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ip
272 REINVENTANDO O GOVERNO
Não consigo ver como é possível termos uma revolução
tecnológica, uma revolução social, uma revolução na infor¬mação, revoluções, além disso, moral, sexuale epistemológica,
e não igualmente uma verdadeira revolução política ... Em
palavras simples, a tecnologia política da era industrial não
é mais apropriada para a nova civilização que se forma ànossa volta. Nossa política é obsoleta.
9-
Governo descentralizado:
da hierarquia à participação
e ao trabalho de equipe
1
Nada pode substituir o conhecimento de um trabalhador acerca de seu local
de trabalho. Não importa quão inteligente seja o chefe, nem tampouco sua
capacidade de liderança. Só conseguirá liberar o potencial máximo dos seus
empregados trabalhando com eles, em vez de contra eles.— Ronald Contino, ex-diretor do Departamento de Saneamentoda Cidade de New York
Há 50 anos, as instituições centralizadas eram indispensáveis.
As tecnologias de informação eram primitivas, a comunicação entre
localidades diferentes difícil, e a mão-de-obra disponível relativa¬
mente pouco instruída. Não havia outra alternativa, senão a de
juntar todos os profissionais de saúde em um mesmo hospital, todos
os funcionários públicos em uma mesma organização ou todos os
bancários em uma ou duas grandes instituições, de modo a que a
informação pudesse ser concentrada e as ordens cumpridas com
maior eficiência.
Havia tempo de sobra para que a informação subisse lentamente
toda a cadeia hierárquica e, depois, descesse, pelo mesmo percurso,
sob a forma de decisões.
Hoje em dia, entretanto, a informação é praticamente sem limi¬
tes. A comunicação entre as mais recônditas localidades é instan¬
tânea. Muitos funcionários públicos têm boa formação acadêmica,
e as condições mudam à velocidade da luz. Não se pode desper¬
diçar tempo com o lento fluxo de informações hierarquia acima,
í*
'
IjFI
274 Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO 275
de ordens hierarquia abaixo. Tomemos, por exemplo, o caso dodiretor de uma determinada escola que descobre que alguns deestudantes carregam um bip para se comunicar com traficantes dedroga. Em um sistema centralizado, o diretor solicitaria ao con¬selho educacional que promulgasse um dispositivo qualquer regu¬lamentando o uso dos bips. Quando a decisão finalmente fossetomada, seis meses mais tarde, os estudantes já estariam usandotelefones celulares, ou, quem sabe, até armas.
No mundo de hoje, as coisas simplesmentefuncionam melhor seos funcionários públicos — nas escolas, nas secretarias de habi¬tação, nos parques e nos programas de treinamento profissionali-
zante — tiverem autonomia para tomar algumas decisões pota própria.
Alvin Toffler, em seu livro Anticipatory Democracy, diz que,era da informação, “a pressão por um sistema mais ágil de tomadade decisões fica seriamente restrita pela complexidade e a poucafamiliaridade das circunstâncias sobre as quais deve se decidir.”O resultado é “uma sobrecarga esmagadora sobre as tomadas dedecisões - em essência, um choque político do futuro.” Tofflerapresenta duas respostas possíveis:
dade crescente do mercado; e o nosso super-herói contra as drogas
assiste, impotente, ao espetáculo das guerras e dos tiroteios que
varrem as ruas de cidade em cidade.
Os líderes empresariais procuram, instintivamente, a abordagem
descentralizadora. Deslocam grande parte das decisões para a peri¬
feria, pelas muitas formas que já descrevemos aqui, delegando-as
clientes, às comunidades e às organizações não-governamen¬
tais. As decisões restantes são empurradas para os escalões infe¬
riores, horizontalizandoa hierarquia e dando maior autonomia a cada
membro.
As instituições descentralizadas apresentam uma série de van-
ou
seus
aos
tagens:
Primeiro: instituições descentralizadas são muito mais flexí¬
veis que as instituições centralizadas e podem responder
muito mais rapidez a mudanças nas circunstâncias ou
sidades dos clientes. Doug Ross, ex-diretor do Departamento de
Comércio de Michigan, reforça a tese com um exemplo bastante
ilustrativo: “O único meio de servirmos a nosso propósito e nos
adaptarmos às rápidas mudanças no mercado foi a descentralização
da autoridade”, contou-nos. “Não me era possível conhecer tão bem
cada um dos programas que mantínhamos como as pessoas que
estavam em campo, vivenciando as experiências dia a dia. Se as
decisões tivessem de subir por toda a cadeia de comando até chegar
a mim, eu precisaria me inteirar de uma série de detalhes de modo a
ser capaz de tomá-las. E, até que elas fizessem o caminho de volta,
já não poderiam corresponder, com a devida agilidade, às necessi¬
dades de nossos clientes.”
Segundo: instituições descentralizadas são muito mais efici¬
entes que as centralizadas. Os trabalhadores na linha de frente são
mais contato têm com os problemas e as oportunidades
r con-
comna nas neces-
Uma das maneiras é tentar fortalecer, ainda mais,
governamental, concentrando mais e mais políticos, buro¬cratas, especialistas e computadores, no afã, desesperado, desuplantar o crescente aumento da complexidade; a outra écomeçar a reduzir a carga de decisões, compartilhando-acom
o centro
outras pessoas, permitindo que a decisão seja tomada
na periferia, livrando da tarefa ojá esgotado e ineficiente centro de decisões.
por escalões inferiores, ouíI
os que
existentes: sabem o que, de fato, acontece, a cada hora, a cada dia.
Freqiientemente, são capazes de engendrar as melhores soluções, se
tiverem o apoio daqueles que dirigem a organização. Isto dá às
administrações participativas uma tremenda vantagem. Ronald
Contino usou o princípio da administração participativa
pleta reformulação do Centro de Equipamento Motorizado (BME) do
Departamento de Saneamento da Cidade de New York e faz uma
colocação bem coerente: “À luz de nossa própria experiência, posso
trabalhador do BME como o nosso mais valioso
As lideranças tradicionais procuram, instintivamente, a primeirasolução. Diante de uma crise fiscal, tratam de consolidar as agên¬cias e centralizar o controle. Quando as instituições de poupançaquebram, criam uma superagência em Washington. Se o tráfico dedrogas se alastra por toda a parte, elegem um super-herói nacionalpara solucionar o problema. Este instinto, porém, geralmente levaao desastre. A centralização do controle e a consolidação de agên¬cias geram mais desperdício, quando deviam combatê-lo. Nossasinstituições tornam-se cada vez mais obsoletas diante da complexi-
na com-
considerar o
276 111Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO
sobre os informados é diferente: só leva aos resultados esperados
seja exercida por meio da persuasão, envolvendo ou consultan¬
do aqueles com alguma participação no processo decisório.” Em
outras palavras, a autoridade é delegada para cima. “Estruturas
colegiadas, não de comando, deverão compor a base mais natural
para a organização. Em lugar de comando e controle, discussões e
reuniões passam a constituir o padrão obrigatório para se levar a
bom termo as realizações." Cleveland chamou isso de "crepúsculo
da hierarquia."
Enquanto o resto da sociedade luta para fugir, como pode, dos
padrões hierarquizados, seja sob a forma dos movimentos estudan¬
tis dos anos 60, do movimento feminista da década de 70, ou, ainda,
dos movimentos empresariais da década de 80 — os governos, em
maioria, continuam segurando as rédeas. Continuam passando
empregados a mesma mensagem: cumpram as ordens; não
a cabeça; não pensem por si mesmos; não tomem atitudes indepen¬
dentes. Se alguma coisa sair errado, a responsabilidade jamais será
de vocês. Ignorem o fato.Se,mesmo assim, vocês se virem impelidos
a tomar uma decisão, decidam-se por sua segurança. Nunca, jamais
se exponham a um risco.
Esta mensagem é altamente destrutiva. Por décadas e décadas,
atemorizado os funcionários públicos, amansando-os, tornan¬
do-os passivos e amargurados. Em organizaçõeshierarquizadas,
tradicionais, podem até reclamar, mas não conseguem conceber a
idéia de tomar o controle em suas próprias mãos.
A inércia resultante tem um preço altíssimo. “Ao verificar o
desperdício, algumas pessoas clamam por um sistema mais centra¬
lizado de controle”, diz Gifford Pinchot III. “Mas o desperdício
não está sendo gerado por mecanismos ineficientes
Decorre exatamente de se tirar o controle real das únicas pessoas
suficientemente próximas do problema, para fazer alguma coisa.”
Para trazer o controle de volta às mãos daqueles que se encon¬
tram na ponta mais baixa da hierarquia, onde as coisas, de fato,
acontecem, os líderes empreendedores empregam um variado nú¬
mero de estratégias. Usam uma administração participativa, vi¬
sando a descentralizar o processo de tomada de decisões;
jam o trabalho em equipe, buscando superar as rígidas barreiras que,
hierarquizadas, afastam as pessoas; criam, ainda,
verdadeiras campanhas institucionais, de modo a proteger aqueles
património. São mais capazes de incorporar melhorias nas organiza¬ções e de resolver seus problemas do que um monte de especialistasadministrativos e todas as suas idéias sobre o que precisa ser feitonos locais de trabalho. Munidos dos programas de participaçãofuncional por nós implantados, os trabalhadores têmvantagem: trata-se de seu próprio local de trabalho."Terceiro: instituições descentralizadas são muito mais inova¬doras do que as centralizadas. Foi o que concluíram os estrategis-tas da Faculdade Kennedy de Estudos Governamentais, de Harvard,em seu trabalho junto com o Programa de Fomento à Inovação, daFundação Ford. Sua maior surpresa, segundo seus próprios relatos,foi verificar que a inovação não surge, fundamentalmente, de umagrande idéia de alguém lá no topo, que, de repente, elabora um plinfalível. Ao contrário, as boas idéias costumam brotar dos
caso
uma enorme
ano
suaempre¬gados que estão em contato direto com o público, a quem, de fato,incumbe o trabalho.
usemaos
Quarto: instituições descentralizadas têm moral elevado, sãomais comprometidas e produtivas. Quando os administradoresdepositam sua confiança nos empregados, delegando-lhes decisõesimportantes, emitem um sinal de respeito por seus funcionários.Este é um aspecto particularmente importante em organizaçõescujas atividades envolvem trabalho intelectual. Se precisamos dacompetência e do conhecimento de nossos professores, estrategis-tas de desenvolvimento e ambientalistas, não podemos tratá-loscomo operários industriais em uma linha de montagem. Os emprega¬dores aprendem logo uma lição: para beneficiar-se, efetivamente, dacapacidade intelectual e do conhecimento de trabalhadorespensantes, precisamos dar-lhes autonomia para que tomem deci¬sões. Na administração, modismos surgem e se vão a todo tempo—e disso já sabem todos os funcionários públicos. Mas participaçãonão é moda. Está em toda a parte, em praticamente todas as indús¬trias.
tem
!
íí de controle.f
Harlan Cleveland, antigo decano do Instituto Humphrey da Uni¬versidade de Minnesota, escreveu um livro fascinante a respeito deadministrar em uma economia de conhecimento: The KnowledgeExecutive. “Antigamente, quando apenas um pequeno número depessoas tinha instrução e estava por dentro, a liderança sobre osdesinformados só podia ser exercida segundo padrões verticalmenteestruturados de comando e controle”, diz Cleveland. “A liderança
encora-
nas estruturas
k
!
279278 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado
que usam de sua autoridade para inovar; e, além disso, investem
empregados, para garantir que tenham sempre as habilidadese o moral que possam permitir-lhes fazer o melhor uso possível desua autoridade. Esses líderes descentralizam, também, a autoridadeas organizações governamentais, empurrando as decisões deWashington para os estados e, dos estados, para os municípios.Estas cinco estratégias serão discutidas mais tarde, aindacapítulo.
Os governos que querem passar credibilidade a seus cidadãosnão podem simplesmente dar total liberdade a seus funcionários,obviamente. Os eleitores exigem alguma responsabilidade. Assim,as organizações que promovem esta descentralização de autoridadetambém têm dificuldade em articular suas missões, criar culturasinternas acerca de seus valores fundamentais e, tambémresultados. A responsabilidade pelos recursos gera uma responsa¬bilidade sobre os resultados, e as culturas autoritárias dão lugauma responsabilidade mais solta, como a expressa na obraEm Buscade Excelência, de Peters e Waterman, em que a divisão dos valorese princípios substitui as regras e os regulamentos, tomando-se aargamassa que irá manter unidos os trabalhadores.
mentava, aindamais, oclamor pela centralização. Por fim, o presiden¬
te Johnson assumiu, pessoalmente, o controle da guerra. Da Casa
Branca, comandou bombardeios e grandes ofensivas da infantaria
nos campos de batalha. Seu pessoal, no Pentágono, se debruçava
sobre as fotografias aéreas, elegendo, a 16 mil quilómetros de dis¬
tância, os alvos do bombardeio. Os generais, nos quartéis instala¬
dos no Vietnã, davam comandos, por intermédio do rádio, a suas
tropas da linha de frente. E as forças armadas americanas pagavam
emseus
entre
neste
o pato.
Felizmente, nossos líderes aprenderam com a derrota. Quando
expulsaram o Iraque do Kuwait, em
bem diferente. O presidente Bush, que enfaticamente garantia que
do Vietnã, deu ao general
1991, usaram uma abordagem
não repetiria os mesmos erros
Schwarzkopf apenas duas missões: expulsar o Iraque do Kuwait e
demolir todo o poder de fogo da Guarda Republicana Iraquiana.
Disse aos militares o que queria que fizessem, mas deixou que eles
achassem a melhor maneira de fazê-lo.O general Schwarzkopf tomou
a mesma atitude em relação a seus comandados no campo de batalha.
Um dos responsáveis por este redirecionamento da filosofia
forças armadas foi o general W. L. (Bill) Creech — um homem quelenda viva da Força Aérea dos Estados
mensurar os
r a
nas
permanece como uma
Unidos, mesmo depois de reformado. Em 1978, Creech assumiu o
Comando Tático Aéreo (TAC), uma operação de US$ 40 bilhões,
envolvendo 115 mil pessoas e 3.800 aeronaves.
Quase todos os dias, cerca da metade de seus aviões ficava em
solo devido a problemas mecânicos. O número de vôos de treina¬
mento caíra à razão de 7,8% ao ano, por mais de uma década.
Pilotos que precisariam de um mínimo de 25 horas de vôo para
estarem realmente aptos para o combate, estavam voando 15 horas
Para cada 100 mil horas voadas, sete aviões se
O MUNDO SEGUNDO CREECH
Talvez o mais puro exemplo de descentralização de quenotícia tenha acontecido na maior e mais centralizada burocracia dosEstados Unidos: o Departamento de Defesa. De acordo com o his¬toriador militar Martin van Creveld, os exércitos mais bem-sucedidos são aqueles em que se verifica a descentralização daautoridade. Entretanto, durante os anos 60, as forças armadasamericanas perderam de vista esta lição. O secretário de defesaRobert McNamara, que chegou ao Pentágono vindo de um dosmarcos da era industrial, a Ford Motor Company, era um devoto dossistemas centralizados. Fascinado pela idéia de otimizar a eficiênciamediante um controle centralizado e planejamento cuidadoso desistemas, fazia seus especialistas produzirem análises de custo-be¬nefício e novas regulamentações a uma velocidade tal, que os co¬mandantes não eram capazes de segui-las. A autoridade desafiavaa lei da gravidade, e os homens no campo de batalha viam desapa¬recer toda a sua capacidade de decisão.
À medida que os Estados Unidos se atolavam
se tem
ou menos.
acidentavam — muitos deles por manutenção ineficiente. Pilotos,mecânicos e técnicos estavam abandonando o TAC em grandes
blocos. “As forças armadas americanas estavam se desmantelando,”
confidenciou mais tarde Creech. “A situação era bem pior do que se
imaginava.”
Creech trabalhara no gabinete do secretário de defesa em meados
da década de 60,e conhecia a paixão de McNamara pela centrali¬
zação e a padronização. Concluiu, então, que tal paixão era o prin¬
cipal problema doTAC. A Força Aérea usava uma abordagem tama-no Vietnã, au-
ff"'
281280 Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO
lações atinge o orgulho das pessoas na organização e afeta sua
performance. Ou se tem um clima de profissionalismo ou, então, de
deterioração e decadência.”
Ele também publicava resultados, patrocinava a competição econcentrassem em suas mis-
nho único, dissera ele, em umdiscurso proferidoem83. “Um sistemaúnico de manutenção foi criado, com a função de se adequar aorganizações diametralmente distintas — do Comando Aéreo Mili¬tar, que realiza suas manutenções, ao Comando Aéreo Estratégico, •que opera fora de suas bases principais, em patrulhamento, e desteao TAC, que, por sua vez, cumpre suas missões em pequenos esqua¬drões por todo o mundo... Todo mundo faz as coisas de maneiraexatamente igual.”
Como se não bastasse, tudo era centralizado: manutenção,almoxarifado, planejamento e estabelecimento de escalas. “O contro¬le vinha do topo.” Cada simples solicitação de reparos tinha depassar pela oficina central de manutenção, denominada Controle deOperações — um processo que levava os trabalhos de manutençãoa um ritmo comparável ao de uma lesma. Conseguir uma peça paraum F-15, no almoxarifado central, segundo reportagem publicadapela revista /nc, “exigia 243 informações em 13 formulários diferen¬tes, envolvendo um total de 22 pessoas e 16 jornadas de trabalhoprocesso administrativo e no de arquivamento.” Creech concluiuque a cura era uma descentralização radical. À época da centraliza¬ção, a força aérea colocava mecânicos e aeronaves em uma oficinacentral, separada dos esquadrões equipes de 24 pilotos, cada qualcom seu próprio nome, símbolose sua lealdade, que se incorporaramao folclore americano durante a II GuerraMundial. Creecheste quadro. Designou mecânicos para os esquadrões, dando a cadaum o quepe e o distintivo respectivo de seu esquadrão específico.Designou aeronaves para esquadrões específicos, permitindo quefosse pintada, em suas caudas, a insígnia do esquadrão a que per¬tenciam — a mesma usada pelos pilotos e mecânicos. (Ele chegoua pintar o nome do principal mecânico junto ao do piloto, no narizda aeronave.) Descentralizou as operações de reposição de peças,fazendo-as disponíveis nas próprias trajetórias de vôo. E deixou queos comandantes de cada esquadrão planejassem suas próprias es¬calas de treinamento.
