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REDUÇÃO DE DANOS - DROGAS 2018

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Descoberta a provável causa do vício. E não é o que você pensa. 
Johann Hari 
19/06/2016 
 
Faz cem anos que as drogas foram proibidas pela primeira vez - e, ao longo desse século de 
guerra contra as drogas, professores e governos nos contaram histórias de vício. Essas histórias 
estão enraizadas em nossas mentes. Elas parecem óbvias, verdades evidentes. 
Até três anos atrás, quando comecei uma jornada de 50 000 quilômetros para escrever meu 
novo livro, 'Chasing The Scream: The First and Last Days of the War on Drugs' (‘Perseguindo o 
grito: os primeiros e os últimos dias da guerra contra as drogas’), eu também acreditava nisso. 
Mas o que descobri em minhas viagens é que quase tudo o que nos contaram sobre o vício está 
errado - e existe uma história muito diferente à nossa espera, se estivermos prontos para ouvi-la. 
Se realmente absorvermos essa nova história, teremos de mudar muito mais que a guerra contra 
as drogas. Teremos de nos transformar. 
Aprendi com uma mistura extraordinária de pessoas que conheci na estrada. Dos amigos de 
Billie Holiday, que me ajudaram a entender como o fundador da guerra contra as drogas a 
perseguiu e ajudou a matá-la. De um médico judeu que foi tirado às escondidas do gueto de 
Budapeste quando era bebê, para depois destravar os segredos do vício quando adulto. 
De um transexual traficante de crack do Brooklyn que foi concebido quando sua mãe, uma 
viciada em crack, foi estuprada pelo pai dele, um policial de Nova York. De um homem que foi 
mantido preso no fundo de um poço durante dois anos por uma ditadura para depois emergir e 
ser eleito presidente do Uruguai, começando os dias finais da guerra contra as drogas. 
Tinha uma razão bastante pessoal para sair em busca dessas respostas. Uma das minhas 
primeiras lembranças da infância é tentar acordar um parente, sem sucesso. Desde então, 
venho pensando sobre o mistério do vício - o que faz algumas pessoas se fixar em uma droga 
ou um comportamento a ponto de não conseguir parar? Como ajudamos essas pessoas a voltar 
para a gente? Ao envelhecer, outro parente próximo ficou viciado em cocaína, e eu me envolvi 
com uma pessoa viciada em heroína. Acho que me sinto em casa perto de viciados. 
Se você me perguntasse lá atrás o que provoca o vício em drogas, te olharia como se você 
fosse um idiota e diria: "Drogas. Dã." Não é difícil entender. Achei que tivesse visto isso 
acontecer na minha própria vida. Qualquer um consegue explicar. Imagine se eu, você e as 
próximas 20 pessoas que passarem na rua tomássemos uma droga potente por 20 dias. Existem 
agentes químicos fortes nessas drogas, então no vigésimo-primeiro dia nossos corpos 
precisariam desses químicos. Teríamos uma necessidade urgente deles. Estaríamos viciados. 
Esse é o significado de vício. 
Essa teoria foi estabelecida por meio de experimentos com ratos - experimentos que foram 
injetados na psique americana nos anos 1980, em um famoso anúncio da Partnership for a 
Drug-Free America. Você talvez se lembre. O experimento é simples. Coloque um rato numa 
gaiola, sozinho, com duas garrafas d'água. Uma delas tem só água. A outra tem água misturada 
com cocaína ou heroína. Em quase todas as vezes que você fizer esse experimento, o rato vai 
ficar obcecado com a água com drogas. Ele vai tomá-la até morrer. 
O anúncio explica: "Só uma droga é tão viciante, nove de dez ratos de laboratório vão usá-la. E 
usá-la. E usá-la. Até a morte. É chamada cocaína. E ela pode fazer o mesmo com você". 
Mas, nos anos 1970, um professor de psicologia de Vancouver chamado Bruce Alexander 
percebeu algo estranho nesse experimento. O rato está sozinho na gaiola. Ele não tem nada para 
fazer além de usar a droga. O que aconteceria se tentássemos algo diferente? Então Alexander 
criou o Rat Park. É uma gaiola sofisticada, onde os ratos têm bolas coloridas e túneis para 
