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A doutrina da situação irregular e a doutrina da proteção integral

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A DOUTRINA DA SITUAÇÃO IRREGULAR E A DOUTRINA DA PROTEÇÃO 
INTEGRAL: INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA SOB CONTROLE E PROTEÇÃO 
DO ESTADO.
 Cristiano Neri1
 Luiz Carlos de Oliveira2
Introdução
A infância e adolescência como já foi apontado por Philippe Ariès (1981) é 
uma construção histórica que ocorreu na sociedade moderna. Quando se fala em 
infância e adolescência, institui-se de maneira simbólica um modelo do que sejam essas 
categorias. Ideologicamente se espera certas ações e posicionamentos que são pré-
concebidos. Enquanto dinâmica histórica e social a adolescência não pode ser 
compreendida enquanto fenômeno estático e imutável. 
Adolescência, portanto, deve ser pensada para além da idade 
cronológica, da puberdade e transformações físicas que ela acarreta, 
dos ritos de passagem, ou de elementos determinados 
aprioristicamente ou de modo natural. A adolescência deve ser 
pensada como uma categoria que se constrói, se exercita e se re-
constrói dentro de uma história e tempo específicos (FROTA, 2007, p. 
157)
Parte das transformações por que passou e o modo como a sociedade brasileira 
enfrentou a adolescência podem ser percebidas através do conjunto de leis que durante o 
século XX buscaram legislar sobre este conjunto da população brasileira. No plano 
jurídico, o que marcou quase todo o século XX foi a tentativa de legislar a vida de 
jovens “desviados” em conseqüência da desigualdade social e econômica. Pois, muitas 
1 Graduado em ciências sociais; pós-graduando em ensino da arte, cultura e história afro indígena; 
mestrando em História Poder e Práticas Culturais da UNIOESTE.
2 Graduado em história; pós-graduado em história regional; pós-graduando em ensino da arte, cultura e 
história afro indígena, UNIOESTE.
das leis que surgiram neste período tiveram como foco crianças e adolescentes carentes 
abandonados e/ou que cometeram algum ato caracterizado como delito. Além do 
fenômeno da adolescência que está presente no seio das famílias há outra categoria 
denominada juridicamente de “menor”. Os jovens que recebiam a terminologia descrita 
em lei normalmente eram os ligados as classes excluídas socialmente, que viviam nas 
ruas e/ou se envolviam com o crime. Segundo Irineu Colombo, 
Juridicamente o adolescente infrator passou a ser uma categoria 
inscrita em lei, em 1927, no Código de Menores, com o termo menor 
delinqüente. No império, o adolescente que cometia delito era 
comumente tachado de desviante ou jovem desvalido, que, em não 
sendo alcançado e julgado pela justiça, poderia ser encaminhado pelo 
pai, pela polícia ou outra pessoa da sociedade para as instituições 
disponíveis na época: Seminários, Casas de Educandos Artífices ou 
Companhias de Aprendizagem de Guerra (COLOMBO, 2006, p. 51, 
grifos do autor).
A importância da inserção jurídica dessa parcela da população poderia ser a 
efetivação de medidas que poderiam possibilitar a proteção e melhores condições de 
vida de forma plena. Isto não ocorreu. Quando o Estado passa a legislar a adolescência, 
isto é, instituir as primeiras políticas em relação a este grupo social, não é no sentido de 
promover sua inserção social, proteção e escolaridade, mas, em disciplinar e normatizar. 
Como ressalta Antonio Carlos Gomes da Costa (2006, p. 15), a lei teve o sentido 
repressor e de controle. 
Os Códigos de Menores e a doutrina da situação irregular
Desde o fim do século XIX e início do século XX o Estado - liberal e 
republicano - passou a se preocupar com as camadas pobres brasileiras, principalmente 
nas áreas urbanas. Está preocupação existia no sentido de normatizar e disciplinar a 
pobreza apoiada em conceitos da medicina, eugenia e higienismo (COLOMBO, 2006, 
p.44). Havia a preocupação em salvar o futuro da nação. Como destaca Rizzini (2006), o 
interesse em relação à infância e adolescência pobre estava em proteger e disciplinar, 
evitar que corresse algum perigo pessoal e/ou se tornasse perigosa socialmente. 
