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ADM2005 Congresso de Administração e 4º COMEXSUL Congresso Sul Brasileiro de Comércio Exterior Ponta Grossa, Paraná, Brasil, 26 a 29 de setembro de 2005 A importância de uma administração profissionalizada para o gerenciamento de organizações do terceiro setor Marcos Aurélio F. da Silva (UEPG) marcos_aurélio@terra.com.br Lindomar Subtil de Oliveira (CEFET-PR) admlinsoli@yahoo.com.br Resumo O Terceiro Setor é um tipo de organização que se caracteriza pela busca do bem-estar social. A prática das suas atividades pode ser observada no mundo todo, onde, visam contribuir para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária. Assim como qualquer outra organização privada, essas instituições que fazem parte do Terceiro Setor, necessitam também de uma administração eficiente, de forma a melhor gerir seus recursos. No entanto, o que se observa em muitos casos, é justamente a falta de um profissional administrador gerenciando essas organizações. Este artigo traz um referencial teórico sobre Terceiro Setor, apresenta os conceitos sobre administração e o papel do administrador nas organizações, discute, e demonstra a importância de uma administração profissionalizada nessas instituições. Palavras-chave: Terceiro Setor; Administração profissionalizada; Organizações. 1. Introdução O Terceiro Setor é caracterizado pela busca do bem-estar social. Seu surgimento deu-se a partir das desigualdades sociais geradas pela Revolução Industrial no século XIX, porém, há registros de organizações filantrópicas que existiram ainda na Antiguidade. A distinção entre esse setor, o Estado (primeiro setor) e as empresas (segundo setor), decorre do fato de que o Terceiro Setor emprega recursos privados para fins públicos. As organizações do Terceiro Setor procuram promover o fortalecimento da cidadania, a extensão dos direitos fundamentais do homem e a consolidação da democracia. Drucker (1999) concorda que, essas entidades, adotam como missão o desejo de provocar mudanças nos indivíduos e na sociedade na qual estão inseridas. No Brasil, o Terceiro Setor é recente. Sua fixação na sociedade brasileira ocorreu nas décadas de oitenta e em meados de noventa. No entanto, apesar de sua crescente importância, o Terceiro Setor ainda apresenta muitas organizações com subdesenvolvimento gerencial. Devido ao seu caráter filantrópico, a maioria dessas organizações é mal administrada, e carentes de uma administração profissionalizada. Muitas organizações sem fins lucrativos mantêm, em seus cargos executivos, pessoas com muita vontade de ajudar, mas sem nenhuma prática administrativa. É comum a idéia de que, uma administração profissional em organizações sem fins lucrativos é dispensável, visto que, estas não visam um lucro monetário. Procura-se demonstrar com isso, a necessidade (e urgência!) de administradores profissionais também em organizações do terceiro setor. Essas entidades, como qualquer outra, precisam de pessoas que saibam como planejar, organizar, dirigir e controlar, para que os objetivos sejam, de fato, alcançados e, se possível, superados. Além do mais, também que há a necessidade de que os administradores encarem esse novo setor econômico como um mercado em potencial, onde, poderão oferecer seus serviços e desempenhar suas atividades. O objetivo do presente artigo é apresentar um conjunto de valores teóricos que embasam a prática das organizações do terceiro setor, e demonstrar como uma administração profissionalizada pode contribuir para melhorar o gerenciamento dessas entidades. Assim, acredita-se que é possível, através de uma gestão profissional, fazer com que as organizações não-governamentais possam atingir níveis de desempenho comparáveis com as organizações empresariais. 