brincar, vários amigos e a melhor das comidas: tudo o que um rato poderia desejar. Alexander 
queria saber o que iria acontecer. 
No Rat Park, todos os ratos tomaram água das duas garrafas, é claro, porque não sabiam o que 
elas continham. Mas o que aconteceu depois foi surpreendente. 
Os ratos nessa vida boa não gostavam da água com drogas. Eles basicamente a ignoravam: 
consumiam menos de um quarto dessa água, em comparação com os animais isolados. Nenhum 
deles morreu. Todos os ratos que estavam sozinhos em suas gaiolas se tornaram dependentes da 
droga, mas isso não aconteceu com nenhum dos animais do Rat Park. 
Inicialmente, achei que isso fosse meramente uma idiossincrasia dos ratos, até descobrir que 
havia - na mesma época do experimento do Rat Park - um equivalente humano em andamento. 
Era a Guerra do Vietnã. 
A revista Time relatou que, entre os soldados americanos, usar heroína estava se tornando um 
hábito tão corriqueiro quanto mascar chiclete, e existem evidências sólidas para sustentar tal 
afirmação: cerca de 20% dos soldados americanos ficaram viciados em heroína no Vietnã, 
segundo um estudo publicado no Archives of General Psychiatry. Muita gente ficou 
compreensivelmente aterrorizada; elas achavam que com o fim da guerra um enorme número de 
viciados voltaria para casa. 
Mas, na realidade, cerca de 95% dos soldados viciados - segundo o mesmo estudo - 
simplesmente pararam de usar heroína. Alguns poucos foram para clínicas de recuperação. Eles 
passaram de uma gaiola aterrorizante para uma agradável, e não queriam mais usar drogas. 
Alexander argumenta que essa descoberta é uma contestação profunda tanto da visão direitista, 
segundo a qual o vício é uma fraqueza moral causada por uma vida de festas e hedonismo, 
quanto da visão liberal, que diz que o vício é uma doença que existe num cérebro quimicamente 
sequestrado. Na verdade, segundo Alexander, vício é adaptação. Não é você. É a gaiola. 
Depois da primeira fase do Rat Park, Alexander levou seu teste além. Ele refez os primeiros 
experimentos, nos quais os ratos se tornavam usuários compulsivos de drogas. Ele os deixou usar 
a droga durante 57 dias - se tem um jeito de ficar viciado, é esse. 
Então ele tirou os animais do isolamento e os colocou no Rat Park. Alexander queria saber se, 
uma vez viciado, o cérebro estava sequestrado e não havia maneira de recuperá-lo. As drogas 
assumem o controle? O que aconteceu - de novo - foi impressionante. Os ratos pareciam exibir 
alguns tremores de abstinência, mas logo pararam de usar as drogas pesadamente e voltaram a 
ter uma vida normal. A gaiola boa os salvou. 
Quando soube disso, fiquei encucado. Como seria possível? Essa nova teoria é um ataque tão 
radical ao que nos contaram que não parecia ser verdade. Mas, quanto mais cientistas 
entrevistava, quanto mais estudos lia, mais descobria coisas que não pareciam fazer sentido - a 
menos que você leve em conta essa nova abordagem. 
Eis um exemplo de experimento que acontece à sua volta, e pode inclusive acontecer com você 
um dia desses. Se você for atropelado e quebrar a bacia, provavelmente vão te dar diamorfina, o 
nome médico para heroína. 
No hospital, haverá muita gente tomando heroína por longos períodos, para aliviar a dor. A 
heroína que o médico te der vai ser muito mais pura e potente que aquela usada pelos viciados, 
que compram uma droga adulterada pelos traficantes. Então, se a velha teoria do vício estiver 
certa - a culpa é da droga; ela faz seu corpo precisar dela -, é óbvio o que vai acontecer. As 
pessoas sairão do hospital e irão direto procurar um traficante para comprar heroína. 
Mas eis o que é estranho: isso virtualmente nunca acontece. Como me explicou o médico 
canadense Gabor Mate os usuários de heroína médica simplesmente param, apesar de meses de 
uso. A mesma droga, usada pelo mesmo período, cria viciados nas ruas, mas não afeta os 
pacientes de hospitais. 
Se você ainda acredita, como eu acreditava que o vício é causado por agentes químicos, issonão faz sentido. Mas, se você acredita na teoria de Bruce Alexander, a imagem começa a entrar 
