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1 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO DEPARTAMENTO DE AGRONOMIA ÁREA DE FITOTECNIA FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR PROF. Dr. FRANCISCO JOSÉ DE OLIVEIRA RECIFE, 2013 2 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar Ficha catalográfica O48f Oliveira, Francisco José de Fisiologia da produção de cana-de-açúcar / Francisco José de Oliveira. – Recife : [s.n.], 2013. 321 f. : il. Apostila [da] disciplina optativa do curso de graduação em Agronomia/UFRPE. . Referências. 1. Fisiologia vegetal 2. Cana-de-açúcar I. Título CDD 633.61 3 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar APRESENTAÇÃO O presente trabalho contem informações sobre a cultura da cana-de- açúcar reunidas em três capítulos que abordam os seguintes aspectos: (1) morfologia e descritores de variedades; (2) fenologia e aspectos fisiológicos da planta; (3) interação entre os fatores de produção (planta x ambiente x manejo). Espera-se contribuir significativamente na melhor formação técnico pro- fissional de Engenheiros-Agrônomos do curso de Agronomia da UFRPE, numa perspectiva de curto prazo, em especial na área de fisiologia da produção de cana-de-açúcar, auxiliando a consolidar os conhecimentos num cenário inova- dor e altamente competitivo no futuro próximo. Essa apostila visa auxiliar no aprendizado de temas importantes que es- tão ausentes em quaisquer ementas de disciplinas obrigatórias, bem como a disponibilização de material didático para os estudantes do curso de agronomia da UFRPE interessados em conhecer com mais detalhes sobre a cultura da cana-de-açúcar. Pretende-se, ainda, que essa contribuição sirva também como fonte de consulta básica e complementar às aulas teóricas e práticas e possa oferecer alguma orientação útil àqueles que visam mais conhecimentos para melhor exploração racional da lavoura canavieira. Na elaboração, organização e compilação do texto realizou-se um traba- lho de pesquisa intensa na busca de informações e como não poderia deixar de ser, após cada capítulo são citadas as referências bibliográficas. 4 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar S U M Á R I O 1 IMPORTÂNCIA DA CANA DE AÇÚCAR PARA ECONOMIA BRASILEIRA ................................................ 8 CAPÍTULO – 1 ......................................................................................................................................................... 9 1. BOTÂNICA DA CANA-DE-AÇÚCAR ...............................................................................................................10 1.1. CLASSIFICAÇÃO ......................................................................................................................................... 10 1.3. ESPÉCIES CULTIVADAS................................................................................................................................. 11 1.4. DESCRIÇÃO DAS ESPÉCIES ......................................................................................................................... 11 1.5. IMPORTÂNCIA DO MELHORAMENTO ......................................................................................................... 18 2. ANATOMIA DA CANA-DE-AÇÚCAR ...............................................................................................................25 2.1. SISTEMA RADICULAR ..................................................................................................................................... 25 2.1.1. Desenvolvimento radicular da cana-de-açúcar ..................................................................................... 27 2.2. CAULE OU COLMO ........................................................................................................................................... 39 2.3. FOLHAS .............................................................................................................................................................. 46 2.4. INFLORESCÊNCIA ........................................................................................................................................... 52 3. DESCRITORES DE VARIEDADES .................................................................................................................59 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................................67 CAPÍTULO – 2 ........................................................................................................................................................86 1 - FENOLOGIA DA CANA-DE-AÇÚCAR ...........................................................................................................87 1.1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................... 87 2. FISIOLOGIA DA CANA-DE-AÇÚCAR .............................................................................................................87 2.1. FOTOSSÍNTESE................................................................................................................................................ 88 2.2. ABSORÇÃO DA ENERGIA LUMINOSA E OXIDAÇÃO DA ÁGUA ............................................................. 89 2.3. FLUXO FOTOSSINTÉTICO DE ELÉTRONS E OXIDAÇÃO DA ÁGUA ..................................................... 90 2.4. FOTOFOSFORILAÇÃO .................................................................................................................................... 91 2.5. METABOLISMO DO CARBONO ..................................................................................................................... 91 2.6. REAÇÕES DO CARBONO C3 (CICLO DE CALVIN & BENSON) ........................................................................ 93 2.7. EFICIÊNCIA DE APROVEITAMENTO DE CO2 E PARTICULARIDADES DA FOTOSSÍNTESE NA CANA-DE-AÇÚCAR .................................................................................................................................................. 94 2.8. SÍNTESE E ARMAZENAMENTO DE AMIDO E SACAROSE ...................................................................... 95 2.9. SÍNTESE DO AMIDO ........................................................................................................................................ 95 2.10. SÍNTESE DA SACAROSE .............................................................................................................................. 95 2.11. TRANSPORTE E ALOCAÇÃO DA SACAROSE ......................................................................................... 97 3. FISIOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO ........................................................................................................ 101 3.1. PROPAGAÇÃO ................................................................................................................................................ 101 3.2. SISTEMA RADICULAR DA CANA-DE-AÇÚCAR ........................................................................................ 102 3.2.1. Cana planta ...............................................................................................................................................102 3.2.2. Cana soca ................................................................................................................................................. 104 3.2.3. Fatores que influem no desenvolvimento do sistema radicular ........................................................ 107 4. FASES DE DESENVOLVIMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR ....................................................................... 119 4.1. BROTAÇÃO E EMERGÊNCIA ....................................................................................................................... 119 4.1.1. Fatores que influenciam na brotação e emergência ........................................................................... 120 4.1.2. Dominância apical .................................................................................................................................... 122 4.1.3. Processo da brotação .............................................................................................................................. 124 5 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar 4.2. FASE DE PERFILHAMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR ............................................................................................... 141 4.2.1. Fatores que influenciam o perfilhamento.............................................................................................. 151 4.3. CRESCIMENTO DOS COLMOS .............................................................................................................................. 155 4.3.1. Fatores que influenciam o crescimento ................................................................................................ 163 4.4. MATURAÇÃO DO COLMO OU ACÚMULO DE SACAROSE .................................................................... 174 4.4.1. Biossíntese, translocação e acúmulo de sacarose ............................................................................. 