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i Capítulo V I I A C O L H IM E N T O I N S T I T U C I O N A L : NÃO S E P OD E P E R D E R O M EN INO DE V I S T A Cláudia Vidigal "Não se pode falar de educação sem amor". Paulo Freire No Brasil, cerca de 30 mil crianças e adolescentes estão em serviços de acolhimento. O acolhimento institucional é uma medida jirotetiva, temporária e provisória e absolutamente necessária para que algumas crianças e adolescentes possam ser garantidos em seus direi- tos básicos em momentos de vulnerabilidade social e familiar. Esta medida está presente no Brasil, mas também em quase todos os países desenvolvidos da Europa, América do Norte etc. Com isso, entende- mos que se trata de uma questão que extrapola o âmbito económico e explicita a possibilidade de crises familiares em qualquer camada so- cial nas quais o Estado precisa agir para proteger as crianças e adoles- centes, bem como as famílias, que precisam de apoio para superar este momento e poder voltar a cuidar de seus filhos. As últimas décadas trouxeram avanços significativos para es- ta medida em nosso país, tomando-a cada dia mais acolhedora, de 98 Cláudia Vidigal verdade. Desde a Constituição Federal, em 1988, até os dias de hoje, diversos avanços legais foram alcançados, sendo o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) o mais importante de todos eles. Acontece, porém, que o emblema do Brasil Colónia, assistencialista, marcado por profundas diferenças sociais traz ainda resquícios importantes de sua história para nossa prática, e aproximar os parâmetros legais da realidade cotidiana é um objetivo que precisamos perseguir com vee- mência. Para tanto, é fundamental estarmos absolutamente cientes das leis, dos planos e das diretrizes nacionais, conseguindo assim fortale- cer a indentidade das instituições de acolhimento dentro de todo o Sistema de Garantia de Direitos. Formação e capacitação contínua para os trabalhadores que atuam neste sistema são imperativos. O Instituto Fazendo História é uma organização social sedia- da em São Paulo que tem como objetivo contribuir com o desenvol- vimento de crianças e adolescentes que estão em instituições de aco- lhimento, trabalhando junto a sua rede social. Em 2010, o Instituto teve mais de 100 abrigos parceiros em processos de formação em bus- ca de um melhor acolhimento. Todos os seus programas têm os parâ- metros legais que iremos presentar a seguir como diretrizes do traba- lho e as histórias de vida de cada criança e adolescente que está nos abrigos onde trabalha como eixo transversal de todas as suas estraté- gias de atuação. Não se pode perder o menino de vista. O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA, 1990) No processo de reordenamento e profissionalização dos abri- gos, percebe-se que a adequação às novas práticas de atendimento, propostas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, de- pende fundamentalmente de um novo modo de compreender a infân- cia e adolescência, tendo como pressuposto que a criança e o adoles- cente são sujeitos de direitos. Família e Violência: Conceitos, Práticas e Reflexões Críticas 99 Antes, existiam os grandes orfanatos que se pautavam pelo modelo de uma instituição fechada (as chamadas instituições totais) à semelhança dos manicómios, conventos, prisões e, portanto, as ativi- (lades de educação, saúde, lazer, profissionalização eram realizadas dentro da instituição, e a convivência familiar e comunitária era prati- camente nula. Trata-se de uma mudança do olhar e do fazer, uma mudança lie mentalidade de todos os atores, no sentido de superar práticas assis- (encialistas e colocar em foco uma nova concepção de atendimento, pautada na educação e no olhar individualizado para cada criança e adolescente, considerando sempre seu contexto social. O desafio está cm reconhecer não só a criança e o adolescente como sujeitos de direi- to, mas também reconhecer a família e a comunidade como referên- cias fundamentais na constituição da identidade desses sujeitos e em seu percurso em direção ao futuro. Após a promulgação do ECA, inicia-se o desmonte das grandes instituições, dando lugar a pequenas casas, de caráter residen- cial para grupos menores de crianças e adolescentes. Os irmãos devem jicrmanecer juntos. O encaminhamento para as unidades deve ser de caráter