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TAPERA DE ARRAIAL. Ali, na beira do rio Pará, deixaram largado um povoado inteiro: casas, sobradinho, capela, três vendinhas, o chalé e o cemitério e a rua, sozinha e comprida, que agora nem é mais uma estrada, de tanto que o mato a entupiu. Ao redor, bons pastos, boa gente, terra boa para o arroz. E o lugar já esteve nos mapas, muito antes da malária chegar. Então, houve gente tremendo, com os primeiros acessos da sezão. – Talvez para o ano que vem ela não volte, vá sembora. Ficou. Quem foi sembora foram os moradores: os primeiros para o cemitério, os outros por aí a fora, por este mundo de Deus. João Guimarães Rosa Sarapalha in Sagarana Malária Uma das mais importantes doenças infecciosas ~3,2 bilhões de pessoas vivem em áreas endêmicas de malária ~ 216 milhões de casos, ~ 445 mil óbitos em 91 países (WHO, 2016) à 90% casos na África 41% população mundial vive em áreas onde a Malária é transmicda. Brasil à 124.180 casos e 37 óbitos confirmados (2016) Sezão, Tremedeira, Maleita, Batedeira.... A malária está presente nas regiões tropicais e subtropicais do planeta. O maior foco de transmissão é a África Sub-‐Sahariana onde ocorrem 90% dos casos no mundo Malária no Brasil No Brasil, a área endêmica é conhecida como Amazônia Legal. Esta área é composta pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Rondônia, Roraima e Tocancns. Populações Ribeirinhas Agente e7ológico Gênero: Plasmodium Espécies: + de 100 Plasmodium à altamente específico 4 parasitam o homem: • Plasmodium falciparum : causa febre terçã maligna • Plasmodium vivax: causa febre terçã benigna • Plasmodium ovale: causa febre terçã maligna na África • Plasmodium malariae: causa febre quartã • Plasmodium knowlesi Maioria absoluta dos casos: P. falciparum e P. vivax P. falciparum • Forma mais letal de malária (90% das mortes) • Afeta zonas tropicais – África • 80-‐90% do inves7mento em pesquisa e controle • Infecta eritrócitos maduros • Causa malária cerebral severa • Pode ser cul7vado in vitro P. vivax • Principal causa de malária no Brasil: ~87% • Afeta zonas tropicais e temperadas • Número de casos estável em zonas onde P. falciparum está em declínio • Infecta eritrócitos imaturos (recculócitos) • Hipnozoítas no mgado: relapso • Não pode ser cul7vado in vitro Malaria report 2017 (WHO) P. vivax à responsável por 82% dos casos no Brasil P. falciparum à predominante na África e a mais virulenta. P. vivax e P. ovale à podem desenvolver formas latentes no mgado que podem ser reacvadas após 2 a 4 anos “E o anofelino é o passarinho que canta mais bonito, na terra bonita onde mora a maleita....ele aparece, o pernilongo pampa, de pés de prata e asas de xadrez. O mosquito fêmea não ferroa de-‐dia está dormindo, com a tromba repleta de maldades...” Vetor: gênero Anopheles Insetos dípteros Pequenos, 1 cm de comprimento Hábitos noturnos Fêmeas hematófagas Desenvolvimento em diferentes cpos de coleções de água -‐ salobra, doce Adulto: hábitos noturnos ou crepusculares Manchas nas asas Palpos Probóscida Características dos mosquitos do gênero Anopheles Distribuição mundial dos potenciais vetores de Malária -‐ 80 sp capazes de transmicr a malária Kiszewski et al., 2004. American Journal of Tropical Medicine and Hygiene 70(5):486-‐498. An. Darlingi (Brasil) An. albitarsis An. gambiae (África) An. aquasalis Hematofagia ü Mosquitos infectados com Plasmodium tem menor capacidade de obtenção de sangue. ü Aumenta o número de tentativas para obter sangue suficiente para oviposição. Manipulação do inseto vetor pelo parasita Malária Formas de vida do parasito: Esporozoítos Trofozoítos sangüíneos Esquizontes eritrocíccos Gametócitos Zigoto Oocisto Esquizontes hepáccos Merozoítos White et al, 2014 Ciclo de vida -‐ Plasmodium Esporozoítos • Alongados e móveis • Alojam-‐se nas glândulas salivares do inseto • 2 membranas (externa e interna) • Formas infectantes – possuem Complexo apical ou de penetração Roptrias e micronemasà proteínas necessárias à penetração à 2 proteínas de supermcie possuem propriedades