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Da Filosofia Analítica a Foucault

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Fundamentos Epistêmicos da Psicologia
Marx e o Materialismo Histórico
Karl Heinrich Marx (1818-1883) Manifesto comunista (1848) e O capital (1867)
Karl Heinrich Marx foi um intelectual e revolucionário alemão e fundador da doutrina comunista moderna. Atuou, sobretudo, como economista, filósofo, historiador e teórico político. Sua obra influenciou várias áreas, especialmente: Filosofia, Geografia, História, Direito, Sociologia, Pedagogia, Ciências Políticas, Antropologia, Economia, bem como outras áreas do saber como a Psicologia.
Suas teorias acerca da sociedade, da economia e da política, conhecidas em longa escala como Marxismo, apoiam-se na tese central segundo a qual as sociedades humanas progridem através da luta de classes: um conflito entre a classe burguesa (que controla a produção) e a classe proletária (que fornece a mão de obra para a produção). 
Marx iniciou seus estudos no Liceu Friedrich Wilhelm, em Tréveris, em 1830, ano em que eclodiram revoluções em diversos países europeus.
Ingressou mais tarde na Universidade de Bonn para estudar Direito, transferindo-se no ano seguinte para a Universidade de Berlim, onde o filósofo alemão Hegel, cuja obra exerceu grande influência sobre Marx, foi professor e reitor.
Particularmente em Berlim, Marx ingressou no Clube dos Doutores, que era liderado por Bruno Bauer, vindo a perder o interesse pelo Direito voltando-se para a Filosofia. Participou ativamente do movimento dos Jovens Hegelianos (incluindo Ludwig Feuerbach). 
Obteve o título de doutor em Filosofia, em 1841, com uma tese sobre as "Diferenças da filosofia da natureza em Demócrito e Epicuro". No ano seguinte, tornou-se redator-chefe da Gazeta Renana, um jornal da província de Colônia, vindo a conhecer Friedrich Engels (1820-1895), quando esse veio a conhecer, no mesmo ano, a redação do jornal.
Apesar de ter sofrido forte influência do pensamento de Hegel, situando-se entre os Jovens hegelianos, a base do pensamento de Marx é, ao contrário do idealismo do seu precursor, materialista. Foi com base no materialismo que adveio a tese marxista do materialismo histórico ou dialético.
Marx baseou seu pensamento na realidade prática, no concreto, sobretudo na realidade econômico-social da Inglaterra do século XIX, do liberalismo. São dos fatos gerados pelo sistema capitalista que Marx extrai suas teses concernentes às relações do homens. Nesse sentido, a filosofia marxista parte da prática para a teoria (práxis), e não da teoria sem a prática que sustentou o idealismo alemão.
A visão idealista de Hegel o levara a acreditar que o Estado seria soberano em relação à sociedade, sendo essa relação de dependência natural. Marx objeta esse pensamento idealista adotando uma vertente materialista que considera o fato concreto a partir da dialética.
Essa perspectiva o leva a refutar incisivamente a ideologia, entendida por ele como “falsa consciência”, uma vez que visa beneficiar única e exclusivamente as classes dominantes, ao legitimar a desigualdade social, alicerçada na luta de classes.
Para Marx, o fim último da filosofia, cujo exemplo é O capital, é desconstruir a ideologia por meio da mostração dos reais mecanismos de dominação. Ele apresenta esse fim de modo explícito na aludida obra, ao situar, no prefácio da 1ª edição, de 1867, que ele consiste em “descobrir a lei econômica do movimento da sociedade moderna”. Ou, como escreveu em Teses sobre Feuerbach, obra publicada postumamente em 1888, por Engels, que “os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diversas maneiras; mas o que importa é transformá-lo.”
O método dialético, como vimos em Hegel, baseia-se no ternário: tese, antítese e síntese. A lógica dialética tornou possível pensar o início da história, da cultura, construída sobre o trabalho do escravo ao reconhecer o mestre como senhor.
Marx retoma esse método aplicando às relações sociais de produção, que dizem respeito àquelas que se estabelecem entre o dono dos meios de produção (tudo o que é necessário para que exista um produto que se movimentará na sociedade pelo capital) e aquele que se submete a tal meio, por ser dono apenas da força de trabalho. Marx chamou essas duas figuras de burguês e o proletariado (que só tem a prole). 
Remontando a história humana à sua história, Marx descobriu que desde à Antiguidade (Grécia e Roma), a lógica das relações de produção existia entre duas classes: os que eram livres (tese) e os escravos (antítese). Das relações social e de produção entre essas duas classes surgiu o sistema econômico Feudal (síntese).
Do sistema econômico feudal, Marx isolou outras duas classes, o senhor feudal (tese) e o servo (antítese), decorrendo da relação entre essas duas classes o sistema econômico capitalista (síntese).
Do sistema econômico capitalista, Marx isolou outras duas classes, a burguesia (tese) e o proletariado (antítese), decorrendo da relação entre essas duas classes o sistema econômico comunismo (síntese), onde não haveria a luta de classes.
Nota-se que a metodologia de análise marxista é materialista, pois se baseia nos sistemas econômicos para pensar as relações de produção nas quais o individuo ocuparia um lugar específico. O que define esse lugar não é a lei sustentada pelo liberalismo inglês: todos os homens são iguais perante a lei, mas, antes, o lugar que ele ocupa nas relações de produção. Marx parte, portanto, do fato concreto, do fato material e dialético, devido à luta de classes entre os homens ao longo da histórica. Daí decorre o materialismo histórico. 
No Prefácio de A contribuição crítica da economia política, Marx (1859[2008]) retoma sua crítica ao idealismo hegeliano, que ele diz estar de cabeça para baixo, e apresenta um binário chamado de infraestrutura e superestrutura para entendermos a lógica da sociedade. 
Superestrutura
(Direito, Política, Religião, Moral, Cultura etc)
1↑ ↓2
Infraestrutura
(Economia)
Aqui se encontra os meios de produção + relações de trabalho. É a partir do contexto material de um determinado período histórico que podemos entender suas leis, política, religião, moral, cultura etc.
Luta de classes: motor da história, a relação trabalho/capital implica na existência de duas classes sociais com interesses antagônicos.
Mais-valia: o sistema capitalista sustenta-se sobre o circuito dinheiro-mercadoria-dinheiro. A força de trabalho é uma mercadoria comprada e seu consumo gera outro valor (produto). A diferença entre o valor da força de trabalho e o valor do salário é a mais-valia. É através da mais-valia que o burguês dominará o proletariado.
Alienação: do latim alienare, a alienação, conceito hegeliano, diz respeito a não pertencer a si. Na concepção marxista, quer dizer que o proletariado, o trabalhador, não é o dono do seu trabalho, que é alienado, pois não lhe pertence. O homem, ao longo da história, não tem consciência de sua situação de alienado.
Socialismo: período de transição com a desestruturação do estado burguês capitalista e a abertura a uma nova ordem social.
Comunismo: supressão das classes sociais e da propriedade privada dos meios de produção.
Para finalizarmos, citaremos um fragmento do texto Ideologia alemã, no qual Marx afirma a vertente materialista de sua filosofia: “não é a consciência do homem que determina sua existência, mas, pelo contrário, é sua existência social que determina sua consciência”. 