excepcional e provisório. As transferências de abrigo devem ser evitadas. Os atendimentos passam a ser personalizados. Passa-se a utilizar os recursos púbhcos da comunidade do entorno das unidades de acolhimento para assegurar saúde, educação, cultura e lazer. As unidades de acolhimento devem estimular e favorecer a convivência familiar e comunitária. Antes do ECA, acreditava- se que o melhor lugar para muitas crianças e adolescentes de famílias pobres ou mais desorganizadas crescer era, de fato, uma grande instituição. Acontece t|ue, desde o perído pós-guerra, na Europa, diversos estudos aponta- ram para as dificuldades encontradas para se promover um desenvol- vimento integral em nossa sociedade ocidental fora de um núcleo fa- miliar. Entendeu-se que a instituição não é o melhor lugar para uma criança crescer e se desenvolver, mas sim, a família, ainda que dife- rente da idealizada por todos. O conceito de família é então ampliado e mais valorizado. O poder público reconhece que possui parcelas de responsabilidade em desenvolver políticas públicas para suprir as necessidades básicas de manutenção das famílias das crianças e adolescentes em medida de proteção. 100 Cláudia Vidigal O PLANO NACIONAL DE CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA (2006 - PNCFC) Em dezembro de 2006, o Plano Nacional de Promoção, Pro- teção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (PNCFC) é divulgado e constitui-se como um marco nas políticas públicas do Brasil, visando primordialmente in- vestir na preservação dos vínculos familiares e comunitários, enten- dendo a família enquanto lugar privilegiado para o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes e rompendo com a cultura da insti- tucionalização de crianças e adolescentes em função da pobreza ou dificuldades circunstanciais de sua família. Trata-se não só de uma compreensão da realidade, mas também, de um plano de metas de se modificar a realidade para que o Estatuto possa ser garantido. O PNCFC reforça os preceitos da não discriminação, o inte- resse superior da criança, os direitos ao pleno desenvolvimento e o respeito à opinião da criança. Alude à importância da convivência familiar e comunitária para um desenvolvimento saudável da criança e adolescente e responsabiliza o Estado e a família como coparticipan- tes nesta empreitada. ORIENTAÇÕES TÉCNICAS: SERVIÇOS DE ACOLHIMENTO PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES (OT, 2009) Em 18 de junho de 2009, foi aprovado o documento Orienta- ções Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes (OT) com a finalidade de dar parâmetros claros para que os serviços de acolhimento pudessem ganhar qualidade. O documento indica pro- cedimentos técnicos ftindamentais para a profissionalização desses serviços estabelecendo, inclusive, orientações metodológicas e diretri- zes nacionais que possam contribuir para que o atendimento no servi- ço de acolhimento seja transitório, porém reparador. Família e Violência: Conceitos, Práticas e Reflexões Críticas 101 Assim, a partir da divulgação deste documento, os serviços de acolhimento de todo o país passam a ter maior clareza do que é esperado deles, de qual é o seu papel no Sistema de Garantia de Direi- I D S e, mais do que isso, passam a ter claro um caminho metodológico comum para o estabelecimento de um serviço de acolhimento de qua- lidade. Não se trata do engessamento de propostas pedagógicas, mas lia concepçãoe socialização de um mesmo norte e da organização de propostas para serem atingidas. Neste documento, estabelece-se qua- tro modelos para os serviços de acolhimento: abrigo, casa-lar, famílias acolhedoras e república jovem. Para cada modelo, há uma diretriz de luncionamento. LEI 12.010 - NOVA LEI NACIONAL DE ADOÇÃO Ainda em 2009, foi aprovada a Lei 12.010, conhecida como Nova Lei Nacional de Adoção. Ela altera diversos artigos do ECA (Brasil, 1990). A partir da promulgação desta lei, os juízes, além de justificar e fimdamentar a entrada e saída de crianças e adolescentes das unidades de acolhimento, passam a ter um prazo de seis meses para reavaliar a permanência das crianças e adolescentes neste serviço, liste dispositivo garante uma revisão e avaliação permanente de todo o sistema de proteção e da necessidade da medida protetiva, em cada caso. Outra inovação foi a fixação do tempo de