Crianças e adolescentes deveriam tornarem-se sujeitos úteis para o trabalho e pacatos 
socialmente. 
O discurso apresentava-se, com freqüência, ambíguo, onde a criança 
precisava ser protegida mas também contida, a fim de que não 
causasse danos à sociedade. Esta ambigüidade na defesa da criança e 
da sociedade guarda relação com uma certa percepção de infância, 
claramente expressa nos documentos da época - ora em perigo, ora 
perigosa. Tais representações não por acaso estavam associadas a 
determinados estratos sociais, sendo a noção de periculosidade 
invariavelmente atrelada à infância das classes populares [...] O foco 
sobre a infância pobre redundou no desenvolvimento de um complexo 
aparato jurídico-assistencial sob a liderança do Estado, materializado 
através da criação de inúmeras leis e instituições destinadas à proteção 
e à assistência à infância (RIZZINI, 2006, p.10).
A lei que deveria ser criada com o objetivo da inclusão social estigmatizou quem 
era oriundo das classes pobres. Um exemplo foi o termo jurídico “menor” que passou a 
denominar uma categoria perigosa ou com possibilidade de oferecer perigo se não 
houvesse interferência institucional do Estado. Assim, no Código de Menores – Mello 
Matos (Decreto n° 17.943 de 12 de outubro de 1927) há a reunião de um conjunto 
jurídico que está tomado pela filantropia - não mais o assistencialismo -, onde são 
traçados e determinados modos de proceder com as crianças e adolescentes que não se 
enquadrassem nas expectativas geradas pela sociedade. Fatos como a instituição do 
Departamento Nacional da Criança (1919), a ocorrência do Primeiro Congresso 
Brasileiro de Proteção a Infância (1922), o surgimento do Juiz de Menores no Distrito 
Federal (1923), já revelavam a emergência da infância - sua proteção e controle - no 
plano nacional, que se confirmou com o Código de Menores de 1927. 
A Justiça de Menores no Brasil foi fundamentada no debate 
internacional do final do século XIX sobre as estratégias de contenção 
da criminalidade infantil, tendo a América Latina como uma espécie 
de laboratório das idéias que circulavam na Europa e na América do 
Norte. Concebida com um escopo de abrangência bastante amplo, seu 
alvo era a infância pobre que não era contida por uma família 
considerada habilitada a educar seus filhos, de acordo com os padrões 
de moralidade vigentes. Os filhos dos pobres que se encaixavam nesta 
definição, sendo, portanto passíveis de intervenção judiciária, 
passaram a ser identificados como menores (RIZZINI, 2006, p.11, 
grifo da autora).
A partir do primeiro Código, que condensa discussões e propostas, que ocorriam 
desde o fim do século XIX, o adolescente menor de dezoito anos passa a ser 
considerado insuscetível das normas criadas para os adultos. Segundo o Art. 86 
“Nenhum menor de 18 anos, preso por qualquer motivo ou apreendido, será recolhido à 
prisão comum”. Mesmo representando um marco no sentido de dar estatuto jurídico a 
infância e adolescência, o Código abrange apenas os indivíduos que estão em condições 
que representam risco aos moldes sociais propostos, isto é, em situação “desviante”, não 
há preocupação em legislar sobre direitos e garantias dos jovens que não estão 
abandonados ou “desviados” socialmente. Neste sentido explicita-se o caráter de 
controle social edisciplinamento moral de crianças e adolescentes que devem tornar-se 
uteis para a sociedade capitalista que está em expansão, marcada por ideais de “ordem e 
progresso”. 
Interessante notar que medidas de internação em instituições que tem o controle 
direto ou indireto do Estado, podem ser dirigidas tanto àqueles que cometeram algum 
ato infracional como aos que estão em situação de “risco”, abandonados, vivendo nas 
ruas. O adolescente que cometia algum ato contrário a lei e se encontrasse abandonado 
era penalizado duas vezes, uma vez que podia ficar um período maior retido nas 
instituições por não ter ninguém responsável por ele. Cabendo a tutela ao Estado.