Creech deu toda
permitia a esquadrões e bases que se
sões. O TAC estabelecia metas claras e mensuráveis para cada
equipe. Creech encorajava as bases a que exibissem gráficos
ilustrativos da performance da manutenção, almoxarifado e dos
treinamentos. Com frequência, exibiam as estatísticas mais vitais
em grandes quadros de aviso na entrada da unidade, para que a
concorrência pudesse vê-las. O TAC começou a distribuir troféus
e a promover banquetes anuais em homenagem aos melhores es¬
quadrões. “Enfatizávamos, constantemente, a competição”, explica
Creech. “Institucionalizávamos novas metas e novos padrões, mas,
dávamos à unidade o controle sobre o ritmo e oao mesmo tempo,
planejamento que adotariam para a consecução das metas anuais
propostas.” “Não tardou para que uma forte camaradagem se
estabelecesse entre os pilotos e seus novos chefes”, segundo a
revista Inc. “E, em pouco tempo, alguns esquadrões começaram a
fazer hora-extra na tentativa de superar os demais em todos os
sentidos, desde a performance dos pilotos até a qualidade de
no
sua
manutenção.”
Os resultados falam por si:reverteu
Quando Creech deixou oTAC, 85%de seus aviões estavam
condições de uso em operações, percentual que costu¬
mava ser de 58% antes de sua chegada; o TAC, até então
considerado o pior Comando da Força Aérea, transformara-
se no melhor deles.
Os caças chegavam a totalizar 29 horas de vôo por mês,
contra as 17 que costumavam voar antes.
O TAC podia realizar o dobro de treinamentos de vôo do
que a performance antes verificada.
O tempo decorrido entre a solicitação e a entrega de um
componente de reposição caíra de 90 para 11 minutos.
A taxa de acidentes caíra de um a cada 13mil horas de vôo,
para um a cada 50 mil.
E a taxa de realistamento de mecânicos estagiários quase
duplicou.
em
a atenção a seu pessoal de reparos ccontroladores de estoque, melhorando suas condições de moradia,investindo em seu treinamento e usando de seu tempo pessoal paralhes oferecer briefings. Mandou renovar a pintura de cada prédiodo TAC e investiu em novos carpetes e móveis, construindo novosalojamentos, segundo o princípio de que “o mau aspecto das insta-
e aos
283282 Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO
lência, do general Vuono, espelham-se nas ações de Creech, na Base
Aérea de Langley, sede do TAC.
Creech tambéu serviu de instrumento para o sucesso da iniciativa
das Instalações Modelo de BobStone. Ele diz que, quando recrutava
comandantes, algo engraçado aconteceu: “Eu conversava com di¬
versos generais e eles todos diziam, com ar tenso: ‘Você já mostrou
isso ao Creech?’ Eu dizia que não, e, então, alguns deles diziam,
“Bem, eu gostaria de ver a reação dele.’” Quando Creech se juntou
ao grupo, mais 40 comandantes também o fizeram.
O TAC conseguiu tudo isso sem novos recursos, sem aumento de
pessoal e com mão-de-obra menos experiente do que a que ali
havia nos anos de decadência. “Qual terá sido o principal fator?”,
pergunta Creech. “Para nós, foi organização. Foi descentralização.
Foi delegar a autoridade ao menor nível possível. Para nós, foi
aceitar a responsabilidade de assumir esta autoridade. Foi um novo
espírito de liderança em muitos níveis — fazendo as coisas acon¬
tecerem.”
“Em qualquer organização”, declarou Creech à Inc, “há sempre
um monte de pessoas esperando que se lhes dê alguma responsa¬
bilidade, algum senso de propriedade, algo de que possam se
orgulhar. E é incrível a quantidade de flores que brotam, depois
que se dão os primeiros passos. A organização deslancha, então,
por caminhos que ninguém jamais poderia imaginar.”
Creech acrescentou, ainda, que “os administradores tradicionais
acreditam que, se descentralizarem a autoridade, terão menos con¬
trole. Mas, na verdade, é exatamente o oposto.”
Quando deixei o TAC, detinha mais controle sobre ele que
todos os meus antecessores. Havia criado líderes e colabora¬
dores em todos os seus diversos níveis. Sem esse tipo de rede
integrada abaixo de nós, seremos líderes apenas no nome.
Não é assim tão difícil dirigir uma grande organização.
Basta pensar pequeno sobre como quer atingir seus objetivos.
Quantitativamente, é muito limitada a capacidade de lide¬
rança de alguém no topo. Não é possível microgerenciar —aspessoas se chateiam com isso. As coisas são conquistadas
individualmente, ou por grupos de duas, três, cinco ou 20
pessoas e não de 115 mil.
O general Creech se reformou em 84, mas sua filosofia se espa¬
lhou. Quando ainda estava à frente do TAC, tanto o Comando da
Europa quanto o do Pacífico adotaram muitas de suas idéias. Um de
seus discípulos, o general Larry D. Welch, sucedeu-o no TAC,
levando depois a mesma abordagem ao Comando Aéreo Estratégico,
sendo finalmente promovido ao Estado Maior da Força Aérea. Em
90, um protegido de Welch assumiu o último comando centralizado,
o Comando AéreoMilitar, e começou a propagar o evangelho segun¬
do Creech. E, no Exército, os programas de Comunidades de Exce-
;
DESCENTRALIZANDO ORGANIZAÇÕES
PÚBLICAS POR MEIO DE UMA
ADMINISTRAÇÃO PARTICIPATIVA
Em seis anos junto ao TAC, Creech praticamente dobrou a produ¬
tividade do comando. Fê-lo simplesmente por puro conhecimento da
natureza humana: as pessoas trabalham mais duro e investem mais
criatividade quando controlam seu próprio trabalho. Empresas
manufatureiras que adotam a administração participativa, têm, via de
regra, um aumento de produtividade da ordem de30 a 40%. Por
vezes, esse aumento pode ser muito maior. “O compromisso adici¬
onal de uma pessoa motivada não representa apenas 10 ou 20% de
diferença”, diz Pinchot. “Quem quer que esteja absolutamente ab¬
sorvido em seu trabalho pode fazer, em meses, o que um empregado
desmotivado levaria anos por fazer.”
A administração participativa está florescendo nas organizações
públicas empresariais, dos distritos escolares aos departamentos de
polícia. Tomemos, como exemplo, o Departamento de Saneamento da
Cidade de New York, uma organização enorme, que coleta o lixo e
varre as ruas de uma cidade de 7 milhões de habitantes. Em 1978,
quando Ronald Contino foi contratado, o Centro de Equipamentos
Motorizados (BME) estava em ruínas. Com cerca de 1.300 mecâni¬
cos, soldadores, eletricistas, ferreiros e maquinistas, o centro era o
responsável pela manutenção de todos os veículos do Departamen¬
to. Mesmo assim, só podia contar com metade de seu pessoal e 6.500
caminhões de coleta em operação a cada dia.
Contino aproveitava as idéias de seus empregados por intermédio
de um comité de trabalho de alto nível e uma série de pequenos
outros comités de gerenciamento do trabalho. Em três anos, 85% dos
caminhões de lixo voltaram à operação, e as inovações do Departa-
t
284 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado 285
mento geraram economias superiores a US$16 milhões. “Isto foi
possível porque criou-se um ambiente em que cada indivíduo sabia
que tinha representação no processo de tomada de decisões e,
também, acesso aos escalões superiores, caso desejasse externar
seus próprios desejos e preocupações”, diz Contino. “As mudanças
nas rotinas de trabalho deixaram de ser vistas como meras ordens
geradas por uma elite distante, mas, sim, como o resultado de um
trabalho de equipe e um desejo universal de ver o trabalho progredir.”
Assim que o Departamento se consolidou, Contino começou a
passar o controle diário das operações a seus empregados. Colocou
um maquinista como chefe de sua nova Divisão de Projetos Espe¬
ciais, que lidava com as requisições de novos equipamentos. Fez
com que os mecânicos listassem todas as especificações para novas
encomendas de equipamento, testando aqueles que eram entregues
assim que chegavam e designando pessoal para acompanhar e exigir
cumprimento dos termos de garantia. Criou um grupo de pesquisa
e desenvolvimento, inteiramente composto de mecânicos, que já
desenvolveu pelo menos 50 projetos de aperfeiçoamento de design,
tendo repassado vários desses a empresas privadas em troca de
royalties para a cidade. Uma equipe de empregados chegou a desen¬
volver um novo tipo de caminhão - um veículo monstruoso usado
para transferir o lixo de um porto para um aterro. Chamaram-no de
“Nosso Bebê!”
A cidade de Madison, em Wisconsin, adotou a administração
participativa como parte de seus esforços pela Administração de
Qualidade Total. (Um dos princípios fundamentais de Deming é o
engajamento do empregado na tomada de decisões.) A primeira
equipe de qualidade de Madison, na Divisão de Máquinas, econo¬
mizou US$ 700 mil por ano ao criar um programa de manutenção
preventiva e reduzir a ociosidade de cada veículo de nove para três
dias. Outro grupo de empregados estudou os problemas com o lixo
sólido, porque o tempo de espera na Usina de Reciclagem de Energia
causava atrasos aos motoristas todas as tardes. A administração
planejava gastar US$ 1 milhão para duplicar o tamanho da rampa
onde os caminhões descarregam. Porém, com um mapeamento do
fluxo de tráfego, os empregados chegaram à conclusão de que, se
os motoristas doEast Side simplesmente começassem uma hora mais
cedo, o engarrafamento do fim de tarde poderia ser evitado.
“Se a decisão tivesse sido baseada no conselho de um consultor
externo que dissesse: ‘Ponha o pessoal do East Side para trabalhar
às 6da manhã’Jamais teria sido implementada”, afirmaTomMosgaller,
coordenador de Administração de Qualidade Total na cidade. “Teria
sido preciso barganhar até que o inferno congelasse para chegarmos
a isso. Mas, como a sugestão havia sido dos próprios trabalhadores,
tinham por ela um certo sentimento de propriedade.”
Madison chegou a demonstrar como os departamentos de polícia
poderiam usar a administração participativa. No verão de 1986, o
chefe de polícia David Couper convocou uma reunião para discutir
a idéia de um laboratório de campo, onde o departamento poderia
testar novas idéias. Mais de 50 membros do departamento compa¬
receram. Nomeou-se uma equipe de planejamento, composta por 10
membros, a qual foi treinada por Mosgaller em Administração de
Qualidade.
Após acaloradas discussões, a equipe decidiu propor a criação
de um Distrito Experimental de Polícia, composto de 38 membros
e jurisdição sobre uma área de 30 mil pessoas. Entrevistou fun¬
cionários de todos os departamentos a fim de conhecer suas preo¬
cupações, incorporando-as, depois, à estrutura administrativa do
novo distrito. Foi um passo revolucionário: Osfuncionários elegiam
seus próprios comandante e tenentes. Desenvolveram sua própria
organização de pessoal e estabeleciam, eles mesmos, suas escalas
de serviços. Projetaram e construíram o prédio que serviu de sede
ao distrito.
O Distrito Experimental de Polícia também ouviu seus usuários e
adotou um policiamento orientado segundo as necessidades da
comunidade (ver capítulo 2). Para ajudar na abordagem correta para
a comunidade, detetives, oficiais, inspetores e escrivães começaram
a trabalhar em conjunto. A cooperação entre eles cresceu de maneira
acentuada. “Eles costumavam ser bem-estratificados”, diz Mosgaller.
O mais fantástico aconteceu aos inspetores. Nunca antes tí¬
nhamos nos valido dos inspetores de estacionamento, usan¬
do-os como olhos e ouvidos do serviço policial. Simplesmen¬
te passeavam por aí, anotando multas. Porém, eles veêm
monte de coisas todos os dias. E agora sabem, exatamente, o
que os detetives estão procurando, de modo que podem aju¬
dar. São nossa melhorfonte de informação, e isso faz com que
se sintam importantes.
um
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ir~ r
286 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado 287
Hoje em dia, o Distrito Experimental de Polícia é uma organização
altamente motivada. O número de faltas ao trabalho e a reivindicação
de direitos trabalhistas caiu vertiginosamente. Em uma pesquisa
realizada junto aos funcionários no segundo ano de funcionamento
do distrito, mais de 80% deles declararam estar mais satisfeitos ali
do que em sua lotação anterior, e mais de 60% acreditavam que sua
eficiência no combate ao crime havia aumentado. As cinco razões
mais comumente apresentadas por terem escolhido o distrito como
seu local de trabalho, foram sua administração de apoio, a menor
rigidez da estrutura, o maior incentivo à tomada de decisões, a maior
autonomia, e o clima de cooperação e trabalho em equipe. O depar¬
tamento ficou tão satisfeito com os resultados que criou, em 1991,
três outros distritos descentralizados, para cobrir o resto da cidade.
“Acho que aprendemos que equipes eficientes de trabalho são as
de 30 ou 40 pessoas”, diz Couper.
A administração participativa está se disseminando, inclusive no
campo da educação pública. Tradicionalmente, os sistemas públicos
de ensino têm sido terrivelmente centralizadores. (Antes de sua
recente experiência de descentralização, Chicago tinha 500mil estu¬
dantes em seu sistema público de ensino e 3 mil administradores. O
sistema católico de educação de Chicago, com 250 mil estudantes,
tinha apenas 36 administradores.) Além disso, estudos vêm provan¬
do, repetidamente, que as escolas cujos diretores e professores são
dotados de autoridade considerável são mais bem-sucedidas que
aquelas onde as decisões importantes são tomadas por uma admi¬
nistração central. Dessa maneira, centenas de distritos escolares
começaram a praticar o que os educadores chamam d&gerenciamento
local, delegando “os poderes de tomada de decisõesa um nível de
maior proximidade da escola propriamente dita”, como descreveu o
então governador de Arkansas, Bill Clinton, de modo a “dar a dire¬
tores e professores maior autoridade.”
Dade County, região da Florida que engloba Miami, entregou a
autoridade sobre suas escolas a equipes de diretores, professores
e, por vezes, até de pais. Ali, como também em Rochester, New York,
cada escola tem agora um orçamento direcionado. No primeiro ano
da reforma educacional de Chicago, US$ 40milhões foram repassa¬
dos da administração central para as escolas, 640 cargos administra¬
tivos foram extintos, e cada escola foi entregue a um conselho eleito,
formado de pais, professores e membros da comunidade.
Cooperação trabalhador-administração
Muitos administradores públicos acreditam que os sindicatos repre¬
sentam o maior empecilho para o governo empresarial. Os sindica¬
tos, certamente, resistem às mudanças que ameacem os empregos de
seusmembros, como faria qualquer outra organização racional. Porém,
a maioria dos administradores empreendedores afirma que os sindi¬
catos não têm sido seus maiores obstáculos. Na verdade, acreditam
que a questão central envolva a qualidade da administração”. Os
atritos entre empregado e empregador são simplesmente um sintoma
de mau gerenciamento”, afirma John Cleveland, que comandou o
Serviço de Modernização de Michigan. “O problema em todas as
organizações é a qualidade dos altos administradores. E, como ge¬
ralmente acontece em ambientes políticos, os indicados para assumir
tais funções não têm qualquer experiência administrativa. Sabem que
não ficarão ali por muito tempo e, por isso, não prestam muita
atenção ao seu trabalho.”
Quando a firma de consultoria Coopers & Lybrand realizou sua
Pesquisa sobre Empreendimento Público, descobriu que, para os
executivos do governo local, as regulamentações do governo, a
oposição institucional e a oposição política representavam as mai¬
ores barreiras ao aumento de produtividade.A oposição trabalhista
organizada foi classificada em quarto lugar.
Para Rob McGarrah, da Federação Norte-amerciana de Funcio¬
nários Federais, Estaduais e Municipais (AFSCME), os seus mem¬
bros “anseiam sugerir”.Conhecem o trabalho medíocre realizado
por muitas instituições públicas. Se a mudança significar perda
salarial ou de poder de negociação, não estarão interessadas. “Mas,
se for uma questão de novas oportunidades, estão todos famintos
por elas.”
Os sindicatos do setor público estão praticamente na mesma
situação que estavam seus correspondentes no setor privado —
quando a competição externa dizimou a indústria americana. São
capazes de resistir à mudança e assistir ao colapso de suas indús¬
trias, ou podem trabalhar em parceria com a administração para
reestruturar suas organizações e readquirir a confiança de
clientes — o público contribuinte.Quando Ron Contino assumiu o Centro de Equipamentos Moto¬
rizados, em New York, as relações entre trabalhadores e a gerência
eram desastrosas. Contino concluiu, pois, que seu primeiro gesto
seus
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288 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado 289
teria de ser o estabelecimento de um comité de trabalhadores de alto
nível, de modo a provar, à força de trabalho, que estava disposto a
compartilhar o poder. Pediu a 20 sindicatos locais representativos
de seus trabalhadores que nomeassem os membros. “Eu disse:
Mande-me aquele ativista do seu sindicato que está sempre recla¬
mando da terrível situação existente e dizendo que tudo precisa
mudar”, relembra Contino. “É desse tipo que eu preciso.”
Os membros do Comité Trabalhista foram liberados de suas ou¬
tras obrigações. Dedicavam-se exclusivamente a melhorar a organi¬
zação. Faziam visitas aos locais de trabalho e perguntavam a seus
colegas como seu trabalho poderia ser melhorado, trazendo suges¬
tões concretas, que apresentavam a Contino e seus principais cola¬
boradores em encontros semanais. Em um ano e meio, estas suges¬
tões já tinham produzido economias da ordem de US$2 milhões. Ao
perceberem que seus representantes tinham poder legítimo, os tra¬
balhadores começavam a se manifestar, trazendo número cada vez
maior de sugestões.Tendo conquistado sua confiança, Contino criou
então os comités de gerenciamento do trabalho em vários pontos da
organização. Esses comités ajudavam o desenvolvimento de centros
de lucro, como também as iniciativas de contratação interna descri¬
tas no capítulo 3, que permitiram economizar, também, milhões de
dólares.
Muitos sindicatos estavam prontos para este tipo de parceria. A
AFSCME agora negocia comités de gerenciamento do trabalho em
muitos de seus contratos. Em Rochester e Dade County, a Federa¬
ção Americana de Professores tem sido um parceiro importante na
consecução de importantes esforços de reforma educa-cional. Em
Madison, os sindicatos têm sido importantes aliados no processo de
Administração de Qualidade Total.
Políticas de não-demissão
Talvez a melhor maneira de garantir a cooperação sindical seja
mediante a adoção de uma política de não-demissão. Como vimos no
capítulo 1, a maioria dos governos perde 10% de seus empregados
a cada ano, de modo que atritos sempre dão lugar a maior flexibili¬
dade. Os governos não precisam garantir às pessoas o emprego
específico que já têm, mas podem garantir-lhes um emprego com
salário correspondente. Foi o que se fez em Visalia. Phoenix garantiu
empregos, embora nem sempre com salários correspondentes.
O Quarto Distrito de East Harlem não demitiu nenhum professor.