2. Uma definição de Terceiro Setor A principal característica do Terceiro Setor é a de que ele existe para buscar o bem-estar social. Outros tipos de organização também procuram amenizar as dificuldades da sociedade, porém, o Terceiro Setor tem como objetivo final promover ações que visem melhorar as condições de vida dos grupos sociais. O Terceiro Setor surgiu em virtude das conseqüências da Revolução Industrial, e alguns fatores marcaram esse período como, por exemplo, o aumento da desigualdade social e da promiscuidade da população, e se estabeleceu devido ao fim do sistema do Welfare-State. Neste modelo de governo, o Estado é responsável pela maior parte das atribuições da sociedade, e é contrário ao liberalismo. Contudo, os primeiros registros de organizações filantrópicas encontram-se na Antiguidade, principalmente na China. Para Cardoso apud Muraro e Lima (2003, p. 81) afirma que, o Terceiro Setor "é uma nova esfera pública, não necessariamente governamental, constituída de iniciativas privadas em benefício do interesse comum, compreendendo um conjunto de ações particulares com o foco no bem-estar público". A mesma autora sugere o Terceiro Setor como um conglomerado de instituições, que atuam de forma quase que emparelhadas ao Estado na busca pelo bem-estar público. No entanto, o Terceiro Setor diferencia-se do setor governamental devido à origem de seus recursos, que são privados. Essa definição demonstra como o Terceiro Setor está ligado ao fim do Estado do Bem-Estar Social e ao surgimento do liberalismo econômico, visto que, só vai surgir quando o Estado deixar de ser um 'grande-pai', que atende a todos, para focar-se somente no que é inerente à sua função governamental, e deixar, desta forma, parte de suas atribuições à sociedade civil organizada. Portanto, o motivo que mais justifica o fenômeno do Terceiro Setor, que atinge todo o mundo, é a necessidade cada vez maior de se conter as mazelas do mundo moderno como, por exemplo, a fome, a pobreza, a grande dificuldade de se viver de uma forma, no mínimo, humana. No Brasil, o terceiro setor foi, no passado, mais conhecido por ações voltadas à caridade e ligadas a religiosos. Isso se deu por dois fatores: até bem pouco tempo atrás as únicas instituições não-estatais sem fins lucrativos conhecidas eram os hospitais, escolas, orfanatos e igrejas e, além disso, o Brasil teve como um dos pilares de construção da sua sociedade a religião. A quebra desse paradigma se deu logo no final do Século XX. Foi nessa época que ocorreu a disseminação do modelo de Terceiro Setor da atualidade, com o surgimento de ONGs, fundações e associações. Além disso, a ditadura militar fez com que surgissem inúmeros núcleos de cidadãos que, ao lutarem por democracia e liberdade, viram no Terceiro Setor um grande aliado para o alcance desse objetivo. 3. Principais objetivos do Terceiro Setor, e sua contextualização na economia dos países O principal objetivo do Terceiro Setor é a busca pelo bem-estar social. No entanto, ele também procura promover o fortalecimento da cidadania, a extensão dos direitos fundamentais do homem e a consolidação da democracia. As ações das entidades do Terceiro Setor espalhadas pelo Brasil procuram, através de seus projetos, ajudar o Estado na reorganização de sua sociedade. O Terceiro Setor tem fácil aceitação das sociedades locais e também um gasto relativamente baixo para concretizar seus projetos. Fernandes (2001) concorda que, geralmente, organizações não-estatais são mais eficazes e mais bem recebidas pela comunidade do que o Estado. Em todos os países, o Terceiro Setor se caracteriza, cada vez mais, como uma importante fonte de empregos, tanto diretos quanto indiretos. Atualmente, nos Estados Unidos, cerca de 10% da população economicamente ativa empregada encontram-se no terceiro setor (Rifkin, 1997). Em países de grande extensão e com um aparato administrativo governamental fraco, como o Brasil, a importância do terceiro setor como fonte de geração de empregos é ainda maior. Segundoafirma Fernandes (1997) no Brasil, o Terceiro Setor é a terceira maior categoria quanto à geração de empregos. Para Muraro e Lima (2003, p.81) denotam que "em termos comparativos a movimentação monetária anual decorrente da atividade do Terceiro Setor – US$ 1,1 trilhão – equipara-se a países tais como Reino Unido e Itália, e ultrapassa o de países como Brasil, Rússia, Espanha e Canadá. Em termos quantitativos, isso significa que o terceiro setor é um excelente negócio". Não obstante tão grande importância econômica, esse setor ainda padece de inúmeras dificuldades. Segundo Landim (1993) a implantação de uma sociedade baseada no ideário liberal sempre enfrentou, e continua enfrentando, obstáculos peculiares. As culturas populares parecem serem mais afeitas à lógica do pertencimento e da hierarquia do que à do individualismo e igualitarismo modernos. 