Com o novo Código de Menores de 1979 (Lei 6.697) a “[...] novidade tímida 
[...] foi de considerar que a proteção da infância era um direito de todas as crianças e 
adolescentes e um dever do Estado” (COLOMBO, 2006, p. 70). Porém, na prática não 
houve mudanças significativas, a criança e o adolescente continuavam sendo 
considerados enquanto objetos de direitos e não sujeitos de direitos, este último, é o 
entendimento atual preconizado no Estatuto da Criança e do Adolescente. Não há 
também, como já foi apontado, a separação nas medidas propostas entre adolescentes 
que cometeram ato infracional e os abandonados.
A doutrina da situação irregular presente no novo Código continua produzindo 
um discurso onde a 
existência de crianças desnutridas, abandonadas, maltratadas, vítimas 
de abuso, autoras de atos infracionais e outras violações era atribuída à 
sua própria índole, enquadrando-se todas numa mesma categoria 
ambígua e vaga denominada situação irregular. Estar em situação 
irregular significava estar à mercê da Justiça de Menores cuja 
responsabilidade misturava de forma arbitrária atribuições de caráter 
jurídico com atribuições de caráter assistencial (VOLPI, 2001, p. 33).
Os pressupostos que regiam o Código de Menores de 1927 (Decreto n° 
17.943), e a doutrina da situação irregular que permeava o novo Código de Menores de 
1979 (Lei 6.697/1979) e a Política Nacional do Bem-Estar do Menor instituída no 
período da Ditadura, se restringia a quatro tipos de crianças e adolescentes: infratores, 
carentes, abandonados e inadaptados. Assim,
O lado mais perverso de tudo isso reside no fato de que os 
mecanismos normalmente utilizados para o controle social do delito 
(polícia, justiça, redes de internação) passaram a ser utilizados em 
estratégias voltadas para o controle social da pobreza e das 
dificuldades pessoais e sociais de crianças e adolescentes 
problemáticos, mas que não chegaram a cometer nenhum delito 
(COSTA, 2006, p. 15).
Não há o entendimento da necessidade da instituição de políticas públicas que 
preveniriam o empobrecimento e a falta de estrutura das famílias brasileiras, como 
melhorar a distribuição de renda, investir com regularidade em educação, saneamento 
básico, moradia, lazer, entre outras. Apesar da lei se referir às instituições de internação 
de adolescentes infratores e em “risco” enquanto “escolas”, não há preocupação em 
proporcionar efetivamente educação para os adolescentes apreendidos. Como demonstra 
Colombo (2006, p. 93), o enfoque fica na formação profissional que não é uma política 
contínua, dependendo do interesse da direção da instituição. Resta aos chamados 
“educandários” tornarem-se um depósito de jovens que não devem conviver livremente 
com o restante da sociedade. 
A Doutrina da Situação Irregular é a expressão jurídica do modelo 
latino-americano de apartação social, modelo este que, ao longo de 
nossa evolução histórica, acabou gerando duas infâncias: (i) a infância 
escola-família-comunidade e (ii) a infância trabalho-rua-delito 
(COSTA, 2006, p. 19, grifos do autor).
Enquanto o modelo de infância e adolescência idealizado pôde ser vivenciado 
de maneira aproximada pelos filhos da classe média e das famílias mais abastadas que 
conseguem freqüentar boas escolas e ter acesso aos bens de consumo oferecidos, 
efetivando por um período da vida a “infância”, resta aos adolescentes empobrecidos, o 
trabalho no meio rural ou mesmo nas cidades para ajudar a sustentar a família. Aos que 
de alguma maneira não se enquadram nesta fórmula, passam a ser juridicamente 
controlados pelo Estado. 