Husserl e a Fenomenologia
Edmund Husserl (1859-1938) Investigações lógicas (1901)
Instituído o positivismo, coube à fenomenologia a humanização da ciência. Foi o que pretendeu inicialmente o filósofo alemão Franz C. H. H. Brentano (1838-1917), que exerceu sem dúvida uma influência nos pensadores de sua época como Sigmund Freud (1956-1939) e Edmund Husserl (1859-1938). Brentano propôs um resgate do homem para analisar suas particularidades individuais, não reconhecidas pelo positivismo, argumentando que os sentimentos do homem não podem ser descartados e nem quantificados, objetivados, reduzidos e tratados como se fossem meramente números. 
No entanto,apesar das questões levantadas por Brentano, fundamentais para a fenomenologia, essa foi concebida Edmund Husserl.
Como matemático (estudou nas universidades de Leipzig, em 1876, e Berlim, em 1878) e filósofo (estudou na universidade de Viena) alemão, Husserl, viveu entre dois séculos importantes, em termos de produção de saber (séculos XIX e XX). 
É considerado o fundador da escola fenomenológica, rompendo, por um lado, com a orientação positivista da ciência liderada por Comte, para, por outro, reconstituir a própria vocação da filosófica que é a de interrogar a realidade a partir do tema pilar de toda história da filosofia, sendo esse pilar a relação entre sujeito e objeto.
Reconhecidamente influenciado por Kant, para quem a experiência é a fonte de todo conhecimento, não se limitou ao empirismo implícito a essa perspectiva ao postular o método da redução fenomenológica, segundo o qual é possível conhecer a essência das coisas. 
Para Husserl, a consciência é reflexiva, pois cria as essências, que seriam as significações produzidas por ela própria (doação de sentido).
Sua principal característica é a intencionalidade, termo que resgata da filosofia medieval, situando-o como pilar da fenomenologia, e trazendo com ele uma nova maneira de pensar a ciência humana argumentando que toda consciência é consciência de algo. 
Com a intencionalidade reajustou a ponte entre o indivíduo e o objeto. A intencionalidade implica que a consciência humana é intencional; não há consciência separada do mundo.
Esse modo de situar suas reflexões renova a objeção kantiana ao racionalismo, pois não haveria consciência prévia, que toda consciência é de algo e também aos empiristas, pois considera que o objeto só existe para quem o percebe e, ainda que percebido, seu sentido se particulariza porque é o indivíduo quem o confere.
Com a intencionalidade, Husserl formula críticas: 
Ao positivismo, que se alicerça na filosofia positiva, sendo essa orientada pela objetividade e pelo materialismo, pela suposta neutralidade do homem cientista mediante seu objeto de análise; 
A Kant, ao estabelecer a dicotomia entre fenômeno e númeno. Como vimos, esse filósofo denominou a realidade em si (Coisa em si) com a palavra grega noumenon e a realidade organizada pela razão como phainomenon. Isso quer dizer que não podemos conhecer a realidade em si, mas apenas o fenômeno (a presença de coisas reais diante da consciência).
Na intencionalidade subjaz uma estrutura cujos elementos são o objeto, o pensar e o eu. Para analisarmos o conceito de árvore ou de cadeira, por exemplo, é indispensável a arvore ou a cadeira como objeto intencionado, o pensar como ato mental e o eu. É baseado nessa lógica que Husserl propõe como estrutura da fenomenologia o Eu-Penso-Algo ou “Ego-Cogito-Cogitatum”.
Husserl destaca que pertence ao sentido de qualquer coisa contingente ter uma essência e, portanto, um eidos, que pode ser apreendido intelectualmente. Ainda que uma árvore possa se transformar, como ressalta esse filósofo, sua essência é atemporal. Mesmo ela vindo a desaparecer, devido a modalidade contingencial a ela pertencente, a essência atemporal do que é ser uma árvore persiste tal como uma entidade matemática.
Esse estudo é respaldado pela metodologia fenomenológica de uma redução eidética: a redução de todo dado empírico e contingencial ao seu eidos, à sua essência, à sua condição necessária.
A REDUÇÃO ou EPOCHÉ FENOMENOLÓGICA OU TRANSCENDENTAL
O método da redução fenomenológica proposto por Husserl consiste numa libertação dos pressupostos para que o cientista possa ir além do dado imediato e alcançar sua essência, seu eidos.
De origem grega, a palavra epoché era utilizada pelo céticos gregos para designar a suspensão do julgamento resultante da isostenia (igualdade ou equilíbrio das coisas) das teses e das antíteses. Com efeito da epoché, os indivíduos deparavam-se com a ataraxia, que é a ausência ou indiferença, ou ainda, a desistência. Entretanto, o sentido dado a epoché por Husserl não é o da desistência, mas o de avançar em busca da essência por meio da SUSPENSÃO DA ATITUDE NATURAL, para a ela sobrepor-se a ATITUDE FENOMENOLÓGICA. A epoché como método é o que garante a suspensão, o pôr entre parênteses, tudo o que for existência real.
Por atitude natural devemos entender a atitude espontânea da consciência orientada para o mundo e que afirma a sua existência no que Husserl chama de mundo da vida. A função outorgada pela epoché é da de justamente suspender essa atitude natural, fazendo com que o mundo natural seja visto como um dado puro da consciência, como um fenômeno.
É através da epoché que chegamos à atitude fenomenológica, que Husserl chama de transcendental ou reflexiva. Todas as coisas que existem contingencialmente se tornam para a consciência puras cogitata, que são os objetos de pensamento. O objeto, nesta perspectiva, é contemplado pelo Eu somente em sua relação com o Eu que pensa. O método da redução fenomenológica é o que dirige a consciência para a estrutura ego-cogito-cogitatum. Ao contemplar uma árvore, devo suspender a atitude natural dela, sua existência física, para considerar apenas Eu-percebo-a-árvore-percebida. 
Filosofia Analítica e a relação entre a Linguagem e o Real
A Filosofia contemporânea
Articulada aos produtos da Revolução Francesa – principal marco histórico da passagem da Modernidade à Contemporaneidade –, a Filosofia reviu os limites do seu alcance e contribuições, através de seus representantes, devido à ascensão da ciência, que tomou para si diversos temas que outrora era de domínio da Filosofia.
Da variedade de escolas que emergiram no século XX, é possível encontrarmos um ponto em comum entre aquelas que tomam como precursor, por um lado, a filosofia de Friedrich Nietzsche, que repercutiu nos trabalhos de Martin Heidegger, Michel Foucault, Gilles Deleuze, Jacques Derrida etc., e, por outro, a fundamentação lógica de Gottlob Frege, que teve influência sobre Bertrand Russell, Ludwig Wittgenstein, John Austin, Willard Quine etc.,. Esse ponto em comum é a crítica da Linguagem, que, embora não estivesse ausente da Filosofia grega, adquiriu uma importância singular na Filosofia contemporânea.
É considerando a segunda vertente da Filosofia, apontada no slide anterior, que nos deteremos ao longo desta aula. Essa segunda vertente recebeu o nome de Filosofia Analítica.
O que vem a ser a Filosofia Analítica?
