eu lírico salienta que aqueles que dançam zombam da morte. Essa “zombaria” levao poeta a duvidar de sua sanidade, perguntando se é ele que delira na estrofe seguinte. Novamente é reiterado o desafio a Deus e à natureza, coniventes com essa insanidade. O tom de surpresa e sofrimento do eu lírico aumenta a cada verso até chegar à sexta parte em que ele assume que a solução deve ser política. A pátria, tema caro aos românticos, não aparece louvada, mas desafiada numa atitude reivindicatória, igualmente uma característica do Romantismo. A nação brasileira é questionada tendo em vista o progresso que teria representado o sucesso na guerra do Paraguai. Em uma provocação direta, o eu lírico entende que as nações devem fazer pressão política pela Abolição, e a República, aludida pela evocação ao Patriarca da Independência, José Bonifácio de Andrada e Silva, será a solução final. O poeta 14 não é um dos heróis dessa nova situação. Sua função é questionar o mito da América como o paraíso da liberdade (BOSI, 1996, p. 246). Também é aquele que chora em solidariedade à bandeira perdida em uma situação contraditória: a bandeira “encerra” – traz em si ou termina com – as “promessas divinas da esperança”. “O navio negreiro” é todo feito dessas imagens paradoxais, permanentemente em choque. A partir do momento em que o poeta se aproxima do navio, o poema passa a utilizar um vocabulário igual ou próximo ao das primeira e segunda partes em um sentido antitético de imagens contrastando. Há oposição entre o veleiro que voa como as andorinhas e os acorrentados que “voam mais e mais” ou “as sombras voam”; entre o canto da natureza e dos marujos e “Outro [...] cantando, geme e ri!”; entre a imagem dos marinheiros como crianças acalentadas e “Magras crianças” com a boca regada pelo sangue das mães; entre “Saudosa bandeira acena” e “Adeus, ó choça do monte” ou “impudente na gávea tripudia”. O azul e o dourado sobressaem na primeira parte enquanto se destacam as referências ao sangue e ao vermelho na parte IV. Existe um paralelo entre as imagens de turba em “turba de infantes inquieta” e turba que ri e “excita a fúria do algoz”, e entre as imagens da orquestra, cujos músicos rugem ou assobiam, e a orquestra que ri, “irônica, estridente”. O poeta também faz uma interessante aproximação entre a representação do mar com a do deserto: no início, o mar é um saara e, depois, um “oceano de pó”. Nas duas metáforas, a imensidão e a hostilidade do espaço são destacadas. Entre uma e outra característica espacial, há a atuação do vate que denuncia que uma imagem é reflexo da outra. A esterilidade do deserto estende-se ao cosmos onde Deus e a natureza não respondem como em “Vozes d’África” (BOSI, 1996, p. 264). O poeta também desloca a imagem bíblica do deserto para o oceano em que acontece a travessia: Depois, o areal extenso... Depois, o oceano de pó. Depois no horizonte imenso Desertos... desertos só... E a fome, o cansaço, a sede... Ai! quanto infeliz que cede, E cai p'ra não mais s'erguer!... Vaga um lugar na cadeia, Mas o chacal sobre a areia Acha um corpo que roer. (ALVES, 2013, p. 67) 15 O futuro são “Desertos... desertos só...”. A danação é total. A travessia não significa chegada à terra prometida, mas à morte ou ao inferno, nas figuras da serpente e de Satanás. O poema refere-se ao destino de amaldiçoados pelo pecado original que tira dos personagens a esperança e a liberdade (BOSI, 1996, p. 264). A imagem do deserto também remete ao processo de despovoamento do continente africano. O poema trata do aniquilamento e da não existência de um povo que apenas o vate é capaz de enxergar. A reiteração das alusões ao deserto, ao inferno e à serpente tem um paralelo no poema “Vozes d’África”. Em “O navio negreiro” também existe um tempo mítico como no outro poema. Segundo Bosi (1996, p. 259), em “Vozes d’África” não há possibilidade