Ninguém quer criar inovações para depois deixar as pessoas sem
emprego. Mas quando os empregados sabem que têm segurança,
sua atitude em relação às inovações muda completamente. Em
Phoenix, vários funcionários já propuseram a eliminação de seus
cargos. Uma vez que os empregados de Phoenix têm direito a guardar
para si 10% das economias, geradas no primeiro ano pelo programa
de sugestões da cidade, eles não apenas estão mudando de empre¬
go, mas acumulando vários bónus no processo.
Horizontalizando a organização hierárquica
A mais séria resistência ao trabalho de equipe e à administração
participativa vem dos administradores medíocres, não dos sindica¬
tos. Muito freqúentemente se interpõem no caminho, impedindo a
ação, pois seu instinto básico, que lhes justifica a própria existência,
é o de simplesmente interferir.Como bem expressaram Peters e
Waterman, agem como uma esponja e bloqueiam todas as idéias,
sejam elas boas ou más.
Com os sistemas computadorizados de hoje, os administradores
também dispõem de tanta informação que são capazes de supervi¬
sionar um número muito maior de pessoas do que podiam fazer no
passado. A abrangência de seu controle é mais amplo. Se as orga¬
nizações mantiverem todas as suas camadas administrativas e caso
os administradores medíocres continuem desempenhando seu papel
característico, um controle excessivo logo se manifesta. Por isso, as
organizações participativas acreditam que devem eliminar algumas
dessas camadas e horizontalizar suas hierarquias. David Couper
eliminou a camada de subchefes que o separava dos seus coman¬
dantes, Phoenix eliminou 39 administradores médios em um só ano,
por meio de um programa de aposentadoria proporcional. (No pro¬
cesso, lucrou US$1,5 milhão.) A Faculdade Técnica Fox Valley eli¬
minou um vice-presidente e seis posições intermediárias de adminis¬
tração ao longo dos últimos três anos, simplesmente deixando de
substituir algumas pessoas que se aposentaram.
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FORMASETÉCNICASDA
ADMINISTRAÇÃOPARTICIPATIVA Tanto Phoenix quanto
a Faculdade Técnica Fox Valley ouvem as
opiniões de seus empregados todos os anos. Quando uma pesquisa
dessa natureza, realizada no Departamento de Polícia de Madison,
revelou a insatisfação com o critério de promoções vigente, seu chefe
solicitou a uma equipe de funcionários que criasse um sistema total¬
mente novo.
A Avaliação dos Administradores pelosEmpregados, embora ainda
pouco utilizada como método, pode se revelar extremamente podero¬
sa. Os Supervisores do Departamento de Polícia de Madison desen¬
volveram um sistema de comparação de dados no qual se obtém um
feedback de quatro categorias: dos funcionários, de seus colegas, de
seus chefes e deles próprios.
As Políticas de Invenção ajudam os empregados a patentear e desen¬
volver novos produtos ou processos que tenham inventado. Em Visalia
separa-se o dinheiro para garantir a patente. Posteriormente pode-se
ajudar no desenvolvimento do projeto ou deixar que o próprio empre¬
gado cuide disso. Pode-se também ajudar empregado na transferência
dos direitos de invenção a uma empresa privada. O Estado de Oregon
e um de seus empregados detêm propriedade sobre a invenção de um
processo de divisão das faixas das autoestradas.
As Campanhas de Inovação encorajam as equipes de empregados a
inovar, enaltecendo os valores daqueles que o fazem. O programa
STEP de Minnesota, descrito no capítulo 9,é um exemplo, mas no
Hawaii e no Estado de Washington existem programas similares. No
Programa de Incentivo ao Trabalho de Equipe, grupos de empregados
que desejem fazer mudanças na prestação de serviço, reduzir custos
ou, mesmo, aumentar as receitas, candidatam-se à um comité de pro¬
dutividade. Se as suas idéias puderem ser aplicadas com êxito, 25%
dos ganhos monetários são repassados a eles. Em seus primeiros sete
anos de vigência o programa poupou ao estado US$ 50 milhões.
Os Programas de Premiação são utilizados em quase todas as orga¬
nizações empreendedoras, como forma de homenagear grandes
ços. O Prémio Groo, do Serviço Florestal Nacional nos Estados Unidos,
é o programa de premiação mais participativo que se tem notícia: a
cada ano, cada empregado pode dar a um outro colega um prémio por
bom rendimento profissional. O prémio leva o nome de seu inventor,
Tyler Groo.
A administração participativa varia quanto ao alcance e qualidade.
Alguns fatores são “decorativos” ao passo que outros, revolucionári¬
os. Alguns administradores querem simplesmente extrair mais de seus
empregados, sem dividir com eles o poder. Outros encaram seus em¬
pregados como parceiros de verdade, com quem podem dividir as
responsabilidades sobre qualquer aspecto relacionado à produtividade
ou qualidade de trabalho da organização. Quanto mais caminhar nesta
direção maior a compensação para a organização. Inúmeros mecanis¬
mos podem ser de grande auxílio:
Os Círculos de Qualidade são equipes temporárias, voluntariamente
formadas, e se utilizam dos métodos de Deming para o aperfeiçoamen¬
to dos processos de trabalho. Concentram-se em um problema a resol¬
ver ou em um processo que queiram aperfeiçoar. Mensuram os resul¬
tados; analisam os dados pinçando as prováveis causas; delineam e
implementam as soluções; checam os resultados; refinam ainda mais
as soluções; e tentam novamente. Na Administração de Qualidade
Total, essas equipes “Planejam, Executam, Avaliam e Atuam.”
Os Comités Trabalho - Administração oferecem aos administrado¬
res, bem como aos seus representantes trabalhistas, um fórum perma¬
nente para a discussão de suas idéias. O Departamento de Obras
Públicas de Phoenix, por exemplo, utiliza não só círculos de qualidade
para atacar problemas específicos, como também mantém comités de
administração do trabalho de modo a manter sempre abertas as linhas
de comunicação para as questões importantes.
Os Programas de Desenvolvimento Funcional ajudam os trabalha¬
dores a desenvolver seus talentos e habilidades através de sessões de
treinamento, workshops etc. As organizações que internamente ofere¬
cem tais oportunidades, condicionando-as a futuras promoções, de¬
senvolvem nos empregados grande lealdade e compromisso. Em
certo setor de Visalia, onde os funcionários municipais administram
todo o programa, tanto o diretor de pessoal quanto o administrador de
risco eram ex-policiais. O administrador do aeroporto era um secretá¬
rio com muitos anos de trabalho.
As Pesquisas de Opinião dão aos líderes mais informações acerca dos
sentimentos de seus empregados do que qualquer outro método.
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avan-
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REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado292 293
A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DE EQUIPE Em 1972, o psicólogo social Roger Harrison explicou por que as
organizações empreendedoras apostam tanto no trabalho das equi¬
pes. Harrison dividiu as organizações em quatro tipos básicos:
as que são orientadas pelo poder, incluindo muitos negó¬
cios tradicionais, são autocráticas e hierarquizadas;
as que são orientadas por papéis específicos, como as
burocracias governamentais tradicionais, são cuidadosa¬
mente ordenadas por regras, procedimentos e hierarquias.
as que são orientadas por uma tarefa, como negócios ori¬
entados pela tecnologia, são extremamente flexíveis e ori¬
entadas segundo resultados; e
as que são orientadas a pessoas, como os grupos
assistenciais, existem somente para servir às necessidades
de seus membros.
Onde quer que encontremos organizações participativas, encontra¬
mos, também, equipes de trabalho. Madison usou os chamados
círculos de qualidade; o Comando Tático Aéreo contava com seus
esquadrões; e o Centro de Equipamentos Motorizados usava equi¬
pes de trabalhadores de todos os tipos. Visalia e St. Paul, constan¬
temente, criavam equipes intradepartamentais para o desenvolvi¬
mento de novos projetos. As escolas de East Harlem eram adminis¬
tradas por equipes. Isso não se dá por acaso. Quando as organiza¬
ções colocam a autoridade nas mãos dos funcionários, rapidamente
descobrem que, para chegarem ao ponto de poder opinar nas gran¬
des questões e tomadas de decisões, esses funcionários precisam
trabalhar juntos, em equipes.
Peters e Waterman descrevem um comportamento idêntico nas
empresas privadas. “Pequenos grupos são unidades bastante sim¬
ples. São os tijolos com os quais se erguem excelentes empresas.”
Escreveram, ainda:
Essas pequenas unidades e partes do todo podem apresentar
denominação variada — campeões, equipes, forças-tarefa,cabeças, centros de projetos, skunk works e círculos de qua¬
lidade, mas têm uma coisa em comum. Nunca constam do
organogramaformal da organização e, raramente, podem ser
encontradas na lista telefónica da empresa. No entanto, são
a parte mais visível da estrutura e que dá vida às empresas.
Há cerca de 25 anos, em The Age of Discontinuity, Peter Drucker
explicou o porquê da necessidade de trabalho em equipe por parte
dos trabalhadores pensantes:
Os trabalhadores pensantes ainda sentem falta de um
supervisor... Mas o trabalho intelectual, em si, não conhece
hierarquia, pois não há conhecimento superior ou inferior. O
conhecimento pode ser relevante em uma dada tarefa ou não.
A tarefa é que determina e não o nome, nem o orçamento, nem
a disciplina, nem a posição do indivíduo que se ocupa dela
O conhecimento, portanto, tem de ser organizado com
uma equipe na qual a tarefa é que deve ditar quem é o
responsável, por quê, e por quanto tempo.
As organizações empreendedoras caem claramente na classe das
que se orientam por tarefa. Tais organizações fazem o que tiverem
de fazer para atingir seus resultados. Segundo explicou Harrison,
modificam suas estruturas e procedimentos de acordo com suas
tarefas. Constantemente, estabelecem equipes de trabalho e forças-
tarefa. “Esses sistemas temporários podem ser ativados rapida¬
mente, equipados com a necessária mistura de capacidades e ha¬
bilidades e, depois, desativados quando a tarefa estiver concluída.
Sua utilização oferece algo que, na verdade, é uma estrutura orga¬
nizacional em constante variação”, escreveu Harrison. Como resul¬
tado, “o mais forte poder das organizações orientadas por tarefas é
a capacidade de lidar com circunstâncias mutantes e complexas.” De
modo contrastante, organizações orientadas para o poder e para o
desempenho de papéis específicos têm problemas quando lidamcom
mudanças, pois ambas “associam o controle a um cargo na orga¬
nização; nenhuma delas tem a capacidade de redesignar, rápida e
racionalmente, pessoas apropriadas às posições chaves”.
Organizações centralizadas, hierarquizadas, subdividem-se, tam¬
bém, em várias outras camadas e estruturas. As pessoas começam
a se identificar com sua própria unidade, ou seja, seu próprio terri¬
tório. A comunicação entre unidades e entre as várias camadas
administrativas que vão se formando, vai ficando difícil. Isso explica
por que as organizações inovadoras usam as equipes com tanta
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Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO 295294
frequência, como afirma Rosabeth Moss Kanter:
“O primeiro grande obstáculo às inovações decorre da
segmentação”, escreveu Kanter em seu livro The Change Masters:
“uma estrutura altamente subdividida em departamentos e níveis,
todos eles cercados e com uma série de restrições de comunicação.
Tudo muito bem protegido.” Mesmo se uma inovação for bem-
sucedida, dificilmente se disseminará, pois a comunicação entre os
departamentos é mínima e as cercas, altas demais.
Por outro lado, organizações criativas patrocinam a comunicação
constante, para que a informação flua rapidamente, chegando a
todos. Para tanto, estão constantemente criando novas equipes e
configurações e, com isso, quase todo mundo mantém contato com
quase todo mundo. “Nas organizações inovadoras”, diz Kanter, “a
divisão do trabalho é ampla”, as lotações são “polivalentes, não-
rotineiras e orientadas para mudanças”; “as jurisdições profissio¬
nais se confundem”, e os empregados têm bastante “autonomia
local” para “prosseguir em processos adiantados de trabalho sem
precisar de aprovação executiva de alto escalão.”
Madison ilustra o argumento de Kanter perfeitamente. Quando
o prefeito Sensenbrenner introduziu a Administração de Qualidade
Total, rapidamente descobriu que as altas cercas que separam os
departamentos constituíam as maiores barreiras ao desenvolvimen¬
to de qualidade e inovação. Seu primeiro time de qualidade, na
Divisão de Equipamentos Motorizados, isolou, como uma das cau¬
sas dos problemas de manutenção dos veículos, a política da cidade
de exigir sempre a compra dos componentes mais baratos (e, conse¬
quentemente, de pior qualidade). Sensenbrenner e seu time decidi¬
ram verificar se seria possível alterar a política. Primeiramente, visi¬
taram o setor encarregado da compra dos componentes, que concor¬
dou que a política era pouco inteligente, mas culpou o setor central
de compras, cujo pessoal, por sua vez, também concordou, mas
disse que a tesouraria não lhes permitia alterar o procedimento. Em
visita à tesouraria, o tesoureiro também não discordava, mas disse
que o procurador municipal jamais aprovaria uma mudança na polí¬
tica adotada. Finalmente, chegaram até o procurador da cidade.
Querem saber o que ele disse? “Ora, é claro que pode fazê-lo... Na
verdade, eu pensava que vocês já estavam fazendo isso.”
“Isto”, diz Sensenbrenner, “foi o exemplo que faltava.”
Além da capacidade de inovar, concluir tarefas e responder ra¬
pidamente a mudanças ambientais, o trabalho de equipe apresenta
uma série de outros pontos fortes:
as equipes interdepartamentais trazem diferentes perspec-
tivas de abordagem de problemas ou oportunidades,
surgidas em diferentes pontos da organização. As pessoas
isoladas em seus departamentos, vêem apenas os sintomas
locais dos problemas. As equipes podem enxergar o proble¬
ma como um todo;
os membros de uma equipe, diante do maior número de
perspectivas, começam a pensar de maneira transcendente
a seus departamentos. Quando incorporam esse novo há¬
bito à rotina de trabalho de seus departamentos, acabam
descobrindo novas maneiras de realizar o que desejam;
as equipes derrubam as cercas que isolam os departamen¬
tos, incentivando a cooperação entre eles. “Os casos não
mais se encaixam perfeitamente dentro do âmbito de um
mesmo departamento, e as organizações que não se dão
conta disso, certamente passarão por muitas frustrações e
não se adequarão apropriadamente às mudanças contem¬
porâneas”, diz George Britton, administrador municipal de
Phoenix;
as equipes criam redes duradouras de trabalho que se es¬
palham por toda a organização, pois todos acabam conhe¬
cendo as pessoas que pensam de modo semelhante em
outros departamentos. As idéias e a informação fluemmais
rapidamente, e a ação se torna mais fácil. Para conseguir
algo significativo dentro de uma grande organização, todo
empreendedor precisa contar com uma rede informal de
aliados; e
os equipes conseguem manter funcionários de alto padrão,
introduzindo mecanismos de controle mais sutis e aceitá¬
veis do que as avaliações formais e as ordens de cima para
baixo. No East Harlem, onde pequenas equipes de profes¬
sores comandam a maioria das escolas, os professores que
não produzem “caem por conta própria, pois a própria pres¬
são criada em seu grupo os induz a isso”, diz John Falco.L L
f! <
Governo descentralizado 297REINVENTANDO O GOVERNO296
o desperdício e a má-administração. Espoliou os funcionários da
pior maneira possível: proibindo-os de adquirir novos arquivos
suspensos, eliminando alguns abajures e proibindo a presença de
cafeteiras elétricas nas repartições do governo. Até hoje, os fun¬
cionários de Minnesota se lembram do dia em que o governador
confiscou suas cafeteiras. Em 1978, muitos deles se vingaram nas
eleições, levando Perpich a um inesperado fracasso.
Pelos quatro anos que se seguiram, Perpich trabalhou para a
Control Data Corporation, em seu escritório em Viena. Lá, pôde
aprender muito sobre como administrar trabalhadores pensantes.
Jamais esqueceu a fúria dos empregados austríacos, quando seus
superiores americanos os proibiram de manter garrafas de vinho no
frigo-bar de seus escritórios.
Quando foi reeleito, em 1982, Minnesota deparava, novamente,
com sérias questões fiscais. Seu primeiro impulso foi criar um grupo
empresarial, algo como a Comissão Grace, que fizera um levantamen¬
to do desperdício no governo federal, apresentando, depois, um
relatório que, até hoje, pode ser visto coberto de poeira em muitas
estantes do serviço público. Perpich pretendia denominá-lo Alme¬
jando Eficiência e Produtividade. Afortunadamente, convidou o
presidente da Dayton-Hudson, William Andres, para dividir com ele
a chefia do tal grupo.
Andres sabia que produtividade não é algo que se possa impor.
Tinha de ser construída internamente, de baixo para cima. “Para
tanto, é preciso dar maiores poderes aos empregados, deixando que
façam o que seja certo”, disse ele a Peter Hutchinson, vice-presi-
dente indicado por ele para o projeto. “Quando se ajuda às pessoas
a descobrir o que é certo, dando-lhes poder para executar suas
descobertas, os resultados são sensacionais. Resultados com os
quais qualquer pessoa isolada num escritório jamais poderia so¬
nhar.” Hutchinson transmitiu o recado ao grupo de trabalho reunido
por Sandra Hale, assessora administrativa de Perpich, para o desen¬
volvimento de projetos como o STEP. Propuseram uma nova abor¬
dagem, orientada pelo trabalho de equipe e pela ação com um nome
diferente, e o governador concordou.
O programa era simples. Perpich designava'um conselho STEP,
que era co-presidido por Andres. O conselho solicitava aos funci¬
onários que encaminhassem propostas inovadoras e fazia, das mais
promissoras, projetos do STEP. Os critérios utilizados eram os mes-
“Uma única maçã podre estraga todo o bolo. Eles fazem
pressão. Esses professores olham para si mesmos e vêm
falar comigo. Chegam e dizem: Não consigo render aqui.
Muitos deles preferem se transferir para outro lugar ou
abandonar definitivamente o sistema.”
CRIANDO UM FACILITADOR INSTITUCIONAL
PARA INOVAÇÃO DE BAIXO PARA CIMA
Para ser bem-sucedida, uma organização participativa precisa não
apenas dar poder a seus empregados e equipes, mas também prote¬
ção.Nem todos os administradores apreciam a idéia de ver seus
funcionários tomando decisões por aí. Muitos dos esforços por uma
administração participativa do começo da década de 80 fracassaram,
na verdade, por falta de apoio por parte dos administradores. Em
Madison, os administradores eram tão arredios à idéia de Adminis¬
tração de Qualidade Total, em seus primeiros anos, que, a certa
altura, todo um time de qualidade se demitiu.
