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10 anos editorial Um olhar psicológico sobre o câncer Gláucia Viola, editora “Uma cama de hospital é um táxi estacionado com o taxímetro a correr.” Groucho Marx A relação do câncer com o sofrimento e a morte precoce faz com que a grande maioria das pessoas não saiba lidar com tudo que envolve essa doença. O surgimento da Psicologia Oncológica serviu PARA�DESMISTIlCAR�OS�MEDOS�E�CRIAR�NOVOS�PARÊMETROS�EM�RELA¥ÎO�A�QUESTÜES�COMO�DIAGNØSTICO�� MEDIDAS�DE�ENFRENTAMENTO��COMPREENSÎO�DAS�CHANCES�DE�CURA�E�ENTENDIMENTO�DO�QUE�PODE�REPRE- sentar qualidade de vida. O câncer deve ser enfrentado e encarado como um problema verdadeiramente de SAÞDE�PÞBLICA��QUE�ATINGE�PESSOAS�DE�TODAS�AS�IDADES�E�EM�TODOS�OS�LUGARES�DO�MUNDO�� sendo a segunda causa principal de morte por doença no planeta. Todas essas CARACTERÓSTICAS�EXIGIRAM�A�NECESSIDADE�DE�OS�PROlSSIONAIS� ENTENDEREM�O�PROBLEMA� ALÏM�DA�VISÎO�CLÓNICA�MÏDICA��!�0SICO ONCOLOGIA�ASSUME�ESSE�PAPEL��RECONHECENDO� QUE�O�DESENVOLVIMENTO�DO�CÊNCER�E�SEU�PROCESSO�DE�TRATAMENTO��SEM�DÞVIDA��SOFREM� INTENSA�INmUÐNCIA�DE�VARIÉVEIS�SOCIAIS�E�AFETIVAS�� !LÏM� DOS� PROBLEMAS� CAUSADOS� PELA� DOEN¥A�� O� DESGASTE� PSÓQUICO� SOFRIDO� PELO� PACIENTE�E�POR�SEUS� FAMILIARES�E�AMIGOS�DURANTE�O�PROCESSO�DE�TRATAMENTO�OCORRE�� PRINCIPALMENTE��EM�FUN¥ÎO�DE�A�DOEN¥A�SER�ASSOCIADA�A�DOR��SOFRIMENTO��DEGRADA¥ÎO� HUMANA��OU�SEJA��O�DIAGNØSTICO�Ï�ENCARADO�COMO�UMA�SENTEN¥A�DE�MORTE��%STA�EDI¥ÎO� da Psique Ciência & Vida�MOSTRA�COMO�A�0SICOLOGIA�/NCOLØGICA�AJUDA�NA�CONDU¥ÎO� DESSE� PROCESSO�� BUSCANDO� AMENIZAR�MITOS� E� ATÏ�MESMO� FANTASIAS� PROVOCADAS� POR� ELA��/� AMBIENTE� HOSPITALAR�� POR� EXEMPLO�� Ï� UM� FATOR� ESTRESSANTE� CHEIO� DE� ESTIGMAS�� APESAR� DE� DESPERTAR� SENTIMENTOS� AMBÓGUOS�� 0OIS�� ALÏM� DE� TRAZER� ALÓVIO� A� QUEM� CHEGA� A� SUAS� INSTALA¥ÜES� EM� MOMENTOS� DE� SOFRIMENTO��CAUSA�GRANDE�REJEI¥ÎO��0ARA�VALIDAR�ESSES�SENTIMENTOS��A�0SICOLOGIA�GANHA�IMPORTÊNCIA�NO�SENTIDO� DE� ATUAR�� JUSTAMENTE��NO�CAMPO�DAS� VARIÉVEIS� EMOCIONAIS��/�CÊNCER�� EM�CONJUNTO� COM�A�HOSPITALIZA¥ÎO�� CARREGA�ESSAS�SENSA¥ÜES��ESPECIALMENTE�NO�QUE�DIZ�RESPEITO�Ì�MORTE� A verdade incontestável e difícil de aceitar é que o sofrimento está intimamente ligado ao câncer. Por ISSO��CABE�AO�PROlSSIONAL�DE�SAÞDE�MENTAL�COMPARTILHAR��DIVIDIR�E�MOBILIZAR�TODOS�OS�RECURSOS�DISPONÓVEIS� para que as pessoas tenham mais possibilidades de elaborar a situação da melhor maneira possível e para QUE�POSSAM�SE�ANCORAR�NA�REALIDADE�DE�FORMA�SAUDÉVEL��!TÏ�PORQUE�A�DOEN¥A�GUARDA�EM�SI�A�CONSCIÐNCIA�DA� possibilidade da morte e essa constatação é acompanhada de angústias que seguirão o paciente durante o PERCURSO�DO�TRATAMENTO��%�CADA�PACIENTE�ENXERGA�UM�SENTIDO�PARTICULAR�NA�MORTE��DE�ACORDO�COM�A�FASE�EM� QUE�SE�ENCONTRA�NO�PROCESSO�DE�EVOLU¥ÎO�VITAL��%SSA�OBSERVA¥ÎO�DE�lNITUDE��VIVÐNCIAS�E�CONDI¥ÜES� FÓSICA�� PSICOLØGICA��SOCIAL�E�CULTURAL�DEPENDE��TAMBÏM��DE�UM�ACOMPANHAMENTO�EMOCIONAL�ADEQUADO��LEVANDO�A� uma intersecção entre todos os fatores no desenrolar da vida. Boa leitura! Gláucia Viola psique@escala.com.br www.facebook.com/RevistaPsiqueCienciaeVida CAPA DOSSIÊ: PSICOLOGIA NO ESPORTE A preparação psicológica pode ser o diferencial nos resultados expressivos de ATLETAS��RATIlCANDO�SEU�PAPEL� central no universo esportivo sumário 3510 anos MATÉRIAS ENTREVISTA Neurologista Marcela Amaral Avelino destaca a heterogeneidade dos quadros CLÓNICOS�COMO�DESAlO�CIENTÓlCO� para a obtenção de diagnósticos dos transtornos mentais SEÇÕES 05 EM CAMPO 16 IN FOCO 18 PSICOPOSITIVA 20 PSICOPEDAGOGIA 22 SEXUALIDADE 24 SUPERVISÃO 32 COACHING 34 LIVROS 50 CYBERPSICOLOGIA 52 NEUROCIÊNCIA 54 RECURSOS HUMANOS 64 DIVà LITERÁRIO 66 CINEMA 70 PERFIL 78 UTILIDADE PÚBLICA 80 EM CONTATO 82 PSIQUIATRIA FORENSE Apoio fundamental !S�DIlCULDADES�EM�LIDAR�COM� o câncer, suas consequências e a proximidade da morte fazem com que a Psicologia Oncológica seja fundamental na atuação hospitalar A Ética do psicólogo !TUA¥ÎO�DO�PROlSSIONAL� na Perícia Psicológica, no âmbito judicial e principalmente nas Varas de Família apresenta inúmeras diferenças do que é exigido na área clínica Uma nova ordem Counseling organizacional é uma ferramenta que usa o conhecimento técnico de uma pessoa para ORIENTAR�UM�PROlSSIONAL�A� tomar decisões assertivas 26 72 08 56 IM AG EM D A CA PA : S HU TT ER ST OC K www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 5 em campo TRABALHO E FELICIDADE Enquanto as mais diversas vertentes organizacionais discutem um modelo de liderança, um estudo realizado por pesquisadores das universidades de Greenwich e Sussex mostra que propor- cionar uma percepção de propósito no trabalho entre os seus liderados não é uma habilidade dos gestores. Muito pelo CONTRÉRIO��ELES�DESTROEM�ESSE�SIGNIlCADO�� A pesquisa ouviu 135 pessoas trabalhan- do em 10 ocupações muito diferentes, desde sacerdotes até coletores de lixo, para perguntar sobre incidentes ou momentos em que os trabalhadores pen- saram que o seu trabalho era algo signi- lCATIVO�E��POR�OUTRO�LADO��MOMENTOS�EM� que eles se perguntaram: “Por que estou trabalhando com isso?”. A despeito das lideranças, a autora do estudo, Katie Bailey, diz que para as organizações que BUSCAM�NUTRIR�ESSE�SIGNIlCADO��OPERAR� “com responsabilidade ética e moral é uma boa alternativa, uma vez que são qualidades que fazem a ponte entre o trabalho e a vida pessoal”. POR OUTRO LADO... Um novo estudo, desta vez da Univer- sidade de Split, Croácia, relacionou a satisfação no trabalho ao sucesso da empresa. A pesquisa comparou desempe- nho empresarial de 40 grandes e médias companhias com a avaliação dos funcio- nários sobre 10 diferentes aspectos de seu trabalho, totalizando 6 mil avaliações. (Fonte: ScienceDaily.com) por Jussara Goyano IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K AÇÃO X HÁBITO MECANISMOS DE AÇÃO DIRIGIDA E ESTRUTURAS DE AÇÃO HABITUAL COMPETEM NA TOMADA DE DECISÃO Com um modelo de experiência com ratos, uma equipe internacional de pesquisadores, sediada na Universidade da Califórnia, em San Diego (EUA), demonstra o que acontece no cérebro para que os hábitos controlem o nosso comportamento. O estudo, publicado na revista Neuron, fornece a evidência mais forte até hoje, segundo seus autores, de que os circuitos do cérebro designados tanto para a ação habitual quanto para a ação dirigida competem pelo controle no córtex orbitofrontal, uma área do cérebro responsável pela tomada de decisão. .EUROQUÓMICOS�CHAMADOS�ENDOCANABINOIDES��ENVOLVIDO�EM�VÉRIOS�PROCESSOS�l- siológicos, incluindo apetite, sensação de dor e humor, são os mecanismos que permitem ao hábito assumir o controle, agindo como uma espécie de freio no circuito da ação dirigida. Os resultados sugerem, segundo os autores da pesquisa, um novo alvo tera- pêutico para pessoas que sofrem de transtorno obsessivo-compulsivo ou vícios, para interromper a dependência excessiva do hábito e restaurar a capacidade de mudar das ações habituais para as ações dirigidas por objetivos; Pode ser útil para tratar o sistema endocanabinóide do cérebro e assim reduzir o controle das ações habituais sobre o comportamento do indivíduo. (Fonte: ScienceDaily.com) 6 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br ESTRESSE COMO OS NEURÔNIOS CEREBRAIS COMANDAM REAÇÕES FISIOLÓGICAS Ao experienciar o estresse, o nosso corpo desvia re- cursos metabólicos para sua resposta de emergência. Pen- sava-se que o sistema nervoso simpático - sistema instinti- vo do corpo para reagir ao estresse - dirigia essa atividade, mas uma pesquisa recente do Weizmann Institute of Science, em Israel, agora mostraque os neurônios no cérebro têm um papel surpreendente nessa atividade. As descobertas, que apareceram recentemente na Cell Metabolism, pode- rão, no futuro, ajudar no desenvolvimento de melhores medicamentos para patologias relacionadas com o estres- se, tais como os transtornos alimentares. Quando somos expostos a situações estressantes, o hipo- TÉLAMO�INTENSIlCA�A�ATIVA¥ÎO�DE�UM�RECEPTOR�EM�SUAS�PARE- des exteriores, o CRFR1. Sabe-se que esse receptor contribui para a rápida ativação da rede nervo simpática - aumentando o ritmo cardíaco, por exemplo. Como essa área do cérebro também regula o equilí- brio de energia do corpo, os cientistas partiram RESOLVERAM�VERIlCAR� SE�O� CRFR1 poderia desem- penhar um papel nisso. Eles descobriram que é o receptor que desem- penha efeito inibitório sobre as células nervosas, e isso é o que ativa o sis- tema nervoso simpático. A descoberta, entre outros detalhes revela- dos pela pesquisa, pode auxiliar no desenvolvimento de tratamentos psicofarmacêuticos que atuem no hipotála- mo, o que já está sendo feito por algumas empresas, em busca de um possível tratamento para os transtornos de ansiedade ou depressão. Os cientistas alertam, no entanto, que, como as células estão envolvidas no equilíbrio ener- gético, bloquear os receptores poderá ter efeitos colate- rais, como ganho de peso. PARA SABER MAIS: Yael Kuperman, Meira Weiss, Julien Dine, Katy Staikin, Ofra Golani, Assaf Ramot, Tali Nahum, Claudia Kühne, Yair Shemesh, Wolfgang Wurst, Alon Harmelin, Jan M. Deussing, Matthias Eder, Alon Chen. CRFR1 in AgRP Neurons Modulates Sympathetic Nervous System Activ- ity to Adapt to Cold Stress and Fasting. Cell Metabolism, 2016; DOI: 10.1016/j.cmet.2016.04.017 AR Q UI VO P ES SO AL Jussara Goyano é jornalista. Estuda Psicologia, Medicina Comportamental e Neurociências, com foco em ������È�I�G9�H��¢���G�����������G�I�:�U�I�GI��I����IG G� pelo Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento. COMPORTAMENTO E INTELIGÊNCIA SABEDORIA VARIA DE ACORDO COM A SITUAÇÃO Estudo mostra que não existe pessoa sábia, mas ati- tude, sim. Pesquisadores da Universidade de Waterloo, nos Estados Unidos, observaram a reação de indivíduos em resposta a diversas situações cotidianas para estudar a sabedoria humana. Entre seus achados está a percepção de que raciocínio sábio é aquele que põe em prática uma combinação de habilidades, tais como a humildade in- telectual, a consideração da perspectiva dos outros e a procura por compromisso. E não depende exclusivamente de personalidade, tendo essas características postas em prática de acordo com a circunstância. !�OBSERVA¥ÎO�DE�QUE�O�RACIOCÓNIO�SÉBIO�VARIA�SIGNIl- cativamente entre as situações na vida cotidiana sugere que ele não é raro. Além disso, para indivíduos diferentes, apenas determinadas situações promovem esta qualidade. Para a próxima etapa do trabalho, os cientistas prepa- ram uma ferramenta para avaliar a sabedoria de acordo com a situação. Eles têm planos de realizar o primeiro estudo longitudinal com o objetivo de ensinar as pessoas a raciocinar sabiamente em suas próprias vidas. O novo mapa da sabedoria foi publicado recentemente na revista Social Psychological and Personality Science. (Fonte: ScienceDaily.com) em campo IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 7www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 7 ENTENDENDO A CRISE REVISTA SOCIOLOGIA - EDIÇÃO 64 giro escala POLÍTICA EM XEQUE REVISTA FILOSOFIA - EDIÇÃO 119 O Brasil passa por um grave momen- to em sua trajetória, no qual se observa que as instituições não demonstram es- tar tão consolidadas quanto a sociedade esperava. Por isso, é fundamental enten- der a crise da democracia nacional e a Sociologia assume um papel central en- quanto instrumento teórico-metodoló- gico, no sentido de promover uma leitu- RA�E�UMA�COMPREENSÎO�MAIS�QUALIlCADAS� DA� REALIDADE�� SUPERANDO� SUPERlCIALIDA- des, subjetividades e estereótipos. Por meio da Sociologia entende-se o com- promisso com a pluralidade e o desejo que o debate sociológico contribua para uma visão mais objetiva, a partir das formas de linguagem e saberes socioló- gicos. A Sociologia, reconhecida como “ciência social que estuda a sociedade, ou, mais precisamente, conhecimento CIENTIlCO�DOS�FATOS�E�FENÙMENOS�SOCIAIS� como realidades que ocorrem dentro da sociedade”, se insere no debate, cada vez mais atual e necessário, em torno de temas como o processo politico brasi- LEIRO��CONTRIBUINDO�DE�MODO�QUALIlCADO� para a descrição, compreensão, inter- PRETA¥ÎO�E�EXPLICA¥ÎO�CIENTÓlCA� Nesses tempos de inquietações, de atitudes que afrontam a democracia e o Estado, com o país em transe, e passan- do por um momento curioso do ponto de vista sociológico, a Sociologia realça suas possibilidades na formação do pen- samento inteligente, criativo e de ideias. Existem vários aspectos que podem jus- TIlCAR� A� IMPORTÊNCIA� E� AS� RAZÜES� PARA� estudar Sociologia. Atualmente, em um ambiente convulsionado por mani- festações, crise política, torna-se cada vez mais importante aprimorar, quali- lCAR�� COMPREENDER� A� REALIDADE� SOCIAL� E� POLÓTICA�E�OS�FATORES�QUE�INmUENCIAM�OS� FENÙMENOS��O�mUXO�DE� INFORMA¥ÜES�E�A� comunicação. Mais informações na edi- ção 64 da revista Sociologia. A política, mais do que nunca, é parte do cotidiano. Está nos meios de comunicação, nas rodas de con- versa, na universidade e nas ruas. No cotidiano, o termo “política” é usado em diferentes acepções. Há aque- les que associam a certa habilidade nas relações sociais e para realizar conciliações, como, por exemplo, a pessoa chamada de muito política, quando, na verdade, é um indivíduo comunicativo e conciliador. Existe outro uso para a expressão política, que a relaciona a disputas partidá- rias, ou a reduz aos pleitos eleitorais. Frases como “este é um ano de po- lítica”, referindo-se aos anos em que há eleições, são análises restritas. Algumas pessoas dizem não gostar da atividade política e consideram-se indiferentes, desiludidas. Geralmen- te, limitam a política à corrupção, à roubalheira e aos desvios de conduta cometidos por aqueles que exercem cargos públicos eletivos. Contudo, etimologicamente, política designa, desde a Antiguidade, o campo da ati- vidade humana relativa à cidade, ao Estado, à gestão do espaço público, ao conjunto de cidadãos e às ações destes nessa esfera. Por isso, é um tema que deveria interessar a todos. Na Grécia Antiga, cidadãos guia- vam a cidade. Todavia, cabe ressaltar que no paradigma grego nem todos podiam ser considerados cidadãos. Mulheres, crianças, escravos e estran- geiros não participavam da vida na pó- lis. No entanto, todos os que gozavam de “cidadania” participavam politica- mente. Em contrapartida, a partir da Modernidade, as questões privadas passaram a ocupar espaço maior na vida das pessoas. Uma das consequên- cias é que a atividade política nas so- ciedades atuais, em termos gerais, caiu em descrédito. O resultado é que nas DEMOCRACIAS� CONTEMPORÊNEAS� HOUVE� avanços em relação aos direitos civis, mas retrocessos na participação polí- tica. Mais detalhes na edição 119 da revista &ILOSOlA. RENATO JANINE RIBEIRO Ser de esquerda é um estilo de vida e não apenas uma posição política ENTREVISTA Edimar Brígido aborda Ética e Estética no pensamento de Wittgenstein ENCAR TE DO PR OFESS ORReflex ão e práti ca 108 Com c urador ia de C arolin a Deso ti Fern andes e Tiago Brent am Pe rencin i Carol ina De soti Fe rnand es�Ï��GRAD UADA�EM �&ILOSOl� A� PELA�05# #AMPIN AS��0ESQU ISA�A�INm� UÐNCIA�A FRICANA�N A�FORMA¥Î O�DA�IDEN TIDADE�C ULTURAL�B RASILEIRA ��¡�EDITO RA�� REDATORA �E�PRODU TORA�CULT URAL�� Tiago Brent am Pe rencin i Ï�LICEN CIADO�E� BACHARE L�EM� &ILOSOl�A ��-ESTRE �EM�%NS INO�DE�& ILOSOl�A� PELA�5N ESP�E� PROFESSO R�DE�&ILO SOl�A�#O NTEMPOR ÊNEA�NA� &ACULDA DE� *OÎO�0AU LO�))�DE�- ARÓLIA� A busca p elo conhe cimento Uma discu ssão sobre a responsa bilidade do desenvolv imento científico p ela estrutu ração e mo dificações culturais n as sociedad es Da Filoso fia à Ciên cia Pela inters ecção entre diferentes domínios do saber dd 35 5/19/1 6 2:5 9 PM REFLEXÃO E PRÁTICA: Pode existir Ciência sem Filosofia? Submissão e violência contra a mulher: a necessidade de desnaturalizar elementos comuns desde a Grécia Antiga e que persistem na atualidade EXISTÊNCIA E DUALISMO Vida como experiência subjetiva radical que está fora do alcance da razão À ESPERA DE UM MILAGRE HANNAH ARENDT: a capacidade humana de agir impulsiona novos inícios na vida política ANO IX No 119 – www.portalcienciaevida.com.br A VOZ DO EDIÇÃO 119 - PREÇO R$ 9,80 FEMINISMO RICARDO DELLO BUONO VÊ A SOCIOLOGIA COMO FERRAMENTA DE LIBERTAÇÃO em sala de aula: apresente o Anarquismo, suas vertentes e seus personagens www.portalcienciaevida.com.br Game of Thrones Artigo analisa arquétipos políticos de uma das séries mais populares da televisão Estudo de caso A agricultura familiar e a qualidade de vida do trabalhador rural Mundo laboral Mudanças nas DPOm�HVSBªFT� do trabalho não alteraram radicalmente a lógica da exploração Friedrich Engels Resenha de Anti-Dühring, um dos trabalhos mais importantes do pensador Como a esquerda nacional encarou essa ideologia, confundindo-a com puro populismo TRABALHISMO Uma reflexão sobre o 8 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br MARCELA AMARAL AVELINO JACOBINA www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 9 A neurologista Marcela Amaral Avelino ressalta o grande DESAlO�DA�COMUNIDADE�CIENTÓlCA�PARA�CONSEGUIR�DIAGNOSTICAR� TRANSTORNOS�MENTAIS��EM�FUN¥ÎO�DA�HETEROGENEIDADE�DE�QUADROS� CLÓNICOS�QUE�OCORREM�EM�RELA¥ÎO�A�ESSES�DISTÞRBIOS E N T R E V I S T A O S�INÞMEROS�MISTÏRIOS�QUE�ENVOLVEM�A� MENTE�DAS�CRIAN¥AS�E�DOS�ADOLESCENTES� SÎO�CADA�VEZ�MAIS�INTENSAMENTE�ALVO� DE�PROFUNDO�ESTUDO�POR�PARTE�DA� .EUROLOGIA�0EDIÉTRICA��4EMAS�COMO�DISTÞRBIOS� DO�DESENVOLVIMENTO�E�DOS�TRANSTORNOS�MENTAIS� E�COMPORTAMENTAIS��DESENVOLVIMENTO�INFANTIL�� SUICÓDIO�ENTRE�ADOLESCENTES��DELINQUÐNCIA��DROGAS�� USO�ABUSIVO�DA�INTERNET��ENTRE�OUTROS��DESAlAM�AS� PESQUISAS�DOS�PROlSSIONAIS�QUE�ATUAM�NA�ÉREA� 3EGUNDO�-ARCELA�!MARAL�!VELINO�*ACOBINA��NEU- ROLOGISTA�DO�!MATO�)NSTITUTO�DE�-EDICINA�!VAN¥ADA�� NEM�SEMPRE�DIFERENCIAR�O�QUE�Ï�PRØPRIO�DO�DESEN- VOLVIMENTO�HUMANO�DO�PATOLØGICO�Ï�SIMPLES��h%��NA� MAIORIA�DAS�VEZES��OS�EXAMES�DIAGNØSTICOS�ACESSÓVEIS� NÎO�SÎO�CAPAZES�DE�ESTABELECER�UM�DIAGNØSTICO�DE� CERTEZA��.O�ÊMBITO�DOS�DISTÞRBIOS�DO�DESENVOLVI- MENTO�E�DOS�TRANSTORNOS�MENTAIS�E�COMPORTAMENTAIS� NA�INFÊNCIA�E�ADOLESCÐNCIA��FECHAR�DIAGNØSTICOS�E� ESTABELECER�TRATAMENTOS�SÎO�SITUA¥ÜES�BEM�MAIS� COMPLEXAS�DO�QUE�APARENTAMv��REVELA� -ARCELA�POSSUI�GRADUA¥ÎO�EM�-EDICINA�PELA� 5NIVERSIDADE�&EDERAL�DO�0IAUÓ������ �E�TÓTULO�DE� ESPECIALISTA�EM�.EUROLOGIA�E�.EUROLOGIA�0EDIÉTRICA� PELA�%SCOLA�0AULISTA�DE�-EDICINA��%0-�5NIFESP �� Neurologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira DE�0EDIATRIA��3"0 �E�.EUROLOGIA�PELA�!CADEMIA� "RASILEIRA�DE�.EUROLOGIA��!". ��2EALIZOU�MESTRADO� PELA�5NIFESP��!TUALMENTE��ALÏM�DE�NEUROLOGISTA� E�NEUROPEDIATRA�NA�#LÓNICA�!MATO�)NSTITUTO�DE� -EDICINA�!VAN¥ADA��EM�3ÎO�0AULO��Ï�PRECEPTORA� DA�RESIDÐNCIA�MÏDICA�DE�.EUROLOGIA�0EDIÉTRICA�DA� 5NIFESP��NEUROLOGISTA�E�NEUROPEDIATRA�DO�)NSTITUTO� DE�!SSISTÐNCIA�-ÏDICA�AO�3ERVIDOR�0ÞBLICO�%STADUAL� n�)AMSPE�E�NEUROLOGISTA�DO�(OSPITAL�DO�3ERVIDOR� 0ÞBLICO�-UNICIPAL�n�(30-�DE�3ÎO�0AULO� Lucas Vasques é jornalista e escreve nesta publicação. NÃO É NADA SIMPLES IDENTIFICAR O QUE É PATOLÓGICO Por Lucas Vasques AR QU IV O PE SS OA L �� psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br No âmbito dos distúrbios do desenvolvimento e dos transtornos mentais e comportamentais na infância e adolescência, fechar diagnósticos e estabelecer tratamentos são situações mais complexas do que aparentam O SUICÍDIO, AINDA SEGUNDO A OMS, É A TERCEIRA CAUSA DE MORTE ENTRE ADOLESCENTES. COMO A NEUROLOGIA OU A NEUROCIÊNCIA PODEM CONTRIBUIR PARA MINIMIZAR ESSE CENÁRIO? MARCELA:�.A�FAIXA�ETÉRIA�ADOLESCEN- TE��OS�PRINCIPAIS�FATORES�ASSOCIADOS�AO� RISCO�DE�SUICÓDIO�ESTÎO�RELACIONADOS�A� TRANSTORNOS�DE�PERSONALIDADE�OU�HU- MOR��QUE� INCLUEM�SINTOMAS�DEPRESSI- VOS��AUTO�E�HETEROAGRESSIVIDADE��PRE- DISPOSI¥ÎO�AO�ABUSO�DE�SUBSTÊNCIAS�E� COMPORTAMENTO� ANTISSOCIAL�� 'ERAL- MENTE�� OS� INDÓCIOS� DE� UM� DESFECHO� SUICIDA� APARECEM� EM� TEMPO� HÉBIL� para se evitar essa trágica consequ- ÐNCIA�� 3EJA� ATRAVÏS� DE� PEQUENAS�MU- DAN¥AS�NO�COMPORTAMENTO�OU�MESMO� DROGADI¥ÎO�� ESSES� ADOLESCENTES� MUI- TAS�VEZES�NOS�MOSTRAM�QUE�PRECISAM� de ajuda. É nesse ponto que a ciência DEVE� INTERVIR�� FAZENDO� DIAGNØSTICO� E� TRATANDO�ANTES�QUE�O�PIOR�ACONTE¥A� COMO DETECTAR SE CONDUTAS ANTIS- SOCIAIS, DELINQUÊNCIA E USO DE DRO- GAS, POR EXEMPLO, SÃO APENAS MANI- FESTAÇÕES INERENTES À ADOLESCÊNCIA, E POR ISSO PASSAGEIRAS, OU ESTÃO AS- SOCIADOS A DISTÚRBIOS DE COMPORTA- MENTO MAIS GRAVES? MARCELA:� %SSA� Ï� UMA� PERGUNTA� MUI- TAS� VEZES� DIFÓCIL� DE� SER� RESPONDIDA�� -AS�PARA�MINIMIZAR�A�CHANCE�DE�ERRO� E�DISTINGUIR�O�NORMAL�DO�PATOLØGICO�Ï� FUNDAMENTAL� UMA� AVALIA¥ÎO� GLOBAL� DO� ADOLESCENTE�� ¡� PRECISO� DETERMINAR� O� IMPACTO� DO� COMPORTAMENTO� NA� VIDA� DO� PRØPRIO� INDIVÓDUO� E� NA� DAQUELES� COM�QUEM�ELE�SE�RELACIONA��E�SE�ELE�TEM� CIÐNCIA� DISSO�� !LÏM� DO� SOMATØRIO� DE� OUTRAS� CARACTERÓSTICAS�� EMPATIA� �COLO- CAR SE�NO�LUGAR�DO�OUTRO �COSTUMA�SER� UMA�CARACTERÓSTICA�AUSENTE�NOS�FRANCA- MENTE�PATOLØGICOS� VIVEMOS NA ERA DE MUITA INFOR- MAÇÃO SIMULTÂNEA E COSTUMA-SE, INCLUSIVE, DIZER QUE A CRIANÇA SÓ FALTA NASCER FALANDO, POIS OS BEBÊS SÃO TOTALMENTE DIFERENTES DOS DA GERAÇÃO PASSADA. COMO A NEUROLO- GIA EXPLICA ESSE DESENVOLVIMENTO DO CÉREBRO INFANTIL? MARCELA: %STE�Ï�MAIS�UM�EXEMPLO�DE� QUE� OS� NOSSOS� GENES� E� CROMOSSOMOS� NÎO� SÎO� OS� ÞNICOS� DETERMINANTES� DO� QUE� SOMOS�� !S� CRIAN¥AS�� ATUALMENTE�� SÎO�PRECOCEMENTE�EXPOSTAS� A�UMA�GI- GANTESCA�MASSA�DE�ESTÓMULOS��DESDE�O� INTRAÞTERO��/�ESTILO�DE�VIDA�CONTEMPO- RÊNEO�Ï�EXTREMAMENTE�DIFERENTE�E�MAIS� ACELERADO� QUE� NA� ÏPOCA� DOS� NOSSOS� IMA GE NS : S HU TT ER ST OC K DADOS DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) INDICAM QUE A PREVA- LÊNCIA MUNDIAL DE DISTÚRBIOS DO DE- SENVOLVIMENTO E DOS TRANSTORNOS MENTAIS E COMPORTAMENTAIS NA IN- FÂNCIA E ADOLESCÊNCIA CHEGA A 20%. A HETEROGENEIDADE DOS QUADROS CLÍ- NICOS E AS PECULIARIDADES DIAGNÓSTI- CAS REPRESENTAM UM DESAFIO PARA A PRÁTICA CLÍNICA? MARCELA:� 3IM�� !� HETEROGENEIDADE� DAS� MANIFESTA¥ÜES� CLÓNICAS� E� POSSÓ- veis etiologias desses transtornos nos DESAlAM� DIARIAMENTE�� ,IDAMOS� COM� ALTERA¥ÜES� TÎO�DIVERSAS� COMO�UM� LEVE� TIQUE�PRØPRIO�DA�INFÊNCIA�ATÏ�ALTERA¥ÜES� COMPORTAMENTAIS�MAIS� RARAS�� QUE� EN- VOLVEM� QUADROS� DEGENERATIVOS� E� PRO- GRESSIVOS�� .EM� SEMPRE� DIFERENCIAR� O� QUE�Ï�PRØPRIO�DO�DESENVOLVIMENTO�HU- MANO�DO�PATOLØGICO� Ï� TÎO� SIMPLES��%�� NA�MAIORIA�DAS�VEZES��OS�EXAMES�DIAG- NØSTICOS�ACESSÓVEIS�NÎO�SÎO�CAPAZES�DE� ESTABELECER�UM�DIAGNØSTICO�DE�CERTEZA�� .O� ÊMBITO� DOS� DISTÞRBIOS� DO� DESEN- VOLVIMENTO�E�DOS� TRANSTORNOS�MENTAIS� E�COMPORTAMENTAIS�NA�INFÊNCIA�E�ADO-LESCÐNCIA�� FECHAR� DIAGNØSTICOS� E� ESTA- BELECER�TRATAMENTOS�SÎO�SITUA¥ÜES�BEM� MAIS�COMPLEXAS�DO�QUE�APARENTAM� �� �I�� G ����� �G��`���I��\��������G�������� �G���G��� G�I�����b���G��G����Gh��9� �� ���������� ��������`����� G����Ë�I�G�G�\��G�G��G����Gh���I������G����G�� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 11 Vários estudos na literatura médica comprovam que, nos transtornos mentais e comportamentais, a genética não é a única responsável pelas manifestações clínicas. Fatores ambientais e sociais SÎO�MODIlCADORES� e causadores de psicopatologias A MICROCEFALIA, RECENTEMENTE, SE TRANSFORMOU EM UM FANTASMA PARA NOSSA SAÚDE PÚBLICA. É CORRETO DIZER QUE O ZIKA VÍRUS, AO ATINGIR O CÉRE- BRO DO FETO, PROVOCA UMA REAÇÃO INFLAMATÓRIA QUE PREJUDICA A MUL- TIPLICAÇÃO DAS CÉLULAS QUE ORIGINAM OS NEURÔNIOS E POR CONTA DESSA IN- FLAMAÇÃO O CÉREBRO NÃO ATINGE SEU TAMANHO NATURAL? MARCELA:� !S� ANÉLISES� DE� AUTØPSIAS� SUGEREM� QUE� O� VÓRUS� PROVOCA� INTENSA� DESTRUI¥ÎO� CELULAR� DIRETA�� RESULTAN- DO� EM�MORTE� NEURONAL�� CALCIF ICA¥ÜES�� GLIOSE� �CICATRIZES �E�DEGENERA¥ÎO�WAL- LERIANA� �DEGENERA¥ÎO� SECUNDÉRIA� DOS� TRATOS�NEURONAIS �� QUE�EXPLICAM�O�DÏ- F ICIT� DE� CRESCIMENTO� CEREBRAL�� (OUVE� INF ILTRADO� INF LAMATØRIO� NAS� AMOSTRAS�� PORÏM�MAIS�DISPERSO� MAS EXISTEM CAUSAS MAIS FREQUENTES PARA A MICROCEFALIA DO QUE O ZIKA VÍ- RUS. QUAIS SERIAM ESSAS CAUSAS E QUAIS AS FORMAS DE TERAPIA, UMA VEZ QUE SE TRATA DE UMA DOENÇA INCURÁVEL? MARCELA: !� MICROCEFALIA� PODE� RE- SULTAR� DE� INÞMERAS� CAUSAS� GENÏTICAS� E� AMBIENTAIS��OU�ATÏ�DA�COMBINA¥ÎO�DE- LAS�� %NTRE� ELAS�� ESTÎO� AS� SÓNDROMES� DE� 2ETT�� DE� #ORNELIA� DE� ,ANGE�� DE� #RI- DU #HAT�� DE� $OWN�� DE� 3ECKEL� E� DE� AVØS��4UDO�ISSO�REmETE�NA�EVOLU¥ÎO�DAS� NOSSAS� CRIAN¥AS�� ALTERA¥ÜES� HORMONAIS� E� MODIlCA¥ÜES� DO� AMBIENTE� UTERINO� EM�FUN¥ÎO�DA�VIDA�DA�MÎE��ADAPTA¥ÎO�Ì� MULTIPLICIDADE�DE�ESTÓMULOS�AMBIENTAIS� �DA�LUMINOSIDADE�ATÏ�O�INGRESSO�PRECO- CE�EM�ESCOLAS�E�CRECHES �ETC� EXISTEM CRIANÇAS CRUÉIS, OU SEJA, PO- DEMOS DIZER QUE UMA CRIANÇA PODE APRESENTAR TRAÇOS DE PSICOPATIA DES- DE MUITO PEQUENA? O QUE A NEUROLO- GIA FALA SOBRE ISSO? MARCELA:�3IM��0SICOPATIA�Ï�UM�TRANS- TORNO� PSIQUIÉTRICO� QUE� SE� CARACTERIZA� PELA� AUSÐNCIA� DE� CONSCIÐNCIA� MORAL�� ÏTICA� E� HUMANA�� EVIDENCIADA� POR� ATI- TUDES�DESCOMPROMISSADAS�PARA�COM�O� OUTRO�E�COM�AS�REGRAS�SOCIAIS��ALÏM�DE� DEF ICIÐNCIA� SIGNIF ICATIVA� DE� EMPATIA�� 0ODE� ACONTECER� EM� QUALQUER� IDADE�� -UITAS�VEZES��OS�SINTOMAS�SÎO�IGNORA- DOS�PELO�TEMOR�DE�SE�ASSUMIR�UM�DIAG- NØSTICO�TÎO�PRECOCEMENTE��%NTRETANTO�� DIVERSOS� SINAIS� SÎO� VISÓVEIS� JÉ� DESDE� MUITO� CEDO�� COMO� MALTRATAR� ANIMAIS� SEM� QUALQUER� REMORSO� OU� SENTIDO�� COMPORTAMENTO�EXTREMAMENTE�OPOSI- TOR�E� IMPULSIVIDADE�EXAGERADA��!TUAL- MENTE�� JÉ�SÎO�RECONHECIDAS�ALTERA¥ÜES� CEREBRAIS�EM�PSICOPATAS�QUE�JUSTIF ICAM� A�F ISIOPATOLOGIA�DA�PSICOPATIA� É MUITO DIFÍCIL DIAGNOSTICAR UMA PSICOSE INFANTIL, UMA VEZ QUE A CRIANÇA VIVE EM UM MUNDO NO QUAL A IMAGINAÇÃO NÃO TEM LIMITES, O QUE PODE SER CONFUNDIDO COM ALGUMA PSICOPATOLOGIA? MARCELA: #OMO� CITADO� ANTERIORMEN- TE�� MALTRATAR� ANIMAIS� PODE� SER� UMA� CARACTERÓSTICA� PRECOCE� DE� PSICOPATIA�� -AS� TORTURAR� UM� ANIMALZINHO� E� CHO- RAR�APØS�SER�ESCLARECIDO�DO�FEITO�Ï�UM� sinal de que esse ato pode ser apenas FRUTO�DA� INCAPACIDADE� INFANTIL�DE�PRE- VER�CONSEQUÐNCIAS��!TÏ�O�PERÓODO�PRÏ- ESCOLAR�� A� CRIAN¥A� GERALMENTE� TEM� PENSAMENTOS� CONCRETOS� E� POUCA� OU� NENHUMA�NO¥ÎO�DO�PERIGO��!SSIM��NÎO� Ï� INCOMUM� ACREDITAREM� QUE� PODEM� VOAR�OU�QUE�ALGUÏM�Ï�UM�SUPER HERØI� E� TEM� PODERES� MÉGICOS�� -AS� ESSES� PENSAMENTOS�SÎO�CONSTRUÓDOS�E�PODEM� SER� DESCONTRUÓDOS�� O� QUE� NÎO� OCORRE� DE� MANEIRA� TÎO� SIMPLES� NOS� QUADROS� DE� PSICOSE�� .ESSES� ÞLTIMOS�� AS� IDEIAS� DELIRANTES�SÎO�F IXAS�E�CONVENCÐ LOS�DA� IRREALIDADE�DE�ALGUMAS�COISAS�Ï�TAREFA� PRATICAMENTE�IMPOSSÓVEL� *� ��������������� G�I��G�hG� ���� �G��G��G����� ������ �����IG ��������G��� ����G����� ���I�I�������������G�G���G� �����G��G��G� �����^�����9� �� ��������Gb����� �� psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br 3MITH ,EMLI /PTIZ�� A� FENILCETONÞRIA� MATERNA�� O� CONSUMO�DE� CIGARRO�� ÉLCO- OL��DROGAS�OU�DE�ALGUNS�MEDICAMENTOS� DURANTE� A� GESTA¥ÎO�� DOEN¥AS� INFECCIO- SAS� �RUBÏOLA�� TOXOPLASMOSE�� CITOMEGA- LOVÓRUS�� VARICELA�� HERPES� ZOSTER�� ENTRE� OUTRAS �� INTOXICA¥ÎO� POR� METILMERCÞ- RIO�� EXPOSI¥ÎO� Ì� RADIA¥ÎO�� DESNUTRI¥ÎO� MATERNA�� MÉ FORMA¥ÎO� DA� PLACENTA�� TRAUMATISMO�CRANIOENCEFÉLICO�� E�HIPØ- XIA� GRAVE� PERINATAL�� /� OBJETIVO� MAIOR� DO� TRATAMENTO� Ï� A� REABILITA¥ÎO� �ESTI- MULAR� O� MAIOR� DESENVOLVIMENTO� POS- SÓVEL �E�CONTROLAR�AS�COMPLICA¥ÜES��!S- SIM�� A� TERAPIA� DEVE� SER� CONDUZIDA� POR� UMA�EQUIPE�MULTIDISCIPLINAR�COMPOSTA� POR�MÏDICOS�DE�DIFERENTES�ESPECIALIDA- DES� �NEUROPEDIATRAS�� OFTALMOLOGISTAS�� PEDIATRAS��lSIATRAS�ETC� ��lSIOTERAPEUTAS�� FONOAUDIØLOGOS�� TERAPEUTAS� OCUPACIO- NAIS�E�PSICØLOGOS��/�USO�DE�MEDICA¥ÜES� TAMBÏM� Ï� FREQUENTEMENTE� NECESSÉRIO� PARA�O�CONTROLE�DE�CRISES�EPILÏPTICAS�E� DAS�ALTERA¥ÜES�DE�COMPORTAMENTO� EM QUE MEDIDA AS DESCOBERTAS NO CAMPO DA NEUROLOGIA PEDIÁTRICA AVANÇARAM NO DIAGNÓSTICO E NO TRA- TAMENTO DOS TRANSTORNOS DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE? MARCELA: !TUALMENTE�� O� DIAGNØSTICO� DOS�4$!(� TEM� SIDO� FEITO� DE�MANEIRA� CADA� VEZ� MAIS� PRECOCE�� /� ESTUDO� DO� COMPORTAMENTO� E� DESENVOLVIMENTO� NORMAL�DA�CRIAN¥A��ALÏM�DOS�ESTUDOS�DE� IMAGEM� FUNCIONAIS�� AUMENTOU� EXPO- NENCIALMENTE� NOSSO� CONHECIMENTO� NA� ÉREA�� PERMITINDO� DIFERENCIAR� O� NORMAL� DO�PATOLØGICO�COM�MAIS�SEGURAN¥A��%�� UMA� VEZ� DISTINGUINDO OS�� Ï� POSSÓVEL� TRATAR� OS� CASOS� NECESSÉRIOS�� !LÏM� DAS� TERAPIAS� MEDICAMENTOSAS�� PODEMOS� CONTAR�COM�O�TRATAMENTO�NEUROPSICOLØ- GICO�DESSAS�CRIAN¥AS��QUE�CADA�DIA�MAIS� ENGLOBA�NOVAS�TÏCNICAS��%NTRE�AS�MEDI- CA¥ÜES�� ATUALMENTE� DISPOMOS� DE� UMA� DIVERSIDADE�AMPLA�DE�CLASSES�DE�DROGAS� E� FORMULA¥ÜES�COM�DIFERENTE� FARMACO- CINÏTICA� E� DIFERENTE� FARMACODINÊMICA�� QUE� PERMITEM� OTIMIZAR� O� BENEFÓCIO� E� MINIMIZAR�OS�EFEITOS�COLATERAIS� O CÉREBRO DAS PESSOAS QUE SOFREM DE TDAH FUNCIONA DE MANEIRA DIFE- RENTE? APRESENTA DIFERENÇAS MORFO- LÓGICAS? MARCELA:� 3ABE SE� QUE� O� 4$!(� TEM� UM� FORTE� COMPONENTE� HEREDITÉRIO�� !� PROBABILIDADE� DE� UMA� CRIAN¥A� TER� O� DISTÞRBIO� AUMENTA� EM� ATÏ� OITO� VEZES� SE� OS� PAIS� TAMBÏM� FOREM� ACOMETIDOS�� %NTRETANTO�� A� CAUSA� DO�4$!(� Ï�MUL- TIFATORIAL�� COM�COMPONENTES� GENÏTICOS� E� AMBIENTAIS�� %STUDOS� DEMONSTRAM� REDU¥ÎO� DO� VOLUME� DE� CERTAS� ESTRUTU- RAS� CEREBRAIS�� COM� PROPORCIONALMENTE� MAIOR�DIMINUI¥ÎO�DO�CØRTEX�PRÏ FRONTAL� ESQUERDO�NOS�ACOMETIDOS��/S�CIRCUITOS� PRÏ FRONTAIS ESTRIATO CEREBELAR� E� PRÏ- FRONTAIS ESTRIATO TÉLAMO�TAMBÏM�DIFE- REM�ENTRE�PESSOAS� COM�E� SEM�4$!(�� 3ABE SE�� AINDA�� QUE�HÉ� ALTERA¥ÜES� FUN- CIONAIS� ENVOLVIDAS�� EM� ESPECIAL� NAS� VIAS�DOPAMINÏRGICA�MESOCORTICOLÓMBI- CA�E�NORADRENÏRGICA�DO�locus ceruleus. A SUPERMEDICALIZAÇÃO DAS CRIANÇAS EM CASOS DE TDAH PODE NÃO SER A MELHOR SAÍDA? MARCELA: #OM�CERTEZAå�-UITOS�CASOS� PODEM�SER�RESOLVIDOS��INCLUSIVE��SEM�O� USO�DE�QUALQUER�MEDICA¥ÎO��/�4$!(� TEM� VÉRIOS� GRAUS� E� TAMBÏM� TEM� SIDO� ASSOCIADO� COM� DÏF ICITS� MOTIVACIONAIS� EM�ALGUMAS� CRIAN¥AS��%SSAS� TÐM�DIF I- CULDADE�PARA�MANTER�A�CONCENTRA¥ÎO�E� EXIBEM�COMPORTAMENTO�IMPULSIVO�POR� RECOMPENSAS� DE� CURTO� PRAZO�� .ESSES� SHU TT ER ST OC K O estilo de vida contemporâneo é mais acelerado que na época de nossos AVØS��)SSO�REmETE�NA� evolução das crianças: alterações hormonais E�MODIlCA¥ÜES�DO� ambiente uterino em função da vida da mãe, adaptação à multiplicidade de estímulos ambientais $�b���������G��� �����I��G��G��Ô�����^������� ��I� �9�I�����G���G�G��G���G����������������������� �9� I������G�������������������������� G ����G���G G www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 13 INDIVÓDUOS��O�REFOR¥O�POSITIVO�MELHORA� EFETIVAMENTE�O�DESEMPENHO�� SEM�USO� DE� QUALQUER� MEDICA¥ÎO�� %NTRETANTO�� EM� MUITOS� CASOS�� OS� PSICOESTIMULAN- TES� PODEM� SE� FAZER� NECESSÉRIOS� PARA� AUMENTAR� A� PERSISTÐNCIA� E� A� ATEN¥ÎO�� ALÏM� DE� MELHORAR� O� COMPORTAMENTO� TAMBÏM��#ONTUDO�� CADA� CRIAN¥A� Ï�DI- FERENTE� DA� OUTRA�� .UNCA� DEVE� SER� ES- QUECIDO� QUE� NEM� TODA� DESATEN¥ÎO� E� OU� HIPERATIVIDADE� Ï� 4$!(�� MUITAS� VEZES� FALTAM� APENAS� ESTÓMULO� E� ORGA- NIZA¥ÎO�FAMILIAR� EXISTEM INÚMEROS MITOS A RESPEITO DO FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO DO ADOLESCENTE, COMO A BUSCA PELO PRA- ZER IMEDIATO, NECESSIDADE DE RECOM- PENSAS POR MÉRITO, DIFICULDADE EM RESPEITAR LIMITES E REGRAS, POR EXEM- PLO. COMO A NEUROLOGIA ENXERGA EM QUE MEDIDA ESSAS CARACTERÍSTICAS DEVEM SER CONSIDERADAS NATURAIS OU INDÍCIOS DE PATOLOGIAS OU DISTÚRBIOS? MARCELA: !