174 4.4.2. CICLAGEM METABÓLICA E TRANSPORTE DE CARBONO NA PLANTA ..................................................177 4.4.3. Processo da maturação..........................................................................................................................................192 4.4.3.1. Fatores que influenciam a maturação ...............................................................................................................196 4.5. FLORESCIMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR .......................................................................................... 200 4.5.1. Fatores que influem no florescimento ............................................................................................. 203 5. CICLO FENOLÓGICO DA CANA-SOCA ....................................................................................................... 214 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................................... 215 CAPÍTULO – 3 ...................................................................................................................................................... 220 1. PRODUÇÃO DE BIOMASSA E SACAROSE ................................................................................................ 221 1.1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................. 221 1.2. FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR .............................................................................................. 221 1.3. O PRODUTO CANA ENERGÉTICA: COLMOS – BAGAÇO – PALHA ..................................................... 222 1.4. AUMENTO DA PRODUTIVIDADE DE CANA-DE-AÇÚCAR ..................................................................... 223 1.5. AGRONEGÓCIO DA CANA-DE-AÇÚCAR .................................................................................................. 224 2. FATORES ENVOLVIDOS NO PROCESSO DE PRODUÇÃO EM CANA-DE-AÇÚCAR .......................... 227 2.1. O AMBIENTE COMO FATOR DE DESENVOLVIMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR .............................. 227 2.1.1. Adaptação ................................................................................................................................................. 227 2.1.2. Fatores do clima ....................................................................................................................................... 228 3. FASES DE CULTIVO ....................................................................................................................................... 228 3.1. BROTAÇÃO E FASE DE ESTABELECIMENTO ......................................................................................... 228 3.2. PERFILHAMENTO .......................................................................................................................................... 230 3.3. FASE DE CRESCIMENTO DO COLMO ....................................................................................................... 231 3.4. FASE DE MATURAÇÃO ................................................................................................................................. 232 4 – ECOFISIOLOGIA DO CULTIVO ................................................................................................................... 233 5 - ASPECTOS DO FLORESCIMENTO ............................................................................................................. 234 6 - ASPECTOS DA MATURAÇÃO ..................................................................................................................... 238 7. INFLUÊNCIA DO CLIMA NA CANA-DE-AÇÚCAR ...................................................................................... 239 7.1. ESTRESSE DAS PLANTAS ........................................................................................................................... 239 7.2. CLIMA ................................................................................................................................................................ 240 8. FATORES RELACIONADOS AO CULTIVO DA CANA–DE-AÇÚCAR ...................................................... 241 8.1. FATORES RELACIONADOS AO AMBIENTE ............................................................................................. 241 8.2. FATORES RELACIONADOS A PLANTA ..................................................................................................... 242 8.2.1. Genética .................................................................................................................................................... 242 8.3. FATORES RELACIONADOS AO MANEJO DA LAVOURA CANAVIEIRA .............................................. 243 8.3.1. Escolha da espécie ou variedade .......................................................................................................... 243 8.3.2. Escolha da área para plantio .................................................................................................................. 244 8.3.3. Plantio ........................................................................................................................................................ 244 8.3.3.1. Planejamento ........................................................................................................................................................244 8.3.3.2. Ambiente de produção ........................................................................................................................................244 6 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar 8.3.4. Correção e fertilização da área e da cultura ........................................................................................ 245 8.3.5. Épocade plantio ....................................................................................................................................... 246 8.3.6. Definição de espaçamento e sistema de plantio ................................................................................. 247 8.3.7. Profundidade do sulco ............................................................................................................................. 248 8.4. PREPARO DO SOLO ...................................................................................................................................... 248 8.4.1. Erradicação da cultura anterior .............................................................................................................. 248 8.4.2. Infraestrutura dos talhões ....................................................................................................................... 249 8.4.2. Dimensionamento dos talhões ............................................................................................................... 249 8.4.3. Carreadores .............................................................................................................................................. 249 8.4.4. Nivelamento e sistematização da área ................................................................................................. 250 8.4.5. Terraceamento ......................................................................................................................................... 250 8.4.6. Preparo convencional do solo ................................................................................................................ 251 8.4.7. Preparo reduzido do solo ........................................................................................................................ 251 8.4.8. Erradicação química da soqueira (“cultivo mínimo”) ........................................................................... 252 8.5. PLANTIO DIRETO ........................................................................................................................................... 252 8.6. MUDAS .............................................................................................................................................................. 253 8.7. SISTEMAS DE PLANTIO ................................................................................................................................ 254 8.7.1. Plantio manual .......................................................................................................................................... 254 8.7.2. Sulcação .................................................................................................................................................... 255 8.7.3. Corte, carregamento e transporte das mudas ..................................................................................... 255 8.7.4. Distribuição das mudas no sulco ........................................................................................................... 256 8.7.5. Cobertura do colmo no sulco de plantio “cobrição” ............................................................................ 256 8.7.6. Plantio mecanizado .................................................................................................................................. 256 8.7.6.1. Plantio mecanizado de cana inteira .................................................................................................................258 8.7.6.2. Plantio mecanizado de cana picada.................................................................................................................258 8.7.6.3. Plantio mecanizado de gema isolada ..............................................................................................................259 8.8. PRAGAS E DOENÇAS .................................................................................................................................... 