Em linhas gerais, é uma corrente contemporânea da Filosofia defendida por filósofos distintos, mas que convergiram em suas teorias quanto à sua visada, qual seja: a de analisar o significado ou o sentido dos enunciados, o que os levaram a tomar como objeto a própria Linguagem, entendida como fundamento, o substrato essencial sobre o qual se assenta o conhecimento. 
A Filosofia clássica, representada por filósofos como Descartes (tese), Hume (antítese) e Kant (síntese), colocou o Conhecimento como questão central da Filosofia. A Filosofia contemporânea, em contrapartida, em sua vertente propriamente Analítica, coloca a Linguagem como eixo da Filosofia, considerando que o seu problema central consiste na análise do uso da linguagem e propõe que se desenvolva rigor metodológico para assegurar que as investigações não sejam prejudicadas por confusões conceituais. 
Essa vertente filosófica postula a correspondência entre linguagem e realidade e se fundamenta em teóricos do campo da lógica como o alemão Gottlob Frege (1848-1925) e o inglês Bertrand Russell (1872-1970), que foi influenciado por Frege e a partir do qual concebeu os “paradoxos de Russell”. Esses paradoxos basearam-se na análise feita por Frege em seu livro Leis básicas de aritmética (1903).
Frege e Russell foram lógicos do final do século XIX, mas que produziram muitos trabalhos no século XX, influenciando diversos filósofos como o alemão Ludwig Wittgenstein (1889-1951). O pensamento daqueles produziram consequências filosóficas gerais que ajudaram na análise de conceitos e no esclarecimento de ideias. 
Em termos históricos,a Filosofia Analítica de Russell opunha-se aos adeptos do idealismo alemão, sobretudo o hegelianismo do seu contemporâneo, o inglês John Mc Taggart (1866-1925). 
Gottlob Frege foi um matemático que, apesar de ter se tornado uma figura obscura em sua época, assumiu a tarefa de demonstrar que as leis da aritmética se reduziam à lógica, uma posição que se tornou conhecida como logicismo. Na busca de seu objetivo realizou a maior contribuição individual ao estudo da lógica na história desta disciplina e apresentou suas bases para o estudo rigoroso da linguagem que caracterizaria a Filosofia Analítica, tornando-se o fundador da semântica e da lógica modernas.
Bertrand Russell, que teve contato com Frege, convenceu-se de que a característica comum que incide sobre os problemas filosóficos é o fato de eles consistirem em confusões conceituais, resultantes do uso inadequado da linguagem comum. Em sua perspectiva, a solução seria uma clarificação do sentido dos enunciados a ser aplicada a ciência, religião, filosofia, ética, arte etc. Na verdade, em sentido genérico, essa postura adotada por Russell estendeu-se aos filósofos que passaram a compreender a Filosofia como analítica, cujo objetivo é esclarecer o significado, o sentido dos enunciados, fundamentando a linguagem rigorosa da lógica e evitando as ambiguidades e confusões do uso da linguagem comum.
Wittgenstein foi um filósofo de origem austríaca, mas naturalizado inglês, cuja obra é dividida em duas partes por especialistas. O professor da USP, João Cuter, especialista em Wittgenstein, afirma que há “dois filósofos”. Há um primeiro e um segundo Wittgenstein que são extremamente opostos, mas que desenvolveram matrizes de pensamentos voltados para o sentido dos enunciados.
Wittgenstein publicou apenas uma obra em vida, o conhecido Tractatus Logico-Philosophicus, publicado em 1921 e que se refere ao primeiro momento de sua obra. Essa obra, foi escrita depois de seu contato direto com Russell, em Cambridge, na Inglaterra.
Nesse livro Wittgenstein estabelece os limites para o uso da linguagem, entre o que faz sentido ser dito e o que é destituído de sentido. É o que podemos encontrar na proposição 7, onde afirma que “sobre aquilo que não pode ser dito, deve-se calar”.
No primeiro momento, Wittgenstein apresenta a linguagem articulada a partir de proposições constituídas única e exclusivamente de nomes que se relacionam a coisas, a objetos da realidade, nomes que têm possibilidades sintáticas que espelham as possibilidade de combinação entre esses objeto da realidade.
nomes ↔ objetos
Há um conjunto de nomes relacionados a determinados objetos. Wittgenstein pensa a linguagem nesse momento como designativa, ela serve para designar algo do campo da realidade. Num campo cromático, existe a possibilidade de relacionarmos nomes a superfícies, mas não há a possibilidade de relacioná-los à sons, por exemplo. Neste sentido, o objeto é o significado do nome, há uma relação de designação, de referência, como diria Frege, entre o nome e o objeto.
A linguagem deve ter como função descrever a realidade, porque nada pode ser dado fora dela (linguagem como limite do mundo). Ela possui uma estrutura lógica: não podemos pensar nada que seja ilógico. A linguagem, em sua filosofia inicial, torna-se o espelho do mundo, que só através dela esse último pode ser compreendido. Por isso a Filosofia seria uma análise lógica da linguagem.
O segundo Wittgenstein rompe não apenas com suas teorias iniciais como com a própria história da Filosofia, alicerçada no problema da designação (nomes coisas). Isso porque, para esse autor, o significado não é a coisa cujo nome designa, ele não é dado pela coisa, o objeto o qual estaria ligado à palavra. O significado, na segunda perspectiva de sua filosofia, está relacionado às regras que nós utilizamos para inserir a palavra na nossa vida e fazer com que nos relacionemos com determinados objetos. Esses objetos não seriam o significado das palavras ligadas a eles. Essa ligação decorre das regras que utilizamos no nosso cotidiano.
Essa maneira de pensar a linguagem vai levá-lo a desenvolver os Jogos de linguagem, no qual o significado da linguagem é dado pelo uso que se faz dela. A linguagem ganha significado pelo seu uso.
Popper e o Falsificacionismo
Karl Popper (1902-1994)
A lógica da pesquisa científica (1933/1958) e
Conjecturas e refutações (1953)
Considerado o mais influente filósofo do século XX, por tematizar a ciência, Popper era austríaco, mas se naturalizou inglês, assim como seu contemporâneo Ludwig Wittgenstein. 
Além de filósofo da ciência, foi também um filósofo social e político de estatura considerável, um grande defensor da democracia liberal e um oponente implacável do totalitarismo.
Popper tornou-se mais conhecido depois de situar o que se tornou conhecido como o Falsificacionismo, entendido como critério da demarcação entre as ciências e as pseudociências.
Em Conjecturas e refutações, Popper (1953, p. 1) afirma que quando recebeu a lista dos alunos que fariam seu curso decidiu falar-lhes acerca do seu trabalho no campo da filosofia da ciência desde quando passou a lutar, em 1919, com as seguintes questões: “Quando pode uma teoria ser classificada como científica?” Ou “Existe um critério para classificar uma teoria como científica?”.
Para responder essas questões, chega a seguinte conclusão: “O critério do estatuto científico de uma teoria é a sua falsificabilidade, ou refutabilidade, ou testabilidade” (POPPER, 1953[1980], p. 5).