em foco. O viciado da rua é o rato da primeira gaiola, isolado, sozinho, com uma única fonte de 
conforto. O paciente do hospital é o rato da segunda gaiola. Ele vai para casa, para uma vida em 
que está cercado pelas pessoas que ama. A droga é a mesma, mas o ambiente é diferente. 
Isso nos dá um insight muito mais profundo que a necessidade de entender os viciados. O 
professor Peter Cohen argumenta que os seres humanos têm uma necessidade profunda de 
estabelecer laços e conexões. É como nos satisfazemos. Se não conseguirmos nos conectar 
uns com os outros, vamos nos conectar com o que encontrarmos - a bolinha pulando na roleta 
ou a ponta da agulha de uma seringa. Ele diz que deveríamos simplesmente parar de falar em 
"vício": deveríamos falar em "ligação". Um viciado em heroína criou uma ligação com a droga 
porque não conseguiu estabelecer outras conexões. 
O oposto de vício, portanto, não é sobriedade. É conexão humana. 
Quando soube disso tudo, fui sendo persuadido gradualmente. Mas restava uma dúvida 
incômoda. Será que os cientistas estão dizendo que a parte química do vício não faz diferença 
nenhuma? 
Me explicaram - você pode se viciar em jogo, mas ninguém vai achar que você vai injetar um 
baralho nas veias. Você pode ser viciado, mas não há o lado químico. Fui a uma reunião dos 
Viciados em Jogos Anônimos em Las Vegas (com a permissão de todos os presentes, que 
sabiam que eu estava lá apenas como observador). Eles eram tão viciados quanto os usuários 
de cocaína e heroína que conheci. Mas uma mesa de pôquer não tem químicos. 
Ainda assim, perguntei: a química desempenha algum papel? Um experimento tem a resposta 
precisa, que descobri no livro The Cult of Pharmacology (o culto da farmacologia, em tradução 
livre), de Richard DeGranpre. 
Todos concordam que fumar cigarros é um dos processos mais viciantes que existem. Os 
químicos do tabaco vêm da nicotina. Quando foram inventados os adesivos de nicotina, no 
começo dos anos 1990, houve uma grande onda de otimismo - os fumantes poderiam satisfazer 
suas necessidades químicas sem o resto dos efeitos imundos (e mortais) do cigarro. Seria a 
libertação. 
Mas o Ministério da Saúde descobriu que apenas 17,7% dos fumantes conseguem parar de 
fumar usando adesivos de nicotina. É claro que não é pouca coisa. Se os químicos respondem 
por 17,7% do vício, como mostra esse dado, ainda temos milhões de vidas arruinadas 
globalmente. Mas o que ele revela, mais uma vez, é que a história que nos contaram sobre as 
causas químicas do vício é real, mas só uma parte pequena de uma fotografia muito maior. 
Isso tem enormes implicações para a secular guerra contra as drogas. Essa guerra massiva - 
que, como vi, mata gente dos shoppings mexicanos às ruas de Liverpool - é baseada na 
afirmação de que precisamos erradicar fisicamente uma vasta gama de químicos, pois eles 
sequestram cérebros e provocam o vício. Mas, se as drogas em si não são as causadoras do 
vício - se, na verdade, é a desconexão que causa o vício --, então nada disso faz sentido. 
Ironicamente, a guerra contra as drogas na verdade potencializa esses causadores de vício. Por 
exemplo: fui a uma prisão no Arizona - "Tent City" --, onde os detentos ficam presos em 
minúsculas celas de pedra ("O Buraco") por semanas a fio se usarem drogas. É a versão 
humana mais próxima que consigo imaginar das gaiolas de isolamento dos ratos. Quando os 
presos saem da cadeia, não conseguirão emprego, porque têm ficha criminal - garantido um 
isolamento ainda maior. Vi exemplos assim no mundo inteiro. 
Existe uma alternativa. Você pode criar um sistema desenhado para ajudar os viciados a se 
reconectar com o mundo - e, assim, deixar o vício para trás. 
Isso não é teoria. Está acontecendo. Vi com meus próprios olhos. Cerca de 15 anos atrás, 
Portugal tinha um dos piores problemas de drogas da Europa - 1% da população era viciada em 
heroína. Os portugueses tentaram a guerra contra as drogas, mas o problema só piorava. Então 