260 8.9. CONTROLE DE PLANTAS INVASORAS ..................................................................................................... 263 8.10. FATORES QUE INFLUENCIAM A QUALIDADE DA CANA-DE-AÇÚCAR ........................................... 263 9. SISTEMAS DE COLHEITA DO COLMO .......................................................................................................... 263 9.1. OPÇÕES DE SISTEMAS DE COLHEITA ..................................................................................................... 265 9.2. SUBSISTEMAS DE CORTE ........................................................................................................................... 268 9.2.1. CORTE MANUAL ............................................................................................................................................... 268 9.2.2. CORTE MECANIZADO ....................................................................................................................................... 270 9.2.2.1. CORTADORAS VERSUS COLHEDORAS.......................................................................................................... 271 9.2.2.2. CORTADORAS (COLMOS INTEIROS) ............................................................................................................. 271 9.2.2.3. COLHEDORAS (CANA PICADA) ...................................................................................................................... 272 9.2.3. Subsistemas de carregamento .............................................................................................................. 274 9.2.3.1. Manual ...................................................................................................................................................................274 9.2.3.2. Mecânico ou semimecânico ...............................................................................................................................274 9.2.4. Subsistema de transporte ....................................................................................................................... 278 9.2.4.1. Subsistema de transporte rodoviário.................................................................................................................279 9.2.4.2. Tipos de transportes ............................................................................................................................................279 9.2.4.3. Subsistema de transporte ferroviário ................................................................................................................283 9.2.4.4. Subsistema de transporte hidroviário ................................................................................................................283 9.2.5. Operações de transbordo ....................................................................................................................... 284 9.2.6. Subsistema de recepção ......................................................................................................................... 285 9.2.7. Descarregamento ..................................................................................................................................... 285 9.3. PÓS-COLHEITA ............................................................................................................................................... 286 10. FATORES TECNOLÓGICOS QUE AFETAM O POTENCIAL DE PRODUTIVIDADE DA CANA-DE- AÇÚCAR ................................................................................................................................................................... 287 10.1. PLANEJAMENTO E ADMINISTRAÇÃO: ..............................................................................................287 7 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar 11. PRODUÇÃO DE BIOMASSA ........................................................................................................................ 288 12. PRODUTIVIDADE DA CULTURA ................................................................................................................ 288 13. PLANEJAMENTO GERAL ............................................................................................................................ 288 13.1. CICLOS DA CULTURA ................................................................................................................................. 288 13.2. AMBIENTES DE PRODUÇÃO ..................................................................................................................... 290 13.3. PLANEJAMENTO DA PRODUÇÃO ............................................................................................................ 290 14. SISTEMAS DE PRODUÇÃO ......................................................................................................................... 291 14.1. PREPARO DO SOLO .................................................................................................................................... 291 14.2. PLANTIO ......................................................................................................................................................... 292 14.3. PRINCIPAIS PRAGAS DA CANA-DE-AÇÚCAR ....................................................................................... 292 14.4. CONTROLE MECÂNICO NA ELIMINAÇÃO DA SOQUEIRA ..................................................................................... 296 14.5. CONTROLE QUÍMICO NO PLANTIO, REALIZADO JUNTO COM A COBRIÇÃO DAS MUDAS .................................... 296 14.6. DESENVOLVIMENTO DE CONTROLES BIOLÓGICOS ........................................................................................... 296 14.7. TRATOS CULTURAIS CANA PLANTA E SOCA ...................................................................................................... 296 14.7.1. Nutrição de plantas ................................................................................................................................ 296 14.7.2. Função dos Nutrientes na cana-de-açúcar ........................................................................................ 298 14.7.3. Resíduos agroindustriais ...................................................................................................................... 299 14.8. CULTIVO MECÂNICO DE SOQUEIRA ...................................................................................................... 300 14.9. MATOCOMPETIÇÃO .................................................................................................................................... 301 14.9.1. Período crítico......................................................................................................................................... 301 14.9.2. Épocas de aplicação e cuidados gerais ............................................................................................. 301 15. COLHEITA ...................................................................................................................................................... 301 15.1. CANA CRUA X CANA QUEIMADA ............................................................................................................. 301 15.2. MATURADORES ................................................................................................................................................. 302 15.3. CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE (CCT) ............................................................................. 302 15.3.1. Corte mecânico ...................................................................................................................................... 302 15.3.2. Corte manual (8-10 t / homem.dia) ..................................................................................................... 302 15.3.3. Carregamento mecânico ....................................................................................................................... 303 15.4. RECEPÇÃO E PAGAMENTO ...................................................................................................................... 303 16. ASPECTOS AMBIENTAIS ............................................................................................................................ 303 16.1. AGRÍCOLAS ................................................................................................................................................... 303 16.2. INDUSTRIAIS ................................................................................................................................................. 304 17. PRODUÇÃO CANA-ENERGIA ..................................................................................................................... 305 17.1. A CANA-DE-AÇÚCAR COMO FONTE DE BIOMASSA ............................................................................................ 305 17.3. SETOR SUCROALCOOLEIRO ............................................................................................................................. 