� ESTRUTURA� CEREBRAL� SOFRE� VISÓVEIS� MUDAN¥AS� DURANTE� A� ADOLES- CÐNCIA�� COMO� JÉ� COMENTADO� ANTERIOR- MENTE�� 0ROVA� DISSO� Ï� QUE� A� ESPESSURA� DA� SUBSTÊNCIA� CINZENTA� VARIA� NESSE� PERÓODO�� REF LETINDO� AS� ALTERA¥ÜES� QUE� OCORREM�EM�NÓVEL�MICROSCØPICO��!LÏM� DISSO��O�AMADURECIMENTO�DAS�CONEXÜES� CEREBRAIS� OCORRE� DE� MANEIRA� PROGRES- SIVA��MAS�EM�TEMPOS�DIFERENTES��£REAS� ENVOLVIDAS� EM� FUN¥ÜES� MAIS� BÉSICAS� AMADURECEM� PRIMEIRO�� AQUELAS� RELA- CIONADAS�� POR� EXEMPLO�� AO� PROCESSA- MENTO� DE� INFORMA¥ÎO� DOS� SENTIDOS� �TATO��VISÎO��AUDI¥ÎO�ETC� �E�NO�CONTROLE� DOS�MOVIMENTOS��!S�PARTES�DO�CÏREBRO� RESPONSÉVEIS�PELO�CONTROLE�DOS� IMPUL- SOS�E�PLANEJAMENTO�DO�FUTURO��ATIVIDA- DES� MAIS� COMPLEXAS� E� CARACTERÓSTICAS� DO�COMPORTAMENTO�ADULTO �ESTÎO�ENTRE� AS� ÞLTIMAS� A� AMADURECER�� /UTRA� EVI- DÐNCIA�DE�DIFEREN¥A�NO�FUNCIONAMENTO� CEREBRAL�ADOLESCENTE�Ï�QUE�AS�PARTES�DO� CÏREBRO�ENVOLVIDAS�EM�RESPOSTAS�EMO- CIONAIS�SÎO�TOTALMENTE�ATIVAS��OU�MES- MO�MAIS�ATIVAS�DO�QUE�EM�ADULTOS��EN- quanto aquelas envolvidas no controle Para minimizar as sequelas da microcefalia, a reabilitação MULTIPROlSSIONAL� precoce é fundamental. Ainda não temos MEDICA¥ÜES�ESPECÓlCAS� neuroprotetoras ou que possam estimular a regeneração neuronal DOS� IMPULSOS� AINDA� ESTÎO� CHEGANDO� Ì� MATURIDADE��4AL�MUDAN¥A�DE�EQUILÓBRIO� PODE�FORNECER�PISTAS�PARA�A�EXPLICA¥ÎO� ENTRE� UM� APETITE� JOVEM� POR� NOVIDADE� E� UMA� TENDÐNCIA� A� AGIR� POR� IMPULSO�� SEM�LEVAR�EM�CONTA�O�RISCO��%NTRETAN- TO��APESAR�DESSA�IMPULSIVIDADE�NATURAL�� EXISTE� UMA� LINHA� TÐNUE� QUE� SEPARA� O� NORMAL�DO�PATOLØGICO��MAS�ESSA�DIVISØ- RIA�NEM�SEMPRE�Ï�TÎO�NÓTIDA��DEPENDEN- DO� DA� REPERCUSSÎO� QUE� ESSAS� ATITUDES� DITAS�JUVENIS�TÐM�NA�VIDA�DO�INDIVÓDUO� O USO EXCESSIVO DA INTERNET PODE ALTERAR O FUNCIONAMENTO CEREBRAL DA CRIANÇA? MARCELA: 6ÉRIOS�ESTUDOS�TÐM�MOSTRA- DO� MODIF ICA¥ÜES� ESTRUTURAIS� �ATROF IA� NA� SUBSTÊNCIA� CINZENTA � E� FUNCIONAIS� �ALTERA¥ÜES� NAS� VIAS� NEURONAIS� DE� DO- PAMINA �EM�ADICTOS�EM�INTERNET�OU�JO- gos. !S�ÉREAS�AFETADAS�INCLUEM�O�LOBO� FRONTAL�� QUE� REGULA� AS� FUN¥ÜES� EXECU- TIVAS�� COMO� PLANEJAMENTO�� ORGANIZA- ¥ÎO� E� CONTROLE� DE� IMPULSOS�� 0ERDA� DE� VOLUME�CORTICAL�TAMBÏM�FOI�OBSERVADA� no striatum��QUE�ESTÉ�ENVOLVIDO�NAS�VIAS� DE� RECOMPENSA�E� SUPRESSÎO�DE� IMPUL- SOS�SOCIALMENTE�INACEITÉVEIS��4AMBÏM� HÉ�POSSÓVEIS� ALTERA¥ÜES�NA� ÓNSULA�� QUE� ESTÉ� LIGADA�Ì�NOSSA�CAPACIDADE�DE�DE- SENVOLVER� EMPATIA� E� COMPAIXÎO� PARA� COM� OS� OUTROS�� E� DE� INTEGRAR� SINAIS� F ÓSICOS� DE� EMO¥ÎO�� %M� SUMA�� O� USO� EXCESSIVO� DA� INTERNET� PARECE� PREJUDI- CAR� A� ESTRUTURA� E� FUN¥ÎO� DO� CÏREBRO�� COM� GRANDE� PARTE� DOS� DANOS� OCOR- RENDO� NO� LOBO� FRONTAL�� QUE� PASSA� POR� GRANDES�MUDAN¥AS�DESDE�A�PUBERDADE� ATÏ� MEADOS� DOS� ��� ANOS�� %M� GRANDE� PARTE�� DESDE� A� SENSA¥ÎO�DE�BEM ESTAR� AO� SUCESSO� ACADÐMICO�PROF ISSIONAL� E� HABILIDADES�DE�RELACIONAMENTO��EMPA- (�������G�������� ����IG����G��G���I��I��G��G9�I�����^� ������ ������9� �� ���9� ���������G� ��'G���9� �����¢ �¢��G�9� ��-�I������ ��-����¢'����¢*����9�����������G� 14 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br TIA�OU�COMPORTAMENTO�ANTISSOCIAL �DE- PENDEM�DO�BOM�FUNCIONAMENTO�DESSA� ÉREA�CEREBRAL� PROCEDE A AFIRMAÇÃO QUE AS MENINAS AMADURECEM MAIS CEDO DO QUE OS ME- NINOS E QUE O CÉREBRO MASCULINO E FEMININO POSSUEM DIFERENÇAS BIOLÓGI- CAS? EM CASO AFIRMATIVO, COMO ESSAS DIFERENÇAS INFLUENCIAM NOS ESTUDOS DA NEUROPEDIATRIA? MARCELA: -ATURIDADE�CEREBRAL�Ï�SINÙ- NIMO�DE�CAPACITA¥ÎO�PARA�DETERMINADA� ATIVIDADE� �DESENVOLVIMENTO� ADEQUADO� DE�VIAS�E�CONEXÜES�INTERNEURONAIS ��3E- GUNDO�ESTUDOS�RECENTES�� FOI�EVIDENCIA- DO�QUE� AS�MENINAS� TENDEM�A�OTIMIZAR� AS� CONEXÜES� CEREBRAIS� MAIS� CEDO� QUE� OS�RAPAZES��AMADURECENDO�MAIS�RÉPIDO� EM�ALGUMAS�ÉREAS�COGNITIVAS�E�EMOCIO- NAIS�DURANTE�A�INFÊNCIA�E�ADOLESCÐNCIA�� %SSA� hEVOLU¥ÎOv� RESULTA� DE� UMA� PODA� NEURONAL�� ONDE� CONEXÜES� REDUNDANTES� SÎO�hAPARADASv�E�OUTRAS�ESSENCIAIS�ESTA- BILIZADAS��!LÏM�DISSO��AS�MULHERES�TEN- DEM�A�TER�MAIS�CONEXÜES�ENTRE�OS�DOIS� HEMISFÏRIOS� DO� CÏREBRO�� $ESSA� FORMA�� CREDITA SE�A�ESSA�REORGANIZA¥ÎO�PREMA- TURA� A� CAPACIDADE� DE� O� CÏREBRO� FEMI- NINO�TRABALHAR�DE�FORMA�MAIS�ElCIENTE� E�� PORTANTO�� ALCAN¥AR� UM� ESTADO� MAIS� MADURO�PARA�O�PROCESSAMENTO�DO�MEIO� AMBIENTE� DE� MANEIRA� MAIS� PRECOCE�� .A� PRÉTICA�� Ï� COMUM� QUE� OS�MENINOS� SE�MOVIMENTEM�MAIS�NO�PERÓODO�PERI- NATAL� E� TENHAM� MELHORES� HABILIDADES� MOTORAS�GROSSEIRAS�� QUE�ENVOLVEM� FOR- ¥A� E� PRECISÎO�� %NTRETANTO�� AS� MENINAS� ADQUIREM�MATURIDADE� EMOCIONAL� E� AL- GUNS�HÉBITOS�MAIS� RAPIDAMENTE�� COMO� O�CONTROLE�DO�ESFÓNCTER��E�FALAM�ANTES�E� MELHOR�DO�QUE�OS�MENINOS��/�QUE�LEVA� Ì� DIFEREN¥A� DE� GÐNERO� AINDA� NÎO� ESTÉ� TOTALMENTE� CLARO� NO� MOMENTO� E� NEM� Um estudo sueco mostrou que homens homossexuais e mulheres heterossexuais têm características cerebrais semelhantes. %SPECIlCAMENTE��ESSAS� semelhanças estão no tamanho total do cérebro, na atividade e nas conexões da amígdala AS� INmUÐNCIAS�DO�MEIO� SÎO�CAPAZES�DE� ELIMINAR� ESSA� DIVERGÐNCIA�� #ONTUDO�� Ï� EVIDENTE� QUE� ESSA� DIFEREN¥A� DEVE� SER� VALORIZADA� NA� AVALIA¥ÎO� NEUROLØGICA� E� FUNCIONAL�DE�QUALQUER�INDIVÓDUO� AINDA EM RELAÇÃO A GÊNEROS, E ABOR- DANDO A QUESTÃO DA HOMOSSEXUALIDA- DE, PARA A NEUROPEDIATRIA É POSSÍVEL AVALIAR SE O FENÔMENO É BIOLÓGICO? DESDE MUITO CEDO A CRIANÇA PODE DESCOBRIR SUA HOMOSSEXUALIDADE? MARCELA: 5M� ESTUDO� SUECO� MOSTROU� QUE� HOMENS� HOMOSSEXUAIS� E� MULHERES� HETEROSSEXUAIS� TÐM� CARACTERÓSTICAS� CE- REBRAIS� SEMELHANTES�� %SPECIlCAMENTE�� ESSAS� SEMELHAN¥AS� ESTÎO� NO� TAMANHO� TOTAL�DO�CÏREBRO�E�NA�ATIVIDADE�E�CONE- XÜES� DA� AMÓGDALA�� /� MESMO� ACONTECE� ENTRE�HOMENS�HETEROSSEXUAIS�E�MULHERES� HOMOSSEXUAIS�� /UTRA� PESQUISA� QUE� ES- TUDOU�O�mUXO�SANGUÓNEO�NAS�AMÓGDALAS� OBSERVOU�QUE�EM�HOMENS�HOMOSSEXUAIS� E�MULHERES�HETEROSSEXUAIS�O�SANGUE�mUI� PRINCIPALMENTE�PARA�AS�ÉREAS�ENVOLVIDAS� COM� MEDO� E� ANSIEDADE�� ENQUANTO� QUE� EM� HOMENS� HETEROSSEXUAIS� E� MULHERES� HOMOSSEXUAIS� TENDIA� A� mUIR� PARA�OS� LO- CAIS� LIGADOS� ÌS� REA¥ÜES� DE� LUTA� E� FUGA�� !LÏM�DISSO��AO�AVALIAR�AS�DIFEREN¥AS�ANA- TÙMICAS�ENTRE�OS�HEMISFÏRIOS�CEREBRAIS��O� DIREITO�PARECE�SER�UM�POUCO�MAIOR�QUE� O� ESQUERDO� EM� HOMENS� HETEROSSEXUAIS� E� MULHERES� HOMOSSEXUAIS�� ENQUANTO� QUE�HAVIA�UMA�TENDÐNCIA�Ì�SIMETRIA�EM� HOMENS�HOMOSSEXUAIS�E�MULHERES�HETE- ROSSEXUAIS��%M�HOMENS�HOMOSSEXUAIS�E� MULHERES�HETEROSSEXUAIS�CONSTATARAM SE� TAMBÏM�MAIS�CONEXÜES�A�PARTIR�DA�AMÓG- DALA� ESQUERDA�� *É� EM�MULHERES� HOMOS- SEXUAIS�E�HOMENS�HETEROSSEXUAIS�HOUVE� MAIS� LIGA¥ÜES� A� PARTIR� DA� AMÓGDALA� DI- REITA��0ARA�A�EXISTÐNCIA�DESSAS�DIFEREN¥AS� ENTRE� O� CÏREBRO�HOMOSSEXUAL�E� O�HETE- ROSSEXUAL� JÉ� FORAM� AVENTADAS� DIVERSAS� TEORIAS��COMO�A�EXPOSI¥ÎO�PROLONGADA�Ì� TESTOSTERONA�E�OUTROS�HORMÙNIOS�MASCU- LINOS�OU�MESMO�ALTERA¥ÜES�GENÏTICAS��/� FATO�Ï�QUE��ATÏ�O�MOMENTO��NÎO�SABEMOS� A�REAL�CAUSA�DE�TAIS�DIFEREN¥AS�E�SE�JÉ�SE� NASCE�HOMOSSEXUAL�OU�NÎO� *�����GH������ ���������������I��G�hG���� ��G���G��P��G��I���������G�9����������G�G�����h������I����G�9� I������G�� G�����9����G���GhÔ����I�������� ���������� MOMENTO DO LIVRO Livro: Opala - A história do maior chevrolet brasileiro Número de páginas: 116 Editora: Escala Dos editores da revista Car and Driver À venda nas bancas e livrarias. Veja mais informações em www.escala.com.br Coordenação de Luiz Guerrero Durante 24 anos de produção, o Chevrolet Opala reinou sem concorrentes e se tornou obje- to de desejo de uma geração de motoristas e en- tusiastas. Suas linhas atraentes, especialmente na versão cupê, e sua versão esportiva, a SS, estabe- leceram novos padrões para a indústria brasileira. Pois é deste automóvel que trata este livro: das origens, cimentadas pelo Opel Rekord, até o dia ���GH�DEULO�GH�������TXH�PDUFRX�R�ÀP�GR�FLFOR�GH� um dos mais queridos automóveis já produzidos no Brasil. OPALA – A história do maior Chevrolet brasileiro, coordenada por Luiz Guerrero, é o quarto título da coleção Os Imortais, que anteriormente contou a história de outros marcantes automóveis como o FUSCA, o MUSTANG e a KOMBI, todos com capa em acabamento Premium e 116 páginas de histórias contadas em imagens e textos cheios de detalhes. Conheça toda a história deste automóvel e entenda por que o Opala foi o maior Chevrolet até hoje fabricado no País. 16 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br in foco por Michele Muller Playgrounds são ASSUNTO SÉRIO de funções psicomotoras, sensoriais e so- ciais. Trazem às crianças a oportunidade de praticarem o equilíbrio, a força, a aten- ção às diversas texturas, a lateralidade, a coordenação motora, a propriocepção (noção da localização espacial do próprio corpo) e as habilidades criativas e sociais. Para comprovar que a arquitetura do espaço faz toda a diferença na brinca- deira, os pesquisadores Anthony Susa e James Benedict (1994) realizaram um es- tudo, na década de 90, relacionando brin- cadeiras de faz de conta, criatividade e o design do playground. Para isso, testaram o “pensamento divergente” de 80 crianças enquanto brincavam em diferentes espa- ços. A conclusão foi de que os parquinhos CONTEMPORÊNEOS�SÎO�MAIS�ElCIENTES�NO�ES- tímulo à criatividade que os tradicionais. O estudo serviu de base para muitos projetos de arquitetura voltados a esse público e ou- tras pesquisas apontando a necessidade de UM�OLHAR�MAIS�PROlSSIONAL�SOBRE�AS�ÉREAS� construídas para estimular brincadeiras. Enquanto seguimos conformados com nossos velhos e abandonados escorregado- res de praça, em países em que ambientes de lazer são levados a sério e considerados parte fundamental do desenvolvimento infantil, a discussão (que nem chegou no "RASIL �ESTÉ�TÎO�AVAN¥ADA�QUE�ESTÎO�REVEN- do alguns de seus projetos mais modernos. O motivo: excesso de segurança. ESPAÇOS PÚBLICOS QUE PROMOVEM A SOCIALIZAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DE FUNÇÕES FUNDAMENTAIS PARA A SAÚDE MENTAL DAS CRIANÇAS DEVERIAM RECEBER MAIS ATENÇÃO E MAIS INVESTIMENTOS DAS AUTORIDADES BRASILEIRAS A VIDA É CHEIA DE RISCOS E A INFÂNCIA É A FASE DE TREINAMENTO PARA REAIS DILEMAS QUE REQUEREM SEGURANÇA NA HORA DE AGIR. CRIANÇAS PRIVADAS DO CONTATO COM O PERIGO CRESCEM SEM CORAGEM D iante das opções tentadoras de diversão eletrônica, as crianças estão reduzindo drasticamente o tempo dedicado às aventuras nos espaços externos. Muitos pais parecem se preocupar com a participação excessiva dos ELETRÙNICOS�NO�DIA�A�DIA�DO�lLHO��MAS� SÎO� raros os que conseguem encaixar na rotina momentos de atividades livres em locais ESTIMULANTES��!�DIlCULDADE�EM�ADMINISTRAR� o tempo e, principalmente, a preocupação crescente com a segurança das crianças pode tornar conveniente esse interesse quase obsessivo delas pelas telas e botões. Uma pesquisa recente com 2 mil fa- mílias inglesas constatou que três em cada quatro crianças passam menos de UMA�HORA�DIÉRIA�BRINCANDO�EM�AMBIENTE� externo – um tempo menor de contato com luz solar que o garantido a detentos das prisões daquele país. A realidade das nossas crianças que vivem nas cidades GRANDES�NÎO�DEVE�SER�DIFERENTE��%�AQUI�HÉ� um agravante: temos menos alternativas interessantes de ambientes destinados a brincadeiras ao ar livre. A maioria dos nossos playgrounds públicos têm duas ou três atrações, não raramente mal conser- vadas. A arquitetura nos surpreende com tantas soluções belas e funcionais, mas até agora pouco trouxe para concorrer com OS� INEVITÉVEIS� ESCORREGADORES� E� BALAN¥OS� das praças brasileiras. Sem questionar a diversão que podem propiciar, sozinhos eles não representam um grande motiva- DOR�PARA�TIRAR�PAIS�E�lLHOS�DE�CASA� A necessidade de oferecer ambien- tes atraentes e repletos de estímulos em ESPA¥OS� PÞBLICOS� Ï� EVIDENTE� EM� VÉRIOS� lugares do mundo. Em muitos países, a comunidade têm à disposição parquinhos desenvolvidos por arquitetos especializa- dos nesse setor. Muitos são tão criativos e IRRESISTÓVEIS�QUE�DÉ�VONTADE�DE�VOLTAR�A�SER� criança para aproveitar a estrutura. Esses locais, quando bem arquitetados, não apenas servem de incentivo a passeios EM�FAMÓLIA�E�MENOS�HORAS�DE�SOFÉ��SÎO�PRO- jetados a partir da consciência da impor- tância do ambiente no desenvolvimento www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 17 IM AG EN S: M IC HE LE M IL LE R probabilidade de gerarem batidas, quedas e machucados. Os pais excessivamente protetores terão que rever seus conceitos e entender por que as ataduras do Menino Maluquinho foram essenciais para a for- mação de um jovem feliz e bem resolvido, conforme Ziraldo concluiu a história. Na década de 1940, muito antes de TERMOS� COMPROVA¥ÜES� CIENTÓlCAS� DA� IM- portância dos riscos que a brincadeira livre traz, o arquiteto dinamarquês Carl Sørensen criou um conceito de play- ground que foi espalhado por toda a Eu- ropa. Sua ideia era dar às crianças da cida- de as mesmas chances de viver aventuras que eram privilégio das que cresciam no interior. O Adventure Playground atual- mente conta com cerca de mil espaços em diversos países, inclusive Estados Unidos e Japão. Equipados com muitos pedaços de madeira e ferramentas de verdade, os parques trazem aos pequenos aventurei- ros a oportunidade de construírem seus próprios brinquedos, de subirem em cor- DAS��ÉRVORES�E�DE�SE�SUJAREM�BASTANTE� No Japão, a preocupação em expor crianças pequenas ao risco foi um dos principais fundamentos do projeto da escola construída por um dos arquitetos mais conceituados daquele país na atua- lidade. Takaharu Tezuka projetou a Fuji Kindergarten, em Tóquio, levando em consideração as necessidades naturais das crianças – inclusive de se aventurar. Na escola, em formato oval e sem a tradicio- nal separação física das salas de aula, elas têm total liberdade de explorar o ambien- te e passam a maior parte do tempo gas- TANDO�ENERGIA�NAS�ÉREAS�EXTERNAS��,É�ELAS� correm, em média, 4 quilômetros por dia e ganham naturalmente as habilidades psicomotoras que garantem seu desen- volvimento social e cognitivo. Nenhuma CRIAN¥A� Ï� CONSIDERADA� PROBLEMÉTICA� POR� NÎO� CONSEGUIR� lCAR� SENTADA� DENTRO� DE� uma sala. O arquiteto Takaharu Tezuca, em sua palestra do TED, destaca: “Crian- ças precisam de pequenas doses de peri- go. Nessas ocasiões elas aprendem a se ajudar. Isso é viver em sociedade. É oque estamos perdendo nos dias atuais”. Além de serem impedidas de brincar LIVREMENTE�� COMO� RESULTADO� DE� VÉRIOS� TI- pos de medo que as cidades grandes nos IMPÜEM��AS�CRIAN¥AS�PERDERAM�A�CONlAN- ça de seus pais. Em algum momento da história recente colocaram uma lente de aumento nas pequenas ameaças do dia a dia e resolveram que crianças são total- MENTE� IRRESPONSÉVEIS� E� DESPROVIDAS� DE� noção de perigo. Um dos fatores que mais pesam no es- tilo de vida das crianças modernas – seja NA� )NGLATERRA� OU� AQUI� n� ACABOU� INmUEN- ciando a criação dos espaços contempo- RÊNEOS� DE� BRINCADEIRA�� !lNAL�� ALGUMAS� sociedades, especialmente a americana, vivem sob ameaça constante de proces- sos, e qualquer atividade que envolva o público infantil corre sério risco de gerar insatisfações com consequências legais. Os medos e ansiedades dos adultos, desproporcionais aos verdadeiros riscos que a realidade traz, desconsideram a na- tureza da criança e mais prejudicam que protegem. O perigo, em pequenas doses DIÉRIAS�� Ï� PARTE� FUNDAMENTAL� DAS� BRINCA- deiras. Filhotes de espécies mais evoluídas se divertem correndo riscos, testando seu próprio comportamento diante de situ- ações perigosas simuladas nas pequenas lutas e aventuras de sua curta infância. E isso não ocorre por acaso, nem representa irresponsabilidade ou falta de noção, como MUITOS� PAIS� DE� lLHOTES� HUMANOS� ACREDI- tam. É parte do crescimento, do autoco- nhecimento e do conhecimento dos limi- tes do corpo e das necessidades do outro. A vida é cheia de riscos e a infância é a fase de treinamento para reais dilemas que re- querem segurança na hora de agir. Crian- ças privadas do contato com o perigo cres- cem sem coragem, dependentes, com altos níveis de ansiedade e sem noção de como lidar com situações sociais simples que não poderão ser evitadas pelos pais mais tarde. Portanto, além de modernos, criativos e cheios de estímulos, muitos playgrounds contemporâneos de países desenvolvidos estão sendo repensados para trazer um certo risco. Ou seja: voltam a ter cantos, pontas, superfícies duras, altura e mais Michele Muller é jornalista com especialização em Neurociência Cognitiva e autora do blog http://neurocienciasesaude.blogspot.com.br 18 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.brwww.portalcienciaevida.com.br psicopositiva por Lilian Graziano CONSIDERADA COMO CONDIÇÃO FUNDAMENTAL PARA A FELICIDADE GENUÍNA, A AUTENTICIDADE DEVE SER UMA BUSCA CONSTANTE. MAS, PARA ISSO, PRECISAMOS CONHECER OS SEUS IMPEDITIVOS A lata de azeite e os impeditivos da VIDA AUTÊNTICA (parte 2) aquela experimentada por um indiví- duo distante da sua própria verdade. No texto passado af irmei que se- riam quatro essas razões (má inten- ção, desconhecimento, falta de cora- gem e o “moedor de carne”), tendo discutido, naquela ocasião, apenas as duas primeiras. Começo este texto, portanto, falando sobre a terceira razão que poderia impe- dir que uma pessoa leve uma vida autên- tica: a simples e pura falta de coragem. !RISTØTELES�AlRMAVA��SABIAMENTE��QUE� a coragem é a principal das virtudes, vis- to ser necessária até para que o indivíduo seja ele mesmo. Concordo integralmente com o SÉBIO� lLØSOFO�� .O� ENTANTO�� VOU� ALÏM�� Tenho medo dos covardes quase tanto quanto dos maus caráteres. Isso por- que, considerando a bondade como característica da maior parte dos seres humanos (uma crença bastante discutí- vel, admito), creio ser no covarde que o mau caráter encontra sua principal fon- te de manobra. O covarde se corrompe por medo. Medo de perder a aprova- ção, o afeto, o conforto, o prestí- gio, não importa. É por medo que ele deixa de viver aqui- lo em que acredita, abre mão de seus valores e, P artindo da ideia de que a au- tenticidade é mais do que uma força pessoal, na coluna passa- da comecei a discorrer sobre a importância dessa característica para a chamada felicidade genuína. Mais do QUE�ISSO��AlRMEI�QUE��A�DESPEITO�DESSE� fato, existem algumas razões que cos- tumam condenar as pessoas a uma vida inautêntica. Uma vida que, agora acrescento, seria bastante discutível em termos de felicida- de, visto sua inerente ausência de sentido, uma vez que nenhuma anomia pode ser maior do que www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 19 Lilian Graziano é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com curso de extensão em Virtudes e Forças Pessoais pelo VIA Institute on Character, EUA. É professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, onde oferece atendimento clínico, consultoria empresarial e cursos na área. graziano@psicologiapositiva.com.br SH UT ER ST OC K / A CE RV O PE SS OA L justamente por conta dessa fraqueza, torna-se perigoso. Se pensarmos na autenticidade como uma condição para uma vida feliz e considerarmos que é necessário cora- gem para sermos autênticos, a conclusão é clara: a felicidade exige coragem. E é triste saber que existem pessoas infelizes não pelas condições que cercam suas vi- das mas, antes de tudo, pelo medo que as impele a uma vida pela metade em que a extensão de seus discursos não vai além do volume vacilante de suas pala- vras. Além disso, vivemos em uma épo- ca em que imersos em uma avalanche de simulações (sociedade do espetáculo, al- guns diriam) ser autêntico e verdadeiro tornou-se um diferencial. Mas isso já é um outro assunto! A quarta razão que nos afasta da au- tenticidade é o que chamo de “moedor DE� CARNEv�� *É� DElNI� ESSA� EXPRESSÎO� EM� outros textos meus, portanto, dessa vez, serei breve. Chamo de moedor de carne esse ritmo alucinante em que vivemos que nos faz viver numa espécie de piloto automático e que nos distancia de tudo: das atividades que fazemos, das pessoas ao nosso redor e de nós mesmos. Os dias vão se acumulando uns sobre os outros, a vida vai passando e lá estamos nós dentro (?!) daquele enorme moedor de carne, muitas vezes ligados no 220 volts. E é assim que o moedor de carne se torna responsável por coisas como a lata de azeite. Antes que você me tome como louca, permita-me, caro leitor, que eu me explique. Durante boa parte da minha infân- cia e adolescência, brigava com minha mãe por causa das latas de azeite que tínhamos em casa (sim, porque naquela época o azeite era vendido em latas!). Nossas latas de azeite eram sempre me- lecadas e grudentas, o que me incomo- A AUTENTICIDADE É IMPOSSÍVEL SEM O AUTOCONHECIMENTO. TALVEZ POR ESSA RAZÃO ESSE ÚLTIMO SEJA A PEDRA ANGULAR DE TODO TRABALHO PSICOTERAPÊUTICO dava bastante. Eu tinha a plena convic- ção de que isso acontecia porque minha mãe fazia dois furos na lata (na época EU�DESCONHECIA�A�TEORIA�DOS�mUIDOS ��/� fato é que brigava com minha mãe to- das as vezes. Quando abria uma lata de azeite, eu fazia sempre um furo grande �RESOLVENDO� ASSIM� O� PROBLEMA� DO� mU- XO ��-INHA�MÎE�lCAVA� LOUCA��!LÏM�DE� fazer um outro furo na lata ainda en- lAVA�UM�PALITO�DE�DENTE�NO�FURO�QUE�EU� HAVIA�FEITO�A�lM�DE�DEIXÉ LO�MENOR��&OI� assim por muito tempo. Até que um dia EU�ME� CASEI�� lZ�MINHA� PRIMEIRA� COM- pra de supermercado e, claro, comprei minha lata de azeite. Quando cheguei em casa, peguei a lata e aconteceu: sem QUE�ME�DESSE�CONTA��lZ�DOIS�FUROS�NELAå� Lembro-me desse dia como se fosse hoje. Naquele momento meu cérebro, funcionando no piloto automático, me traíra, fazendo com que eu simplesmen- te seguisse a minha referência, ainda que isso fosse de encontro com minha crença e minha verdade. Para mim, a lata de azeite se tornou uma metáfora do que acontece quan- do estamos distantesde nós mesmos: traímos a nossa essência, deixamos de ser autênticos e, o pior, temos que arcar com uma vida, por assim dizer, um tan- to “melecada”. ANÚNCIO 1/3 20 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br psicopedagogia por Maria Irene Maluf Educando para o FUTURO DURANTE TODA A ESCOLARIDADE É POSSÍVEL APARELHAR GRADATIVAMENTE AS CRIANÇAS E JOVENS DE MODO A DESENVOLVER AS CHAMADAS HABILIDADES INTERPESSOAIS O homem é um ser social por natureza. Desde o momen- to de seu nascimento, in- dependentemente de onde viva, já se encontra inserido em um grupo social, que se amplia conforme cresce e começa a frequentar a escola, constituindo novas e crescentes rela- ções interpessoais. Tal rede de relações é estabelecida segundo características do indivíduo, do próprio grupo e da cultura vigente e vai sendo construída gradativamen- te no decorrer de toda vida e, embora os primeiros anos sejam primordiais nesse aprendizado, é preciso aprender a aprender como planejar novas situa- ções por toda a vida. Ninguém duvida que o maior ob- jetivo da educação seja criar a auto- nomia pessoal e social e que essa con- dição dependa em grande parte da formação acadêmica e depois prof is- sional, de cada pessoa. A constituição de um perf il prof issional que acom- panhe as mudanças, as demandas de um mundo laboral hiperativo, compe- titivo e exigente é uma urgência das últimas décadas, à qual ninguém se pode furtar. Paralelamente a isso, temos como certo que a formação do adulto capaz e autônomo, socialmente responsável, depende primordialmente da educação que recebe da família e da escolaridade que frequenta e que esta não se baseia mais na transmissão de valores e co- nhecimentos (de toda ordem) pratica- mente imutáveis, mas na necessidade DE�CRIAR�PESSOAS�COM�UM�PERlL�ADAPTA- tivo às rápidas mudanças sociais, cien- TÓlCAS�� MERCADOLØGICAS�� ETC�� !PRENDER� como se aprende, para aprender sem- pre, constitui um padrão de realidade à qual ninguém pode se furtar. Entretanto, além do imprescindí- vel respeito aos talentos naturais, há de se levar em conta que habilidades de toda ordem devem ser aprendidas a partir da pré-escola, visando o desen- volvimento de um novo perf il, que vai passo a passo evoluindo até alcançar condições ideais de atender as exigên- cias acadêmicas e, um dia, ser prof is- sionalmente competitivo. Capacidade de se adaptar a mu- danças, responder a desaf ios de modo organizado, coerente, ser capaz de trabalhar e resolver problemas junto a outras pessoas, demonstrar atitudes interpessoais de comunicação, lide- rança, domínio da tecnologia são im- prescindíveis para a vida social e para atender as demandas do mercado de trabalho do século XXI. No dia a dia é possível, por exem- plo, criar métodos e estratégias que objetivam desenvolver as chamadas habilidades interpessoais das crianças e jovens em idade escolar. Isso pode ser realizado mediante jogos e tarefas de grupo, onde é maior a valorização dos comportamentos que demons- trem capacidade de trocas de infor- mação ef icientes, empatia, atitudes de comando, controle da frustração, capacidade de suportar pressão, resi- liência e autonomia, entre outras. Segundo Eric Smith, pesquisador da Universidade de Stanford, o controle emocional gera atitudes mais adapta- TIVAS� EM� CASO� DE� MUDAN¥AS�� DESAlOS�� fracassos, estresse comuns na vida estu- dantil, e preparam para as vicissitudes DO�MUNDO�PROlSSIONAL�PRINCIPALMENTE�� Portanto, preparar as crianças e jo- VENS�PARA�ATENDER�A�ESSE�PERlL�DE�PRO- lSSIONAIS�QUE�A� SOCIEDADE�PRECISA�PARA� enfrentar as vicissitudes e os novos modelos do século XXI tornou-se um DESAlO�REALISTA�PARA�A�FAMÓLIA�E�A�ESCOLA�� E, evidentemente, bons professo- res que também tenham essa feição tornaram-se indispensáveis: antes de dominar o conteúdo ou ser um mes- tre na didática, o importante passou a ser sua habilidade interpessoal, ou seja, saber estabelecer um bom rela- cionamento com seus alunos, desen- volver empatia, criar o sentimento de pertencimento a um grupo. Isso tudo favorece as habilidades cognitivas e www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 21 Maria Irene Maluf é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É editora da revista Psicopedagogia da ABPp e autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br SH UT TE RS TO CK / A RQ UI VO P ES SO AL inf luencia de forma marcante no en- sino e na aprendizagem. Segundo revela uma importante pesquisa divulgada recentemente pelo Grupo Educacional Person (2015), re- alizada em 23 países, sobre as carac- terísticas mais valorizadas por alunos, pais, professores e responsáveis pelas políticas educacionais em cada nação, as coincidências foram muitas. Para os alunos brasileiros, a pa- ciência é a principal qualidade de um bom professor (13%) e saber se rela- cionar é o segundo quesito mais im- portante, seguido do prof issionalismo e habilidades didáticas. Inqueridos os familiares dos alu- nos, 14,2% indicaram o prof issionalis- mo, seguido do relacionamento e da paciência, como características-chave de um bom professor, o que não di- fere essencialmente do que pensam os próprios professores que agregam ainda a dedicação (9,8%). A pesquisa revelou que para os re- presentantes políticos se destaca outra ALÉM DO IMPRESCINDÍVEL RESPEITO AOS TALENTOS NATURAIS, APRENDER COMO SE APRENDE, PARA APRENDER SEMPRE, CONSTITUI UM PADRÃO DE REALIDADE DO QUAL NINGUÉM PODE SE FURTAR qualidade, mas em quarta posição, que está relacionada ao gerenciamento da sala de aula (8,4%), perdendo ape- nas para o relacionamento (12,2%), paciência (12,2%) e dedicação (10,7%). Tais habilidades fazem com que a criança, no encontro e vivência com seus pares, conheça seus próprios sentimentos, suas reações emocionais FRENTE�AO�COTIDIANO�E�SEUS�DESAlOS��SEU� MODO� DE� PENSAR� E� REmETIR� SOBRE� ISSO�� Portanto, oportunizar o desenvolvi- mento das habilidades socioemocio- nais dos professores é importante para melhorar a aprendizagem acadêmica e para ajudar a desenvolver as mesmas habilidades nas novas gerações. 22 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br sexualidade Por Giancarlo Spizzirri IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K E AR QU IV O PE SS OA L A SEXUALIDADE É MUITO MAIS QUE O ATO SEXUAL. MUITOS FATORES PODEM INFLUENCIAR NOSSO COMPORTAMENTO. FALAR SOBRE O ASSUNTO, MESMO ANTES DA PUBERDADE, É UMA TAREFA ÁRDUA DADA A DIVERSIDADE DAS CONDUTAS HUMANAS A FASE das descobertas de SI MESMO habitualmente descrito como início da vida sexual. Não é incomum nos per- guntarem com que idade começamos a vida sexual – entretanto a sexualida- de humana é muito mais do que o ato sexual em si. As primeiras práticas e atividades sexuais durante a adolescência in- f luenciam nossas emoções e, por con- seguinte, nossas relações. Com frequ- ência ouvimos relatos de pessoas que foram reprimidas durante a adolescên- cia, e de como essa repressão as in- f luenciou de forma negativa em com- portamentos futuros; por outro lado, também são frequentes os relatos de indivíduos que não receberam qual- quer orientação e/ou foram criados em ambientes considerados permis- sivos, que também sofrem durante a vida adulta em seus relacionamentos. Portanto, chegar em um denominador do que seja adequado ao pensarmos na educação durante, e até mesmo antes da puberdade,é uma tarefa árdua dada a diversidade das condutas humanas. Em relação às mudanças f ísicas que acompanham esse período, algu- mas considerações merecem desta- que. É na adolescência (para alguns em fases precoces, para outros em fases posteriores do desenvolvimento – durante esse período) que se obser- vam nas meninas o aparecimento do broto mamário e na sequência o de- senvolvimento das mamas, da pilosi- dade pubiana e axilar, da genitália e a primeira menstruação, que recebe o nome de menarca. Nos meninos ve- rif icam-se aumento dos testículos e posteriormente o surgimento dos pe- los pubianos, assim como o aumento do tamanho do pênis. Essas mudanças f ísicas são velozes, e muitas vezes po- dem gerar conf litos. De certa maneira é como se o psiquismo não acompa- nhasse a intensidade do aumento dos hormônios, responsáveis por essas al- terações. Com frequência o adolescen- te pode não reconhecer o seu próprio corpo, sentimentos de inconformidade são comuns, entre eles: sentir-se esqui- sito, atrapalhado, atribulado, ansioso, frustrado, uma vez que nem sempre a imagem corporal reproduzirá aquela que foi idealizada. Além desse corpo em mudança, que rapidamente vai perdendo as caracte- rísticas infantis, é nesse período que as sensações oriundas de por quem sen- timos atração sexual irão se tornando mais evidentes, e então mais dúvidas e A adolescência é uma fase do desenvolvimento, que geralmente ocorre dos 10 aos 19 anos de idade. Para a Organização Mundial da Saúde, a puberdade se distingue por mudan- ças envolvidas com particularidades f ísicas (por exemplo, pela inf luência dos hormônios no desenvolvimento das características sexuais secundá- rias), emocionais, relacionais, entre outras. Com a maturação das gônadas (ovários e testículos), a função repro- dutora passa a se constituir uma pos- sibilidade; além do mais, é nessa fase que as práticas sexuais ganham outra dimensão, e normalmente costumam ser mais empreendidas, como a mas- turbação, brincadeiras e jogos com a f inalidade de gratif icação sexual. En- tretanto, não podemos resumir esse período somente como sendo o qual novas práticas sexuais são exploradas; ele é também um momento importan- te de interação dos adolescentes com seus pares, família e sociedade. Segundo diversos estudos, é nesse período, geralmente após os 14 anos, que ocorrerá a primeira atividade se- xual com outra pessoa. Para muitos, esse momento constitui um marco, www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 23 NA ADOLESCÊNCIA, AS MUDANÇAS FÍSICAS SÃO VELOZES E PODEM GERAR CONFLITOS. É COMO SE O PSIQUISMO NÃO ACOMPANHASSE A INTENSIDADE DO AUMENTO DOS HORMÔNIOS, RESPONSÁVEIS POR ESSAS ALTERAÇÕES ABORDAGEM�OPORTUNA�E�ESPECÓlCA�SOBRE� o tema. Além do mais, determinadas práticas sexuais são encorajadas de- pendendo do sexo do nascimento. Para os garotos adolescentes, a masturbação parece ser mais aceita socialmente do que para as garotas. Ao pensarmos em desigualdades, esse fato pode consti- tuir um prejuízo para as adolescentes na exploração e melhor entendimento das reações do próprio corpo. Após a avalanche de hormônios que acarretam as mudanças f ísicas, um pouco mais adiante, as sensações e as emoções perceberão o impacto dessas alterações. Chega-se então na fase das grandes paixões, de sensa- ções como: o meu mundo acabou se meu amor não for correspondido; as- sim como das grandes causas, como: Giancarlo Spizzirri é psiquiatra doutorando pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP, médico do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do IPq e professor do curso de especialização em Sexualidade Humana da USP. receios podem acompanhar essa fase. Como é um período de novas desco- bertas, nem sempre as brincadeiras sexuais com pessoas do mesmo sexo IRÎO� REmETIR� EM� ORIENTA¥ÎO� SEXUAL� HO- mossexual na idade adulta. Aliás, os fatores que determinam a orientação sexual são complexos e merecem uma eu tenho razão, os outros é que não me compreendem, e assim por diante. Diante do exposto, o adolescente ain- da tem de lidar com questões cruciais que dizem respeito a sua integridade f ísica, como as doenças sexualmente transmissíveis, uso de bebidas alcoóli- cas, rivalidades entre grupos etc. Além do mais, se esses adolescentes não fo- ram bem instruídos sobre os métodos contraceptivos e preventivos, a possi- bilidade de uma gravidez indesejada e/ou doenças transmissíveis pelo con- tato sexual torna-se concreta. Portan- to, quanto mais os adolescentes forem aconselhados de maneira adequada, tanto mais serão capazes de tomar de- cisões apropriadas, que implicarão em mais satisfação em um período da vida do qual guardamos lembranças. 