decidiram fazer algo radicalmente diferente. Resolveram descriminar todas as drogas e usar o 
dinheiro gasto para prender os viciados em programas de reconexão - com seus sentimentos e 
com a sociedade. O passo mais crucial é garantir moradia e empregos subsidiados, para que 
eles tenham propósito na vida, algo que os faça sair da cama pela manhã. Em clínicas 
acolhedoras, vi os viciados aprendendo a se reconectar com seus sentimentos, depois de anos 
de trauma e de um silêncio forçado causado pelas drogas. 
Um exemplo que observei foi um grupo de viciados que recebeu um empréstimos para começar 
uma empresa de coleta de lixo. Repentinamente, eles eram um grupo, todos conectados entre si 
e com a sociedade, cuidando uns dos outros. 
Agora se conhecem os resultados disso tudo. Um estudo independente do British Journal of 
Criminology descobriu que, desde a total descriminação, o vício caiu e o uso de drogas injetáveis 
teve redução de 50%. Repito: o uso de drogas injetáveis teve redução de 50%. A descriminação 
foi um sucesso tão grande que pouquíssima gente em Portugal defende uma volta ao antigo 
sistema. O maior opositor dessa política em 2000 era João Figueira, o principal policial da força 
antidrogas. Ele fez alertas terríveis, do tipo que se espera ouvir na Fox News ou ler no Daily 
Mail. Mas, quando conversamos em Lisboa, Figueira me disse que nenhuma de suas previsões 
se confirmou - e agora ele espera que o resto do mundo siga o exemplo português. 
Isso não é relevante só para os viciados que amo. É relevante para todos nós, pois nos força a 
pensar de maneira diferente a respeito de nós mesmos. Os seres humanos são animais que 
precisam de laços. Precisamos de conexões e de amor. A frase mais sábia do século 20 foi 
"Apenas se conecte", de E.M. Forster. Mas criamos um ambiente e uma cultura que cortou 
conexões, ou que oferece apenas um simulacro delas: a internet. O crescimento do vício é 
sintoma de uma doença mais profunda na maneira como vivemos - constantemente olhando 
para o próximo objeto brilhante que queremos comprar, em vez dos humanos que nos cercam. 
O escritor George Monbiot fala na "era da solidão" Criamos sociedades humanas em que o corte 
de conexões nunca foi tão fácil. Bruce Alexander, o criador do Rat Park, me disse que falamos 
demais em recuperação de indivíduos. Precisamos falar de recuperação social - como todos nos 
recuperamos juntos da doença do isolamento que recai sobre nós como uma névoa densa. 
Mas essas novas evidências não são apenas um desafio político. Elas não nos forçam somente 
a transformar nossas cabeças. Elas nos forçam a transformar nossos corações. 
É muito difícil amar um viciado. Quando olho para os viciados que amo, é sempre tentador optar 
pela estratégia durona recomendada por programas como Intervention - falar para o viciado 
tomar jeito ou então cortá-lo de sua vida. A mensagem é que o viciado que não parar com as 
drogas deve ser rejeitado. É a lógica da guerra contra as drogas importada para nossas vidas. 
Mas, na verdade, aprendi que isso só agrava o vício - e você pode perder a pessoa para 
sempre. Voltei para casa determinado a me aproximar como nunca dos viciados da minha vida - 
dizer para eles que os amo incondicionalmente, consigam eles parar ou não. 
Quando terminei minha longa jornada, olhei para meu ex-namorado, em crise de abstinência, 
tremendo no quarto de visitas, e pensei nele de um jeito diferente. Há um século estamos 
entoando cantos de guerra sobre os viciados. Quando secava a testa dele, me ocorreu que 
deveríamos estar entoando canções de amor. 
A história completa da jornada de Johann Hari - contada por meio das histórias das pessoas que 
ele conheceu - está em 'Chasing The Scream: The First and Last Days of the War on Drugs' 
(Perseguindo o grito: os primeiros e osúltimos dias da guerra contra as drogas, em tradução 
livre), publicada pela Bloomsbury. O livro foi elogiado por Elton John, Naomi Klein e Glenn 
Greenwald, entre outros. 
 