307 17.4. A CANA ENERGIA .............................................................................................................................................. 307 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................................... 311 INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES: CÉLULA VEGETAL......................................................................... 315 ORGANELAS CITOPLASMÁTICAS .................................................................................................................. 316 QUESTIONÁRIOS ................................................................................................................................................ 318 8 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar 1 IMPORTÂNCIA DA CANA DE AÇÚCAR PARA ECONOMIA BRASILEIRA INTRODUÇÃO A cana-de-açúcar sempre teve um papel importante na economia brasileira, desde o período dos engenhos coloniais. Não é de hoje que especialistas vêm buscando manei- ras de aprimorar o cultivo da planta, tornando-a mais produtiva e resistente, entre outras vantagens agronômicas. Está novamente em fase de franca expansão e desenvolvimen- to. Atualmente, a cana-de-açúcar é tratada como a mais importante fonte de biomassa energética. O setor sucroalcooleiro responde por cerca de 1 milhão de empregos, dos quais 511 mil diretamente envolvidos na produção da cana-de-açúcar e o restante distri- buído na cadeia de processamento de açúcar e álcool. As explicações para o crescimento recente do setor sucroalcooleiro, basicamente a partir de 2003, são, em primeiro plano, o desenvolvimento de novas tecnologias para a produção de veículos bicombustível ou flex fuel, capazes de utilizar tanto etanol quanto gasolina, ou mesmo a mistura dos dois combustíveis, em qualquer proporção e, ao dis- curso inconteste da “energia limpa”, do “ecologicamente correto” frente à necessidade de reduzir a emissão de monóxido de carbono (um dos gases causadores do efeito estufa) como forma de atender às exigências do Protocolo de Kyoto. A demanda pelos produtos do setor sucroalcooleiro está crescendo no cenário mundial, e neste segmento, segundo a Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), o Brasil é líder absoluto na produção mundial de cana-de-açúcar. Conforme dados disponíveis relativos ao ano 2007, a produção brasileira foi de 514 milhões de toneladas, o que correspondea 144% a mais que a Índia – país que ocupa a segunda posição –, e representa 33% da produção mundial, que produziu 1,558 bilhão de toneladas de cana- de-açúcar (BRASIL, 2009). O crescimento da demanda nacional e mundial por álcool combustível, de forma rápida e acentuada, tem provocado um aumento significativo do número de usinas pelas diversas regiões brasileiras, acentuando, inclusive, a expansão dos pólos produtores para regiões onde o cultivo figurava como atividade de importância secundária como, por e- xemplo, o estado de Goiás. 9 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO DEPARTAMENTO DE AGRONOMIA ÁREA DE FITOTECNIA CAPÍTULO – 1 1 BOTÂNICA 2 ANATOMIA DA CANA-DE-AÇÚCAR 3 DESCRITORES DE VARIEDADES DE CANA-DE-AÇÚCAR Prof. Francisco José de Oliveira 10 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar 1. BOTÂNICA DA CANA-DE-AÇÚCAR INTRODUÇÃO A cana-de-açúcar é uma planta perene pertencente ao gênero Saccharum, da fa- mília Poaceae, tribo Andropogoneae. As principais características dessa família são a forma da inflorescência (panícula). O crescimento do caule em colmos as folhas invaginantes que apresentam lâminas (lim- bo) com bordos serrilhados e as raízes fasciculadas. Há pelo menos seis espécies do gê- nero, sendo a cana-de-açúcar cultivada, atualmente um HÍBRIDO multiespecífico. HÍBRIDO – é uma variedade ou cultivar formado a partir do cruzamento sexual en- tre diferentes espécies afins. Exemplo: Espécie A + Espécie B = Híbrido C Os híbridos atuais recebem uma nomenclatura específica que informa a instituição responsável pelo cruzamento e seleção, o ano do cruzamento e o número específico do clone. Exemplo: RB 72454 – RB 92579 – IAC 91-5155 – SP 79-1011 - CTC (91-338). 1.1. CLASSIFICAÇÃO ESPECIFICAÇÕES ENGLER (antiga) CRONQUIST (atual) Divisão Angiospermae Magnoliophyta Classe Monocotyledon Liliopsida Ordem Glumiflorae Cyperales Família Graminae Poaceae Tribo Andropogonae Andropogonae Subtribo Saccharininae Saccharininae Gênero Saccharum Saccharum 11 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar ESPÉCIES: Saccharum officinarum - Saccharum barberi - Saccharum robustum - Saccharum sponta- neum - Saccharum sinense - Saccharum edule. As variedades comerciais do MUNDO são todas híbridas: Saccharum spp. Gênero: Saccharum – Somam 30 espécies 1.3. ESPÉCIES CULTIVADAS S. officinarum L. (2n=80) espécie genérica e complexo poliploide S. Robustum Brandes e Jewiet ex Grassl (2n=60-205) S. spontaneum L. (2n=40-128) S. barberi Jewiet (2n=81-124) S. Sinense Roxb (2n=111-120) S. Edule Hassk (2n=60-80) A cana-de-açúcar é uma planta alógama. Características do Gênero Saccharum – S. officinarum L. - açúcar – S. robustum - selvagem, baixa – S. barberi – resistência a frio – S. sinensi – rústica, sist. rad. vigoroso – S. spontaneum – fibra, NCM, altura – S. eduli - flor comestível 1.4. DESCRIÇÃO DAS ESPÉCIES Saccharum officinarum L. (2n=80) 12 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar Esta espécie é um complexo poliploide, composto de 80 cromossomos, cujo centro de diversidade é a Nova Guiné; o seu centro de origem não é exatamente conhecido. É a espécie genérica. É conhecida como “cana nobre”, devido à sua esplêndida aparência, às cores bri- lhantes e aos colmos grossos (14 a 16 mm) e suculentos, com alto conteúdo de sacarose e boas características gerais para a industrialização. Foi a espécie predominantemente cultivada no mundo todo do final do século XVIII até o início deste século. Anteriormente, por mais de 250 anos, cultivou-se uma outra cana, que, em certo tempo, foi tomada como nobre, a “crioula” (cana-da-terra, mirim, creole, criolla, caña de la tierra), mas que praticamente se extinguiu devido à sua alta suscetibilidade ao vírus do mosaico. As principais variedades de cana nobre cultivadas foram: 1) Caiana; 2) as do grupo Cheribon, como a Cristalina, a Listrada, a Roxa ou Preta, e a Rosa ou Vermelha. Posteriormente, em muitos centros canavieiros foram obtidas novas variedades a partir de sementes daquelas canas nobres (certamente de polinização livre), cultivadas no início do presente século. No Brasil, pelo menos uma variedade selecionada a partir de sementes de Caiana teve plantio expressivo: a Manteiga, o que criou em Pernambuco o “ciclo da Manteiga”, por ter predominado nos canaviais daquele estado nos primeiros 30 anos deste século. Esta espécie constitui-se na espécie-base dos programas de melhoramento, para a qual se faz a recorrência (nobilização), objetivando características especiais, como col- mos suculentos, bom teor de açúcar, boa pureza do caldo, teor de fibra adequado para moagem, etc. Saccharum Robustum Brandes e Jewiet ex Grassl (2n=60-205) Supõe-se que esta espécie se originou da introgressão de S. spontaneum com ou- tros gêneros na região de Nova Guiné. Admite-se que, a partir desta espécie, é que S. officinarum evoluiu, por meio de se- leções humanas por tipos macios e ricos em líquido açucarado. 13 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar Não apresenta rizoma e é de interesse no melhoramento pelo vigor de seus colmos (= 20 a 45 mm) e pelo alto teor de fibra, mas tem pouca participação nos híbridos atuais, exceto nos havaianos. Tem pouca participação nos híbridos atuais, exceto nos havaianos. As plantas apresentam porte alto, colmos fibrosos e são muito pobres em sacaro- se. S. Sinense Roxb (2n=111-120) e S. barberi Jewiet (2n=81-124) Estas duas espécies eram cultivadas pelos nativos da China e do norte da Índia, respectivamente, desde épocas pré-históricas, não havendo definição segura sobre a ori- gem dessas espécies. Saccharum barberi - Apresenta por médio, colmos finos e fibrosos e são pobres em sacarose. São rústicas e pouco exigentes em solo, susceptíveis ao MOSAICO e tole- rante ao FRIO. S. Sinense provavelmente surgiu da introgressão (*) de S. officinarum com Miscan- thus, ou com S. spontaneum, na China, após a introdução da primeira em épocas pré- históricas. Já S. barberi pode ter surgido de forma independente no noroeste da Índia, ou da introgressão de S. officinarum com Erianthus. Apresentam colmos finos a médios e não são de interesse para o melhoramento atual, principalmente devido à dificuldade de florescimento e à esterilidade. (*) Genes introduzidos em uma espécie, provenientes de outra espécie relacionada geralmente por meio de retrocruzamentos. S. spontaneum L. (2n=40-128) É uma espécie altamente polimórfica (*), que cresce no trópico e no subtrópico, de 8 graus S a 40 graus N, desde o Japão e Indonésia/Nova Guiné até o Mediterrâneo e Á- frica, passando pelo subcontinente da Índia. Suas plantas variam de pequenas, tipo “capim”, sem colmos, a clones com colmos de mais de 5 m de altura, com diâmetro variando de 3 a 15 mm. As folhas caracterizam- 14 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar se por quase ausência de limbo, restrita apenas à nervura central, ou limbos de até quatro cm de largura. (*) é a existência de dois ou mais fenótipos alternativos comuns, em uma popula- ção natural. É uma espécie que tem dado boa contribuição ao melhoramento