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Capítulo 34 323 Pedro Luiz Tauil Cor Jesus Fontes Malária 3434 INTRODUÇÃO A malária é uma doença infecciosa, parasitária, carac- terizada por acessos febris, precedidos por calafrios e se- guidos por sudorese e cefaléia. É conhecida também como maleita, impaludismo, sezão, febre intermitente, entre ou- tros nomes. Tem como agente etiológico protozoários do gênero Plasmodium. Mais de cem espécies deste gênero são conhe- cidas, infectando répteis, aves e mamíferos. Entre estes en- contram-se espécies de roedores, morcegos, ungulados e primatas. Admite-se que nenhum dos plasmódios animais seja infectante para a espécie humana, com exceção de al- guns que parasitam outros primatas e têm sido responsá- veis por infecções experimentais, acidentais e até algumas vezes naturais, em seres humanos. As espécies de plasmó- dios que estão associadas à malária humana são Plasmo- dium falciparum, P. vivax, P. malariae e P. ovale. No Brasil nunca foi registrada transmissão autóctone de P. ovale. Esta espécie está restrita a determinadas regiões da África. A transmissão natural da malária ocorre por meio da picada de fêmeas de mosquitos da família Culicidae, do gênero Anopheles. Várias espécies podem ser vetores da doença, sendo que no Brasil as mais importantes perten- cem a duas subespécies: Nyssorhinhcus e Kerteszia: A. (N) darlingi, A. (N) aquasalis, A. (N) albitarsis, A. (K) cruzii e A. (K) bellator. O A. darlingi é o transmissor de maior im- portância epidemiológica pela sua abundância, ampla dis- persão no território nacional, distribuindo-se por todo o interior do país, e por apresentar elevado grau de antropo- filia, domesticidade, endofagia e capacidade de transmitir diferentes espécies de plasmódio humano. Seus criadouros preferenciais são lugares de água limpa, quente, sombrea- da e de baixo fluxo, muito freqüentes na Amazônia brasi- leira. O A. aquasalis distribui-se na faixa litorânea que vai do Amapá até o norte de São Paulo e tem como criadouros preferenciais lugares de água salobra. O A. albitarsis, sabe- se hoje, é um complexo de espécies com diferentes capa- cidades vetoriais, sendo o A. marajoara e o A. deaneorum duas espécies já encontradas naturalmente infectadas no Brasil, em estados da região amazônica. O A. cruzii e o A. bellator encontram-se ao sul de São Paulo, e nos estados de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, tendo como criadouros preferenciais lugares de água acumulada na base das folhas de plantas bromeliáceas. Atualmente, no Brasil, mais de 99% dos casos de ma- lária ocorre na região amazônica, onde fatores de nature- za biológica, ecológica, social e econômica favorecem a incidência da doença e dificultam seu controle. CICLO BIOLÓGICO DOS PLASMÓDIOS O conhecimento do ciclo biológico dos plasmódios fa- cilita a compreensão do local de ação das drogas antima- láricas, tornando o tratamento da malária mais racional. A Fig. 34.1 apresenta o ciclo biológico dos plasmódios nos hospedeiros humanos e nos mosquitos anofelinos. Os esporozoítos são a forma infectante para os seres humanos, inoculados nos capilares sangüíneos pela pica- da dos insetos vetores. Permanecem pouco tempo na cir- culação sangüínea, penetrando nos hepatócitos. Nestas cé- lulas, evoluem para trofozoítos e, por esquizogonia, originam os esquizontes tissulares, ou pré-eritrocíticos. Esta fase constitui a fase pré-eritrocítica ou tecidual. Os esquizontes multiplicam-se também assexuadamente, dan- do origem a milhares de merozoítos, que rompem os he- patócitos e, caindo na circulação sangüínea, vão invadir os glóbulos vermelhos, dando início à segunda fase do ciclo, a fase