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NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 1 Farmacologia Sebenta Teórica e Prática NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 2 Índice: Recomendações: Página 3. Agradecimentos: Página 4. Conteúdos: Página 4. Farmacologia Geral: Aulas 1 e 2: Farmacologia Geral. Conceitos Gerais Em Farmacologia. Da Origem Dos Fármacos À Sua Comercialização: O Ciclo De Vida Dos Medicamentos. – Páginas 6-9. Aulas 3 e 4: Farmacocinética Geral. Absorção. – Páginas 10-19. Aulas 5 e 6: Farmacocinética Geral. Distribuição. Metabolização. Excreção. – Páginas 20-24. Aulas 7 e 8: Farmacodinamia Geral I. – Páginas 25-31. Aulas 9 e 10: Farmacodinamia Geral II. – Páginas 32-34. Aulas 11 e 12: Fármacos Que São Proteínas: Propriedades Farmacodinâmicas E Farmacocinéticas. Genéricos E Biossimilares. – Páginas 35-45. Aulas 13 e 14: Farmacologia Geral Da Proliferação Celular. Antineoplásicos . – Páginas 46-51. Aulas 15 e 16: Farmacologia Geral Do Transporte Iónico. Anestésicos Locais. – Páginas 52-56. Aulas 17 e 18: Farmacologia Da Transmissão Gabaérgica E Glutamatérgica. Ansiolíticos E Antiepiléticos. – Páginas 57-64. Aulas 19 e 20: Farmacologia Geral Do Sistema Nervoso Vegetativo Adrenérgico E Colinérgico. – Páginas 65-75. Aulas 21 e 22: Farmacologia Geral Da Inflamação. Fármacos Anti-inflamatórios Não Esteroides. A Artrite Reumatoide. – Páginas 76-85. Aulas 23 e 24: Farmacologia Geral da Inflamação. Anti-inflamatórios Esteroides. Farmacologia Geral Da Histamina. Anti-histamínicos. – Páginas 86-99. Aulas 25 e 26: Farmacologia Da Transmissão Serotoninérgica. Antidepressivos e Ansiolíticos. – Páginas 100-107. Aulas 27 e 28: Anestésicos Gerais. Relaxantes Musculares. – Páginas 108-114. Aula 29: Bases Farmacológicas Da Medicina De Precisão. – Páginas 115-120. Aula 30: Mecanismos Gerais De Hepatotoxicidade E Nefrotoxicidade Induzida Por Fármacos. – Páginas 121-125. Testa-te: da página 126 à página 167. Resoluções: da página 168 à página 216. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 3 Recomendações: A Farmacologia Geral é uma cadeira do primeiro semestre do segundo ano e, apesar de valer apenas 4 créditos, considero que é bastante importante para entendermos vários mecanismos fisiopatológicos de diferentes doenças e como podemos intervir de forma a tratá-las da maneira mais eficaz, sendo bastante útil futuramente na prática clínica. É também muito útil para conhecermos os princípios básicos das ciências farmacêuticas e para conhecermos os grupos farmacológicos que temos ao nosso dispor, para melhorar a vida dos nossos doentes. É ainda de extrema importância para percebermos as reações adversas medicamentosas e as interações medicamentosas e alimentares que podem ocorrer, de modo a garantirmos a segurança dos nossos pacientes e prevenirmos a não adesão à terapêutica. No meu ano letivo, ao longo do semestre, foram lecionadas aulas teóricas uma vez por semana de duas horas, que na minha opinião são extremamente úteis na sistematização das matérias, facilitando o nosso estudo e contribuindo para a nossa aprendizagem. Cada turma, por semana, teve também uma aula de cariz teórico-prático, de apenas 50 minutos, mas onde eram revistos os vários temas lecionados nas aulas teóricas prévias, e onde eram realizadas questões individuais de forma a avaliar qualitativa e quantitativamente o desempenho de cada aluno na cadei ra de Farmacologia. As aulas práticas eram bastante úteis e simples, mas deviam ser previamente preparadas. Quando tal acontecia, podem acreditar em mim, o trabalho refletia-se na nota prática final. As presenças nas aulas práticas também contavam para a nota prática final, por isso não faltem! São apenas 50 minutos semanais! Estas são as dicas que tenho para vos ajudar! Não sei se no vosso ano vai ser igual, mas ficam as recomendações. Aqui fica uma pequena “sebenta” (se assim se pode chamar 😊) onde coloquei os apontamentos que fiz ao longo do ano nas aulas teóricas e nas aulas práticas, completado em alguns temas com referências dos livros recomendados na bibliografia (o Golan e o Godman). Os meus conselhos em termos de estudo: para as aulas práticas, se revirem bem as aulas teóricas é suficiente. Para o exame aconselho o estudo pelas aulas teóricas e relativamente à bibliografia recomendo o Golan, o Godman e o Rang. Pessoalmente não gostei do Katzung, mas há quem adore. Espero ajudar alguém e que o meu gosto pela Farmacologia contribua de alguma forma para o vosso estudo! Se precisarem de alguma coisa podem contar a 200% comigo. Para quem não sabe quem sou, chamo-me Marta Simões, basta procurarem! 