Popper concebeu o “Racionalismo crítico” para descrever sua filosofia, realçando com ela sua rejeição ao empirismo clássico – baconiano – e do observacionalismo-indutivista da ciência, que dele resulta. Além disso, argumentou que a teoria científica será sempre conjectural e provisória (POPPER, 1953[1980]). Não é possível confirmar a veracidade de uma teoria pela simples constatação de que os resultados de uma previsão efetuada com base naquela teoria se verificaram. Essa teoria deverá gozar apenas do estatuto de uma teoria não (ou ainda não) contrariada pelos fatos.
Para fundamentar sua tese, Popper (1953[1980]) lançou mão especificamente das teorias de quatro autores: teoria da relatividade (Albert Einstein), materialismo histórico (Karl Marx), psicanálise (Sigmund Freud) e psicologia individual (Alfred Adler).
Ora, o que estava em questão para Popper (1953[1980]) não era saber quando uma teoria era verdadeira ou aceitável, mas o critério que demarca a fronteira entre as ciências e as pseudociências. 
 Ciências Pseudociências
 (comete erros) (encontra a verdade por acidente)
Assim, para a ciência, o filósofo situa a Física de Einstein, sua teoria da relatividade, lembrando-se da vibração que sentiu ao tomar conhecimento dos resultados da observação de um eclipse empreendida por Eddington, em 1919, sendo esses resultados a primeira confirmação importante da teoria da gravitação. As três outras teorias, entretanto, pareciam assemelhar-se mais aos mitos e não à ciência. Estariam mais próximas da astrologia que da astronomia. Para Popper, essas teorias teriam alto poder explicativo porque partiam da teoria sobre a prática. É possível interpretar qualquer fenômeno a partir de uma teoria. Essa seria regularmente confirmada pelas observações clínicas.
“Todos os cisnes são brancos”. 
Esse é um dos exemplos utilizados por Popper. Para ele, essa afirmação não pode ser confirmada porque não se pode garantir que todos os cisnes serão vistos. Em sua perspectiva, uma boa teoria é aquela que se sustenta diante da refutabilidade e não por sua confirmação.
Algumas das conclusões:
(4) A teoria que não for refutada por qualquer acontecimento concebível não é científica. A irrefutabilidade não é uma virtude, como frequentemente se pensa, mas um defeito;
(5) Todo teste genuíno de uma teoria é uma tentativa de refutá-la. A possibilidade de testar uma teoria implica igualpossibilidade de demonstrar que é falsa. Há, porém, diferentes graus na capacidade de se testar uma teoria: algumas são mais testáveis, mais expostas à refutação do que outras;
Kuhn e a questão dos paradigmas
Thomas Samuel Kuhn
 (1922-1996)
A estrutura das revoluções científicas (1962)
Kuhn nasceu em Ohio (EUA). Em 1943, formou-se em Física pela Universidade de Harvard, na qual recebeu, em 1946, o grau de mestre e, em 1949, o de doutor, ambos títulos na área de Física.
Tornou-se professor em Harvard, lecionando a disciplina de Ciências para aluno de Ciências Humanas. A estrutura desta disciplina baseava-se nos casos mais famosos da história da ciência, pelo que foi obrigado a familiarizar-se com o tema. Essa familiaridade determinou o desenvolvimento de sua obra, publicando A Revolução Copernicana, em 1957, e posteriormente, em 1962, um dos seus livros mais conhecidos: A estrutura das revoluções científicas, como contribuição à “Enciclopédia Internacional das Ciências Unificadas”. Em 1956, lecionou História da ciência na Universidade da Califórnia, em Berkeley. Tornou-se professor efetivo desta instituição, em 1961. Em 1964, tomou a posição de professor de Filosofia e História das Ciências na Universidade de Princeton. Em 1971, lecionou para o MIT, onde permaneceu até terminar a sua carreira acadêmica. Kuhn morreu em 17 de Junho de 1996.
Kuhn (1962[2013]), no Prefácio de A estrutura..., informa algumas influências para sua filosofia da ciência dentre as quais isolamos:
A teoria historiográfica de Alexandre koyré: desenvolvimento X acumulação.
A teoria do desenvolvimento cognitivo de Jean Piaget: Desenvolvimento cognitivo (4 estágios) teoria da assimilação.
A teoria da percepção da Psicologia da Gestalt: Figura e fundo
De que modo Kuhn situa A estrutura ... no percurso de suas pesquisas?
ciências naturais ciências sociais
Astronomia, Física, Química etc. Sociologia, Antropologia, Economia etc.
Por ser formado em Física e ter a experiência de passar um ano numa comunidade científica composta predominantemente de cientistas sociais, confrontou-se com problemas relativos às diferenças entre essas comunidades e as dos cientistas ligados às ciências naturais. Impressionou-lhe o número e a extensão dos desacordos expressos existentes entre os cientistas sociais no que diz respeito à natureza dos métodos e problemas científicos legítimos. A tentativa de descobrir a fonte dessa diferença levou-o ao reconhecimento do papel desempenhado na pesquisa científica pelo paradigma.
Paradigma é um conceito que substitui uma variedade de noções familiares e serve de fundamento para “o padrão usual do desenvolvimento de uma ciência amadurecida” (KUHN, 1962[2913], p. 74). Trata-se de uma direção original e que o põe numa perspectiva diferente em relação ao filósofo da ciência, Karl Popper (1953[1980], p.5), para quem “O critério do estatuto científico de uma teoria é a sua falsificabilidade, ou refutabilidade, ou testabilidade.”. Esse último difere no campo científico as ciências das pseudociência, sendo o tal critério o delineador de tais campos. Para Kuhn (capítulo 11, p. 244), o papel atribuído por Popper à falsificação assemelha-se muito ao que identifica em seu ensaio como anomalias (experiências que, ao evocarem crises, preparam o caminho para uma nova teoria).
O que é um paradigma?
Kuhn (1962[2013], p.288) situa o paradigma “como a constelação dos compromissos de grupo”, “como exemplos compartilhados”, (p.296), como o fundamento adotado pela comunidade científica e que contempla teorias, métodos e instrumentos científicos, além de problemas (quebra-cabeças) e soluções que orientam a ciência, técnica ou pesquisa normal. Kuhn (1962[2013], p.53) considera paradigma “as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”.
“Essas realizações são reconhecidas durante algum tempo por alguma comunidade científica específica como proporcionando os fundamentos para sua prática posterior [...]. Essas realizações são relatadas pelos manuais científicos elementares e avançados. Tais livros expõem o corpo da teoria aceita, ilustram muitas (ou todas) das suas aplicações com observações e experiências exemplares. Uma vez que tais livros se tornaram populares no começo do século XIX [...], muitos dos clássicos famosos da ciência desempenham uma função similar. A Física de Aristóteles, o Almagesto de Ptolomeu, os Principia e a Óptica de Newton, a Eletricidade de Franklin, a Química de Lavoisier e a Geologia de Lyell – esses e muitos outros trabalhos serviram, por algum tempo, para definir implicitamente os problemas e métodos legítimos de um campo de pesquisa para gerações posteriores praticantes da ciência” (KUHN, 1962[2013], p.71-72). 