24 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br EQUÍVOCOS da profissão supervisão Por Ricardo Wainer A SUPERVISÃO E O PROCESSO DE AUTOCONHECIMENTO DO TERAPEUTA PERMITEM A PREVENÇÃO SIGNIFICATIVA DE ALGUMAS OCORRÊNCIAS QUE SURGEM DE SENSAÇÕES DESCONFORTÁVEIS COM O PACIENTE OU POR PENSAMENTOS DE INCOMPETÊNCIA COM O CASO O TERAPEUTA POSSUI A DESAFIADORA TAREFA DE AJUDAR O PACIENTE E PODE ENCONTRAR OBSTÁCULOS NO CAMINHO, COMO SEUS PRÓPRIOS ESQUEMAS MENTAIS DESADAPTATIVOS O segundo erro é a utilização pelo terapeuta de mecanismos de hipercom- pensação, de forma a evitar sentimentos desagradáveis vinculados a seus EIDs. Nesse tipo de ocorrência, o que se vê é o terapeuta agindo de um modo extremo, seja através de condutas agressivas (de ataque), de controle excessivo ou ainda se autoengrandecendo em relação ao paciente. Assim, um paciente narcisis- ta, que ativa o esquema de fracasso e/ ou de privação emocional do terapeuta, pode sofrer um “ataque” do terapeuta, por meio de depreciação ou mesmo de- monstrações de inveja. Evidentemente, esse tipo de situação usualmente tem o término da terapia como desfecho. Tem-se também uma falha de mesma natureza da anterior, mas com sentido oposto. A conduta do psicoterapeuta em se subjugar ao paciente através de con- dutas permissivas, como alongamento do tempo da sessão, permissividades em relação a faltas e/ou não cumprimento de combinações (horários, pagamentos, tarefas de casa etc.), indica que os EIDs do paciente ativaram EID de subjugação do terapeuta, que acaba por assumir esse papel passivo como uma forma primiti- va de obter afeto-consideração ou de não ser visto como defeituoso. A quarta situação a ser monitorada é a conduta de criticar o paciente. Talvez o mais iatrogênico de todos os quatro erros indicados, pois reapresenta ao pa- CIENTE�UMA�FORMA�DE�hmASHBACKv�DE�SEU� PASSADO�COM�lGURAS�DE�AUTORIDADE�DIS- funcionais e as quais ele, provavelmente, (EIDs)¹ e/ou da repetição de estilos dis- funcionais de enfrentamento (que his- toricamente serviram para aliviar situ- ações de abuso ou emoções negativas). O primeiro desses equívocos é o terapeuta se desconectar do paciente durante a sessão, entrando no modo de enfrentamento disfuncional chamado “protetor desligado”, segundo a terapia do esquema. É uma forma de resistên- cia automática e inconsciente (na maio- ria das vezes), em que o terapeuta pode INTERAGIR�E�INTERVIR�DE�MODO�SUPERlCIAL�� desconexo, racionalizando (dando “dis- cursos teóricos”) ou mesmo apresen- tando sentimentos de tédio, chateação E�DESCONFORTO��.ÎO�RARO��PODE�lCAR�COM� o pensamento em questões pessoais ou ainda falar sobre assuntos banais com o paciente (“conversa entre amigos”). A ocorrência desse tipo de erro indica, na maioria das vezes, que o paciente encontrava-se no mesmo modo “prote- tor desligado” e, ao invés de “trazê-lo de volta” para o setting terapêutico, o terapeuta é que vai para a “periferia” do foco da sessão.A complexidade e sutilezas do processo psicoterápico podem lCAR�OCULTAS�NUMA�ANÉLISE�SU- PERlCIAL� E� INGÐNUA�� %NTRETAN- to, olhando-se para além do aparente, desnuda-se uma rede intricada de rela- ções entre conhecimentos e experiên- cias emocionais de diversos momentos cronológicos do indivíduo, que culmi- nam na projeção das muitas facetas do self de cada ser humano. Para obter sucesso em sua empreita- da, o clínico necessita, para além de seus conhecimentos teóricos e técnicos, um saber sempre atualizado de seus esquemas mentais mais primitivos, bem como de seus modos de enfrentamento que são ativados quando suas necessidades emocionais não são satisfeitas (o que pode ocorrer a qualquer momento, inclusive na relação terapêutica). Dentre os erros mais freqüentes que se apresentam na prática psicoterápi- ca temos quatro deles que tipicamente aparecem como resultante da falta de consciência do terapeuta sobre seus pró- prios esquemas mentais desadaptativos www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 25 SH UT TE RS TO CK / AC ER VO P ES SO AL Ricardo Wainer é doutor em Psicologia, especialista em Terapia do Esquema, com treinamento avançado pelo New York Schema Institute, e supervisor credenciado pela International Society of Schema Therapy. Pesquisador em Psicoterapia Cognitivo-Comportamental e em Ciências Cognitivas. Professor titular da Faculdade de Psicologia da PUC–RS. Diretor da Wainer Psicologia Cognitiva. TA�A� IDENTIlCAR�AS�PISTAS�E�SINAIS�DE�QUE� um EID determinado está ativado. Após isso, auxiliá-lo a conscientizar-se so- bre qual modo de enfrentamento adota quando tal EID está ativado. Pode usar o “protetor desligado” e se desconectar dos sentimentos negativos que a sessão está lhe ativando. Pode ainda hipercom- pensar ou subjugar-se. E, não menos da- noso, lidando com a situação através da crítica e punição. de alguns questionários e pela própria análise dos casos em que o terapeuta DEMONSTRA� MAIORES� DIlCULDADES�� ±S� vezes isso pode se dar por sensações desconfortáveis com o paciente ou por pensamentos de incompetência com o caso. Em outros, paradoxalmente, por um interesse muito aumentado pelo caso, com ações incomuns de afeto com o cliente. O supervisor deve levar o terapeu- as traz dentro de si como “vozes críti- cas”. A atitude de criticar pode assumir duas formas. Uma delas é a atitude de exigir mais e mais do paciente, sendo hi- perdemandante com o mesmo e fazendo com que este se sinta sempre em falta ou sendo punitivo com o paciente, através de ironias, xingamentos ou gritos. Ou- tra maneira desse modo crítico se mani- festar é pela livre permissão do terapeu- ta de falas e atitudes autodepreciativas do próprio paciente, do tipo, “não presto para nada”, “nada do que faço tem valor” ou outras ainda piores. A supervisão e o processo de auto- conhecimento do terapeuta permitem a PREVEN¥ÎO�SIGNIlCATIVA�DESSAS�OCORRÐN- cias. Obtém-se isso através, inicialmen- te, da detecção dos EIDs do terapeuta, o que pode ser obtido por meio do uso Referências ¹Young, J. E.; Klosko, J. S.; Weishaar, M. E. Terapia do Esquema: Guia de Técnicas Cognitivo- comportamentais Inovadoras, 2008. 26 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PSICOLOGIA JURÍDICA Questõe s éticas e técnicas do psicó logo A atua ção do profiss ional na Perícia Psicol ógica n o âmbito judicia l e esp ecialme nte nas Varas de Fam ília deve s er com preend ida por suas e specifi cidade s e se mostra muito diferen te das exigên cias na área c línica Por A ndreia Calça da www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 27 Andreia Calçada é psicóloga, psicoterapeuta, ludoterapeuta, pós-graduada pela UERJ em Psicopedagogia Clínica, especialista em Psicologia Clínica e Psicopedagogia, com especialização em Neuropsicologia pelo IPUB. Tem experiência em Equipe Psiquiátrica e Avaliação Psicológica e é pós-graduada e especializada em Psicologia Jurídica. Autora dos livros Falsas acusações de abuso sexual – o outro lado da história, Falsas acusações de abuso sexual e a implantação de falsas memórias, Perdas irreparáveis – alienação parental e falsas acusações de abuso sexual e é coautora do livro Guarda compartilhada – aspectos psicológicos e jurídicos. SH UT TE RS TO CK Éstá cada vez mais clara a necessida-de que os psicólogos e outros pro-fissionais têm de compreender a diferença existente entre a atuação profissional do psicólogo na área clínica e a atuação do psicólogo no meio jurídico, especialmente na perícia psicológica. A atuação do psicólogo tem sido cada vez mais solicitada no meio forense, principalmente no que tange à avaliação de crianças e adolescen- tes em litígios familiares e em Varas de Família. As perícias psicológicas podem ocorrer também em Varas Criminais e ligadas ao Trabalho, mas em sua maioria ocorrem nas vinculadas à Famí- lia. O momento atual pelo qual passam as famí- lias traz em seu bojo uma série de mudanças que a reboque geram conf litos. A família mudou. Do núcleo tradicional, pai, mãe e filho, temos hoje mães que são chefes de família, pais que cuidam de filhos, famílias homoafetivas e famílias for- madas por filhos de vários casamentos dos par- ceiros. Normal, portanto, que novas demandas surjam e que o Judiciário seja procurado para resolver os conf litos decorrentes. Processos de guarda, convivência, partilha de bens, entre ou- tros, nos quais, muitas vezes indevidamente, as crianças são envolvidas. Consequentemente, o psicólogo é solicitado para avaliações. Em função disso, o número de processos contra esse profissional nos CRPs e CFP aumentou muito nos últimos anos. Visando estabelecer diretrizes, o CRP elaborou um docu- mento denominado “Referências técnicas para a atuação do psicólogo em Varas de Família”, bem como a Resolução 8/2010, que regula a atuação dos psicólogos peritos e assistentes técnicos atu- antes no Judiciário. Além da Resolução 7/2003, que regulamenta o manual de documentos decor- rentes de avaliação psicológica (entre eles os lau- dos e pareceres). O objetivo foi a proteção de fa- mílias e profissionais, já que esses últimos, muitas vezes, se envolvem na seara do conflito, servindo como arma para os atores. É um lugar de difícil atuação, que demanda clareza por parte do psicó- logo sobre qual o seu lugar e a sua importância. A perícia psicológica em Varas de Família, segundo Silva (2015), “é uma avaliação/investiga- ção psicológica realizada por perito psicólogo, de- terminada pelo juiz, com o objetivo de verificar a relação entre pais e filhos (ou de quem está pedin- do a guarda), seus vínculos, os processos mentais e 28 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PSICOLOGIA JURÍDICA �+��I�����G�� I����I�È�I�G����������Ô�� O Conselho Federal de Psicologia (CFP) fun- ciona como uma autarquia de direito públi- co, que tem a missão de orientar, fiscalizar e disciplinar a profissão de psicólogo, zelar pela observância dos princípios éticos, além de co- laborar para o desenvolvimento da Psicologia como ciência e profissão. Tem sede no Distrito Federal e sedes regionais (Conselhos Regionais – CRP) nas capitais de 17 estados brasileiros. tologia, utilização de testes e dinâmica familiar. A redação do laudo ou relató- rio pericial exige também formas espe- cíficas de escrita fundamentais para a exposição do que foi avaliado. O diagnóstico pericial tem quali- dade de conclusão científica e não per- manece, apenas, no conhecimento do psicólogoe isso deverá ficar claro para os entrevistados. Estará disponível nos autos. O psicólogo deverá responder com fidelidade sobre o que descobriu acerca da personalidade do peritado, le- vando em consideração aspectos priva- dos do examinado em função do sigilo profissional, porém informando tudo o que sirva para ampliar a visão do juiz. Isso, muitas vezes, se transforma em um questionamento ético para o psicó- logo, já que, com frequência, algumas informações privadas são importantes para o entendimento do juízo acerca do processo. O perito deverá avaliar a importância da informação privada for- necida (até porque o periciado sabe que as informações prestadas poderão ser levadas ao juiz) e buscar a melhor forma de integrá-la à conclusão, se for o caso. Já o assistente técnico, segundo Amêndola (2008, in “Referências téc- nicas para a atuação do psicólogo em comportamentais, as dinâmicas, enfim, promover uma investigação psicológica utilizando-se das técnicas de Psicologia. O objetivo final é responder aos quesi- tos1 formulados nos autos, levando sub- sídios, na forma de laudo pericial, para que o juiz [avaliando-os], juntamente com as demais provas dos autos, possa dar sua decisão”. Os objetos da investigação psi- cológica, de acordo com Silva (2015), podem girar em torno de alguns temas: vínculos entre pais e filhos ou outros adultos, estado emocional dos pais e as suas implicações no cuidado com os fi- lhos, estado emocional da criança e sua relação com o processo de separação, dinâmica familiar, presença de psico- patologia, características de persona- lidade, funções egoicas, persuasão so- bre a criança, uso de drogas ou algum *��������\�G���\������\�����I�G����G���� �������G G�P��G����GH����G ��������� I�������� ��I�G���9����IG��9�G���9������I`����:� )����G���9�����I���IG��������� ��� ��%G�����9��� ��������� �����������G �������G�����G���� �� .% %���������� �IG ������ ��� vício, abusos psicológico ou sexual, maus-tratos e presença de comporta- mentos que possam levar à síndrome de alienação parental, entre outros. O especialista O perito é alguém que é especialista em determinada área e habilita- do em seu conselho de classe, no caso, aqui, o psicólogo. No Brasil, especifica- mente no Rio de Janeiro, o perito pode ser sorteado em uma listagem de pe- ritos do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) ou, ainda, ser indicado como perito de confiança do juiz. Na Argentina, por exemplo, segue-se basi- camente o sorteio. É fundamental que o perito tenha experiência em avaliação psicológica, tenha especialização em Psicologia Jurídica (pois se diferencia da área clínica), conheça de psicopa- Cresce a participação do psicólogo no meio forense, especialmente no que se refere à avaliação de crianças e adolescentes em litígios familiares www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 29 Varas de Família”), é psicólogo autô- nomo contratado pela parte, cujo co- nhecimento específico sobre a matéria deve ser empregado com a função de complementar e/ou argumentar acer- ca do estudo psicológico desenvolvido pelo perito no processo judicial. É, por- tanto, um assessor da parte, devendo estar habilitado para orientar e esclare- cer sobre as questões psicológicas que dizem respeito ao conf lito. De acordo com o artigo 8º da Resolução 8/2010, o assistente técnico, profissional capa- citado para questionar tecnicamente a análise e as conclusões realizadas pelo psicólogo perito, restringirá sua análi- se ao estudo psicológico resultante da perícia, elaborando quesitos que ve- nham a esclarecer pontos não contem- plados ou contraditórios, identificados a partir de análise criteriosa. Para de- senvolver sua função, o assistente téc- nico poderá ouvir pessoas envolvidas, solicitar documentos em poder das partes, entre outros meios (artigo 429, Código de Processo Civil). O ideal seria que ambos, perito e assistente técnico, trabalhassem em conjunto para salvaguardar o “melhor interesse da criança”. No que tange a esse último, o melhor interesse da IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K *� �G��`���I������I�G��������G�� G �� �� I��I���Ô��I����^��IG����Ô������G��I�9�G���G�9� ���I����I������� �����I`����:�!�IG� �����^���� ����G����:�*����I`����� ����P������� ���I��� �� ��� G ����H��������� ��I�H����GI��IG� G� ������G�� G �� �������G � acusações de abuso sexual, físico e psi- cológico. Um posicionamento isento e científico sobre os fatos, bem como a pacificação dos conf litos, é a melhor ajuda que um bom laudo pericial pode fornecer para as famílias e, principal- mente, para o desenvolvimento saudá- vel das crianças. Relatos articulados Diferentemente do que é espera-do do profissional na clínica, no âmbito forense os relatos dos entrevis- tados serão articulados com os dados processuais e com todas as informa- ções obtidas. Ele deve se adaptar, pois precisará combinar as formalidades processuais com os aspectos técnico- -científicos da profissão. “Deve-se ater a um prazo para a entrega do laudo ou relatório psicológico e também atentar à linguagem jurídica. Deverá realizar uma descrição realista dos fatos, pauta- da em documentos processuais, fazer uma descrição confiável e muitas vezes literal do que é dito pelo entrevistado LAUDOS PERICIAIS PARA SABER MAIS N a área do Direito, a Psicologia tem como atribuição principal elaborar �G� ��� ����I�G��:� *� ��������G�� ���� G��G� ������ IG���9� �� ���I`����� ������9� trabalha baseado nesses laudos e pareceres, instrumentos imprescindíveis para �� ���� ���� I�� �h��� �� G���IG�� G� %����hG:� ������ ��G� ����Ô�� ��� ��������G��� ������I`������������9����I`����� ��^ �I�������I`����� � �I�P���:�*���������G��G� por intermédio da aplicação de procedimentos para avaliar a personalidade e o grau de periculosidade de adultos ou adolescentes nos processos criminais, �G��0G�G�� ���I�G��� G�$��Ë�I�G� G�%������ �e��� ��^ �I��G��G�I����������� ������ ��� ���I������ I����� ��� ���G9� I���� G���������� �\I��I�� G� ��������hÔ�� � �I�P��G9� �H����G� ������IG�������G����G�� G�������G��������I����� �����^�����G��0G�G�� �� !G�^��G����G��0G�G�� G�$��Ë�I�Ge���%� �I�P����\������I`����� ��^ �I������G��G� ������ ��������G� � �I�P���:���+��I�����G�%��^ �IG�\���G�P��G��������GI���G� ����G������ ���I`������I�����������G� ��%����hG9��������� ����G ������ ��^ �I�����������G��� GH�G������� �� ���� ��� �������� G��� ���I������ I��I��������� G���������:� %P� �� ������ ������������I�IG��������G�����G������� � �I�G����G������H��G��:� criança pode muitas vezes estar “escon- dido” em meio a discursos de proteção tanto da família quanto de órgãos que atuam junto ao Judiciário. Esse é o caso, por exemplo, em processos onde ocorrem a alienação parental, falsas As perícias psicológicas podem acontecer em Varas Criminais e também nas ligadas ao Trabalho, mas na grande maioria das vezes ocorrem nas vinculadas à Família 30 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PSICOLOGIA JURÍDICA *�������� ����P�G�G��G��G�������Ë�I�G� G� ������GhÔ������G G������I� G�G�\���������� ����I�G ���GH������G��������Gh��������G G�� �� ��Ô���������G G��G�� ������H��IG��G�������� ����G� ��������P¢�G�O�I��I���Ô�9����������IG�� der o que está sendo perguntado, é hora de fazer a análise dos dados e, então, a síntese e elaboração do laudo pericial3, com base na Resolução 7/2003. De acordo com a Resolução 8/2010 do CFP, o trabalho pericial poderá con- templar observações, entrevistas, visitas domiciliares e institucionais, aplicação de testes psicológicos, utilização de re- cursos lúdicos e outros instrumentos, métodos e técnicas reconhecidos pelo Conselho Federal dePsicologia (artigo 3º), e nele poderá atuar equipe multi- profissional (artigo 5º). Em seu artigo 6º, a resolução de- termina que os documentos produ- zidos por psicólogos que atuam na Justiça devem manter o rigor técnico e ético exigido na Resolução CFP nº 7/2003, que institui o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psicólogo, decorren- tes da avaliação psicológica. Em seu relatório, o psicólogo perito apresen- tará indicativos pertinentes à sua in- vestigação, os quais possam subsidiar diretamente o juiz na solicitação rea- lizada, reconhecendo os limites legais de sua atuação profissional, sem aden- trar nas decisões, que são atribuição exclusiva dos magistrados (artigo 7º). ����GhÔ���G�0G�G� ��!G�^��G� O documento “Referências técnicas para a atuação do psicólogo em Varas de Família”, lançado pelo Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop), apre- senta diretrizes para a atuação de psicólogos em Varas de Família. O texto procura oferecer subsídios aos profissionais da área e àqueles que não possuem vínculo empregatício com o Poder Judiciário mas emitem pareceres que são anexados a processos, desenvolvendo práticas relativas à Psicologia Jurídica. e contestar exaustivamente os pontos periciais que constituem a resposta ao solicitado pelas partes e pelo juiz. É uma matriz, à qual o psicólogo deve adaptar a visão global do que foi com- preendido na análise diagnóstica reali- zada” (Pinto, 2007). Durante as perícias, o psicólogo busca acessar o entrevistado em uma relação quase íntima, na qual o peri- ciado possa se expressar com espon- taneidade, apesar de saber que tudo o que disser será incluído no informe do profissional e transmitido à autorida- de que decidirá sobre a causa (Pinto, 2007). O objetivo é que seu trabalho ajude a resolver a demanda judicial. Para isso, se utilizará de entrevistas se- midirigidas e testes psicológicos devi- damente qualificados pelo CFP. As partes deverão ser contatadas com o objetivo de agendar as entrevis- tas diagnósticas. Em muitos processos haverá a participação do assistente ���G�^��G�I�����I���G���� ��� ��I�����GhÔ�9�����9�G�\�� ���bI������G �I���G�9��������9������������9� famílias homoafetivas, cada vez mais comuns técnico, que como veremos adiante, de acordo com a Resolução 8/2010, em seu artigo 2º, não poderá partici- par dos procedimentos da perícia. Ele poderá ter reunião com o perito e con- testar seu laudo posteriormente atra- vés do Parecer2. Importante que o perito tenha acesso aos documentos dos autos. Nas entrevistas, é igualmente relevante ob- ter dados da história de vida de cada um e o histórico da demanda judicial. Fundamental que não se tirem conclu- sões apenas com a leitura dos autos. Isso é difícil, porém profissional e éti- co. Testes e entrevistas são utilizados. Visitas a residências e escolas são im- portantes, bem como entrevistas com profissionais e familiares envolvidos. Tudo com o objetivo de alcançar uma visão mais ampla possível do conf lito e da dinâmica em questão. Após ter colhido informações que entenda como suficientes para respon- www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 31 A resolução veda também, em seu artigo 10, ao psicólogo que esteja atu- ando como psicoterapeuta das partes envolvidas no litígio: I - Atuar como perito ou assistente técnico de pesso- as atendidas por ele e/ou de terceiros envolvidos na mesma situação litigio- sa; II - Produzir documentos advin- dos do processo psicoterápico com a finalidade de fornecer informações à instância judicial acerca das pessoas atendidas, sem o consentimento for- mal dessas últimas, à exceção de de- clarações, conforme a Resolução CFP nº 7/2003. Consentimento Quando a pessoa atendida for criança, adolescente ou interdi- to, o consentimento formal referido no caput deve ser dado por pelo menos um dos responsáveis legais. Sobre o laudo pericial, o CFP, através, ainda, do documento “Referências técnicas para a atuação do psicólogo em Varas de Família”, acrescenta que o psicólogo registrará apenas as informações ne- cessárias para o cumprimento dos ob- jetivos do trabalho. Portanto, essas são conclusões psicológicas e não jurídi- cas, não sendo atribuição de psicólogos proferir sentenças ou soluções jurídi- cas. O psicólogo não poderá se tornar um “pequeno juiz ou um juiz oculto”. O cuidado com a exposição excessiva deve ser tomado. Não há a necessida- de de reproduzir em relatórios, laudos ou pareceres frases ditas pelos sujeitos. Porém, no que diz respeito às normas éticas, indica-se que o psicólogo não tem o direito de colher informações do cliente e, depois, se negar a conversar com a pessoa atendida sobre as conclu- sões a que chegou. Entrevistas de devo- lução fazem parte das tarefas e obriga- ções dos psicólogos. Enfim, a tarefa de atuar como psi- cólogo na função pericial é difícil no sentido do estabelecimento de limites para a própria atuação: não ser juiz, não ser advogado, não ser o acusador e REFERÊNCIAS Calçada, A. S.; Cavaggioni, A.; Neri, L. Falsas acusações de abuso sexual – o outro lado da história. Rio de Janeiro: OR Editora, 2000. Calçada, A. S. Falsas acusações de abuso sexual e a implantação de falsas memórias. São Paulo: Editora Equilíbrio, 2008. . Perdas irreparáveis – alienação parental e falsas acusações de abuso sexual. Rio de Janeiro: Editora Publit, 2014. . Falsas acusações de abuso sexual – a perícia social e psicológica no Direito de Família. In: Freitas, P. D.; Javorski, J., p. 212-248. Florianópolis: Editora Voxlegem, 2015. Silva, E. L. Perícias psicológicas nas Varas de Família – a perícia social e psicológica no Direito de Família. In: Freitas, P. D.; Javorski, J., p. 183-211. Florianópolis: Editora Voxlegem, 2015. BRASIL. Resolução 7/2003 do Conselho Federal de Psicologia, www.pol.org.br, acesso em: 2 fev. 2016. BRASIL. Resolução 8/2010 do Conselho Federal de Psicologia, www.pol.org.br, acesso em: 2 fev. 2016. BRASIL. “Referências técnicas para a atuação do psicólogo em Varas de Família”, Conselho Federal de Psicologia, www.pol.org.br, acesso em: 2 fev. 2016. não ser o psicólogo clínico. Importante separar, após a avaliação das personali- dades e dinâmicas familiares, o que se 1 Entenda-se por quesitos as perguntas formuladas pelo juiz, promotor e pelas partes assessoradas pelo assistente técnico. Os quesitos são de extrema importância, pois nortearão a investigação pericial, já que o perito necessitará respondê-los. 2 O Parecer Psicológico é um documento fundamentado e resumido sobre uma questão focal do campo psicológico cujo resultado pode ser indicativo ou conclusivo. O parecer tem como finalidade apresentar resposta esclarecedora, no campo do conhecimento psicológico, através de uma avaliação especializada, de uma “questão-problema”, visando dirimir dúvidas que estão interferindo na decisão, sendo, portanto, uma resposta a uma consulta, que exige de quem responde competência no assunto. A discussão do Parecer Psicológico constitui a análise minuciosa da questão explanada e argumentada com base nos fundamentos necessários existentes, seja na ética, na técnica ou no corpo conceitual da ciência psicológica. Nessa parte, deve respeitar as normas de referência de trabalhos científicos para suas citações e informações (Resolução 7/2003 CFP). 3 O relatório ou laudo psicológico é uma apresentação descritiva acerca de situações e/ou condições psicológicas e suas determinações históricas, sociais, políticas e culturais pesquisadas no processo de avaliação psicológica. Como todo docu- mento, deve ser subsidiado em dados colhidos e analisados, à luz de um instrumental técnico (entrevistas, dinâmicas, testes psicológicos, observação, exame psíquico,intervenção verbal), consubstanciado em referencial técnico-filosófico e cientí- fico adotado pelo psicólogo. A finalidade do relatório psicológico será apresentar os procedimentos e conclusões gerados pelo processo da avaliação psicológica, relatando sobre o encaminhamento, as intervenções, o diagnóstico, o prognóstico e evolução do caso, orientação e sugestão de projeto terapêutico, bem como, caso necessário, solicitação de acompanhamento psicológico, limitando-se a fornecer somente as informações necessárias relacionadas à demanda, solicitação ou petição. *���^�I������������G�����������Ô��G������ ����H ����� G���������GhÔ�����I��`��IG9�G�\�� �����G �� ���I���G�� ����G�����G�������IGh������I�� G ��I���������� faz necessário e útil para a melhora na qualidade de vida das pessoas envolvi- das em litígios familiares. 32 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br coaching por Eduardo Shinyashiki ALTO! DESDE A CONCEPÇÃO DA VIDA E EM TODAS AS SUAS FASES SUPERAMOS INÚMERAS BARREIRAS, SENDO NECESSÁRIO ENTENDER QUE CONTRATEMPOS E DIFICULDADES SEMPRE EXISTIRÃO D esde a Pré-história os seres humanos enfrentam proble- mas, superam obstáculos e lidam com as adversidades diariamente, mesmo que sejam de for- mas diversas. Porém, é possível notar que muitas pessoas não conseguem enfrentar essas situações de modo natural. Já ou- tras tiram de letra. Quase sempre as pessoas que têm mais resistência em atravessar situações difíceis estão presas apenas ao lado ne- gativo do problema e não conseguem visualizar outros prismas de uma mesma questão, se diminuindo perante as adver- sidades, deixando aquele obstáculo ditar suas ações e, muitas vezes, sua própria vida. Nesse momento, elas se tornam vítimas desses problemas e assumem o compromisso de impotência perante os fatos. Mas observe a contradição: ao mes- mo tempo em que elas esperam e pedem por uma solução, continuam olhando so- mente para um lado do problema, ou seja, para o lado oposto da solução desejada. Se não soubermos lidar com as adver- sidades que aparecem em nosso caminho acabamos dando força aos sentimentos NEGATIVOS� E� ELES�lCAM�SEMPRE�PRESENTES� na nossa vida. Mesmo que eles sejam dei- xados de lado, se não forem resolvidos voltarão com frequência no nosso dia a dia, muitas vezes com padrões repetiti- vos ou disfarçados com outras questões. Dessa forma, alimentamos a ansiedade, a RAIVA��A�TRISTEZA��A�FALTA�DE�CONlAN¥A�n�EM� NØS�� NOS� OUTROS� E� NA� VIDA� n�� A� INSATISFA- ção, o estresse, a desmotivação, a baixa autoestima, a falta de controle da nossa própria vida, entre muitos outros senti- mentos e crenças limitantes. 