4. A administração e o papel do administrador Apesar de não ser considerada uma ciência exata, a arte da administração não é fruto do mundo moderno, pelo contrário, desde os tempos da história antiga os povos já praticavam, mesmo que despretensiosamente, as técnicas de administração. As grandes transformações econômicas, tecnológicas e sociais pelas quais o mundo passou, também foram acompanhadas por mudanças na forma de administração. Assim sendo, a função de administração sempre exerceu uma grande importância no contexto do desenvolvimento das organizações, principalmente das empresas públicas e privadas. Contribuindo inicialmente para uma definição de administração, Maximiano (2000) afirma que é um processo de tomar decisões e realizar ações, e envolve quatro processos: planejamento, organização, execução e controle. Ainda conforme o autor, administrar compõe-se de outros processos que são a essência do enfoque funcional, que foi criado por Fayol. Este método consistia em separar a tarefa da administração das tarefas operacionais e técnicas, como fazer máquinas e equipamentos, e prestação de serviços. Corroborando também com esta definição, Megginson, Mosley e Pietri JR.(1998, p.13) explicam que a “administração pode ser definida como trabalhar com Recursos Humanos, financeiros e materiais, para atingir objetivos organizacionais através do desempenho das funções de planejar, organizar, liderar e controlar”. Para Megginson, Mosley e Pietri JR.(1998, p.8) a administração é um conceito universal, e é necessária não somente nas empresas, mas em todos os tipos de sociedade organizada. Concernente a isso, os autores esclarecem que “se um administrador conhece essas informações fundamentais e sabe aplicá-las em determinada situação, ele será capaz de gerenciar eficazmente em qualquer posição, mas de forma flexível, adaptando-se a situações novas”. Além do mais, a função do administrador é a mesma em qualquer tipo de organização, o que irá mudar basicamente é com relação à cultura, tipo de organização, número de empregados e outras situações que ele deverá enfrentar. Um aspecto fundamental apresentado por Maximiano (2000), denota que as habilidades administrativas são muito importantes para qualquer pessoa que tome decisões sobre a utilização de recursos para realizar objetivos, ou estando em ambientes onde essas decisões são tomadas. Com efeito, o papel do administrador é crucial para o desempenho de qualquer organização, e concordando com Megginson, Mosley e Pietri JR.(1998, p.19) “o sucesso ou fracasso de uma organização dependem substancialmente da capacidade de seus administradores desempenharem essas funções de maneira eficaz”. 5. A administração no Terceiro Setor Tratando-se especificamente da atuação do administrador em organizações do Terceiro Setor, igualmente este visa aplicar seus conhecimentos e práticas gerenciais de forma que a instituição consiga atingir os fins pretendidos da melhor forma possível. Escarlate e Rosais (2002) afirmam que o maior desafio no gerenciamento de organizações do terceiro setor está em administrar recursos escassos, equipes voluntárias de formações heterogêneas, e até sem formação, e atingir metas sociais. De acordo com Scornavacca, Becker e Caravantes (1998) um dos maiores desafios para o Terceiro Setor é o desenvolvimento de uma estrutura de gestão adequada a suas peculiaridades. Esses autores propõem uma forma de ação administrativa que julgam ser a mais apropriada às instituições do Terceiro Setor, quando administradas profissionalmente: "A forma de ação administrativa mais apropriada a estas organizações é a de projeto transformador, de cunho educativo e formativo, e não caritativo. Para que o desenvolvimento organizacional assim obtido seja harmônico, deve atuar nas dimensões política, econômica e cultural destas organizações de forma evolutiva e nunca revolucionária. A busca do desenvolvimento sustentado nas organizações beneficentes é um processo de mudança cultural em longo prazo que deve ser conduzido a partir da capacitação gerencial". (SCORNAVACCA, BECKER E CARAVANTES, 1998, p. 159). A idéia dos autores é que as instituições do Terceiro Setor procurem sempre atingir o verdadeiro foco do problema, e não apenas amenizar suas conseqüências. Dessa forma, buscam agir