A administração participators é também um negócio arriscado,
pois encoraja os funcionários a partilhar informações e a enfrentar
as questões subjacentes. No âmbito da Prefeitura ou do Legislativo
estadual, no qual os jornalistas estão sempre à procura de conflitos
e vazamentos de informação, isto pode significar uma propaganda
negativa. “A cautela diante do risco constitui um dos principais
temores que limitam o avanço dos administradores públicos” em
seus esforços participativos, segundo Robert Krim, que gerencia um
Consórcio de Administração em Boston, uma firma público-privada
de consultoria criada para prestar auxílio aos departamentos da
cidade.
Rudy Perpich, governador de Minnesota de 76 a 79 e de 83 a 91,
criou uma solução interessante: uma espécie de campeão, destinado
a dar maior proteção e poderes aos empreendedores existentes na
burocracia. Denominado Esforço pela Excelência da Performance
ou, simplesmente, STEP, (Strive Toward Excellence in Performance),
revelou-se bastante eficiente, a ponto de merecer um dos primeiros
prémios para inovação da Fundação Ford.
O STEP tinha uma história bem interessante. Durante seu primeiro
mandato como governador, Perpich aprendeu, a duras penas, que
muitos funcionários públicos simplesmente odeiam decretos impos¬
tos de cima para baixo. Para cortar os gastos, criou um comité contra
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Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO 299298
litação aos motoristas, reduziu à metade o tempo de espera para os
clientes. Outro projeto ajudou também o Departamento de Recursos
Naturais a se livrar de amontoados de reclamações generalizadas
contra discriminação racial, senhorios, empregadores e bancos. Este,
em especial, demonstrou o papel do STEP de incentivo à inovação
e como mecanismo formal de proteção aos empreendedores. Quando
um diretor do Departamento se recusou a dar a seu pessoal tempo
necessário para que pudesse desenvolver o novo programa, o dire¬
tor executivo do STEP o ameaçou, dizendo que, se o projeto fracas¬
sasse, iria responsabilizá-lo por isso perante a alta administração.
No dia seguinte, o diretor voltou atrás.
A administração Perpich aprendeu um sem-número de lições
valiosas com o programa STEP, que foram resumidas em um livro
intitulado Managing Change: A Guide to Producing Innovation
from Within. Uma delas foi a de que a inovação surge de baixo para
cima.“Pelo menos um terço dos administradores do projeto STEP
são empregados de campo, não gerentes de nível alto ou intermedi¬
ário”, relata o livro. Outra lição foi a de que projetos administrados
por equipes são mais bem-sucedidos do que projetos individual¬
mente administrados. Uma terceira foi a de que a descentralização
requer um compromisso sério por parte da alta direção. Sem o abso¬
luto apoio de Perpich, o STEP não teria funcionado. Ironicamente,
nas instituições e sistemas centralizados — sejam governos estadu¬ais, sistemas escolares ou programas federais — as pessoas dosaltos escalões precisam freqiíentemente alterar as regras, antes que
as camadas inferiores possam inovar. Boas idéias podem surgir de
baixo, mas, nos sistemas centralizados, são geralmente ignoradas.
Para dar poder de ação aos empregados, aqueles que determinam as
políticas precisam descentralizar a forma como são tomadas as de¬
cisões.
Novos prefeitos e governadores que, tão freqiientemente, criam
comissões para pôr fim ao desperdício e aumentar a produtividade,
poderiam aprender muito com a bem-sucedida história dos progra¬
mas STEP e com a desastrosa experiência de Perpich, em seu primeiro
mandato. O contraste ratifica uma de nossas máximas prediletas:
esforços pelo aumento da produtividade geralmente minam não só
a própria produtividade, mas também o moral; esforços para elevar
o moral dos trabalhadores, aumentando seus poderes, geralmente
aumentam não só o moral, mas também a produtividade.
mos verificados em todos os governos empreendedores que se
espalhavam pelos Estados Unidos. Os projetos STEP tinham de ser
propostos por uma equipe, não deviam requerer injeção de novos
recursos e tinham de incorporar, pelo menos, um dos princípios
seguintes: voltar-se completamente ao cliente, administração
participativa, descentralização de autoridade, além de avaliação de
rendimentos, novas parcerias ou alta tecnologia.
O STEP aprovava um projeto, quando este dava às pessoas liber¬
dade para inovar, oferecia-lhes assistência técnica, forçava seus
chefes a que sentassem e ouvissem e, além disso, lhes dava prote¬
ção.
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Uma das primeiras equipes STEP convenceu o Departamento de
Recursos Naturais a mudar sua atitude em relação a seus clientes.
Durante a década de 80, a utilização dos 64 parques públicos deixava
de acontecer, e o orçamento se esvaía na tentativa de contornar o
problema. Um grupo de funcionários do Departamento decidiu que
era preciso uma nova abordagem de marketing. A equipe encami¬
nhou uma proposta de projeto STEP que obteve aprovação. Primei¬
ramente, essas pessoas pediram aos administradores que procuras¬
sem trazer à tona e identificar todas as necessidades possíveis de
seus clientes. Logo passaram a instalar novos brinquedos e play¬
grounds nos parques e sistemas de eletrificação nas áreas de cam¬
ping. Criaram então o Passport Club — uma espécie de programa de
benefícios para os visitantes mais frequentes, a fim de atraí-los a
parques mais distantes e menos utilizados. Em seguida, começaram
a aceitar cartões de crédito, fazendo propaganda e distribuindo
passes de entrada, como presentes de Natal. As vendas aumentaram
em 300%. Associaram-se, então, a uma empresa privada que melho¬
rou a qualidade de suas lojas de souvenir, e a venda desses itens
subiu em 50%. Finalmente, realizaram uma pesquisa de opinião entre
1.300 usuários do parque.
Durante o primeiro ano que se seguiu a esta estratégia de
marketing, o número de visitantes do parque subiu em 10%. Esses
números chamaram a atenção dos administradores do Departamen¬
to: em 1987, ao se criar o cargo de coordenador de marketing, a
equipe do programa STEP foi chamada para assumi-lo. Criou-se,
também, um Conselho de Inovações, destinado a criar e manter, no
Departamento, uma atmosfera de constante transformação.
Outro projeto STEP, na agência que expede as carteiras de habi-
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REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado300 301
INVESTINDO NO FUNCIONÁRIO Conselho Distrital da AFSCME, na cidade de New York, administra
sua própria universidade. “Nossos membros estão sedentos— quasedesesperados — por treinamento”, diz McGarrah.A descentralização só pode funcionar se os líderes estiverem dis¬postos a investir em seus funcionários. Como disse o general Creech
a respeito de seus soldados: “Não se pode tratá-los com desprezo,
alojá-los com desprezo e esperar que apresentem, em contrapartida,
um trabalho de qualidade.” A todomomento podemos verificar que as
organizações de mentalidade empreendedora pagam bem a seus funci¬
onários e se esforçam no sentido de melhorar a qualidade de seus
ambientes de trabalho. Além disso, investem alto em treinamento.
Ninguém quer que funcionários com treinamento medíocre sejam
encarregados de tomar decisões importantes. No entanto, poucos
governos investem em programas de treinamento. Não há estatísti¬
cas precisas, porém qualquer um que analise a questão se convence
de que o governo gasta bem menos com treinamento do que ocorre
com a iniciativa privada.
Durante os anos 80, a Comissão Nacional de Serviço Público, de
Paul Volcker, estimouque o governo federal gastava quase 1% de
sua folha de pagamento civil com programas de treinamento, em
comparação aos 3%da iniciativa privada. Em 90, a Comissão Revisora
da Administração, em Nova Jersey, relatou que o estado gasta com
treinamento e desenvolvimento o equivalente a apenas a 0,06% de
1% dos US$ 300 milhões de sua folha de pagamento, para os geren¬
tes e supervisores. A Western Electric, uma grande empresa desse
estado, gasta cem vezes mais do que isso.
Entendendo que estão inseridas agora em um mercado competi¬
tivo, em uma economia que privilegia o conhecimento, na qual o
aperfeiçoamento constante de habilidades é quase um pré-requisito
à própria sobrevivência, as empresas aumentaram, dramaticamente,
seus investimentos em programas de treinamento. Governos empre¬
sariais aprenderam a mesma lição. Visalia foi a primeira organização
externa a enviar seus gerentes à Hewlett-Packard para tomarem parte
de seus programas de treinamento. Madison investe alto em treina¬
mento. Phoenix oferece 25 cursos diferentes a seus funcionários, a
cada três meses. Como muitos governos, Phoenix oferece, ainda,
reembolso de mensalidades aos empregados que frequentem cursos
em instituições conveniadas.
Até mesmo alguns sindicatos investem em treinamento.
De acordo com Robert McGarrah, a AFSCME geralmente investe
dinheiro para que os órgãos públicos ofereçam treinamento. O 37®
DESCENTRALIZANDO O SISTEMA FEDERAL
Para muitos de nossos leitores a questão da descentralização é
sinónimo de federalismo. Durante as décadas de 60 e 70, em meio a
uma verdadeira explosão de movimentos nacionalistas nos Estados
Unidos, muitas atividades do governo foram excessivamente centra¬
lizadas. Entre 1963 e 1980, o Congresso criou 387 novos subsídios,
ou seja, diferentes fontes de recursos federais, sujeitos a uma gama
de regulamentos governamentais, para cobrir serviços prestados
por governos estaduais ou locais. Em 1977, representavam um em
cada US$ 4 gastos por esses governos. A despeito dos severos
cortes nos fundos e da aprovação de alguns poucos pacotes de
subsídios já comprometidos, 475 subsídios categorizados ainda
existiam em 1991. E o déficit federai só aumentava. O Congresso,
cada vez mais, lançava mão de subvenções para programas
categorizados, mesmo sem os fundos.
Já houve boas razões para centralizar responsabilidades. Duran¬
te a era industrial, dispunha-se, em Washington, de muito mais
informações que na maioria dos governos menores, estaduais e
municipais. Além disso, durante os anos 60, muitos governos esta¬
duais e municipais simplesmente não estavam dispostos a fazer o
que queria o povo americano, sobretudo no que se referia ao traba¬
lho duro da integração racial. Porém, 30 anos mais tarde, muitos
desses governos não só são mais eficientes que o governo federal,
mas, ainda, bem mais progressitas.
Líderes estaduais têm reclamado amargamente da excessiva regu¬
lamentação imposta, nos Estados Unidos, por Washington, durante
25 anos, e os líderes municipais apresentam, cada vez mais, o mesmo
tipo de queixa em relação aos governos estaduais. Ronald Reagan
prometia um novo federalismo, mas pouco fez senão cortar todo o
auxílio federal, deixando para trás o que alguns chamam âefedera¬
lismo de autodefesa. Obviamente, é hora de arrumar, inteligentemen¬
te, as regras federais, estaduais e municipais.
Não cabe, aqui, discutir completamente o programa em busca de
uma solução. Muitos livros já foram escritos sobre o assunto.
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:> Governo descentralizado 303REINVENTANDO O GOVERNO302
as missões e os resultados desejados, deixando os escalões mais
baixos do governo completamente livres para tentar consumá-los da
forma que acharem conveniente.
O que precisamos, realmente, é de um novo modelo de conces¬
sões de subsídios, estruturado segundo os princípios de governo
empreendedor. Durante os anos 80, o governador da Pensilvânia,
Richard Thornburgh, e seu chefe de polícia Walt Plosila, desenvol¬
veram um dos mais bem-sucedidos programas dos Estados Unidos
para a estimulação de inovações tecnológicas e iniciativas empreen¬
dedoras. A chamada Parceria Ben Franklin era fundamentalmente um
programa de subsídio a quatro redes regionais denominadas Cen¬
tros Avançados de Tecnologia. Cada centro oferecia subsídios idên¬
ticos, denominados Desafios, a pequenas empresas, organizações
acadêmicas e outras organizações que investiam em inovação
tecnológica.
No que nos interessa, a principal inovação foi o método de finan¬
ciamento desses centros. Todas as primaveras, cada um dos quatro
centros apresentava um pacote de solicitações para os Desafios.
Cada conselho estadual da Parceria Ben Franklin julgava cada sub¬
sídio potencial segundo o seguinte conjunto de critérios: o poten¬
cial do projeto para aplicação comercial, o número de empregos a
serem criados, o montante de investimento do setor privado exigido
etc. Reputava-os, também, com base em resultados anteriores de
cada centro, fundamentando-se em parâmetros tais como a criação
de empregos e a habilidade dos subsidiados de atrair capital priva¬
do. Os centros com as mais altas médias recebiam o dinheiro. A partir
daí, podiam realocar os recursos como quisessem.
Esta fórmula de financiamento forçava os centros a abraçar a
missão definida pelo estado— desenvolvimento comercial de ino¬vações tecnológicas — e a se esforçar por alcançar os resultadosdesejados pelo estado: criação de empregos na Pensilvânia e inves¬
timentos do setor privado. Porém, cada centro era livre para escolher
seus próprios métodos.
Traduzindo-se em nível federal, a abordagem sugeria a concessão
de benefícios em uma série de áreas de atuação diferentes.
O governo federal estabelecia um amplo critério, com base em diver¬
sos fatores, como necessidade, qualidade do programa, resultados
e envolvimento estadual ou local. Fazia, então, com que os governos
estaduais ou locais competissem pelos subsídios. Várias organiza-
Gostaríamos, simplesmente, de propor uma regrinha prática, articu¬
lada na Conferência Nacional de Legislativos Estaduais: a menos
que haja uma importante razão obrigando em sentido contrário, a
responsabilidade pela resolução dos problemas deve recair sobre o
mais baixo nível governamental possível.
Quanto mais próximo estiver um governo de seus cidadãos, maior
credibilidade terá. Isto já pôde ser comprovado em pesquisas. Quan¬
to mais próximo estiver, tanto mais responsáveis serão seus repre¬
sentantes, que tenderão, ainda, a elaborar soluções sob medida, ao
invés de se ocupar de promover programas que envolvam a todos.
Se fôssemos capazes de obedecer à essa regra básica, o governo
federal poderia ter menos empregados e prestar menos serviços
diretos, mas seu papel como diretriz da sociedade em nada se aba¬
laria. Em muitas áreas, ainda teria a responsabilidade de prover
fundos e determinar políticas, mesmo sem prestar os serviços. Entre
elas se incluem:
áreas de planejamento, que vão além da competência do
estado e dos municípios, tais como o comércio internacio¬
nal, as políticas macroeconômicas e grande parte das polí¬
ticas ambientais;
política de combate à pobreza, que requer investimento em
regiões com menos recursos financeiros. Aqui, o governo
federal precisa intervir de modo a equilibrar melhor a capa¬
cidade de investimento de cada área específica;
programas de seguridade social, como o seguro-social e o
salário-desemprego. Se quisermos benefícios justos e equi¬
librados em todo o país, não podemos esperar que estados
ricos e pobres contribuam na mesma proporção; e
investimentos tão altos que requeiram aumentos na carga
fiscal, e que podem determinar se empresas ficarão na cida¬
de ou a abandonarão (um exemplo evidente é a assistência
médica). Os estados fugirão de tais responsabiliades, com
medo de desencorajar os investimentos, a menos que o
governo federal assuma uma boa parte do custo financeiro.
Mesmo em boa partedesses casos, entretanto, os programas
podem ser desenvolvidos de modo a permitir significativa flexibili¬
dade em nível estadual ou municipal. O governo federal pode definir i
Li L
rj 304 REINVENTANDO O GOVERNO
ções, incluindo o Comité pelo Federalismo e Causa Nacional, a
Coalizão Comunitária Nacional e a Fundação Heritage, propuseram
mecanismos dentro desta linha. O Congresso chegou a discutir a
aplicação de um programa competitivo de subsídios para o combate
às drogas.
Esta abordagem cria incentivos aos estados e municípios, mas
deixa, em suas mãos, todo o trabalho de desenvolvimento e adminis¬
tração dos programas. Valendo-se de um sistema de critérios base¬
ados no desempenho, o governo federal pode exercer controle sobre
a qualidade, sem, contanto, ditar o conteúdo e a estrutura do pro¬
grama. E ao fazer os governos competir, segundo um critério abso¬
lutamente racional, força-os à criação de novas estratégias empre¬
endedoras. Neste sentido, os desafios poderiam substituir perfeita¬
mente os subsídios categorizados e os demais, para formar o centro
de um genuíno Novo Federalismo.
10
Governo orientado
para o mercado:
induzindo mudanças
através do mercado
Em vez de funcionar como fornecedores de determinados bens ou serviços
para a massa,... as organizações públicas governamentais estão assumin¬
do mais um papel facilitador, intermediário e, em mercados novos ou já
existentes, atuam na qualidade de investidores pioneiros. Muitas das
principais empresas privadas aprenderam, na última década, que este
papel mais empreendedor não pode ser bem executado pelas burocracias
tradicionais, ao estilo comando-e-execução.— Corporação para o Desenvolvimento Empresarial
Em 1930, se você quisesse comprar uma casa, teria economizado
50% do valor da transação, para fazer o pagamento inicial e pedido
ao seu banco uma hipoteca de cinco anos. Era, assim, que as pes¬
soas compravam casa em 1930, porque essa era a maneira como os
bancos faziam negócios. Durante o New Deal, a Secretaria Federal
de Habitação (FHA - Federal Housing Administration) inovou,
oferecendo uma nova forma de hipoteca com prestação inicial menor— só 20% do total — e um período de pagamento de 30 anos. Outrasagências governamentais criaram um mercado secundário, para que
os bancos pudessem repassar esses créditos. Com isso, o setor
bancário passou por uma conversão: o governo modificou o merca¬
do e, hoje, consideramos normais as hipotecas de 30 anos, com 20%
de pagamento inicial. Ora, vale a pena perguntar: nossa situação
seria melhor se Franklin Delano Roosevelt, o criador do New Deal,
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Governo orientado para o mercado 307306 REINVENTANDO O GOVERNO
administrativo. Acreditam que sua função é administrar e não
estruturar o mercado. Compartilham, com um vice-prefeito de Mos¬
cou, uma premissa silenciosa, conforme a história que nos conta E.
S. Savas. Esse vice-prefeito, comunista da velha guarda, ouviu com
ceticismo, a explicação dada por Savas sobre a necessidade de
adotar estratégias distintas para a prestação de serviços nas cidades
norte-americanas, complexas e diferentes entre si. Por fim, anunciou,
em tom definitivo: “Não se pode deixar que cada chefe de estação
prepare o horário dos trens. É preciso centralizar essa decisão: o
horário tem de ser controlado por alguém.”