1UANDO� REmETIMOS� SOBRE� UMA� SITU- A¥ÎO� CONmITANTE� JÉ� VIVENCIADA� PODEMOS� PERCEBER� QUE� DIlCILMENTE� CONSEGUIMOS� olhar para as adversidades sob uma se- gunda óptica, mas focamos somente nos aspectos ruins, sem ao menos tentar en- xergar o lado positivo delas. Por exemplo, ao receber uma advertência do líder por queda de resultados (situação adversa), você provavelmente irá buscar novas VOEVOE www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 33 estratégias para alavancar os números, ALÏM�DE�lCAR�MAIS�ATENTO�AO�ATINGIMEN- to de metas (lado bom). Quantas vezes, após algum problema ser resolvido, você já pensou: “Ainda bem que isso aconte- ceu, assim pude ter a oportunidade de co- nhecer tal coisa ou pessoa”, e por aí vai. Sempre haverá um lado bom, seja em cir- cunstâncias mais simples ou complexas. Os problemas estarão sempre pre- sentes em nossa vida, porém a forma de perceber e lidar com eles poderá fazer toda a diferença. Parafraseando Fer- nando Pessoa, “ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um au- tor da própria história. É saber falar de si mesmo. É não ter medo dos próprios sentimentos”. O primeiro passo para se livrar de uma adversidade é aceitar e en- tender qual é a mensagem de mudança que ela nos passa. Não podemos permitir que um obstá- culo nos coloque como vítima ou que fa- çamos autoquestionamentos do tipo “por que eu?”, “por que isso só acontece comi- go?”, entre muitos outros pensamentos que nos paralisam. Reconheça as opor- tunidades de crescimento, sabedoria e de evolução que existem em nossa trajetória. Experimente ter uma visão ampla, que abranja todo o contexto. Muitas ve- zes, achamos que para quem está de fora da situação é muito mais fácil achar uma solução, e estamos certos em relação a isso, pois o outro tem uma visão do todo, facilitando o seu entendimento. Portanto, permita-se contemplar por algum instan- TE�AQUILO�QUE�O�AmIGE��CONHE¥A�E�COMPRE- enda a mensagem que aquele problema lhe passa. Quando mudamos o ponto de vista, vemos o mesmo problema com ou- tra perspectiva. Se mesmo assim sentir DIlCULDADE�EM�ENXERGAR�O� LADO�POSITIVO� de tal questão, se coloque na posição de observador e imagine alguém que você IM AG EM : S HU TT ER ST OC K / A CE RV O PE SS OA L Eduardo Shinyashiki é palestrante, consultor organizacional, especialista em Desenvolvimento das Competências de Liderança e Preparação de Equipes. É presidente do Instituto Eduardo Shinyashiki e também escritor e autor de importantes livros como Transforme seus Sonhos em Vida (Editora Gente), sua publicação mais recente. www.edushin.com.br O PRIMEIRO PASSO PARA SE LIVRAR DE UMA ADVERSIDADE É ACEITAR E ENTENDER QUAL É A MENSAGEM DE MUDANÇA QUE ELA NOS PASSA. RECONHEÇA AS OPORTUNIDADES DE CRESCIMENTO, SABEDORIA E DE EVOLUÇÃO QUE EXISTEM EM CADA TRAJETÓRIA admira muito no seu lugar e, assim, con- seguirá visualizar qual é a ação que essa pessoa teria. Dessa forma, é possível ob- ter uma visão mais clara e ajustar o foco para encontrar soluções criativas, que nos levarão ao sucesso desejado. #ADA�DESAlO� E� CADA�DIlCULDADE�QUE� se enfrenta na vida servem para fortalecer A�FOR¥A�DE�VONTADE��CONlAN¥A�E�CAPACIDA- de de vencer os obstáculos futuros com êxito, assertividade, prosperidade e muita felicidade. Esses impedimentos que sur- gem no decorrer da estrada serão sempre sinônimos de superação, portanto fazem parte da trajetória e do crescimento pes- SOAL�E�PROlSSIONAL�� Ter a coragem de olhar o mundo e a sua própria realidade de outros pontos de vista é maravilhoso e libertador. Voe alto, enxergue novos horizon- tes! Assim você perceberá que o mundo Ï�UM�ESPA¥O�DE� INlNITAS�POSSIBILIDADES� e um cenário onde você mesmo pode CRIAR� O� ROTEIRO� QUE� QUISER�� COM� O� lNAL� feliz que desejar! ANÚNCIO 1/3 34 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br IM AG EN S: D IV UL GA Çà O Da redação Questões sobre Psiquiatria Forense (Perícia na Psicologia Jurídica) O livro Perícia na Psiquiatria Forense, do especialista Guido Arturo Palomba, tem como objetivo fa- cilitar a compreensão dessa área da Medicina pouco explorada e levar informação prática e simples para advogados, juízes, delegados, médicos e psiquiatras. Organizado em perguntas e respostas, trata das principais questões da Psiquiatria Forense, abordando a atuação na área civil e criminal, bem como o seu crescimento histórico. A obra tangencia aspectos como elaborar um laudo e preencher quesitos; inclina-se ao setor mais técnico como perícia retrospectiva, interdição, guarda de menores, alienação parental, anulação de testamentos, orienta como fazer a perícia nesses casos e em quais pontos basear-se. Insere o teor criminal, explica o que é periculosidade e os limites da menor idade, entre outros fundamentos. Apesar de seu foco estar voltado aos que fazem parte da intersecção entre Direito e Medicina, o púbico leigo também pode apreendermuito – sobretudo aqueles que passam por processo de guarda de menor ou anulação de casamento, por exemplo. Perícia na Psiquiatria Forense Autor: Guido Arturo Palomba Editora: Saraiva Páginas: 244 Os mistérios do cérebro e a Matemática (Neurobiologia e educação) !�.EUROCIÐNCIA�COM�O�OLHAR�DIFERENCIADO�DOS�PROlSSIONAIS�DA�EDUCA¥ÎO� INFANTIL��DO�ENSINO� FUNDA- mental e até mesmo da clínica é abordada no livro A Neuciência na Sala de Aula – uma Abordagem Neurobiológica, QUE�ENFATIZA�A�IMPORTÊNCIA�DOS�PROlSSIONAIS�DE�EDUCA¥ÎO�ADENTRAREM�NESSE�MUNDO�DA� Neurobiologia, fazendo com que, por meio da sala de aula e das atividades lúdicas, eles possam faci- litar o processo de aprendizagem da criança. Por meio de atividades lúdicas, advindas da psicomotricidade e do conhecimento básico do sistema nervoso central, o professor irá oferecer novas sinapses para que sejam disparadas e a plasticidade ACONTE¥A��/�LIVRO�TAMBÏM�OFERECE�VALIOSAS�INFORMA¥ÜES�SOBRE�O�AUTISMO��O�DESAlO�DO�NOVO�SÏCULO��E� como entender a sexualidade de pessoas com necessidades especiais, escritas por autores portugueses. A Neuciência na Sala de Aula – uma Abordagem Neurobiológica Organizadora: Marilza Delduque Editora: Wak Páginas: 152 Distúrbio de personalidade (romance e doença mental) Nas Fronteiras de Alice, livro escrito por Marcelo Siqueira, discute como é possível reencontrar o amor, transcendendo questões como idade, doenças mentais e ética. A obra aborda os complexos temas do transtorno de personalidade e do adultério entre um professor e uma aluna, porém man- tendo a narrativa repleta de amor e suspense. Nesse relacionamento, cada um será exposto às suas fraquezas e aos seus desejos mais íntimos, provocando comentários e incompreensões de pessoas próximas, principalmente na questão das múltiplas personalidades. Divertida em alguns momentos e intensa em outros, a narrativa transmite para o leitor sensações de nostalgia, erotismo, paixão e cumplicidade, além de abordar a doença mental como pano de fundo. Nas Fronteiras de Alice Autor: Marcelo Nogueira Editora: Pandorga Páginas: 238 livros www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 35 P sic o lo g ia n o e sp o rte Hoje, há consenso sobre a influência do desempenho mental na atuação dos competidores de alto nível, mas o equilíbrio emocional é determinante também para o sucesso pessoal d o s s i ê P sic o lo g ia n o e sp o rte PSICOLOGIA NA PRÁTICA DO ESPORTE SH UT TE RS TO CK d o s s i ê 36 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br O esporte é um dos prin-cipais fenômenos socio-culturais desde a Grécia Antiga. Hoje, certamen- te, muitos atletas são referência para pessoas que nem sempre são espor- tistas, mas simpatizam com filosofias que o esporte carrega como foco, aten- ção, determinação, superação, entre outros. A grande maioria dos atletas medalhistas, por exemplo, se tornam ídolos e até popularizam esportes an- tes não tão admirados, como aconte- ceu com Gustavo Kuerten na época em que se tornou o melhor tenista do mundo e também o espelho até mes- mo para crianças, que trocaram a ado- ração pelo futebol por essa modalida- de. Mas Guga é só um dos exemplos. O esporte brasileiro – e mundial – tem muitos outros atletas modelos. Porém, há casos conhecidos em que o esportista apresenta seu me- lhor momento físico, técnico e tático, entretanto, por diversos fatores, não trabalha bem seu aspecto emocional e este é, sem dúvida, o grande dife- rencial nas competições. Aquele que estiver preparado psicologicamente O aspecto emocional é o grande diferencial para que os atletas consigam se destacar, mas não são restritos aos competidores. O treinamento psicológico traz benefícios para todos Para uma boa PERFORMANCE na vida terá resultados melhores. Há inúme- ras variáveis que podem influenciar positiva ou negativamente a atuação de um atleta ou da equipe. Todos os competidores, desde os grandes favo- ritos aos iniciantes, sofrem influên- cias, e as pessoas mais equilibradas emocionalmente, naqueles momen- tos decisivos, é que se consagrarão. E essa lógica serve para a vida também, seja no campo pessoal, profissional, em família etc. Voltando ao esporte, podemos dizer que esta não é ciência exata; ele é sempre executado por humanos Por Rodrigo Scialfa Falcão Rodrigo Scialfa Falcão é psicólogo formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre ��� ���������G�G� �����hÔ�� �������������G�/��������G��*H���G� G��G�G����G¤/���I�:� Especialista em Psicologia do Esporte pelo Instituto Sedes Sapientiae. Psicólogo clínico com especialização em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP. O comportamento mental, comprovadamente, �����I�G� ���G����G� ������G�G��������G�I�� ��G���\�������G������P��G� G��� G:� ���� ��� G������\���������G ������������ �Psicologia do Esporte deve se adaptar Cada modalidade esportiva tem suas peculiaridades, sua cultura e seu uni- verso, e a Psicologia do Esporte deve se adaptar a essas situações, pois as modalidades são diferentes umas das outras, assim como as capacidades físicas, técnicas e táticas são distintas de um esporte para outro. Isso também acontece com a preparação psicoló- gica. Os recursos necessários para um bom desempenho de maratonistas são diferentes dos recursos dos esgrimis- tas, que são também diferentes dos jo- gadores de handebol. Nas modalidades coletivas, algumas responsabilidades podem ser partilhadas. Isso não acon- tece em modalidades individuais, onde todo o desempenho atlético é fruto do comportamento de uma pessoa. www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 37 P sic o lo g ia n o e sp o rte SH UT TE ST OC K e, por isso mesmo, a imprevisibili- dade está presente nos ginásios, nas piscinas, nas pistas, nos campos. O comportamento mental, comprova- damente, influencia de maneira defi- nitiva a performance de alguém em qualquer área da vida, que dirá nas competições esportivas. Nossa pai- xão nacional, o futebol, nos mostrou de forma dolorosa, como um desfecho mal elaborado pode desestabilizar 11 homens em menos de 15 minutos. E afetou também o equilíbrio emocio- nal de uma legião de torcedores. Foi a partir desse evento, na Copa do Mundo sediada no Brasil, com os “donos da casa” derrotados por um placar vergonhoso, que vimos crescer o debate sobre a atuação de psicólo- gos esportivos, uma área bem reco- nhecida em outros países, mas que ainda é pouco explorada no Brasil. De modo geral, todos sabem da im- portância da prevenção psicológica no esporte, porém, na prática, poucas equipes efetivamente preparam seus atletas devidamente. *������^H�������I���G��\�������G���� ��� �����G��P��G�� G��� G9� ���\�9���������I����I�� �� ���G���� G����GhÔ�9�������G��� ���I��`��I�������������G�� G�\� ���I��������G �������G��� ESTÍMULO ÀS HABILIDADES PSICOLÓGICAS PARA SABER MAIS Segundo Rudik (1990), o rendimento esportivo máximo é alcançado quando os atletas atingem uma forma esportiva caracterizada por vários aspectos, entre eles: melhora da atividade total da consciência, aumentando a velocidade das reações motoras; processos de percepção produzidos com rapidez, tornan- �¢����G���I�G�������IG���e�G������� G�G���hÔ�9�������G� ��G�IG�GI� G �� �� distribuí-la ou concentrá-la, elevando também a capacidade de alterar rapida- mente o foco de atenção de um objeto para outro; aumento da capacidade de ��G���G�������h��������������P�����9� G�I��G�hG������G����`���G�����hG���� G� vontade de vencer. Balague (2001) coloca que cada fase do treinamentotem requisitos psicológi- cos diferentes e, por isso, para que se obtenha um ótimo rendimento é necessá- rio que as habilidades psicológicas sejam estimuladas e desenvolvidas conjunta- mente com as capacidades físicas e as habilidades técnicas e táticas. Para Korsakas e Marques (2005), “se a periodização compreende o planeja- mento do treinamento esportivo, quando se fala sobre a preparação psicológica integrada aos outros processos desse treinamento, não poderíamos tratá-la de forma diferente. Basicamente por dois motivos: o primeiro pela necessidade de combinar a preparação do atleta considerando-o como uma totalidade, que atu- ará empregando todo o seu potencial (aspectos físicos, técnicos, táticos e psi- cológicos) na busca dos objetivos da competição; o segundo pela necessidade de utilizar a preparação psicológica adequadamente, sem acreditar que palestras �����GI���G��9���������I������G�9� ����G G�����9��� ���G�� G��I���G� ����G� preparação com qualidade”. d o s s i ê 38 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br É nítido e incontestável que o desempenho e a prepa-ração mental são fato-res fundamentais para a obtenção do sucesso na atuação do esportista de alto rendimento. No entanto, essas conquistas precisam ficar restritas apenas ao esporte. Existem algumas habilidades psico- lógicas que devem ser seguidas por esses competidores, e pessoas foca- das em alcançar o sucesso. Equilíbrio emocional Os esportes competitivos talvez sejam um dos poucos fenô- menos sociais em que as emoções oscilam abruptamente. Se nos es- pectadores é comum, imagine nos atletas. Desenvolver o equilíbrio emocional é fundamental para qualquer pessoa. No esporte ele chega a ser primordial, pois um Desempenho mental e preparação emocional são aspectos imprescindíveis para a conquista de vitórias no esporte, mas alguns requisitos podem ser aproveitados também na vida pessoal e profissional HABILIDADES psicológicas devem SER SEGUIDAS erro pode ocasionar uma avalan- che de sentimentos negativos e le- var à derrota. Saber retornar desses momentos (frequentes) dos jogos e competições é uma habilidade que pode ser diferencial para uma deci- são e até para a carreira de qualquer atleta. A tensão exacerbada propor- ciona emoções negativas, como raiva, frustração e medo. Como consequência, podem desencadear problemas durante a atuação, in- cluindo a tensão muscular e desvio de concentração, que propicia dis- trações, lentidão de raciocínio na execução de golpes, movimentos lentos, entre outros. Concentração É comum ouvir alguém dizendo “Concentre-se”, “Foco”. No es- porte, estar concentrado é um dos aspectos importantes para o bom rendimento. A concentração é um tipo de percepção. A percepção é basicamente uma capacidade cog- nitiva, que faz reconhecer o mundo ao redor através dos sentidos (visão, tato, olfato, audição, paladar). Por- tanto, para perceber alguns eventos que nos cercam, o cérebro utiliza diferentes tipos de atenção. O ambiente está cercado por vários estímulos que aguçam a per- cepção, e a atenção seleciona e co- difica alguns deles que interessam no momento. Quando se foca em poucos estímulos, utiliza-se a con- centração – que nada mais é do que prestar mais atenção naquilo que é relevante naquele determinado mo- mento. Ou seja, no adversário, nos pensamentos e nas sensações cor- porais. Quando se ouve alguém fa- lar de foco, é preciso lembrar de um feixe de luz iluminando um local escuro. A falta de concentração em determinados momentos de uma competição é uma das queixas mais frequentes que os psicólogos do es- porte têm de lidar no seu trabalho. Por Rodrigo Scialfa Falcão Rodrigo Scialfa Falcão é psicólogo formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre ��� ���������G�G� �����hÔ�� �������������G�/��������G��*H���G� G��G�G����G¤/���I�:� Especialista em Psicologia do Esporte pelo Instituto Sedes Sapientiae. Psicólogo clínico com especialização em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP. www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 39 P s ic o lo g ia n o e s p o rte SH UT TE RS TO CK Estar concentrado é uma habilidade psicológica muito importante para qualquer atleta, porém pode haver níveis diferentes de concentração, dependendo da situação exigida na competição. Por exemplo, para um pivô no basquete e um atleta de tiro esportivo as exigências são muito distintas. Durante uma competi- ção, a concentração pode ser deter- minante para o resultado. Tolerância à frustração As derrotas podem ensinar mais do que as vitórias. Pouco tem- po atrás, o tenista Novak Djokovic era um coadjuvante em relação a Rafael Nadal e Roger Federer. Em diversas entrevistas, ele disse que aprendeu muito com as suas derro- tas. Esse foi seu principal combus- tível para se desenvolver, estudar os seus erros e obter a confiança para perseverar. Alguns adversários são mais do que simplesmente rivais, eles podem proporcionar indireta- mente as condições para a evolução de um atleta. Se a derrota equivale ao fracasso, nunca se ganhará a ba- talha da confiança com esse tipo de crença (Rolo e Haan, 2009). Desempenho sob pressão Controlar a ansiedade nos mo-mentos mais difíceis é com- portamento típico que ocorre durante as competições e que, na- turalmente, põe pressão em quem está atuando. Todo atleta, antes do início de uma partida, sente-se ansioso, agitado, apreensivo de que possa acontecer algo inesperado. Não é adequado que essas sensações cresçam e se tornem amedrontado- ras a ponto de não conseguirem realizar plenamente suas capacida- des. Aceitar que a ansiedade é ine- vitável na competição e saber que pode lidar com ela são habilidades essenciais para recuperar o controle Um erro pode ocasionar uma avalanche de sentimentos negativos e levar à derrota. Saber retornar desses momentos, que são frequentes, dos jogos é uma habilidade que pode ser diferencial para uma decisão e até para a carreira de qualquer atleta ���G��G� ��I��I����GhÔ����� �������G ������������ ����G�I������hÔ��\���G� G�������G���G������������������������I`������ �� ���������È�� ���� G�����������GHG��� d o s s i ê 40 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br A percepção é basicamente uma capacidade cognitiva, que faz reconhecer o mundo ao redor através dos sentidos (visão, tato, olfato, audição, paladar). Portanto, para perceber alguns eventos que nos cercam, o cérebro utiliza diferentes tipos de atenção vida. Na resiliência, a motivação é componente primordial de todo o processo de superação. Autoconfiança Confiar em si mesmo e na equi-pe é uma habilidade que deve ser desenvolvida. Quem não a pos- sui dificilmente consegue se dar bem no esporte competitivo. Au- toconfiança é diferente de sober- ba; é entender que o atleta possui qualidades e também limitações, é saber utilizar as qualidades nos momentos negativos e trabalhar as limitações nos treinos. Assim como saber perder, apren- der com as derrotas é uma lição im- portante, valorizar e usufruir das vi- tórias também é um comportamento que estimula a autoconfiança. Nos momentos de crise e adversidade é necessário se lembrar das sensações da vitória, do prazer proporcionado ao conseguir um objetivo. Pensar positivo, ter uma atitu- de positiva, verbalizar coisas po- sitivas são fatores tão importantes em treino quanto em competição. Essas ações repercutem no corpo, deixando-o mais relaxado e equi- librado para executar os movimen- tos necessários (Samulski, 2008). Corpo e mente estão interligados e, por isso, as atitudes negativas tam- bém ref letem em nossos músculos. Como consequência, entre outrosaspectos, ocorrem desequilíbrio e diminuição da performance. Em competição, quanto mais enfrentam adversidades, mais po- sitivos têm que ser para construir psicológico na sequência de aconte- cimentos inesperados ou distrações (Samulski, 2008). Superar o medo – ele é uma emoção natural do ser humano e pode ser controlado. O psicólogo do esporte cana- dense, Garry Martin, ensina que, para eficácia dos aspectos psicoló- gicos – quando eles são transferidos para o ambiente das competições –, os treinos devem ser o mais se- melhante possível às exigências durante o torneio. É importante treinar taticamente, mas deve ser dado tempo para treinar questões mentais. Como isso pode ser feito? Simulando condições típicas com- petitivas, treinos mais intensos, com jogadores sendo mais agressi- vos, atletas realizando funções di- ferentes das habituais, com torcida a favor ou contra, com ruído e som alto, com placares adversos etc. Na preparação para os Jogos Olímpi- cos de Pequim 2008, a equipe de badminton chinesa utilizou muitos treinos simulados, principalmente com o ginásio lotado, para ensinar aos seus atletas como lidar com a pressão da torcida e a adversidade de um jogo, já que esse esporte é um dos mais populares na China. Por- tanto, a pressão pelo ouro olímpico seria inevitável. Os atletas chineses não decepcionaram: levaram todos os ouros da modalidade. Mesmo os grandes gênios do esporte, em algum momento da car- reira, tiveram obstáculos e percalços e precisaram se superar para recon- duzir sua trajetória. Essa caracterís- tica é chamada de resiliência, termo que, assim como a palavra estresse, vem da Física, e a Psicologia em- prega para designar o indivíduo que consegue ultrapassar grandes adversidades, resistir às pressões e, com muito esforço, reconduzir a sua �Modalidade mental O tênis é considerado uma modalida- de esportiva na qual a parte mental é uma de suas principais armas. Neste cenário, o sérvio Novak Djokovic vem se consolidando como principal des- taque. O número 1 do ranking mundial admite que investe no fator psicológi- co, fazendo uso de uma “abordagem holística”, como ele mesmo define, que ��I���� G� ��P��IG� ���� ��GhÔ�� �� ���G9� além, é claro, de hábitos alimentares específicos e treinamento intensivo. *� ��G ��� ��G� ���������b���G�������� ��G���������G�IG�����G9���� ������������� �� �����GhÔ�� �G���� G��G ����� G ��d�\���������� I�G�G� ��������È�I�G www.portalcienciaevida.com.br P sic o lo g ia n o e sp o rte 41 O psicólogo do esporte Garry Martin ensina ���9��G�G��IPI�G� ��� aspectos psicológicos, os treinos devem ser semelhantes às exigências do torneio. É importante treinar taticamente, mas deve ser dado tempo para treinar questões mentais de esforço, por exemplo: ter uma boa atitude durante o jogo; manter- -se confiante nos momentos difí- ceis; usar a agressividade positiva- mente sem deslealdade. Esse tipo de meta é mais fácil de executar, depende exclusivamente do indiví- duo. As metas por resultados (ga- nhar um torneio, chegar às quartas de final, golear um adversário, por exemplo) são mais complexas de se atingir, pois não dependem funda- mentalmente do indivíduo, mas de outras variáveis que não podem ser IMAG EN S: S HU TT ER ST OC K confiança e autoestima. A confian- ça está relacionada diretamente ao êxito percebido. Então, muitas ve- zes os atletas só acham relevantes as vitórias, quando o mais importante é a atitude durante a competição. Ou seja, há jogos que se vence jo- gando mal e outros que se é derro- tado jogando bem (Gallwey, 2004). Motivação É possível definir motivação basi-camente como os motivos que levam às ações em busca das metas em todos os aspectos da vida. Pode ser exemplificada também como a direção e a intensidade dos esforços. Motivação é uma “energia psicoló- gica” que faz com que a pessoa se comporte de determinadas maneiras. Para saber o que motiva é imprescin- dível ter autoconhecimento. Portan- to, quando se fala em motivação não existe “receita de bolo”, pois ela é pessoal, individual e exclusiva. Não há motivação sem busca por metas. Segundo Samulski (2008), as metas podem tornar os sonhos e DESEMPENHOS FÍSICO E MENTAL PARA SABER MAIS E studar os comportamentos de todos que estão, de alguma forma, envol- vidos no universo esportivo e de exercícios físicos é o objetivo central da +��I�����G� �� ������:�+G�G�����9�����������G��������� � �IG�O� ��I�����G����I��G� entender de que forma os fatores mentais interferem no desempenho físico, além de compreender como a participação nessas atividades afeta o desenvol- vimento emocional, a saúde e o bem-estar de uma pessoa que atua nesse am- biente. A Psicologia do Esporte é uma ciência relativamente nova, que tem pres- tado relevantes serviços para a otimização da performance de atletas e equipes. Oferecer aos esportistas de alto rendimento apoio psicológico é tão importante quanto proporcionar uma alimentação saudável e balanceada, programada por um nutricionista. Isso porque o corpo físico e o mental são duas faces da mesma ��� G ��������I������G��G���hÔ�:���������hG���������G���G����������������P� relacionada aos esportes de alto rendimento. Entretanto, outras áreas de atuação podem ser exploradas: práticas de tempo livre (atividade física como manuten- ção da saúde); esporte escolar (cuidar da relação do praticante com o ambiente escolar); iniciação esportiva (crianças e jovens envolvidos em atividades peda- gógicas e esportivas) e reabilitação (recuperação psicológica de lesões). *�����G�����������������G����HG���GhÔ�� ��I���G���������G���Ô��������G����9� P�������I�������G� ���������Ô����������G ����9���������9�G��G���� ������G���G���G�H\��������������������b�I���� ambições profissionais palpáveis, desde que se faça algo para alcan- çá-los. É preferível, do ponto de vista psicológico, que se pretenda alcançar metas de atuação em vez de resultados. As metas de atuação podem ser controladas. Os resulta- dos, não. As metas de atuação são d o s s i ê 42 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br ���G�������������� e na equipe é uma habilidade que deve ser desenvolvida. Quem não a possui �I��������I�������� se dar bem no esporte competitivo. ����I��G�hG�\� diferente de soberba; é entender que o atleta possui qualidades e também limitações pensamentos sejam negativos com relação a si mesmo. É importante os atletas desen- volverem um repertório grande de variação de jogadas e ter paciência para colocá-las em prática nos mo- mentos adequados. Nem sempre o estilo de jogo de uma equipe irá se en- caixar com o do adversário. Ter cora- gem de arriscar pode ser fundamental quando estiver numa situação como essa. Jogar com simplicidade também ajuda. Inteligência não é sinônimo de belas jogadas. Em muitos momentos, fazer o básico para marcar um ponto pode ser a estratégia mais adequada. Disciplina Habilidade e talento, por si só, não são os únicos requi- sitos para uma carreira vitoriosa. É necessário ter muita disciplina. Michael Jordan disse certa vez que 90% são transpiração, e 10%, ins- piração. Pelé, frequentemente, co- menta que, após as rotinas diárias, ele ficava mais tempo treinando faltas com a sua perna esquerda (ele é destro) e cabeceio (que ele dizia ser seu pior fundamento). seus pontos fracos (deixe isso para os treinos). Devem pensar nos pon- tos positivos de seu jogo, tendo por base os pontos fortes, ou seja, abusar de suas jogadas de confiança. Quan- to mais positivo for durante a com- petição, melhor, mesmo que seus UM FENÔMENO PSICOLÓGICOPARA SABER MAIS Rei do Futebol e Atleta do Século são alguns dos inúmeros adjetivos uti-���G ����G�G� ��������G�������G�G�������H��� �� ������G����� ��)G�I�- mento, o Pelé. Colecionador de títulos e recordes, ele, hoje com 75 anos, além de ser conhecido em todo o planeta, é unanimidade quando se fala no melhor jogador de todos os tempos. Contudo, não são apenas os fatores físicos e técnicos que pesaram na vitoriosa carreira do ídolo. Psicologica- mente, Pelé também era um craque. Quem atesta a tese é Tostão, também ex-jogador e seu companheiro de equipe na seleção brasileira, campeão ��� �G�� ���(\��I�9� ��� <DB;:� )�� G��� ������� I��������� B;� G���9�.���Ô�9� que é médico, homenageou o Rei em sua coluna publicada no jornal Folha de S.Paulo. Em um dos trechos, ele disse: “Do ponto de vista psicológico, Pelé também era um fenômeno, seus níveis de concentração, atenção e ati- vação eram extremos. Possuía um grande equilíbrio emocional e controle da ansiedade. Sabia o momento exato de canalizar sua raiva e agressividade. Ele não se abalava com os adversários e adversidades e se motivava ainda mais I��������G� ��� ��G��:�+��\� �������G����G���������G�I���I�È�I�G� ����G�� habilidades e treinava as mesmas exaustivamente, era um perfeccionista. Por um conjunto complexo de fatores (biológicos, genéticos, psicológicos, cog- nitivos, intelectuais e ambientais) Pelé é o Rei do Futebol”, conclui. controladas e a probabilidade de frustração é muito alta. Respeito Respeitar o adversário, as regras do jogo, o fair play, o ambiente competitivo, os horários das parti- das, os árbitros, assistentes e cola- boradores deve ser uma obrigação para qualquer atleta. Ser leal com seus adversários e com o público que está prestigiando. O respeito, mais do que uma habilidade, é um valor moral. Os atletas são pessoas que têm o poder de influenciar a conduta de crianças e jovens e nem sempre compreendem esse papel que exercem na sociedade. Inteligência tática Saber ler as nuances do jogo do adversário, seus pontos fortes e fracos, e utilizar estratégias para mi- nimizar as jogadas dele. Isso é inte- ligência tática. Em competições, os jogadores deveriam evitar focar em +G�G�I�����������G�IG�����G���������G��Ô�� HG��G������GH��� G �����G�����:�*������ �� HG������9�(�I�G���%�� G�9� ���������D;Ú��Ô�� ��G�����GhÔ�9���<;Ú9�������GhÔ� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 43 P s ic o lo g ia n o e s p o rte Motivação é uma “energia psicológica” que faz com que a pessoa se comporte de determinadas maneiras. Portanto, quando se fala em motivação não existe “receita de bolo”, pois ela é pessoal, individual e exclusiva Treinar com intensidade, cuidar da alimentação e dormir bem são fundamentais para qualquer atleta. O treinamento esportivo nada mais é do que repetição de exercícios. Espírito de luta Há um estudo que diz que, para ser especialista em qualquer área, são necessárias 10 mil horas de prática. Portanto, isso leva anos para ser adquirido. Infelizmente, algumas coisas terão de ser deixadas de lado em algum momento na carreira esportiva. Às vezes, o lazer, a convivência com os amigos e até com familiares. Porém, todos os seres humanos ne- cessitam de momentos de relaxa- mento e de descanso (físico e men- tal). Entregar-se a eles faz parte de uma atitude disciplinada. Desligar do esporte nessas ocasiões e apro- veitar para fazer algo que não faz com tanta frequência. de intensidade elevada e de energia, que se alimenta essencialmente de suas emoções positivas. Os senti- mentos de entusiasmo, inspiração, decisão e desafio são um ponto cen- tral para se desenvolver nessa habi- lidade. Os treinamentos servem de termômetro para as competições, ou seja, não há fórmula mágica. Quanto mais semelhantes os trei- nos forem das competições, melhor. Dessa maneira, muitas característi- cas aqui apresentadas podem ser fa- cilmente transferidas para a vida. O treinamento sem qualidade não ca- pacitará ninguém a competir bem. E viver é um eterno treinamento, não é mesmo? �!G�����G�� �� �������Ô�� �G��� ��G�� �������IG� ���� limpo, ter espírito esportivo. Seu con- ceito está vinculado à Ética no meio esportivo, onde os praticantes devem sempre procurar atuar de forma a não prejudicar o adversário de maneira proposital. O termo, porém, vem sen- do utilizado em praticamente todos os segmentos da sociedade moderna e assume o significado de trabalhar ou apresentar uma conduta de acordo com padrões éticos e morais. Alguns comportamentos po- dem ser sinônimo de espírito de luta: garra, atitude, intensidade, coragem, jogar do primeiro ao úl- timo minuto com a mesma gana e energia, manter uma situação emo- cional construtiva quando as coisas vão mal, acreditar em seu potencial. Para Loehr (1990), treinar e jo- gar com intensidade é uma habilida- de que requer repetição. Os atletas terão o melhor de seu desempenho quando puderem manter um estado IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K REFERÊNCIAS &���G�G����(G�����:�������G�GhÔ�����I��`��IG�I����I���������� �������G���������HG������H��:� $�d���� ����%�:���.��I����9�Basquetebol: ��G����Ô��������G G�������I�È�I�G�����P��IG:�(G����� :9�=;;@: �������G� ���9��G�����#GG�:�Treino mental no tênis:�����G�\��G����P��IG���G�G�����I����:�=;;D: �H����1���H���e��G�����"��� :�Fundamentos da Psicologia do Esporte e Exercício.� :� ����� 9�=;;<: "G����(G����:�Consultoria em Psicologia do Esporte:� :�$��:9�<DDB: �����G��-G������:�Treinamento mental no tênis:�I���� �����������G���GH��� G �������G��:� :� (G����9�=;;C: %G���� :�'����:�El juego mental.� :�.����9�<DD;: 1:�.:�"G�����:�O jogo interior de tênis. :�.