adesivas ao hepatócito: -‐CSP (proteína circumsporozoíta) -‐TRAP (proteína anônima relacionada à trombospondina) Complexo apical Micronemas Roptrias (um par) O esporozoíta à esquizonte Após atravessar vários hepatócitos, o esporozoíta pára em um, se desenvolve e replica dentro de um vacúolo parasitóforo bem delineado. O parasita sofre então um processo conhecido como esquizogonia (o núcleo divide- se sem divisão da membrana), dando origem a uma estrutura conhecida como esquizonte (ou criptozoíta). Hipnozoítas de P. vivax e P.ovale. Formas dormentes que são responsáveis por relapsos da doença meses ou anos depois. Nature Reviews Microbiology (2006): 4-849 P. vivax P. malariae P. falciparum P. ovale 8 12-16 6 9 Duração da esquizogonia pré-eritrocítica (dias) Esquizontes hepáccos• Resultado da diferenciação dos esporozoítos nos hepatócitos • Formas arredondadas e mulcnucleadas • Crescem e sofrem múlcplas divisões nucleares • N° de merozoítos produzidos pelo esquizonte P. vivax – 10000 P. falciparum – 40000 • O esquizonte então dá origem a inúmeros merozoítas A etapa final envolve a liberação dos merozoítas na corrente sanguínea. Os merozoítas de Plasmodium são liberados na corrente sanguínea pela formação de vesículas cheias de merozoítas (merossomos), que “brotam” do hepatócito para o lúmen do sinusóide. Nature Reviews Microbiology (2006): 4-849 Esquizonte à Merozoítas P. vivax P. malariae P. falciparum P. ovale 10.000 2.000 40.000 15.000 Número de merozoítas por esquizonte tecidual Merozoítos • Capazes de invadir somente hemácias – possuem Complexo Apical • Formato ovóide • Altamente ancgênicos • 2 membranas (externa e interna) • roptrias e micronemas: proteínas necessárias à penetração • Resultado da diferenciação dos esquizontes Aikawa M. "Malaria", Topics in Inernational Health,(1998) The Wellcome Trust, CABI Publishing, CAB International) Moléculas da superfície da hemácia servem de receptores para ligantes presentes no merozoíta: • P. vivax: o antígeno Duffy liga-se à proteína ligante do antígeno Duffy • P. falciparum: EBA-175 liga-se a glicoforina A e EBA-140 liga-se a glicoforina B O merozoíta P. vivax P. malariae P. falciparum P. ovale Reticulócitos Eritrócitos maduros Todas as idades Reticulócitos Tipos de eritrócitos que infecta Adesão Reorientação Início da invasão Descarga das organelas do complexo apical (ex: secreção das roptrias) Formação do vacúolo parasitóforo Trofozoítos • Resultantes da diferenciação dos merozoítos • Encontrado dentro do eritrócito após 10-‐18 horas de infecção. • Digere a hemoglobina da hemácia dentro do vacúolo alimentar Esquizontes eritrocíccos • Resultantes da diferenciação dos trofozoítos • Semelhantes aos esquizontes hepáccos • Mulcnucleados • Esquizogonia: forma de reprodução assexuada em que ocorrem múlcplas mitoses, dando origem a uma células mulcnucleada. Uma vez que o núcleo e as organelas se replicaram, ocorre citocinese, dando origem aos merozoítas. Cada Plasmodium tem uma quancdade determinada de merozoítos na hemácia e a esquizogonia sanguínea ocorre em intervalos regulares para cada espécie. • P. vivax – 12 a 14, 48 horas • P. falciparum – 8 a 36, 36 a 48 horas • P. malariae – 6 a 12, 72 horas P. vivax P. malariae P. falciparum P. ovale 6-12 8-24 (ou +) 4-16 Números de merozoítas/hemácia 12-24 Gametócitos • Resultantes da diferenciação dos trofozoítos • Formas sexuadas do parasito • Formam microgametas masculinos e macrogametas femininos • Formas infectantes para o INSETO Gametogênese • Formação dos gametas (gametócito masculino e feminino). • Es{mulo ou mecanismo que desencadeia a diferenciação é desconhecido. • P. falciparum: 12-‐15 dias para desenvolvimento. • P. vivax: 36 horas P. falciparum P. vivax P. malariae P. ovale Fase eritrocítica Desenvolvimento no mosquito • Depois da digestão do repasto sanguineo, o micro e macro gametócitos rapidamente amadurecem. • O microgametócito rapidamente sofre divisão nuclear múlcpla para dar origem a 8 gametas. • Macrogameta é liberado da hemácia . Zigoto e oocineto ME de um oocineto de P. gallinaceum. Um oocineto (O) penetrando a membrana peritrófica (PT). (Toril et al, J. Protozool. 