Na verdade, as cidades não se assemelham às ferrovias e não
funcionam com horários rígidos. Elas não operam em uma linha
fixa, com uma só tarefa; aproximam-se, muito mais, dos mercados:
são agregados amplos e complexos de pessoas e instituições, cada
uma das quais tomando decisões constantemente e se ajustando ao
comportamento das demais, com base nos incentivos e nas informa¬
ções disponíveis.
Numa cidade, num estado, ou nação, os administradores não
podem “preparar o horário”, ou “controlar” as decisões. Pode haver
programas administrativos, controlando atividades específicas, in¬
clusive a administração de uma linha ferroviária;mas, para gerenciar
o conjunto da cidade, seus administradores precisam aprender a
navegar, conforme salientamos no capítulo 1. E estruturar o merca¬
do, talvez, seja o melhor método de navegação, criando incentivos
para que, com suas próprias decisões, as pessoas se movimentem
na direção escolhida pela comunidade.
Considerem-se os desafios enfrentados, hoje, pelos nossos go-
nos Estados Unidos: um sistema de saúde em crise; o meio
tivesse iniciado meia dúzia de programas para construir casas des¬
tinadas a famílias de renda baixa e média?
Ao inovar, lançando um novo modelo de hipoteca, a FHA estava
praticando uma forma de descentralização— diferente, é verdade, daque discutimos no capítulo 9. Com efeito, seria mais apropriado
chamá-la de não-centralização: a estratégia seguida pela FHA per¬
mitia que milhões de indivíduos e bancos tomassem suas próprias
decisões, para atingir um objetivo estabelecido pelo governo, sem
receber ordens superiores ou financiamento governamental.
O que a FHA fez, essencialmente, foi estruturar o mercado em
função de um objetivo público: um modo eficaz e económico de os
governos cumprirem suas metas. Ao identificar os incentivos que
podem induzir milhões de decisões individuais, os governos, com
frequência, podem realizar muito mais, do que mediante o custeio de
programas administrativos.
Um bom exemplo é o modo como, nos Estados Unidos, alguns
estados têm tratado o problema das latas e garrafas do lixo. No lugar
de instituir programas caros e elaborados de reciclagem, eles, sim¬
plesmente, determinaram que os consumidores fizessem obrigato¬
riamente um depósito de cinco centavos de dólar em cada lata ou
garrafa comprada — valor a ser restituído contra a entrega da lata
ou garrafa vazia. O público pôde ver a dramática diferença que fez
essa “lei do casco” nos estados que a adotaram: menos vidro que¬
brado nos parques e menos garrafas vazias jogadas nas ruas, além
de um volume menor de lixo levado para os aterros. Os que ainda não
têm essa experiência, por morar em estados onde não há tal sistema,
podem ler os levantamentos que documentam suas consequências:
nas ruas de New York, meio milhão de garrafas a menos, cada dia;
redução de 4% no peso do lixo recolhido em todo o estado; e vidro
quebrado, encontrado só em 16% dos parques de Boston.
Nos Estados Unidos, os governos sempre usaram, em algumas
medidas, os mecanismos do mercado para alcançar seus objetivos.
Há muito empregamos o zoneamento urbano para manter o cres¬
cimento das nossas cidades e dos incentivos fiscais, visando influ¬
enciar os gastos dos indivíduos e das empresas. Sempre estabele¬
cemos as regras do mercado, mudando-as, muitas vezes, quando
queremos resultados diferentes.
Mas, ao serem confrontados com um problema, os funcionários
governamentais reagem, instintivamente, procurando um programa
vernos,
ambiente ameaçado, como nunca antes; uma economia global em
que os trabalhadores precisam aprimorar, dramaticamente, sua edu¬
cação e seu treinamento, durante suas carreiras; mudanças na estru¬
tura familiar que tomam o atendimento infantil de boa qualidade uma
necessidade virtual. Será que os nossos governos têm a capacidade
de resolver esses problemas, aumentando os impostos e gastando
mais dinheiro? No contexto político e fiscal contemporâneo, a res¬
posta é clara. Assim como o New Deal de Roosevelt não podia
financiar a construção de todas as casas de custo médio de que o
país necessitava, hoje nossos governos não têm condições de as¬
segurar toda a assistência médica, a proteção ambiental, bem como
L L
ri REINVENTANDO O GOVERNO Governo orientado para o mercado308 309
o treinamento de trabalhadores e os cuidados à infância de que
precisamos. Isto seria impensável.
Se isto é verdade, quer dizer que os governos não têm alternativa
para a abordagem não centralizadora; precisam utilizar essa podero¬
sa alavancagem para estruturar o mercado, de modo que milhões deindivíduos e de empresas sejam estimulados a atender às nossas
necessidades em matéria de serviço médico, cuidados às crianças,
treinamento de trabalhadores e proteção ambiental. Não surpreen¬
de, portanto, que estejam os governos agindo assim:
em matéria de atendimento médico, o debate sobre a sua
universalidade é, de fato, um debate sobre como reestruturar
o mercadodesse serviço. Não há quem recomende um sistema
como o inglês — administrado pelo governo, com médicos eenfermeiros na condição de funcionários públicos;
no que concerne à proteção ambiental, o Lei do Ar Limpo
de 1990, utilizou, para controlar a chuva ácida, um meca¬
nismo de mercado que se assemelha a um imposto sobre a
poluição— a chamada emissions trading. As organizaçõesinteressadas na defesa do ambiente começam a advogar
estratégias regulatórias, baseadas no mercado, como os
“impostos verdes”, que os estados estão adotando;
no referente ao treinamento de trabalhadores, vários esta¬
dos estão explorando variações do Sistema de Investimen¬
to Humano de Michigan. Em lugar de procurar custear metis
programas públicos de treinamento, eles procuram pôr em
funcionamento mercados para esse serviço, no qual os
trabalhadores atuam com o poder aquisitivo e a informação
de que dispõem; e
com respeito aos cuidados à infância, quando o Congresso
norte-americano aprovou a primeira lei importante, em 1990,
houve um debate entre os que queriam que o governo
federal custeasse creches diretamente e os que preconiza¬
vam o uso de mecanismos do mercado, como créditos fis¬
cais e vales, para dar às famílias de baixa renda, o poder de
tomar as suas próprias decisões. Desnecessário dizer que
prevaleceu este último ponto de vista.
Essas tendências foram estimuladas pelo colapso do comunismo
da Europa Oriental, um acontecimento que dramatizou em cores
vivas, a superioridade do mecanismo de mercado sobre os sistemas
administrativos. A partir da queda do Muro de Berlim, os governos
orientados para o mercado parecem ter estado em evidência. Aliás,
essa tendência não tem qualquer relação com a pregação conserva¬
dora em favor de “deixar que o mercado decida.”Com efeito, estruturar
o mercado, para perseguir um objetivo público, é o contrário de
“deixar as coisas para o livre jogo das forças do mercado” — repre¬senta, de fato, uma modalidade de intervencionismo.
Na verdade, o “mercado livre”, isento de qualquer influência
governamental, não existe. Todos os mercados legais são
estruturados com regras estabelecidas pelos governos. Só o merca¬
do negro está livre da regulamentação governamental e, precisamen¬
te, por isso, é controlado pela força e bafejado pela violência. A
próxima vez que você ouvir alguém glorificar o “mercado livre”,
condenando a regulamentação pelo estado, pergunte-lhe se está,
realmente, propondo tomarmos o mercado de drogas como modelo.
Estruturar o mercado é, tatnbém, o oposto de criar burocracias
administradas pelo setor público para prestar serviços. É uma
terceira alternativa, entre os programas administrativos preconiza¬
dos pelos liberais e o desejo, manifestado pelos conservadores, de
que o governo não se intrometa com as forças do mercado. É uma
forma de usar a alavancagem do setor público para orientar as
decisões dos agentes privados, de modo a alcançar metas coletivas.
Trata-se de um método clássico de atividade governamental em¬
preendedora: implica um governo ativo, mas não burocrático.
Não queremos dizer que os mecanismos do mercado sempre
funcionem. Muitos bens coletivos fornecidos pelo governo — deparques à segurança pública — não são negociados no mercado. Ehá muitos mercados com falhas fundamentais. É comum que o go¬
verno seja chamado a intervir porque um determinado mercado gerou
sérios problemas sociais ou económicos. Na década de 30, o gover¬
no foi convocado porque a economia de mercado entrou em colapso.
Hoje, o governo é chamado porque o mercado nos vem impulsionan¬
do no sentido de uma catástrofe ambiental, ao mesmo tempo em que
deixa boa parte dos pobres e deseducados sem ocupação, casa ou
esperança. Mas, como o presidente Franklin Roosevelt demonstrou,
há 50 anos, muitas vezes a maneira mais efetiva de resolver um
problema criado pelo mercado é reestruturar esse mercado.
Os mecanismos do mercado têm muitas vantagens com relação
REINVENTANDO O GOVERNO310 Governo orientado para o mercado 311
sistemas administrativos. Já discutimos algumas delas nos ca¬
pítulos anteriores: os mercados são descentralizados, normalmente
competitivos, delegam a escolha aos interessados, e vinculam os
recursos diretamente aos resultados. Os mercados, também, reagem
com
reestruturação permite aos governos alcançar a escala necessária
para resolver os problemas mais sérios. Se um governo pode criar
incentivos que afetam milhões de decisões tomadas no mercado, em
lugar de influir, apenas, sobre aquelas atividades custeadas pelo
poder público, pode seu poder multiplicar-se mil vezes.
A tendência para o governo orientado para o mercado,
colapso do comunismo na Europa Oriental, é uma consequência
direta da era da informação. Com a informação se expandindo em
taxas geométricas e a mudança batendo à nossa porta, precisamos
dispor de sistemas que processem informações com toda rapidez,
que criem processos de retroalimentação e que a distribuam para
milhões de indivíduos, sob a forma de indicadores de preços, de
modo que possam ajustar-se às mudanças na realidade. Um grupo
de mandarins, sentado no topo de uma pirâmide hierárquica, não
poderia mais tomar decisões efetivas em nome de todos, porque não
teria condições de processar o volume de informação ou das deci¬
sões. Mas o mercado possui essas condições.
O mercado está para a atividade social e económica da mesma
forma que o computador para a informação: usando os preços, como
seu mecanismo primordial, ele envia e recebe sinais, quase simulta¬
neamente, processando milhões de insumos de forma eficiente e
permitindo que milhões de pessoas tomem suas próprias decisões.
Consideremos o sistema de educação superior nos Estados Unidos:
milhões de estudantes (e seus pais) selecionam volumes de informa¬
ção, comparam preços, e finalmente, fazem sua escolha. As faculda¬
des e universidades agem da mesma forma com respeito aos estu¬
dantes, examinando os pedidos de matrícula, as referências e os
históricos escolares. Por fim, há um ajuste entre os dois lados. Será
que algum tipo de mecanismo administrativo — por exemplo, a de¬signação de estudantes para a faculdade mais perto de
funcionaria melhor?
O PROBLEMA COM OS
PROGRAMAS GOVERNAMENTAIS
aos
“Quando pensamos em governo, a palavra que surge, automatica¬
mente, em nossas mentes é “programa”’, escrevem Philip Power eJan Urban-Lurain, de Michigan, em Criando um Sistema de Inves¬
timento Humano (Creating a Human Investment System). “Pão emanteiga: governo e programa. Literalmente, descrevemos a ativida¬de governamental sob a forma de programas.”
Naturalmente, a palavra “programa” tem um sentido mais amplo.
Muitos “programas” são, na verdade, mecanismos de mercado: avasta maioria, porém, é constituída de mecanismos administrativos:
organizações monopolísticas, normalmente de funcionários públi¬
cos, que despendem recursos orçamentários para prestar determina¬
dos serviços. Neste contexto, é o que entendemos por “programas”.
Infelizmente, os programas administrativos apresentam uma sériede defeitos, quando comparados com os mercados:
Osprogramas são orientadospelo eleitorado e nãopelos clien¬
tes. Como explicam Power e Urban-Lurain:
velocidade às mudanças rápidas e, como acentuamos, sua
com o
!
Os programas tendem a ser criados em reação à demanda
por recursos de uma parte do eleitorado, e não em resposta
à demanda de indivíduos ou mercados de trabalho. Mas a
simples participação em um grupo de eleitores não autoriza
a demanda por alguma coisa. Em consequência dessa
fusão, os programasoferecem habitualmente certas coisas —recursos, bens, serviços — a indivíduos que podem nãoquerê-las ou que não estão preparados para utilizá-las efe¬tivamente. Aquilo que o governo distribui depende da sua
disponibilidade e não da demanda exercida pelas pessoas.
Por isso, tantos programas governamentais, criados com a melhor
das intenções, fracassam miseravelmente, deixando de atender às
necessidades reais daqueles que pretendem ajudar.
Os programas são motivados pela política e não por políticas.
Para criar um programa, os líderes políticos precisam reunir um grupo
de apoio suficientemente amplo, que aprove um projeto de lei e
autorize os recursos necessários. Por isso há uma pressão constante
para que os programas atendam a todos os interessados. Quando um
con-
sua casa —
r
Governo orientado para o mercadoREINVENTANDO O GOVERNO 313312
los. Os mercados, ao contrário, são autocorrigíveis: as instituições
que vendem bens e serviços em mercados competitivos, sabem
quando não estão indo bem, e sua sobrevivência depende da capa¬
cidade de corrigir tais falhas. Como os mercados envolvem milhões
de decisões independentes, e todos os que deles participam, estão
constantemente, reavaliando suas decisões, os erros tendem a ser
corrigidos com bastante rapidez.
Os programas raramente morrem. A não ser em casos de crises
fiscais extremas, a maioria dos programas continua a se arrastar,
ano após ano. Muitos políticos e administradores já se desgastaram,
tentando eliminar um programa obsoleto apoiado por algum grupo
de eleitores. Embora o grande público permaneça indiferente, os
beneficiários lutam, com afinco, para defendê-lo, e os políticos he¬
sitam em assumir posição que não lhes renderá amigos, mas que, ao
contrário, vai criar-lhes um grupo determinado de inimigos, prontos
a se vingarem no dia das eleições.
Raramente os programas conseguem a escala necessária para
ter um impacto significativo. Para transformar um programa em
lei, os políticos, muitas vezes, aceitam a concessão de recursos que
sabem ser insuficientes para o objetivo pretendido. E se um pro¬
grama tem êxito, a demanda rapidamente ultrapassa a dotação
disponível. Um bom exemplo, nos Estados Unidos, é o programa
Head Start, há muito tempo aclamado como um grande sucesso, e
que ainda não consegue atender a mais do que um terço das pessoas
elegíveis.
Num mercado, a demanda cria a sua própria oferta. As empresas
que vendem para um mercado, se expandem para atender ao aumento
da demanda; o mesmo não acontece com os programas governamen¬
tais, que recebem recursos através do processo político. No setor
público, poucas organizações podem crescer com o aumento da
receita, razão por que não se preocupam em explorar mercados po¬
tenciais, desenvolvendo novos serviços e conquistando, também,
novos clientes. Mesmo quando agem agressivamente no atendimen¬
to da demanda existente, muitas vezes têm as mãos amarradas pelo
processo legislativo. Comenta Peter Plastrik, ex-presidente do Fun¬
do Estratégico de Michigan: “Você pode ter uma boa idéia e o
mercado ser realmente amplo, mas não consegue chegar até ele
porque seu financiamento é controlado pelo processo político.”
Plastrik e seus colegas de Michigan descrevem os programas
projeto de lei chega ao fim do seu percurso legislativo, os objetivos
originais estão de tal forma diluídos, que ele, muitas vezes, deixa de
ter sentido— foi “contaminado” por vários outros objetivos, algunsaté contraditórios. Um determinado programa de desenvolvimento
estadual tinha como meta a “criação de novos empregos”, ao lado
da “adoção de meios de produção de alta tecnologia”, embora a alta
tecnologia, muitas vezes, elimine empregos ao invés de criá-los.
Os programas criam “feudos” que as organizações governamen¬
tais depois defendem a qualquer preço. Diz Philip Power: “Todos já
ouvimos essas frases, que caracterizam a linguagem da selva buro¬
crática: “Meu programa, meus recursos, meus clientes.” Power e
Urban-Lurain vão diretamente ao ponto:
As organizações governamentais presumem que, se não
forem as únicas responsáveis pela prestação de um serviço à
população, tenderão a perder o financiamento do seu pro¬
grama; e se perderem esses recursos, perderãofuncionários;
e se isto acontecer, não terão status; e se não dispuserem
desse perfil, perderão novos financiamentos, no futuro. Por
isso, as burocracias tendem, naturalmente, a gastar seu tem¬
po e sua atenção construindo e defendendo posições, ao
contrário de administrar bem os programas sob sua respon¬
sabilidade.
Os programas tendem a criar sistemas de prestação de serviços
fragmentados. Conforme explicamos no capítulo 6, quando as
legislaturas acrescentam novos programas, ano após ano, cada um
deles com uma justificativa perfeitamente lógica, o resultado não
pretendido é uma colcha de retalhos do velho e do novo. As partes
interessadas precisam visitar dez repartições diferentes e candidatar-
se a dez programas diversos para receber os serviços para os quais
estão habilitadas. Cada uma dessas repartições terá suas próprias
normas e formulários — obstáculos específicos que precisam ser
enfrentados. O sistema não é transparente nem holístico e não fa¬
cilita as coisas para as partes interessadas.
Os programas não se autocorrigem. Quando os programas go¬
vernamentais falham, seus administradores são os últimos a saber,
porque não medem os resultados da sua atividade. Tipicamente,
usam números para promover esses programas e não para gerenciá-
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REINVENTANDO O GOVERNO314 Governo orientado para o mercado 315
administrativos como “operações de varejo”; a estruturação do
mercado, como “operações de atacado”. O Fundo Estratégico de
Michigan foi concebido para funcionar no atacado, mediante a troca
dos modelos de empréstimo e o tratamento catalisador da formação
de novas instituições financeiras. “Se você levar em conta que
US$ 100 milhões não são nada se comparados com os US$
O presidente Harry Truman, certa vez, fez a mesma observação a
respeito da ascensão de Dwight Eisenhower à Casa Branca.
Eisenhower tinha comandado as forças aliadas durante a Segunda
Guerra Mundial; estava acostumado a dar ordens que eram obede¬
cidas e se preparava, agora, para comandar uma burocracia civil.
Truman comentou que ele “vai sentar-se atrás de uma grande mesa
e dizer: “Faça isso, faça aquilo.” E sabem o que vai acontecer?
Nada.”