����9�=;;?: /������ ������ ������9��G�G����� ����I�G����G������G������P��G9��Ô�� ��I���P��G��<;��������G�� ����P��IG:� +G�G�G�+��I�����G� ����������9������GhÔ�� �� �������GhÔ���Ô����� G������� �����I�G����G�G�G��I�������G� d o s s i ê 44 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br No esporte dizem que 90% do desempenho são mental. Quantas ve-zes, em conversas sobre competições esportivas, já ouvimos a frase “está tudo na cabeça”? Mesmo assim, treinadores e atletas passam a maior do tempo, esforço e dinheiro realizando treinos físicos e técnicos, deixando pouquíssimo espaço para o chamado jogo mental. A importância de uma mente clara e focada é muitas vezes subestimada. E uma mente que não está sob controle está mais pro- pensa a erros que, muitas vezes, podem custar uma partida ou até uma final. Além disso, o estresse, a ansiedade e a pressão sob as quais atletas são subme- tidos constantemente ocasionam em falta de atenção, concentração, perda das habilidades motoras e falência. Entretanto, a quantidade correta de estresse e ansiedade controlados pode manter o atleta em um estado mental ideal, chamado de “zona”, que consiste em estar totalmente focado e presente no momento. Psicólogos do esporte afirmam que não estar “pre- sente no momento” é o que provoca confusão mental. Isto é, quando, du- rante uma competição, o atleta pensa em eventos passados ou nas consequ- ências da derrota, a confusão mental se instala pela falta de foco no momen- to presente, prejudicando o desempe- nho. Ao contrário, um atleta focado no momento presente e livre de padrões mentais negativos e medos tem mais chance de vencer. Como consequência, tem se tor- nado cada vez mais comum entre atletas a realização de rotinas mentais, como visualizações, ensaios, autover- balização e relaxamentos para ajudá- -los a superar distrações, estados psi- cológicos desfavoráveis e desenvolver prontidão mental. Os pesquisadores Michael Greenspan e Deborah Feltz, das Uni-versidades Estaduais do Arizona e de As práticas contemplativas e suas variadas técnicas estão ajudando atletas de alto rendimento a melhorarem o desempenho esportivo, por intermédio de um trabalho que enfatiza o aspecto mental Michigan, respectivamente, conclu- íram, em uma revisão sobre o tema, que as intervenções baseadas em re- laxamento e reestruturação cogniti- va são altamente eficazes na melhora de desempenho esportivo. Segundo os autores, essas estratégias de coping permitem que os atletas dirijam o foco para as sensações internas do corpo, como a respiração, resultando em me- lhores desempenhos competitivos. Enquanto as rotinas mentais pa- recem de fato influenciar o desem- penho atlético, o mecanismo exato pelos quais elas funcionam ainda não está claro. Em um estudo clássico com medalhistas olímpicos, a equi- pe do pesquisador Daniel Gould, da Universidade Estadual de Michigan, registrou que os atletas utilizam as ro- tinas mentais como modo de chegar a um estado mental ideal e que 53% dos atletas entrevistados sobre seus piores desempenhos disseram não ter aderido às rotinas mentais. De acordo com os pesquisadores, a habilidade de regular o estado de excitação, chama- do de arousal, parece influenciar dire- tamente o desempenho atlético. Essa excitação (arousal) refere-se a quão ativado emocionalmente um atleta se torna antes ou durante a competição. As rotinas mentais parecem, desse A importância do %*"*�( ).�' Por Camila Ferreira Vorkapic �G���G�!������G�0���G��I�\��������G ��G� �����������������������^I�� �����G��!G����I�)+���� pesquisadora do Laboratório de Biociências da Motricidade Humana (LABIMH), na Universidade .��G ������- 9��� ��'GH��G�`���� ��)�����������G� G�/������� G ��!� ��G�� ��-�������- :�������G� em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, pós-doutora em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Sergipe e autora do livro Mindfulness, Meditação,Yoga e Técnicas ��������G���G�d����"��G� ������IGh����� ��+�P��IG�+����G���G�G�+�������G��� ��-Gb � (Ed. Cognitiva). É coordenadora da Rede de Estudos Interdisciplinares em Neurociências (REIN), em Sergipe. www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 45 P s ic o lo g ia n o e s p o rte IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K /W IK IP ED IA A habilidade de regular o estado de excitação, I�G�G �� ��G����G�9��G��I�������I�G�� ����G������ o desempenho atlético. Essa excitação (arousal) refere-se a quão ativado emocionalmente um atleta se torna antes ou durante a competição modo, ajudar na ativação de um es- tado de excitação mais apropriado à performance, regulando expectativas, confiança, concentração e atenção, e o próprio nível de excitação durante a competição esportiva. Esporte Zen As últimas décadas de pesquisas mostram que psicólogos do es- porte e preparadores têm utilizado rotinas mentais especiais para me- lhora do autocontrole e autorregula- ção emocional. Ao invés de contro- lar ou rejeitar experiências internas, essas rotinas enfatizam uma consci- ência atenta e não crítica, aceitação, atenção, concentração, relaxamen- to e técnicas de respiração, como modo de melhorar o desempenho competitivo. O yoga, que inclui a meditação, é o único método capaz de desenvolver todas essas variáveis ao mesmo tempo. O yoga é um sistema milenar de práticas mente-corpo que se originou na Índia há mais de 2.000 anos e foi descrito sistematicamente a poste- riori (Yoga Sutras de Patanjali, cerca de 900 BC.). Envolve a utilização de técnicas diferentes como posturas (asanas), respiração controlada (pra- nayamas), relaxamento consciente e profundo (yoganidra) e meditação. De acordo com a dra. Shirley Telles, uma das maiores pesquisadoras do tema e diretora de pesquisa do Pa- tanjali Research Foundation, em Ha- ridwar, na Índia, essas técnicas têm efeito específico no estado psicológi- co das pessoas. Em uma revisão sobre yoga e saúde mental, ela relatou que Apesar da importância da concentração e do desempenho mental no esporte, os maiores investimentos continuam a ser nos treinamentos físicos e técnicos d o s s i ê 46 psique ciência&vida EXIGÊNCIAS EXTERNAS E INTERNAS PARA SABER MAIS A tradução literal do verbo to cope, do inglês, pode ser descrita como lu-tar, competir com sucesso ou em igualdade de condições. Seu signifi- cado pode ser, ainda, a ação de lidar de maneira adequada com uma situa- ção, superando as adversidades ou os limites que essa situação apresenta. Em Psicologia, mais especificamente na Psiconeuroimunologia, área científica interdisciplinar que desenvolve uma abordagem tratando o ser humano como unidade indissolúvel de corpo e mente, o coping é estudado, principalmente, na relação com o estresse, sendo definido como tentativa ou empenho para lidar com exigências externas (do ambiente) ou internas (do próprio sujeito) observadas como sobrecarregando ou excedendo os limites e recursos da pessoa. Fatos estressantes ocorrem o tempo todo na vida das pessoas, que podem ser definidos como pequenas contrariedades do cotidiano, como a fila longa no banco, engarrafamentos no trânsito, a nota baixa do filho na escola e acontecimentos desse tipo, aparentemente sem grandes consequências, mas que trazem aborrecimentos. Curiosamente, fatos positivos também são con- siderados estressantes, como o encontro com um parceiro amoroso, a notícia da aprovação do filho no vestibular ou um elogio inesperado no trabalho, por �������:�)Ô�����������G�����G��G �Ô����I������G� ��cope. Pesquisas apontam duas categorias de estratégias básicas de coping: direcionadas para a resolu- ção do problema e as orientadas para a regulação da emoção. Aceitar e lidar apropriadamente com pensamentos e sentimentos negativos, assim como experimentar um estado mental correto durante as competições, é a diferença entre ganhar e perder os estudos mostram melhoras signifi- cativas na autorregulação emocional com consequentes reduções nos ní- veis de ansiedade e estresse e melho- ras na atenção, concentração, humor, qualidade de vida e bem-estar. Hoje, práticas contemplativas como yoga e meditação mindfulness vêm sendo cada vez mais utilizadas no esporte como parte do treinamen- to mental de atletas. Tais práticas têm sido úteis na aceitação de sentimentos negativos e pessimistas e no desen- negativos, assim como experimentar um estado mental correto durante as competições, é a diferença entre ga- nhar e perder. Os pesquisadores Amy Gooding e Frank Gardner, do Depar- tamento de Psicologia da Universidade Kean, nos Estados Unidos, descobri- ram que, na verdade, atletas medianos e de elite experimentam níveis simila- res de ansiedade, mas a diferença está na maneira pela qual os atletas de elite interpretam a ansiedade pré-competi- tiva como facilitadora. Sendo uma for- ma específica de excitação (arousal), a relação entre ansiedade e desempenho competitivo tem sido bastante estuda- da ultimamente. Os autores afirmam que uma experiência emocional requer uma interpretação cognitiva do nível de excitação. Outra possibilidade é que o desempenho dependa de estratégias de coping, como a confiança do atleta em lidar com a ansiedade e a percepção das demandas específicas do esporte. Com o tempo, através de experiências negativas e positivas, o atleta pode volvimento de habilidades emocio- nais específicas necessárias durante uma competição esportiva. Aceitar e lidar apropriadamen- te com pensamentos e sentimentos A confusão mental se instala pela falta de foco no momento presente e um atleta focado e livre de padrões mentais negativos tem mais chance de vencer www.portalcienciaevida.com.brpsique ciência&vida 47 Psicolog ia no espo rte �Reestruturação cognitiva A chamada reestruturação cognitiva é um processo psicoterapêutico que busca o aprendizado da identificação e da contestação de pensamentos irra- cionais ou não adaptativos, conhecido como distorções cognitivas, como por exemplo clivagem, pensamento mági- co, filtragem, excesso de generalização, magnificação e raciocínio emocional, frequentemente associados. �G�������I���G� G����P��IG��I�������G���G�9� é possível que atletas lidem melhor com pensamentos negativos por estarem mais presentes. Prestando plena atenção, exercem menos esforço na tentativa de controlar e reduzir cognições e emoções treinar o reconhecimento do nível de excitação apropriado (e, consequente- mente, ansiedade) e ajustá-lo às neces- sidades competitivas. Da perspectiva das práticas con- templativas, é possível que atletas de elite lidem melhor com pensamentos e sentimentos negativos por estarem mais presentes no momento. Pres- tando plena atenção (mindfulness) e se tornando mais conscientes du- rante o desempenho, esses atletas exercem menos esforço na tentativa de controlar e reduzir cognições e emoções. Na verdade, é exatamente o contrário, são capazes de desempe- nhar suas tarefas competitivas com quaisquer cognições e emoções que estejam experimentando. Contribuição Apesar da sugestiva relação entre práticas de mente-corpo e trei- namento mental de atletas, poucos estudos observaram o impacto dessas rotinas no estado psicológico dos atle- tas e no desempenho esportivo. Além disso, a maioria dos estudos utiliza ex- clusivamente técnicas de mindfulness ou estratégias baseadas em mindful- ness para esse propósito. mento de uma observação desapegada dos conteúdos da consciência, podem representar uma poderosa estratégia comportamental de coping para se li- dar com o estresse, a ansiedade e pen- samentos negativos no esporte. No en- tanto, poucas pesquisas investigaram o efeito dessas práticas no estado men- tal de atletas. Alguns estudos observa- ram níveis reduzidos de ansiedade e estresse e melhores desempenhos em arqueiros, jogadores de basquete e de futebol após a utilização de interven- ções baseadas em mindfulness (para uma revisão, consultar os artigos na seção Para saber mais). Pesquisadores afirmam que as téc- nicas contemplativas ajudam a treinar o córtex pré-frontal, a parte do cérebro responsável por criar o estado mental de calma e alerta, mantendo os atletas focados, sem distrações e com o me- lhor desempenho possível. De acordo IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K /A RQ UI VO P ES SO AL Pesquisas constatam queda no nível de estresse e melhores desempenhos em arqueiros, jogadores de basquete e de futebol após intervenções de mindfulness Mindfulness é um tipo de aten- ção focada, uma “percepção ou cons- cientização não crítica do momento presente”, que pode ser desenvolvida através de técnicas contemplativas e até artes marciais. A Psicologia do Esporte tem utilizado intervenções baseadas em mindfulness como rotina mental para melhorar o desempenho e o humor geral dos atletas. A técnica de concentração na respiração, por exemplo, uma das práticas de min- dfulness, ajuda a reduzir a ruminação mental. Uma mente ruminante é uma mente fora de controle. E quando se tem 30 segundos para decidir uma partida, a última coisa que um atleta quer é uma mente confusa. De modo específico, técnicas de meditação mindfulness, um com- ponente de práticas contemplativas como o yoga, que foca na percepção e na atenção plena para o desenvolvi- d o s s i ê 48 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br �Referência nas pesquisas �� ����������������G� G���IG�G� -������� Telles é uma referência nas pesquisas que investigam os efeitos terapêuticos �����G��� G��� ��GhÔ����H���G������� e o corpo. Nascida em Nairóbi, no Quê- nia, e radicada na Índia, defende a eficá- cia comprovada dos meios naturais de contornar o estresse. Desenvolveu seu trabalho e aplicou seus conhecimentos em casas de correção infantojuvenil, moradias de idosos, empresas de tec- nologia, pacientes esquizofrênicos e sobreviventes de tragédias naturais. ����G�� G���������G����GhÔ����������P��IG�� de mente-corpo e treinamento mental de atletas, poucos estudos observaram o impacto dessas rotinas no estado psicológico dos atletas e no desempenho esportivo com a dra. Kristen Race, fundadora do blog Mindful Life e autora do Mindful Parenting, nos Estados Unidos, a capa- cidade de observar os pensamentos e emoções desapegadamente reduz sig- nificativamente os níveis de cortisol sanguíneo, o chamado “hormônio do estresse”. Além disso, a capacidade de direcionar a atenção para dentro ati- va uma área do cérebro chamada de ínsula, resultando em maior sensação de consciência do próprio corpo e me- lhorando a comunicação entre mente e corpo. O resultado disso é que os atletas percebem melhor as mudan- ças fisiológicas, como uma respiração muito superficial ou um músculo ten- sionado, e podem rapidamente fazer os ajustes apropriados, mesmo antes de saber conscientemente o que está acontecendo e de esses fatores impac- tarem no desempenho. No Brasil No Brasil, um estudo da autora com lutadores profissionais de jiu-jítsu observou redução nos níveis de ansiedade, fadiga, tensão e raiva após utilização de uma intervenção baseada em técnicas de yoga (YBIS). Pesquisas que envolvem práticas de yoga, e não somente mindfulness, ainda são minoria, mas também possuem potencial positivo de resul- tados. Enquanto posturas (asana), re- laxamento profundo (yoganidra – co- nhecido em mindfulness como body scan) e meditação são parte de quase todas as intervenções de mindfulness, o yoga compreende outras técnicas, como as respiratórias (pranayama), que não estão incluídas em mindful- ness, mas que parecem desempenhar papel importante na regulação do humor. Por exemplo, uma equipe de pesquisadores italianos, comandada pela dra. Daniele Martarelli, da Uni- versidade de Camerino, na Itália, ob- servou que os níveis de cortisol, au- mentados após o exercício em atletas, estão relacionados ao estresse oxida- tivo (aumento de radicais livres) e podem ser revertidos após respiração diafragmática (pranayama). Essa es- tratégia ajuda a regular os níveis de cortisol, sugerindo efeitos no estresse e na ansiedade. Além disso, a respira- ção profunda envia sinais ao sistema nervoso simpático que, por sua vez, reduz os batimentos cardíacos. Não Imagem - Jacques Lacan ANÚNCIO DU www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 49 Psicolog ia no espo rte IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K/ W IK IP ED IA REFERÊNCIAS "������G�9�(:�%:e�!����9��:�!:�+��I������IG���������������������G�����������I���������������G�����d�G� ������:�.���-�����+��I��������9��:�>9��:�>9��:�=<D¢=>A9� "��� 9��:e� ���� 9� :��:e�%GI����9�-:�/:-:�*�����I�������������I�����I�d�����G������G�G����9� ���I�����������I���������G� �G���I�:�.���-�����+��I��������9��:�A9��:�>@C¢>C=9� "��� 9��:e�/ ��9� :�+��I������IG����������������G�I�����������G�I�d�G����G�������G��������G������:� Medicine and Science in Sports and Exercise9��:�=A9��:�?BC¢?C@9�<DD?: "�� ���9��:e�"G� ���9�!:������������G���������������G���������H���������� �������9����������������9� G� �HG����HG�����������������I���G��:�%����G����������IG��-������+��I������9��:�?9��:�>;>¢><D9�=;;D: (G��G�����9��:e���II�����9�(:e�-I���9�-:e�+�����9�+:���G���G��G��I�H��G�������� �I�������I���¢�� �I� � ��� G�����������:� �� ��I�¢�G�� �����������G���G� �������G�����(� �I���9��:�=;<<9�G������$�� D>=?>;9� ��d<;:<;D>¤�IG�¤���<AD:��G�G��H�G�G��G�9�(:e�.�����9�-:e����G���G��9�+:�(:�3��G����������� �d�G�������G��I��������������G����� ��������I��G���I� ���� ���:�!�����+��I��G���9��:�>9��:�<<B9�9� ��d<;:>>CD¤�����:=;<=:;;<<B: é à toa que jogadores de basquete costumam respirar profundamente antes de lançar a bola. Eles o fazem intuitivamente, na tentativa de redu- zir os batimentos cardíacos e conse- quentemente a ansiedade, que pode- ria custar os pontos de uma cesta. A pesquisa sobre a relação entre técnicas contemplativas e treina- mento mental na preparação de atle- tas é um campo emergente, e pouco ainda se sabe sobre como o cérebro funciona nesse sentido. No entanto, as pesquisas de fato observam me- lhoras no estado mental e no desem- penho esportivo dessa população. Tais práticas comprovadamente re- duzem o estresse e a ansiedade, co- nectando o indivíduo ao momento presente e criando uma mente mais resiliente. E estas, definitivamente, são as características mentais dos verdadeiros campeões. O psicólogo do esporte e profes- sor de meditação George Mumford trabalhou nas equipes de basque- te norte-americanas do Chicago Bulls, durante os anos de Michael Jordan, e no Los Angeles Lakers. Atualmente é consultor de diversos atletas e times de esportes diversos. Nas palavras de Mumford: “Você precisa focar em si mesmo. É muito mais difícil conquistar a si mesmo que aos outros. Isso é o mais difícil que temos que fazer, mas também o mais benéfico. Tudo acontece no momento presente. Esse momento é tudo o que temos. É somente no momento presente que podemos mudar as coisas. E você não está so- mente mudando para si, você está fazendo isso por todos. Todos se beneficiam. Na vida ou no esporte, esse é o maior ato de altruísmo”. Jogadores de basquete costumam respirar profundamente antes do lance livre e o fazem intuitivamente, na tentativa de reduzir os batimentos cardíacos e a ansiedade UPLA JÚNIOR 50 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br ciberpsicologia Por Igor Lins Lemos O JOGO MUNDIALMENTE CONHECIDO TEM CONQUISTADO ADEPTOS E ABARCADO RELATOS INTERESSANTES NO SETTING TERAPÊUTICO League of Legends: uma PAIXÃO PERIGOSA? M esmo aqueles que não são pesquisadores no campo da ciberpsicologia ou jogadores do League of Legends (LoL) já ouviram comentários sobre o jogo que dá título a esta matéria. O LoL é mun- dialmente famoso, jogo do gênero Mul- tiplayer Online Battle Arena (MOBA), no qual o papel dos jogadores, que jogam sempre em um time de cinco pessoas, é destruir uma construção localizada na base do time inimigo (chamada de ne- xus). Mas qual a importância de trazer uma matéria sobre este game? A resposta é simples: trata-se de um jogo eletrôni- co que tem uma média de 67 milhões de jogadores utilizando-o mensalmente e cerca de 27 milhões diariamente, de acordo com a Riot Games. Possivelmente este dado reverbera em outro: é o jogo mais comentado nos consultórios de psi- cólogos e psiquiatras. Constantemente recebo pacientes e seus familiares que mencionam con- mITOS�COM�O�USO�DO�,O,��$ESTA�FORMA�� trago o questionamento: o problema é o jogo eletrônico ou o jogador? Reforço que todo tipo de tecnologia é neutro, porém o usufruto positivo ou negativo será caracterizado por aquele que pra- tica essa atividade. Um dos pontos que podem reforçar o uso problemático do LoL é a necessidade que os jogadores (especialmente aqueles em adoecimento psíquico) relatam de alcançar posições cada vez mais altas (existe um ranking neste jogo, altamente disputado). En- tretanto, existe um importante critério: quanto mais vitórias, mais conquistas; quanto mais derrotas, mais quedas no ranking. Isso leva os jogadores (e pacien- tes) ao seguinte raciocínio: “Se eu jogar E�GANHAR�SIGNIlCA�QUE�ESTOU�EM�UM�DIA� favorável, então irei jogar mais vezes para continuar subindo no ranking”. De forma oposta: “Se eu perder é um mau sinal, preciso jogar novamente para po- der recuperar as posições perdidas na partida anterior”. Essas frases lembram as cognições presentes em paciente com jogo patológico? Apesar de ser um jogo inserido, no âmbito clínico, nas narrativas de pacientes acometidos pelo transtorno do jogo pela internet, a matéria abar- ca outro ponto: a paixão relacionada aos jogos eletrônicos. Vallerand et al. ����� � DElNEM�PAIXÎO� COMO� UMA� FOR- te tendência de realizar uma atividade que gere prazer ao indivíduo, na qual o sujeito investe tempo e energia. Os pesquisadores comentam, também, que a paixão gera uma forte implicação na identidade, fazendo as atividades se tornaram parte do que nós somos. Os autores dividem essa paixão em dois tipos: a paixão harmônica e a paixão obsessiva. No primeiro tipo o sujeito consegue interromper uma atividade quando julga que ela é prejudicial para si (o que raramente é encontrado no co- meço de tratamento de pacientes com transtorno do jogo pela internet); no segundo tipo o comprometimento está além do controle do indivíduo, já exis- tindo interferências negativas nas ativi- dades cotidianas. A consequência deste processo – complementam os pesqui- sadores – é a persistência, que se torna rígida e presente mesmo em atividades que não geram sentimentos positivos e prejudicam os relacionamentos ou obri- gações acadêmicas/laborais do sujeito (neste caso, o jogador). Relacionando o LoL à paixão, Ber- tran e Chamarro (2016) realizaram um estudo com 369 espanhóis que concor- daram em preencher um questionário virtual. Os participantes tinham mais de 16 anos e jogavam LoL periodicamente. A idade média dos sujeitos foi de 21,59 anos (DP = 3,58) e a média de tempo de jogo por semana foi de 17,72 horas (DP = 12,46). Além das informações so- CIODEMOGRÉlCAS�� O� TEMA� DA� PAIXÎO� FOI� medido pela Passion Scale. Os resultados do estudo demonstraram que a paixão harmônica se torna uma protetora de consequências negativas. Do outro lado, a paixão obsessiva traz consequências negativas a esses jogadores. A pesquisa sugere que aqueles jogadores que apre- www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 51 SH UT TE RS TO CK / AC ER VO P ES SO AL UM DOS PONTOS QUE PODE REFORÇAR O USO PROBLEMÁTICO DO LOL É A NECESSIDADE QUE OS JOGADORES (ESPECIALMENTE AQUELES EM ADOECIMENTO PSÍQUICO) RELATAM DE ALCANÇAR POSIÇÕES CADA VEZ MAIS ALTAS NO RANKING DO JOGO o usufruto excessivo que pode, de fato, trazer lucros para o jogador, mas sim a caracterização patológica, quando este usufruto já trouxe prejuízos no âmbito Igor Lins Lemos é doutor em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental Avançada pela Universidade de Pernambuco (UPE). É psicoterapeuta cognitivo-comportamental, palestrante e pesquisador das dependências tecnológicas. E-mail: igorlemos87@hotmail.com sentam sinais relacionadas a um possível adoecimento psíquico demonstram um funcionamento obsessivo em relação ao jogo eletrônico LoL. Os resultados do estudo, mencio- nados anteriormente, estão em sintonia com o que observo frequentemente na prática clínica. Devido à existência do já mencionado ranking, muitos pacientes re- velam que precisam se dedicar cada vez mais tempo para que possam ser mun- dialmente reconhecidos e que se tornem parte de times que possam gerar lucro para si (existem campeonatos mundiais do jogo, com premiações milionárias). Não é incomum ouvir pacientes men- cionando que já despenderam mais de 3 mil horas neste jogo. Sou totalmente favorável para que os jogadores possam obter este tipo de reconhecimento, po- rém minha preocupação é quandoesse uso está relacionado ao escapismo. Isso SIGNIlCA� QUE� O� PROBLEMA� MAIOR� NÎO� Ï� Referências: BERTRAN, E.; CHAMARRO, A. Video gamers of League of Legends: the role of passion in abusive use and in performance. Adicciones, v. 28, n. 1, 2016. VALLERAND, R. J.; BLANCHARD, C.; MAGEU, G. et al. Les passions de l’ame: on obsessive and harmonious passion. Journal of Personality and Social Psychology, v. 85, n. 4, 2003. acadêmico ou laboral, na família ou em RELACIONAMENTOS� AMOROSOS� E�� POR� lM�� nas cognições e emoções desse paciente. Isso é uma paixão saudável? 52 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br neurociência por Marco Callegaro A atenção e os TRAÇOS da CRIATIVIDADE DIFICULDADES DE PRESTAR ATENÇÃO EM ALGO DESINTERESSANTE PODE SER UM GRANDE PROBLEMA EM DETERMINADOS CONTEXTOS. PESSOAS QUE APRESENTAM TDAH MOSTRAM DIFICULDADES PARA SUPRIMIR ATIVIDADE CEREBRAL VINDA DA “REDE DA IMAGINAÇÃO” um transtorno relacionado a três carac- terísticas principais: a inatentividade, a impulsividade e a hiperatividade. Essas características nem sempre vêm juntas, podem se apresentar isola- damente. Nem sempre a presença de um desses traços envolve necessariamente o diagnóstico de TDAH. Para complicar, essas características podem surgir em diferentes condições e não fazer parte do TDAH. O diagnóstico de TDAH está relacionado à presença desses traços, ou de alguns deles, desde cedo, como um padrão recorrente na vida escolar, social S ERÉ� QUE� AS� PESSOAS� COM� DÏlCIT� de atenção são mais criativas? Primeiro, vamos procurar en- TENDER� BEM�O� QUE� Ï� hDÏlCIT� DE� atenção”. Existe o TDAH, sigla com as iniciais do chamado “transtorno de dé- lCIT�DE�ATEN¥ÎO�E�HIPERATIVIDADEv��QUE�Ï� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 53 SH UT TE RS TO CK / AR QU IV O PE SS OA L O RACIOCÍNIO CRIATIVO ENVOLVE A HABILIDADE DE INFERIR RELAÇÕES E PERCEBER PADRÕES NOVOS E COMPLEXOS. CARACTERÍSTICAS QUE ESTÃO ASSOCIADAS AO DÉFICIT DE ATENÇÃO PODEM ESTIMULAR A CRIATIVIDADE Marco Callegaro é psicólogo, mestre em Neurociências e Comportamento, diretor do Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (ICTC) e do Instituto Paranaense de Terapia Cognitiva (IPTC). Autor do livro premiado O Novo Inconsciente: Como a Terapia Cognitiva e as Neurociências Revolucionaram o Modelo do Processamento Mental (Artmed, 2011). Para saber mais: -I�����G����&G���G�9���H��IG �����=<� ������H��� ��=;<?���d������d¤¤H����:�I�����IG����IG�: com/beautiful-minds/the-creative-gifts-of-adhd/ e familiar. No caso do TDAH, existem estudos com gêmeos idênticos mostran- do que é alta a predisposição genética, pois quando um irmão gêmeo recebe o diagnóstico, a chance do outro irmão apresentar essa mesma condição é bem alta, cerca de 90%. Portanto, acredita- -se que existam genes envolvidos na transmissão do TDAH. Vários genes INmUENCIANDO� VÉRIAS� CARACTERÓSTICAS�� OU� transmissão poligenética. No entanto, a forte herdabilidade do TDAH e sua alta incidência sugerem que existem alguns traços adaptativos misturados aos negativos, o que pode explicar a perpetuação desses genes nas populações humanas ao longo da evolução. Se essa hipótese estiver cor- reta, seria de esperar encontrar algo de bom nas pessoas que têm essa condi- ¥ÎO�� 4ALVEZ� A�MESMA� CONlGURA¥ÎO� DE� TRA¥OS� QUE� LEVE� AO� DÏlCIT� DE� ATEN¥ÎO� contribua para traços positivos. O psicólogo Scott Barry Kaufman acredita que existem características positivas que podem acompanhar o TDAH, em especial a criatividade. O ra- ciocínio criativo envolve a habilidade de inferir relações e perceber padrões novos e complexos. Kaufman cita estudos onde FORAM�IDENTIlCADOS���� TRA¥OS�DE�PERSO- nalidade recorrentes em pessoas criati- vas. Seis traços eram “negativos”, como a impulsividade e a hiperatividade. No entanto, existiam 16 traços “positivos”, como, por exemplo, independência, ris- co, alto nível de energia, curiosidade, humor, traços artísticos e emocionais. No TDAH, muitos desses mesmos traços estão presentes, como apresentar níveis mais altos de geração de ideias es- pontâneas, devaneios, sonhar acordado, busca por sensação, energia e impulsivi- dade. As pesquisas têm apoiado a noção de que as pessoas com características de TDAH têm mais probabilidade de al- cançar níveis mais altos de pensamento criativo e realizações do que as pessoas sem essas características. As realizações na vida estão associa- das à habilidade de ampliar a atenção e TER�UM�lLTRO�MENTAL�QUE�PERMITE�A�PER- meabilidade, algo que as pessoas com TDAH têm abundantemente. Pesquisas recentes sobre Neurociência cognitiva também sugerem uma conexão entre o TDAH e a criatividade. Pensadores criativos e pessoas que apresentam 4$!(�MOSTRAM� DIlCULDADES� PARA� SU- primir atividade cerebral vinda da “rede da imaginação” (rede de modo padrão, ou DMN – Default Mode Network). O vazamento de informações no lLTRO�MENTAL�Ï�POSITIVO�OU�NEGATIVO�DE� acordo com o contexto e as demandas existentes. A habilidade de controlar a atenção é importante em muitos con- TEXTOS�� POIS� A� DIlCULDADE� EM� INIBIR� O� mUXO�MENTAL�PODE�ATRAPALHAR�AO�FOCAR�A� atenção em uma aula chata ou se con- CENTRAR� EM� UM� PROBLEMA� DESAlADOR�� Mas como aponta Kaufman, a habilida- de de manter a corrente de fantasias in- ternas, a imaginação e o sonhar acorda- do podem ser imensamente favoráveis para a criatividade. Alguns estudos sugerem que a rede de modo padrão que as pessoas com TDAH apresentam com maior ativida- DE�� EMBORA� CAUSEM� DIlCULDADES� PARA� controlar o foco da atenção, é a mes- ma rede neural que facilita o estado de mUXO� CRIATIVO� E� O� ENGAJAMENTO� ENTRE� os músicos, incluindo músicos de jazz e os rappers. As pessoas com TDAH frequentemente são capazes de focar melhor do que outros quando estão profundamente engajadas em uma ati- VIDADE�QUE�Ï�PESSOALMENTE�SIGNIlCATIVA� para elas, o chamado hiperfoco. Uma abordagem pedagógica inte- RESSANTE�PARA�ESSE�PERlL�Ï�A�APRENDIZA- gem baseada em problemas (ABP), em que os estudantes usam as informações para criação de diferentes produtos como desenhos, dramatização, blogs, vídeos ou artigos, permite maior envol- vimento com o material, e se tornam alunos ativos, em vez de serem subme- tidos somente à observação passiva. Um conceito mais amplo sobre o papel positivo de certos traços poderia também fazer com que os estudantes com características de TDAH mos- trassem suas forças criativas, incluindo a imaginação, o pensamento divergen- te e hiperfoco em atividades que des- pertam o seu interesse. Se tratarmos as características do TDAH somente COMO� DElCIÐNCIAS�� CONFORME� OCORRE� com frequência na escola, podemos deixar de reconhecer e estimular mui- tas crianças criativas e com potencial. /� DESAlO� DO� SISTEMA� EDUCACIONAL� Ï� criar um ambiente que enfatize a cria- tividade como um caminho e ao mes- mo tempo um resultado para o proces- so de aprendizagem. 