na dimensão econômica, de forma a dar sustentação financeira ao projeto, na dimensão política, para que o projeto seja realmente entendido e aceito pela sociedade. Ademais, atua na dimensão cultural, para que os participantes do projeto se desenvolvam pessoal e profissionalmente enquanto dele participarem. Nesse aspecto, cabe ao administrador e sua equipe administrativa estruturarem programas que visem a motivação e integração de todos os participantes do projeto. Portanto, o administrador precisa incentivar as pessoas a colaborar inteiramente para o alcance dos objetivos determinados. Um dos principais estigmas das organizações do Terceiro Setor é a "falta de um projeto que apresente claramente o trabalho que a instituição se propõe a fazer e a incapacidade de calcular o orçamento com precisão" afirma (FARINA, 2005, p.1). Atualmente, as empresas já não apóiam organizações que não tenham um bom projeto, com o planejamento adequado quanto às atividades a serem desenvolvidas e o quanto essas atividades irão usar dos recursos da empresa financiadora. Ninguém quer investir em organizações que não proporcionem grande garantia de retorno do investimento. Nesse sentido, Pereira (1996) afirma que o gerenciamento dos programas sociais no Brasil é uma variável estratégica para a modernidade devido à interferência cada vez menor do Estado na sociedade, fruto do liberalismo econômico, e da perspectiva de cada vez mais importância na economia da sociedade. No âmago dessa questão, denota-se que um novo modelo econômico e social está surgindo. Os problemas sociais estão ficando complexos demais para ficarem na mão dos governos, e as empresas, neste contexto, estão buscando como forma de estratégia competitiva, assumir seu papel na sociedade através de práticas de responsabilidade social e parcerias com instituições. 6. Considerações finais Observou-se através das abordagens teóricas deste artigo, que somente pessoas capacitadas no gerenciamento de entidades associativas, sejam em organizações não-governamentais, fundações ou até mesmo em associações, é que poderão proporcionar ao Terceiro Setor a sustentação necessária para o seu desenvolvimento. Apesar de haver uma infinidade de métodos, e ferramentas, passíveis de utilização para se atender às necessidades de uma organização do Terceiro Setor, acredita-se que, antes disso, é preciso que se dissemine a cultura do Terceiro Setor profissionalizado. Em países mais desenvolvidos e que apresentam uma cultura filantrópica já presente no modo de se viver da sociedade, sendo os Estados Unidos o maior exemplo desse modelo, é comum encontrar tais organizações com toda uma equipegerencial profissionalizada, com pessoas desenvolvendo seus trabalhos em um ambiente específico e buscando cada vez mais aumentar seus conhecimentos sobre a área em que atuam. Outro fator muito importante é desenvolver, nos administradores, principalmente os recém- saídos da universidade, a consciência para enxergar no Terceiro Setor uma grande oportunidade, tanto de desenvolverem as habilidades adquiridas nos bancos escolares como para participarem efetivamente da vida em sociedade. A chance de se desenvolver bons trabalhos em organizações do Terceiro Setor é real, pelo fato de que essas instituições ainda são carentes de mão-de-obra especializada. É através de uma atitude pró-ativa como esta que se pode construir uma sociedade civil sólida, capaz de garantir seus direitos perante o Estado, e de caminhar com passos cada vez mais firmes em direção a uma sociedade democrática. Portanto, combinar esforços para aplicar uma administração profissionalizada no Terceiro Setor, parece ser uma maneira adequada na qual essas instituições podem buscar apoio para melhorar sua eficiência administrativa, e atingir os resultados esperados. Referências DRUCKER, P. F. (1997) - Administração de organizações sem fins lucrativos. Pioneira. São Paulo. ESCARLATE, L. F. A.; ROSAIS, J. J. R. (2002) - Organizações não-governamentais: uma oportunidade para os administradores. Administração em Revista, D. Federal, v.2, n.1, jan./jun. FARINA, E. (2005) - A falta de profissionalismo afugenta investidores e ameaça a sustentação das ONGs brasileiras. A solução? Um choque de gestão no terceiro setor. Revista Amanhã. 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