com suas caracte- rísticas de vigor, perfilhamento, capacidade de relevo e resistência a doenças e pragas. São plantas de porte menor, colmos curtos e finos, fibrosos e praticamente sem açúcar. Apresenta sistema radicular bem desenvolvido e perfilhamento abundante. Esta espécie apresenta alta adaptabilidade,podendo ser encontrada em desertos, em baixadas encharcadas e até em áreas salinas próximas ao mar, desde o nível do mar até nas montanhas do Himalaia, em faixas de temperatura do trópico até locais de inverno nevado. É provavelmente produto da introgressão entre membros ou protótipos do comple- xo Saccharum. É a espécie que, modernamente, tem dado maior contribuição ao melhoramento, com suas características de vigor, dureza, perfilhamento, capacidade de rebrota de so- queira, especialmente devido ao vigoroso rizoma e à resistência a estresse, doenças e pragas. Saccharum Edule Hassk (2n=60-80) É considerado atualmente um produto da introgressão de S. officinarum ou S. ro- bustum com outro gênero, sendo uma série poliploide (*), com 2n = 60, 70 e 80, com for- mas aneuplóides (**). Por possuir uma inflorescência compacta e comestível, é uma olerí- cola tradicional dos melanésios, sendo cultivada nos jardins de vilas, de Nova Guiné às Ilhas Fiji. (*) célula que possui um ou mais genomas repetidos várias vezes. (**) organismo cujo conjunto somático tem excesso ou falta de determinados cromosso- mos. 15 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar CENTRO DE ORIGEM E DIVERSIDADE A cana-de-açúcar é uma lavoura que produz em curto período, um alto rendimento de matéria verde, energia e fibras, sendo considerada uma das plantas com maior efici- ência fotossintética. Seu centro de diversidade é a Nova Guiné e centro de origem é desconhecido. Centro de Origem – Locais onde existe a maior diversidade genética de uma determinada espécie e de disseminação desta variabilidade. Centro de Diversidade – Difere do centro de origem pelo número de subespécies dentro dos limites de espécies separadas. Conhecer o C.O e de C.D de uma planta de interesse agrícola é fundamental, pois lá encontraremos fontes de variação genética imprescindíveis para serem usadas em programas de melhoramento vegetal. Centros de origem: 1.China: S. sinense e S. spontaneum 2.Índia: S. spontaneum 2a. Indo-malaio: S. officinarum, S. robustum, S. spontaneum e S. barberi 3. Ásia Central: S. spontaneum 4. Oriente Próximo, 5. Mediterrâneo, 6. África Oriental: S. spontaneum 7. Mesoamérica, 8. América do Sul, 8a.Chile, 8b.Brasileiro-paraguaio. 16 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar COMPLEXO SACCHARUM: •Saccharum spp •Erianthus SP - CANA ENERGIA •Sclerostachya, •Narenga, •Miscanthus - CANA ENERGIA PROBLEMAS QUE MOTIVARAM O INÍCIO DOS PROJETOS DE MELHORAMENTO NO MUNDO: AS DOENÇAS DE PLANTAS Os programas de melhoramento da cana-de-açúcar no mundo surgiram com a fina- lidade de criar novos tipos varietais mais resistentes às doenças que dizimavam os cana- viais. 17 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar No Brasil: Em 1863, o ataque de Gomose (Xanthomonas axonopodis pv. Vasculo- rum), em canaviais da Bahia, Pernambuco e na região de Campos, no Rio de Janeiro. As variedades que a sucederam foram escolhidas dentre outras canas nobres. Em Java, Indonésia: o “mal de sereh” (Sereh disease vírus) devastando os canavi- ais de outra cana “nobre”, a Black Cheribon, em 1890. No Brasil entre 1916 a 1920: o mosaico (Sugarcane mosaic vírus), provavelmente introduzido de variedades híbridas do gênero Saccharum oriundas da Ásia. APARECIMENTO IMPORTANTE DE DOENÇAS DE CANA-DE-AÇÚCAR NO BRASIL •1925: mosaico em tipos de S.officinarum cultivados •1953: carvão em variedades Co331 e CB45-3 •Década de 70: carvão na NA56-79 •1986: ferrugem marrom em variedades recém-lançadas pelo PLANALSUCAR •1992: amarelinho na variedade SP71-6163. •2010: ferrugem alaranjada é identificada em variedades na região de Ribeirão Preto. PLANO DE HIBRIDAÇÃO EM 1934 (Aguirre Jr) (1) Primeiro enobrecimento de Kassoer (2) Segundo enobrecimento de F1 de Kassoer Ex: POJ2364 x EK28 18 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar A variedade Crioula resultado da hibridação natural entre S.Officinarum e S.barberi. CULTIVADA DURANTE 350 ANOS NO MUNDO FONTE: LANDELL, 2010: 1.5. IMPORTÂNCIA DO MELHORAMENTO A cana-de-açúcar tem pouca resistência a doenças e alta exigência em solo e cli- ma. A alta suscetibilidade dessa espécie a diversas doenças, em especial ao MOSAI- CO, levou os países produtores a iniciar programas de melhoramento através da HIBRI- DAÇÃO entre diferentes espécies do gênero Saccharum. As canas cultivadas atualmente são consideradas um HÍBRIDO das seguintes es- pécies: Saccharum officinarum, s. barberi, S. robustum, S. spontaneum, S. sinense, S. edule. 19 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar FIGURA 01 Degenerescência Principal problema da lavoura canavieira Redução da capacidade produtiva das variedades comerciais Pesquisar constantemente – local de exploração (MANGELSDORF, 1966; STUPIELLO, 2002) Tempo Variedades . Diminuição da fertilidade do solo . Efeito cumulativo de pragas e doenças . Sem sintomas aparentes ou não identificadas MELHORAMENTO GENÉTICO DA CANA-DE-AÇÚCAR FIGURA 02 20 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar FIGURA 03 PROGRAMAS DE MELHORAMENTO ATIVOS NO BRASIL FIGURA 04 MELHORAMENTO GENÉTICO DA CANA-DE-AÇÚCAR 21 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar Melhoramento Clássico – Explora a Genética Quantitativa •Hibridação (o que cruzar) •Seleção (quanto, onde e como selecionar) •Melhoramento Biotecnológico –Transgênicos (ganhos não tangíveis pelo melhoramento clássico) –Marcadores Moleculares (auxiliar o melhoramento clássico deixando hibridação e sele- ção mais eficientes) HIBRIDAÇÃO Pode ocorrer naturalmente ou de forma planejada em cruzamentos específicos: a) Cruzamentos biparentais: quando envolvem dois clones . b) Multiparentais ou policross: quando envolve um número maior de parentais FIGURA 05 - Parque de lanternas bi parentais 22 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar FIGURA 06 - Lanterna para policruzamentos PLANEJAMENTO DOS CRUZAMENTOS • VALOR DE PARENTAIS – Comportamento dos parentais – Fenótipo complementar dos parentais – Diversidade genética dos parentais distância genética – Desempenho de progênies • FENÓTIPO – Conhecimento tácito – Dados de ensaios ESCOLHA DOS PARENTAIS: A boa escolha dos parentais aumenta a probabilidade de obtenção de genótipos superiores Estratégias para combinar esses parentais selecionados: 23 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar a) efetuar cruzamentos simples, porém controlados, para gerar populações segregantes, efetuando-se em seguida a seleção de plantas individuais, que podem ou não ser usados em novos cruzamentos; b) promover o intercruzamento entre os parentais escolhidos, mediante polinização livre, visando a formação de população base para se proceder a seleção recorrente: aumento de alelos favoráveis. PARENTAIS POTENCIAIS: a) CULTIVARES COMERCIAIS: muito utilizado, pois se a- proveita do efeito de seleções já efetuadas e portanto concentra alelos mais favoráveis para os caracteres desejados; b) CLONES ELITE c) LINHAGENS COM CARACTERÍSTI- CAS ESPECIAIS NOVO BIOTIPO DA CANA Desenvolvimento de variedades com características favoráveis para a produção de ener- gia. Cruzamento de híbrido comercial de Saccharum versus Saccharum spontaneum. ETAPAS DO PROCESSO DE GERMINAÇÃO DOS CARIOPSES: a) Germinação em caixas – plântulas em viveiro; b) Individualização das plântulasem viveiro; c) Aclimatação das mudas em bancadas; d) Plantio no campo (T1). Perfil agronômico de uma variedade A produtividade superior de energia (açúcar, álcool e fibra): caráter associado ao: a) acúmulo de biomassa b) teor de sacarose c) teor de fibra 24 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar Resistência ou tolerância às doenças e pragas; Acúmulo elevado de sacarose nos períodos de colheita de outono e/ou inverno e/ou primavera; Tolerância à seca: possibilita ganhos de biomassa no período inicial de déficit hídri- co, manutenção de colmos vivos até a colheita, e capacidade de brotação prolon- gada da soqueira; Ausência de florescimento e isoporização dos colmos: importante principalmente em cultivares com maturação médio-tardia e em regiões onde o déficit hídrico é muito acentuado; Teor de fibra médio-alto: visando à maior produção de energia; Teor de fibra médio-alto: visando à maior produção de energia; • Capacidade de brotação sob palha (TCH/longevidade); • Uniformidade da altura e diâmetro de colmos: característica facilitadora do corte mecâni- co, que reduz impurezas vegetais e indica uma menor variação da idade dos colmos da touceira, proporcionando melhor qualidade na maturação; • Hábito ereto de crescimento: relacionado à redução de perdas, maior rendimento do cor- te mecânico ou manual e redução de impurezas minerais; • Velocidade de crescimento e capacidade de rápido sombreamento das entrelinhas: as- sociado à redução de mato-competição; • Brotação rápida, vigorosa e prolongada da soqueira: mantém a população de colmos ao longo dos cortes e também reduz mato-competição; • Densidade de colmos: redução de perdas no processo de limpeza do corte mecânico, redução do custo de transporte de cada tonelada de colmos; • Despalha fácil ou espontânea: redução de impurezas vegetais; • Palmito curto: redução de impurezas vegetais e melhor rendimento de corte; • Diâmetro médio/grosso: aumento do rendimento de colheita e redução de perdas no processo de limpeza na colheita mecânica; • Tolerância ao frio. 25 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar CARACTERIZAÇÃO DA VARIEDADE QUANTO AO PERFIL DE RESPOSTA a) Índice ambiental e estabilidade para TCH/dia b) Variedades estáveis: É uma variedade que responde a uma condição mais favorável de cultivo, mas que também tem bom desempenho em condições desfavoráveis de produ- ção. c) Variedades responsivas: É aquela que tem grande resposta a uma condição favorável de cultivo, mas que não se adapta a ambientes mais restritivos. d) Variedades rústicas: É aquela que se adapta a ambientes mais restritivos, mas não apresenta boa resposta a uma condição favorável de cultivo. Algumas das principais siglas do Brasil. CB – Campos IAC – Instituto Agronômico de Campinas (SP) RB – República do Brasil (Planalsucar/RIDESA SP – São Paulo (Copersucar) CTC – Centro Tecnologia Canavieira (SP) PO - Pedro Ometto (Usina da Barra) PB – Pernambuco NOTA: ssp e o plural de sp que é uma abreviação para espécie nos casos em que esta não pode ser determinada. Portanto, a terminologia taxonômica atual dos cultivares de cana-de-açúcar é Sac- charum spp., já que não se cultiva comercialmente canas que não sejam fruto de melho- ramento (Híbridos). 