Em 1961, o presidente Kennedy ordenou que os mísseis norte-
americanos fossem retirados da Turquia. Mais de um ano se passou
e, durante a crise dos foguetes de Cuba, Kennedy ficou perplexo
com a oferta feita por Khrushchev de remover os mísseis soviéticos
de Cuba, se os Estados Unidos retirassem os seus da Turquia. O que
tinha acontecido?ODepartamento de Estado havia iniciado consul¬
tas com os países aliados sobre a retirada dos mísseis, sem qualquer
pressa e, finalmente, preparou um plano de cinco anos para
desmantelá-los. Nos Estados Unidos, os militares chamam esse
procedimento de slow roll, ou seja, “ir levando.”
O mesmo acontece, constantemente, no setor da educação. Quan¬
do muitos estados promoveram suas reformas de cima para baixo,
na década de 80, os distritos escolares, em sua maioria, anunciaram
que estavam cumprindo a orientação recebida. Mas os fiscais que
foram ao campo encontraram um quadro muito diferente. Os novos
cursos, que passaram a ser exigidos, eram simplesmente os cursos
já existentes, mas com novos nomes; o ensino suplementar era
mínimo; os testes estavam sendo aplicados, mas alguns professores
virtualmente, ensinavam aos alunos respondê-los. Aliás, Ralph Tyler,
professor de educação em Stanford e líder neste campo há 50 anos,
afirma que isso é o que acontece, sempre, em todo o mundo. Para
piorar as coisas, as regras obrigavam os professores e administra¬
dores das escolas a gastar um tempo enorme, preenchendo formu¬
lários para documentar seu suposto cumprimentodas ordens rece¬
bidas, o que, por certo, criava grande ressentimento. Como vimos em
East Harlem e em Minnesota, os incentivos funcionam muito melhor.
Mesmo quando os comandos podem ser implementados, freqiien-
temente provocam efeitos colaterais perversos. Por exemplo: quan¬
do os tribunais ordenaram que os alunos das escolas públicas fos¬
sem transportados em ônibus escolares, para desfazer a segregação
racial das escolas, as famílias brancas fugiram das escolas urbanas.
nossos
16 bilhões de capital bancário existente só no nosso estado, perce¬
berá, facilmente, que o sucesso não pode ser comprado — isso não
é possível, porque o dinheiro de que dispomos não é suficiente.” Ao
agir no atacado, porém, o Fundo Estratégico alavancou o sucesso.
Finalmente, de modo geral os programas não usam incentivos,
comandos. Às vezes, os comandos são necessários. Mas nomas
mundo em que vivemos, dos trabalhadores de conhecimento, onde
a informação está sempre em expansão, os incentivos são muitas
vezes, mais efetivos. Isto é, particularmente, verdadeiro quando os
comandos não podem ser implementados, como acontece, com fre¬
quência, às políticas governamentais. Há muito que as burocracias
aperfeiçoaram a arte de fingir o cumprimento de ordens e normas com
as quais não estão de acordo. Antony Jay e Jonathon Lynn descre¬
vem essa arte, de modo brilhante, na sátira Yes, minister, transmitida
na Inglaterra pelo serviço de televisão da BBC. Numa sequência, um
ministro diz, ao seu funcionário mais graduado, o que ele quer que
seja feito, e ouve uma resposta ambígua. O ministro insiste, pergun¬
tando o que significa aquela resposta, e o funcionário responde:
O funcionário: “Quero dizer que compreendi, perfeitamente,
os objetivos de Vossa Excelência e empregarei o máximo dos
meus esforços para que sejam alcançados. Para esse fim,
recomendaria fosse criada uma comissão interministerial
com termos de referência amplos, de forma que, dentro de
algum tempo, pudéssemos avaliar as várias implicações da
proposta, para tomar uma decisão baseada em considera¬
ções de longo prazo, em lugar de nos lançarmos, prematura¬
mente, em ações precipitadas e, possivelmente, mal concebi¬
das, que pudessem ter consequências imprevistas. ”
O ministro: “O senhor quer dizer não?”
O funcionário: “Sim. ”
L
r
REINVENTANDO O GOVERNO316
O QUE É IMPORTANTE PARA QUE
UM MERCADO POSSA FUNCIONARHoje, para integrar as escolas, os distritos escolares estão usando,cada vez, mais incentivos, a exemplo das escolas “modelo” e dos
sistemas de escolha — com sucesso bem maior. Criticar os programas não é a mesma coisa que argumentar que os
mercados são sempre melhores. Alguns mercados têm defeitos sérios.
Quando são dominados por um pequeno número de firmas
(oligopólios), a verdadeira competição, em grande parte, desaparece.
Se os consumidores não têm proteção adequada, muitas vezes são
vitimados pelo sistema. Nos Estados Unidos, ao longo de toda a
história, os espertalhões se aproveitaram dos pobres e deseducados— desde os dias dos vendedores ambulantes de panacéias, sem qual¬quer valor, até os escândalos mais recentes, em que empresas bancá¬
rias, desonestas, venderam hipotecas suspeitas a proprietários de
casas modestas.
COMO OS GOVERNOS
REESTRUTURAM O MERCADO
Pode parecer estranho que, em sua maioria, os programas admi¬
nistrativos tenham alternativas orientadas para o mercado. São quase
infinitas as maneiras de um governo estruturar o mercado para atin¬
gir seus objetivos; elas são usadas todo o tempo — e muitas, como
os incentivos fiscais e as taxas de utilização, são tão comuns que mal
as notamos.
Os seis elementos, resumidos no quadro que acompanha este capí¬
tulo, sugerem seis estratégias básicas para mudar o mercado. Neste
livro, já encontramos grande número de exemplos reais, virtualmente de
todas elas. Considere o leitor apenas algumas das mais importantes.
Com relação aos mecanismos de mercado, não tratados aqui, podemos
citar inclusive, a política de aquisições, as parcerias de agências públi¬
cas e privadas, os empréstimos, bem como a garantia dada a emprés¬
timos e a participação acionária. (Ver o Apêndice A).
Estabelecendo as regras do mercado. É o que os governos têm
feito desde que foram inventados. As leis de zoneamento regulam
o desenvolvimento imobiliário; há leis que estabelecem normas
para o mercado de capital e, até mesmo, algo tão simples, como o
mercado dos táxis, é disciplinado por regras públicas.
Para solucionar problemas, os governos alteram, constantemente,
as regras do mercado. Vejamos um exemplo: o seguro para automó¬
veis. À medida que os prémios subiam, os estados tentaram vários
tipos de reforma do mercado, para evitar que continuassem subindo.
Alguns, como Massachusetts, empregaram mecanismos de coman¬
do e controle, regulando diretamenle as empresas seguradoras e
fixando os prémios cobrados — em nome da defesa do consumidor— mas isto termina por prejudicá-lo, ao eliminar a competição. Outrosestados, porém, como New York e a Florida, conseguiram reduzir os
prémios mediante o fato de que os consumidores tinham limitada a
possibilidade de recorrerem à Justiça contra as empresas. Três es¬
tados obtiveram o mesmo resultado, adotando sistema que prevê o
reembolso automático, nos casos de injúria pessoal, eliminando,
Para que funcionem com eficácia e equidade, os mercados necessitam
de certos elementos, que resumimos adiante. Ao considerar se um
mecanismo de mercado pode resolver um problema, o governo precisa
verificar se esses seis elementos estão presentes. Em caso contrário,
normalmente é possível reestruturar o mercado introduzindo os que
faltam. Se não, será melhor usar um mecanismo administrativo.
Oferta: deve haver uma oferta adequada do serviço ou produto em
questão — seja ele o cuidado à infância, os abrigos para os idosos,habitação popular ou os lares coletivos para retardados mentais.
Deve existir um número suficiente de fornecedores, para assegurar a
competição.
.
! Demanda: os clientes devem dispor de suficiente poder aquisitivo
para adquirir o produto ou serviço, e o desejo de usar esse poder. No
mercado de retreinamento profissional, por exemplo, muitos clientes
individuais não têm condições de adquirir tal serviço. E muitas em¬
presas não são estimuladas a treinar seus empregados, porque, às
vezes, os perdem, depois de treinados, para os concorrentes.
Acessibilidade: os que vendem, devem ter acesso fácil aos que com¬
pram. Em certos casos, é necessário usar corretores para desenvolver
as transações. Por exemplo: quem compra ações não encontra dire¬
tamente quem as vende, mas emprega corretores para esse contato.
Já em serviços, como o treinamento profissional, a intermediação é
rara. Quando ela existe, sob a forma de programas públicos, raramente
é visível ou de fácil acesso ao público.
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1Si L
r
319Governo orientado para o mercado
Informação: Quando os consumidores não têm informação adequada
sobre o preço, a qualidade e os riscos de um produto ou serviço, suas
decisões ficarão prejudicadas. Terminarão pagando um alto preço por
um produto inferior — ou, pior ainda, perdendo sua casa para umaempresa que manipula hipotecas sem qualquer escrúpulo.
Regras: são normalmente fixadas pelos governos.
Policiamento: como em qualquer outra atividade, os que preten¬
dem agir de forma predatória contra pessoas desinformadas, precisam
saber que poderão ser apanhados e punidos.
sistemas semelhantes. Em San Francisco, essa inspeção é obrigató¬
ria, e os imóveis, postos à venda, precisam de um padrão mínimo. A
Comissão de Serviços Públicos da cidade estima que essa medida
redundou numa economia da ordem de US$ 5 milhões no consumo
de energia durante os primeiros cinco anos, mesmo antes de ser
estendida aos imóveis comerciais.
Criando ou aumentando a demanda. Os governos criam ou
mudam os mercados, o tempo todo, quando estimulam a demanda.
E de queforma?Dando recursos à população para comprar serviços;
exigindo que certos serviços sejam adquiridos, ou simplesmente,
encorajando a sua aquisição. Vales concedidos pelo governo, e seus
equivalentes, têm ajudado a estimular o surgimento de creches. A
chamada lei G.I., que financiava a educação dos militares que regres¬
savam da Segunda Guerra Mundial, criou uma grande demanda pelo
ensino universitário. A lei de energia de San Francisco criou uma
demanda pelas inspeções da eficiência energética dos imóveis.
Catalisando os fornecedores do setor privado. Os governos,
constantemente, fazem acordos com as empresas privadas para
aumentar a oferta de certos produtos ou serviços. Em 1988, o
Departamento de Planejamento e Desenvolvimento Económico da
cidade de St. Paul convenceu o First Bank a comprometer US$ 94
milhões, em cinco anos, com empréstimos para habitação popular e
desenvolvimento económico em comunidades carentes. Em 1990, o
Federal Reserve Board (o banco central) pressionou os bancos do
Estado de Massachusetts a oferecer um bilhão de dólares em em¬
préstimos para as comunidades carentes.
Algumas cidades incorporaram esses acordos no seu zoneamento.
Para evitar a deterioração do seu centro urbano, Scottsdale criou
uma série de incentivos com o intuito de as empresas fornecerem,
digamos, amenidades de infra-estrutura, a exemplo de garagens e
benfeitorias nas ruas. Os que podem agir assim podem obter auto¬
rização para aumentar a densidade de ocupação urbana, como tam¬
bém a altura e outros, fatores dos seus prédios. Seattle, San Diego
e Tampa desenvolveram versões próprias dessa abordagem, conhe¬
cida como “zoneamento incentivado” (incentive zoning).
Criando instituições que atuem no mercado para preencher
vazios. Muitas vezes, os investidores privados deixam de atender a
certos segmentos do mercado porque a expectativa de lucros é
pequena, e os investidores não sabem que lucro poderão obter, ou,
assim, a necessidade de um processo judicial para determinação de
responsabilidade. Outros 18 optaram por sistema semelhante, mas
muito diluído, o que provocou o efeito contrário. Enquanto houver
pessoas dirigindo automóveis, esta constante reestruturação do
mercado certamente continuará a existir.
Fornecendo informações aos consumidores. Se os consumido¬
res forem capazes de escolher entre ofertas competitivas, o governo
poderá provocar mudanças fundamentais nomercado, simplesmente
divulgando informações sobre a qualidade de cada serviço. Quando,
nos Estados Unidos, o governo federal começou a publicar dados
sobre as empresas de transporte aéreo, teve um efeito dramático,
muito maior do que seria possível se acionado qualquer comando
regulatório. Quando o Estado do Arizona começou a publicar os
custos do seguro de automóveis, de residências e dos hospitais,
obrigou as empresas interessadas a oferecer preços competitivos.
Quando o Estado da Califórnia passou a exigir que as indústrias
anunciassem quais as substâncias tóxicas utilizadas no seu proces¬
so produtivo, até que fossem consideradas sem perigo para a comu¬
nidade, não só desestimulou o uso dessas substâncias, como tam¬
bém, puniu as empresas cuja influência retardou o processo
regulatório.
A cidade de Visalia utilizou a informação para encorajar o uso
eficiente de energia. Em troca de uma taxa, as pessoas que estão
vendendo sua casa, podem agora exigir que ela seja inspecionada do
ponto de vista do uso da energia, obtendo uma qualificação do
Conselho de Agentes Imobiliários. Os vendedores pagam essa taxa
para que sua propriedade valha mais, mas com a prova de que usem
a energia de forma eficiente. Pelo menos dez estados já dispõem
L
Governo orientado para o mercadoREINVENTANDO O GOVERNO 321320
empréstimos bancários por cinco anos, subsidiando o processamen¬
to desses empréstimos, a cidade de Tampa convenceu os bancos a
conceder empréstimos que eles normalmente rejeitariam. Diz o dire¬
tor da agência, Fernando Noriega: “Organizamos o mercado para
oferecê-lo aos bancos privados.”
A participação nos riscos é muito comum. Nos anos 30, o governo
federal fortaleceu o sistema bancário, segurando os depósitos do
público. A Small Business Administration, há muito tempo, garante
empréstimos, tomados por pequenas empresas, e, igualmente,
negócios de propriedade de pessoas pertencentes a minorias. O
governo federal, virtualmente, criou um mercado para empréstimos
a estudantes, dando-lhes a sua garantia. E muitos municípios divi¬
dem os riscos imobiliários com firmas particulares de construção
civil.
ainda, a sua percepção do mercado está prejudicada pelo preconcei¬
to. Tipicamente, esses vazios do mercado incluem empréstimos para
microempresas, as formadas por minorias ou mulheres. Hoje, muitos
governos estaduais e municipais incentivam a criação de empresas
privadas ou autarquias a fim de preencher esses vazios. Não se pode
dizer que não haja precedentes: bem cedo, na história dos Estados
Unidos, os governos estaduais ajudaram a organizar empresas pri¬
vadas. No Japão, muitas das maiores empresas começaram, também,
como empreendimentos governamentais.
Catalisandoaformação de novos setores do mercado. Algumas
vezes, os governos ajudam a criar não só uma empresa, para expandir
a oferta de determinado serviço, como também, todo um setor do
mercado. Um exemplo típico é o das chamadas organizações de
manutenção da saúde, (HMO - Health Maintenance Organizations).
O primeiro plano de seguro de saúde em grupo, com pré-pagamento
pelos usuários — precursor das modernas HMO — foi criado pelo
Departamento de Água e Energia da cidade de Los Angeles, em
1929. Transcorridas quatro décadas, as HMO ainda são raras. Incen¬
tivado por suas vantagens, em 1973, o Congresso aprovou uma lei— Health Maintenance Organization Act — visando estimular sua
criação, concedendo financiamento do governo federal para ajudar
a instituir HMOs privadas e oferecendo, ainda, aos empregados que
pagavam seguros de saúde a opção de ingressar em uma dessas
organizações existentes na área. Os estados trabalharam, também,
na promoção das HMOs e, hoje, graças, em parte, a esses esforços
do governo, elas detêm uma parcela importante do mercado.
Na década de 80, diversos governos estaduais seguiram estraté¬
gias semelhantes de desenvolvimento económico. O Estado da
Pensylwania, por exemplo, incentivou a formação de firmas de capi¬
tal pioneiro para fornecer capital para empreendimentos de risco.
O Estado de Michigan catalisou a criação de firmas de capital
inicial e de um setor financeiro, composto por empresas de desen¬
volvimento industrial e comercial (BIDCO - Business and Industrial
Development Corporations), especializados em conceder emprésti¬
mos a longo prazo, a pequenas firmas de manutenção.
Compartilhando com o setor privado o risco do aumento da
oferta. O leitor, por certo, terá lembrança do Departamento de De¬
senvolvimento Urbano da cidade de Tampa, na Florida, mencionado
no capítulo 1. É um exemplo clássico da partilha do risco. Ao garantir
Mudando a política de investimentos públicos. A maioria dos
governos faz investimentos significativos com seus fundos de
pensões, reservas e saldos de caixa. Pela escolha na forma de inves¬
timento, eles podem ter uma influência importante na oferta de ca¬
pital em diferentes mercados. Em 1982, quando o Departamento do
Tesouro de Michigan foi autorizado a investir, em ações, até 5% do
seu fundo de pensões, avaliado então em US$ 6 bilhões, transfor¬
mou o estado em um mercado importante para investimentos. E não
demorou muito, outros estados fizeram o mesmo.
Dezenas de governos locais e estaduais adotaram, também, a
política de depositar seus saldos de caixa em bancos comprometidos
com determinadas políticas de empréstimo: os chamados programas
de depósitos vinculados, que têm sido utilizados com os mais diver¬
sos objetivos. A partir do final da década de 60, Illinois fez isso para
estimularempréstimos a firmas pertencentes a membros de minorias
étnicas; Santa Mônica, na California, dez anos depois, também para
encorajar empréstimos destinados à conservação de energia; o Es¬
tado de Ohio, por sua vez, para promover empréstimos a pequenas
empresas nos anos difíceis do princípio da década de 80; e, em 1991,
Boston anunciou um programa destinado a minorias étnicas.
O dinheiro público, também, pode ser retirado de determinadas
aplicações. A África do Sul sentiu o efeito que pode acarretar essa
retirada. Os fundos de pensões do setor público criaram um Conse¬
lho de Investidores Institucionais que, ameaçando retirar recursos
aplicados, desestimula atividades a exemplo da denominada
k L
323Governo orientado para o mercado322 REINVENTANDO O GOVERNO
Chamamos “taxa de impacto” ao tributo destinado a cobrir o custo
social de uma atividade, onerando diretamente os que a exercem—dirigir automóvel, construir novos bairros, aumentando o tamanho
de uma cidade etc. A idéia é muito simples: “privatizar” o custo
social, evitando que ele seja transferido para outras pessoas ou
instituições. De acordo com a Rand Corporation, nos Estados
Unidos, os impostos sobre cigarros quase já atingiram essa posição,
contudo os impostos sobre bebidas alcoólicas ainda não.