de salvação, pois o tempo histórico não pode penetrar no tempo mítico. No entanto, em “O navio negreiro”, Castro Alves aponta a instituição da República não como salvação do povo africano, mas, pelo menos, como uma medida para dar fim à escravidão. CONCLUSÃO Castro Alves ousou tocar em uma situação social iníqua que já não era tolerada por muitos na sociedade que se tornava mais liberal e democrática. No entanto, a confiança na República expressa no poema “O navio negreiro” mostrou- se um engodo. As consequências da escravidão ainda hoje estão presentes na sociedade brasileira. ATIVIDADE FINAL (Atende aos objetivos 1, 2 e 3) 1. Castro Alves morreu antes de ver o Treze de Maio. Segundo Alfredo Bosi (1996, p. 266), “[...] no dia seguinte à Lei Áurea, os escravos foram lançados à própria sorte”. Comente uma das obras de autores diferentes de Castro Alves citadas no texto intitulado “Sob o signo de Cam”, ou outra do mesmo período, confrontando com a esperança expressa na última estrofe de “O navio negreiro”. DEIXAR 20 LINHAS 16 2. Leia atentamente o poema “África” do poeta moçambicano José Craveirinha publicado no livro Xigubo, em 1964: África Em meus lábios grossos fermenta a farinha do sarcasmo que coloniza minha Mãe África e meus ouvidos não levam ao coração seco misturada com o sal dos pensamentos a sintaxe anglo-latina de novas palavras. Amam-me com a única verdade dos seus evangelhos a mística das suas missangas e da sua pólvora a lógica das suas rajadas de metralhadora e enchem-me de sons que não sinto das canções das suas terras que não conheço. E dão-me a única permitida grandeza dos seus heróis a glória dos seus monumentos de pedra a sedução dos seus pornográficos Rols-Royce e a dádiva quotidiana das suas casas de passe. Ajoelham-me aos pés dos seus deuses de cabelos lisos e na minha boca diluem o abstracto sabor da carne de hóstias em milionésimas circunferências hipóteses católicas de pão. E em vez dos meus amuletos de garras de leopardo vendem-me a sua desinfectante benção a vergonha de uma certidão de filho de pai incógnito uma educativa sessão de “strip-tease” e meio litro de vinho tinto com graduação de álcool de branco exacta só para negro um gramofone de magaíza um filme de heróis de carabina ao vencer traiçoeiros selvagens armados de penas e flechas e o ósculo das suas balas e dos seus gases lacrimogéneos civiliza o mau casto impudor africano. Efígies de Cristo suspendem ao meu pescoço em rodelas de latão em vez dos meus autênticos mutovanas da chuva e da fecundidade das virgens do ciúme e da colheita de amendoim novo. E aprendo que os homens que inventaram a confortável cadeira eléctrica 17 a técnica de Buchenwald e as bombas V2 acenderam fogos de artifício nas pupilas de ex-meninos vivos de Varsóvia criaram Al Capone, Hollywood, Harlem a seita Ku-Klux-Klan, Cato Mannor e Sharpeville e emprenharam o pássaro que fez o choco sobre o ninhos mornos de Hiroshima e Nagasaki conheciam o segredo das parábolas de Charlie Chaplin leem Platão, Marx, Gandhi, Einstein e Jean-Paul Sartre e sabem que Garcia Lorca não morreu mas foi assassinado são os filhos dos santos que descobriram a Inquisição perverteram de labaredas a crucificada nudez da sua Joana D’Arc e agora vêm arar os meus campos com charruas “made in Germany” mas já não ouvem a subtil voz das árvores nos ouvidos surdos do espasmo das turbinas não leem nos meus livros de nuvens o sinal das cheias e das secas e nos seus olhos ofuscados pelos clarões metalúrgicos extinguiu-se a eloquente epidérmica beleza de todas as cores das flores do universo e já não entendem o gorjeio romântico das aves de casta instintos de asas em bando nas pistas do éter infalíveis e simultâneos bicos trespassando sôfregosa infinita côdea impalpável de um céu que não existe. E no colo macio das ondas não adivinham os vermelhos sulcos das quilhas negreiras