Buscar

Filosofias de projeto

Prévia do material em texto

Filosofias de Projeto EC804 - Estruturas Metálicas I
Filosofias de projeto
Na definição de critérios para dimensionamento de uma estrutura o fator mais importante é a segurança.
Uma vez que as variáveis envolvidas no dimensionamento, como cargas, propriedades dos materiais,
geometria, erros de execução, são variáveis aleatórias, não é possível garantir que uma estrutura seja 100%
segura. O que é feito na prática é procurar limitar a probabilidade de colapso da estrutura a níveis que são
aceitos como razoáveis, baseados na experiência adquirida com muitos casos de sucessos e insucessos.
Entretanto, nos dias de hoje e para estruturas comuns, é praticamente inviável estabelecer em uma norma
que a probabilidade de colapso deve ser limitada a, por exemplo, 10-5 , devido às limitações de recursos da
grande maioria dos engenheiros projetistas. Para contornar esses problemas, fatores de majoração de
cargas e de minoração de resistência foram introduzidos, com valores baseados em dados estatísticos
relativos a cada uma das variáveis aleatórias envolvidas, de modo a criar um método intermediário entre o
tradicional Método das Tensões Admissíveis, reconhecidamente falho, e métodos mais complexos,
baseados puramente em distribuições de probabilidades. Neste capítulo são apresentados os conceitos
básicos utilizados no desenvolvimento do Método dos Estados Limites, um método semi-probabilístico,
como alguns autores o denominam, e que se encaixa nessa posição de intermédiario.
O método dos estados Limites (LRFD - Load and
Resistance Factor Design)
Duas filosofias de projeto estão atualmente em uso, o
método das tensões em serviço (conhecido também como
o Método das Tensões Admissíveis - Allowable Stress
Design, ASD, segundo o AISC† ) e o Métodos dos
Estados Limites (Load and Resistance Factors Design -
LRFD, segundo o AISC). Tensões em serviço tem sido a
filosofia principal de projeto durante os últimos 100 anos.
A partir da década de 1970, o projeto estrutural vem
evoluindo em direção a procedimentos mais racionais,
baseados em probabilidades, e que vem sendo conhecido
como estados limites. O projeto pelos estados limites
inclui métodos conhecidos como "cálculo pela resistência
última", "cálculo pela resistência", "cálculo plástico",
"cálculo pela fator de carregamento", "análise limite", e
recentemente "cálculo pelos fatores de carregamento e
resistência" (LRFD).
Estruturas e elementos estruturais devem ter resistência
adequada, assim como rigidez e tenacidade, para permitir
funcionamento apropriado durante a vida útil da estrutura.
O projeto deve prever alguma resistência adicional acima
daquela que é necessária para suportar as cargas de
serviço; isto é, a estrutura deve ser projetada tendo em
vista a possibilidade de cargas acima das previstas. Essas
cargas não previstas podem ser provenientes de mudanças
na destinação da estrutura, efeitos de cargas subestimados
devido a simplificações na análise estrutural, e de
variações nos procedimentos de construção.
Adicionalmente, deve haver uma previsão para a
possibilidade de as resistência terem sido subestimadas.
Desvios nas dimensões dos elementos, embora dentro de
tolerâncias aceitáveis, podem resultar em elementos com
resistência inferior à resistência computada. Os materiais
(aço para barras, parafusos e solda) podem ter resistência
menor que a utilizada para os cálculos. Uma seção de aço
pode ocasionalmente ter uma tensão de escoamento
abaixo do mínimo valor especificado, mas ainda dentro
dos limites estatisticamente aceitáveis.
O projeto estrutural deve conduzir a segurança adequada
independentemente da filosofia de projeto que é utilizada.
 