eritrocítica. Na fase tecidual, os indivíduos infectados não apresen- tam manifestação clínica da doença. Sua duração varia conforme a espécie de plasmódio: cerca de uma semana para o P. vivax e P. falciparum e de duas semanas para o P. malariae. No caso do P. vivax e do P. ovale, existem popu- lações de esporozoítos distintas quanto à duração da sua atividade dentro dos hepatócitos, sendo umas mais lentas, denominadas hipnozoítos. Estas formas explicariam as re- 324 Capítulo 34 caídas que ocorrem nos doentes por esses plasmódios, quando não devidamente tratados. Na fase eritrocítica, os merozoítos que invadiram os eritrócitos, transformam-se em trofozoítos, que, por repro- dução assexuada, multiplicam-se em esquizontes e estes se multiplicam em novos merozoítos, que rompem as hemá- cias e penetram em outras, dando início a outros ciclos de esquizogonia eritrocitária. Depois de algumas gerações de merozoítos, algumas formas se diferenciam em formas sexuadas: os macro e microgametócitos. Estes não mais se dividem e se desenvolvem nos insetos vetores para dar ori- gem a novos esporozoítos. Os ciclos eritrocitários repetem-se a cada 48 horas nas infecções por P. vivax, e P. falciparum e a cada 72 horas nas in- fecções por P. malariae. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O período de incubação vai da inoculação dos esporo- zítos nos seres humanos até o aparecimento dos sintomas. Varia de sete dias a vários meses, dependendo da espécie e da cepa de plasmódio, da quantidade de parasitos e da exposição prévia à malária. Em zonas temperadas, nas in- fecções por P. vivax, esse período pode levar até oito me- ses ou mais. O período pré-patente compreende a fase pré-eritro- cítica do parasito, quando ele está restrito ao fígado. Vai desde a sua inoculação até a detecção microscópica no san- gue periférico. Este tempo varia com a espécie de plas- módio. O período patente refere-se à fase de manifestações clí- nicas e corresponde ao tempo em que os plasmódios são visíveis em amostras de sangue. Nos indivíduos semi-imu- nes, pode ocorrer parasitemia sem sintomas clínicos. São chamados de portadores assintomáticos. A crise aguda da malária caracteriza-se por episódios de calafrios, febre e sudorese. Tem duração variável de seis a 12 horas. A febre pode alcançar 40ºC e não responde aos antitérmicos. Em geral esses paroxismos são acompanha- dos por cefaléia, mialgias, náuseas e vômitos. A febre re- laciona-se com a liberação dos merozoítos sangüíneos pe- las hemácias rompidas ao final da esquizogonia. Após os primeiros paroxismos, a febre pode passar a ser intermi- tente, caracterizando as febres terçãs (a cada 48 horas), nas infecções por P. vivax e por P. falciparum, e as febres quartãs (a cada 72 horas), nas infecções por P. malariae. Pela des- truição de hemácias, a anemia costuma estar presente na grande maioria dos doentes. Os quadros clínicos da malária podem ser leves, mo- derados ou graves, na dependência da espécie de parasi- to, do nível de parasitemia, do tempo de doença e do ní- vel de imunidade adquirida. As gestantes, as crianças e os primoinfectados estão sujeitos a maior gravidade da doença. As infecções por P. falciparum são as que produ- zem a grande maioria das formas mais graves e letais. O diagnóstico precoce e o tratamento correto e oportuno são os meios mais adequados para reduzir a gravidade e a letalidade por malária. As manifestações da malária grave são principalmente anemia intensa, hipoglicemia, icterícia, distúrbios neuro- lógicos, insuficiência renal, insuficiência pulmonar e dis- túrbios da coagulação sangüínea. O diagnóstico clínico é amplamente praticado em re- giões dos países onde há dificuldades técnicas, operacio- nais e financeiras para comprovação laboratorial da doen- ça, particularmente na África, ao sul do deserto do Saara. Apesar de ser simples, de baixo custo e bastante sensível, principalmente em áreas endêmicas, o diagnóstico clínico não é muito específico, pois outras doenças febris agudas podem apresentar sinais e sintomas semelhantes aos da malária, como algumas arboviroses, entre elas a febre ama- rela e o dengue, a leptospirose e a febre tifóide. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL O diagnóstico laboratorial específico baseia-seno en- contro de parasitos da malária no sangue de indivíduos com manifestações clínicas suspeitas da doença. O méto- do mais freqüentemente utilizado é o exame microscópi- co do sangue pela técnica da gota espessa. O sangue é co- letado por punção digital, depositado numa lâmina e corado geralmente pelo Giemsa. A gota é examinada ao mi- croscópico óptico com uma lente objetiva de imersão de aumento de 100 vezes. O exame cuidadoso dessa lâmina bem corada, por profissional treinado e experiente, é con- siderado ainda o padrão-ouro para a detecção e identifica- ção dos parasitos da malária. A caracterização das espéci- es de Plasmodium pode ainda ser mais bem visualizada em esfregaços de sangue. Porém, a técnica de preparo desse tipo de lâmina é mais complexa e exige maior habilidade do coletador de sangue. O exame microscópico é bem sen- sível, conseguindo detectar densidades baixas de parasitos (5 a 10 parasitos por µL de sangue). Contudo, em geral nas condições de campo, o limite inferior de detecção é de 100 parasitos por µL de sangue. Permite diferenciação das es- pécies de Plasmodium e do estágio de evolução do parasi- to circulante. Pode-se ainda calcular a densidade da para- sitemia, comparando-se com o número de leucócitos ou de hemácias. Ainda permite o armazenamento da lâmina por tempo indeterminado, possibilitando o seu controle de qualidade. O exame microscópico é relativamente barato, mesmo considerando as despesas com equipamento, trei- namento do pessoal examinador, supervisão e controle de qualidade. O exame microscópico apresenta algumas des- vantagens, como o tempo de exame (cerca de 60 minutos, entre a coleta do sangue e o fornecimento do resultado). Depende de boa técnica de preparo da lâmina, da qualida- de dos reagentes, de pessoal bem treinado e experiente na leitura das lâminas e de permanente supervisão. Existe ainda um outro tipo de exame microscópico disponível: é o QBC® (Quantitative Buffy Coat). Utiliza-se de fluorocromos, como a acridina-laranja, em sangue centrifugado. É uma técnica bastante sensível, porém tec- nologicamente mais complexa e cara, requerendo equipa- mentos e materiais mais sofisticados. Pode ser praticada em laboratórios de referência e de pesquisa. A técnica da reação em cadeia da polimerase, o PCR, é mais sensível e específica que as anteriores, porém requer pessoal especializado, equipamentos e reagentes específi- cos e ainda bastante onerosos. É utilizada em laboratóri- os de pesquisa. Capítulo 34 325 A detecção de anticorpos por métodos sorológicos, através das técnicas de imunofluorescência indireta, imunoabsorção enzimática (ELISA) e hemaglutinação, pode ser utilizada no diagnóstico da malária, porém não na rotina para detecção de casos agudos em condições de campo. Mais recentemente foram introduzidos no comércio imunotestes para detecção de antígeno dos parasitos da malária, utilizando-se de anticorpos monoclonais, por métodos imunocromatográficos. Estão disponíveis kits que permitem diagnósticos rápidos, em cerca de 15 minu- tos. Os antígenos capturados atualmente são a HRPII (histidine-rich protein) produzida