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01 1 A TEORIA DA GESTALT E A DINAMICA DE GRUPOS

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A Teoria da Gestalt e a 
Dinâmica de Grupos 
A teoria da gestalt surge em principios deste século como uma reação ao “atomismo” então vigente nas ciências em geral. A palavra “gestalt”, de origem germânica e intraduzível para outros idiomas, significa o modo como os elementos (partes) estão agrupados. Suas origens residem nos estudos sobre o fenômeno da percepção, particularmente na descrição do fenômeno chamado “phi”, uma ilusão de movimento aparente descrito e nomeado por Wertheimerem em 1912. O chamado”fenômeno phi” consiste na ilusão visual na qual objetos estáticos mostrados em rápida sucessão parecem estar em movimento por ultrapassarem o limiar da visão humana de poder percebê-los isoladamente. 
A noção de que o todo é maior do que suas partes constituintes e que seus atributos (do todo) não podem ser deduzíveis a partir do exame isolado das partes constituintes é um dos pilares da teoria gestáltica, cuja aplicação na área psicológica foi desenvolvida posteriormente, sobretudo por Kurt Lewin em seus estudo sobre os grupos e sua dinâmica. 
A teoria da gestalt, apoiada na observação fenomenológica, sustentava a possibilidade de convalidar experimentos psicológicos até então desconsiderados como via de acesso ao estudo científico da vida mental. Foram, portanto, seus adeptos os precursores da tendência contemporânea a incluir o observador na descrição do fenômeno observado, dentro do princípio, hoje universalmente aceito e sustentado pela teoria da relatividade, que não há objetividade pura na aproximação científica de qualquer fato natural. 
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Vejamos, agora, como, partindo do referencial gestáltico, Lewin elaborou 
sua teoria do funcionamento grupal, não sem antes referir brevemente sua traietória profissional para conectá-la com suas descobertas. 
Lewin foi um dos tantos judeus obrigados pelo nazismo a deixar a Alemanha, o que ocorreu em 1933. De início dedicou-se às ciências físicas, tendo posteriormente voltado seu interesse para o campo da filosofia, área onde se doutorou com uma tese sobre “a psicologia do comportamento e das emoções”. Já como professor titular de psicologia na Universidade de Berlim (desde 1926) desenvolvia as pesquisas referenciadas pela teoria da gestalt, que mais tarde viriam a sustentar sua aproximação ao estudo dos grupos humanos. De suas origens germânicas trouxe o rigor metodológico que sempre pautou seu trabalho. Tendo inicialmente migrado para a Inglaterra mudou-se, após alguns meses, para os Estados Unidos, onde seu espírito pragmático encontrou o ambiente cultural propício para desenvolver seu talento de investigador. 
A expressão “dinâmica de grupo”aparece por primeira vez em um artigo de 
1944, no qual Lewin estuda as relações entre teoria e prática em psicologia social. 
No ano seguinte funda, a convite do prestigiado MIT (Massachussets Institute of 
Techology), um centro de pesquisas em dinâmica de grupos (Research Center tbr 
Group Dynamics). 
Nesse local realizou a maior parte de suas investigações e experiências com grupos. Influenciado por esse ambiente constituído em sua maior parte por engenheiros, Lewin formulou a noção de dinâmica de grupo como uma “engenharia social”, o que o levou posteriormente a muito arrepender-se dessa analogia que serviu para que interpretassem a dinâmica de grupo como uma técnica de manipulação dos grupos 
Para Lewin, os fenômenos grupais só se tornam inteligíveis ao ohservadoi ciue consente cm participar da vivência grupal. Em sua opinião, tais fenônieno não podem ser observados “do exterior”, assim como também não podem se estudados como fragmentos a serem examinados a posteriori, corno preconiza vam os atomistas. Isto o levou a formular a aproximação metodológica denomi nada “pesquisa-ação”, cm que não só o observador era incluído no grupo comi não se escotornizava o fato dc que com tal inclusão o modificava, o que, no entan to, não invalidava a proposta investigatória. 