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Como a Alemanha acabou com sua "Cracolândia" 
06/06/2017 
No final da década de 1980, o maior ponto de uso de drogas a céu aberto da Alemanha ficava 
em Frankfurt: na região do parque de Taunusanlage, próximo à estação ferroviária central, 
viviam cerca de 1,5 mil dependentes de heroína, numa espécie de "Cracolândia" alemã. 
Além de ser um problema social, Taunusanlage era uma questão de saúde pública: cerca de 
150 dependentes morriam de overdose a cada ano. Atualmente, mais de 25 anos depois, a 
"Cracolândia" alemã faz parte do passado da cidade. 
A extinção do ponto de uso de drogas foi alcançada graças a uma iniciativa que ficou 
conhecida como o "Caminho de Frankfurt" e serviu de exemplo para diversas cidades do país 
que enfrentavam problema semelhante. 
"A mudança na política de drogas não ocorreu pela convicção nas opções que se tornavam 
populares, como terapias de substituição, mas pela necessidade de que algo novo precisava 
ser feito, já que o tradicional não estava funcionando", avalia Dirk Schäffer, assessor para 
drogas e sistema penal da organização de combate à aids Deutsche Aids-Hilfe (DAH). 
No início da década de 1990, conta Schäffer, a situação era dramática em várias cidades da 
Alemanha, com alta taxa de mortalidade decorrente do uso de drogas e grandes concentrações 
de usuários em locais públicos. A isso, somava-se o advento da aids e o medo de que o vírus 
se espalhasse para além dos grupos de risco. 
Diante da situação em Taunusanlage, Frankfurt iniciou em 1988 uma série de encontros 
mensais em busca de uma solução para o problema da heroína na cidade. Deles participavam 
não somente políticos e policiais, mas também representantes de organizações de ajuda a 
dependentes químicos e comerciantes locais. 
A principal revolução da política adotada foi a percepção do vício como uma doença, 
possibilitando a descriminalização do dependente. Essa mudança gerou impactos em ações 
policiais, direcionadas a combater o tráfico e não mais o usuário, e em medidas de saúde 
pública, concentradas em oferecer alternativas – não somente de moradia, mas também locais 
de consumo e possibilidades de tratamento – para tirar das ruas dependentes químicos. 
Alternativas para dependentes 
Entre as estratégias adotadas em Frankfurt estavam o oferecimento amplo de terapias de 
substituição e a criação de salas supervisionadas para o consumo de drogas. 
As terapias de substituição para usuários de heroína começaram a ser aplicadas na Alemanha 
no final dos anos 1980. Nela, a heroína é substituída por opioides, como a metadona, com 
quantidade estipulada e o uso monitorado por um médico. A abstinência não é 
necessariamente uma das metas visadas nesse tipo de tratamento, mas sim o controle do 
vício. 
"Ao substituir heroína por opioides, o objetivo das terapias de substituição é melhorar as 
condições de saúde física e mental de dependentes e possibilitar sua reintegração social. 
Nesse sentido, essas terapias são as mais bem-sucedidas nos tratamentos de dependentes 
químicos", afirma Uwe Verthein, do Centro Interdisciplinar para Pesquisa sobre Dependência 
da Universidade de Hamburgo. 
Apesar do sucesso, esse tratamento só é possível para dependentes de opiáceos, como a 
heroína. Ainda não há terapias semelhantes para outras drogas, como o crack. Primeiros 
experimentos para a substituição da cocaína estão sendo feitos na Holanda, mas Verthein 
destaca que essa pesquisa ainda está bem no início. 
Atualmente, a terapia de substituição faz parte da política federal de drogas na Alemanha. O 
país oferece esse tratamento para cerca de 77 mil dependentes químicos. 
Além desta terapia, o Caminho de Frankfurt abriu também as portas para as salas 
supervisionadas para o uso de drogas na Alemanha. Em 1994, a cidade, quase ao mesmo 
tempo que Hamburgo, abriu o primeiro estabelecimento deste tipo. No local, dependentes têm 
acesso a seringas e todo material esterilizado para o uso da substância e recebem 
acompanhamento médico em casos de overdose. 
O espaço possibilita ainda que assistentes sociais façam contato com dependentes e possam 
apresentar a eles opções de tratamento para o vício. Além disso, as salas contribuíram para 
tirar das ruas a grande massa de usuários que se concentravam em parques e próximos a 
estações de trem e reduzir infecções causadas pela reutilização de seringas infectadas. 
A iniciativa foi seguida por outras cidades, como Berlim. Mesmo sem uma base legal, essas 
salas eram toleradas pelas autoridades. Somente em 2000 o governo federal legalizou estes 
espaços. Atualmente, há 24 salas supervisionadas para o consumo de droga, distribuídas em 
15 cidades da Alemanha. Em Frankfurt, há quatro, por onde passam anualmente cerca de 4,5 
mil dependentes por ano. Em Berlim, são duas salas e uma estação móvel, que recebem 
anualmente aproximadamente 1,2 mil usuários. 
Ações policiais em paralelo também foram importantes para a desocupação de Taunusanlage. 
Porém, elas ocorreram apenas depois da disponibilização de locais para o uso de droga e 
abrigos, e eram voltadas a informar os dependentes sobre essas alternativas. Assistentes 
sociais também foram engajados para o trabalho de informação. 
"Os dependentes não foram simplesmente expulsos, o que os espalharia pela cidade, criando 
outros pontos de uso de drogas", destaca o sociólogo Martin Schmid, da Universidade de 
Ciências Aplicadas de Koblenz. 
Exemplo para outros países? 
Apesar de o problema da concentração de usuários em espaços públicos na Alemanha na 
década de 1980 estar relacionado à heroína, cuja possibilidade de terapia é diferente de outras 
drogas, inclusive do crack, especialistas afirmam que a percepção do vício como uma doença é 
um aspecto da política alemã que pode servir de exemplo para outros países. 
"Ver o dependente como doente ajuda bastante a solucionar o problema das drogas, pois 
possibilita o desenvolvimento de políticas públicas adequadas para o apoio ao usuário. 
Simplesmente prendê-los ou interná-los à força não contribui para resolver essa situação", 
afirma Peter Raiser, do Escritório Central Alemão para Questões sobre Vício (DHS). 
Schmid acrescenta que a abordagem da inclusão e da descriminalização do dependente pode 
ser a base, assim como foi na Alemanha, para países desenvolverem suas políticas de drogas 
de acordo com suas especificidades. 
 