Ciência normal
” não tem como objetivo trazer à tona novas espécies de fenômeno; na verdade, aqueles que não se ajustam aos limites do paradigma frequentemente não são vistos [...] a pesquisa científica normal está dirigida para a articulação daqueles fenômenos e teorias já fornecidos pelo paradigma” (KUHN, 1962[2013], p.89).
“[...], atividade na qual a maioria dos cientistas emprega inevitavelmente quase todo seu tempo, é um empreendimento altamente cumulativo, extremamente bem-sucedido no que toca ao seu objetivo: a ampliação contínua do alcance e da precisão do conhecimento científico.” (KUHN, 1962[2013], p. 127).
[...] é uma atividade voltada para a “resolução de quebra-cabeças.” (KUHN, 1962[2013], p.103).
“A aquisição de um paradigma e do tipo de pesquisa científica esotérica que ele permite é um sinal de maturidade no desenvolvimento de qualquer campo científico que se queira considerar” (KUHN, 1962[2013], p.71).
“[...] significa a pesquisa firmemente baseada em uma ou mais realizações científicas passadas.” (KUHN, 1962[2013], p.71).
“[...], atividade na qual a maioria dos cientistas emprega inevitavelmente quase todo seu tempo, é baseada no pressuposto de que a comunidade científica sabe como é o mundo.” (KUHN, 1962[2013], p. 64).
Kuhn (1962[2013]) argumenta que a Ciência se desenvolve por períodos ou estágios que são, esquematicamente, o pré-paradigmático (anterior a adoção de um paradigma que oriente a pesquisa normal) e o pós-paradigmático (quando há adoção de um paradigma e os desdobramento implicados por tal adoção). Para ilustrá-los, utiliza, ao longo do ensaio, diversos exemplos das ciências naturais, especialmente da Astronomia, da Física e da Química. 
Período pré-paradigmático
Concerne ao estágio onde se verifica a ausência de um paradigma que oriente a ciência normal. Ele “é regularmente marcado por debates frequentes e profundos a respeito de métodos, problemas e padrões de solução legítimos – embora esses debates sirvam mais para definir escolas do que para produzir um acordo” (KUHN, 1962[2013], p.121). Nesse período inicial, há apenas escolas ou subescolas que apresentam controvérsias em relação aos fundamentos sobretudo como ocorre nas ciências sociais e psicológicas (KUHN, 1962[2013], p.53). 
Os primeiros estágios do desenvolvimento da maioria das ciências têm se caracterizado pela contínua competição entre diversas concepções de natureza distintas, cada uma delas parcialmente derivada e todas apenas aproximadamente compatíveis com os ditames da observação e de método científico. O que diferenciou essas várias escolas não foi um ou outro insucesso do método – todas elas eram científicas – mas aquilo que chamaremos de incomensurabilidade de suas maneiras de ver o mundo e nele praticar a ciência (KUHN, 1962[2013], p.63).
Excluindo áreas como a matemática e a astronomia, nas quais os primeiros paradigmas estáveis datam da pré-história, e também aquelas, como a bioquímica, que surgiram da divisão e combinação de especialidades já amadurecidas, as situações esboçadas acima são historicamente típicas. Sugiro que desacordos fundamentais de tipo similar caracterizam,por exemplo, o estudo do movimento antes de Aristóteles e da estática antes de Arquimedes, o estudo do calor antes de Black, da química antes de Boyle e Boerhaave e da geologia antes de Hutton – embora isso envolva de minha parte o emprego continuado de simplificações infelizes que rotulam um extenso episódio histórico com um único nome, um tanto arbitrariamente escolhido (por exemplo, Newton ou Franklin). Em biologia – por exemplo, no estudo sobre hereditariedade – os primeiros paradigmas universalmente aceitos são ainda mais recentes. Permanece em aberto a questão a respeito de que áreas da ciência social já adquiriram tais paradigmas. A história sugere que a estrada para um consenso estável na pesquisa é extraordinariamente árdua (KUHN, 1962[2013], p.77).
A formação de um paradigma na pesquisa elétrica
A história da pesquisa elétrica na primeira metade do século XVIII proporciona um exemplo [...] como a ciência se desenvolve antes de adquirir seu primeiro paradigma universalmente aceito. Durante aquele período houve [...] homens como Hauksbee, Gray, Desaguliers, Du Fay, Nollet, Watson, Franklin e outros [...]. Entretanto, embora todas as experiências fossem elétrica [...], suas teorias não tinham mais do que uma semelhança de família [...] Somente através dos trabalhos de Franklin e de seus sucessores imediatos surgiu uma teoria capaz de dar conta, com quase igual facilidade, de aproximadamente todos esses efeitos. Em vista disso essa teoria podia e de fato realmente proporcionou um paradigma comum para a pesquisa de uma geração subsequente de “eletricistas” (KUHN, 1962[2013], p. 75-76-77).
Período pós-paradigmático
Concerne ao estágio onde se verifica a vigência de um paradigma que orienta a ciência normal fornecendo os problemas (quebra-cabeças) e as soluções modelares para a comunidade de praticantes da ciência, além dos efeitos produzidos por tal vigência. Isso porque esse período inclui as anomalias que geram as crises, que se tornam o cerne da revolução científica, levando necessariamente à emergência de um novo paradigma que possa orientar a ciência normal. 
Somada ao período pré-paradigmático, essa é a estrutura das revoluções científicas que são, para Kuhn, o padrão usual de desenvolvimento de uma ciência amadurecida.
A emergência de um paradigma afeta a estrutura do grupo que atua num determinado domínio científico (Física, por exemplo). Quando, pela primeira vez no desenvolvimento de uma ciência da natureza, um indivíduo ou grupo produz uma síntese capaz de atrair a maioria dos praticantes de ciência da geração seguinte, as escolas mais antigas (pré-paradigmático) começam a desaparecer gradualmente. Seu desaparecimento é em parte causado pela conversão de seus adeptos ao novo paradigma (início do período pós-paradigmático), o que implica uma definição nova e mais rígida do campo de estudo. Nas ciências, a criação de publicações especializadas, a fundação de sociedades de especialistas e a reivindicação de um lugar especial nos currículos de estudo têm geralmente estado associadas com o momento em que um grupo aceita pela primeira vez um paradigma único [...]. Quando um cientista pode considerar um paradigma como certo, não tem mais necessidade, nos seus trabalhos mais importantes, de tentar construir seu campo de estudos começando pelos primeiros princípios e justificando o uso de cada conceito introduzido (KUHN, 1962[2013]), p.81-82-83).
Adotado um paradigma como orientador da pesquisa normal, encerra-se o período pré-paradigmático e se inicia o amadurecimento científico. Quanto a isso, Kuhn (1962[2013]), p.87) se pergunta: 
Ao indicar a questão do status de um paradigma, medido pelo seu efeito (sucesso), Kuhn salienta que tal sucesso, “seja na análise aristotélica do movimento, os cálculos ptolomaicos das posições planetárias, o emprego da balança de Lavoisier, seja a matematização do campo eletromagnético por Maxwell, é, a princípio, em grande parte, uma promessa de sucesso que pode ser descoberta em exemplos selecionados e ainda incompletos. Para Kuhn, “a ciência normal consiste na atualização dessa promessa, atualização que se obtém ampliando o conhecimento daqueles fatos que o paradigma apresenta como particularmente relevantes, aumentando a correlação entre esses fatos e a predições do paradigma e articulando mais ainda o paradigma. 