A Doutrina da Proteção Integral 
A publicação do novo Código de Menores em 1979 ocorreu em um período em 
que existem questionamentos na maneira como a infância e a adolescência eram 
percebidas e tratadas. Estas indagações partem de diversos grupos dentro do país e 
também no âmbito internacional, dando base para que surjam novas propostas que irão 
nortear um aparato jurídico que abandona a Doutrina na Situação Irregular e colocarão 
em seu lugar a doutrina da proteção integral, onde a criança e o adolescente passarão a 
ser sujeitos de direitos. 
Na década de 1980, com o abrandamento da ditadura militar - 
redemocratização -, e a organização de grupos e movimentos em defesa dos meninos de 
rua, da infância e adolescência, surgem críticas contundentes ao modo como o Estado e 
a sociedade lida com esta parte da população brasileira. Além das discussões e atos em 
defesa das crianças e adolescentes no plano interno, há na esfera internacional propostas 
que buscam proporcionar inovações nas políticas direcionadas a infância e adolescência. 
É exemplo disto, o Ano Internacional da Criança (1979), o Ano Internacional da 
Juventude (1985), As Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da 
Justiça da Infância e da Juventude, promovidos pela Organização das Nações Unidas 
(ONU). Em 1989 é aprovada pela Assembléia Geral da ONU a Convenção sobre os 
Direitos da Criança, que tem grande repercussão internacional, sendo que 193 países 
assinaram o documento. 
Em 1988 é promulgada a Constituição Federativa do Brasil que estabelece em 
seu texto uma importante mudança na forma em que as crianças e adolescentes 
brasileiros são percebidos. Na parte que trata da ordem social o texto constitucional 
afirma através do 
 Art. 227. [que] É dever da família, da sociedade e do Estado 
assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o 
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à 
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a 
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda 
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade 
e opressão.
Há nesse texto a instituição no ornamento jurídico brasileiro, em relação à 
infância e adolescência, da doutrina da proteção integral. Além do Art. 227, outros 
trechos do texto constitucional descrevem direitos e garantias que devem ser efetivados. 
A partir do conjunto de tratados, convenções internacionais e das determinações 
constitucionais – que representam e condensam a pressão de grupos socialmente 
organizados – há a publicação em 1990 do Estatuto da Criança e do Adolescente. 
A criança e o adolescente passam a ser tratados juridicamente sob o princípio 
da prioridade absoluta (SARAIVA, 2002, p. 4). Com a vigência da doutrina da 
proteção integral os mecanismos usados e respaldados anteriormente é que passam a ser 
irregulares. O Estatuto da Criança e do Adolescente aborda a criança e o adolescente de 
maneira universal, protegendo e possibilitando o acesso a todos os direitos e garantias. 
Saí de cena o “menor”, o “desviado”, o “incapaz”, em “situação irregular” e aparecem 
sujeitos que merecem cuidadose respeito absoluto do Estado, da sociedade e da família. 
Além dos direitos assegurados aos adultos, a esta parte da população brasileira é 
garantida direitos específicos. Assim, ao 
estabelecer como diretriz básica e única no atendimento de crianças e
adolescentes a Doutrina da Proteção Integral, o legislador pátrio agiu 
de forma coerente com o texto constitucional de 1988 e documentos
internacionais aprovados com amplo consenso da comunidade das
nações (COSTA, 2004, p. 27).
No ECA há um conjunto de direitos e garantias que podem ser divididos, em 
três grandes sistemas: i- trata das políticas públicas que devem ser dirigidas a todos os 
adolescentes, independente da situação em que estejam; ii- elenca as medidas dirigidas a 
crianças e adolescentes que correm algum risco pessoal ou social e não cometeram ato 
infracional; iii- trata especificamente dos adolescentes em conflito com a lei. 