dois anos como o pe- ríodo máximo de permanência em programa de acolhimento institu- cional e familiar e a obrigatoriedade de justificativa da autoridade ju- diciária, quando este prazo for superado. Este procedimento pretende prevenir que não haja demora excessiva na solução de algumas situa- ções de acolhimento, bem como, assegurar que o direito da criança ou adolescente de viver em uma família, biológica ou substituta, seja pri- vilegiado em detrimento da permanência em um serviço de acolhi- mento. A família passa a ser considerada em dimensões estendidas e ampliadas, para além da unidade pais e filhos e passa a ser compreen- dida também como aquela, formada por parentes próximos com os 102 Cláudia Vidigal quais a cri-ança"" adolescente convive e mantém vínculos dc H , , , , , de e afeti^tM'^ nova lei reforça ainda a necessidade da prcs.M , ção dos vííílculK familiares e fraternais, declarando que "os grupo* ,|, irmãos senão colocados sob adoção, tutela ou guarda da mesma l.imi lia substiti^ta' ressalvada a comprovada existência de risco de a h n , . . .,„ outra situ^íÇãoflue justifique plenamente a excepcionalidade\lr ção divergia, ptocurando-se, em qualquer caso, evitar o r om n u i definitivo rdosvínculos" (art. 28 - parágrafo 4). Cria e toma ob,,,.,,,,, rio o P l a n^ taf'dual de Atendimento (PIA), um procedimento .,„„ resulta ent^ umdocumento onde deverão constar todas as informk.V» e o objetivtodoatendimento em relação àquela criança ou adolcsccnl». e sua famPlia. Wamental no esforço de dar uma solução efetivi n n., cada caso. 'No PIA deverão estar registrados os resultados da avaliu ilu interdiscipri'linar'f compromissos assumidos pelos pais ou resnouMi vel e pe la i rede de atendimento; e a previsão das atividades a s ou . , desenvoIv:'idas com a criança ou com o adolescente acolhido e sn\<, pais ou r&fspmvel, com vista à reintegração familiar ou caso sn.i esta vedacfda por expressa e fundamentada determinação judicial tm providênci«iasaserem tomadas para sua colocação em família subsiiiii ta, sob direfetasupervisão da autoridade judiciária. O!')utro aspecto positivo diz respeito à escuta das crianças „„ dos adolesí«centes, os quais devem ser ouvidos e passam a ter sua opi- nião devic'àaKÚe considerada. Adolescentes com mais de 12 anos precisam «icoísentir seu encaminhamento para famílias adotivas To dos passatí»na ter o direito de conhecer sua história ao completar 1« anos, e, ar^tes disso, desde que acompanhados por profissionais com- petentes. NOVAS ULIIS, NOVAS PRÁTICAS, NOVOS VÍNCULOS QiO stabelecimento de todos esses novos parâmetros legais nas últimafsJécadas não é, por si só, suficiente para que novas práticas sejam Parsf^*^^^- mudanças ocorrem de forma gradativa, proces- sual enãa^O'P'^ decreto. Assim, as instituições de acolhimento vêm lumil ia e Violência: Conceitos, Práticas e Reflexões Críticas 103 liindo para se aproximar cada dia mais do que a legislação espera e IJit delas. Nes te novo paradigma, os técnicos e educadores dos ser-||i'< dc acolhimento buscam qualificar sua atuação para um acolhi-H I I O individualizado que considere a história pessoal e familiar de (III u m e que tenha sempre o direito à convivência familiar e comu-Uiii i i como pano de fundo de suas ações. Para tanto, o estabeleci-lliti) dc vínculos é condição central do trabalho, que ainda aparece fincada por diversas contradições. Com resquícios de uma orientação assistencialista, é comum b o vínculo estabelecido com as crianças e adolescentes nos abrigos jb orientado pela ideia de que, por tratar-se de situações envolvendo nllitos junto aos familiares, é preciso protegê-los e amá-los como se ucni filhos. Assim, constrói-se um trabalho sobre o engano de que Hii possível e adequado substituir a família de origem. Essa orienta-0 S C apoia n um complicado e cmel julgamento em que não se reco-iiliccc a capacidade de cuidar e educar daquela família, além de contar mm um impossível: apagar a história passada. E nesta perpectiva, |Mi i l c - se o direito à convivência familiar de vista. Diversas são as histórias em que trabalhadores dos serviços ili- acolhimento, ao se vincularem com as crianças e adolescentes, co- mo se fossem o s pais, de modo consciente ou não, no ímpeto de apla- lar o sofrimento decorrente do afastamento em relação à família de origem, dificultam o trabalho