Consideremos dirigir, que não só polui a atmosfera como também
exige estradas dispendiosas. As estradas constituem um bem públi¬
co e, também, privado, beneficiando, indistintamente, todos os cida¬
dãos, tenham ou não automóvel. Por isso, os governos não exigem
que os motoristas paguem a totalidade do que elas custam, mas
infelizmente não cobram dos motoristas quase nada desse custo. Em
1988, Norm King, administrador de Moreno Valley, na Califórnia,
disse num discurso: “Um economista fez um estudo que mostrava
que, para cada milha adicional de entradas de alta velocidade,
construídas em Los Angeles, o custo real da construção, se alocado
exclusivamente aos veículos que a utilizam, seria de 8,12 centavos
de dólar por kilômetro, durante toda a vida útil da estrada; mas a
quantia, gerada atualmente pelo imposto sobre a gasolina, é de cerca
de um centavo de dólar por milha.”
Se a comunidade constrói uma nova estrada com finalidade de
facilitar o tráfego urbano, afirma King, os contribuintes, em conjun¬
to, subsidiam mais de 90%. “Ora, eu não teria a coragem de pedir a
nenhum de vocês para pagar a conta da gasolina que gasto para ir
trabalhar, mas, por alguma razão, não temos escrúpulos em pedir, aos
nossos vizinhos, que paguem a construção da estrada que usamos
para ir trabalhar.”
As taxas de impacto tornaram-se comuns em áreas de grande
crescimento, como a California, a Florida e as cidades em redor de
Washington, D.C. Elas servem para forçar os construtores a pagar
pelas estradas, os sistemas de transporte coletivo, esgotos, as redes
de suprimento de água e as escolas que os novos bairros construídos
tomam necessários. Na Florida, depois que a lei de Administração
do Crescimento, {Growth Management Act), em 1985, decidiu que,
antes da aprovação qualquer projeto, os governos locais deveriam
dispor dos recursos necessários para todos os serviços e a infra-
estrutura previstos, metade dos 67 municípios do estado adotou as
greenmail e dos salários excessivos pagos aos administradores.
Atuando como um corretor para compradores e vendedores.
Conforme observamos acima, os mercados onde os compradores
têm dificuldade de encontrar vendedores exigem a ação de correto¬
res. Algumas vezes, o setor público pode desempenhar esse papel.
As “lojas de oportunidades” e o “cartão de oportunidades”, de
Michigan, foram concebidos para funcionar como intermediários
acessíveis e amigáveis entre compradores e vendedores, nos seto¬
res da educação e do treinamento para adultos. A Empresa Estadual
de Capacitação da Baía de Massachusetts{Massachusetts Bay State
Skills Corporation), que foi copiada por 12 ou mais estados, atua
como um corretor entre as firmas que necessitam de trabalhadores
treinados e dos supridores desse treinamento, utilizando como atra¬
tivo o capital inicial — tipicamente, 100% no primeiro ano, 50% nosegundo, e uma pequena porcentagem no terceiro — para que asempresas e as instituições educacionais criem novos programas de
treinamento. Como seu objetivo primordial é reunir compradores e
vendedores, financia os programas de treinamento desejados pelos
compradores, que correspondem às necessidades genuínas do mer¬
cado. Em consequência, esses programas alcançam taxas de coloca¬
ção extremamente elevadas.
Usando o Código Tributário para formar o preço das ativida¬
des. Nos Estados Unidos, o incentivo fiscal é, sem dúvida, o método
preferido para provocar mudanças no mercado. Usamos incentivos
fiscais para estimular as pessoas a comprar casas e a fazer doações
de caridade; encorajamos as empresas a dar emprego aos pobres
e a investir em pesquisa e desenvolvimento, assim como influenci¬
amos as instituições para que adotem o status de organização sem
fins lucrativos, ou para que vendam suas ações aos empregados.
Ocasionalmente, chegamos a usar os impostos visando desencorajar
o que não estamos dispostos a proibir, como fumar cigarros e con¬
sumir bebidas alcoólicas. Naturalmente, poderíamos usar este último
método com muito maior frequência. Basta pensar em todas as coi¬
sas que os norte-americanos gostariam de desencorajar, mas que
não querem proibir: pornografia, cartazes ao lado das estradas, a
chamada junkfood— alimentos de preparação rápida, como pizza ehambúrgueres— e a exibição de violência na TV. Um imposto eleva¬do poderia ter esse efeito.
Formando o preço das atividades mediante taxas de impacto.
L
r
324 REINVENTANDO O GOVERNO Governo orientado para o mercado 325
denominadas taxas de impacto. Em 1988, 58% das comunidades que
responderam a uma pesquisa feita em todo o país pela Associação
Nacional dos Construtores de Residências (National Home Builders
Association), estavam utilizando alguma forma de taxa de impacto—
proporção essa que havia dobrado nos cinco anos precedentes.
Administrando a demanda por meio de taxas pagas pelos
usuários. Uma terceira variação do tema da influência sobre os
preços é a taxa cobrada aos usuários (userfee), que pode ser utili¬
zada para administrar a demanda pelos serviços. Os governos tra¬
dicionais, cuja atividade está dirigida inteiramente para a presta¬
ção de serviços, descobriram que eles nunca conseguem ultrapassar
a demanda. Constroem-se estradas para aliviar a congestão do trá¬
fego e, em poucos anos, as novas estradas já estão congestionadas.
Preparam-se novos aterros para o lixo, e, em poucos anos, eles têm
a sua capacidade esgotada.
“Nosso instinto sugere aumentar a oferta”, afirma Norm King.
“Nossa formação põe ênfase na oferta: como construir mais estra¬
das, uma usina de tratamento de lixo maior, um novo aterro.” Mas,
como em todos os níveis os recursos dos governos estão curtos,
esbarrando nos limites da arrecadação, essa abordagem leva direta¬
mente à bancarrota. É preciso “ver o que se pode fazer para reduzir
a demanda, a fim de não investir esses recursos, se possível.”
Para reduzir o ritmo do preenchimento dos aterros, os governos
aumentaram o preço cobrado ao público pelo recolhimento de lixo.
Para administrar a demanda por estradas, elevaram as taxas de
pedágio, criaram faixas especiais para os automóveis que transpor¬
tam mais de uma pessoa, e deram incentivos aos empregadores para
reduzir o tráfego na hora do rush, mediante a adoção de horários de
trabalho flexíveis, o uso cooperativo dos automóveis e de ônibus
para os empregados. Estão, até, começando a usar tarifas mais altas
nas horas de maior movimento — o que as companhias telefónicas
já fazem com os telefonemas interurbanos e as empresas de trans¬
porte aéreo, com as passagens. O metrô de Washington, D.C. cobra
mais caro nas horas de rush, e o Departamento de Transportes da
Californianegociou acordos com quatro empresas privadas para
construírem estradas de alta velocidade, cobrando pedágio diferen¬
ciado de acordo com a hora. Cingapura, Noruega e Holanda fazem
o mesmo. Segundo o economista Steven A. Morrison, vários estu¬
dos estimaram em cerca de US$ 8 bilhões a vantagem potencial, em
todo o país, do sistema depeak loadpricing, como é conhecido nos
Estados Unidos.
A objeção mais importante, levantada contra o gerenciamento da
demanda, é a de que as taxas impostas aos usuários discriminam os
pobres. Mas, como notamos no capítulo 7, isto depende de como é
empregada a renda gerada por essas taxas. Se for usada no desen¬
volvimento de sistemas de transporte de massa, vai
beneficiar os pobres. Outra objeção é a ineficiência e a inconveni¬
ência da cobrança de pedágio; mas já existe tecnologia que permite
cobrar, automaticamente, dos motoristas, sem postos de pedágio: ela
é utilizada em vários lugares no país. Um sistema de laser lê um
cartão eletrónico instalado nos automóveis dos frequentadores
habituais da estrada, cobrando uma taxa variável em função da hora.
Construindo a comunidade. Mudar o mercado representa mais
do que reestruturar a economia privada, que demanda lucros. Pode
significar, também, o fortalecimento das comunidades. Como exem¬
plo, citaríamos: estados que concedem doações às empresas de
desenvolvimento comunitário, fortalecendo as comunidades de baixa
renda, mediante a construção habitacional e a criação de empregos,
o aprimoramento da segurança pública etc. Em Washington, D.C.,
uma lei dá aos inquilinos o direito de comprar os edifícios onde
moram, quando os proprietários os transformam em “condomínios”,
isto é, em propriedad&coletiva. Ft. Collins, no Colorado, instituiu um
processo de zoneamento segundo o qual os construtores precisam
ter a aprovação de representantes da comunidade, antes de obter a
autorização da Prefeitura para novas construções. E, como se sabe,
o governo norte-americano alimenta as igrejas e outras organizações
comunitárias, todo ano, com bilhões de dólares, mediante abatimen¬
tos nos impostos devidos, que são concedidos em troca de contri¬
buições feitas para as organizações de caridade.
A ORIENTAÇÃO DO MERCADO
APLICADA A OUTRA FUNÇÃO
DO GOVERNO: REGULAMENTAÇÃO
Até aqui, nossos argumentos focalizaram a superioridade dos meca¬
nismos de mercado, em comparação aos mecanismos administrati¬
vos que porém, são usados, primordialmente, para a prestação de
serviços. A regulamentação é um campo completamente diverso, no
LL . ,
7
REINVENTANDO O GOVERNO326 Governo orientado para o mercado 327
qual os governos tradicionais empregam mecanismos de comando e
controle: estabelecem regras e esperam que as pessoas as respeitem.
A proteção ambiental é um exemplo perfeito. Nos Estados Unidos,
desde que o Departamento de Proteção Ambiental (EPA:
Environmental Protection Agency) foi criado, o governo federal
tem-se valido, fundamentalmente, dessa estratégia de comando e
controle. Alguns mecanismos de mercado foram tentados: créditos
fiscais para conservação de energia, vários experimentos com incen¬
tivos para reduzir emissões tóxicas e um pequeno imposto sobre os
automóveis com consumo elevado de combustível. Mas o que a
EPA tem feito, primariamente, é estabelecer normas e levar, aos
tribunais, as empresas e governos locais que as desrespeitam. Mui¬
tas vezes, chegou ao ponto de ditar a tecnologia a ser usada pela
empresa ou organização governamental, com o intuito de assegurar
o respeito aos seus padrões.
A estratégia teve alguns resultados positivos. Na maioria das
áreas metropolitanas, a qualidade do ar melhorou. Numerosos rios
foram limpos, e a água dos Grandes Lagos é, hoje, muito mais limpa
do que em 1970. A proibição de usar substâncias tóxicas, como o
DDT e o PCB, limitou, notavelmente, nossa exposição a esses pro¬
dutos químicos.
No entanto, não se pode dizer que a estratégia do comando e
controle tenha tido um êxito completo. Cidades como New York, Los
Angeles, Boston e Houston excedem, rotineiramente, os padrões
impostos pela EPA, para a qualidade do ar — em Los Angeles, istoocorre 140 dias por ano. Metade da população norte-americana
ainda vive em cidades onde o ar que se respira é considerado pouco
saudável pela American Lung Association, que se pronuncia em
nome dos especialistas em pneumonologia. Dentre centenas de
poluentes do ar e da água, menos de 20 foram regulamentados pela
EPA, e este esforço custou muito dinheiro. De acordo com o próprio
Departamento, em 1990, as empresas, os governos e os indivíduos
nos Estados Unidos, gastaram US$ 115 bilhões no cumprimento dos
regulamentos ambientais do governo federal. Há estudos que mos¬
tram que o mesmo resultado poderia ter sido alcançado através de
outros métodos, e, por uma quarta parte desse custo. A estratégia
de comando e controle apresenta uma série de inconvenientes:
Em primeiro lugar; não altera os incentivos económicos
subjacentes, que motivam as empresas e os indivíduos. Como os
comandos da EPA se opõem frontalmente aos incentivos económi¬
cos, as empresas, muitas vezes, fazem o possível para contorná-los,
de forma legal ou ilegal. Gasta-se muito tempo e dinheiro lutando
contra as regras do Departamento ou evitando-as, enquanto o de¬
pósito ilegal de lixo aumenta.
Em segundo lugar, a estratégia de comando e controle se baseia
na ameaça de penalidades mas, num ambiente político, muitas
dessas penalidades nunca podem ser avaliadas. A lei que obriga
a manter o ar dentro de padrões adequados, a Clean Air Act, apro¬
vada em 1970, determinou que as normas da EPA fossem alcançadas
em 1987, mas, em 1989, havia 96 cidades deixando de cumpri-las. Que
podia a EPA fazer? Sempre que tentava impor penalidades com reais
consequências, os representantes dessas cidades no Congresso
levantavam uma tempestade de reclamações.
Em terceiro lugar, a regulamentação do tipo comando e con¬
trole é umprocesso muito lento, exigindo que a EPA defina os níveis
máximos de exposição a milhares de substâncias, com precisão su¬
ficiente para resistir a qualquer exame judicial. Essa regulamentação
tende a recair em extremos. Como suas consequências são tão sérias,
exigindo que a indústria reduza ou elimine o emprego dessas subs¬
tâncias, muito está em jogo. Por isso, a indústria disputa, judicial¬
mente, cada decisão, combatendo-a também, no Congresso. Isso
torna o processo muito lento e faz com que os técnicos governamen¬
tais, que estudam as normas de defesa da população, ajam com
extremo cuidado, porque sabem que vão ser realmente contestados.
Em quarto lugar, quando especifica a tecnologia a ser usada
pela indústria para controlar a poluição, a regulamentação
desestimula a inovação. Em sua maior parte, a regulamentação fe¬
deral requer que a indústria adote “a melhor tecnologia disponível”,
ao instalar novas fábricas e equipamentos. A EPA diz qual é essa
tecnologia, e as empresas devem utilizá-la; se desenvolvem uma
melhor, precisam convencer a burocracia do Departamento a mudar
suas normas, o que é sempre um processo custoso e de resultados
incertos. Assim, diferentemente do que acontece com mercados
competitivos, a regulamentação da EPA desencoraja a adoção de
novas tecnologias e desestimula, também, as empresas a fechar
fábricas velhas e sujas, abrindo outras, mais limpas, porque “a me-
li L
T
328 REINVENTANDO O GOVERNO Governo orientado para o mercado 329
lhor tecnologia disponível” é exigida, fundamentalmente, só para
novas indústrias e instalações. O próprio Departamento, pela sua
Comissão Consultiva sobre Economia e Inovação Tecnológica, con¬
cluiu, recentemente, que o sistema regulatório desestimula o
desenvolvimento de tecnologias inovadoras de controle da
poluição.
Em quinto lugar, porque a abordagem do comando e controle
impõe os mesmos requisitos às indústrias de todo opaís e, por isso,
é extremamente dispendiosa. Exige-se que todosusem a mesma
tecnologia e adotem os mesmos padrões, não importando o custo
envolvido. Uma abordagem extremamente onerosa, porque obriga as
indústrias limpas e as indústrias sujas a fazer os mesmos investimen¬
tos, e as empresas rurais a ter os mesmos gastos das empresas
urbanas.
Em sexto lugar, porque a abordagem do comando e controle
obriga a EPA a focalizar, primariamente, as organizações maio¬
res, no setor público e no privado. Depois de 20 anos de esforços
nessa área, alguns ambientalistas acreditam que se poderia assegu¬
rar, agora, melhor rendimento, concentrando-se nos indivíduos e nas
microempresas, o que, no entanto, é muito difícil com o sistema de
comando e controle. É, politicamente, perigoso dar ordens aos indi¬
víduos e às microempresas, e a sua implementação constitui um
pesadelo.
Finalmente, a regulamentação pelo sistema do comando e
controle tende afocalizar os sintomas e não as causas. As normas
exigem tecnologias específicas para os automóveis, mas não levam
em conta quanto tempo as pessoas dirigem. A EPA exige a presença
de limpadores nas chaminés das usinas movidas a carvão, mas não
sabe que tipo de carvão está sendo usado.
uma taxa às empresas poluidoras. A EPA ignorou o conselho e tem
preferido levar os poluidores aos tribunais.”
Como acontece com as outras taxas de impacto, a idéia é garantir
que todos, produtores e consumidores, sejamos inteiramente
ponsáveis pelos custos e consequências das nossas decisões,
quando somos nós mesmos que tomamos essas decisões. Isto se
consegue incluindo o custo da poluição para a sociedade no custo
do produto — seja gasolina, pesticidas ou eletricidade produzidacom carvão ou produtos contendo clorofluorcarbono. Com isso, as
pessoas são estimuladas a não poluir, e as empresas que não gastam
tempo e dinheiro para reduzir a sua poluição, desfrutam de uma
posição competitiva desvantajosa.
Os economistas se referem a esses custos sociais como “custos
externos” (externalities). Peter Drucker mostra que, no passado,
alguns desses custos externos já foram levados em conta: “No
século passado, todos os países desenvolvidos transformaram os
acidentes industriais da empresa envolvida de custo externo em
custo direto: todos esses países adotaram o sistema pelo qual o
empregador se responsabiliza por um prémio de seguro em favor dos
trabalhadores, calculado com base na sua própria experiência com
acidentes de trabalho, o que torna os prejuízos, causados pelas
operações pouco seguras, um custo direto da empresa.”
Algumas substâncias são tão nocivas que deveriam, simplesmen¬
te, ser banidas, observa Drucker. Mas não é prático agir da mesma
forma com respeito a todas as atividades que causam prejuízos
ambientais — não se pode imaginar, por exemplo, a proibição dedirigir, voar, fazer lavagem a seco ou mesmo preparar um churrasco.
Em tais casos, as taxas de impacto, impostos sobre poluentes e
outros incentivos do mercado apresentam muitas vantagens, crian¬
do estímulos económicos poderosos para que todos — empresas eindivíduos — mudem seu comportamento, pois que tornam maiscaras as atividades poluidoras. O consumidor não precisa estar
informado sobre qual o produto mais prejudicial ao ambiente; basta
consultar os preços. Se um automóvel polui mais o ar, ele é mais caro.
Se a eletricidade produzida por usinas a carvão vai gerar chuva
ácida, ela torna-se mais cara. Se as fraldas de plástico preenchem
rapidamente os aterros de lixo, ficam mais caras.
Esta abordagem não só dá, a todo mundo, sinais claros do custo
social da poluição, sob a forma de preços, como também deixa, a
res-
A POLÍTICA DA REGULAMENTAÇÃO
POR MEIO DO MERCADO:
INCENTIVOS EM LUGAR DE COMANDOS
Há 20 anos os economistas têm-nos dito que há uma maneira simples
de evitar esses problemas. Escreve James Q. Wilson:
“Os economistas que estudaram o assunto, são quase unânimes em
afirmar que o modo mais eficiente de reduzir a poluição seria cobrar
L
Governo orientado para o mercadoREINVENTANDO O GOVERNO 331330
rica de modo significativo, e começam, agora, a aplicar amesma idéia
a outros produtos.