† AISC - American Institute of Steel Construction
Carregamentos a mais e resistências a menos devem ser
considerados no projeto. A formulação apropriada da
segurança estrutural vem sendo estudada continuamente
durante os últimos trinta anos. O maior esforço tem sido
na análise das probabilidades de colapso ocorrendo em
elementos estruturais, conexões ou sistemas estruturais,
empregando vários métodos probabilísticos.
O termo "estado limite" vem sendo preferido sobre o
"colapso". Estados limites significa "aquelas condições
em que uma estrutura deixa de satisfazer às funções a que
se destina". Estados limites são em geral divididos em
duas categorias: últimos (resistência) e de utilização.
Estados limites últimos são fenômenos de comportamento
como atingimento da máxima resistência (i. é, resistência
em regime plástico), flambagem, fadiga, fratura,
tombamento, e escorregamento. Estados limites de
utilização são aqueles que se referem à destinação do
edifício, tais como deflexões, vibração, deformação
permanente e fissuramento.
Tanto cargas atuantes quanto a resistência da estrutura são
variáveis que devem ser consideradas. Em geral uma
análise completa de todas as incertezas que podem
influenciar um estado limite não é prática ou mesmo
possível. O enfoque atual para um método simplificado
que considere a segurança estrutura sob um ponto de vista
probabilístico usa métodos probabilísticos baseados em
momentos de primeira e segunda ordem. Tais métodos
assumem que a carga Q e a resistência R são variáveis
aleatórias com distribuições como indicado na figura 1.
Quando a resistência R excede a carga Q há uma margem
de segurança. A menos que a resistência R exceda a
carga Q por um valor suficientemente grande, há alguma
probabilidade de R ser menor que Q, mostrado pela
porção hachurada onde as curvas de R e Q se superpõem.
Filosofias de Projeto EC804 - Estruturas Metálicas I
2
resistência R 
carregamento Q
fr
eq
u
ên
ci
a
������������
������������
������������
������������
R mQ m
Colapso estrutural (atingimento de um estado limite) pode
então ser definido pela comparação entre R e Q, ou em
forma logarítimica, comparando ln(R/Q), como mostrado
na figura 2. Em ambas figuras o colapso corresponde à
região hachurada. A distância entre a linha de colapso e o
valor médio da função ln(R/Q) é definido como um
multiplo � do desvio padrão � da função. O
multiplicador � é chamado índice de confiabilidade
(reliability index). Quanto maior for �, maior é a
margem de segurança. O índice � é útil de várias formas:
1. Ele pode dar uma indicação da consistência da
segurança para vários componentes e sistemas usando
métodos tradicionais de projeto.
2. Ele pode ser usado para estabelecer novos métodos que
terão margens de segurança consistentes.
3. Pode ser usado para variar em uma maneira racional as
margens de segurança para aqueles componentes e
sistemas tendo uma maior ou menor necessididade para
segurança que a usada em situações ordinárias.
fr
eq
uê
nc
ia
ln (R/Q)[ln (R/Q)] m
β σ
ln(R/Q)
 σ
ln(R/Q)
: desvio padrão
[ln(R/Q] : média
m
Em geral, a expressão para o segurança estrutural pode ser
escrita como
φ γR Qn i i≤
em que o primeiro membro representa a resistência do
elemento ou sistema, e o segundo membro representa a
carga prevista para ser suportada. Do lado da resistência,
a resistência nominal Rn é multiplicada por um fator de
minoração resistência �f para obter a resistência de
projeto (também chamada resistência útil). Do lado das
cargas, os vários efeitos de cargas Qi (tais como cargas
permanentes, cargas móveis, cargas de vento, etc.) são
multiplicadas por fatores �i para obter a soma das cargas
fatoradas ��iQi.
Durante os anos 80 a filosofia geral dos estados limites
últimos ganhou aceitação, culminando, para o projeto de
estruturas em aço, com a adoção em 1986, da
especificação AISC Load and Resistance Factor Design
Specification. No Canadá o método dos estados limites
vem sido utilizado a partir de 1974, sendo que a partir de
1978 passou a ser o único método em uso.
No Brasil o método dos estados limites foi inicialmente
introduzidopara estruturas de concreto, através da norma
NB1 na década de 70. No início da década de 80, a parte
referente a ações passou a ser tratada independentemente
pela norma NBR 8681 "Ações e segurança nas
estruturas". Em 1986 foi publicada a primeira versão da
NBR 8800 "Projeto e execução de estruturas de aço para
edifícios", baseada na filosofia dos estados limites.
Neste curso será abordada em primeiro lugar a norma
NBR 8681, que se refere às ações a serem consideradas
no projeto de uma estrutura. A seguir serão introduzidos
os conceitos relativos à determinação de resistência dos
elementos estruturais e ligações, utilizando em aplicações
a norma NBR 8800.
O Método das Tensões Admissíveis ( ASD - Allowable
Stress Design)
O método tradicional para o projeto de estruturas
metálicas, ainda largamente utilizado, é o chamado
método das tensões admissíveis (ASD). Para o ASD, a
verificação da segurança da estrutura é feita através de:
φ
γ
R
Qn i≥ Σ (1)
onde
�/� = FS : é um fator de segurança que
engloba minoração de resistências e
majoração de ações, referido a seguir como
FS
Rn : resistência nominal do elemento estrutural
Qi : esforços agindo sobre o elemento
estrutural, resultante das diversas ações
sobre a estrutura
Nessa filosofia todas as cargas são consideradas com a
mesma variabilidade. Toda a variabilidade de cargas e
resitências é colocada no lado esquerdo da desigualdade,
isto é, do lado da resistência. Por exemplo, para uma
barra fletida, a equação (1) acima se torna:
M
FS
Mn ≥ (2)
onde
Mn : é a resistência nominal a flexão da barra
Filosofias de Projeto EC804 - Estruturas Metálicas I
3
M : é o momento fletor na barra resultante das
diversas ações sobre a estrutura
O termo Método das tensões admissíveis implica em
cálculo de tensões em regime elástico. Escrita em termos
de tensões, essa desigualdade resulta em
F
FS
I c
I c
M
I c
F
FS
f
Mc
I
y y
b≤ ≤ =