de reaproximação e reinserção familiar. Desde a chegada na instituição, os vínculos entre as crianças c adolescentes e os trabalhadores do abrigo começam a ser constmídos c permitem assim, proporcionar-lhes um lugar acolhedor para que i|uestões como: desamparo, saudade, raiva e medo, por exemplo, pos- sam ser expressas e cuidadas. No entanto, é importante que estes vín- culos não concorram ou disputem com o vínculo dessas crianças e adolescentes com suas famílias. Para tanto, é preciso circunscrevê-los dentro de uma proposta de trabalho para cada criança, um Plano Indi- vidualizado de Atendimento (PIA), que reúna os dados da história trazidos pelos órgãos encaminhadores e estabeleça algumas tendências para cada caso. Se o trabalho do educador é de um trabalho apoiado em rela- ções afetivas, trata-se, então, também de um trabalho, de uma prática que precisa ser profissionalizada. Nas relações afetivas estamos entre- 104 Cláudia Vidigal gues, mergulhados, experienciando "coisas" que nem sempre temos consciência ou somos capazes de controlar. Esse talvez seja uma das questões mais paradoxais dos serviços de acolhida. Como profissiona- lizar sem anular os afetos envolvidos? Este desafio é tão grande que diversos trabalhadores de abrigos, por vezes, chegam a desenvolver bloqueios que os impedem de se vincularem às crianças e adolescen- tes. É muito importante que os educadores estejam atentos para perce- ber o tipo de sentimento que as crianças e famílias lhes mobilizam. Por exemplo: se os educadores se identificam demais com o sofrimen- to da criança podem atuar de maneira involuntária criando situações nas quais afastam a família da criança e aí, não contribuem para os processos de inserção familiar. A ênfase no trabalho de inserção familiar que atualmente orienta as políticas de acolhimento, coloca um desafio para os traba- lhadores destes serviços: vincular-se afefivamente às crianças e aos adolescentes com vistas a apoiá-los no processo de desligamento do serviço de acolhimento. Muitos são os relatos de trabalhadores de abrigos marcados pela saudade das crianças com quem estiveram durante o período de acolhimento. É por esse mofivo que os espaços de formação para esses trabalhadores são importantes. . ,,, HISTÓRIAS QUE SE CRUZAM NO ESPAÇO INSTITUCIONAL A possibilidade de a criança e o adolescente atribuírem signi- ficado à história e ao sofrimento vividos com sua família, quando isto ocorreu, é um dos componentes centrais do papel do educador. Com frequência a expressãodessa dor aparece, por exemplo, em compor- tamentos agressivos, apáticos, nas dificuldades de socialização, nas dificuldades de aprendizagem apresentadas na escola. Para o educador acessar o que está sendo expresso em cada uma dessas situações c preciso, antes de mais nada, enxergar tais situações como oportunida- des de expressão, mesmo que não se tenha de imediato clareza do que está se revelando. Muitas vezes, ocorrem situações no abrigo muito Família e Violência: Conceitos, Práticas e Reflexões Críticas 105 difíceis de serem decodificadas, principalmente no momento da recep- ção e nas primeiras semanas de chegada da criança. À primeira vista, alguns comportamentos podem ser entendidos como ataques pessoais aos educadores. É bastante comum, por exemplo, que meninas ou me- ninos que foram abusados, apresentem grandes dificuldades para se aproximar dos educadores do mesmo sexo dos abusadores. Estas difi- culdades podem ser percebidas, por exemplo, em atitudes excessiva- mente receosas diante da presença desses educadores. As meninas podem se apresentar para a relação com o educador de forma bastante sexualizada, como se não houvesse outra forma de receber amor, a não =er a partir de seu corpo. Nestas circunstâncias, estabelecer relações de ínculo afetivo é um processo que pode inaugurar uma experiência ao mesmo tempo amorosa e respeitosa, fundamental na construção da identidade, que considere e reestabeleça o caráter protetivo da relação ntre um adulto e uma criança. Além da própria relação vivida com o educador, a possibili- ade de a criança e o adolescente conhecerem e falarem sobre sua istória e o que se passou em sua família é fundamental. Essas são onversas que ocorrem com os trabalhadores dos abrigos quando há lações de confiança e, com frequência, em situações do cofidiano. Tudo isso permitirá