e não sentem como eu sinto o prenúncio mágico sob os transatlânticos da cólera das catanas de ossos nos batuques do mar. E no coração deles a grandeza do sentimento é do tamanho cow-boy do nimbo dos átomos desfolhados no duplo rodeo aéreo do Japão. Mas nos verdes caminhos oníricos do nosso desespero perdoo-lhes a sua bela civilização à custa do sangue ouro, marfim, améns e bíceps do meu povo. E ao som másculo dos tantãs tribais o eros do meu grito fecunda o húmus dos navios negreiros... E ergo no equinócio da minha Terra o moçambicano rubi do mais belo canto xi-ronga e na insólita brancura dos rins da plena Madrugada a necessária carícia dos meus dedos selvagens é a tácita harmonia de azagaias no cio das raças belas como altivos falos de ouro erectos no ventre nervoso da noite africana. Fonte: CRAVEIRINHA, José. Xigubo. 2. ed. Lisboa: Edições 70, 1980. p. 15-17. 18 Redija um texto comparando os poemas “África” de José Craveirinha e “O navio negreiro” de Castro Alves. Cite os versos dos dois poemas para ilustrar seus argumentos. DEIXAR 20 LINHAS Respostas comentadas: 1. Espera-se que o aluno redija um texto abordando uma das obras de Lima Barreto ou Cruz e Sousa citadas no texto (Triste fim de Policarpo Quaresma, Recordações do escrivão Isaías Caminha, Os bruzundangas e Clara dos Anjos de Lima Barreto e “Emparedado” de Cruz e Sousa) enfocando as críticas presentes às instituições como a República e o Exército, aos intelectuais negros, aos ideais republicanos e ao nacionalismo ufanista, entre outras. O aluno deve citar trechos desses textos para exemplificar a crítica contida no romance ou poema escolhido. 2. Espera-se que o aluno redija um texto citando versos dos poemas e contemplando os seguintes pontos: 1) a valorização da natureza e de suas forças telúricas nos dois poemas; 2) a visão da África como a de um conjunto, um cosmo. A figura da África também é a figura da mãe, da nação que protege e dá vida. Nos dois poemas, não há países distinguidos, com exceção do verso “o moçambicano rubi do mais belo canto xi-ronga”, do poema “África”, em que o eu lírico valoriza um lugar determinado, Moçambique; 3) a atuação política e o julgamento ético feito pelos dois poetas expressos nos poemas interpretados; 4) a presença forte e poética do mar: caminho da escravidão, segundo o poema de Castro Alves, ou caminho da escravidão e da libertação, segundo o poema de José Craveirinha; 5) o vocabulário usado nos poemas como expressão da cultura, do tempo e do lugar em que os poetas viveram; 6) temática negra como novidade na poesia brasileira do século XIX e na poesia que se rebelou contra o domínio português nos países africanos. 19 RESUMO Segundo Alfredo Bosi, Castro Alves é um dos maiores poetas brasileiros. Sua poesia participante representa o que há de melhor em crítica social além de contribuir para a existência de outros gestos abolicionistas. O poema “O navio negreiro” visto aqui ressalta as qualidades de um poeta romântico comprometido com as questões políticas e sociais. O poema também põe em relevo o estilo vibrante de Castro Alves, sua maestria em usar as metáforas, hipérboles e antíteses e sua opção em usar uma natureza magnificada para reforçar sua mensagem. A interpretação do poema “Vozes d’África” feita por Alfredo Bosi (1996), no texto citado “Sob o signo de Cam”, esmiúça as várias referências feitas pelo poema que indicam a erudição do jovem Castro Alves. É interessante ler o texto e completar com pesquisa a respeito dessas referências. REFERÊNCIAS ALVES, Antônio Frederico de Castro. Os escravos. Disponível em: <www.dominiopublico.gov.br>. Acesso em: 20 dez. 2013. BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 43. ed. São Paulo: Cultrix, 2006. ___________. Sob o signo de Cam. In: ___________. Dialética da colonização. 3. ed., 1. reimpr. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. p. 246-272. CANDIDO, Antonio. O Romantismo como posição do espírito e da sensibilidade. In: ____________. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos, 1750-1880. 11. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2007. p. 341-352. CASTRO Alves – retrato falado do poeta. Direção: Silvio Tendler. Intérpretes: Bruno Garcia; Tereza Freire; Dira Paes e outros. Roteiro: André Luis de Oliveira, Silvio Tendler e Tânia Fusco. Rio de Janeiro: Caliban, 1999. 1 DVD (70 min), fullscreen, color. CRAVEIRINHA, José. Xigubo. 2. ed. Lisboa: Edições 70, 1980. SECCO, Carmen Lucia Tindó Ribeiro. Craveirinha e Malangatana: cumplicidade e correspondência entre as artes. Scripta, Belo Horizonte, v.6, n.12, p. 350-367, jan. 2003. 20 ZAGURY, Eliane. Castro Alves de todos nós. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1976. O Brasil do século XIX conheceu a instabilidade política com a disputa de liberais e conservadores pelo poder após a abdicação ao trono de Pedro II. A economia, ancorada na produção escravista e exportadora, recebia pressão do mundo capitalista pela abolição do trabalho escravo. A população brasileira livre também pressionava para que houvesse valorização do trabalho e parcelas mais liberais da sociedade engajavam-se pela fim da escravidão, influenciadas por valores europeus. Pode-se observar no Brasil reflexos da Revolução Industrial e da criação do trabalho livre, que foram determinantes de uma lógica econômica com interesse pelo aumento, tanto do número de consumidores como da mão de obra disponível. Havia uma crise do Brasil puramente rural ao passo que surgia uma sociedade urbana. Com o fim do tráfico negreiro em 1850, o investimento do capital é diversificado e direcionado às atividades urbanas. Ao fim da guerra do Paraguai, aumentaram os questionamentos a respeito da escravidão, visto que negros alforriados formavam o contingente do exército brasileiro. Em paralelo, as ideias republicanas se disseminavam. Mas a história da abolição da escravidão caminhou muito devagar no Brasil. Atitudes para retardar seu fim foram tomadas, como a Lei do Ventre Livre, de 1871, e a Lei dos Sexagenários, de 1885. Por fim, foi assinada a Lei Áurea, já com a imigração recebendo incentivos governamentais. É nessa sociedade profundamente desigual e injusta que se desenvolve o Romantismo na literatura brasileira com a preocupação de valorizar uma cultura que se diferenciasse da metrópole e destacasse as características da ex-colônia. É também no século XIX que aparece um público leitor no Brasil. Este fato contribuiu para a criação do caráter sistêmico da literatura brasileira e para o crescimento da cultura urbana. O Romantismo é classificado em três fases, especialmente, na poesia romântica a partir de 1836, ano de publicação da primeira obra considerada do Romantismo brasileiro, Suspiros poéticos e saudades, de Gonçalves de Magalhães. A primeira fase é a nacionalista, indianista e religiosa; a segunda valoriza a morte, o pessimismo e tem uma estética macabra. þÿ Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/d8/Castro_Alves.jpg A poesia de Castro Alves tem um forte cunho social, mas é também épica, erótica e lírica. Suas descrições da natureza sempre exuberante, como convém à estética romântica, são acompanhadas por autêntica solidariedade aos mais fracos socialmente. Seu canto a favor da libertação dos escravos resulta de um sentimento feito de “[...] imagens grandiosas que tomam à natureza, à divindade, à história personalizada o material para metáforas e comparações” (BOSI, 2006, p. 121). 2. Leia atentamente o poema “África” do poeta moçambicano José Craveirinha publicado no livro Xigubo, em 1964: ALVES, Antônio Frederico de Castro. Os escravos. Disponível em: <www.dominiopublico.gov.br>.Acesso em: 20 dez. 2013.
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