 ou 
Em ASD, o termo 
Fy
FS seria a tensão admissível Fb e fb
seria a a tensão elástica computadacom toda a carga de
serviço. Se a resistência nominal Mn tivesse sido baseada
no atingimento de uma tensão Fcr menor que Fy devido a,
por exemplo, flambagem, então a tensão admissível Fb
seria Fcr/FS. Portanto, a o critério de segurança em ASD
poderia ser escrito
f F = 
F
FS
 ou F =
F
FS
 b b
y
b
cr≤




As tensões admissíveis são derivadas da resistência
alcançada se a estrutura é sobrecarregada. Quando a
seção é dúctil e não há flambagem, deformações maiores
que a deformação no início do escoamento, �y = Fy/Es,
podem existir na seção. Esse comportamento dúctil pode
permitir cargas maiores que se a estrutura tivesse
permanecido em regime completamente elástico. Nesses
casos a tensão admissível pode ser ajustada para cima.
Quando a resistência é limitada por flambagem ou algum
outro mecanismo tal que a tensão não atinja a tensão de
escoamento, as tensões admissíveis são ajustadas para
baixo.
Requisitos de serviço tais como limitação de flechas são
sempre analisados para cargas de serviço,
independentemente de se estar utilizando método dos
estados limites ou método das tensões admissíveis.
Por que utilizar o Método dos Estados Limites :
1 O Método dos Estados Limites é uma outra
ferramenta de que os engenheiros estruturais dispoem
para projetos em aço. Por que não ter as mesmas
ferramentas (fatores de majoração para sobrecargas
variáveis e fatores de minoração para resistências)
disponíveis para projetos em aço como existem para
projetos em concreto armado?
2 A norma brasileira NBR 8800 prescreve que o
projeto deve ser feito de acordo com o Método dos
Estados Limites .
3 O Método das Tensões Admissíveis é uma forma
aproximada para fazer o que o Método dos Estados
Limites faz em uma forma mais racional.
4 A racionalidade do Método dos Estados Limites tem
sido sempre atrativa, e se tornou incentivante ao
permitir uso melhor e mais econômico do material
em casos especiais de combinações de cargas e
configurações estruturais. Certamente a segurança se
beneficia do fato de se tratar diferentemente cargas de
natureza distinta, em vez tratá-las como de mesma
natureza, como se faz no Método das Tensões
Admissíveis.
5. A utilização de fatores diferenciados para cada
combinação de vários carregamentos deve levar a um
dimensionamento mais economico.
6 O Método dos Estados Limites permite que novas
informações sobre cargas e sua distribuição
estatística sejam introduzidas assim que estiverem
disponíveis. Enquanto nosso conhecimento sobre as
resistência é bastante elevado, o conhecimento dass
cargas e respectivas distribuições estatísticas é
relativamente reduzido. O Método dos Estados
Limites trata cargas e resistências separadamente,
permitindo que esse maior ou menor conhecimento
seja introduzido no lugar certo.
7 Modificações nos fatores de minoração de
resistencias ou de majoração de cargas são mais
facilmente introduzidas no Método dos Estados
Limites que modificações no fator de segurança do
Método das Tensões Admissíveis.
8 Método dos Estados Limites torna o projeto com
diferentes materiais mais compatível. Na realidade,
a variabilidade das cargas independe do material que
está sendo utilizado. No futuro, normas em
desacordo com a filosofia dos estados limites
colocarão o material em desvantagem no projeto.