2. ANATOMIA DA CANA-DE-AÇÚCAR 2.1. SISTEMA RADICULAR Raízes sett (colmo) são finas e têm muitas ramificações, que sustentam a planta em crescimento nas primeiras semanas depois da brotação. Raízes shoot são tipos se- cundários de raízes que emergem da base do novo shoot cinco a sete dias após o plantio. 26 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar As raízes shoot são mais grossas e vigorosas que as raízes sett e se desenvolvem no sistema da raiz principal da planta (Figura A). raízes sett continuam a crescer por um pe- ríodo de seis a quinze dias após o plantio, a maioria desaparecendo aos 60 – 90 dias, enquanto o sistema de raiz shoot desenvolve-se e apropria-se do suprimento de água e nutrientes ao shoot de crescimento. Genótipos que produzem muitos perfilhos normalmente produzem muitas raízes porque cada novo perfilho é uma fonte de raízes shoot. De forma similar, cultivos com maior penetração de raiz horizontal (gravitrópico fraco) são mais resistentes ao tomba- mento do que aqueles com um sistema de raiz gravitrópico mais forte. Um dos fatores de maior importância na relação planta-água-solo é a arquitetura e distribuição do sistema radicular das plantas, bem como sua dinâmica de crescimento (VASCONCELOS, 2002). O conhecimento do sistema radicular da cana-de-açúcar permi- te a utilização adequada das técnicas agronômicas, tais como: espaçamento, local de a- plicação dos fertilizantes, operações de cultivo, drenagem dos solos e sistemas de irriga- ção, controle da erosão, uso de culturas intercalares entre outras (CASAGRANDE, 1991). O estudo do sistema radicular tem sido relegado devido às variabilidades de condi- ções físicas, químicas e biológicas do solo, as quais influenciam a distribuição das raízes. Tais variabilidades podem levar a resultados não representativos do desenvolvimento normal do sistema radicular das plantas (VASCONCELOS et al., 2003). O desenvolvimento do sistema radicular de culturas perenes e semiperenes, como a cana-de-açúcar, apresenta um agravante, no que se refere à renovação de raízes entre ciclos, ou no mesmo ciclo, tornando-se necessário a identificação de raízes vivas ou me- tabolicamente ativas em uma massa total amostrada (FARONI, 2004). Depois do corte da cana-planta, o sistema radicular antigo mantém-se em atividade por algum tempo e, durante esse período, é substituído pelas raízes dos novos perfilhos da soqueira, sendo esse processo lento e gradual. As raízes da soqueira são mais superficiais que as da cana-planta pelo fato de os perfilhos das soqueiras brotarem mais próximo da superfície que os da planta. Pelo mes- mo fato, quanto maior o número de cortes, mais superficial o sistema radicular das so- queiras (BACCHI, 1983). O sistema radicular da cana-de-açúcar (rizomas e raízes) é essencial para a rebro- ta das soqueiras, uma vez que cumpre o papel de reserva orgânica energética e nutricio- nal (CAMARGO, 1989; MALAVOLTA, 1994; TRIVELIN et al., 2002). Ao mesmo tempo em 27 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar que ocorre a brotação das socas, um novo sistema radicular é formado, e algumas raízes vivas são importantes para alimentar os rebentos na fase inicial de desenvolvimento (CA- SAGRANDE, 1991). 2.1.1. Desenvolvimento radicular da cana-de-açúcar A compreensão dos fenômenos que ocorrem na parte aérea das plantas torna-se mais completa quando também se compreende o que ocorre abaixo da superfície do solo, principalmente com relação ao crescimento e à distribuição de raízes no perfil. O sistema radicular é o principal elo de ligação entre a planta e o ambiente de produção. É a “boca” e o alicerce do vegetal. O desenvolvimento do sistema radicular tem influência direta sobre algumas carac- terísticas da planta, tais como: resistência à seca, eficiência na absorção dos nutrientes do solo, tolerância ao ataque de pragas do solo, capacidade de germinação e/ou brota- ção, porte (ereto ou decumbente), tolerância à movimentação de máquinas, etc. De tais fatores depende a produtividade final. Entretanto, não é a quantidade de raízes o fator determinante destas vantagens, mas a sua distribuição no perfil do solo ao longo das estações do ano. Uma quantidade muito grande de raízes nas camadas superficiais do solo pode significar um gasto exces- sivo de metabólitos sintetizadosna parte aérea e translocados para as raízes, além de maior risco de estresse hídrico em períodos de veranico, mas, por outro lado, em condi- ções de cana irrigada, esta distribuição pode ser muito favorável (VASCONCELOS e GARCIA, 2005). A arquitetura e a distribuição radicular dependem de: • Fatores genéticos; • Fatores ambientais: solo e clima. O desenvolvimento do sistema radicular inicia-se logo após o plantio em uma por- ção do colmo com pelo menos uma gema lateral. As primeiras raízes formadas são as RAÍZES PRIMÁRIAS que emergem de uma parte dos primórdios da raiz acima da cicatriz da folha sobre os nós (DILLEWIJN, 1952; GLOVER, 1967). As raízes primárias podem surgir no prazo de 24 horas após o plantio 28 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar (GLOVER 1967) e esse tempo varia entre as variedades (VENKATRAMAN & THOMAS, 1922). As raízes primárias são finas e altamente ramificadas que sustentam a planta nas primeiras semanas após a germinação do tolete. As RAÍZES SECUNDÁRIAS são o se- gundo tipo de raízes que se formam da base do novo rebento 5 a 7 dias após o plantio, estas raízes são mais grossas que as primárias e são responsáveis por desenvolverem o sistema radicular principal da planta (DILLEWIJN, 1952). As raízes primárias continuam a crescer por um período de 6 a 15 dias depois do plantio, a partir do momento em que as raízes secundárias começam a retirar água e nu- trientes do solo e nutrir a parte aérea da planta, então, às raízes primárias entram em se- nescência e desaparecem entre 60 a 90 dias (GLOVER, 1967). Em três meses as raízes primárias ocupam menos de 2% da massa seca das raízes (DILLEWIJN, 1952). Evans (1936) observou que as RAÍZES SECUNDÁRIAS se diferenciam funcional- mente em três tipos no desenvolvimento da cana-de-açúcar. As primeiras raízes que sa- em da base dos novos rebentos são grossas e crescem para baixo em direção ao subsolo até uma profundidade de 1,5 m, elas são adaptadas a dar a sustentação à planta. Raízes emergentes dos nós superiores possuem o formato mais fino e são mais ramificadas que se estendem lateralmente formando uma densa rede de raízes “superficiais” responsáveis pela absorção de água e nutrientes. A terceira classe de raízes é formada pela aglomera- ção vertical de raízes que chegam a penetrar até a profundidade de 6 metros no solo ten- do assim ao acesso a reservas de água. Este padrão de desenvolvimento radicular se repete em cada perfilho criando assim a arquitetura do sistema radicular da cana-de- açúcar. Fatores genéticos que influenciam o desenvolvimento das raízes Assim como existem diferenças marcantes nas características da parte aérea entre espécies vegetais e entre VARIEDADES de determinada espécie, também existem gran- des diferenças no desenvolvimento e na arquitetura dos seus sistemas radiculares. O co- nhecimento da parte aérea de uma variedade não significa o conhecimento da planta. A arquitetura do sistema radicular também sofre alterações de acordo com a IDA- DE DA PLANTA, tanto entre ciclos (cortes) como dentro de um mesmo ciclo (meses de desenvolvimento). O sistema radicular da cana-planta explora mais intensamente as ca- 29 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar madas mais superficiais do solo, se comparada à soqueira, que apresenta um incremento na exploração de subsuperfície (Figuras 9A e 9B, página 45). Enquanto as práticas de calagem e de adubação de cana-planta exercem maiores efeitos sobre a produtividade até o 2o corte, os atributos químicos de subsuperfície têm maior importância a partir do 3o corte (LANDELL et al., 2003). Em uma lavoura de 8o corte pode-se encontrar alta ocorrência de raízes abaixo de dois metros de profundidade. Mas essa melhor