Para Kuhn (1962[2013], p. 89) as operações de acabamento que constituem a natureza da pesquisa científica normal está dirigida para a articulação daqueles fenômenos e teorias já fornecidos pelo paradigma. Isso, apesar de restringir drasticamente a visão do cientista, é o que o leva a investigar alguma parcela da natureza com uma profundidade e de uma maneira tão detalhada que de outro modo seria inimaginável. Contudo, eleito um paradigma que orientará a pesquisa normal, os problemas podem ser de ordens diversas e inclusos em três classes de fatos que não são nem sempre nem permanentemente distintos:
1. Redeterminação dos fatos científicos (os cientistas buscarão a precisão, a segurança e o alcance dos métodos que desenvolveram visando a redeterminação de categoria de fatos anteriormente conhecidas dentro de um paradigma que assegura a importância tais fatos). 
1.1. Concordância ou harmonização dos fatos com as teorias ou estreitamente entre a natureza e a teoria através da experimentação e da observação: Exemplo: George Atwood inventou, em 1784 a máquina que carrega seu nome e que fornece a primeira demonstração inequívoca da segunda lei de Newton quase um século depois dos Principia.
3. Articulação de uma paradigma com os fatos
Articular o paradigma aos fatos é um dos trabalhos de acabamento com os quais os cientistas se ocupam a maior parte do tempo depois de estabelecido um paradigma. Para Kuhn, as operações de acabamento constituem a natureza do que chama de pesquisa normal.
Considerando que o padrão usual do desenvolvimento científico de uma ciência amadurecida são as revoluções científicas, que ocasionam as mudanças de paradigmas, vejamos alguns dos elementos que compõe a estrutura dessas revoluções científicas.
O que são quebra-cabeças?
Um dos atributos da ciência normal é resolver quebra-cabeças instrumentais, conceituais e matemáticos. Eles indicam “aquela categoria particular de problemas que servem para testar nossa engenhosidade ou habilidade na resolução de problemas” (KUHN, 1962[2013], p.105). Em suas palavras, a comunidade científica, “ao adquirir um paradigma, adquire igualmente um critério para escolha de problemas que, enquanto o paradigma for aceito, podem ser considerados como dotados de uma solução possível” (KUHN, 1962[2013], p.106). É por essa razão que a ciência normal progride rapidamente, pois seus praticantes – os cientistas –concentram-se em problemas que somente a sua falta de engenho pode impedir de resolver (KUHN, 1962[2013], p.107).
Precisa falar que ao tentarem resolver quebra-cabeças deparam-se com problemas (anomalia) e desses descobrem outras coisas: descoberta do oxigênio (capítulo 5) pato ou coelho? Ar deflogisticado ou oxigênio?
Descoberta científica do oxigênio na química pneumática
A descoberta [científica] começa com a consciência da anomalia, isto é, com o reconhecimento de que, de alguma maneira, a natureza violou as expectativas paradigmáticas que governam a ciência normal. Segue-se então uma exploração mais ou menos ampla da área onde ocorreu a anomalia. Esse trabalho somente se encerra quando a teoria do paradigma for ajustada, de tal forma que o anômalo se tenha convertido no esperado. A assimilação de um novo tipo de fato exige mais do que um ajustamento aditivo da teoria. Até que tal ajustamento tenha sido completado – até que o cientista tenha aprendido a ver a natureza de um modo diferente o novo fato não será considerado completamente científico. (KUHN, 1962[2013], p. 128).
Mudança de paradigma na Astronomia
A mudança do paradigma ptolomaico (sistema GEOCÊNTRICO) para o copernicano (sistema HELIOCÊNTRICO) é um dos exemplos mais famosos da ciência normal. Segundo Kuhn (1962[2013]),o sistema de Ptolomeu foi bem-sucedido na predição das estrelas e dos planetas. No entanto, além da pressão social para a reforma do calendário, nesse sistema houve um fracasso da atividade técnica normal de resolução de quebra-cabeças. Para o filósofo da ciência em foco, o fracasso técnico desse sistema foi o cerne da CRISE astronômica com a qual Copérnico se confrontou, convocando a revolução copernicana (KUHN, 1962[2013]).
Mudanças de paradigma na óptica física
Essas transformações de paradigma da óptica física são revoluções científicas e a transição sucessiva de um paradigma a outro, por meio de uma revolução, é o padrão usual de desenvolvimento da ciência amadurecida. No entanto, esse não é o padrão usual do período anterior aos trabalhos de Newton [...]. Nenhum período entre a Antiguidade remota e o fim do século XVII exibiu uma única concepção da natureza da luz que fosse geralmente aceita. Em vez disso havia um bom número de escolas e subescolas em competição, a maioria das quais esposava uma ou outra variante das teorias de Epicuro, Aristóteles ou Platão (KUHN, 1962[2013], p.74).
Bachelard: A perspectiva da epistemologia histórica
Gaston Bachelard (1884-1962) A formação do espírito científico (1938)
Bachelard foi um filósofo francês cujo pensamento estava voltado também para as questões relativas à filosofia da ciência.
Tal como ocorreu com a filosofia e Popper e Kuhn, a filosofia de Bachelard sofreu forte impacto do contexto histórico em que viveu, destacando a revolução científica promovida no início do século XX pela teoria da relatividade de Albert Einstein. 
Seu trabalho acadêmico considerou o significado epistemológico da ciência Física, procurando dar a ela uma filosofia compatível com a sua novidade. Com esse eixo, formulou suas proposições para a filosofia das ciências, as quais podem ser reconhecidas como historicidade da epistemologia e a relatividade do objeto. Para Bachelard, a Física de Einstein rompe com as ciências anteriores em termos epistemológicos e a sua metodologia já não pode ser empirista, pois seu objeto encontra-se em relação, ou seja, não é mais absoluto. 
É nesse âmbito que a metodologia bachelardiana se especifica ao realçar o que esse filósofo chamou de obstáculos epistemológicos, abordado em A formação do espírito científico, de 1938. 
O que vem a ser esse obstáculo?
Precisamente, os aspectos que ocorrem quando existem saberes sedimentados que impedem, dificultam ou atrasam o surgimento de novas formas de pensar.
Ainda nessa obra, propõe uma psicanálise do conhecimento, para argumentar que o progresso científico do conhecimento deve ser analisado através de suas condições psicológicas. Em sua análise histórica da ciência, Bachelard lança mão do que chama de a via psicológica normal do pensamento científico, que deve ser entendida como uma análise que perfaz o caminho, segundo ele, “da imagem para a forma geométrica e, depois, da forma geométrica para a forma abstrata”. Para Bachelard, a própria concepção de espírito científico remete-nos ao universo psicanalítico, reforçando, em sua filosofia, que, em relação ao senso comum, a ciência deve ser absolutamente independente.