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Crise de opioides e a ausência de salas de injeção nos EUA 
 
Epidemia de grupo de drogas que inclui heroína provocou cerca de 50 mil mortes nos Estados 
Unidos em 2016. Apesar de bons exemplos internacionais, país hesita em estabelecer locais de 
injeção supervisionada. 
 
"Silêncio – Sala íntima", lê-se numa placa de um hospital em Maryland. "Eu não queria ir 
até lá, porque sabia para que servia aquele quarto", lembra-se Toni Torsch. Mas, finalmente, ela 
teve que ir e enfrentar o que os médicos tinham para dizer. Foi em 3 de dezembro de 2010, o dia 
em que seu filho Daniel morreu de uma overdose acidental de heroína. 
Ele tinha 24 anos e era dependente de opioides [drogas com efeitos semelhantes à 
morfina], um vício que havia desenvolvido sete anos antes. Um médico lhe prescrevera o 
analgésico oxicodona para ajudar a aliviar a dor de uma lesão ocorrida quando jogava futebol. 
Foi quando começou o que ele chamava de "problema de pílulas". 
Depois do tratamento, ele continuou comprando o medicamento nas ruas ou na escola. 
Mais tarde, ele recorreu à heroína, que era mais barata e mais fácil de encontrar. 
"Para ele, era vergonhoso e constrangedor", disse Torsch à DW. "Ele nãoqueria que 
ninguém soubesse." Ao longo dos anos, contou a mãe, ele tentou superar o vício várias vezes 
seriamente – mas não conseguiu acalmar a "fera", como ele chamava a sua dependência de 
opioides. 
 
Histórias como a de Daniel tornaram-se muito comuns nos EUA, onde uma epidemia de 
opioides está devastando famílias e municípios. No ano passado, por volta de 50 mil pessoas 
morreram por overdose de opioides, incluindo a heroína e o ainda mais forte fentanyl, segundo 
dados oficiais preliminares. Isso corresponde a um número dez vezes maior que em 2000. 
 
