Buscar

BRASIL AFRODESCENDENTE

Prévia do material em texto

Darcy Ribeiro Compreendendo o Brasil afrodescendente 
Afeição cultural afrodescendente brasileira surge em torno do complexo formado pela economia do açúcar, com todas as suas variantes comerciais e financeiras, juntamente com todos os complementos agrícolas e artesanais que permitiam sua operação.
Era predominantemente originária da matriz africana, inserida no contexto de transição europeia de uma economia pré-capitalista e mercantilista para uma economia capitalista industrial, que mudou a face europeia.
 O crioulo, no Nordeste, nasce em uma estrutura de latifúndio, na monocultura açucareira e na escravidão, a qual se tornou o primeiro empreendimento agroindustrial do Brasil.	
 O abrasileiramento forçoso, imposto pela colonização, proporcionou a multiplicidade cultural originária de distintas regiões, formando novos gêneros humanos.
 A mistura do negro com o índio, do colonizador com o negro, trouxe essa nova feição; a fusão desse processo é observada no sincretismo religioso, no qual os ritos peculiares das religiões africanas se misturam ao catolicismo salvacionista dos portugueses. Na culinária também verificamos a influência inequívoca desse novo gênero, como no caso da feijoada, do acarajé, do vatapá; assim como na música, com o incremento dos ritmos do afoxé, de instrumentos como o tambor, o atabaque, entre outros.
 Esse cenário de mestiçagem é resultante de extrema violência e dominação: verifica-se o histórico de escravização, com o negro sendo submetido aos mais brutais castigos, em uma relação na qual o senhor do engenho exercia seu poder como proprietário do bem semovente, que era seu escravo.	
 No sistema autocrático, o senhor de engenho era o Estado, a religião e a lei, que dentro do projeto capitalista do empreendimento agroindustrial, necessitava, e de força de trabalho era essencial que o negro escravo substituísse o rebelde índio.
 A estratificação social açucareira seguia uma rígida estrutura, com raríssima mobilidade social, com o senhor de engenho ocupando o topo da pirâmide hierárquica num modelo patriarcal.	
 Intermediariamente, tínhamos as camadas instituídas, como os religiosos, os feitores, os capatazes, os militares, os comerciantes e os funcionários públicos.
 Nas camadas inferiores, estavam os africanos escravizados, força de trabalho capital, para a engrenagem do sistema. Os índios viviam à margem dessa estratificação.
 Guardião e centralizador de todas as funções sociais num intenso poder, o senhor de engenho encontrou em si duas realidades, uma delas a imposição de sua vontade e supremacia; e a outra, a adaptação ao que seria a nova aristocracia, que, em síntese, era o poder da casa-grande.
 Já a senzala se subordinava aos mandos da casa-grande, em uma desculturação de suas origens, num processo de miscigenação, assimilação e resignação. Resignação e passividade que se rompem no processo histórico brasileiro, na manutenção, embora por outras vias, da estratificação social da época.
Os bolsões de miséria de uma classe afastada dos bens de consumo e da vida social resumem a gênese da dívida social que nossas elites insistem em calotear.
FONTE: https://www.oestadoce.com.br/opiniao/darcy-ribeiro-compreendendo-o-brasil-brasil-crioulo

Continue navegando