Essa independência é o que possibilita o que Bachelard chama de o novo espírito científico. Esse se encontra em descontinuidade, em ruptura, com o senso comum, o que significa uma distinção, nesta nova ciência, entre o universo em que se localizam as opiniões, os preconceitos, em última instância, o senso comum, e o universo das ciências, algo imperceptível nas ciências anteriores, baseadas em boa medida nos limites do empirismo, em que a ciência representava uma continuidade, em termos epistemológicos, com o senso comum. Portanto, a ruptura epistemológica entre a ciência contemporânea e o senso comum é uma das marcas da teoria bachelardiana, que passa a ser orientada por intermédio de um racionalismo aplicado, em detrimento do empirismo.
É por essa razão que, para Bachelard, o progresso do conhecimento científico não pode ser analisado ao longo da história em termos de acúmulos, mas, antes, por intermédio de rupturas, de retificações, num processo dialético em que o conhecimento científico é construído através da constante análise dos erros anteriores.
Canguilhem: A filiação dos conceitos
Georges Canguilhem (1904-1995) Estudos de História e de Filosofia das Ciências e O Normal e o Patológico e O que é a Psicologia? (1956).
Canguilhem foi um filósofo e médico francês que se tornou bastante conhecido no âmbito da epistemologia e historia das ciências. Foi um notável discípulo de Gaston Bachelard (1884-1962), inscrevendo-se, com seu pensamento, na consistente tradição da epistemologia histórica francesa, vindo a influenciar diretamente a pesquisa inicial do também filósofo francês Michel Foucault (1926-1980). 
Canguilhem desenvolveu uma concepção muito particular acerca da Psicologia. Para ele, sua unidade é procurada em sua possível definição enquanto teoria geral da conduta, entendida como uma síntese da psicologia experimental, da psicologia clínica, da psicanálise, da psicologia social e da etnologia. Não obstante, ao examiná-la de perto, é possível considerar que essa unidade se assemelha mais a um pacto de coexistência pacífica acordado entre profissionais do que a uma essência lógica, obtida pela descoberta de uma constante numa variedade de casos. Uma Psicologia só pode ser dita experimental em razão de seu método e não de seu objeto.
Um das maiores contribuições de Canguilhem para a história do conhecimento foi propor uma estreita relação entre uma filosofia do conceito e uma filosofia do engajamento, sendo essa última intensificada pelo trabalho de Foucault. Nas palavras da psicanalista francesa Elisabeth Roudinesco (2007), Canguilhem foi um filósofo da rebelião conceitual, pois tinha horror a qualquer abordagem do homem que visasse reduzir o espírito a uma coisa, a psique a um determinismo fisiológico, o pensamento a um reflexo ou, ainda, o homem a um inseto. 
É por essa razão que a noção de filiação dos conceitos, proposta por Canguilhem, corresponde ao reconhecimento das conjunturas teóricas e práticas que permitiram que um determinado conceito aparecesse como verdadeiro em certo momento.
Já em relação ao que chama de empréstimos teóricos, o filósofo considera que a linguagem na ciência pode carregar valores ideológicos, por isso, a importação de um conceito de um domínio científico para o outro pode acarretar em obstáculos para o pensamento.
Foucault: Saber e Poder
Michel Foucault (1926-1984)
A medicina, a psiquiatria, a justiça, a geografia, o corpo, a sexualidade, o papel dos intelectuais, o Estado, são analisados por Foucault em vários artigos, entrevistas e conferências reunidos neste livro. 
Todos têm como tema central a questão do poder nas sociedades capitalistas: a sua natureza, seu exercício em instituições, sua relação com a produção de verdade e as resistências que suscita. 
O método genealógico desenvolvido por Foucault evidencia a existência de formas de exercício do poder diferentes do Estado, a ele articuladas e indispensáveis à sua sustentação e atuação eficaz. 
É na medida em que o poder não está localizado exclusivamente no aparelho de Estado, diz Foucault, “nada mudará a sociedade se os mecanismos de poder que funcionam fora, abaixo e ao lado dos aparelho de Estado a um nível muito mais elementar, cotidiano, não forem modificados”.
Roberto Machado (contracapa de Microfísica do Poder)
Foucault foi um filósofo e crítico francês que se deteve a examinar através de metodologias específicas conceitos (loucura, sexualidade, corpo etc.) por intermédio da relação entre saber e poder.
O filósofo baiano Roberto Machado, um dos especialistas brasileiros em sua obra e tradutor de Microfísica do Poder, apresenta para ela uma “Introdução” na Língua Portuguesa intitulada “Por uma genealogia do Poder”. Nela, Machado traça uma breve análise do pensamento de Foucault, que consiste em que a arqueologia do saber, que figura nos textos foucaultianosda década de 60, é completada pelo projeto de um genealogia do poder, que se evidencia na década de 70. Foucault se propôs a investigar inicialmente as condições histórico-filosóficas da existência das ciências do homem, situando-as em relação a outros saberes da modernidade. O que lhe interessa em seguida é completar essa análise do saber, sua arqueologia, com uma genealogia do poder que explique o aparecimento de saberes sobre o homem como elementos de um dispositivo de natureza essencialmente política, como peças de relações de poder.
Foucault nasceu em Poitiers, na França, no ano de 1926, vindo a falecer no mesmo país, em Paris, em 1984. 
Quando jovem, teve tensa relação com seu pai, que chegou a interná-lo aos 22 anos de idade acusando-o de ser louco, após tentativa de suicídio. Na idade adulta, entrou para a Escola Normal Superior de Paris, onde ele desenvolveu seu interesse por filosofia e teve influência de seus tutores, particularmente, Jean Hyppolite (tradutor de Fenomenologia do espírito de Hegel) e Louis Althusser (um filósofo marxista). 
Foucault foi positivamente influenciado por diversos autores dentre os quais Karl Marx, com seu materialismo dialético-histórico, e Friedrich Nietzsche, com sua filosofia intempestiva alicerçada em noções como vontade de potência. O filósofo francês reconhece declaradamente essas influências em sua obra, além de Canguilhem.
Em “Soberania e disciplina”, Foucault anuncia de saída que, de 1970 a 1976, tentou investigar o como do poder, no sentido de discernir os mecanismos existentes entre dois pontos de referência, dois limites: por um lado, as regras do direito que delimitam formalmente o poder e, por outro, os efeitos de verdade que este poder produz, transmite e que por sua vez reproduzem. Um triângulo, portanto: poder, direito e verdade.
Nesse texto, na “terceira precaução metodológica”, Foucault (1976[2008], p. 183) adverte-nos em 
... não tomar o poder como um fenômeno de dominação maciço e homogêneo de um indivíduo sobre os outros, de um grupo sobre os outros, de uma classe sobre as outras; mas ter bem presente que o poder – desde que não seja considerado de muito longe – não é algo que se possa dividir entre aqueles que o possuem e o detém exclusivamente e aqueles que não o possuem e lhe são submetidos. O poder deve ser analisado como algo que circula, ou melhor, como algo que só funciona em cadeia. Nunca está localizado aqui ou ali, nunca está nas mãos de alguns, nunca é apropriado a uma riqueza ou um bem. O poder funciona e se exerce em rede. Nas suas malhas os indivíduos não só circulam, mas estão sempre em posição de exercer este poder e de sofrer sua ação; nunca são alvo inerte ou consentido do poder; são sempre centros de transmissão. Em outros termos, o poder não se aplica aos indivíduos, passa por eles. Não se trata de conceber o indivíduo como uma espécie de núcleo elementar, átomo primitivo, matéria múltipla e inerte em que o poder golpearia e sobre o qual se aplicaria, submetendo os indivíduos ou estraçalhando-os. Efetivamente, aquilo que faz com que um corpo, gestos, discursos e desejos sejam identificados e constituídos enquanto indivíduos é um dos primeiros efeitos de poder. Ou seja, o indivíduo não é o outro do poder; é um de seus primeiros efeitos. O indivíduo é um efeito do poder e simultaneamente, ou pelo próprio fato de ser seu efeito, é seu centro de transmissão. O poder passa através do indivíduo que ele constituiu.