54 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br recursos humanos UMA GRADUAÇÃO JÁ NÃO É CERTIFICAÇÃO ESPECIAL NA TRAJETÓRIA PROFISSIONAL. O INVESTIMENTO NO PROCESSO PESSOAL DE ADMINISTRAÇÃO EMOCIONAL PODE SER UM TEMPERO MAIS RELEVANTE NOS DIAS ATUAIS por João Oliveira As OPORTUNIDADES na CARREIRA Q uando ouvimos a palavra oportunidade associamos naturalmente a outra que, de fato, pouco tem a ver: sorte. Esse é um pensamento muito comum entre prof is- sionais que observam outros em plena ascensão sem se dar conta dos fatores envolvidos no processo de crescimento no ambiente institucional e como isso pode ser possível se todos ao mesmo tempo só falamde crise em diversos setores. Alguns pontos devem ser observados, e o primei- ro deles é o preparo do prof issional que deseja al- çar voos mais altos. O investimento deve ser apenas www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 55 João Oliveira é publicitário e psicólogo. Atua como palestrante e facilitador de cursos/treinamentos em todo o Brasil. Diretor de Cursos do Instituto de Psicologia Ser e Crescer (www.isec.psc.br). Entre seus livros, estão: Jogos para Gestão de Pessoas: Maratona para o Desenvolvimento Organizacional, Mente Humana: Entenda Melhor a Psicologia da Vida e Saiba Quem Está à sua Frente – Análise Comportamental pelas Expressões Faciais e Corporais (Wak Editora). IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K/ AC ER VO P ES SO AL na direção de aquisição dos conhe- cimentos técnicos necessários para uma determinada posição. Lógico que isso faz parte do processo, mas, nos dias atuais, uma graduação, ape- nas, não é certif icação que garanta um brilho especial no currículo. Dessa forma, o prof issional preci- sa se especializar cada vez mais. A busca por cursos livres, pós-gradua- ções e especializações diferenciadas pode fazer toda diferença na hora da escolha de um novo gestor na organi- zação. No entanto, o investimento no processo pessoal de administração emocional provavelmente é o tempe- ro mais relevante quando a oportuni- dade sai em busca de preparo. Sabemos que o gestor ef iciente não é necessariamente um expert em todos os perf is prof issionais que gere. De fato, o gestor é o elemento que consegue navegar bem entre pessoas cuidando de aspectos gerais e indivi- duais, mantendo a equipe focada no objetivo principal. Por isso, ele é, an- tes de mais nada, um gestor de emo- ções. Cabe então ressaltar que não se pode aplicar fora o que não se tem dentro e, nesse caso, a administração emocional é um forte elemento dife- renciador de um bom ou mau gestor. As oportunidades estão sempre nas mãos das pessoas que decidem quem deve subir ou descer na empre- sa. Por isso, agir com ética e respeito a todos é o mínimo que se espera de al- guém que deseja ser notado como pre- parado pela linha de comando. Deixar claro que possui ambição de crescer e que está se preparando para isso deve ser parte dos temas de conversas en- tre os companheiros de trabalho. Nem sempre as pessoas são concorrentes diretos, pois algumas não querem as- sumir responsabilidades, mesmo que isso possa trazer maior valor f inancei- ro em seus contracheques. O ambiente sempre é favorável ao crescimento. Se ocorre uma crise é necessário um novo plano de inter- por ter um foco direcionado aos ele- mentos do dia a dia. Quando não se consegue ir além do que o próprio caminho oferece, é melhor buscar um novo destino com probabilidades de sucesso. Por isso, o trabalho emocional é provavelmente o mais importante de todos: estar bem consigo mesmo e com a autoestima no lugar é impres- cindível. O investimento do preparo só irá obter resultado se houver cora- gem de se lançar como possível can- didato à próxima promoção ou a uma nova realidade de atuação prof issio- nal que pode ser em outra instituição ou mesmo como empreendedor de sua própria ideia de negócios. Só há destino f inalizado para quem nisso acredita. Alguns aspec- tos são sempre importantes destacar, como manter o networking em cons- tante crescimento, observe outras atividades fora de seu eixo principal. Muitas vezes, a oportunidade pode estar em outro modelo prof issional próximo ao seu perf il de atuação. Converse mais, ouça mais, leia mais. As boas informações já existem: é so- mente necessário acessá-las. Hoje, um prof issional que está estagnado numa mesmo posição por muitos anos pode ser considerado ob- soleto se não agregar novas habilida- des às suas capacidades já existentes. Procurar o crescimento não é somen- te uma busca por mais altas remune- rações, é também uma apresentação de dinamismo e proatividade. Toda instituição, mesmo em momentos de severa crise, preserva aqueles que agregam mais valor. São esses que po- dem possuir a chave de ignição para o sucesso esperado por todos. venções, e se o mercado está em am- plo crescimento, é preciso mais pro- f issionais de talento para gerirem a demanda. Ou seja, as oportunidades sempre estão diante de nós, que po- demos ou não percebê-las como tal. Um exemplo de aproveitamen- to de uma boa chance de mercado ocorreu no Rio de Janeiro, cidade sede dos Jogos Olímpicos e Para- límpicos. Com a questão da acessi- bilidade em alta, o comércio teve de se adaptar rapidamente para prover rampas para cadeirantes. Alguns pe- quenos empresários criaram rampas metálicas de fácil encaixe que podem ser colocadas e tiradas das entradas das lojas todos os dias, eliminando assim o custo e a confusão causada por obras de adaptação. O resultado pode ser visto por toda a cidade com pequenas rampas de alumínio faci- litando o acesso em cumprimento a uma determinação legal. Estar atento às informações de forma ampla faz parte do empreendi- mento quando o objetivo é aproveitar oportunidades que nem sempre estão visíveis para todos. Pensar além do trivial pode apresentar uma rede de possibilidades, antes imperceptíveis, O GESTOR CUIDA DE ASPECTOS GERAIS E INDIVIDUAIS, MANTENDO A EQUIPE FOCADA NO OBJETIVO PRINCIPAL. POR ISSO, ELE É, ANTES DE TUDO, UM GESTOR DE EMOÇÕES 56 psique ciência&vida PSICO-ONCOLOGIA Marcelo Pereira Lemos é formado em Psicologia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). É especializado em Life Coaching pela Society International of Coaching e Practitioner pelo Instituto de Desenvolvimento Humano Humanize. Atualmente é psico-oncologista do Hospital do Câncer Mãe de Deus. Contatos: marcelo.lemos@maededeus.com.br e marcelop_lemos@hotmail.com Compreender a história da Psicologia Oncológica, desmembrando seus campos na atuação hospitalar, é uma forma de lidar com o câncer, suas consequências e a proximidade da morte Por Marcelo Pereira Lemos com cuidados paliativos ENGAJAMENTO PSICO-ONCOLOGIA “As pessoas são como vitrais co-loridos: cintilam e brilham quan-do o sol está do lado de fora, mas quando a escuridão chega, sua verdadeira beleza é reve- lada apenas se existir luz no interior” (Elizabeth Kubler-Ros, 1977). O tema de ref lexão exposto a seguir se encontra no campo da Psicologia Oncológica. Questões como diagnóstico, ressignif icação das medidas de enfrentamento, compreensão das possibilidades nas medidas de conforto e enten- dimento do que pode ser qualidade de vida, respeitando sempre o pa- ciente na sua subjetividade física, social e espiritual, são assuntos ex- tremamente relevantes. A Psico-oncologia surgiu em 1960, na Argentina; e, no Brasil, al- guns trabalhos começaram a ocor- rer a partir dos anos 1970, com o interesse de integrar e produzir co- nhecimento na área clínica médica oncológica. Em meados dos anos 1990, a Sociedade Brasileira de Psico-oncologia foi fundada com o intuito de oferecer cursos itineran- tes de especialização realizados em várias cidades do país. Fonseca (2004) explica que a palavra câncer é utilizada para des- crever um grupo de doenças que se caracteriza pela anormalidade das células e pela sua divisão excessiva. Um câncer começa com uma célula que contém informações genéticas incorretas, de modo que se torna www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 57 SH UT TE RS TO CK 58 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PSICO-ONCOLOGIA A Psico-oncologia é uma ferramenta indispensável para promover as condições de qualidade de vida do paciente com câncer, facilitandoo enfrentamento de eventos estressantes, se não aversivos, relacionados ao processo de tratamento da doença to de estigmas e diferentes visões. Enquanto uns traziam o alívio de chegar a ele, outros retratavam o completo desgosto por permane- cer nele. A Psicologia torna-se de extrema importância para validar esses sentimentos e atuar nesse campo de variáveis emocionais. O câncer em conjunto com a hospita- lização carrega esses sentimentos, principalmente no que se diz res- peito à morte. E sobre esses aspectos psico- lógicos, sabe-se que os pacientes experimentam reações de reajusta- mento que podem ser chamadas de estágios do processo de morrer, for- mulados por E. Kübler-Ross (1977) e que, apesar de serem escritos em 1977, até hoje são norteadores para os processos de luto. Os cinco estágios são denomi- nados como: 1) negação; 2) rai- va; 3) barganha; 4) depressão e 5) aceitação. Nem todos passam pelos estágios nessa ordem e nem todos completam o processo. Negação: tomada de consciên- cia do fato de sua doença fatal. A l- guns pacientes costumam procu- rar uma segunda opinião, ao passo que outros manifestam a negação de maneira implícita, agindo com otimismo e planos para o futuro. A equipe deve compreender essa rea- ção, que mostra a falta de prepara- ção emocional para enfrentar esse momento. Segundo a autora, não devemos forçá-los a aceitar, mas dar-lhes tempo e deixar que falem de sua angústia. incapaz de cumprir as funções para as quais foi designada. Quando essa célula reproduz outras com a mes- ma construção genética incorreta, então um tumor começa a ser for- mado, composto de uma massa des- sas células imperfeitas. Conforme dados do Institu- to Nacional do Câncer (INCA), o câncer deve ser analisado como um problema de saúde pública, que acomete indivíduos de todas as idades e em todos os continentes, constituindo-se na segunda princi- pal causa geral de morte por doença em todo o mundo. Com a necessidade de com- preender além da visão clínica mé- dica, a Psico-oncologia surgiu como área de conhecimento no momento em que profissionais da área de saú- de passaram a reconhecer que o de- senvolvimento do câncer, bem como o andamento do processo de trata- mento da doença, sofria a inf luência de variáveis sociais e afetivas. Pensar no câncer como uma doença associada a dor, sofrimen- to, degradação e a uma sentença de morte acabava desgastando psiqui- camente tanto o portador da doença quanto seus familiares e amigos ín- timos. Possibilitando a intervenção da Psico-oncologia para desmistifi- car seus medos e suas fantasias. Dessa forma, Costa (2001) ob- servou que a Psico-oncologia se constituiu como uma ferramenta indispensável para promover as condições de qualidade de vida do paciente com câncer, facilitando o processo de enfrentamento de eventos estressantes, se não aver- sivos, relacionados ao processo de tratamento da doença, entre os quais estão os períodos prolonga- dos de tratamento. O hospital é um ambiente reple- A Psicologia Oncológica se debruça em temas como diagnóstico e medidas de enfrentamento, conforto e entendimento do que pode ser qualidade de vida para o paciente www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 59 Os pacientes experimentam reações de reajustamento que podem ser chamadas de estágios do processo de morrer: negação; raiva; barganha; depressão e aceitação. Nem todos passam pelos estágios nessa ordem e nem todos completam o processo Raiva: a medida em que a nega- ção vai se atenuando, a pessoa come- ça a experimentar muita raiva, que normalmente é dirigida ao médico, ao enfermeiro, aos visitantes, aos familiares, a Deus etc. Novamente não devemos nos chocar com essa reação; é importante entender, pois o paciente sofre com o fato de que os outros permanecerão vivos. Barganha: constata-se o desejo do paciente em realizar acordos por um pouco mais de tempo, fazendo pactos consigo mesmo e/ou com Deus; fazem promessas materiais, negociam com a própria morte. Depressão: ao f inal do tem- po da barganha, o paciente passa à depressão. Ele já não prevê mais possibi l idades, a v ida acabou. En- tra em um período de si lêncio in- terior, fechado. Esse estágio costu- ma provocar culpa e outros senti- mentos de af l ição. Nesse período, é importante que os familiares se- jam estimulados a manifestar seus sentimentos. Aceitação: não signif ica que o paciente tome uma atitude cômoda e espere passivamente a morte. Ocorre quando o paciente se mos- tra capaz de entender sua situação com todas as suas consequências. Nessa situação, geralmente o pa- ciente está cansado, mas em paz. Volta-se para dentro de si, revelan- do a necessidade de reviver suas ex- periências passadas como forma de resumir o valor de sua vida e procu- ra o seu sentido mais profundo. “O lado humano do câncer pode ser condensado pelo termo psicossocial. A interação das di- mensões psicológicas, sociais, com- portamentais, psiquiátricas, éticas e espirituais é preponderante para a avaliação da qualidade de vida. Es- sas dimensões estão presentes em todo encontro com qualquer mem- bro da equipe de saúde, em cada en- contro” (Holland, 2003, p. 21).IMAG EN S: S HU TT ER ST OC K Essa condição de enfrentamento da doença não é algo que se estabele- ça no primeiro momento. O pacien- te primeiro passa por um período de negação, conforme citado anterior- mente, quando a principal pergunta é “por que comigo?”. Nesse primei- ro momento, aprimorar o vínculo e possibilitar um ambiente de escuta ativa se tornam necessários. Barone (2004) descreve que não existe câncer sem sofrimento. Assim, está a cargo do profissio- nal de saúde mental compartilhar, *�IË�I����� ������ ��� ��I������������� �� ���hG���������IG�GI�����G����G�G����G�� G �� G��I\���G���� pela sua divisão excessiva A Sociedade Brasileira de Psico-oncologia -�+*�\� ��G����� G ��I����9� ���� ����� ��- crativos, criada em 1994, com o objetivo de congregar profissionais e estudantes da área de saúde para estudo, divulgação e desenvolvimento da Psico-oncologia. Em �������G�����I����G��G���G���GhÔ�� ��G����- dades assistenciais, educativas, culturais e políticas na área e a promoção da transdis- I�����G�� G �9����G� �����G�G�����È�I�G�����- gral à pessoa com câncer, sua família, bem como os profissionais envolvidos. �Desenvolvimento da Psico-oncologia 60 psique ciência&vida PSICO-ONCOLOGIA IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K/ AR QU IV O PE SS OA L DO A UT OR acompanhada de angústia e temo- res que seguirão o paciente ao lon- go do tratamento. Segundo Kovács (2003), o medo é a resposta psico- lógica mais comum diante da mor- te. A visão da morte pelo paciente oncológico é singular, e o contato com ela é constante, ocorrendo até mesmo por meio de pequenas per- das do seu cotidiano. Ainda conforme o autor, cada indivíduo vê a morte e lhe atribui um sentido, dependendo da etapa em que se encontre no processo de desenvolvimento vital. Essa visão depende também da sua história de vida, de suas vivências e aprendiza- gens, de sua condição física, psicoló- gica, social e cultural. Em qualquer fase do desenvolvimento humano, a ideia da morte está presente e tem uma representação característica, trazendo um entrelaçamento entre todos os aspectos presentes no de- correr da própria vida. Nesse sentido, podemos pensar sobre os escritos de Dutra (2004), o diferencial oferecido pelo psicó- logo é uma escuta que vai além das palavras. Para o autor, o profissio- nal da Psicologia está diante, atra- vés dessa escuta, de outros meiosde comunicação e dispositivos, de uma demanda psíquica dos sofri- mentos de cada paciente, e precisa- Não existe câncer sem sofrimento. Assim, está a cargo do profissional de saúde mental compartilhar, mobilizar recursos para que as pessoas elaborem a situação vivenciada, e para que possam se ancorar, de maneira saudável, na realidade ELEMENTOS CENTRAIS DO CUIDADO PALIATIVO PARA SABER MAIS E m relação às características de elaboração e aplicação dos cuidados paliativos, Campbell (2011) elege elementos centrais dessa prática, se- gundo o National Consensus Project, sendo eles: 1) População atendida – constitui-se de pessoas que apresentam uma doença fatal incurável, dano ou condição debilitante. 2) Atenção centrada no paciente – o cuidado com cada paciente e família é único. 3) Momentos de utilização dos cuidados paliativos – ao descobrir a doença. 4) Atendimento integral – o paciente e a família são compostos pelo biopsicossocial-espiritual. 5) Equipe interdis- ciplinar – profissionais preparados tecnicamente e com suporte teórico. 6) Atenção para o alívio do sofrimento – é o preceito da filosofia do cuidado paliativo. 7) Comunicação – fundamental em todos os elementos aqui des- critos. 8) Atenção aos indivíduos com morte iminente ou em luto – infor- mações atualizadas sempre sobre prognóstico da doença. 9) Continuidade no atendimento entre diferentes setores – os cuidados paliativos devem ser utilizados em todas as esferas da saúde. 10) Acesso equitativo – cada cui- dado é individualizado. 11) Atentar para as barreiras legais – uso de opioides de forma adequada. 12) Melhorar a qualidade – buscar sempre a excelência no atendimento, e esse compromisso é de toda a equipe. dividir, mobilizar recursos, para que as pessoas consigam elaborar a situação, então, vivenciada, e para que possam se ancorar, de maneira saudável, na realidade. Para Borges (2006), o câncer traz em si a consciência da possibi- lidade de morte. Essa constatação é *�������G��\����G�H������I��IG ������������G�e�G����G�������G���������G�^����G��I���G��G����9��G�� outros não escondem o desgosto por permanecer no local www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 61 Na negação, alguns pacientes costumam procurar uma segunda opinião; outros manifestam de maneira implícita, agindo com otimismo. A equipe deve compreender a reação, que mostra a falta de preparação emocional para enfrentar esse momento A autora segue descrevendo a importância de entender como as famílias, com suas organizações típicas e diferenciadas, precisam enfrentar e lidar com os problemas ligados às situações específ icas cor- relacionadas a uma doença grave. O papel que a família desempe- nha como agente de cuidados quan- do um de seus membros adoece é considerado de extrema importân- cia. A complexidade da doença neo- plásica exige atenção não só para as necessidades físicas, como também para as demandas psicológicas e so- ciais do paciente, incluindo a par- ticipação ativa da família (Costa; LIMA, 2002). E por essa participação, reme- te-se à submissão de que a doença em si traz ao paciente, aliado ao es- tigma ainda presente de constante sofrimento. Vivenciar o processo da doença pode, na maioria dos ca- sos, significar privação da sociabi- lidade cotidiana, quebra da rotina, interrupção do curso normal da vida tanto para os enfermos quanto para seus familiares. Silva e Acker (2007) relatam o desejo do cuidador Um dos estágios do paciente de câncer, a barganha, pode desencadear um processo de depressão, no qual �����Ô������È��G��������H��� G ��� ���� G são diferentes, dada a localização, estadiamento e/ou tratamento, tor- nando-se complexo falar de uma forma genérica sobre famílias no contexto de câncer. rá entendê-lo como um sujeito que pensa, sente, fala e cria sentidos nas relações de subjetividades. Nesse modo de subjetividades, pacientes buscam, através das me- táforas, relatar sobre seu sofrimen- to. O câncer carrega em cada corpo um estigma de morte, um medo do desconhecido, uma passagem sofri- da de um futuro incerto. De acordo com Paulon (2010), devemos inter- pretar o discurso e o inconsciente humano além daquilo que está vi- sivelmente dado e do que se pode mensurar, pois esse discurso não se limita ao que está concretamente simbolizado. Familiares e cuidadores Família representa um apoio muito importante tanto na es- truturação dos vínculos afetivos como nos referenciais de seguran- ça. O paciente portador de câncer geralmente vivencia uma série de experiências emocionais. Conforme afirmam Santos e Sebastiani (2001), são manifestações psicológicas que o remetem a condições primitivas e a uma necessidade de sentir-se am- parado e protegido, principalmente pelas figuras que já ocuparam esse papel e que, no momento, estão sen- do solicitadas novamente. As famílias enfrentam grandes dif iculdades para lidar com uma doença como o câncer, e quan- to mais avançada ela se encontra, maior é o sofrimento (CARVA- LHO, 2008). Na assistência aos pa- cientes oncológicos internados, é possível perceber que os familiares vivenciam junto aos pacientes as internações prolongadas, as altera- ções bruscas de rotina e projetos de vida. Sofrem com as alterações na configuração familiar. Segundo Holland e Holahan (2004), assim como não existe uma família padrão, não existe um pa- drão de câncer. Suas consequências 62 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PSICO-ONCOLOGIA O câncer traz em si a consciência da possibilidade de morte. Essa constatação é acompanhada de angústia e temores que seguirão o paciente ao longo do tratamento. O medo é a resposta psicológica mais comum diante da morte em manter o paciente sob seus cui- dados, porém, para que isso se torne possível, há a necessidade de apren- dizado sobre o cuidado e como lidar com o sofrimento do outro. Os cuidados direcionados a pa- cientes que têm o diagnóstico de câncer, seja em qualquer estado, demandam tempo de dedicação do cuidador e isso faz com que ele abandone grande parte de suas ati- vidades cotidianas, tendo que se adaptar a uma nova rotina que in- clui dias e noites no hospital, perda de funcionamento rotineiro da vida profissional e demais exigências e demandas do tratamento (Inocen- ti; Rodrigues; Miasso, 2009). Contudo, vale ressaltar sempre o importante papel do familiar nes- se momento. Família é o cuidado, no mais puro e signif icativo tom da palavra. Acalma, acolhe e preenche lacunas de medo, solidão e tantos outros sentimentos afetivos. Pa- ciente com uma base familiar sóli- da e estruturada tem nesse alicerce da vida uma condição real de com- preender e enfrentar o câncer de maneira mais saudável. Cuidados paliativos Na década de 60, com o apare-cimento do modelo hospice, criado por Cicely Saunders, surgia o molde dos cuidados paliativos. Uma alternativa de encarar a morte como processo inerente à vida. Que ofe- recesse dignidade à pessoa humana no seu final de vida. A morte passa a não ser mais ocultada e silenciosa e, sim, fonte de cuidado de uma nova proposta de saber e poder. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o cuida- do paliativo como uma prioridade da política de saúde. Para a OMS, esse cuidado corresponde a um trabalho desenvolvido por uma equipe interdisciplinar que uti l iza estratégias de intervenção, preco- diagnóstico, e passa a ser o alívio dos sintomas, não apenas físicos, mas também de ordem espiritual e psicológica. Uma morte mais dig- na, carinho, afeto e cuidado são as ações dessa inovadora e reconheci- da f ilosofia. Em minha atividade como psi- cólogo oncológico,f ico certas ve- zes me questionando sobre nossa capacidade como seres humanos de nos relacionarmos com a obvieda- de da morte. A meu ver, de todos os fatos que nos movem, o mais forte e determinante é o medo de morrer. O ser humano vivencia em suas relações sociais diferentes formas de nizando o bem-estar e a qualida- de de v ida, promovendo o al ív io do sofrimento f ísico, social, emo- cional, espiritual e psicológico da pessoa com uma doença grave, em estado avançado e incurável, bem como seus familiares. Existe um crescente interesse no mundo pelo tema cuidado pa- liativo, principalmente por seu pa- radigma diferenciado, deslocando a atenção da cura para o cuidado, mas ainda a sua inserção no sistema de saúde é muito complicada (Boe- mer, 2009). O enfoque desse cuidado deixa de ser a cura, por uma questão de )G��G��� ��GI���GhÔ�9�G������G��������G���������I���G9������G� ��G���I���� G �� ������������G��������È�I�G�� �G��G G��I��������G� ����������IG�����G���� G��� G www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 63 O cuidado paliativo surgiu com a cria- ção do modelo hospice e, atualmente, \� ������G �� ��� ������� ������ �� I������ de saúde. Os hospices eram locais de ��IG���� �G�G� ��G G����� ��� �\I���� $0:� /�G��� �����������G9�����\I����2$29���� transformou em lugares destinados a ����H�� ����G�$��G� G����G�$���G����G:�*� hospice��� �����\����I��I��������G��- vamente recente, que apareceu no Rei- no Unido após a fundação do Hospice Saint Christopher, em 1967. Foi fundado por Dame Cicely Saunders �Modelo hospice Cada indivíduo atribui à morte um sentido dependendo da etapa em que se encontre no processo de desenvolvimento vital. Essa visão depende da sua história de vida, de suas vivências e aprendizagens, de sua condição física, psicológica, social e cultural perdas, sejam elas de ordem material, virtual ou pessoal. A forma como são enfrentadas essas perdas demonstra as características de elaboração sau- dável ou não frente à situação. Portanto, o cuidado paliativo torna-se importante no atual qua- dro de saúde mundial, pelo fato de que muitas pessoas morrem em so- frimento. E, para melhorar a quali- dade de vida dessas pessoas, não se fazem necessárias técnicas de alto valor financeiro, tendo em vista que o tratamento nas abordagens descri- tas acima complementa um círculo natural da vida humana. A morte não pode ser vencida. Desse modo, ignorar esse fato é ignorar a própria humanidade. Desenvolver ações de fortalecimento do cuidado paliativo torna-se cada vez mais precisa e ne- cessária em termos de encorajamen- to (Pessini; Bertachini; 2014). Compreensão O sofrimento que o câncer cau-sa no psiquismo do ser hu- mano retrata a importância que a Psicologia tem para poder compre- ender, desmistif icar e ressignif icar o sentido de vida e morte. A asso- ciação com o sentimento de morte iminente, por vezes, causa no pa- ciente um sentido de invalidez que inibe qualquer possibilidade de vis- lumbrar, em um futuro breve, uma qualidade de vida e conforto em seu cotidiano. A morte e seu percurso intenso, por vezes apressado, dif icultam e moldam o planejamento terapêuti- co. Proporciona uma psicoterapia focada no indivíduo e com base no contexto atual do paciente. Pensar sobre as dúvidas que per- meiam sempre o cotidiano move as pessoas e faz com que se busquem efeitos satisfatórios na rotina. A dú- vida remete a um senso crítico de poder analisar o que se deve ou não fazer. O importante é que a inter- rogação existe, senão o óbvio seria uma rotina. O concreto é assustador, pois as pessoas jamais serão iguais. Somos constantes interrogações que nos movem a todo instante. E o pensamento de que concreto mesmo nessa vida é o ponto final dela. IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K/ DI VU LG AÇ ÃO REFERÊNCIAS BARONE, K. C. Realidade e Luto: um Estudo da Transicionalidade. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. BOEMER, M. R. Sobre cuidados paliativos. USP, v. 43, n. 3, set. 2009, São Paulo. �* " -9��:��:�0:�-:�+��I��hÔ�� G�������������GI��������I��`��I��G�������� �� ��������������:� Psicologia em Estudo, v. 11, n. 2, p. 361-369, mai./ago. 2006, Maringá. CAMPBELL, M. L. Nurse to Nurse: Cuidados Paliativos em Enfermagem. Porto Alegre: Editora Artmed, 2011. �*-.��%/)$* 9��:�':�*� ��������������� G�+��I�¢��I�����Gd������IGh����G�G�G��������G��� ��������hÔ����������G������Gb �:�+��I�����G9���È�I�G���+����Ô�, v. 21, n. 2, jun. 2001, Brasília. �*-.�9�%:��:e�'$(�9� :��:�":����G�hG�¤G ����I������������������G��G�G�H��G����G�d������IGh����G�G� a enfermagem. Revista Latino-Americana de Enfermagem, v. 10, n. 3, p. 321-333, 2002. �/. �9� :������ ��Gh�����H���G�������IGh��� G�+��I�����G���^��IG��G�I��������G��� G �:� Estudos de Psicologia, v. 9, n. 2, ago. 2004, Natal. FONSECA, J. P. Luto Antecipatório. São Paulo: Livro Pleno, 2004. #*''�)�9�&:e�#*'�#�)9��:�.������G����������I�G����������G� �I������������������G G��G����� to breast cancer. Psychology and Health9�:�-Ô��+G���d��G�G� ��+��I`����9�=;;>:$)*� ).$9� �:e� *� $"/ -9�$:�":e�($�--*9��:�$:�0��È�I�G���������������� ��I�� G ����G����G�� ���GI������ oncológico em cuidados paliativos. Revista Eletrônica de Enfermagem (internet), 2009. &*0R�-9�(:�%:�Educação para a Morte:�.��G���� �����:�-Ô��+G���d��G�G� ��+��I`����9�=;;>: KÜBLER-ROSS, E. Sobre a Morte e o Morrer. São Paulo: Martins Fontes, 1977. PAULON, P. C. O silêncio como estratégia do inconsciente.�!GI�� G �� ��!�����G9���È�I�G����'���G�� de Ribeirão Preto, 2010. -�).*-9��:�.:� ��e�- ��-.$�)$9� :�1:�Acompanhamento psicológico à pessoa portadora de doenças crônica:�$�d��)" �($¢��(*)9�0:��:�*��:: -$'0�9��:��:�(:e���& 9�%:�$:��:�0:�*�I�� G ���G��G����� ���I���G����H�G�`��IG� ���G����G���� responsáveis pela pessoa portadora de neoplasia. Revista Brasileira de Enfermagem, 2007. 64 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br divã literário por Carlos São Paulo D ignidade é um sentimento que nos leva ao interesse pelas ques- tões do sofrimento de outrem, bem como a justiça – o que tor- na o homem protegido na relação com o OUTRO��%NCONTRAMOS�TAIS�REmEXÜES�NO�CON- TO�h3AMSA�APAIXONADOv��NO� LIVRO�Homens sem Mulheres, de Haruki Murakami. Nesse conto, o personagem de Franz Kafka, o Samsa do livro Meta- morfose, segue um processo inverso. Assim Murakami descreve: “Quando certa manhã acordou de sonhos in- tranquilos, encontrou-se em sua cama METAMORFOSEADO�DE�'REGOR�3AMSAv��$E� alguma maneira o inseto entendeu que se transformara em uma pessoa e que se chamava Gregor Samsa. Samsa, ao despertar em um am- biente de uma casa, aparentemente abandonado, logo tomou consciência dos temas: invasão, prisão e proteção. Começou a pensar quem era ele antes de ser Gregor. Veio à sua mente uma Aspectos desvalorizados pelos HUMANOS /3�-)4/3�3§/�#/.3425°$/3�./3�02)-2$)/3�$!� (5-!.)$!$%��#/-/�)-!').!2�/�3%.4)-%.4/�$%�*534)!�%� $)'.)$!$%�$%�5-�).3%4/�15%�3%�42!.3&/2-!�%-�(/-%-� 0!2!�2%&,%4)2�3/"2%�!3�"!3%3�).34).4)6!3�$!�03)15%� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 65 espécie de sonho que fez surgir em sua cabeça uma nuvem de mosquitos. Sua prioridade é preencher o vazio que sentia no corpo e teve que se habituar aos dilemas da vida humana em meio à guerra. Ao observar os homens e se olhar no espelho, deu-se conta de que esta- va nu. Vestiu um roupão. Chamaram à porta. Ao abri-la, viu uma jovem mu- lher com o corpo deformado – por ser corcunda –, que para ele parecia um INSETO�� 3AMSA� SE� APAIXONA� E� NÎO� SABE� por que seus genitais formam uma pro- tuberância se destacandono seu corpo vestido. A jovem viera consertar uma fechadura. Foi enviada pelos pais pela suposta facilidade que teria em passar pelas guerras lá fora. !� JOVEM� JÉ� EXPERIMENTARA� O� ABUSO� do outro e entendeu que aquele órgão, SE�EXPRESSANDO�POR�TRÉS�DO�ROUPÎO��SE- ria mais uma tentativa de humilhação e abuso. Ela reclama disso, e Samsa – em SUA�HUMANIDADE�n��TENTA�LHE�EXPLICAR�O� que só ele sente. Seu coração acelera. Vivia algo muito bom que os homens chamam de amor. A tensão entre a len- TIDÎO�DO�TEMPO�EM�QUE�SE�ESTÉ�APAIXO- nado e a aceleração desse mesmo tem- PO�QUANDO�SE�QUER�AMAR�DEIXOU�3AMSA� confuso e atraído por alguém que não sabe se voltará a ver. Sonhar é o modo que temos para entrar em contato com a natureza que SE� EXPRESSA� DE� FORMA� MITOLØGICA� PARA� resgatar os seus segredos. Quem conse- gue prestar atenção a eles terá o benefí- cio de se conhecer de verdade. Não se pode observar os sonhos com a lógica da consciência, mas com a linguagem METAFØRICA�DO�INCONSCIENTE��0ODERÓAMOS� por meio do sonho descobrir algo sobre SH UT TE RS TO CK / D IV UL GA Çà O E AR QU IV O PE SS OA L Homens sem Mulheres Autor: Haruki Murakami Editora: Alfaguara Ano: 2015 Páginas: 240 a origem de Samsa. Ele sonhou, ou veio Ì� SUA� CABE¥A�� UMA� NUVEM� DE� INSETOS�� 0ODERÓAMOS�AQUI� REmETIR� SOBRE�ASPECTOS� desvalorizados pelos humanos, ou tra- zer a ideia do incômodo ou doença que nos fazem tê-los como indesejáveis, ou ainda pensarmos nas bases instintivas da PSIQUE��O�QUE�NOS�FAZ�EXECUTAR�ATOS�SEM� USAR�A�SABEDORIA�DA�REmEXÎO�� $URANTE� O� DESENVOLVIMENTO� DA� criança, ou da humanidade, a consci- ência, à medida que evoluía, também o afastava de sua própria natureza ao ne- gligenciar a sua origem mítica. No mito DO�PARAÓSO��!DÎO�E�%VA�EXPERIMENTAM� o fruto do conhecimento e se dão conta QUE�ESTÎO�NUS�E�QUE�EXISTEM�DIFEREN¥AS� ENTRE�ELES��$ESSA�FORMA��PARA�ENTENDER- mos a natureza do homem recorremos aos mitos construídos pela humanidade em seus primórdios, época em que a consciência ainda não o tinha afastado tanto de sua própria natureza. Assim acontece com as várias guer- ras lá fora, podemos pensar nos quatro cavaleiros do Apocalipse. O primeiro, a guerra, já contém em si os outros três: a dominação, a peste e a fome. A jo- vem corcunda, em sua guerra com seu CORPO�� TROUXE� A� VERGONHA� E� HUMILHA- ção como uma barreira que a impedia de ser amada. Talvez ela represente o hESTUPRO�SOCIALv�DAS�CONVULSÜES�SOCIAIS� que é a invasão do mais forte sobre o mais fraco, ou seja, a violência e o des- respeito à integridade do outro. Na linguagem de um dos muitos mi- tos da criação, Epimeteu, na criação do !�'5%22!�¡��0/24!.4/��5-�2%35,4!$/�$!� ).#/-0%4º.#)!�0/,°4)#!��15!.$/�!�!24%� $%�'/6%2.!2�.§/�#/.3%'5%�/�2%30%)4/� !/3�6!,/2%3�).34)45°$/3�%�%34!"%,%#)$/3� !/�,/.'/�$!�6)$!�$/3�0/6/3�$%�5-!�.!