por trofozoítos e por gametócitos jovens de P. falciparum e a pLDH (desidroge- nase láctea do parasita), produzida tanto pelas formas assexuadas como sexuadas dos quatro parasitos da malá- ria, podendo-se diferenciar espécies de P. falciparum das não falciparum, porém não distingue P. vivax, de P. malariae e de P. ovale. Esses testes rápidos apresentam vantagens e desvantagens em relação aos exames microscópicos. A sensibilidade para P. falciparum é maior que 90%, compa- rando-se com a gota espessa, para densidades maiores que 100 parasitos por µL de sangue. A especificidade também é elevada, acima de 90%. São de fácil execução e interpre- tação de resultados, dispensam o uso de microscópico e de treinamento prolongado de pessoal. Entre suas desvanta- gens estão a impossibilidade de distinguir P. vivax, P. malariae e P. ovale; podem manter resultados positivos mes- mo após tratamento correto e eficaz, mas não medem os níveis de parasitemia e não detectam infecções mistas que incluem o P. falciparum. Seu custo parece ser ainda mais elevado que o da gota espessa. As indicações de seu uso em campo ainda estão sendo definidas pelos programas de controle de malária. TRATAMENTO O surgimento da resistência do P. falciparum à cloroqui- na ao final dos anos 1970 é hoje amplamente dissemina- da em todo o mundo, constituindo um dos principais de- safios ao controle da malária no mundo. No Brasil, a constatação da disseminação de cepas do P. falciparum re- sistentes às 4-aminoquinolinas se deu em 1987, resultan- do na suspensão do uso da cloroquina, e posteriormente da amodiaquina, para o tratamento dessa espécie de plasmó- dio no país. O tratamento da malária visa a atingir o parasito em pontos-chave de seu ciclo evolutivo, os quais podem ser didaticamente resumidos em: a. interrupção da esquizogonia sangüínea, responsável pela patogenia e manifestações clínicas da infecção; b. destruição de formas latentes do parasita no ciclo teci- dual (hipnozoítas) das espécies P. vivax e P. ovale, evi- tando assim as recaídas tardias; c. interrupção da transmissão do parasita pelo uso de drogas que eliminam as formas sexuadas dos parasitos (gametócitos). Para atingir esses objetivos, diversas drogas são utiliza- das, cada uma delas agindo de forma específica, tentando impedir o desenvolvimento do parasita no hospedeiro. As drogas antimaláricas mais comumente utilizadas são classificadas de acordo com o seu grupo químico em arilaminoalcoóis (quinina, mefloquina, halofantrina e lumefantrina), 4-aminoquinolinas (cloroquina e amodia-qui- na), 8-aminoquinolinas (primaquina), peróxido de lactona sesquiterpênica (derivados da artemisinina), naftoquinonas (atovaquona), biguanidas (proguanil), ou pela sua função terapêutica em antibióticos (tetraciclina, doxiciclina e clin- damicina). Três principais mecanismos de ação dessas drogas são identificados: a. degradação da hemoglobina no vacúolo lisossômico do parasito; b. depressão da atividade metabólica mitocondrial do parasita; c. interferência na via metabólica das purinas. Entretanto, na prática clínica, essa ação medicamento- sa é geralmente identificada pelos seus efeitos no ciclo bio- lógico do plasmódio, que são: a. drogas esquizonticidas teciduais ou hipnozoiticidas (cura radical do P. vivax e P. ovale); b. drogas esquizonticidas sangüíneas (promovem a cura clínica); c. drogas gametocitocidas (bloqueiam a transmissão). Os esquemas de tratamento da malária variam entre as diferentes áreas endêmicas do mundo, principalmente em função do perfil de endemicidade, o que gera perfis dife- renciados de imunidade, e da suscetibilidade do parasita aos antimaláricos. Para facilitar a escolha do melhor