exploração de subsuperfície pelas soqueiras varia também em função da classe de solo, de seus atributos físico-químicos e da disponibilidade hídrica do local. Embora a cana-planta apresente menor quantidade de raízes que as soqueiras, sua eficiência de absorção por unidade de superfície é maior, pois apresenta um conjunto de raízes mais novas e mais tenras que as soqueiras, que têm um sistema com uma pro- porção maior de raízes mais velhas e mais lignificadas e cuja manutenção compete mais com a parte aérea por energia. É muito provável que essa seja uma das causas da queda de produtividade de um corte para o outro. Fatores do solo que influenciam o desenvolvimento Podem-se relacionar três conjuntos de fatores do solo que interferem no desenvol- vimento radicular: pedogenéticos, atributos físicos e atributos químicos. Atributos físicos Densidade do solo Um dos atributos que mais interferem no desenvolvimento radicular é a densidade do solo. A densidade pode apresentar aumento de valores devido à compactação resul- tante de pressões exercidas pelo tráfego de máquinas, veículos, implementos e animais. O aumento na densidade do solo ocorre simultaneamente à redução da macropo- rosidade, redução da aeração, redução da condutividade hidráulica e gasosa e aumento da resistência à penetração. Todas essas alterações interferem, direta ou indiretamente, no desenvolvimento radicular, onde se podem ver porções do perfil com densidade excessiva impedindo o de- senvolvimento radicular da cana-de-açúcar. Esse solo, com argila em torno de 60%, tem densidade de 1,19 g cm-3 na profundidade entre 60 cm e 80 cm, mas nas porções de im- pedimento do crescimento radicular foram encontrados valores de densidade em torno de 30 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar 1,45 g cm-3. Para essa classe de solo e com esse teor de argila, a densidade de 1,45 g cm-3 é muito alta. A redução da aeração também é outro problema nos solos compactados. ASADY et al. (1985) relatam que a penetração de raízes em camadas compactadas decresce li- nearmente quando a aeração é reduzida a partir de 30% até 0%. Quanto à importância da disponibilidade de oxigênio às raízes, ERICKSON e VAN DOREN (1961) constataram que quando a difusão do oxigênio cai para menos de 58 mg m-2 s-1, o crescimento radicular é restringido. Solos compactados apresentam difusão inferior a 33 mg m-2 s-1 (ERICKSON, 1982). Além da pressão exercida pelas máquinas, a umidade do solo no momento das operações também atua como importante fator na distribuição da compactação no perfil, e o grau dos efeitos prejudiciais depende das proporções de argila:silte:areia das diferentes classes de solo. Umidade do solo É indiscutível a importância da disponibilidade de água para a planta. E o sistema radicular é a “boca” de captação dessa água. Portanto, a utilização de água pela parte aérea depende, principalmente, da distri- buição do sistema radicular. Por outro lado, essa distribuição no perfil do solo depende da umidade e dos ciclos hídricos em determinada região. Em regiões ou períodos secos, a arquitetura radicular apresenta maior proporção de raízes profundas em relação ao total, comparada àquela em locais ou períodos úmidos. Se o solo seca de cima para baixo, as camadas superficiais tornam-se mais resis- tentes à penetração de raízes antes das camadas mais profundas. Enquanto o sistema radicular, na superfície, tem seu crescimento paralisado ou até reduzido pela morte de raízes, nas camadas mais profundas o crescimento se mantém por mais tempo, resultan- do em um aprofundamento do sistema radicular. Além disso, os metabólitos que seriam utilizados para a formação de raízes superficiais podem ser, então, utilizados na formação de raízes mais profundas. É a natureza: o próprio processo de secagem do solo fazendo com que haja uma mudança estrutural no vegetal para a sua sobrevivência. 31 Fisiologia da produçãode cana-de-açúcar Segundo Stasovski e Peterson (1993), as alterações estruturais nas raízes em res- posta à seca são permanentes e o restabelecimento do crescimento após a reidratação envolve, usualmente, a formação de novas raízes laterais. ENGELS et al. (1994) consta- taram que plantas de milho podem responder rapidamente ao ressecamento e reumede- cimento das camadas superficiais do solo através do aumento do crescimento de raízes nas camadas com condições mais favoráveis. Os autores concluem que esta plasticidade no crescimento de raízes é um fator que contribui para a manutenção de um adequado estado nutricional. A umidade do solo e os outros atributos como porosidade, aeração e resistência à penetração, estão interligados quanto à influência sobre o crescimento radicular. Pouco adianta um teor de água no solo ser satisfatório se houver baixa aeração e alta resistência à penetração. É lógico que a umidade diminui a resistência à penetração se comparada à condição de solo seco. Mas um solo compactado, mesmo estando úmido, tem elevada resistência à penetração. Se existir camada de impedimento do crescimento para cama- das mais profundas, em períodos de seca, a planta estará mais sujeita ao estresse hídri- co. Atributos químicos Quanto aos aspectos nutricionais, a adaptação de uma variedade a um solo de baixa fertilidade depende da eficiência de absorção do sistema radicular e de sua tolerân- cia a elementos tóxicos. Segundo ANGHINONI e MEURER (1999), a aquisição de nutri- entes é alterada sempre que a cinética de absorção ou o crescimento das raízes forem afetados. O teor de alumínio no solo, responsável pela redução no crescimento das raí- zes, varia com as espécies, cultivares e com o solo, especialmente quanto ao seu teor de cálcio, pois as raízes não crescem em solos deficientes deste nutriente, que é essencial para a divisão celular e para a funcionalidade da membrana celular. Segundo FURLANI (1983), a toxidez de alumínio pode provocar a fixação de fósfo- ro em formas menos disponíveis, diminuir a taxa de respiração, interferir em reações en- zimáticas responsáveis pela deposição de polissacarídeos nas paredes celulares e modi- ficar a dinâmica de absorção e transporte de vários nutrientes, principalmente Ca, Mg e P. Por outro lado, ZHANG e BARBER (1992) comprovaram que a liberação de fósforo esti- mula o crescimento de raízes. 32 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar Segundo TINKER (1981), é essencial que raízes e nutrientes se distribuam apro- priadamente entre si para haver máxima eficiência do sistema radicular e isso também deve ser considerado em relação à variável tempo, devido ao crescimento e distribuição das raízes, ao movimento de íons no solo, às alterações de demanda pela cultura e às mudanças do teor de água no solo. Fatores ambientais no desenvolvimento radicular e na brotação Temperatura A temperatura do solo influencia a biomassa radicular (WALKER, 1969), o grau de elongação (LOGSDON et al., 1987) e de ramificação (BOX, 1996). Segundo esse último autor, a orientação do crescimento radicular é mais horizontal sob baixas temperaturas. A manutenção do colchão de palha residual da colheita mecanizada crua propor- ciona maior disponibilidade hídrica no solo, comparada à condição de solo nu. Por outro lado, a presença da palha resulta em menor temperatura do solo. ABRAMO FILHO (1995) constatou que a temperatura da superfície da palha foi 5oC superior à temperatura sob o colchão de palha. Com isso, variedades com diferentes capacidades de desenvolvimento radicular e tolerância à seca reagem distintamente a estas condições e estes fatores inter- ferem na absorção de nutrientes e têm grande influência no desenvolvimento radicular. A temperatura interfere na velocidade das reações bioquímicas e na ação de enzi- mas envolvidas na divisão, diferenciando o crescimento celular e, portanto, é um dos fato- res que mais influenciam na brotação. Clements et al. (1952), relataram que 19,5°C seria uma temperatura que estaria próxima do ponto na qual a atividade de crescimento é nula. Por outro lado, Gasho et al.(1973) observaram que não existe um ótimo de temperatura, se muito alta ou muito baixa, pode causar decréscimo na produção. Analisando a influencia da temperatura du- rante a brotação sobre o número de colmos industrializáveis por touceira, verificaram que o ótimo estava entre 30°C, e a equação que representa essa tendência, seria: Y=8,46 + 0.60X – 0,009X2 onde: Y representa o número de colmos por touceira e X a temperatura de brota- ção (10,20,30,40 e 50°C). Os autores citaram também que temperaturas acima de 35°C podem reduzir muito a produção final. 