😉 Boa sorte! Vocês conseguem! Beijocas enormes! NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 4 Agradecimentos: Tenho de vos confessar que não sou muito formal e não gosto muito destas coisas! Mas alguns agradecimentos particulares têm de ser feitos. Tenho de agradecer aos meus colegas e amigos Nuno Leiria, Inês Marques, Carolina Gavancho, Mélissa Carvalho, Cleida Brito e Inês Gonçalves que me apoiaram a 100% quando decidi realizar uma sebenta sobre Farmacologia, uma cadeira que adorei, e eles sabem que sim. Para além disso, fizeram o excelente trabalho de rever esta sebenta com atenção (embora possa conter alguns erros, e, por isso, desde já, desculpem-nos), após a ter terminado e relido, mas, inevitavelmente, escaparam-me alguns defeitos. E tenho de agradecer também aos meus afilhados, ou aos meus “rebentos”, como gosto de lhes chamar, Carlota Henriques, Catarina Marrucho, Lara Mendes, Telma Lopes e Urmik, pois assim que lhes contei o que estava a fazer agradeceram-me com todas as suas forças 😊! Mas acima de tudo agradeço a todos aqueles que marcam de alguma forma o meu dia, seja com um sorriso, com um abraço ou com um simples “bom dia”! Conteúdos: Esta sebenta contém, em primeiro lugar, uma explicação dos vários temas abordados ao longo do semestre na cadeira, quer nas aulas teóricas, quer nas aulas teórico-práticas. Os apontamentos foram feitos tendo em conta os conteúdos lecionados pelos vários docentes, os apontamentos por mim retirados durante as aulas e pequenos esclarecimentos retirados dos livros recomendados na bibliografia de base. A segunda parte é constituída por exercícios de escolha múltipla referentes apenas à matéria lecionada retirados de exames anteriores, seguidos da sua resolução e respetiva explicação. Nota: Os retângulos azuis contêm pequenas mensagens que acho que são importantes de reter. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 5 Farmacologia Geral NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 6 Aulas 1 e 2: Farmacologia Geral. Conceitos Gerais Em Farmacologia. Da Origem Dos Fármacos À Sua Comercialização: O Ciclo De Vida Dos Medicamentos. Farmacologia: é a ciência que tem como objeto de estudo o fármaco. Esta destina-se a entender como se pode mudar a normal fisiologia da doença e alterar os seus mecanismos de base. Esta conjuga-se posteriormente com a terapêutica, cujo o principal objeto é o doente. Farmacognosia: é a área da farmacologia que estuda a origem dos medicamentos. Farmáciaou Farmacotécnica: é a ciência que estuda a composição, as propriedades físicas e químicas, a preparação, etc., do medicamento. No fundo responsabiliza-se pela qualidade do medicamento. Farmacogenética: área da farmacologia que se ocupa das variações qualitativas e quantitativas das respostas a fármacos condicionadas por fatores genéticos. Farmacogenómica: é um conceito mais abrangente que inclui a Farmacogenética. Utiliza a informação codificada pelo genoma dos indivíduos para selecionar o melhor medicamento para cada situação. É base da medicina personalizada , que permite uma melhor eficácia terapêutica. Terapia génica: consiste na modificação e manipulação do genoma com fins terapêuticos , utilizando agentes exógenos (estranhos ao organismo), como os vírus (utilizados como vetores). Farmacodinamia: corresponde a tudo o que o fármaco faz ao organismo, no fundo consiste no seu mecanismo de ação. Farmacocinética: corresponde a tudo o que o organismo faz ao fármaco, todas as modificações que lhe impõe de modo a eliminá-lo. Fármaco: é um agente de natureza química ou biológica que é capaz de alterar a normal fisiologia ou fisiopatologia do individuo, podendo ser usado com ou sem fins terapêuticos. Os fármacos são usados não só na terapêutica, como também no diagnóstico, na