39(4) (1992), pp.449) • Ferclização forma um zigoto diplóide. • Matura por 18-‐24 horas. • Alonga-‐se, adquire mobilidade (oocineto) e se desloca para atravesar a parede do estômago do mosquito. • Tamanho varia de 10-‐20 mm (dependendo da espécie). Desenvolvimento no mosquito: o oocineto Oocineto maduro Imagem: Sinden RE. "Malaria", Topics in Inernational Health,(1998) The WellcomeTrust, CABI Publishing, CAB International Complexo apical Núcleo Películo • O oocineto transforma-‐se em oocisto ao envolver-‐se por uma grossa cápsula com 0.1-‐0.2 mm de espessura. • 10-‐12 dias de desenvolvimento para P. falciparum e 8-‐10 dias para P. vivax. • Divisão nuclear reducional, haplóide novamente. • mulcplicação para formar milhares de esporozoítas. Desenvolvimento no mosquito: do oocineto ao oocisto Oocisto rompendo-se Esporozoítas ²Hospedeiro Vertebrado – Homem Ciclo pré-‐eritrocícco ou cssular: primeira fase do ciclo Ciclo eritrocícco ² Hospedeiro Invertebrado – Inseto Ciclo biológico: Ciclo pré-‐eritrocícco ou cssular: primeira fase do ciclo Esporozoítos infectantes são inoculados no homem pelo inseto vetor do gênero Anopheles e invadem hepatócitos Após invasão do hepatócito, os esporozoítos se diferenciam em esquizontes, que crescem e tornam-‐se mulcnucleados Esquizontes diferenciam-‐se em merozoítos e rompem o hepatócito Merozoítos invadirão os eritrócitos Ciclo eritrocítico – se inicia quando merozoítos tissulares invadem os eritrócitos Merozoítos invadem eritrócitos Diferenciação em trofozoítos, esquizontes e merozoítos, que se mulcplicam até o rompimento das células Merozoítos liberados na corrente sanguínea Diferenciação em estágios sexuados, os gametócitos → seguirão seu desenvolvimento no inseto vetor Após algumas gerações de merozoítos sanguíneos 48 h ou 72 H ² Hospedeiro Invertebrado – Inseto No repasto sanguíneo, o Anopheles ingere as formas sanguíneasdo parasito – só os gametócitos serão capazes de evoluir no inseto → ciclo sexuado No intescno – o gametócito feminino se transforma em macrogameta e o masculino em microgameta A fecundação origina o ovo ou zigoto – 24 horas após a fecundação, o zigoto passa a se movimentar – oocineto Inicia-‐se o processo de divisão e, após 9-‐14 dias – ruptura do oocisto liberando os esporozoítos formados durante a divisão Esporozoítos disseminados por toda parte do corpo do inseto e acngem as glândulas salivares Esporozoítos injetados no hospedeiro vertebrado no momento da picada O oocineto acnge a parede do intescno se encista -‐ oocisto Transmissão Mais comum → transmissão através do inseto vetor Patogenia Ø Toda a sintomatologia clinica {pica e a patologia associada com a malária é causada apenas o ciclo eritrocícco assexuado. Ø A passagem do parasita pelo mgado (ciclo pré-‐eritrocícco) não é patogênica e não determina sintomas. Período de incubação: Varia de 12 a 30 dias – depende da espécie Normalmente há ausência de sintomas Fase inicial: mal-‐estar cefaléia cansaço mialgia Precedem a febre malárica Patogenia P. vivax P. malariae P. falciparum P. ovale Período de Incubação 8-27 dias 15-30 dias 8-25 dias 9-17 dias Presença de Hipnozoítas Sim Não Não Sim Número de merozoítas por esquizonte tecidual 10.000 2.000 40.000 15.000 Parasitemia Média (mm3) 50.000 20.000 50.000-500.000 9.000 Tipo de eritrócito que infecta Reticulócitos Eritrócitos maduros Todas as idades Reticulócitos Patogenia ü Sintomas mais comuns Ø Febre Ø Anemia Ø Esplenomegalia (baço aumentado) Causada pela hemozoína (pigmento malárico) que é uma substância pirogênica. Causada pela destruição das hemácias parasitadas ou das hemácias sadias por hemólise mediada por anticorpos. Causada pela resposta imunológica do paciente à infecção. Ø Febre Ø Anemia Ø Esplenomegalia “Primo Ribeiro diz: -‐ Ei, Primo, aí vem ela – Danada! – Olhele aí o friozinho nas costas” à Destruição dos eritrócitos e liberação de parasitos e metabólitos (pigmento malárico) à liberação de citocinas – leva a fenômenos patogênicos -‐ febre, mal-‐estar -‐ anemia -‐ Acesso malárico: coincide com a ruptura das hemácias – calafrios e sudorese – dura 15 minutos à 1 hora e é seguida por febre alta (até 41°C) A periodicidade dos sintomas depende do ciclo eritrocícco do Plasmódio: -‐febre terçã: a cada 48 horas (P. falciparum, P. ovale e P. vivax) -‐febre quartã: a cada 72 horas (P. malariae) “Primo Agemiro se agarrou com as mãos nos joelhos. Os maxilares estrondam só param de bater quando ele faz vômitos.” Acesso Malárico Calafrio Calor Suor Ø Forte sensação de frio Ø Tremores incontroláveis Ø Náusea e vômito Ø Duração: 1-2 horas Ø Calor intenso Ø Dor de cabeça Ø Náusea e vômito Ø Temperatura Alta (39-41°C) Ø Duração: 2-8 horas Ø Sudorese intensa Ø Prostração e sono Ø Duração: 3 horas Fonte: CTLT 48 horas 72 horas 36-48 horas 48 horas P. vivax P. malariae P. falciparum P. ovale Terçã maligna Terçã benigna Quartã Terçã leve Lise das hemácias à liberação de metahemoglobina à fagocitados e levados ao mgado e baço à inchaço e dor Casos crônicos àesplenomegalia permanente “ – O seu inchou mais, Primo Argemiro? – Olha aqui como é que está . E o seu primo? – Hoje está mais alto. – Inda dói muito? – Melhorou. É da passarinha. No vão esquerdo, abaixo das costelas, os baços jamais cessam de aumentar. E todos os dias eles verificam qual foi o que passou à frente.” Eritrócitos parasitados aderem à parede endotelial de capilares Formação de rosetas nas vênulas do rim, coração, mgado, cérebro, intescno Obstrução da microcirculação – malária cerebral, insuficiência renal e hepacte Malária Grave e Complicada Hemácias não infectadas Adesão em diferentes receptores endoteliais Patologia: citoaderência Produção local de citocinas (TNF-α) Mais comum infecções por P. falciparum Hemácias infectadas Obstrução capilar Auto-aglutinação Formação de rosetas Ø Malária cerebral: forte cefaléia, hipertemia, vômitos, sonolência, convulsões em crianças – paciente evolui para quadro de coma Ø Insuficiência renal aguda: aumento de uréia e creacnina plasmáccas Ø Icterícia: pele e mucosa amarelada devido ao aumento da bilirrubina sérica – resultante de hemólise excessiva ou compromecmento da função hepácca Diagnóscco • Clínico Febre intermitente Anemia Residência ou procedência de área endêmica • Laboratorial Parasito no exame de sangue punção digital • Imunológico Detecção de an{genos derivados do parasito no sangue imunocromatografia P. falciparum P. vivax P. malariae Trofozoítas Jovens Trofozoítas Maduros Gametócitos Esquizontes Formas Sanguíneas (dentro das hemácias) Tratamentos vCloroquina (amino-‐4-‐quinoleína: Resoquina®, Nivaquina®) ação esquizonccida e gametocitocida ancpirécca e ancinflamatória -‐P. falciparum: tornou-‐se resistente a cloroquina -‐P. vivax , P. ovale e P. malariae: ação eficiente v Primaquina (amino-‐8-‐quinoleína)• ação esquizonccida hepácco e gametocitocida eficiente • efeitos colaterais: náuseas, vômitos e dor abdominal v Mefloquina • ação esquizonccida àeficaz para combater P. falciparum Quinina: • durante muitos anos, único medicamento disponível hoje, pouco uclizado (desenvolvimento dos ancmaláricos sintéccos) • ressurgiu após resistência do P. falciparum a outros medicamentos • eficaz contra trofozoítos, esquizontes sangüineos e merozoítos “Primo Ribeiro: se alembra de quando o doutor deu a despedida pra o povo do povoado? O pessoal estava na portas das casas, batendo queixo. Falou: Não adianta tomar o remédio, porque o mosquito torna a picar. Todos têm que se mudar daqui.” Profilaxia -‐Evitar o contato com o mosquito -‐Uso de repelentes, telas em portas e janelas -‐Consumir alimentos à base de alho -‐Combate ao inseto vetor – inseccidas -‐Combate às larvas – larvicidas Quimioprofilaxia -‐Ancmaláricos com ação “-‐ Mas, meu Deus, como isto é bonito! Que lugar bonito pra gente deitar no chão é se acabar! É o mato, todo enfeitado, tremendo também com a sezão.” Tratamento Primaquina Mefloquina Cloroquina Doxiciclina Quinino Halofantrina Primaquina Artemisinina Tratamento Ação das Drogas
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