es- quema terapêutico da malária, é fundamental que se te- nham as seguintes informações: a. espécie de plasmódio causadora da doença; b. gravidade da doença; c. idade do paciente; d. história de exposição anterior à infecção: indivíduos primoinfectados tendem a apresentar formas mais gra- ves da doença; e. susceptibilidade dos parasitos da região aos antimalá- ricos convencionais; f. condições associadas, tais como gravidez e outros pro- blemas de saúde. No Brasil, a seleção e a recomendação das drogas an- timaláricas, assim como todas as informações concernen- tes ao tratamento da malária são periodicamente revisadas e disponibilizadas aos profissionais de saúde por meio de manuais técnicos editados pelo Ministério da Saúde. Deta- lhes sobre doses e administração dos medicamentos utili- zados para o tratamento dessa doença causada pelas espé- cies de plasmódio prevalentes no Brasil são apresentados nas Tabelas 34.1 e 34.2. TRATAMENTO DA MALÁRIA CAUSADA PELO P. MALARIAE Deve ser tratada com a cloroquina,ativa contra as for- mas sangüíneas e também contra os gametócitos dessa es- pécie (Tabela 34.1). 326 Capítulo 34 TRATAMENTO DAS MALÁRIAS CAUSADAS POR P. V IVAX E P. OVALE Devem ser tratadas com a cloroquina, ativa contra as formas sangüíneas e também contra os gametócitos dessas espécies. A cura radical é conseguida pela associação de um esquizonticida tecidual, a primaquina, que irá atuar sobre os hipnozoítas que podem estar presentes nessas es- pécies de plasmódio (Tabela 34.1). TRATAMENTO DA MALÁRIA CAUSADA PELO P. FALCIPARUM (TABELAS 34.1 E 34.2) Desde 1987, o Ministério da Saúde brasileiro tem recomen- dado a associação de quinina + doxiciclina (ou tetraciclina) como esquema de primeira escolha para tratamento do P. fal- ciparum não grave, nas áreas de transmissão da doença. Embo- ra eficaz, esse esquema está associado à baixa adesão dos pa- cientes, induzindo a um grande número de recrudescências. A mefloquina é um esquizonticida sangüíneo muito eficaz em dose oral única. Devido ao seu lento tempo de eliminação e conseqüente risco de desenvolvimento de re- sistência, sua indicação é reservada para pacientes que não toleram ou apresentam baixa resposta à associação de qui- nina + doxiciclina, ou para pacientes que residem em áreas onde não existe a transmissão da doença (por exemplo, pacientes da região extra-amazônica que retornam infec- tados, após viagem à áreas endêmicas). Aos casos graves de malária por P. falciparum, os deriva- dos da artemisinina são considerados como primeira opção terapêutica. Em geral, após a melhora do paciente, comple- menta-se o tratamento com outro antimalárico, podendo ser a mefloquina ou um antibiótico com ação antimalárica. A quinina parenteral, associada à clindamicina e mefloquina, são opções alternativas para os casos graves (Tabela 34.2). Em áreas de transmissão ativa da doença, é recomen- dado o uso de drogas gametocitocidas, visando à interrup- Tabela 34.1 Esquemas de Tratamento da Malária Não Complicada no Brasil Espécie de Plasmodium/Droga Dose Observações P. vivax e P. ovale Cloroquina 25 mg base/kg de dose total em 3 dias, sendo 10 mg/kg no Tomar os comprimidos junto às (comprimidos de 150 mg base) 1o dia; 7,5 mg/kg no 2o e 3o dias. Um esquema prático para refeições adultos seria 600 mg da base no 1o dia, seguidas de 300 mg base no 2o e 3o dias Primaquina (comprimidos de 5 e 15 mg) 0,25 mg/kg/dia, durante 14 dias ou 0,50 mg/kg/dia, A primaquina não deve ser usada durante 7 dias para gestantes ou menores de 6 meses de idade P. malariae Cloroquina Semelhante à descrita acima para o P. vivax P. falciparum Quinina + Doxiciclina 30 mg/kg/dia de quinina, BID, durante 3 dias A doxiciclina