9 O Método dos Estados Limites permite que sejam
desenvolvidas normas específicas para ações,
permitindo que normas para um determinado material
se concentrem mais em particularidades de seu
comportamento estrutural.
10 Ajustes na calibração do método no futuro podem ser
realizadas sem muita complicação. Em princípio, a
calibração dos coeficientes atuais foi realizada para
uma situação média, baseada na prática corrente
(portanto compatível com o Método das Tensões
Admissíveis), podendo ser alterada no futuro.
11 A economia é favorecida para baixos valores da
relação entre cargas parmanentes e cargas acidentais.
Para altos valores da relação, é levemente
desfavorecida.
12 Estruturas mais seguras devem resultar sob o Método
dos Estados Limites, uma vez que o método leva a
uma melhor previsão do comportamento da estrutura
durante a vida útil.
13 A prática de projeto está ainda no início com relação
a estados limites de utilização; entretanto, pelo menos
o Método dos Estados Limites prevê o enfoque,
compatível com a prática corrente. A racionalidade
do Método dos Estados Limites e as vantagens
descritas deverão relegar o Método das Tensões
Admissíveis a um segundo plano em poucos anos. É
importante que o engenheiro atual entenda ambas
filosofias de projeto porque muitas estruturas
continuarão a ser projetadas pelo Método das
Tensões Admissíveis, e o engenheiro pode deparar
com o problema de avaliar estruturas projetadas no
passado. Além disso, é sempre saudável conhecer a
história para entender as tendências do futuro.
Filosofias de Projeto EC804 - Estruturas Metálicas I
4
O Método dos Estados Limites pode ser entendido como
uma transição entre o Método das Tensões Admissíveis e
os métodos probabilísticos que deverão surgir no futuro,
os quais se basearão apenas na especificação de níveis
aceitáveis de probabilidade de um colapso, deixando para
o engenheiro a tarefa de combinar as diversas variáveis
aleatórias envolvidas (cargas, resistências, desvios de
cálculo, erros de execução, etc) para satisfazer as
probabilidades especificadas. O papel desempenhado
pelos fatores de minoração de resistências e de majoração
de cargas, nestes incluídos fatores de combinação, é de
garantir que o projeto leve a uma probabilidade próxima
de valores considerados aceitáveis, da ordem de 10-5 
para utilização normal da estrutura. Essa filosofia deixa
clara a idéia de que é impossível fazer umaestrutura
100% segura, o que era obscuro no caso do Método das
Tensões Admissíveis, que dava a falsa idéia de que a
carga poderia ser aumentada em, por exemplo, 65% sem
que ocorresse colapso. Em geral as estruturas bem
projetadas de acordo com a prática atual são 99.999%
seguras!!!
Análise da estrutura
Em geral a análise estrutural para obter os efeitos
(momentos fletores e torsores, forças axiais e cortantes,
etc.) provenientes das ações (cargas permanentes,
sobrecarga, carga de vento, temperatura, etc.) é realizada
da mesma forma quer se utilize o Método dos Estados
Limites quer se utilize o Método das Tensões
Admissíveis. Métodos de análise estrutural baseados no
comportamento linear elástico são usados em geral,
podendo ser também utilizados métodos em que o estado
limite se caracteriza pelo colapso devido a transformação
da estrutura em um mecanismo através da sucessiva
formação de rótulas plásticas.

Continue navegando