33 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar Umidade do solo e Precipitação No que diz respeito à disponibilidade de água, a deficiência hídrica no solo pode prejudicar ou impedir a brotação das gemas, e isso depende da intensidade e da duração do período de deficiência hídrica. A umidade adequada para a brotação pode variar em função da região, da classe de solo e principalmente de condições físicas do solo, como aeração, densidade e condutibilidade hidráulica. Casagrande (1991) sugere que mais importante que aferir a umidade do solo é a determinação do potencial em que a água está retida do solo. Sing & Srivastava (1973) mostraram os efeitos dos diferentes níveis de retenção de água no solo sobre o desenvol- vimento inicial dos brotos e raízes da cana-de-açúcar. O potencial próximo de zero é e- quivalente á condição de capacidade de campo, a qual proporcionou as melhores taxas de desenvolvimento inicial. O potencial de 15 atm, equivalente ao ponto de murcha per- manente, resultou em uma porcentagem de brotação de 65,55% e redução na altura e peso de brotos e matéria seca, e comprimento das raízes. Há de se ressaltar a importância da variedade plantada e da profundidade do lençol freático que precisa estar pelo menos a 1 metro de profundidade (VASCONCELOS et al., 2003). A umidade do solo tanto em falta como em excesso pode prejudicar a brotação. A umidade e a aeração do solo são independentes, principalmente em solos pesados, onde o excesso de umidade pode promover a deficiência da aeração. Isso porque o processo de brotação é caracterizado por um considerável aumento na respiração e, em função disso, a aeração do solo torna-se um fator de importância (DILLEWIJN, 1952). A precipitação em cada região e a capacidade de armazenamento de água no solo determina a disponibilidade de água para o desenvolvimento radicular. De nada adianta um solo apresentar excelentes atributos físico-químicos e elevada capacidade de arma- zenamento de água se não chove na região. O contrário também é verdadeiro: se chove bem, mas o solo tem capacidade de armazenamento muito baixa, poucos dias sem chuva e elevada evapotranspiração podem resultar em deficiência hídrica, resultando no proces- so de redução de raízes superficiais e consequente alteração na arquitetura do sistema radicular. Portanto, para a adequada classificação de ambiente de produção, não se pode le- var em consideração apenas a classe de solo e sua condição de fertilidade, mas sim, de- 34 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar ve-se avaliar o conjunto de condições que possam favorecer, permitir ou impedir o desen- volvimento radicular e da parte aérea. Crescimento e distribuição das raízes As raízes primárias possuem uma alta taxa de elongação, chegando a 20 mm em alguns dias após o inicio do desenvolvimento sob condições favoráveis (GLOVER, 1967). As raízes secundárias crescem mais rapidamente, com taxas de elongação estabelecidas acima de 80 mm por dia, no entantoestes níveis são observados por um curto período de tempo (DILLEWIJN, 1952; GLOVER, 1967). A taxa média de crescimento para as raízes secundárias depois de 10 dias é de 40mm por dia em solos arenosos e de 28mm por dia em solos argilosos (GLOVER, 1967). Os estudos de Smith et al. (2005) demonstram que em áreas de cultivo de cana-de- açúcar em sequeiro, as taxas de elongação são maiores quando comparadas com o culti- vo irrigado. A maior concentração de biomassa de raízes é encontrada perto da superfície e diminui exponencialmente com a profundidade. Aproximadamente 50% da biomassa radi- cular ocorrem nos primeiros 20cm de solo e 85% na camada de 0 a 60 cm (BLACKBURN, 1984; VASCONCELOS 1998). Com o passar do desenvolvimento da cultura há uma vari- ação nesse comportamento, isso devido à alternância de raízes vivas e mortas (AGUIAR, 1978). O crescimento e a distribuição das raízes são fortemente afetados pelo suprimento e distribuição de água no solo, causando diferenças na exploração dos recursos que es- tão em uma maior profundidade (SMITH, 2005). Segundo Baran et al. (1974), que compa- rou a distribuição de raízes em cultivos irrigados e de sequeiro, observa-se que as raízes das plantas com baixa frequência de irrigação estão distribuídas mais profundamente da- quelas plantas que são bem irrigadas. Raízes profundas reduzem a vulnerabilidade da cultura à deficiência de água no solo, pela capacidade dessas raízes captarem a água que fica reservada em camadas mais profundas (WOOD & WOOD,1967). Depois do corte da cana, o sistema radicular antigo mantém-se em atividade por algum tempo e, durante esse período, é substituído pelas raízes dos novos perfilhos da soqueira, sendo esse processo lento e gradual. As raízes da soqueira são mais superfici- ais que as da cana-planta pelo fato de os perfilhos das soqueiras brotarem mais próximo 35 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar da superfície (FARONI & TRIVELIN, 2006). Pelo mesmo fato, quanto maior o número de cortes, mais superficial é o sistema radicular das soqueiras (BACCHI, 1983). O desenvolvimento do sistema radicular é típico para cada espécie, havendo cres- cimento acumulativo durante os ciclos da cultura, da cana-planta para as socas nos su- cessivos cortes (colheitas), a morte ou a renovação do sistema radicular não é causada pela colheita da cultura e sim pela deficiência hídrica, independentemente da fase de de- senvolvimento (AGUIAR, 1978; VASCONCELOS, 2002). O sistema radicular da cana-de-açúcar (rizomas e raízes) é essencial para a rebro- ta das soqueiras, uma vez que cumpre o papel de reserva orgânica energética e nutricio- nal (CAMARGO, 1989; MALAVOLTA, 1994; TRIVELIN et al., 2002). Ao mesmo tempo em que ocorre a brotação das socas, um novo sistema radicular é formado, e algumas raízes vivas são importantes para alimentar os rebentos na fase inicial de desenvolvimento (CA- SAGRANDE,1991). As raízes são do tipo fasciculado e podem atingir até 4,0 m ou mais de profundida- de. Estudos clássicos sobre distribuição do sistema radicular da cana, citados por BAC- CHI (1985), evidenciam a existência de três tipos básicos de raízes na cana: Raízes superficiais, ramificadas e absorventes; Raízes de fixação mais profundas; e Raízes cordão, que podem atingir até 6 metros de profundidade. A proporção de cada tipo de raiz no sistema radicular depende da cultivar, das pro- priedades física e química do solo e da umidade. Cada perfilho apresenta um sistema radicular próprio, de forma que enquanto hou- ver emissão de perfilhos, ocorre aumento no volume de raízes. Esse volume tende a se estabilizar, havendo posteriormente apenas uma renovação das raízes velhas, que vão morrendo. As raízes têm função principal de sustentação, além de absorver água e nutrientes. O SISTEMA RADICULAR da cana-planta explora mais intensamente as camadas superficiais, se comparada a cana-soca, que apresenta um incremento na exploração de subsuperfície. Embora a cana-planta apresente menos raízes que as soqueiras, sua eficiência de absorção por unidade de área é maior, pois apresenta um conjunto de raízes novas e ten- ras que as soqueiras, que têm uma proporção maior de raízes velhas e lignificadas. 36 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar FIGURA 28 FIGURA 29 37 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar FIGURA 30 FIGURA 31 38 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar RIZOMAS OS RIZOMAS - Assemelham-se a colmos subterrâneos, com entrenós, nós e ge- mas, sendo, porém, os entrenós bastante reduzidos. A brotação das do rizoma vai constituir novos colmos, dando formação à TOUCEIRA. O rizoma é também responsável pela formação de uma nova touceira, após o corte dos colmos. COLMO É geralmente cilíndrico, colorido e formado por duas partes: NÓ e ENTRENÓ (in- ternódio ou gomo). NÓS Nos nós encontramos a CICATRIZ FOLIAR (resto da inserção da bainha da folha no colmo), a GEMA e a zona radicular. FIGURA 32 39 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar 2.2. CAULE OU COLMO Também chamado de COLMO, é um órgão de reserva, envolto pelas folhas alter- nadas. Ele pode ser ereto ou decumbente e seu diâmetro varia de cerca de um centímetro a vários centímetros. As touceiras podem ser ralas ou densas, conforme o número de colmos em cada uma delas. Uma junta é formada de um nódulo e um entrenó. O nódulo é o local onde a folha está acoplada ao talo e onde as gemas e a raiz primordial são encon- tradas. Uma cicatriz pode ser encontrada no nódulo das folhas quando estas caem (Figu- ra B). A extensão e o diâmetro das juntas se diversificam de acordo com as variedades e as condições de cultivo. As cores do talo vistas nos entrenós dependem das variedades de cana e das condições ambientais. Todas as cores do talo derivam de dois pigmentos básicos: a cor vermelha da antocianina e a verde da clorofila. Os colmos apresentam formato cilíndrico sendo compostos por NÓS e ENTRENÓS internódios). Eles podem ser definidos como à porção acima do solo, que sustenta as fo- lhas e a inflorescência. NÓ Região onde se insere a bainha e a folha e encontram-se: ZONA RADICULAR – que inclui a gema e vários primórdios radiculares; ANEL DE CRESCIMENTO – região com células que permitem o alongamento do entrenó; ZONA CEROSA E ENTRENÓ. Além dessas estruturas, há a chamada CICATRIZ DA BAINHA. Nos nós encontramos a CICATRIZ FOLIAR (resto da inserção da bainha da folha no colmo), a GEMA e a zona radicular. GEMAS As gemas, localizadas na zona radicular, são dispostas alternadamente no colmo, uma em cada nó. Possuem as mais variadas formas e tamanhos. As características das gemas, juntamente com a cor e diâmetro do colmo, bem como o formato e a disposição dos entrenós, constituem elementos importantes para dife- renciação das variedades. 40 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar As folhas mais velhas se tornam menos ativas e morrem com o tempo, despren- dendo-se do colmo e deixando uma cicatriz. O formato e a cor do colmo é uma característica fenotípica importante e muito ú- teis na descrição e identificação de variedades. FIGURA 08 CANA-DE-AÇÚCAR — II ÓRGÃOS VEGETATIVOS Região auricular GEMAS - TIPOS ANGULAR HORIZONTAL 41 Fisiologia da produção de cana-de-açúcar FIGURA 09 42 Fisiologia da produção
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