§/ Carlos São Paulo é médico e psicoterapeuta junguiano. É diretor e fundador do Instituto Junguiano da Bahia. carlos@ijba.com.br / www.ijba.com.br homem, deu-se conta de que distribuíra todas as faculdades disponíveis para os animais irracionais e nada sobrou para dar ao homem que nascia nu e despro- TEGIDO�� 0ROMETEU�� IRMÎO� DE�%PIMETEU�� conseguiu roubar dos deuses o fogo e a sabedoria para dar ao homem a ca- pacidade de criar seus próprios meios necessários à vida. Com esses recursos, os homens começaram a interferir na NATUREZA�E�TER�DIlCULDADE�DE�SE�RELACIO- nar com seus pares. Os homens come- çaram a se destruir. Zeus, o deus maior do Olimpo, resolveu intervir. Compadecido, Zeus deu-lhes um de seus dons: a arte da política, constituída de dois atributos: justiça e dignidade. Na dignidade pessoal já está o sentimento DE�VERGONHA�OU�PUDOR��0ARA�:EUS��TODOS� os homens deveriam desenvolver a Arte DA�0OLÓTICA��POIS�ASSIM�DARÎO�IMPORTÊN- cia aos seus atos que serão julgados e QUALIlCADOS�PELOS�OUTROS��$O�CONTRÉRIO� não haveria harmonia social e a espécie humana desapareceria. A guerra é portanto um resultado da incompetência política, quando a arte de governar não consegue o respei- to aos valores instituídos e estabeleci- dos ao longo da vida dos povos de uma NA¥ÎO��1UANDO�FALTA�A�!RTE�DA�0OLÓTICA�� lCAMOS�SEM�A�JUSTI¥A�E�SEM�A�DIGNIDADE� PESSOAL��/�HOMEM�ENTÎO�lCARÉ� INDIFE- rente às questões do outro e se torna- rá manipulador da realidade, usando o bem coletivo em proveito próprio. %SSES�SÎO�OS�DESAlOS�DE�UM�INSETO�QUE� evoluiu para um ser racional. 66 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.brwwwwww.po.portartalcilcienciiaevididvidida.ca comom.brbbr6666 psique ciênnnciacc &vi&vidad “E stou convencido de que a memória tem uma força da gravidade. Ela sempre nos atrai. Os que têm memória são capazes de viver no frágil tempo presente. Os que não a têm, não vivem em nenhuma parte.” Nossos textos nesta coluna são escritos com alguma antecedência. Dito isso, queremos apenas registrar que resolvemos escrever sobre o lLME�Nostalgia da Luz, do sensível diretor Patricio Guzmán Lozanes, tomados pelos contraditórios sentimentos vividos no atual momento do Brasil, quando a “presidenta” eleita por mais de 54 milhões de votos está sendo afastada por um processo que tem sido denunciado dentro e fora do país como algo que não cumpre a mínima diretriz dentro da nossa Constituição. Inevitável lembrarmos, então, do período ditatorial que, não faz nem muito tempo, o país desembarcou dele, mais precisa- mente nos anos 80 do século XX. Há muito de memória traumática sen- do desenterrado no processo atual. Não é possível prever como serão os próximos tempos, um fantasma que mal começara a ser exorcizado é chamado a ser revisitado por fatores políticos que colocam em dúvida a credibilidade do processo político que ora se instaura. Muitos dos mais recentes fatos levaram-nos a pensar em Costa- -Gravas, com seu inesquecível Missing, que narra os dias que instau- raram o golpe militar no Chile. O diretor compôs o seu roteiro utili- zando o olhar de um pai, um americano conservador, republicano até ENTÎO��QUE�BUSCA�NO�#HILE�DOS�MILITARES�O�SEU�lLHO�DESAPARECIDO��/� golpe dos anos 60 em toda a América Latina é assim desenhado pelas lentes do diretor. O governo que agora está sendo destituído aqui foi o primeiro a verdadeiramente querer abrir as páginas da nossa história para apura- ção e conhecimento público. Vimos funcionar a Comissão Nacional da Verdade, que, para o nosso orgulho, tinha como um dos seus mem- bros a psicanalista Maria Rita Kehl, que esteve presente quando da O DOCUMENTÁRIO NOSTALGIA DA LUZ, DIRIGIDO POR PATRICIO GUZMÁN, MOSTRA AS CONSEQUÊNCIAS DE QUEM SOFREU COM A DITADURA MILITAR NO CHILE E REACENDE A DISCUSSÃO A RESPEITO DE UM POSSÍVEL RETROCESSO POLÍTICO NO BRASIL cinema Por Dr. Eduardo J. S. Honorato e Denise Deschamps Quando o passado bate à porta www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 67 entrega do Relatório Final à “presidenta”. Talvez essa ousadia desse governo tenha sido um dos pontos que ergueram ódios que levaram ao desfecho que parece se encaminhar tudo isso. A história acusa e, de certa maneira, talvez seja repetindo-a que se busque a explicação que atenue culpas por atos ou OMISSÜES��&OI�ASSIM��COMO�NO�lLME�Nos- talgia da Luz, o astrônomo, o arqueólogo e o arquiteto que quiseram fazer ver que o presente não existe, como é pensado no lLME��O�PASSADO�ESTÉ� SEMPRE�NOS� TRA¥OS� daquilo que pensamos como atual. Essa PODE�SER�A�GRANDE�PREMISSA�DESSE�lLME�� levando a questionamentos compartilha- dos por diversas ciências, como Astro- nomia, Física,Arqueologia e até mesmo Psicologia. O passado existe e nos brinda, e o presente nada mais é do que um frag- mento deste. /�lLME�COME¥A�DE�UMA�MANEIRA�EN- volvente, nos apresentando tanto aos imensos telescópios, ao intrigante deserto do Atacama, assim como às belas imagens do enigmático espaço. O diretor constrói SUAS� REmEXÜES� EM� BUSCA� DE� UM� PASSADO� que ali, naquele inóspito local, segundo ele a única mancha marrom em todo planeta Terra se encontra eternamente preservado Eduardo J. S. Honorato é psicólogo e psicanalista, doutor em Saúde da Criança e da Mulher. Denise Deschamps é psicóloga e psicanalista. Autores do livro �����G���G��Gd� ���� �� ���������: Participam de palestras, cursos e workshops em empresas e universidades sobre este tema. Coordenam o site www.cinematerapia.psc.br pela total falta de umidade. O que ali jaz para sempre conta a história, mas é pre- ciso querer buscá-la e enfrentar a secura das lacunas do desinteresse plantado pelos que comandaram cada período. Um lugar tipicamente inabitável, que guarda tantos segredos sórdidos de um passado político, mas também abre portas para o entendi- mento do nosso futuro enquanto raça. Interessante pensar esse documen- tário junto a um episódio insólito que invadiu o deserto do Atacama em 2011, que, repentinamente, se apresentou aos OLHOS�HUMANOS�TODO�mORIDO��COM�COLORA- ções diferentes, nos mais variados tons. Mudou por algum tempo sua aparência traduzindo uma festa que, talvez, ainda estejamos olhando tão perto, que encon- tramo-nos míopes para entender a nota, O�RECADO�DA�NATUREZA��%SSA�mORADA�DO�DE- serto ainda não pode ser compreendida. O fato é que algum fenômeno trouxe uma POSSIBILIDADE� DE� FAZER� mORIR�� TRADUZIR SE� EM�mOR��FAZER�GERMINAR�BULBOS�E�RIZOMAS� IM AG EN S: D IV UL GA Çà O que podem ter estado ali adormecidos por décadas. Invade o olhar, encanta, en- ternece, fazendo lembrar a poesia do ve- LHO�POETA�$RUMMOND��A�mOR�QUE�VENCEU� O�ASFALTO��A�mOR�QUE�A�TUDO�VENCE��A�VIDA� que insiste sempre, como os presos polí- TICOS�DE�0INOCHET��NARRADOS�NO�lLME��QUE� olhando para as estrelas encontravam dentro de si a liberdade. EXOPLANETAS Também por esses dias recebemos a notícia que, pouco antes do desligamento DElNITIVO�DO�TELESCØPIO�+EPLER��OS�ASTRÙNO- mos descobriram dentro da nossa galáxia mais de 1.200 exoplanetas e alguns apa- rentemente úmidos e com condições de ter vida ou mesmo muito parecidos aqui com a nossa Terra. O mundo solavanca mais do que nunca na marcha do progres- so e retrocesso, civilização versus barbá- rie, desenvolvimento e atraso etc. Vivemos em uma canção estelar que talvez algum dia nos possibilite olharmos para o céu e entendermos um pouco desse presente, que é sempre passado. Oito minutos leva a luz do sol para atingir nossos olhos, o que vemos não está mais lá, mas nos in- HÁ MUITO DE MEMÓRIA TRAUMÁTICA SENDO DESENTERRADO NO PROCESSO ATUAL. NÃO É POSSÍVEL PREVER COMO SERÃO OS PRÓXIMOS TEMPOS, UM FANTASMA QUE MAL COMEÇARA A SER EXORCIZADO É REVISITADO p#P��G�������\�������������I\����G�����G� ������G��Ô�����G� ��������������G���G���G�o:������I������ ���G���G��9�1����G��-�G�����G��� G�G�����G���G��G�I������G������IG��G��Ô��H����G��������G� �� �I�����P����)���G���G� G�'��9� ��I�������+G���I���"���P�:� 68 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br6868 pspsiquique ce ciêniênciacia&v&vidada wwwwww.po.portartalcilcienciiaevididvidida.ca comom.brbbr vade em sensações, luzes e sombras. Um fascínio pelo externo, pelos distantes mi- lhares de anos-luz, quando o aqui e agora não se torna tão suportável. Assim foi com os pioneiros da Astronomia do campo de concentração. Uma fuga possível para o imaginário, que acalenta e acalma. As mulheres de Calama, que durante 28 anos buscaram os restos mortais de seus parentes no deserto, presos políticos que por mais de 17 anos foram assassina- dos a mando do ditador Pinochet, miram a terra ao invés de voltarem seus olhos para as estrelas. O astrônomo diz que suas buscas deveriam merecer mais respeito do que as deles, mas que não é assim que a so- ciedade percebe aquelas que precisam en- terrar seus mortos, de certa maneira para que, tocando o passado, recuperem a capa- cidade de tocar no frágil presente, na atu- alidade de suas experiências. Temos casos semelhantes em todas as ditaduras que se espalharam pela América Latina nos anos 60. Aqui no Brasil, entre muitos outros de- saparecidos, temos o caso de Stuart Angel, lembrar-se, e o faz em nome da resistên- CIA��OU�SEJA��DE�SUA�DIlCULDADE�EM�COMPOR� novas saídas e negociações psíquicas. Se pensarmos que isso também se aplica aos fenômenos do coletivo, veremos que sob o estado de circunstâncias especiais a histó- ria se repetirá, como diz outro pensador, como uma farsa, e isso porque não há nela traço de mudança ou mesmo de presente. Ela apenas buscará recompor condições já ultrapassadas em nome de manter o “status” de uma recordação que não pode vir à tona. Os mecanismos de culpa e ver- gonha, oriundos de impulsos destrutivos, são facilmente substituídos por operações de projeções e subsequente perseguição dos objetos assim investidos. Há um traço de tragicômico nos fatos que, negando a atualidade, apenas se impõem farsantes, fazendo um avesso das atualizações da re- alidade. O discurso da repressão se ergue, então, a partir de fantasias persecutórias. “Pessoas jovens e pueris, em particu- lar, inclinam-se a transformar a necessi- dade, imposta pelo tratamento, de pres- tar atenção à sua doença, numa desculpa bem-vinda para regalar-se em seus sinto- mas” (Freud, 1914). Ao pensarmos as delicadas atualida- des que atravessam muitos dos países que antes sofreram de massivas organizações repressivas, talvez possamos aproximar uma possível leitura, entre tantas outras, do quanto agora perigosamente podem se aproximar de uma repetição, aliada às suas partes mais adoecidas e, portanto, mais resistentes a qualquer atravessamen- to da realidade para novas composições. E ESSE�lLME��DE�UMA�FORMA�REALMENTE�MUITO� original, faz ver isso com algum encanta- mento. A dor que toca, e como a toca, não produz mágoa ou ira, apenas intenta es- forços de ligação com a vida, com o con- serto, como diz outra participante do do- cumentário, que é possível compor vidas onde a ausência inenarrável não produza a sensação de uma falta tão lancinante que ela descreve como a tendo carregado como um “defeito de fabricação”. Fala isso ENQUANTO�EMBALA�EM�SEU�COLO�SEU�lLHINHO� ainda muito bebê. Então, mais do que ira lLHO�DA�ESTILISTA�:UZU�!NGEL��QUE�BUSCOU�O� CORPO�DE�SEU�lLHO�ENFRENTANDO�OS�OBSCU- ros porões da ditadura brasileira. O caso é NARRADO�EM�UM�lLME�DE�3ÏRGIO�2EZENDE�� Zuzu Angel (2006), e ela ganhou uma bela canção em sua homenagem composta por Chico Buarque de Hollanda, Angélica, que diz em certo trecho: “Quem é essa mulher. Que canta sempre esse estribilho? Só que- RIA�EMBALAR�MEU�lLHO��1UE�MORA�NA�ESCU- ridão do mar”. Vemos na letra a proximi- dade com os relatos de dor das mulheres de Calama, em suas buscas no deserto. E mesmo com todos esses relatos, documen- TOS��lLMES��CAN¥ÜES�E� TODAS�AS� FORMAS�DE� expressar a dor, violência e agressividade que esse período da história nos remete aqui no país, ainda vemos questionamen- tos e incentivos virtuais para o retorno des- se tipo de “governo”. RESISTÊNCIA Freud, em seu texto “Recordar, repe- tir e elaborar” (1914), já nos alertava sobre o fato de um paciente repetir ao invés de O GOVERNO QUE AGORA ESTÁ SENDO DESTITUÍDO AQUI FOI O PRIMEIRO A VERDADEIRAMENTE QUERER ABRIR AS PÁGINAS DA NOSSA HISTÓRIA PARA APURAÇÃO E CONHECIMENTO PÚBLICO. VIMOS FUNCIONAR A COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE����������I�����G�I��I����G���� ������� ����GIG�G9������IG���Ô����I�����9�G�������������9�G��G�� G���Ï��������G����`����� www.portalcienciaevida.com.br ou ressentimento, vemos aquilo que costu- mamos chamar de esperança. Patricio Guzmán, que é considerado um dos mais conceituados documentaris- tas latino-americanos, foi ele mesmo um exilado quando da derrubada do governo de Salvador Allende. Elabora, via seus do- cumentários, uma história que é de todo um país, seu Chile, e, ao mesmo tempo, toca em sua própria trajetória, os perigos que viveu e dos quais se salvou exilando-se em Cuba e depois na França. Talvez por ISSO�MESMO��SEU�lLME�TRAGA�TANTA�LUZ��POIS� há nele um distanciamento necessário ao narrar uma história, mas, concomitante- MENTE��ENCONTRAMOS�TODO�UM�lO�DE�AFETO� que envolve o espectador todo o tempo. Os sons que insere colocam a quem assiste suspenso em um espaço mágico que pode ser da origem, nascimento de qualquer vida, como pode também ser pensado como os mistérios e enigmas que estão inacessíveis lá no universo. SORRISOS Vemos, em determinado trecho, duas das mulheres de Calama visitando o observatório e seus sorrisos ao olharem pelos poderosos telescópios. Há em seus sorrisos algo de criança ao se voltarem para os céus, como a deixar por alguns instantes toda a miséria e dor em seus olhos cansados de avistarem o solo. Uma nova fuga da realidade para um externo repleto de mistérios e que acalmam nos- sas angústias. Dizem alguns pensadores da atualidade que a grande revolução será operada pelas mulheres, sua obs- tinação, com certeza, tem enfrentado ao longo da história as mais poderosas forças. “Ergue os olhos, Hanah. Ergue os olhos!” (trecho do discurso no genial lLME�DE�#HARLES�#HAPLIN��O Grande Dita- dor, 1940). Sabemos, então, que, por isso mesmo, há sempre uma estratégia de as calarem nos momentos-chave de emba- te. As bruxas estão aí para nos lembrar disso, com forte simbolismo que a força do feminino traz. O homem do capital não contempla o desamparo, não perce- be seu adoecimento, prefere a dominação com mais propriedade. Quando não po- demos criar mecanismos que possibilitem isso, podemos assistir àquilo que se no- meia como “peste emocional”, que pode ser comparada ao próprio surgimento do que se chama “o ovo da serpente”. Talvez ESSA� TAREFA� SEJA� O� QUE�� AO� lNAL�� AS� LENTES� de Guzmán tão delicadamente propõem. A história tem muito a contribuir com o que vivemos como atual na subjetividade e, talvez, na verdade, como propõe, toda experiência seja, na verdade, passado. Vida e morte são entrelaçadas com lOS� INSEPARÉVEIS� DE� PASSADO� E� PRESENTE�� compondo futuros incertos. O diretor já AlRMOU�QUE� hGRANDE�PARTE�DOS� CHILENOS� não fala da História, ignoram-se os mas- sacres e as perseguições, o desprezo pe- los índios, ou o verdadeiro contexto por detrás dos golpes de estado”. Sabemos, por outro lado, que o Brasil foi um dos últimos países a querer entender o que aqui se passou em tempos recentes da última ditadura. Muito ainda nos assom- bra com uma negação em algo mesmo próximo ao que ele narra em Nostalgia da Luz. Tempos obscuros se combatem com o estudo da História e muita claridade NAS�DISCUSSÜES� FUNDAMENTAIS��%SSE�lLME� é inspirador quanto a esse aspecto. IM AG EN S: D IV UL GA Çà O AS MULHERES DE CALAMA, QUE POR 28 ANOS BUSCARAM OS RESTOS MORTAIS DE SEUS PARENTES NO DESERTO, PRESOS POLÍTICOS QUE POR MAIS DE 17 ANOS FORAM ASSASSINADOS A MANDO DE PINOCHET, MIRAM A TERRA AO INVÉS DE VOLTAREM SEUS OLHOS PARA AS ESTRELAS )���G���G� G�'��:�.^�����������G�d�)���G���G� ���G�'��:��������d�+G���I���"���P�:� +G^���d�!�G�hG9������9� ��G��G9�����G��G��� /�:�"È����d���I�����P���:� ���GhÔ�d�D;��������:����� ���G�hG�����d�=;<;:�������H�� ��Gd� ��!����¤ ������!�����:���G���IGhÔ�d�<=�G���: negando todo feminino, a mãe terra e a vastidão das galáxias. Sabemos que trabalhar as resistências é uma das tarefas mais árduas de um ana- lista na condução de uma análise. Talvez ao pensarmos em mudanças coletivas ti- véssemos que voltar um olhar mais apro- fundado para onde deixarmos de levar essa discussão. Em termos do público foi o teórico Wilhelm Reich quem abordou isso �� ��G ��G� ��+���I��������I�����������G���� ��I� G Ô��� ��G�G��I�����:���H��IG�������I��������� �������� ���G�G�G�\�GH�� G G� ������G����I���G�����������G� 70 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PERlL Por Anderson Zenidarci O ESCRITOR E POETA EDGAR ALLAN POE É CONHECIDO POR SUAS HISTÓRIAS QUE ENVOLVEM SUSPENSE, TERROR E O MACABRO. SUA VIDA SE CONFUNDE COM SEUS CONTOS DE MISTÉRIO A VIDA que imita a ARTE U m dos primeiros escritores americanos de contos e con- siderado o inventor do gênero lC¥ÎO� POLICIAL� TAMBÏM� TEM� UMA� GRANDE� CONTRIBUI¥ÎO� AO� GÐNERO� DE� lC¥ÎO�CIENTÓlCA��.ASCEU�COMO�%DGAR�0OE� NA�CIDADE�DE�"OSTON��lLHO�DE�ATORES�MAM- BEMBES� DE� ORIGEM� ESCOCESA IRLANDESA�� ANTES�DOS� TRÐS� ANOS�lCOU�ØRFÎO�DE�MÎE�� QUE�MORREU�POUCO�DEPOIS�DE�DAR�A�LUZ�A� SUA�IRMÎ�CA¥ULA�E�DE�TER�SIDO�ABANDONADA� PELO� MARIDO�� DEVIDO� TANTO� A� COMPLICA- ¥ÜES�NO�PARTO�COMO�A�TUBERCULOSE��$EI- XOU�OS�TRÐS�lLHOS�ØRFÎOS��QUE�FORAM�CADA� UM� PARA� UM� DESTINO� DIFERENTE�� %LE� FOI� ACOLHIDO�PELO�CASAL�&RANCIS�E�*OHN�!LLAN�� rico empresário que morava na cidade de 2ICHMOND�� NO� ESTADO� DA� 6IRGÓNIA�� MAS� NUNCA�FOI�FORMALMENTE�ADOTADO��EMBORA� *OHN�TENHA�LHE�DADO�O�SEU�SOBRENOME��FA- ZENDO�COM�QUE�SE�CHAMASSE��A�PARTIR�DE� ENTÎO��%DGAR�!LLAN�0OE��$ESDE�PEQUENO� FOI�MAIS� APEGADO�Ì�MÎE�ADOTIVA�DO�QUE� ao pai, que permanecia sempre distante, O�QUE�ESTIMULOU�A�DIFÓCIL�RELA¥ÎO�ESTABELE- CIDA�ENTRE�OS�DOIS�A�PARTIR�DA�ADOLESCÐN- cia do escritor, permeada por constantes BRIGAS�E�DISCUSSÜES�QUE�AMBOS�TERIAM�AO� LONGO� DA� VIDA�� #OM� A� TAMBÏM� PRECOSE� MORTE� DA�MÎE� ADOTIVA�� SEU� PAI� VOLTOU� A� SE�CASAR�� COM�UMA�MULHER�MUITO� JOVEM� QUE� LHE� DEU�DOIS� lLHOS�� E� QUE� O� REJEITA- va veementemente, pois o via como uma AMEA¥A��)SSO�IMPEDIU�QUE�0OE�SE�TORNASSE� HERDEIRO�DA�FORTUNA�PATERNA��E�ELE�SE�AFAS- tou da casa do pai adotivo. Frequentou A�5NIVERSIDADE�DA�6IRGÓNIA� SOMENTE�POR� um semestre, passando a maior parte do TEMPO� ENTRE� BEBIDAS� E� MULHERES�� !PØS� UMA�SÏRIE�DE�DISCUSSÜES�COM�O�PAI��FUGIU� DE�CASA�PARA� SE� ALISTAR�NAS� FOR¥AS� ARMA- das, onde serviu durante dois anos antes de ser dispensado. O pai, a contragosto, USOU�SUA�INmUÐNCIA�E�O�AUXILIOU�A�ENTRAR� NA�!CADEMIA�-ILITAR�DE�7EST�0OINT��TEN- TANDO�MANTÐ LO�NA�CARREIRA�MILITAR��-AS� EM�VIRTUDE�DA�SUA�PROPOSITADA�DESOBEDI- ÐNCIA�A�ORDENS��USO�DE�ÉLCOOL� E� ENVOLVI- MENTO�COM�JOGOS�DE�AZAR��ELE�ACABOU�POR� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 71 IM AG EN S: W IK IP ED IA / A RQ UI VO P ES SO AL /S HU TT ER ST OC K ALLAN POE ERA CHAMADO DE CRÍTICO LITERÁRIO CRUEL, POR SUAS CRÍTICAS CÁUSTICAS. EM TOM DE RECLAMAÇÃO, DIZIAM QUE ELE USAVA ÁCIDO PRÚSSICO AO INVÉS DE TINTA Anderson Zenidarci é mestre em Psicologia pela PUC-SP, supervisor e palestrante. Coordenador e professor do curso de Especialização em Transtornos e Patologias Psíquicas pela Facis, professor de pós-graduação no curso de Psicologia de Saúde Hospitalar na PUC-SP. Atua há mais de 30 anos em atendimento clínico em diversos segmentos da Psicologia, com especial dedicação à psicossomática, transtornos e patologias psíquicas. APARECEM� SEUS� CONTOS�MAIS� CONHECIDOS�� COMO�h/�GATO�PRETOv��h/�BARRIL�DE�!MON- TILLADO�� h-ANUSCRITO� ENCONTRADO� NUMA� GARRAFAv�E�h!�MÉSCARA�DA�MORTE�ESCARLA- TEv��CONSIDERADO�OBRA PRIMA�DO�TERROR�� 3UA�MORTE��E�O�MISTÏRIO�QUE�A�CERCA�� PODERIA� PERFEITAMENTE� SER� UM� DE�SEUS� CONTOS� DE� SUSPENSE�� 0OE� FOI� ENCONTRADO� NAS� RUAS�DE�"ALTIMORE�� APØS� TER�DESAPA- RECIDO�ALGUNS�DIAS��SUJO��VESTIA�ROUPAS�QUE� NÎO�ERAM�SUAS�E�APRESENTAVA�UM�ESTADO� de delirium tremens�� &ALECEU� NO� HOSPITAL� QUATRO� DIAS� DEPOIS�� .ESTE� PERÓODO�� ELE� NÎO� CONSEGUIU� ESTABELECER� UM� DISCURSO� SUlCIENTEMENTE�COERENTE�QUE�PUDESSE�EX- PLICAR�COMO�TINHA�CHEGADO�Ì�SITUA¥ÎO�NA� QUAL�FOI�ENCONTRADO��!�CAUSA�DE�SUA�MOR- TE�PREMATURA��AOS����ANOS��Ï�DESCONHECI- DA��POLÐMICA�E�CONTROVERSA��&OI�POR�DIVER- SAS�VEZES�ATRIBUÓDA�AO�ÉLCOOL�� CONGESTÎO� CEREBRAL�� CØLERA�� SÓlLIS�� DROGAS�� DOEN¥AS� CARDIOVASCULARES�� SUICÓDIO�� TUBERCULOSE�� DOEN¥AS�CEREBRAIS�RARAS�� /�FATO�Ï�QUE��COMO�EM�ALGUNS�DOS�SEUS� CONTOS��A�VERDADE�JAMAIS�SABEREMOS� BÏM�ESCREVEU�SÉTIRAS��CONTOS�DE�HUMOR��E�� COMO�EFEITO�CÙMICO��USOU�A�IRONIA�E�A�EX- TRAVAGÊNCIA�DO�RIDÓCULO��MUITAS�VEZES�NA� TENTATIVA�DE�LIBERAR�O�LEITOR�DA�CONFORMI- DADE� CULTURAL�� %RA� CONHECIDO� COMO� UM� CRÓTICO� LITERÉRIO� CRUEL�� POR� SUAS� CRÓTICAS� CÉUSTICAS��/S�AUTORES�DIZIAM��EM�TOM�DE� RECLAMACÎO��QUE�ELE�USAVA�ÉCIDO�PRÞSSICO� AO�INVÏS�DE�TINTA�� 3UAS� OBRAS� INmUENCIARAM� A� LITERATURA� DO�MUNDO��EM�CAMPOS�ESPECIALIZADOS��TAIS� COMO�A�COSMOLOGIA��CIÐNCIA�QUE�TRATA�DAS� LEIS�GERAIS�QUE�REGEM�O�UNIVERSO �E�A�CRIP- TOGRAlA��ESCRITA�POR�MEIO�DE�SINAIS�CODIl- CADOS��PARA�QUE�POSSA�SER�LIDO�E�ENTENDIDO� SOMENTE�POR�QUEM�DETENHA�A�SENHA�DE�SUA� DECODIlCA¥ÎO �� 5SOU� DAS� PSEUDOCIÐNCIAS� MUITO�EM�hMODAv�NA�ÏPOCA��COMO�A� FRE- NOLOGIA��ESTUDO�DA�ESTRUTURA�DO�CRÊNIO�QUE� determina o caráter e a capacidade men- TAL �E�A�lSIOGNOMIA (TÏCNICA�DE�COMPREEN- SÎO� DO� COMPORTAMENTO� E� PERSONALIDADE�� POR�MEIO�DA�OBSERVA¥ÎO�DAS�CARACTERÓSTICAS� DOS�TRA¥OS�FACIAIS�E�CORPORAIS ��/�USO�DES- SES�RECURSOS�EM�SEUS�ESCRITOS�FASCINAVA�O� PÞBLICO�LEITOR��!�COMO¥ÎO�CRIADA�POR�SUAS� FA¥ANHAS�CRIPTOGRÉlCAS�DESEMPENHOU�UM� PAPEL� IMPORTANTE�EM�POPULARIZAR� CRIPTO- GRAMAS�EM�JORNAIS�E�REVISTAS�� 0OSSUÓA�UMA�AlADA�HABILIDADE�ANALÓ- TICA�� BEM� EVIDENTE� EM� SUAS� HISTØRIAS� DE� DETETIVE��QUE�SE�PERMITIA�DESCREVER�AO�PÞ- BLICO�O�PERlL�DO�ASSASSINO�POR�SEU�modus operandi�� 3EU� TRABALHO�APARECE�AO� LONGO� DA�CULTURA�POPULAR�NA�LITERATURA��MÞSICA�� lLMES�E� TELEVISÎO��0OE�Ï�UM�ESCRITOR�ES- TUDADO�E�CULTUADO��%NTRE�SUAS�OBRAS�DES- tacam-se: O Corvo, Annabel Lee�E�O�VOLU- me Histórias Extraordinárias� ����� ��ONDE� STICAS.STICAS.TICASS SER�EXPULSO�DESTA�ACADEMIA��EM�������FATO� PELO�QUAL�SEU�PAI�ADOTIVO��OFENDIDO��O�RE- PUDIOU�ATÏ�A�SUA�MORTE�� %M�������CONSEGUINDO�SE�MANTER�POR� meio dos seus escritos, casa-se em segre- DO�COM�A�SUA�PRIMA�6IRGÓNIA�#LEMM��DE� ���ANOS��1UATRO�ANOS�DEPOIS�ELA�COME¥OU� A�SOFRER�DE�TUBERCULOSE�E�MORREU�APØS�SEIS� ANOS�� 6IÞVO�� TENTOU� UM� RELACIONAMENTO� COM�3ARAH�(ELEN�7HITMAN��QUE�O�REJEI- tou em virtude do comportamento errá- TICO��DESREGRADO�E�ALCOØLICO�� .A�ÏPOCA��0OE� TENTOU�O�SUICÓDIO�POR� SOBREDOSAGEM�DE�LÉUDANO��E�REGRESSOU�Ì� CIDADE�DE�2ICHMOND��ONDE�RETOMOU�A�RE- LA¥ÎO�COM�UMA�PAIXÎO�DE�INFÊNCIA��3ARAH� %LMIRA� 2OYSTER�� ENTÎO� VIÞVA�� 4AMBÏM� NESSE� RELACIONAMENTO� TEVE� PROBLEMAS� PELO�SEU�ALCOOLISMO��%LE�ERA�UMA�PESSOA� SOLITÉRIA��DIZIA�POUCO�SOBRE�SI��UM�DESCO- NHECIDO�MESMO�PARA�OS�MAIS�PRØXIMOS�� "EBIA�MUITO� E� SEMPRE� JOGAVA�� SAÓA� COM� PROSTITUTAS� FREQUENTEMENTE�� 0ARECIA� NÎO� PERTENCER�A�LUGAR�NENHUM�� !LÏM� DE� ESCRER� COMPULSIVAMENTE� E� SER��BRILHANTE�NO�GÐNERO�DE�HORROR��TAM- -�G���H�G�������I�G�G��G������G���G� ����� �9� ���IG���������I�G���G ��9��G���I����G� I��������G���G�I�������GG +��������^G���G�GG G��GH��� G ��G�G�^��IG9�H��� ��� ����������G������`��G�� �� ������� www.portalcienciaevida.com.br SH UT TE RS TO CK utilidade pública Por Roberta de Medeiros A PERDA DO CÔNJUGE É O TIPO DE LUTO QUE COM MAIS FREQUÊNCIA RESULTA EM ENCAMINHAMENTO PSIQUIÁTRICO, POR ISSO O TEMA, TÃO DELICADO, NÃO PODE SER ENCARADO COMO UM DADO ESTATÍSTICO QUALQUER 72 psique ciência&vida DIFICULDADE em superar a VIUVEZ morrer depois de perder sua esposa é de 21%, independentemente do fato de estar doente ou não. A percentagem é de 17% para as mulheres. A análise do médico e sociólogo Nicholas Christakis, da Universidade Harvard, e do sociólogo Paul Allison, da Universidade da Pensilvânia, tam- bém deixou claro que dependendo da garem a morrer também pouco tempo depois da separação. Casos assim são frequentes, apon- tou uma pesquisa feita nos Estados Unidos. O estudo avaliou o impacto do luto na saúde e bem-estar de mais de meio milhão de casais de idosos entre 65 e 89 anos. De acordo com o levantamento, a chance de um homem A morte de uma pessoa da fa- mília é sempre uma experi- ência traumática, superada a duras penas. A perda do companheiro é ainda mais complica- da, muitas vezes f ica a ausência, uma espécie de morte em vida. Em alguns casos, o abalo é tão forte que acaba sendo inevitável muitas pessoas che- www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 73 SITUA¥ÎO� A� INTERNA¥ÎO� JÉ� Ï� SUlCIENTE� para aumentar o risco de morte do côn- juge. A probabilidade é de 4,5% para os homens e de 2,7% para as mulheres. Cerca de um mês após a morte ou internação do parceiro, a ameaça do outro também morrer chega a 61% e se mantém alta durante um período de até dois anos, mostra o levanta- mento. Isso se deve ao fato de que a morte do marido ou da mulher provo- ca níveis altíssimos de estresse, além de outras perdas que vêm por tabela, como abalos na vida social, emocio- nal e até mesmo econômica. Não é o caso de encarar um tema tão delicado como um dado estatísti- co qualquer. Pelo contrário, observam os sociólogos. Segundo eles, os dados sugerem uma nova óptica, a de que os parentes e prof issionais da saúde de- veriam dar maior atenção aos recém- -viúvos, uma medida preventiva capaz de proteger a saúde deles quando per- dem seus vínculos afetivos. O impacto da perda também vai depender da doença que causou a morte ou internação da pessoa. Al- gumas doenças, por características particulares, acabam gerando um desgaste emocional muito maior aos familiares e ao cônjuge. Em caso de insuf iciência cardía- ca, fratura de quadril ou uma doença pulmonar crônica, como o enf isema, a probabilidade de morte do compa- nheiro aumentava de 11% a 15%, mos- trou o estudo. O mesmo não se dá em relação à hospitalização ou morte por câncer no intestino, por exemplo. Mas é a doença mental que mais abala a saúde do parceiro. A interna- Já os evitadores demonstram arre- pendimento habitual após a perda. As pesquisas revelam que o sentimento de culpa é o mais comum. “Você tem re- morsos por algo que disse ou fez, mas agora não pode mais consertar?”, per- guntaram os pesquisadores. Mais da metade das pessoas enlutadas entre- vistadas pelo estudo de Parkes respon- DEU�AlRMATIVAMENTE�� Outra pesquisa feita em Harvard en- tre jovens viúvos e viúvas mostra que, QUANDO�ERAM�ALTOS�OS�CONmITOS�MATRIMO- niais, havia baixo sofrimento emocional durante as primeiras semanas de luto. 0ORÏM��O�LUTO�DO�GRUPO�CONmITUOSO�PIO- rou e prolongou-se. Após quatro anos da morte, os viúvos ainda lamentavam o parceiro perdido. Já no caso dos relacio- namentos dependentes, o luto era dura- douro e intenso desde o início. Viúvos inseguramente apegados a seus parceiros sofriam mais de raiva, isolamento social, culpa, ansiedade de morte, sintomas somáticos, desespe- ro, despersonalização e pensamentos recorrentes do que as pessoas segura- mente apegadas. /UTRO� FATO� QUE� INmUENCIA� O� LUTO� COMPLICADO� Ï� A� AUSÐNCIA�DA�lGURA�DO� lLHO�� 0ESSOAS� QUE� HAVIAM� PERDIDO� O� lLHO�FORAM�MAIS�ASSOLADAS�POR�PENSA- mentos de perda. A perda de um parceiro dá margem ao surgimento de sentimento de solidão mais severoque outros tipos de perda. Alguns autores mostram que a propor- ção de enlutados pela perda do cônjuge que disseram estar muito solitários não era maior entre aqueles que moravam sozinhos do que aqueles que viviam com outras pessoas. O que nos leva a crer que viver com outras pessoas não reduz, necessariamente, a solidão da- queles que perderam o parceiro. PESQUISA SUGERE QUE OS PARENTES E PROFISSIONAIS DA SAÚDE DEVERIAM DAR MAIOR ATENÇÃO AOS RECÉM-VIÚVOS, UMA MEDIDA PREVENTIVA CAPAZ DE PROTEGER A SAÚDE DELES QUANDO PERDEM SEUS VÍNCULOS AFETIVOS �H���G� ��(� ������\� ���G����G�I����^IG:� ¢�G��d���H���G:�����I���I�G�²��G��:I�� ção por esquizofrenia (doença que causa delírios, alucinações e drásticas alterações na forma de pensar e ex- pressar suas emoções), perda gradativa da memória ou da capacidade de julga- mento podem comprometer, e muito, o bem-estar dos mais próximos. Nesse caso, o risco de morte sobe para 32%. Isso porque os distúrbios psiquiátricos crônicos causam so- frimento para o resto da vida, com mudanças profundas na qualidade da convivência entre o casal e demais fa- miliares. Também há sempre uma de- pendência muito grande em relação ao parceiro. No livro Amor e Perda, o psiquiatra Colin Murray Parkes mostra que a re- ação do cônjuge ao luto depende do tipo de vínculo que tinha com os pais ou cuidadores durante o seu desen- volvimento. Ele estabeleceu padrões de amor que inf luenciam a maneira como as pessoas veem o mundo. Isto determina a forma como os adultos reagem à morte da pessoa querida. Os cuidados parentais problemáti- cos, por exemplo, acarretam na vulne- rabilidade na infância, inf luenciando os relacionamentos na vida adulta e o nível de sofrimento emocional decor- rente do luto. Uma pesquisa feita em Harvard mostra que ter uma relação dependente na vida adulta foi um dos preditores mais poderosos das rea- ções problemáticas de luto. 74 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br NOVAS TÉCNICAS Novas perspectivas para GESTÃO de PESSOAS NOVAS TÉCNICAS Novas perspectivas para GESTÃO de PESSOAS www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 75 SH UT TE RS TO CK Dionízio Costta Jr. é psicólogo organizacional, professor e pesquisador. Diretor de Pesquisa e Desenvolvimento da ABRH- PE – Associação Brasileira de Recursos Humanos. Coautor do livro Coaching – Aceleração de Resultados (Editora Ser Mais).Por Dionízio Costta Jr. O counseling organizacional é uma ferramenta que utiliza o conhecimento técnico de uma pessoa para aconselhar de maneira sistemática �����������G��G����G��G�� �I������G��� G�������G�9��������� G��H��\IG���G�G���G��� G PPPPPPPooooooorrrrrrrrr DDDDDDiiiiiiiooooooooonnnnnnnníííííííízzzzzzzziiiiiiiioooooooo CCCCCCooooooossssssssttttttttttttttttaaaaaaa JJJJJrrrrrrrr.... Por Dionízio Costta Jr. OOOOOOOO ccccccccoooooooouuuuuuuuunnnnnnnnnnnssssssssseeeeeeeeeeellllllllliiiiiiiinnnnnnnnnnggggggggggggg oooooooorrrrrrrrrrrgggggggggggggaaaaaaaaaannnnnnnnnniiiiiiiizzzzzzzzzzzaaaaaaaaaaccccccccccciiiiiioooooooooonnnnnnnnnnaaaaaaaaaaallllllllll ééééééééééé uuuuuuuuuummmmmmmmmmmaaaaaaaaaa fffffffffffeeeeeeeeeeerrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrraaaaaaaaaammmmmmmmmmmeeeeeeeeeeennnnnnnnnntttttttttttaaaaaaaaaa qqqqqqqqqquuuuuuuuuueeeeeeeeeee uuuuuuuuuuttttttttttttiiiiiiiilllllllliiiiiiiizzzzzzzzzzzaaaaaaaaaa oooooooo ccccccccoooooooonnnnnnnnnnhhhhhhhhhhheeeeeeeeeeecccccccccciiiiiiimmmmmmmmmmeeeeeeeeeeennnnnnnnnnttttttttttttooooooooo tttttttttttéééééééééééccccccccccnnnnnnnnnniiiiiiiicccccccccoooooooo ddddddddddeeeeeeeeeee uuuuuuuuuummmmmmmmmmmaaaaaaaaaa pppppppppppeeeeeeeeeeessssssssssssssssssooooooooooaaaaaaaaaa pppppppppppaaaaaaaaaaarrrrrrrrrrraaaaaaaaaa aaaaaaaaaaacccccccccccoooooooonnnnnnnnnnssssssssseeeeeeeeeeelllllllllhhhhhhhhhhhaaaaaaaaaarrrrrrrrrrr ddddddddddeeeeeeeeeee mmmmmmmmmmmaaaaaaaaaannnnnnnnnnneeeeeeeeeeeiiiiiiiiirrrrrrrrrraaaaaaaaaa sssssssssiiiiiiiiisssssssssttttttttttteeeeeeeeeeemmmmmmmmmmmáááááááááátttttttttttiiiiiiicccccccccaaaaaaaaaa ���������������������������������������������������������������������������������������������������GGGGGGGGGGG���������GGGGGGGGGGG��������������������������������GGGGGGGGGG�������������GGGGGGGGGG���������� �����������IIIIIIIIII�������������������������������������������������GGGGGGGGGG������������������� GGGGGGGGGG���������������������������������������������������������������������GGGGGGGGGG���������9999999������������������������������������������������������������������� GGGGGGGGGG������������HHHHHHHHHHH���������������������\\\\\\\\\\\IIIIIIIIGGGGGGGGGG���������������������GGGGGGGGGGG����������GGGGGGGGGG��������������������GGGGGGGGGG������������������� GGGGGGGGGG O counseling organizacional é uma ferramenta que utiliza o conhecimento técnico de uma pessoa para aconselhar de maneira sistemática �����������G��G����G��G�� �I������G��� G�������G�9��������� G��H��\IG���G�G���G��� G 76 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br NOVAS TÉCNICAS ABORDAGEM SEM HIERARQUIA PARA SABER MAIS O psicólogo norte-americano Carl Ransom Rogers (1902-1987) teve atuação marcante na terceira força da Psicologia (corrente humanista), além de ter sido um dos principais nomes da Abordagem Centrada na Pessoa. Dedicou-se à I������hÔ�� ������\�� ��I����^I���G�+��I�����G9�����������I����I� ����������� ����È���� G�����I�GhÔ�������IG�G� ��+��I�����G9����� G �� G���G����������� ����� ����G�� G� \IG G� ��<D@;:�.G�H\��������� �������������������� ��������P��I�� G�I�^��IG����I��`��IG:� ������ ��I�� G�G� G������h����� �I������G�� G�+��IG�P����� �� ��H��G��������:�+�������9�I�������G�GH�� G������`���G9�������I��G�G�� ����IG�� a pessoa em terapia como paciente ou doente, característica das duas primeiras correntes à época, e apontou a importância da relação da pessoa e do terapeuta, ���9������G�I��I��hÔ�9�����G�����G������Ô�������^G������hÔ�� ������G����G:���� I����P���� ������G�� ��� È�I�G�� ������G�����9�I� G� G���hÔ�����I��I����G�G��G� � ��G� �������� ���������G�������G���G���������HP��IG9� ������I��I�����I�����G�� �������G���������G����Ô����G�������IG G9��G��G� ��G� ���� ������9��G���� G �9��� �bI����HP��I�� G�������G�� G �����G�G���� ������G�O��Gb ����G��H��¢���G�:�!