Este tríplice sistema, de prevenção primária (políticas públicas), 
prevenção secundária (medidas de proteção) e prevenção terciária 
(medidas socioeducativas), opera de forma harmônica, com 
acionamento gradual de cada um deles. Quando a criança e o 
adolescente escapar ao sistema primário de prevenção, aciona-se o 
sistema secundário, cujo grande agente operador deve ser o Conselho 
Tutelar. Estando o adolescente em conflito com a lei, atribuindo-se a 
ele a prática de algum ato infracional, o terceiro sistema de prevenção, 
operador das medidas socioeducativas, será acionado, intervindo aqui 
o que pode ser chamado genericamente de sistema de Justiça 
(Polícia/Ministério Público/Defensoria/Judiciário/Órgãos Executores 
das Medidas Socioeducativas) (SARAIVA, 2010, p. 10-11).
Os três sistemas se complementam e representam, através da descentralização 
das políticas infanto-juvenis preconizadas no ECA, uma divisão de responsabilidades 
entre instituições de caráter nacional, estadual e municipal. Neste mecanismo, o 
afastamento da família e/ou a internação em instituições socioeducativas, que eram 
práticas correntes na legislação sob a ótica da doutrina da situação irregular são agora 
respectivamente realizadas em situações extremas, em último caso.
Considerações finais
Arend (2005) em um brilhante estudo sobre a circulação de crianças no Brasil na 
década de 1930 á 1940 argumenta que os padrões da família nuclear burguesa não se 
adequam a realidade das famílias pobres, por isso, para as mães que desejam ficar com 
seus filhos tem que se dispor de diversas redes de auxilio, assim a responsabilidade de 
cuidar as crianças se estende a parentes consangüíneos ou a vizinhança. Já e em relação 
ao judiciário quando são solicitadas tendo em vista o risco de perder seus filhos tem 
que contar com como os testemunhas dos vizinhos, e ainda táticas para lidar com uma 
realidade que não é a sua, ou seja, como o discurso da família nuclear burguesa não é 
vivenciado pelos pobres eles se apropriam deste discursos para formular táticas no 
judiciário nas palavras da autora:
Ressaltamos que essa população, no período, estava submetida a um 
violento processo de embate cultural, mas também é preciso 
considerar que, através de determinadas “táticas”, era possível, muitas 
vezes, contornar as “tecnologias disciplinares”. Conforme 
explicitamos na Introdução desse estudo, as culturas designadas como 
populares, segundo afirma Michel de Certeau, possuem práticas que 
se caracterizam por uma “uma maneira de pensar investida numa 
maneira de agir, uma arte de combinar indissociável de uma arte de 
utilizar”. Essas práticas operacionalizam-se através de determinados 
movimentos intitulados pelo autor como “táticas” (AREND;2005, 
p:164 165).
Arend ainda argumenta que muitas das idéias debatidas desenvolvidas a partir 
do ECA(Estatuto da criança e do Adolescente) já tiveram experiências semelhantes no 
passado, ou seja, a autora evidenciou que os filhos das famílias pobres que eram 
adotados não tinham na maioria das vezes o mesmo tratamento que os filhos 
consangüíneos sendo colocados para cuidar de crianças quase da sua idade e em 
atividades domésticas, em algumas vezes até torturados:
Conforme afirmamos no terceiro capítulo consideramos necessárias 
análises mais realistas em relação às políticas sociais levadas a cabo 
no país, durante o século XX, para a infância e adolescência pobre, 
pois muitos dos programas sociais que atualmente são apresentados 
como inovadores já foram idealizados de forma similar em épocas 
ulteriores. A História Social da Família, enquanto campo do saber que 
procura realizar um “diálogo” entre o presente e o passado, pode 
fornecer grandes contribuições nesse sentido. Mas para que essas 
pesquisas possam se tornar uma realidade no Brasil é preciso, em 
primeiro lugar, que a documentação do Poder Judiciário e de outras 
instituições públicas e privadas ligadas à assistência aos infantes 
“abandonados” seja preservada e acessada por historiadores e 
historiadoras de formação acadêmica. A obstrução desse imenso 
cabedal de informações, mesmo após ter findado o prazo legal de 
setenta anos que impede a exposição pública dessas fontes 
documentais, demonstra que relações de poder instituídas há longa 
data nesses domínios — localizados sobretudo no Poder Judiciário 
brasileiro — resistem à ação republicana, cidadã e democrática e às 
exigências de transparência na administração pública (AREND;2005, 
p:421).