não deve ser usada para gestantes e menores de 8 anos Primaquina 3,3 mg/kg/dia de doxiciclina, BID, durante 5 dias ou Primaquina é contra-indicada para 0,75 mg/kg em dose única no 6o dia gestantes ou menores de 6 meses Mefloquina (comprimidos de 250 mg) 15 a 20 mg/kg em dose única Pode ser administrada em 2 tomadas com intervalo de 12 horas Primaquina 0,75 mg/kg em dose única no 2o dia Não recomendada para gestantes e quem usou quinina nas últimas 24 h Primaquina é contra-indicada para gestantes ou menores de 6 meses Quinina (monoterapia) 25 mg/kg/dia durante 7 dias Opção de escolha para gestantes e crianças menores de 8 anos P. falciparum + P. vivax (mista) Ver acima Mefloquina 15 a 20 mg/kg em dose única Primaquina 0,25 mg/kg/dia, durante 14 dias ou 0,50 mg/kg/dia, durante 7 dias (Adaptado do Manual de Terapêutica da Malária, Ministério da Saúde, 2001.) Capítulo 34 327 Tabela 34.2 Esquemas de Tratamento da Malária Grave por P. falciparum Esquema de artesunato endovenoso: 2,4 mg/kg (dose de ataque) por via endovenosa, seguidos de 1,2 mg/kg administrados após 12 e 24 horas da dose de ataque. Manter dose diária de 1,2 mg/kg durante 6 dias. A droga deve ser dissolvida em diluente próprio ou em uma solução de 0,6 mL de bicarbonato de sódio 5%. Esta solução deve ser diluída em 3-5 mL de SG 5%, e administrada imediatamente por via endovenosa, em bolo. O tratamento deve ser complementado com outro antimalárico oral, como por exemplo a mefloquina na dose de 15 a 20 mg/kg em dose única; ou clindamicina, 20 mg/kg de peso/dia, por 5 dias, divididos em duas tomadas (12 em 12 horas), via oral; ou doxiciclina, 3,3 mg/kg de peso/dia dividida em duas tomadas (12 em 12 horas), por 5 dias, via oral. Esquema de artemeter intramuscular: 3,2 mg/kg (dose de ataque) intramuscular, seguidos de 1,6 mg/kg, durante 6 dias. Deve-se complementar o tratamento com outro antimalárico oral, conforme orientação acima. Esquema de quinina endovenosa (adultos): 20 mg de dicloridrato de quinina/kg (dose de ataque) diluídos em 10 mL de SG 5%/kg, por infusão EV em 4 horas (máximo de 500 mL de SG 5%); 8 horas após, administrar quinina 10mg/kg, diluídos da mesma forma, em 4 horas. Repetir essa dose a cada 8 horas, até que o paciente possa deglutir e administrar quinina oral 10mg/kg a cada 8 horas, até completar 7 dias. (Crianças): 20 mg de quinina sal/kg (dose de ataque), diluídos em 10 mL de SG5%/kg, por infusão EV em 4 horas; 12 horas depois, administrar quinina 10 mg/kg em 2 horas, diluídos da mesma forma. Repetir essa dose a cada 12 horas, até que o paciente possa deglutir e iniciar quinina oral 10mg/kg de 8 em 8 horas, até completar 7 dias. Nos intervalos entre as doses de ataque e manutenção da solução com quinina, o paciente deve permanecer com acesso parenteral, tendo-se o máximo cuidado para evitar infusão excessiva de fluidos. Esquema de quinina endovenosa associada à clindamicina endovenosa: administrar quinina nas mesmas doses descritas para adultos e crianças até 3 dias. Associar clindamicina na dose de 20 mg/kg de peso, divididos em 2 doses (12 em 12 h), diluídas em solução glicosada a 5% (15 mL/kg de peso) infundida gota a gota em 1 hora, durante 7 dias. ESTE ESQUEMA É CONSIDERADO DE ESCOLHA PARA GESTANTES COM MALÁRIA GRAVE. Esquema de artemisinina supositórios (ainda não disponível no Brasil): 40 mg/kg (dose de ataque) por via intra-retal, seguidos de três doses de 20 mg/ kg, a cada 24 horas. Logo após, administrar um antimalárico por via oral. Esquema de artesunato cápsulas retais: Uma dose de ataque de 4-6 mg/kg por via intra-retal; seguida de 2 a 3 mg/kg administrados em 4 doses nos momentos 4, 12, 48 e 72 horas. Após essas doses, deve-se administrar