Segundo Machado, Foucault formula a questão do poder para dar prosseguimento à pesquisa que realizava sobre a história da penalidade. Colocou-se então o problema de uma relação específica de poder sobre os indivíduos enclausurados que incidia sobre os corpos e utilizava uma tecnologia própria de controle. E essa tecnologia não era exclusiva da prisão, encontrando-se também em outras instituições como o hospital, o exército, a escola, a fábrica, como inclusive indicava o texto mais expressivo sobre o assunto, o Panopticon, de Jeremy Benthan.
Esse tipo específico de poder Foucault chamou de 
DISCIPLINA ou PODER DISCIPLINAR. 
O PODER DISCIPLINAR não é nem aparelho, nem uma instituição. 
A DISCIPLINA é uma técnica, um dispositivo, um mecanismo, um instrumento de poder. São “métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que asseguram a sujeição constante de suas forças e lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade” (MACHADO, 1979, p. XVII). É o diagrama de um poder que não atua do exterior, mas trabalha o corpo dos homens, manipula seus elementos, produz seu comportamento, enfim, fabrica o tipo de homem necessário ao funcionamento e manutenção da sociedade industrial, capitalista... A dominação política do corpo que a DISCIPLINA realiza responde à necessidade de sua utilização racional, intensa, máxima, em termos econômicos. Mas, por outro lado, o corpo se torna força de trabalho quando trabalhado pelo sistema político de dominação característico do PODER DISCIPLINAR (MACHADO, 1979, p. XVII). 
Características básicas do PODER DISCIPLINAR. 
1ª A DISCIPLINA é um tipo de organização do espaço. É uma técnica de distribuição dos indivíduos através da inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório, combinatório. Isola em um espaço fechado, esquadrinhado, hierarquizado, capaz de desempenhar funções diferentes segundo o objetivo específico que dele se exige. Pelo fato de as relações de PODER DISCIPLINAR não necessitarem de um espaço fechado para se realizar, sendo essa a menos importantes, há outra característica mais fundamental (MACHADO, 1979, p. XVII). 
2ª A DISCIPLINA é um controle do tempo. Ela estabelece uma relação de sujeição do corpo ao tempo, com o objetivo de produzir o máximo de rapidez e o máximo de eficácia. Esse controle minucioso das operações do corpo a DISCIPLINA o realiza através da elaboração temporal do ato, da correlação de um gesto específico com o corpo que o produz e, finalmente, através da articulação do corpo com o objeto manipulado.
3ª A vigilância é um dos seus principais instrumentos de controle, uma vigilância que é ou precisa ser vista pelos indivíduos que a ela estão expostos como contínua, perpétua, permanente, que não tenha limites, penetre nos mais recônditos, esteja presente em toda a extensão do espaço. Olhar invisível – como o Panopticon de Benthan, que permite ver tudo permanentemente sem ser visto – que deve impregnar quem é vigiado de tal modo que este adquira de si mesmo a visão de quem o olha. 
4ª A DISCIPLINA implica um registro contínuo de conhecimento. Ao mesmo tempo em que exerce um poder, produz um saber. O olhar que observa para controlar não é o mesmo que extrai, anota e transfere as informações para os pontos mais altos da hierarquia do poder?
Essas características inter-relacionam-se.
Para ilustrar essa inter-relação das características básicas da DISCIPLINA ou PODER DISCIPLINAR Machado utiliza o Hospital. 
Quando a medicina, com o nascimento da psiquiatria, inicia um controle do louco, ela cria o hospício, ou hospital psiquiátrico, como um espaço próprio para dar conta de sua especificidade; institui a utilização ordenada e controlada do tempo, que deve ser empregado sobretudo no trabalho, desde o século XIX considerando o meio terapêutico fundamental; monta um esquema de vigilância total que, se não está inscrito na organização espacial, se baseia na pirâmide de olhares formada por médicos, enfermeiros, serventes; extrai da própria prática os ensinamentos capazes de aprimorar seu exercício terapêutico. Mas, além de inter-relacionadas, essas técnicas disciplinares se adaptam às necessidades específicas de diversas instituições que, cada uma à sua maneira, realizam um objetivo similar, quando considerada do ponto de vista econômico.
Em suas pesquisas, Foucault destaca que as técnicas disciplinares não são rigorosamente repressivas. A grande estratégia que as relações de poder disciplinares desempenham nas sociedades capitalistas do século XIX vem justamente do fato de elas não serem negativas, mas positivas...É que então surge uma das teses fundamentais da genealogia: 
O poder é produtor de individualidade. 
O indivíduo é uma produção do poder e do saber.
Essa tese leva-nos ao âmago da questão da disciplina. Atuando sobre uma massa confusa, desordenada e desordeira, o esquadrilhamento disciplinar faz nascer uma multiplicidade ordenada no seio da qual o indivíduo emerge como alvo do poder. O nascimento da prisão, em fins do século XVIII, não representou uma massificação... O isolamento celular foi, ao contrário, a grande inovação dos projetos e das realizações de sistemas penitenciários... O nascimento do hospício não destruiu a especificidade da loucura. É o hospício que produz o louco como doente mental, personagem individualizado a partir da instauração de relações disciplinares de poder. Antes da constituição das ciências humanas, no século XIX, a organização das paróquias, a institucionalização do exame de consciência e da direção espiritual e a reorganização do sacramento da confissão, desde o século XVI, aparecem como importantes dispositivos de individualização. O PODER DISCIPLINAR não destrói os indivíduos; ao contrário, ele o fabrica. O indivíduo não é o outro do poder, realidade exterior, que é por ele anulado; é um de seus mais importantes efeitos.
A ação sobre o corpo, o adestramento do gesto, a regulação do comportamento, a normalização do prazer, a interpretação do discurso, com o objetivo de separar, comparar, distribuir, avaliar, hierarquizar, tudo isso faz com que apareça pela primeira vez na história esta figura singular, individualizada – o homem – como produção do poder. Mas também, ao mesmo tempo, como objeto de saber. Das técnicas disciplinares, que são técnicas de individualização, nasce um tipo específico de saber: as ciências humanas, cuja constituição histórica é uma questão central nas investigações de Foucault, sobretudo em sua arqueologia do saber, sendo retomada e transformada pelo projeto genealógico. O objetivo agora é explicitar, aquém do nível dos conceitos, dos objetos teóricos e dos métodos, o que pode explicar, não só como, que era o procurado no primeiro caminho, mas fundamentalmente porque as ciências humanas apareceram.

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