�I��� famoso por elaborar um método psicoterapêutico centrado no próprio paciente. O ���G����G����� �� �������������G����GhÔ�� ��I��G�hG�I���G������G��G�G�������G� encontre sozinha sua própria cura. Counseling é uma abor-dagem profissional e pessoal com foco específico no desen-volvimento do ser hu- mano, que visa otimizar suas capaci- dades. É desenvolvida com atividades estruturadas de acompanhamento, desenvolvimento e resultado. Basica- mente, consiste em uma pessoa que, dotada de conhecimento técnico, ex- periência de vida pessoal e profissio- nal, aconselha de forma sistemática e dedicada o outro a tomar as decisões mais assertivas, e que sejam benéficas para sua vida. Quem aconselha ganha o nome de counselor e quem recebe o Quem aconselha ganha o nome de counselor e quem recebe o aconselhamento é chamado de counselee. Essa atuação pode existir de duas formas: amadora (de maneira informal e aleatória) ou profissional (de modo sistemático e com frequência) rendo presbiteriano Jay Edward Adams, professor e conselheiro. Entretanto, sua abordagem foi criticada por seu grau elevadíssimo de subjetividade. Todos, em algum momento da vida, serviram como conselheiro para alguém, orientando-o a tomar as me- lhores decisões, ou em outras ocasiões foi aconselhado, direcionado a fazer as melhores escolhas. Entretanto foi com Carl Rogers (8/1/1902-4/2/1987), �Referência mundial A American Counseling Association – ACA é uma organização profissional e educacional sem fins lucrativos, que tem por objetivo se dedicar ao desenvolvimento e à valorização da atividade de aconselhamento. Criada em 1952, nos Estados Unidos, é considerada a maior associação do mundo no setor, representan- do exclusivamente conselheiros profissionais em inúmeros cenários da prática da atividade. Conta com mais de 55 mil membros. aconselhamento é chamado de coun- selee. Essa atuação pode existir de duas formas: amadora (de maneira in- formal e aleatória) ou profissional (de modo sistemático e com frequência). A aplicação do counseling é milenar. É possível perceber ao longo do proces- so histórico a existência de aconselha- mento em todas as sociedades, desde os povos indígenas até as grandes coroas da Idade Média. Todavia, observa-se sua atuação mais fortemente na religião. Alguns teóricos atribuem a origem da técnica de counseling ao cristianismo como uma ação natural dentro das co- munidades eclesiásticas. Nesse meio, se destaca a contribuição dada pelo reve- *���������G������G��G�I���I���������� GH�� G� ������G���������G���������G���� desenvolvimento do ser humano, otimizando suas capacidades www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 77 psicólogo que fundamentou as carac- terísticas que hoje são usadas no desen- volvimento humano. A premissa básica do counseling é colocar o ser humano no centro de toda ação, antes mesmo do problema. A definição de Rogers (1942) para counseling é a seguinte: “Uma sé- rie de contatos diretos com o indivíduo com o objetivo de lhe oferecer assis- tência na modificação de suas atitudes e comportamentos. Consiste em uma relação permissiva que oferece ao indi- víduo oportunidade de compreender a si mesmo e a tal ponto que habilita a tomar decisões em face de suas novas perspectivas”. A partir de leitura de San- tos e apresentada por Scorsolini-Comin acerca de Rogers, o aconselhamento pode ser compreendido como um “[...] método de assistência psicológica des- tinada a restaurar no indivíduo suas condições de crescimento e de atualiza- ção, habilitando-o a perceber, sem dis- torções, a realidade que o cerca e a agir, nessa realidade, de forma a alcançar am- pla satisfação pessoal e social” (p. 7). Sua atuação organizacional nasce no início da década de 1940, na Europa, e fortemente nos Estados Unidos, onde existe a maior associação de aconselhamento no mundo: a ACA – American Counseling Association. Definições Scorsolini-Comin ainda expõe outras definições sobre acon- selhamento: Erickson (1951) - Re- lação entre duas pessoas na qual um dos participantes assumiu ou foi levado a assumir a responsabi- lidade de ajudar o outro. O cliente tem possíveis necessidades, proble- mas, bloqueios ou frustrações que deseja tentar satisfazer ou modifi- car. O bem-estar do cliente consti- tui o interesse central da situação. Shostrom e Brammer (1952) - Rela- ção objetiva e recíproca entre duas pessoas, em que uma, com forma- ção específica, auxilia a outra a mo- dificar-se ou a mudar seu ambiente IMAG EN S: S HU TT ER ST OC K Todas as pessoas, em algum momento da vida, serviram como conselheiras para alguém, orientando-o a tomar as melhores decisões, ou em outras ocasiões foi aconselhado, direcionado a fazer as melhores escolhas mudanças em uma ou mais das seguin- tes áreas: comportamental; construtos pessoais; capacidade de ser bem-suce- dido nas situações de vida, de forma a aumentar ao máximo as oportunidades e reduzir ao mínimo as condições de decisão. O aconselhamento deve resul- tar em comportamento livre e respon- sável por parte do cliente, acompanha- do de capacidade para compreender e controlar a ansiedade. Sheeffer (1980) - Relação face a face entre duas pessoas, na qual uma delas é ajudada a resolver dificuldades de ordem educacional, profissional, vital e a utilizar melhor os seus recursos pessoais. No Brasil sua atuação é pequena, quase inexistente, com pouca literatu- ra especializada e serviços oferecidos. Isso acontece devido ao grande equívo- co em se achar que tudo precisa de coaching. A confusão é feita, geral- mente, porque pessoas não dotadas de capacidade para diagnosticar a necessidade da ferramenta, levando em consideração a carência do in- divíduo, recomendam coaching por ser algo da moda ou com a desculpa de que deu certo na empresa tal. Para tudo indicam o coaching, achando que essa ferramenta é a solução de todos os males. Não é! O coaching é incrível em seus resultados, mas quando aplicado para quem precisa de um processo de coaching. Não é difícil até mesmo os teóricos confun- direm o counseling com o coaching e o mentoring. Essas tão poderosas ferramentas têm pontos em comum, mas quando se debruça a compreen- der cada uma delas, percebe-se que existem diferenças alarmantes, e é justamente essas particularidades (p. 1). Mac Kinney (1958) - Relação in- terpessoal na qual o conselheiro assiste o indivíduo na sua totalidade psíquica a se ajudar mais efetivamente a si pró- prio e ao seu ambiente. Stefflre (1976) - Indica um relacionamento profissio- nal entre um orientador preparado e um cliente. Esse relacionamento, ge- ralmente, se verifica apenas entre duas pessoas, embora, às vezes, possa envol- ver mais de duas, e destina-se a auxiliar o cliente a compreender e ver melhor seu espaço vital, de modo a fazer esco- lhas significativas, com base em infor- mações, de acordo com sua natureza essencial nas áreas onde haja escolha para ele fazer. Patterson e Eisenberg (1988) - Processo interativo caracteri- zado por uma relação única entre con- selheiro e cliente, que leva este último a Há indicações de que o counseling é milenar, com registros da existência de aconselhamento em todas as sociedades, desde os indígenas até a Idade Média 78 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br NOVAS TÉCNICAS Para Shostrom e Brammer, o aconselhamento é uma relação objetiva e recíproca entre duas pessoas, em que uma, com formação específica, auxilia a outra a modificar-se ou a mudar seu ambiente que cada uma tem que define seu su- cesso no processo de desenvolvimento individual. Não existem melhores ou piores ferramentas, todas elas apresen- tam resultados e um impacto positivo dentro da organização. Entretanto, cabe sempre ressaltar e reforçar que devem ser sempre aplicadas de maneira pru- dente e ética com responsabilidade e maturidade organizacional, sem modis- mos ou conveniências. No que concerne ao counseling, existem especificações que evidenciam as principais diferenças: Quem pode ser um counselor? Pessoa com experi- ência profissional e pessoal, que tenha o conhecimento e vivência no campo organizacional. Será necessária tam- bém uma preparação para assumir o papel de counselor, um curso de for- mação, para aprender as técnicas que precisam ser usadas nas sessões. Quem pode ser um counselee? Profissionais talentosos que exercem um cargo estra- tégico dentro das organizações, o tipo de funcionário que vale a pena investir caro para aprimorar suas capacidades. Onde acontecem as sessões? Podem acontecer dentro da organização ou fora (exceto para situações em que o counselor perceba que precisa tirar o counselee de dentro da empresa para uma reflexão mais aprofundada). Qual o foco? No ser humano, muito antes do problema ou gap. Vale salientar que o ser humano é único e que reflete no campo profissional experiências pesso- ais. Consequentemente, quando o pro- fissional auxilia no crescimento pessoal está sendo proporcionado crescimento profissional. Qual a metodologia? O counselor possui conhecimento téc- nico na ferramenta para o desenvolvi-mento do colaborador indicado. São re- alizadas sessões mensais, com duração, em média, de uma hora (para mais ou para menos). Nessas sessões são reali- zados aconselhamento e atividades de reflexão, além de ações pós-sessão. Diferenças É de extrema importância entender que, quando se fala em counseling organizacional, a referência é uma fer- ramenta de desenvolvimento humano, com foco na pessoa dentro da organiza- ção, pois existe, também, o counseling como ferramenta terapêutica usada em sessões de análise psicológica ou Psica- nálise (não é este o caso). Quando uma empresa decide aderir a um programa de counseling, ela precisa ter em mente que é de extrema importância selecionar uma pessoa que seja de referência den- tro da organização para ocupar a função de conselheiro. Esse profissional sele- cionado internamente precisa ter não apenas a vivência, mas também o perfil, um perfil auxiliador que tem foco nas pessoas, com sensibilidade e interesse no desenvolvimento de pessoas (testes de análise comportamental facilitarão nessa busca. Entretanto, é importante ressaltar que os testes não devem ser to- mados como verdades absolutas de pes- soas, pois o ser humano é muito maior que qualquer teste que possa existir). Além disso, proporcionar uma capacita- ção (que pode ser interna, com a ajuda de uma consultoria especializada) para que o profissional possa conhecer e ter o domínio das ferramentas usadas em um processo de counseling organizacional. No que diz respeito ao colabora- dor que receberá as sessões de aconse- lhamento, é necessário, antes de mais nada, entender se o caso dele requer um profissional que o aconselhe nas esco- lhas e decisões. Então, o primeiro pas- so é perceber a real necessidade do uso do counseling (uma consultoria ajuda- rá no diagnóstico), para não correr o risco de usar o counseling quando, na verdade, precisaria de um mentoring ou um coaching. Quando é entendida a necessidade, começa a conscientização do colaborador no sentido de entender Além do counseling organizacional, existe, também, o counseling como ferramenta terapêutica, utilizado em sessões de análise psicológica ou Psicanálise www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 79 O coaching é incrível em seus resultados, mas quando aplicado para quem precisa de um processo de coaching. Não é difícil até mesmo os teóricos confundirem o counseling com o coaching e o mentoring o que é a ferramenta, como ela funcio- na, seu desfecho e seus resultados. Não é aconselhável iniciar um processo onde essas informações não estejam claras para o counselee. Não existe uma data fixa para o fim de um proces- so, mas existem médias de tempo que podem ser renovadas. A princípio, seis meses é uma média de tempo para uma primeira etapa. Se houver necessidade de estender isso poderá acontecer com tranquilidade, mas é importante ficar atento para não criar uma situação na qual o counselee fique como que esti- vesse “acorrentado” ao counselor. Benefícios Os ganhos de um programa de counseling são inúmeros. É pos- sível enumerar dez benefícios mais evidenciados nos colaboradores que recebem sessões de desenvolvimento com essa ferramenta. São os seguin- tes: assertividade nas tomadas de de- cisão; maior alinhamento cultural; maior relacionamento de parceria; baixo investimento em treinamento; qualidade de vida no trabalho; maior planejamento e controle; amadureci- mento organizacional; maior capaci- dade de criação e inovação; melhoria da carreira profissional; entendimen- to da real utilidade e contribuição para a organização. Para a organização, os benefícios também são inúmeros, desde ter um colaborador mais motivado e enga- jado nos projetos da empresa até um funcionário mais saudável psicologica- mente falando. Esses ganhos, por si, já são maravilhosos e atestam a eficácia que um programa bem estruturado proporciona. Também são percebidos ganhos para o counselor, que também vão desde prestígio dentro da corpora- ção até o sentimento de dever cumpri- do em poder ter ajudado um outro ser humano a se desenvolver. O counseling, sem dúvida, é uma das melhores ferramentas para o desen- volvimento humano organizacional. Como foi possível observar, sua atuação beneficia a todos: a quem recebe, quem aplica e à organização como um todo. A valorização do ser humano é, certa- mente, o melhor caminho para se obter uma organização assertiva em seus re- sultados e sempre gozando de sucesso, e quando aplicado de maneira bem elabo- rada, estudada e planejada o counseling ajuda a atingir os objetivos. Com isso, é possível desmistificar aquele velho dita- do que diz que “se conselho fosse bom, não se dava, vendia”. Conselho bom é conselho dado com razão. REFERÊNCIAS Rogers, C. R. Counseling and Psychotherapy:�)���3���d�#��������(����9�<D?=: . On Personal Power. New York: Delacorte Press, 1977. Santos, O. B. Aconselhamento Psicológico e Psicoterapia: ����G��GhÔ��®������������G���� Básico. São Paulo: Pioneira, 1982. Scorsolini-Comin, F. Aconselhamento Psicológico: Aplicações em Gestão de Carreiras, Educação e Saúde. São Paulo: Editora Atlas, 2015. �Na religião O professor e conselheiro Jay Edward Ada- ms é um reverendo presbiteriano, que exer- I��������\�����P��G��� ��?;�G�����G�P��G� �� aconselhamento bíblico. Obteve seu PhD pela Universidade de Missouri, nos Estados Unidos, e serviu como professor no Semi- nário Teológico de Westminster durante vários anos. Entre outras atividades fun- dou os ministérios Christian Counseling and Education Foundation (CCEF) e National As- sociation of Nouthetic Counselors (NANC). Para a empresa, os benefícios são muitos, desde ter um colaborador motivado e engajado até um funcionário saudável do ponto de vista psicológico www.portalcienciaevida.com.br em contato AMIGOS PARA SEMPRE !�AMIZADE�ENTRE�O�SER�HUMANO�E�OS�ANIMAIS�NÎO�Ï�NOVIDADE��!LIÉS��ME�IDENTIlCO�MUITO�COM� isso, pois tenho um cachorro que faz parte da família. No entanto, é bom quando vemos que estão sendo desenvolvidos estudos que mostram os vários benefícios existentes nessa intera- ção, como foi mostrado em artigo publicado na revista Psique, em sua edição de número 125. Recomendo que todos tenham um animalzinho de estimação, pois, conforme o artigo diz, ajuda na diminuição do estresse, equilíbrio da frequência cardíaca, da pressão arterial e até do colesterol, além de ajudar no tratamento de problemas psíquicos. Cães e gatos, de fato, são muito mais do que uma excelente companhia. A terapia que preconiza a relação com animais, por exemplo, busca promover no paciente estímulo para despertar sua sensibilidade e reações psicológicas e emocionais. E, asseguro, quase sempre consegue. Cristina Lourenço, por e-mail 10 anos 08/06/2016 15:47:38 NECESSIDADE DE ESTAR CONECTADO Realmente os efeitos da internet no mundo moderno estão causando uma verdadeira revolução na vida cotidiana da sociedade. Diariamente observamos, em qualquer lugar público, inúmeras pessoas manuse- ando aparelhos celulares nas mais diversas situações, o tempo todo. E isso, como não poderia deixar de ser, provoca fenômenos psicológicos e sociológicos que começam a ser estudados por especialistas. A entre- vista com o psicólogo Breno Rosostolato, publicada no número 125, mostra bem esse cenário. O uso sem controle desses equipamentos, principalmente por parte dos jovens, pode ocasionar um transtorno QUE�PREOCUPA�A� COMUNIDADE�CIENTÓlCA�� A� NOMOFOBIA��OU�SEJA��A�FOBIA�DE�lCAR�DESCO- nectado do mundo virtual. Os sintomas da abstinência do uso de aparelhos tecnoló- gicos são tão sérios que, em alguns casos, podem ser comparados à abstinência de drogas. Há de se ter cuidado. João Souza, por e-mailRAIVA PODE NÃO DEPENDER DE EDUCAÇÃO A revista Psique continua em forma. A edição 125 saiu com um excelente arti- go, que explica que a raiva pode não ser somente causada por falta de educação ou resultado de uma fase de estresse pela qual a pessoa esteja passando. Em meio a tantos distúrbios psicológicos que vejo aparecer no mundo moderno, descobri 80 psique ciência&vida agora que existe o transtorno explosivo intermitente, conhecido como TEI. Para mim explica muita coisa, pois nunca acei- tei o fato de que pessoas aparentemente normais tenham verdadeiras explosões de raiva e descontrole em situações que, aparentemente, não deveriam causar rea- ções tão violentas. O TEI se caracteriza PELA� DIlCULDADE� EM� CONTER� COMPORTA- mentos impulsivos e agressivos, que aca- bam em explosões de raiva. Essas reações são sempre muito desproporcionais à si- tuação que as originaram. Muito interes- sante. Parabéns a todos pelo trabalho. Helena Santos, por e-mail MEDO NÃO É FRESCURA Olá, pessoal. Aqui é uma fã da revista Psi- que. Sempre aprendo muito com vocês e dessa vez não foi diferente. No número 125, o destaque foram as matérias sobre a im- portância que se deve dar às fobias. Muita gente costuma dizer que o fato de uma pes- soa ter medo de barata, de andar de avião e outras coisas aparentemente banais é uma manifestação simplesmente de frescura. Não é verdade. O tema é muito importante. O medo, apesar de fazer parte da natureza do ser humano, quan- do é elevado a potên- cias máximas precisa ser levado a sério e tratado com a ajuda da Psicoterapia e, às vezes, inclusive, com intervenção psiquiá- trica. A revista cita um DADO�ALARMANTE��DE�ACORDO�COM�A�/RGANI- zação Mundial da Saúde, 10% da popula- ção mundial sofrem com alguma fobia. É muita gente sendo considerada fresca, não acham? O assunto é grave e deve ser trata- do como tal. Um abraço. Lilian Thiem, por e-mail COMPLEXIDADE DO SEXO Que tema mais complexo é o sexo. Os cos- tumes podem mudar, os comportamentos podem se modernizar, mas quando o as- sunto é sexualidade parece que voltamos ao século XVIII. Salvo raras exceções, as pessoas não se sentem à vontade para falar sobre isso, mesmo quando conversam com os mais íntimos, no caso seus respectivos parceiros. Por isso, achei bem interessante e esclarecedora a entrevista, publicada no número 124, com o psicólogo clínico Ari Guarnieri. Ele explica que todos os tabus que envolvem a questão devem ser deixa- dos de lado, pois muitos casais convivem durante anos com problemas e dúvidas por não ter a coragem de conversar aber- tamente sobre o tema. Ana Cláudia Sampaio, por e-mail www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 81 CONSELHO EDITORIAL AICIL FRANCO é psicóloga, mestre e doutora em Psicologia Clínica pela USP. Professora no IJBA e na Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Savador, BA. ANA MARIA FEIJOO é doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, autora de LIVROS�E�ARTIGOS�CIENTÓlCOS��PARECERISTA�DE�DIVERSAS� revistas e responsável técnica do Instituto de Psicologia Fenomenológico-Existencial do RJ. ANA MARIA SERRA é PhD em Psicologia e terapeuta cognitiva pelo Institute of Psychiatry, Universidade de Londres. Diretora do Instituto de Terapia Cognitiva (ITC), atua em clínica, faz treinamento, consultoria e pesquisa. Presidente honorária, ex-presidente e fundadora da ABPC. ANDRÉ FRAZÃO HELENE é biólogo, mestre e doutor EM�#IÐNCIAS�NA�ÉREA�DE�.EUROlSIOLOGIA�DA�-EMØRIA e Atenção pela Universidade de São Paulo, onde também é professor no curso de Biociência e coordena o Laboratório de Ciências da Cognição no Instituto de Biociências. CLÁUDIO VITAL DE LIMA FERREIRA é psicólogo, doutor em Saúde Mental pela Unicamp, pós-doutorado em Saúde Mental pela Universidade de Barcelona-Espanha, professor associado de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia. Autor de Aids e exclusão social. DENISE TARDELI, graduação em Psicologia e Pedagogia. Mestrado em Educação e doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano, ambos pela USP. Pesquisadora na área da Psicologia Moral e Evolutiva. Professora universitária. DENISE GIMENEZ RAMOS é coordenadora do Programa de Estudos Pós-Graduados da PUC-SP e membro da Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica. KARIN DE PAULA, psicanalista, doutora pela PUC-SP, professora e supervisora clínica universitária e do CEP, autora do livro $em? Sobre a inclusão e o manejo do dinheiro numa psicanálise, e de vários outros artigos publicados. LILIAN GRAZIANO é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com pós-graduação em Psicoterapia Cognitiva Construtivista. É professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento. Atua em clínica e consultoria. LILIANA LIVIANO WAHBA, psicóloga, PhD, professora da PUC-SP. Presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica. Coeditora da revista Junguiana. Diretora de Psicologia da Ser em Cena - Teatro para Afásicos. MARISTELA VENDRAMEL FERREIRA é doutora em Audiologia pela University of Southampton – Inglaterra, mestre em Distúrbios da Comunicação pela PUC-SP, especialista em Psicoterapia Psicanalítica pelo Instituto de Psicologia da USP. MÔNICA GIACOMINI, presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar – biênio 2007/09. Especialista em Psicologia Hospitalar, psicóloga clínica junguiana, psicóloga do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do HCFMUSP e supervisora titular do Aprimoramento em Psicologia Hospitalar em Ortopedia. PAULA MANTOVANI é graduada em Psicologia pela Universidade Paulista, psicanalista, consultora editorial do programa de entrevistas da FNAC e membro correspondente do Espaço Moebius de Psicanálise de Salvador (BA). PEDRO F. BENDASSOLLI é editor da GV Executivo, psicólogo graduado pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e doutor em Psicologia Social pela USP. É também professor da Fundação Getúlio Vargas e da ESPM. LINHA DIRETA IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K CANAL FACEBOOK A revista Psique traz muitas informações interessantes também nas redes sociais. !CESSE�A�&ANPAGE��WWW�FACEBOOK�COM�2EVISTA0SIQUE#IENCIAE6IDA EDITORA: Gláucia Viola EDIÇÃO DE ARTE E DIAGRAMAÇÃO: Monique Bruno Elias COLABORARAM NESTA EDIÇÃO: Andreia Calçada; Camila Ferreira Vorkapic; Dionízio Costta Jr.; Lucas Vasques Peña; Marcelo Pereira Lemos; Roberta de Medeiros; Rodrigo Scialfa Falcão. COLUNISTAS: Anderson Zenidarci, Carlos São Paulo, Denise Deschamps; Eduardo J. S. Honorato; Eduardo Shinyashiki; Giancarlo Spizzirri; Guido Arturo Palomba; Igor Lins Lemos, João Oliveira; Jussara Goyano; Lilian Graziano; Marco Callegaro; Maria Inere Maluf; Michele Muller, Ricardo Wainer. O Conselho editorial e a Redação não se responsabilizam pelos artigos e colunas assinados por especialistas e suas opiniões neles expressas. REALIZAÇÃODIRETO COM A REDAÇÃO Av. Profª Ida Kolb, 551 Casa Verde – CEP 02518-000 São Paulo – SP – (+55) 11 3042-5900 – psique@escala.com.br PARA ANUNCIAR anunciar@escala.com.br SÃO PAULO: (+55) 11 3855-2179 SP (INTERIOR - CAMPINAS): (+55) 19 4595-5058 SP (INTERIOR - RIBEIRÃO PRETO): (+55) 16 3667-1800 RJ: (+55) 21 2224-0095 ES: (+55) 27 3229-1986 PR: (+55) 41 3026-1175 RS: (+55) 51 3061-0208 SC: (+55) 47 3041-3323 BRASÍLIA: (+55) 61 3226-2218 Tráfego: material.publicidade@escala.com.br ASSINE NOSSAS REVISTAS (+55) 11 3855-2117 – www.assineescala.com.br EDIÇÕES ANTERIORES Adquira as edições anteriores de qualquer revista ou publicação da Escala (+55) 11 3855-1000 www.escala.com.br (sujeito à disponibilidade de estoque) ATENDIMENTO AO LEITOR De seg. a sex., das 9h às 18h. (+55) 11 3855-1009 Fax: (+55) 11 3857-9643 – atendimento@escala.com.br LOJA ESCALA Confira asofertas de livros e revistas – www.escala.com.br FALE CONOSCO Existem inúmeras formas de violência. A psicológica é tão preocupante que requer a abordagem da suposta “natu- ralização” social, cuja incidência pode minar autonomia, iniciativa, coragem, segurança de crianças e jovens em ple- no desenvolvimento emocional e social. O descaso com o outro e a prática de “brincadeiras” que ultrapassam a fron- teira do lúdico e instalam uma sensação de incompetência pessoal a quem escu- ta apelidos, chacotas, bem como pres- sionar alguém a deslocar a sua emoção saudável para canais inadequados, por exemplo, comer ou beber demais, usar drogas, vivenciar sexo compulsivo (ou- tras formas de compulsão), são conse- quências da “naturalização” da violên- cia psicológica. A Psicologia Clínica pode ajudar a entender esse processo. Saiba como na edição 71, que está dis- PONÓVEL� NO� SITE� DA� REVISTA��www.psique- cienciaevida.uol.com.br Rua Santo Ubaldo, 28 – Torre C – CJ. 12 – Vila Palmeira – São Paulo – SP CEP: 02725-050 – Telefone - (11) 4114-0965 PSIQUE CIÊNCIA & VIDA é uma publicação mensal da EBR _ Empresa Brasil de Revistas Ltda. ISSN 1809-0796. A publicação não se responsabiliza por conceitos emitidos em artigos assinados ou por qualquer conteúdo publicitário e comercial, sendo esse último de inteira responsabilidade dos anunciantes. REALIZAÇÃO www.portalcienciaevida.com.br Ano X - Edição 126 Agosto/2016 Ethel Santaella DIRETORA EDITORIAL Denise Gianoglio COORDENADORA EDITORIAL PUBLICIDADE - GRANDES E MÉDIAS AGÊNCIAS DIRETORA DE PUBLICIDADE: Rosana Diniz GERENTES DE NEGÓCIOS: Claudia Marin e Vinícius Secco PUBLICIDADE - PEQUENAS AGÊNCIAS E DIRETOS DIRETORA DE PUBLICIDADE: Yone Catoira GERENTES DE CONTAS: Diogo Telles e Sandra Lopes PROJETOS ESPECIAIS: Rafaela Landim REPRESENTANTES Interior de São Paulo: L&M Editoração, Luciene Dias – Paraná: YouNeed, Paulo Roberto Cardoso – Rio de Janeiro: Marca XXI, Carla Torres, Marta Pimentel – Rio Grande do Sul: Totali Soluções em Mídia, Ivanir Antonio Curi – Santa Catarina: Artur Tavares – Regional Brasília: Solução Publicidade, Beth Araújo. www.midiakit.escala.com.br GERÊNCIA DE PRODUTO GERENTE GERAL: Tarcila de Lourenzi – tarcila@escala.com.br MARKETING E COMUNICAÇÃO GERENTE: Paulo Sapata – paulosapata@escala.com.br IMPRENSA – comunicacao@escala.com.br VENDAS DE REVISTAS E LIVROS AVULSOS (+55) 11 3855-2142 – atendimento@escala.com.br ATACADO DE REVISTAS E LIVROS (+55) 11 3855-2147 – adm.atacado@escala.com.br Av. 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O ESTELIONATÁRIO VALE-SE DA SIMULAÇÃO E DA MENTIRA, QUE SÃO RAMOS NASCIDOS DO TRONCO COMUM DO ENGANO E DA ASTÚCIA, PARA APLICAR O SEU GOLPE ESTELIONATO é tão ANTIGO quanto a própria HUMANIDADE líticos. Se esse desvio for no sentido do emprego da força bruta, então teremos os ditadores, as guerras, as invasões e seus similares (campos de concentração, ho- mens-bomba etc.). E caso a regressão seja na direção da fraude, têm-se demagogos enganadores do povo, que se travestem COM�PELE�DE�CORDEIRO��lNGEM�PAZ�E�AMOR�� mas são lobos gananciosos com objetivos balordos. Não passam de estelionatários da pior qualidade. A história mostra que tanto os líderes políticos que se valeram da força quanto os estelionatários do povo, ambos, mais cedo ou mais tarde, acabaram se dando mal: aqueles que usaram da força bruta um dia encontraram outro mais forte e foram eliminados; os que se valeram da fraude e da mentira para enganar o povo, houve (como sempre vai haver) o momen- to em que as suas máscaras caíram, pois nenhum embusteiro, por melhor que seja, Ï�CAPAZ�DE�ENGANAR�MUITOS�POR�LONGO�TEM- po sem se trair e ser descoberto. Julgados, mofaram na cadeia. Assim seja também aqui no Brasil. que o cerca, tem duas outras armas para vencer a refrega: a inteligência, a qual lhe dá o entendimento lógico do fato, e a mo- ral, que é o dever-ser da lógica. Assim, constituído de entendimento e de determinação moralmente ordenada, TRANSCENDE�OS�ANIMAIS�E�VIVE�FELIZ�AGINDO� corretamente (a felicidade vem por acrés- cimo) dentro das suas circunstâncias e possibilidades. Porém, pode acontecer, entre os hu- manos, uma regressão ao mundo animal, quando o indivíduo, sistematicamente, se VALE�DA�FOR¥A�BRUTA�OU�UTILIZA�O�ESTELIONATO� para atingir seus propósitos. O grande problema é quando essa regressão atávica ocorre nos líderes po- AR QU IV O PE SS OA L/ SH UT TE RS TO CK S E� FOSSE�NECESSÉRIO�DElNIR� ESTELIO- natário em uma só palavra, di- ríamos: trapaceiro. A bem ver, a palavra vem de stellio, onis, estelião, lagarto que muda a cor da pele, daí trapa- ceiro, velhaco. Esse tipo de indivíduo não é um fato típico da nossa época, pois já existia nos re- cuados tempos. O estelionato é tão antigo quanto a própria humanidade, ou melhor, é ANTERIOR�A�ELA��UMA�VEZ�QUE�MUITOS�ANIMAIS� se valem desse comportamento. A bem ver, onde há vida há luta pela vida e o vencedor será o mais apto. E nesse embate os ani- mais empregam recursos variadíssimos, principalmente de duas ordens: uns ven- cem à base da fraude; outros, pela violência. Se não é pela força bruta, a aquisição de um caráter vantajoso coloca o seu possuidor em melhores condições de sobrevivência, tornando-o mais apto a enfrentar o recon- TRO�COM�O�AMBIENTE��A�RAPOSA�lNGE�DORMIR� para surpreender a sua presa; a libélula fe- cha as asas para se confundir com o caule onde pousa, ludibriando o inimigo. Nesse sentido, muitas espécies simulam a morte para aproveitar a semelhança com algo ina- nimado para evitar o ataque. Se, juntamente com a força bruta, essa é a regra do reino animal, o homem, o mais evoluído de todos, que também está em permanente embate com o meio ACOMPANHE OS MOVIMENTOS DO MERCADO e reconheça as boas oportunidades para o caminho do sucesso profi ssional VEJA TAMBÉM OUTROS TEMAS DA COLEÇÃO: À venda na loja Escala www.escala.com.br /editoraescalaoficial TESTES INCLUSOS!