Diante desta epidemia, o presidente Donald Trump declarou nesta quinta-feira (26/10) a 
crise de opioides como emergência de saúde pública. A medida facilita que recursos 
governamentais sejam redirecionados para combater esse problema. O presidente afirmou ainda 
que a crise não está poupando nenhuma parte dos EUA. 
O país está procurando maneiras de reduzir as mortes por abuso de drogas e ajudar as 
pessoas a sair do seu vício. Uma ideia que está sendo discutida de forma controversa é o 
estabelecimento de salas para injeção supervisionada ou SIFs (Safe Injection Facilities). 
Esses são espaços onde os viciados em opioides podem usar drogas que adquiriram em 
outros lugares, sem medo de perseguição legal. Isso ajuda a evitar mortes por overdose, pois há 
uma equipe médica no local para intervir em caso de emergência. 
Críticos dizem que as SIFs iriam basicamente legalizar, tolerar e até mesmo incentivar o 
uso de heroína. Em outros países, principalmente na Europa, tais salas já existem há muito 
tempo. A primeira foi aberta em Berna, na Suíça, em 1986. Nos EUA, apesar do aumento das 
mortes por overdose, não existe nenhuma. 
"Isso tem que acontecer", disse Torsch, falando a favor das SIFs. "Eu não quero lutar 
para que as pessoas consumam mais heroína. Eu só quero lutar para salvar vidas." Após a 
morte de seu filho, ela e sua família criaram uma fundação que ajuda famílias afetadas pelo vício 
de opioides na região de Baltimore, Maryland. 
Aqui, dois estudos deram um argumento forte para o estabelecimento das SIFs na 
cidade. Um deles estima que uma única sala poderia evitar seis mortes por overdose a cada 
ano. Além disso, os autores da pesquisa afirmam que as SIFs poderiam gerar 6 milhões de 
dólares anuais – porque, por exemplo, reduziriam o número de chamadas de ambulâncias e as 
visitas de emergência. 
 
Essas estimativas são baseadas em dados da Insite em Vancouver, Canadá – que é até 
agora a única sala de injeção supervisionada na América do Norte. Com mais de 3,6 milhões de 
injeções desde que abriu em 2003, o projeto canadense não registrou uma só morte por 
overdose desde então. 
Em Maryland, assim como nos EUA como um todo, o tema é controverso. No início deste 
ano, um deputado na Assembleia Legislativa do estado do leste americano apresentou um 
projeto de lei que abriria o caminho para o estabelecimento de SIFs em Baltimore. Não foi 
aprovado. 
Na época, o governador Larry Hogan chamou a proposta de "absolutamente insana" e 
"idiota". Seu gabinete não respondeu a um pedido da DW, perguntando por que ele se opôs às 
SIFs. 
 Em outras cidades, como Nova York e São Francisco, também há debates sobre a 
abertura ou não de SIFs. Na região de Seattle, os legisladores já concordaram em estabelecer 
duas salas piloto, mas até agora nenhuma abriu. Muitas cidades da região, no entanto, até 
proibiram SIFs em seu território. 
Um grupo chamado I-27 tem feito campanhas para eliminar a ideias das salas como um 
todo e, em vez disso, se concentrar no tratamento tradicional. Na semana passada, um juiz 
derrubou os planos da iniciativa para que as pessoas decidissem sobre o assunto. 
O líder do grupo, Joshua Freed, afirmou que ele e seus companheiros iriam continuar 
lutando contra as SIFs. "Acho que, em vez de continuar permitindo o uso, uma sociedade 
atenciosa diz: 'vamos encontrar um lugar onde você possa ser ajudado'", defendeu. 
Para Torsch, uma SIF seria exatamente esse tipo de lugar. "Não vai ser uma varinha 
mágica. Mas se trata de mais um espaço, de mais uma oportunidade para pessoas com essa 
doença", afirmou. "Temos a esperança de que possamos ajudar outras famílias a evitar a dor 
com que convivemos." 
 
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'De Braços Abertos': beneficiários reduziram uso de crack e recuperaram contato 
familiar. 
 