Os estados e as cidades começaram, também, a experimentar.
Iowa, Minnesota e Oregon tributaram os pesticidas agrícolas e os
fertilizantes, aplicando uma parte da arrecadação desses impostos
na proteção da água subterrânea. A Florida aprovou uma lei sobre
papel não-reciclado e outra, incidindo taxas sobre certas embala¬
gens, se, até outubro de 1992, não fossem recicladas. Oregon e New
Jersey criaram incentivos fiscais para investimentos em máquinas de
reciclagem. O Distrito de Controle da Qualidade do Ar da Costa
Meridional da Califórnia persuadiu a EPA a isentá-la da exigência
da “melhor tecnologia disponível”, de forma que pudesse empregar
novos processos tecnológicos que fossem desenvolvidos. E Seattle
despertou muita atenção, ao instituir um programa voluntário de
reciclagem, usando os preços como sua alavanca, cobrando US$ 14
por lata de lixo, cujo conteúdo não fosse separado para fins de
reciclagem. Em 1990, Seattle estava reciclando 37 % do seu lixo, mais
do que qualquer outra cidade dos Estados Unidos.
Em Washington, o Clean Air Act, de 1990, estimulou o interesse
nas estratégias baseadas no mercado, incluindo um programa de
controle da chuva ácida, mediante a redução de emissões tóxicas. É
o sistema conhecido nos Estados Unidos como emissions trading,
um mecanismo de mercado que funciona como o “imposto verde”:
os poluidores pagam para continuar poluindo ou inovam para eco¬
nomizar dinheiro. A EPA tentou esse programa, pela primeira vez, na
década de 70; dava créditos às empresas que reduziam a poluição do
ar, abaixo do nível imposto por lei, permitindo-lhes trocar (trade)
esses créditos entre diferentes fontes de poluição, dentro da empre¬
sa, ou vendê-los às empresas localizadas na mesma região. A idéia
era estimular as firmas a atingir as metas da EPA, mas deixar que
escolhessem como fazer isso de modo mais económico e inovador.
Se conseguissem reduzir uma fonte de poluição economicamente,
podiam usar os créditos gerados dessa maneira de forma compen¬
satória. Isso estimulava um mercado limitado à “troca de fontes
poluidoras”, mas, mesmo assim, estima-se que tenha economizado
o setor privado de US$ 5 a US$ 12 bilhões.
Em 1982, a EPA ampliou a idéia no combate ao uso do chumbo na
gasolina. Se as refinarias produzissem gasolina, com conteúdo de
chumbo abaixo do nível máximo imposto pela EPA, ganhariam cré-
cada um, a decisão da melhor escolha. Se eu prefiro continuar diri¬
gindo meu automóvel de alto consumo, muito bem; se prefiro ter um
carro “limpo”, que use eficientemente o combustível, melhor — seráuma formade economizar dinheiro. Se quiser utilizar uma eletricidade
mais cara, poderei fazê-lo; se instalar painéis solares no meu teto,
estarei poupando dinheiro.
Se a poluição se tornar uma despesa significativa, as indústrias
farão o que puderem para evitá-la — desenvolvendo tecnologiasmais limpas, usando o combustível mais económico, reciclando
materiais e conservando energia. O lucro é um incentivo importante
para a inovação. Um sistema de “impostos verdes”, como estão
sendo conhecidos, estimularia a criatividade do setor privado norte-
americano na busca de maneiras mais limpas de viver, trabalhar
e produzir.
O método fiscal de combate à poluição estimula as pessoas a
enfrentar a verdadeira causa do problema, em lugar de tratar seus
sintomas. No passado, obrigamos as usinas que trabalhavam com
carvão, a instalar máquinas limpadoras. O incentivo do preço as
levaria a adotar o modo mais limpo e menos dispendioso de produzir,
possivelmente escolhendo um combustível menos poluente. No
passado, determinamos a indústria automobilística a instalar con¬
versores catalisadores nos automóveis; um “imposto verde” sobre
a gasolina faria com que todos preferissem o meio de transporte mais
limpo, e que fosse, também, prático.
Os “impostos verdes”poderiam, também, evitar algumas das lon¬
gas batalhas legais resultantes da regulamentação proibitiva, por¬
que o que está em jogo, é menos vultoso. Eles dariam ao governo
maior flexibilidade, permitindo-lhe aumentar ou diminuir a carga tri¬
butária, variando, desta forma, a pressão exercida sobre os indivídu¬
os e as empresas. Custariam muito menos, porque alcançariam seus
objetivos com maior eficiência. E criariam uma receita fiscal, que
poderia ser usada tanto para corrigir a poluição quanto para investir
em atividades que a evitasse, como o trânsito de massa.
Os incentivos do mercado parecem ser a onda do futuro. Durante
o final dos anos 80, eles começaram, finalmente, a atrair a atenção.
Assistindo ao debate sobre os impostos verdes, na Europa Ociden¬
tal, muitas organizações ambientalistas endossaram a idéia. Os
países da Europa sempre tiveram impostos elevados sobre a gaso¬
lina, o que contribuiu para limitar seus níveis de poluição atmosfé-
T
Governo orientado para o mercado 333REINVENTANDO O GOVERNO332
móveis que passam por uma rodovia e em que momento, permitindo
a cobrança de pedágio sem a presença humana. As empresas estão
desenvolvendo sistemas que poderão medir a poluição dos gases
emitidos pelos automóveis, à medida que eles forem passando por
um ponto determinado da estrada. Tecnologias como essas tornam
possível usar os mecanismos do mercado de diversas maneiras, há
dez anos fora do nosso alcance.
O Instituto de Futuros Alternativos (Institute for Alternative
Futures), dirigido pelo futurologista Clement Bezold, chama essa
tendência de “a emergência de mercados mais inteligentes”, nos
quais compradores e vendedores têm acesso a uma informação muito
mais ampla do que acontecia anteriormente. Uma consequência,
segundo Bezold, é que os consumidores estão começando a “votar
por seus valores, com o seu dinheiro.” Há firmas de investimento
“socialmente responsáveis”, que só aplicam o dinheiro dos seus
clientes em empresas que atendam a certos critérios. OConselho de
Prioridades Económicas (Council on Economic Priorities) publicou
um livro que classifica as empresas e seus produtos em nove cate¬
gorias. O ambientalista Denis Hayes, proponente do Dia da Terra,
fundou uma organização destinada a garantir produtos que são
apropriados, do ponto de vista ambiental. Essa organização vai
vender às empresas um “selo verde”, para qualificar seus produtos.
Diz Hayes: “Nosso objetivo é ajudar o consumidor norte-americano
a se posicionar em favor da proteção do ambiente. Esperamos que
o “selo verde” se torne o catalisador de uma mudança importante
nos hábitos de compra dos consumidores.”
Certos produtos já vêm com dizeres que indicam a sua eficiência
no uso da energia: automóveis, aquecedores de água, caldeiras,
geladeiras e condicionadores de ar. Mais de dez estados instituíram
sistemas voluntários de avaliação energética de casas, como fez a
cidade de Visalia. Na área de Washington, D.C., uma moderna orga¬
nização de consumidores avalia os planos de saúde existentes na
região, de acordo com a satisfação dos clientes, o preço e outros
fatores, comparados publicamente no The Washington Consumer
Checkbook. E os pesquisadores do setor de saúde começam a de¬
senvolver critérios adicionais, para medir a qualidade dos vários
prestadores de serviços médicos.
Com o computador, tomou-se possível não só desenvolver essa
informação, como também torná-la prontamente disponível a um
ditos que poderiam vender a refinarias que estivessem produzindo
acima do nível de poluição tolerável. Esse fato criou um mercado
ativo para esses créditos, porque os compradores e vendedores
tinham muito mais acesso a uns e outros na indústria da refinaria de
petróleo, relativamente homogénea. A EPA estimou, em 20%, a di¬
minuição no custo de reduzir o uso do chumbo na gasolina, como
resultado do programa de troca de créditos.
Em 1990, a chuva ácida constituía o tema ambiental mais contro¬
vertido do Congresso norte-americano. O Governo Bush recomen¬
dou e o Congresso aprovou um sistema de troca de créditos, pelo
qual as usinas elétricas usando carvão, seriam creditadas pela quan¬
tidade de dióxido sulfúrico emitido para a atmosfera. Essas usinas
poderiam utilizar qualquer meio para reduzir essas emissões e se
emitissem menos do que o tolerável, venderiam seus créditos a
outras usinas. Paul Portney, da organização Recursos para o Futuro,
um órgão de pesquisa que ajudou a desenvolver o conceito de
incentivos do mercado, calcula que isso poderia reduzir o custo, com
o cumprimento da lei, de US$ 8 bilhões para US$ 4 bilhões por ano.
Em 1991, os proponentes da regulamentação ambiental baseada
no mercado encontraram-se, subitamente, sob os refletores da opi¬
nião pública. Os jornais escreviam a respeito dos “impostos verdes”
e de outros incentivos do mercado; o Congresso começou a consi¬
derar projetos de lei sobre o assunto, e os ambientalistas subscre¬
veram, cautelosamente, a idéia. Em 1988, Robert Starvin, de Harvard,
publicou um estudo, com os senadores Timothy Wirth e John Heinz,
que delineava as 36 maneiras de abordar os problemas ambientais
através domercado. Em janeiro de 1991, ele declarou à revista Fortune:
“Há dois anos, queixávamo-nos de que ninguém nos ouvia; agora,
é como se a noite tivesse se transformado em dia !”
O SURGIMENTO DE MERCADOS
MAIS INTELIGENTES
As estratégias baseadas no mercado, como as que descrevemos, só
são possíveis porque a era da informação aumentou, radicalmente,
nossa capacidade de medir a poluição e quantificar o seu impacto.
Só na década passada, por exemplo, desenvolvemos monitores con¬
tínuos de emissões tóxicas, capazes de medir as emissões de enxofre
de uma usina, ou sistemas eletrónicos que podem registrar os auto-
1 L
Governo orientado para o mercado 335REINVENTANDO O GOVERNO334
bém para o setor público. Isto, a despeito do fato de que,
quando implementados apropriadamente, os sistemas de pre¬
ços promovem a conservação de muitos recursos públicos.
Ted Kolderie descreve um fenômeno semelhante no movimento
de reforma educacional, observando que as instituições funcionam
quando criam os incentivos corretos. Contudo, os líderes empresa¬
riais, raramente, focalizam os incentivos embutidos no sistema edu¬
cacional; em lugar disso, criam “parcerias” e patrocinam projetos.
Diz Kolderie: “A cooperação das empresas, hoje, é mais ou menos
como a do pai que faz a tarefa de casa para a filha. É uma ajuda,
mas uma ajuda mal-orientada.” Ela consiste em:
Doar computadores; proporcionar treinamento, durante as
férias, para os mestres de ciências; reconhecer os professo¬
res excepcionais; motivar os estudantes para que se gradu¬
em, prometendo-lhes uma educação universitária; colaborar
para a aprovação de uma lei, ampliando o ano escolar ou
tornando mais difíceis os concursos dos professores. É difícil
criticar esses esforços, ... (mas) o teste é sempre a pergunta:
será que eles mudam o sistema existente? ...
A atividade empresarial deve ser mais dura. Quando so¬
licitados a apoiar alguma iniciativa, os homens de negócios
devemfazer a pergunta fundamental: Se essas coisas têm tal
importância, por que o próprio sistema não asfaz? Por que
só são feitas quando nós as financiamos? ...
Se os empresários estivessem pensando, estrategicamente,
seria estimulante ver que as escolas têm seus próprios incen¬
tivos e oportunidades para inovar.
Ao longo de todo este livro, argumentamos no sentido de que a
chave para a reinvenção do governo é a mudança dos incentivos
que motivam as instituições públicas. O que é senão outra forma
dizer que essa chave consiste na mudança dos mercados que fun¬
cionam dentro do setor público. No setor da educação, isto pode
significar a criação de um mercado competitivo em que os consumi¬
dores tenham opções, e os principais interessados (pais e professo¬
res) tenham controle genuíno. No treinamento profissional, issopode significar o fornecimento de informações ao sistema sobre a
qualidade de todos os que prestam um tipo de serviço, a entrega dos
grande número de pessoas. Exemplo disso é o Sistema de Investi¬
mento Humano e o Cartão de Oportunidades de Michigan: tentativas
de criar um mercado mais inteligente, para o retreinamento profissi¬
onal, usando cartões de crédito “inteligentes”, guichês com infor¬
mação eletrónica, além de um sistema de computadores, com dados
sobre a atuação de cada fornecedor desses serviços existente no
estado. Ao facilitar o surgimento de mercados mais inteligentes
como esse, os governos podem fazer com que os cidadãos formem
o mercado de acordo com seus próprios valores e necessidades.
1
REESTRUTURANDO OS MERCADOS
DENTRO DO SETOR PÚBLICO
Os mercados não existem só no setor privado, como também dentro
do setor público. Normalmente, nós os chamamos de “sistemas”: o
sistema de educação, o de treinamento profissional e o de saúde
mental — mas são mercados, assim como o sistema financeiro, obancário e o sistema de assistência médica. Se aplicássemos o pen¬
samento orientado para o mercado a esses sistemas públicos, con¬
seguiríamos bons resultados.
Infelizmente, poucas pessoas pensam no governo dessa manei¬
ra. Até, mesmo, os empresários abandonam sua visão empresarial
quando trabalham com o governo. Norm King conta uma história
a respeito da câmara de vereadores de Palm Springs, cujos mem¬
bros, mesmo empresários, não podiam entender a idéia de reduzir a
demanda de água pela elevação do seu preço:
A ironia é que nossos empresários locais, muitas vezes de
pensamento conservador, cuja vida depende da sua compre¬
ensão das leis da oferta e da demanda, não entendem como
os conceitos de oferta e demanda funcionam ou poderiam
funcionar numa situação verificada no setor público. Assim,
você tem cinco pessoas, homens de negócios do lugar, depen¬
dentes da oferta e da procura na sua própria vida profissio¬
nal, resistindo à idéia de que o consumo cairia se o usuário
tivesse de pagar o custo integral da água consumida. Temos,
aí, uma dicotomia muito interessante. Como capitalistas,
acreditamos que as leis da oferta e da procurafuncionam bem
no setor privado, mas não aceitamos que sejam válidas tam-
i-
336 REINVENTANDO O GOVERNO Governo orientado para o mercado 337
recursos disponíveis diretamente aos clientes, oferecendo-lhes “cor¬
retores” acessíveis e delegando-lhes a escolha entre os fornecedo¬
res concorrentes. No seguro contra o desemprego, pode significar
a criação de incentivos financeiros para que as empresas se empe¬
nhem na readaptação dos seus empregados, em lugar de dispensá-
los, ou criem um incentivo que leve os desempregados que depen¬
dem da assistência pública, a habilitar-se para conseguir emprego
em outro setor, o que, em muitos estados, ainda é desestimulado.
A idéia é aplicar, ao setor público, a mesma análise com que
procuramos compreender como funciona o mercado, e perguntar:
o que há de errado aqui? que está faltando? Será demanda, informa¬
ção ou competição? Que elementos do mercado precisam ser aper¬
feiçoados para que ele funcione efetivamente? Que outros sistemas
públicos precisam mudar para tornar possível esta mudança? O
sistema de orçamento, de pessoal, de recursos humanos? Este é,
precisamente, o tipo de pensamento aplicado por Philip Power e seus
colegas, em Michigan, ao treinamento profissional; e por Ted Kolderie
e seus colegas, em Minnesota, à educação.
Há quem prefira chamar esse exercício de abordagem sistémica.
Alguns governos fazem isso; os que adotam a Administração da
Qualidade Total (TQM - Total Quality Management), por exemplo,
aprendem que, tipicamente, 85% dos problemas em uma operação
derivam dos sistemas, e só 15%, das pessoas envolvidas. Mas a
maioria dos projetos de TQM, no setor público, dirige-se a sistemas
muito pequenos, que são mais fáceis de mudar: o horário de trabalho
dos motoristas que recolhem o lixo, por exemplo ou o procedimento
usado na aquisição dos veículos municipais. É importante mudar
esses sistemas, mas o verdadeiro desafio está em enfrentar os sis¬
temas maiores: orçamento, pessoal, contabilidade, educação, treina¬
mento profissional o seguro contra desemprego. Tom Mosgaller,
coordenador de TQM da cidade de Madison, acredita que a admi¬
nistração da qualidade total vai desaparecer se tratar apenas de
microsistemas: “Vale a pena aperfeiçoar o fluxo (dos caminhões de
lixo), mas não é isso que transforma uma cultura. Se não atacarmos
as infra-estruturas fundamentais, depois de algum tempo, os sindi¬
catos e os empregados vão dizer: “Ora, pessoal, vamos deixar de
brincadeira!’”
EQUILIBRANDO OS MERCADOS
E A COMUNIDADE
Muito do que discutimos neste livro poderia ser resumido sob o
título do governo orientado para o mercado: não só as mudanças de
sistema, mas também a competição e as opções do consumidor, a
responsabilidade pelos resultados e, naturalmente, a iniciativa pri¬
vada no setor público. Mas os mecanismos do mercado representam
apenas metade da equação. Os mercados são impessoais e não
perdoam; mesmo aqueles, mais cuidadosamente estruturados, ten¬
dem a levar a resultados pouco equitativos. Por isso, acentuamos,
também, a outra metade da nossa equação: a transferência de poder
para as coletividades. Precisamos do calor e do cuidado das famílias,
dos vizinhos e das comunidades, para complementar a eficiência e
a efetividade dos mecanismos de mercado. Ao se afastar do modelo
da burocracia administrativa, o governo empreendedor precisa
abranger tanto o mercado, quanto a comunidade.
Em Washington, o centfo do governo federal norte-americano,
seria isto chamado de movimento simultâneo para a esquerda e a
direita. A imprensa não hesita em classificar de “conservador” o que
se aproxima do mercado, e de “liberal” o que preconiza a transferên¬
cia de poder para as comunidades. Mas essas idéias pouca relação
têm com as noções tradicionais do que é “liberal” ou “conserva¬
dor”. Elas não se voltam para os objetivos do governo e, sim, para
os métodos utilizados; podem ser empregadas para implementar
qualquer programa de governo. Podem ajudar uma comunidade ou
uma nação a lutar contra a pobreza, por exemplo, se essa for sua
prioridade, ou a diminuir os impostos e reduzir as despesas públicas,
caso esta seja a sua prioridade. Reinventar o governo está, intima-
mente, ligado ao modo como os governos funcionam, não com o
que eles fazem. E, independentemente do que queiramos que eles
façam, será que não merecemos governos que voltem a funcionar?
;il L

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