um medicamento antimalárico por via oral. (Adaptado do Manual de Terapêutica da Malária Grave, Organização Mundial de Saúde, 2000.) ção da transmissão. A primaquina, único medicamento com ação sobre os gametócitos do P. falciparum, deve ser usada para tal fim. TRATAMENTO DAS INFECÇÕES M ISTAS Para pacientes com infecção mista causada por P. falci- parum + P. vivax (ou P. ovale), o tratamento deve incluir dro- ga esquizonticida sangüínea eficaz para o P. falciparum, as- sociada à primaquina (esquizonticida tecidual). Se a infecção mista é causada pelo P. falciparum + P. malariae, o tratamento deve ser dirigido apenas para o P. falciparum. TRATAMENTO DA MALÁRIA NA GRAVIDEZ Sabe-se que a placenta favorece o desenvolvimento do parasito na gestante, e que a gravidez é causa conhecida de depressão da resposta imune. Portanto, a malária durante a gravidez constitui risco substancial para a mãe, feto e re- cém-nascido. Em geral, mulheres grávidas de segundo e terceiro trimestres são mais suspcetíveis aos quadros gra- ves e complicados da malária causada pelo P. falciparum, o que pode resultar em aborto espontâneo, prematuridade, baixo peso ao nascer e morte materna. Por esta razão, o tra- tamento da malária deve ser precoce, a fim de impedir es- sas complicações. Além disso, é recomendável avaliar cri- teriosamente o recém-nascido durante as quatro primeiras semanas de vida, pelo risco de malária congênita. A gestante portadora de maláriacausada pelo P. vivax deve ser tratada apenas com a cloroquina, droga segura na gravidez. O uso da primaquina como esquizonticida teci- dual deve ser postergado até o final da amamentação. A pa- ciente deve ser conscientizada de que recaídas poderão acon- tecer durante a gravidez e que o tratamento com cloroqui- na será repetido. Em algumas situações, a utilização de cloroquina semanal (dose de 300 mg) representa um recurso eficiente para prevenir as recaídas durante a gestação. No caso de malária por P. falciparum durante a gestação, apenas a quinina em monoterapia ou a quinina associada à clindamicina deve ser utilizada (Tabela 34.1). Tetraciclina e doxiciclina são contra-indicadas, enquanto a mefloquina e os derivados da artemisinina ainda não apresentaram in- formações suficientes sobre sua segurança na gravidez. Ex- ceção é feita aos derivados da artemisinina nos casos de malária grave, caso seja iminente o risco de vida da mãe. TERAPIA EM COMBINAÇÃO DE ANTIMALÁRICOS Nos últimos anos, a Organização Mundial de Saúde tem recomendado o estudo criterioso da eficácia e efetivi- dade de diferentes combinações de antimaláricos. O prin- cípio fundamental dessa estratégia é o reconhecimento do potencial antimalárico sinergístico ou aditivo de duas ou mais drogas, com vistas a incrementar a eficácia e também retardar o desenvolvimento da resistência aos componen- tes da combinação. Embora ainda não disponíveis comer- cialmente no Brasil, alguns esquemas de combinação de drogas antimaláricas com eficácia conhecida são: Atovaquona-Proguanil Recomendado para o tratamento da malária falcipa- rum, principalmente nos casos de falha terapêutica com os 328 Capítulo 34 esquemas convencionais com quinina, quinina + doxicicli- na ou mefloquina. Deve ser administrado para pacientes adultos (pesos > 40 kg), na dose de 1 g de atovaquona as- sociada a 400 mg de proguanil, diariamente, por três dias. A dose diária deve ser reduzida para três comprimidos se o peso for entre 31-40 kg; para 2 comprimidos entre 21 e 30 kg; um comprimido entre 11 e 20 kg. Esta combinação terapêutica ainda não é recomendada para crianças meno- res de dez anos, mulheres grávidas ou portadores de insu- ficiência renal, devido a falta de