Dois anos após a Prefeitura de São Paulo ter implementado o programa De Braços 
Abertos na região conhecida como Cracolândia, no bairro da Luz, 88% dos beneficiários da ação 
afirmam ter reduzido drasticamente o consumo de crack. Os dados fazem parte de uma 
pesquisa feita por assistentes sociais que atuam junto com os dependentes químicos e mostra 
ainda que, antes do programa, iniciado em janeiro de 2014, o uso de crack por pessoa era de, 
em média, 42 pedras por semana, e agora é de 17 pedras, uma queda de 60% entre as pessoas 
cadastradas. 
Antes do De Braços Abertos, que oferece moradia em hotéis, oportunidade em frentes de 
trabalho e renda, além de alimentação e capacitação, cerca de 16% dos beneficiários afirmava 
consumir de 81 a 100 pedras por semana, índice que agora é de apenas 2%. As pessoas que 
diziam consumir de 1 a 10 pedras por semana representavam 22% antes do programa. Agora, 
eles são quase a metade (47%) dos beneficiários. A pesquisa ainda aponta que, antes da ação, 
65% dos beneficiários diziam passar o dia todo sob o efeito do crack, e 32% na metade do dia, 
pelo menos. Dois anos depois, apenas 5% afirmam ficar sob efeito da droga durante todo o dia. 
Mais de 55% dizem ficar sob o efeito do crack por pouco tempo no dia. Antes, eram apenas 3%. 
O De Braços Abertos é baseado no conceito de redução de danos, fazendo com que o 
dependente químico, com mais dignidade e seus direitos respeitados, deixe gradativamente o 
consumo de crack e outras drogas. O levantamento aponta, por exemplo, que 84,66% estão em 
tratamento de saúde, que 84,17% não possuíam sequer documentação antes da ação – e, 
agora, contam com identificação – e que 72,75% estão trabalhando. Outro dado importante é 
que 52,52% dos beneficiários recuperaram o contato com a família, condição importante para a 
reinserção social do dependente químico. 
Atualmente, o programa conta com 467 beneficiários ativos, sendo 36% de mulheres e 
64% de homens. Na faixa etária, 43% dos cadastrados tem entre 30 a 40 anos e 31% entre 51 a 
55 anos de idade. Em relação à escolaridade, cerca de 55% têm o Ensino Fundamental 
incompleto e 12% o Ensino Médio incompleto. Os pardos são 50% dos beneficiários, enquanto 
27% se declaram negros e 23% brancos. 
 
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Política sobre drogas dará guinada rumo à abstinência. 
01/03/2018 
Com o voto de 16 dos 22 membros presentes, o Conselho Nacional de Políticas sobre 
Drogas (Conad) aprovou na manhã desta quinta-feira (01) a resolução apresentada pelo ministro 
do Desenvolvimento Social, Osmar Terra, segundo a qual a política pública sobre entorpecentes 
deve sofrer uma mudança profunda de direção. Segundo o texto, a partir de agora, a “orientação 
central da Política Nacional sobre Drogas deve considerar aspectos legais, culturais e científicos, 
em especial a posição majoritariamente contrária da população brasileira quanto a iniciativas de 
legalização de drogas”. 
O Conad tem poder deliberativo. Ou seja, a nova resolução deve orientar as políticas 
públicas a respeito de drogas elaboradas pelo Governo Federal. Na prática, os grupos que 
defendem a busca da abstinência como principal objetivo ganham força sobre os grupos que 
defendem a prevalência da redução de danos nas políticas públicas sobre o tema. 
Os defensores da abstinência argumentam que as drogas fazem mal ao ser humano e à 
sociedade. O uso, portanto, deveser combatido aprioristicamente. Os dependentes, tratados com 
terapias de reabilitação. 
Já o outro grupo, defensor das políticas de redução de danos, argumenta que o papel do 
Estado é conscientizar os usuários que não querem ou não podem parar de usar drogas, para que 
as usem com cuidado. Não é incomum que defensores da redução de danos se filiem também à 
ideia de descriminalização do uso de drogas, especialmente da maconha. 
“A política de drogas que está em vigência hoje tem causado danos à sociedade”, 
discursou o ministro Osmar Terra, ao defender a aprovação da resolução. “Não existe exemplo no 
mundo de países que tenham liberado o uso de drogas e que tenha tido bons resultados”, 
completou. A nova orientação aprovada no Conad, segundo Osmar Terra, “é importante no 
momento em que a gente está se preparando para enfrentar a violência no Brasil”. “Nós estamos 
com a intervenção federal no Rio de Janeiro, a violência se propagando e acompanhando uma 
grande epidemia de drogas.” 
A aprovação da resolução se desenvolveu sob uma pequena polêmica. A conselheira 
Clarissa Guedes, representante do Conselho Federal de Psicologia, defensora da linha de 
redução de danos, declarou que não concordava com a votação e pediu vistas do processo. 
Presidente do Conselho, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, indeferiu o pedido. 
Indeferido o pedido, a conselheira Fabíola Leal, representante do Conselho Federal de 
Serviço Social, também adepta da linha de redução de danos, se retirou da plenária em protesto. 
Antes, ela havia apresentado um voto em separado, com três destaques. Um deles foi aprovado e 
dois, rejeitados. 
 
Disciplina: Toxicodependência 
 
Prof.ª: Elza Ibrahim

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