Para validar tal experimentação, Lewin entendia, porém, que ela deveria s realizar no contexto dos pequenos grupos (osface-to-frice gmups), cuja configt ração deveria ser tal que permitisse aos seus participantes existirem psico1ogic mente uns para os outros e se encontrarem em uma situação de interdependênci e interação possível no decurso da experiência. 
Os pequenos grupos, além de permitirem a observação “ao vivo” dos pn cessos de interação social, constituem-se em uma unidade experimental de refl rência para a formulação de hipóteses que possam ulteriormente ser confrontad e comparadas com o encontrado em outros agrupamentos humanos. 
Uma das mais significativas constatações de tais experirnentos com os p 
quenos grupos foi que as ações e percepções dos membros são elementos de un 
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estrutura mais complexa, não sendo compreensíveis fora dessa estrutura grupal, ou seja, o indivíduo na gestalt grupal comporta-se de uma forma sui generis diretamente relacionada com essa gestalt. 
Lewin observou que a integração no interior de um grupo só se dará quando as relações interpessoais estiverem baseadas na autenticidade de suas comunicações e que essa autenticidade é uma atitude passível de aprendizado no e pelo próprio grupo 
Dedicou-se particularmente ao estudo da questão da autoridade e dos tipos de liderança nos pequenos grupos, descrevendo os três estilos básicos de liderar: o autocrático, o laissez-faire e o democrático, cujas denominações, por si só, já os caracterizam. Pondera-se, no entanto, que tais estudos foram empreendidos com grupos isolados em situações artificiais e com um objetivo mais ou menos explícito de demonstrar as “vantagens” da liderança democrática em relação às outras duas. 
Lewin descreveu ainda as várias etapas do processo de solução de problemas em grupo, iniciando-se elas pela definição dos problemas, seguindo-se a promoção das idéias, a verificação das mesmas, a tomada de decisão e, finalmente, a execução. 
Talvez a maior contribuição do codificador das leis e princípios da dinâmica grupal tenha sido a criação de um modelo para verificar sua validade e, ademais, treinar profissionais para a coordenação de grupos. A seguir serão enfocados os passos que nos dois últimos anos de sua vida Lewin percorreu com o propósito de delinear este esquema de treinamento, de acordo com o relato de um de seus mais destacados discípulos, o canadense G. Mailhiot. 
“K. Lcwin conseguira, desde há algum tempo, agrupar em torno de si uma equipe dc pesquisadores e organizar com eles o seu Centro dc Pesquisas em Dinâmica de Grupos, no MJT. 1bdos pareciam altamente motivados e adeptos sem restrições das hipóteses de Lewin, que, em conjunto, tentavam então veriflcar expernentalmente. Todavia, nos momentos de auto—avaliação de seu trabalho, realizada periodicamen— te, haviam deplorado por diversas vezes a falta de integração real da equipe, o ritmo lento e artificial do encaminhamento de seus trabalhos, OS parcos recursos inventivos e a fraca engenhosidade manifestados na exploração dos problemas estudados. Lewin, que participava fielmente desses encontros dc autocrítica, havia falado pouco até aquela data e, segundo seu hábito, escutara com atenção constante a expressão de descontentamento dos colaboradores. Um dia, entretanto, no momento em que a auto-avaliação parecia urna vez mais encaminhar-se para uma constatação negativa, Lewin, em tom modesto, quase se desculpando, a título de sugestão, enunciou a seguinte hipótese: ‘Se a integração entre nós não se realiza e se, paralelamente, nossas pesquisas progridem tão pouco, tal fato pode ocorrer em razão de bloqueios que existiriam entre nós ao nível de nossas comunicações’ 
Dessa hipótese inicial partiu-se para a configuração de encontros fora do ambiente de trabalho, sem outro propósito que não o de aprenderem a comunicarse de modo autêntico. Estava plantada a semente das experiências de sensibilização 
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para as relações humanas. A fonte de aprendizagem passa gradativamente a ser não só o que acontece no “aqui-e-agora”
das interações pessoais dentro do grupo, mas da avaliação conjunta desta experiência. Passou-se a admitir nas sessões de auto-avaliação a presença de observadores de outros grupos e, reciprocanlenle, esses tinham a possibilidade de também serem avaliados, nos grupos em que participavam, por observadores de grupos distintos, criando-se, assim, uma maior objetivação sobre os comportamentos grupais de todos. Cada grupo de discussáo, com seu respectivo observador (que era também um animador, pois ia comunicando ao grupo suas observações), foi denominado ‘basie skil/ Iraininç’ groiip” (BSTG) ou “grupo de treinamento das técnicas de base”, que, ao lado dos grupos de discussão, nos quais eram debatidos os problemas concretos dos grupos em que trabalhavam habitualmente, vieram a se constituir nos dois pilares do processo de aprendizagem da dinâmica de grupos nos seus primórdios. 