informações sobre a sua toxicidade nessas condições. Artemeter-Lumefantrina Pode ser usada para tratamento da malária falciparum não complicada, incluindo os casos que não responderam ao tratamento convencional. Em indivíduos semi-imunes, um regime fixo de seis doses tem sido operacionalmente aceito e consiste na administração de um a quatro compri- midos (dependendo do peso) nos momentos 0 h, 8 h, 24 h, 36 h, 48 h e 60 h. Assim, para adultos com mais de 35 kg, o número de comprimidos será de quatro; entre 25 e 34 kg, três comprimidos; entre 15 e 24 kg, dois comprimidos; e en- tre 10 e 14 kg, um comprimido. Não se recomenda o uso em crianças com menos de 10 kg e nem para mulheres ges- tantes ou em lactação. PROFILAXIA DA MALÁRIA No Brasil, onde o P. falciparum e o P. vivax se distribu- em de maneira quase homogênea nas diferentes áreas en- dêmicas, a política adotada atualmente com relação à sua profilaxia é centrada apenas nas medidas de proteção in- dividual. Como o mosquito vetor tem, em geral, hábitos noturnos de alimentação, recomenda-se evitar a aproxima- ção às áreas de risco após o entardecer e logo ao amanhe- cer. O uso de repelentes nas áreas expostas do corpo, telas em portas e janelas e mosquiteiros também são medidas que têm este objetivo. Como não é disponível uma vacina ou uma droga pro- filática causal para a malária, a ação esquizonticida sangüí- nea de alguns antimaláricos tem sido usada como forma de prevenir as suas manifestações clínicas. Entretanto, a progressiva expansão do P. falciparum resistente e o maior potencial tóxico dos antimaláricos disponíveis fizeram com que a sua quimioprofilaxia passasse a representar um tema polêmico nos últimos anos. Como medida de curto prazo, a quimioprofilaxia pode ser recomendada apenas para viajantes internacionais e grupos especiais. A única droga que pode se mostrar eficaz como profilática no Brasil é a mefloquina, devendo ser ini- ciada uma semana antes do deslocamento para o local de destino e interrompida após quatro semanas do regresso à área de origem. Aos indivíduos para os quais ela for reco- mendada, deverão ser repassadas informações sobre pos- síveis efeitos colaterais e como proceder para ter o diag- nóstico e tratamento adequado da doença, caso tornem-se sintomáticos durante ou após a viagem. Não se deve deixar de enfatizar que todas as pessoas que se dirigem para áreas endêmicas precisam ser orien- tadas para, em caso de doença febril durante o período de permanência e até cerca de 30 dias após a saída apresen- tarem suspeita de malária, procurarem confirmação do diagnóstico laboratorial. O diagnóstico precoce e o trata- mento adequado reduzem o risco de formas graves e letais. Como medidas coletivas algumas estratégias têm sido consideradas atualmente para reduzir os níveis de transmis- são nas áreas endêmicas. Destacam-se as medidas de comba- te ao vetor adulto, através da borrifação das paredes dos do- micílios com inseticidas de ação residual; medidas de combate às larvas, por meio principalmente do controle biológico de larvas, utilizando o Bacillus turigiensis e o B. sphericu; medi- das de saneamento básico para evitar a formação de “criadouros” de mosquitos, surgidos principalmente a par- tir das águas pluviais e das modificações ambientais provo- cadas pelo homem; medidas para melhorar as condições de vida, por meio da informação, educação e comunicação, a fim de provocar mudanças de atitude da população em re- lação aos fatores que facilitam a exposição à transmissão. BIBLIOGRAFIA 1. Boulos M. Clínica de la infección malárica. In Diagnóstico de la malaria. Organización Panamericana de la Salud. 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