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Estamira resumo 3

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Estamira: a loucura e laço social
Resumo: O documentário nacional Estamira, produzido em 2006, traz à tona uma reflexão sobre a historicidade da loucura e seu contexto de legitimação em um cenário capitalista, abarcado por concepções biologicistas. A psicanálise, todavia, oferece uma articulação teórica e sua prática de escuta do desejo, revelando o lugar do doente mental em uma sociedade marcada pela exclusão.
Palavras-chave: Estamira, saúde mental, psicanálise, loucura. 
 
O Laço Social
O documentário nacional Estamira, produzido por Marcos Prado em 2006, possibilita um entendimento e uma reflexão sobre a saúde mental e a construção histórica da loucura em uma sociedade marcada com forte discurso psiquiátrico e medicamentoso. O desenvolvimento da psiquiatria se deu através de conceitos de normalização, embasados em uma dicotomia saúde-doença, onde o louco é colocado em um lugar de desrazão e desprezo. Entretanto, a teoria psicanalítica, à partir de um entrelaçamento com a saúde mental, possibilita um olhar diferenciado para o sofrimento humano. Os estudos de diversos autores da área vêm em contrapartida do discurso psiquiátrico do mundo pós-moderno, pois contribui para a despatologização da condição humana de incompletude e angústia.
Pautada na ética do desejo, a psicanálise possibilita um posicionamento relacionado à estruturação do ser, que se dá através do contato com o outro. Neste sentido, o que nos constitui subjetivamente, tem relação ao momento histórico e cultural que vivemos. O status do louco é definido socialmente (Foucault, 1961) – o doente mental legitimado em uma sociedade pode não ser tomado como tal em outra cultura. Louco é aquele que a sociedade reconhece como tal (Pelbart, 1989). Todavia, o discurso psiquiátrico, em nome de uma ciência neutra e pura, considera, em sua grande parte, a condição biológica como transcendente à realidade social, cultural e psicológica. Assim, há uma busca pelo enquadramento e restabelecimento de um determinado padrão de normalidade e saúde mental para uma boa convivência social, determinada por princípios morais de juízos de valor. Se na Antiguidade o doente mental era visto como possuidor de forças malignas, na modernidade este é entendido como portador de um distúrbio genético ou cerebral que toma posse de sua lucidez e razão. O caso de Estamira revela de que maneira o entrelaçamento social de exclusão reflete na condição do sujeito. Diagnosticada com esquizofrenia, ela representa, assim como o lixo - no qual convive e tem contato diariamente - o resto e o desmerecimento de um sistema de estruturação econômico.
A primeira revolução industrial, que ocorreu por volta do fim do século XVIII, trouxe consigo a necessidade de impor disciplina aos trabalhadores, iniciando um movimento de exclusão dos improdutivos, mendigos e pobres. Prática que se intensificou com a ascensão da burguesia. É neste processo, então, que nasce a psiquiatria. A loucura tornou-se objeto de estudo e classificação, pautada em um reducionismo biológico extremo. No Brasil, esta especialidade médica se impõe como instância de controle social dos indivíduos e das populações (Devera, 2005). Enquanto problema social e ameaça a um bom funcionamento do sistema econômico vigente, diversas instituições para o controle do doente mentais foram inauguradas. O enlace com a história de vida de Estamira indica os prejuízos que tal posicionamento pode acarretar na singularidade do louco.
A Escuta do Desejo
O diretor do filme assumiu um papel de escuta. Marcos Prado permite que Estamira revele a sua verdade ao mundo, sem barrar ou impor testes de realidade, dando espaço à escuta de um ser desejante, no entanto, com ausência de qualquer expressão e intenção psicanalítica (Juhas, Santos, 2011). Através da linguagem, expressa nas falas da personagem, o seu discurso revela uma posição subjetiva de estrutura, ao contrário da posição psiquiátrica que pretende “normalizar” os quadros de alucinação através dos medicamentos. Nos momentos em que Estamira está sobre seus efeitos, não há espaço para exteriorização do desejo, pelo contrário, seu discurso fica atravessado pela confusão mental causada pela medicação.
Psicopatologia
Do ponto de vista subjetivo, Estamira identificou-se fortemente com o lixo. Além disso, sua história de vida foi marcada por uma função materna de simbiose, sem espaço para que a castração fosse comprida pela função paterna. Posteriormente, eventos e situações-limite, como a ocorrência de dois estupros, seguiram-se de experiência alucinatórias, relatadas por uma das filhas de Estamira no documentário. É possível notar um ego fragilizado também em questões que envolvem melancolia, como diz a personagem: “a minha depressão é imensa”.
A Lucidez e a “Inlucidez”
Estamira faz diversas críticas em relação ao trabalho, à educação e a medicalização. Diversas cenas causam grande choque ao telespectador, pois o faz refletir e pensar sobre questões da ordem social e subjetiva. Se a personagem é capaz de ter lucidez em seu discurso, isso demonstra que tais percepções não são da ordem cognitiva; deste modo, o caso contraria a tese psiquiátrica de que o doente mental nada pode produzir de útil para a sociedade. Estamira sustenta uma verdade. Ela revela o resto que negamos em nós mesmos. É chocante, pois nos obriga a lidar com nossas angústias e sofrimentos, diante da incompletude da vida. Convoca-nos a um retorno dirigido para a criança presente em qualquer adulto. O infantil que teve sua onipotência desconstruída pela castração. Ao mesmo tempo, traz à tona a maneira como encaramos o conceito de normalidade e insanidade, demonstrando que ignoramos o paradigma na qual a ciência assume diante de tais indivíduos que são vistos como “desajustados” e inaptos para a convivência social.
Fonte: https://psicologado.com/resenhas/estamira-a-loucura-e-laco-social © Psicologado.com

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