Tal configuração da formação cm dinâmica de grupos manteve-se mais or menos estável nos anos que se seguiram à morte de Lewin, mas, a partir de l 956 o grupo de discussão na sua proposta original foi abandonado e o BSTG foi re pensado. Decidiu-se discriminar a iniciação às técnicas de grupo dos grupos d sensibilização para relações humanas, passando o primeiro a denominar-se “.vki) group” (SG) e o segundo trani,ig roup” (TG), que se torna o instrumento pri mordial para a aprendizagem em dinâmica de grupos. 
O “T-group”, mais tarde renomeado de grupo F ou “de formação” (par muitos F de “free”, livre em inglês), é um grupo centrado em si mesmo, onde, n aqui-e-agora das interações dos membros do grupo sem o ônus de uma tarefa o propósito extrínseco ao grupo, tem-se a experiência de um grupo em stati nasce,idi, com toda a riqueza vivencial e de abertura para um acontecer na programado em que, no entanto, vemos ocorrer os fenômenos que se repete sempre que nos encontramos em um grupo: busca de afirmação pessoal. rivalid des e alianças, disputas pela liderança, alternância de momentos de coesão e d sagregação, reativação de preconceitos ao lado de sua superação, resistência disposição à mudança, surgimento de mal-entendidos a par de esforços para fazerem entendidos, etc... 
Embora Lewin não tenha chegado a teorizar sobre os Tgroups, que apen se esboçavam nos BSTG que os antecederam, sua intuição, somada às descobc tas feitas anteriormente, permitiram que pudesse formular por antecipação as pr cipais contribuições de tal atividade ao treinamento em dinâmica de grupo, qu sejam, possibilitar a cada membro uma experiência única de interagir a pa unicamente de sua vivência com os outros enquanto membros daquele gru experimentar-se em papéis de líder e liderado e educar-se para a autenticidad 
Os grupos de formação não possuem estruturas internas, nem tarefas a r lizar ou lideranças pré-designadas. Seus coordenadores devem se recusar a re sentar o papel de “condutores” e tão-somente funcionar como “catalisadores” processo grupal, o que exclui a função de conselheiros ou agentes de informa para o grupo, necessitando se absterem de estimular a dependência do gru São, no entanto, a consciência e a memória do grupo, ativadas nos momento 
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revisão crítica do grupo. Sua autoridade é exercida pelo comprometimento e pela fidelidade aos objetivos da experiência, devendo, além disso, constituírem-se em modelos de autenticidade interpessoal. 
A dinâmica de grupo expandiu seu raio de ação e influência sobretudo na área das instituições em geral. Tornou-se, para alguns efeitos, uma disseminadora de técnicas de dinamização grupal empregadas tanto na avaliação quanto na compreensão e tentativa de resolução das questões organizacionais. Hoje em dia sua sustentação como instrumento epistemológico na abordagem gmpal carece do suporte de teorias suplementares, como, por exemplo, a psicanálise, que examinaremos no tópico a seguir. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
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MAILHTOT, G. Dinôniica e gênese dos grupos. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1976. 
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MATTA, J.E. Dinô,nicci de grupo e desenvoleunento dc organizações. São Paulo: Livraria Pioncira Editora, 1975.

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