A autora Arend nos da indícios de que é preciso considerar os arranjos das 
famílias dos pobres como diferentes e assim o aparato jurídico e as tecnologias 
disciplinares, devem considerar que para educar seus filhos as famílias pobres se 
utilizam dos mais variados arranjos nas palavras da autora: 
No tocante a essa relação de filiação, é preciso abandonar uma 
perspectiva etnocêntrica, isto é, pautada na norma familiar burguesa, 
onde os planos do biológico, do sócio-psíquico e do jurídico foram 
unificados, para aprendermos com outras relações sociais. Os grupos 
populares urbanos brasileiros percebidos, hoje, como diferentes ou 
mesmo atrasados, segundo uma abordagem Evolucionista Social 
presente no senso comum, possuem experiências nas quais a 
responsabilidade pela educação das crianças e dos jovens é distribuída 
entre a parentela ou outras pessoas. Sabemos que tal proposição, 
especialmente se incorporados os princípios igualitários, caminha no 
sentido de edificarmos e aceitarmos outras configurações de família. 
Ao invés de continuarmos a “abandonar” menores, o melhor seria 
deixar para trás esse legado de etnocentrismo e de preconceito 
(AREND;2005, p:422).
 Alguns das dificuldades em pesquisar assuntos correlacionados a infância e 
adolescência é a dificuldade do acesso as fontes, pois há alguns entraves que se colocam 
ao pesquisador, como por exemplo, o segredo de justiça, dessa maneira, as vezes se 
torna complicado para os cientistas sociais: historiadores sociólogos e antropólogos 
subsidiarem os formuladores de políticas públicas e a sociedade para projetar seu futuro, 
com estudos de realidades atuais que ajudariam na proposição de medidas que perceba 
as práticas socioculturais como um processo construído em meio a diversas redes de 
socialização que vão das que propiciam a incorporação dos ideais de sociedade 
democrática, como as de socialização perversas e assim pensar em intervenções não 
somente no extremo do processo de construção do sujeito. Além disso o conhecimento 
da práticas socioculturais da infânciaadolescência deve auxiliar os formuladores de 
políticas públicas para que suas proposições vão ao encontro das necessidades dos 
sujeitos sociais em questão. 
Referências
AREND. Silvia Maria Fávero. Filhos De Criação: Uma história dos menores 
abandonados no Brasil (década de 1930). Programa de Pós-graduação em História da 
Universidade do Rio Grande do Sul (Doutorado). 2005.
ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 1981.
BRASIL. Decreto n° 17.943 A, de 12 de outubro de 1927. Rio de Janeiro, 1927.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 
1988.
COLOMBO, Irineu. Adolescência infratora paranaense: história, perfil e prática 
discursiva. Brasília: UNB, 2006. 315 p. Tese de doutorado. Programa de Pós-Graduação 
em História Social, UNB, 2006.
COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Os Regimes de Atendimento no Estatuto da 
Criança e doAdolescente – Perspectivas e Desafios. Brasília: Presidência da 
República/SDH/Subsecretaria dos Direitos da Criança e do Adolescente, 2004.
______. Socioeducação: estrutura e funcionamento da comunidade educativa. Brasília: 
Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2006.
FROTA, Ana Maria Monte Coelho Diferentes concepções da infância e adolescência: a 
importância da historicidade para sua construção. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 
UERJ, RJ, v. 7, n. 1, p. 147-160, abr. 2007.
RIZZINI, Irene. Reflexões sobre pesquisa histórica com base em idéias e práticas sobre 
a assistência à infância no Brasil na passagem do século XIX para o XX. In: Anais I 
congresso Internacional de Pedagogia Social, 1, 2006.
SARAIVA, João Batista. Adolescentes em confronto com a lei: O ECA como 
instrumento de responsabilização ou eficácia das medidas sócio-educativas. Boletim 
Jurídico. Uberaba/MG, 2002. Disponível em: http://www.boletimjuridico.com.br/ 
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