a expressão da criança e do adolescente e o traba- lho de reintegração às famílias. Ao retomar sua história, a criança tem a oportunidade de res- significar - atribuir outros sentidos - suas lembranças difíceis e abrir caminho em direção a recursos que a podem ajudar a superar adversi- dades. O papel do educador em um abrigo, em grande medida, está em oferecer à criança a possibilidade da palavra para a representação de suas vivências e para a expressão do que sonha para o flituro, seja na conversa, na encenação da brincadeira, no desenho, no acompanha- mento das tarefas escolares, na organização dos seus objetos pessoais e em outras situações prosaicas do cotidiano. Muitas são as situações oo longo do cotidiano em que a criança e o adolescente podem se ex- pressar. A conversa significativa - o diálogo em que há interesse real cm escutar o outro - tem um enorme potencial de ajuda no atravessa- mento dos momentos de muito sofrimento. Porém, as conversas sobre as histórias são momentos delica- dos dentro do abrigo. A dor que as acompanha não é fácil de suportar c pode ativar lembranças das histórias pessoais de quem as ouve. E, 106 Cláudia Vidigal então, o educador passa a ter que lidar com os seus próprios sofrimen- tos. Há também o receio de que as crianças se entristeçam ainda mais, uma vez que a dor se ativa novamente. E, mesmo em se tratando das lembranças alegres, teme-se que as saudades que desencadeiam tam- bém as ameacem. Esse receio ou temor leva, muitas vezes, a não que- rer despertar nenhuma lembrança, mas, o que se constata, com fre- quência, é que depois de uma conversa difícil para a criança, por exemplo, ela fica mais aliviada e consegue brincar ou dar conta de alguma tarefa do cotidiano. De fato, ser companhia nesses casos não é uma tarefa fácil, mas, falando, é possível começar a sentir menos dor e é possível criar espaços internos para viver novas experiências das quais sentiremos novas saudades, por exemplo, saudades de boas con- versas em que fomos ouvidos com respeito e acolhimento. O trabalho de retomada da história ganha força quando per- mite que a criança se aproprie do que viveu e lhe atribua um significa- do, abrindo espaço para que imagine um futuro, que sonhe, que faça planos. As informações reunidas pela equipe técnica a partir de entre- vistas com os familiares da criança, visitas domiciliares e relatórios do fórum e de outros equipamentos, possibilita que a equipe do serviço de acolhimento conheça as histórias das crianças por outras fontes que não apenas as próprias crianças^, e são de grande ajuda para com- preender as nebulosas e enigmáticas maneiras que encontram para sc expressar. Ser companhia para visitar suas histórias, nomear as dores e encontrar novos sentidos é uma contribuição fundamental para o pro- cesso de construção de identidade, de maneira que esta não se apoie em uma ideia equivocada de sua própria história. Para que a criança e o adolescente experienciem seu próprio valor e cresçam descobrindo suas qualidades, a companhia de um adulto com quem esteja vincula- da e que descubra, reconheça e viva com ele esses valores é crucial. Isso ocorre sempre a partir de uma relação afetiva ainda que por cami- nhos bastante particulares para cada um. Não se pode perder o menino de vista. "A transmissão pelos técnicos aos educadores/cuidadores ou família acolhedoni de informações necessárias ao atendimento das crianças e adolescentes deve es- tar pautada em princípios éticos, os quais também devem pautar a postura dos educadores/cuidadores". - OT - p. 47. Família e Violência: Conceitos, Práticas e Reflexões P r í t i n . . 107 QUESTÕES PARA DISCUSSÃO 1. Qual é o melhor lugar para uma criança crescer: família ou acolhimento institucional? Reflita sobre as condições favoráveis para o desenvolvimento de uma criança e em qual ambiente as mesmas poderiam ser alcançadas. 2. Que famílias ou que membros de uma família estão capa- citados para o cuidado de um uma criança? Compartilhe sua resposta com seus colegas em grupos. 3. Reflita e cite que práticas poderiam estar presentes no co- tidiano dos acolhimentos institucionais para que esta ex- periência não se constitua em mais uma violência. REFERÊNCIAS (2009). Le, n.. 12.010. de 3 de agosto de 2009. Presidência da República. Brasília
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