investigação, na prevenção, etc. Os fármacos podem ser classificados quanto ao seu local de ação em dois grupos, os etiotrópicos e os organotrópicos. Os etiotrópicos atuam no agente etiológico, na causa da doença, afetam diretamente o microrganismo estranho (ex.: antifúngicos, antivirais, antibacterianos, anti-tumorais, etc.). Os organotrópicos atuam alterando um mecanismo fisiológico, biológico (ex.: anti-hipertensores, antipiréticos, analgésicos, etc.). Os fármacos podem ainda ser classificados quanto às suas características moleculares em químicos, proteínas/biológicos, minerais, células, etc. Medicamento: é um fármaco utilizado especificamente com fim terapêutico, destina-se a tratar uma dada patologia ou a minimizar uma dada sintomatologia. Medicamento Experimental: é um fármaco que se utiliza em ensaios clínicos como fármaco de referência. É a forma farmacêutica de uma substância ativa ou placebo, testada ou utilizada como referência num ensaio clínico, incluindo os medicamentos cuja introdução no mercado haja sido autorizada, mas sejam utilizados ou preparados, quanto à forma farmacêutica ou acondicionamento, de modo diverso da NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 7 forma autorizada, ou sejam utilizados para uma indicação não autorizada ou destinados a obter mais informações sobre a forma autorizada. Denominação Comum Internacional (DCI): designação adotada ou proposta pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para substâncias ativas de medicamentos, de acordo com as regras definidas, que não pode ser objeto de registo de marca ou de nome, conforme lista publicada periodicamente por esta organização. Deve ser a nomenclatura utilizada para a prescrição de fármacos. A DCPt refere-se à denominação comum em português. Farmacovigilância: conjunto de atividades de deteção, registo e avaliação das reações adversas, com o objetivo de determinar a incidência, gravidade e nexo de causalidade com os medicamentos, baseadas no estudo sistemático e multidisciplinar dos defeitos dos medicamentos, que se prolonga ao longo de todo o ciclo de vida do medicamento, a partir da fase I, no momento em que o fármaco é usado em humanos. Ciclo de vida de um medicamento: após a descoberta e o desenvolvimento pré-clínico do fármaco iniciam-se os estudos clínicos com a fase I, e simultaneamente inicia-se também a farmacovigilância. Nos estudos clínicos de fase I avalia-se a farmacocinética, a tolerabilidade e os efeitos adversos do fármaco num número reduzido de voluntários saudáveis. Nos ensaios clínicos de fase II fazem-se estudos de eficácia e dosagem e ainda de toxicidade em pacientes num número reduzido. Nos estudos de fase III fazem-se estudos de controlo num número maior de indivíduos. Após a fase III é feito o pedido de AIM (Autorização de Introdução de Mercado). Na fase IV fazem-se estudos de vigilância após introdução no mercado. Os estudos não clínicos compreendem estudos de farmacodinamia (comprovam o efeito que motivou o estudo do novo medicamento, avaliam o mecanismo de ação), de toxicidade (avaliam a segurança do fármaco) e de farmacocinética (avaliam o ADME, isto é, a absorção, a distribuição, o metabolismo e a excreção do fármaco). Os estudos de toxicidade não são realizados em humanos, apenas em animais. Por este motivo tem-se tentado reduzir ao máximo o uso de animais em ensaios experimentais, obtendo o maior número de informações com o menor número de animais possível, iniciando o estudo em humanos cada vez mais precocemente. IND (“Investigational New Drug”) é uma autorização dada ao medicamento experimental para que este possa ser experimentado em humanos, garantindo as mínimas condições de segurança para avançar. Cerca de 90% dos medicamentos não chegam a ser introduzidos no mercado devido à pobre farmacocinética. Os medicamentos novos são diferentes de medicamentos inovadores. Os novos são medicamentos que foram melhorados e que obtiveram AIM mais recentemente, ao passo que os inovadores são A reter: A principal razão pela qual os medicamentos não chegam ser introduzidos no mercado resulta do facto de estes não terem uma farmacocinética vantajosa, favorável. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 8 queles que têm um novo mecanismo de ação, mais vantajoso e eficaz. Em Portugal, a maioria dos medicamentos são novos e não inovadores. O Resumo das Características do Medicamento (RCM) é destinado aos profissionais de saúde, incluindo os médicos. O Folheto Informativo (FI) é destinado aos utentes e deve ser esclarecido pelos médicos e farmacêuticos (é um resumo do RCM). Este é aquele que vem junto com os medicamentos. O RCM é o documento autorizado onde se informa das condições de utilização aprovadas para o medicamento e apresenta a informação científica essencial para os médicos e outros profissionais de saúde. Este documento inclui a informação necessária para a sua aplicação terapêutica: indicações (em que doenças e circunstâncias está provada a sua eficácia e segurança), posologia, precauções, contra-indicações, reações adversas, uso em condições especiais (crianças, grávidas, lactantes,…) e também resume os dados clínic os, as propriedades farmacológicas ou os dados pré-clínicos sobre segurança, de forma a ajudar o médico a saber em que tipo de doentes pode ou não utilizar o medicamento e sobre como pode atuar o fármaco. O Folheto Informativo é a informação escrita que acompanha o medicamento, dirigida ao utente. Inclui a composição qualitativa e quantitativa das substâncias ativas e contém instruções para a sua administração, utilização e conservação; no folheto especificam-se também as reações adversas ao medicamento, as suas interações e contra-indicações, tudo isso com o objetivo de obter a sua correta utilização e para poder seguir o tratamento prescrito. Está escrito de forma clara e compreensível para permitir que os doentes e utentes atuem de forma adequada, com a ajuda dos profissionais de saúde se for necessário. O conteúdo dos textos e outras características da rotulagem e do folheto terão de ser aprovados pelo INFARMED. Os medicamentos obtêm AIM por possuírem uma razão beneficio/risco elevada. Para a obtenção de AIM os medicamentos são avaliados quanto à sua qualidade (que é avaliada através da composição e das propriedade físico-químicas),segurança e eficácia. O sistema europeu compreende quatro procedimentos para a concessão de AIM de um medicamento em mais do que um estado membro. O procedimento nacional é feito pelo INFARMED. O procedimento de reconhecimento mútuo é feito pelo INFARMED e pelo EMR (Estado Membro de Referência). O procedimento descentralizado é feito pelo INFARMED e pelo EM (Estado Membro) em questão. O procedimento centralizado é realizado pela EMA (Agência Europeia do Medicamento), onde estão envolvidos todos os estados membros. O INFARMED tem como objetivo regular e supervisionar medicamentos, dispositivos médicos e produtos cosméticos e de higiene corporal, avaliando a qualidade, a eficácia e a segurança. Reações Adversas Medicamentosas (RAM): são todas as reações prejudiciais ou nocivas não procuradas e que aparecem fortuitamente nas doses normalmente utilizadas, nas doses terapêuticas. Eventos Adversos: é um conceito que inclui as RAM. São todas as reações indesejadas que resultem da utilização normal ou inapropriada do fármaco (por exemplo, em doses tóxicas). Esta pode resultar de erros na medicação, ou seja, erros iatrogénicos. (As designações efeitos laterais ou secundários não devem ser utlizados.) A reter: Os medicamentos têm sempre de ser avaliados quanto à sua qualidade, segurança e eficácia. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 9 Erros na medicação: todo o erro que decorre da prescrição, da transcrição, da dispensa, da administração, da aderência à terapêutica e da monitorização do fármaco. Cerca de 10% dos erros resultam dos medicamentos LASA (Look-Alike e Sound-Alike), isto é, que têm uma grafia e uma fonética semelhante. Reações Idiossincráticas: são imprevisíveis, ocorrem numa população muito restrita de indivíduos e estão dependentes de fatores genéticos. Reações Idiopáticas, Essenciais ou Primárias: são reações cujo o mecanismo é desconhecido. (Exemplo: alguns anti-histamínicos novos causam excitabilidade quando administrados a crianças, pois pensa-se que estes atuem sobre o recetor 5H3 expresso no cérebro.) Reações Iatrogénicas: são reações derivadas do próprio tratamento. (Do grego, iatros significa médico, curandeiro, e genia que significa origem, causa). Cada vez existe uma fronteira mais ténue entre medicamentos e dispositivos médicos. Alguns exemplos de dispositivos médicos são os stents coronários medicados, os preservativos com espermicida, os cateteres revestidos com heparina (anticoagulante), etc. Off label – utilização de um fármaco para uma doença para o qual este não foi aprovado, para o qual não está indicado. Fármaco órfão: é um fármaco que é indicado para o tratamento de uma doença rara, com muito baixa prevalência e incidência mundial. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 10 Aulas 3 e 4: Farmacocinética Geral. A Absorção. Farmacocinética (PK): refere-se à relação entre a dose de um fármaco e a sua concentração no organismo. Estuda-se através de gráficos concentração/tempo. Farmacodinamia (PD): refere-se à relação entre a concentração do fármaco no local de ação e a resposta observada. Estuda-se através de gráficos dose/efeito. Farmacocinética (Pharmacon + Kinesis = movimento do fármaco no organismo) dedica-se ao estudo do ciclo geral dos fármacos no organismo, um ciclo dinâmico, que compreende a absorção, a distribuição, a metabolização e a excreção (ADME). Absorção: O transporte através das membranas: A maioria dos fármacos sai do espaço intravascular por transporte paracelular, isto é, passa a favor do gradiente de concentração entre os espaços intercelulares, sendo assim a absorção limitada pelo fluxo sanguíneo. Contudo, no sistema nervoso central (SNC) e na maioria dos epitélios, as células estão justapostas e interligadas através de tight junctions e, por isso, o transporte paracelular é limitado. Por esta razão, a absorção está intimamente dependente do transporte membranar por intermédio de proteínas transmembranares. Existem vários tipos de transporte membranar, e estes podem ser divididos em dois grandes grupos, o transporte passivo e o transporte ativo. O transporte passivo ocorre sempre a favor do gradiente eletroquímico da substância e não requer o uso de energia. Contrariamente, o transporte ativo requer sempre o uso de energia e ocorre contra o gradiente de concentração da substância. Existem vários tipos de transporte passivo. A maioria das moléculas lipossolúveis, de baixo peso molecular, não carregadas (com menor grau de ionização), na sua forma livre (não associadas a proteínas) e de pequenas dimensões atravessa a membrana plasmática e/ou nuclear por difusão passiva, interagindo com os lípidos membranares. Na difusão passiva o transporte está dependente da intensidade do gradiente eletroquímico, da área da membrana exposta e das características do fármaco. Outro tipo de transporte passivo é a difusão mediada por proteínas transportadoras, onde o ligando se liga ao domínio específico da proteína e esta altera a sua conformação, permitindo a passagem do metabolito entre os dois compartimentos. Este tipo de transporte designa-se de transporte facilitado. A difusão de eletrólitos (substâncias que em solução originam iões) está dependente do pH dos dois compartimentos e da constante de dissociação do fármaco. Isto é importante, porque a maioria dos Aviso: não existem vias especiais para os fármacos no nosso organismo, estes seguem as mesmas vias que as substâncias endógenas. Os fármacos são, portanto, considerados substâncias estranhas ao organismo, xenobióticos. Nota: A forma livre do fármaco, isto é, não associada a proteínas, é a forma terapeuticamente ativa. A reter: A PK estuda-se por gráficos concentração/tempo. A PD estuda-se através de gráficos dose/efeito. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 11 fármacos são ácidos fracos ou bases fracas, assim, a sua absorção vai estar diretamente relacionada com pH do meio. Não esquecendo que a forma não ionizada/neutra é que atravessa mais facilmente as membranas por difusão passiva, necessitamos que esta exista em maior percentagem que a forma ionizada. Os fármacos que são ácidos fracos são melhor absorvidos em meios ácidos, porque o pH do meio é menor que o seu pKa, existindo maior quantidade de ácido não ionizado, que atravessa a membrana. Quando os ácidos fracos estão em meio alcalino tendem a doar os seus protões, ficando na sua forma ionizada, deixando de conseguir atravessar as membranas. De outro modo, os fármacos que são bases fracas são melhor absorvidos em meios básicos/alcalinos, pois o pH do meio é maior que o seu pKb, e assim a forma não ionizada da base existe em maior quantidade e atravessa a membrana. Quando os fármacos que são bases fracas estão em meios ácidos tendem a receber protões, ficando eletricamente carregados, o que não lhes permite que estes atravessem as membranas, acumulando-se. Este fenómeno é denominado de Ion-Trapping. Exemplos: o ácido acetilsalicílico (o principio ativo da aspirina) é um ácido fraco e que é melhor absorvido no estômago, logo não deve ser administrado com leite, pois o pH básico do leite vai alcalinizar o pH acídico gástrico e diminuir a taxa de absorção do fármaco. Por outro lado, se existir uma intoxicação por toma excessiva de ácido acetilsalicílico, de imediato deve aumentar-se o pH do organismo para que este seja rapidamente eliminado, bebendo-se leite ou no hospital por intermédio de uma injeçãoendovenosa de bicarbonato (HCO3-). Do mesmo modo, as anfetaminas são bases fracas e não devem ser administradas com soluções ácidas, como sumos de laranja ou sumos de limão, para que sejam mais eficazmente absorvidas. Contudo, se existir uma intoxicação devem ser administradas soluções ácidas ou administrar uma solução endovenosa de ácido ascórbico, para diminuir o pH do individuo, para que o fármaco seja eliminado do organismo o mais rapidamente possível. O duodeno é o órgão de eleição para a absorção da maioria dos fármacos, porque é o que tem maior gama de variação de pH, variando o seu pH entre os 4,8 e os 8,2. Quanto ao transporte ativo também são considerados vários tipos. O transporte ativo pode ser mediado por ATPases, isto é, proteínas transportadoras transmembranares que têm atividade enzimática incorporada e que através da hidrólise de uma molécula de ATP em ADP e fosfato (P), conseguem realizar o transporte de substâncias contra o seu gradiente de concentração, designando-se este tipo de transporte, transporte ativo primário. Equação de Henderson-Hasselbach: 10𝑝𝐾𝑎−𝑝𝐻 = 𝐻𝐴/𝐴− A reter: Os fármacos que sejam ácidos fracos são melhor absorvidos em meios ácidos, como o meio acídico do estômago. Os fármacos que são bases fracas são melhor absorvidos em meios alcalinos, como o duodeno. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 12 O transporte ativo secundário, é realizado também por proteínas transmembranares, mas não através da hidrólise de ATP, mas sim pela existência de um gradiente de difusão favorável ao transporte de outra substância, na maioria dos casos do sódio (Na+) ou do cálcio (Ca2+). Quando ambas as substâncias são transportadas na mesma direção, este designa-se de simporte, quando são transportadas em direções opostas designa-se de antiporte. Proteínas transportadoras transmembranares: existem dois tipos, as proteínas ABC (“ATP” Binding Protein) e as proteínas SLC (Solute Carrier). As proteínas ABC realizam transporte ativo primário, medeiam o efluxo (a saída das substâncias da célula) e a mais bem conhecida e mais importante é a glicoproteína-P (Pg-P) ou MDR1 (Multi Drug Resistence) codificada pelo gene ABCB1. As proteínas SLC realizam o transporte ativo primário e transporte facilitado, medeiam tanto o efluxo como o influxo de substâncias, são mais abundantes que as ABC e as mais importantes são a SLC6A4 ou SERT e a SLC6A3 ou DAT, que medeiam a recaptação da serotonina e da dopamina da fenda sináptica novamente para o interior dos neurónios, respetivamente. Todos estes transportadores têm como principal objetivo manter a homeostasia celular, mediando o efluxo e o influxo de substâncias endógenas e exógenas, evitando a toxicidade, funcionando como um mecanismo protetor, de defesa do organismo. Contudo, são o principal mecanismo de resistência a fármacos como os anti-tumorais, os antifúngicos, os antibacterianos, os antivirais, etc., o que constitui um grande desafio para a industria farmacêutica. Para além disso, possibilitam também a existência de interações medicamentosas e a existência de vários efeitos adversos (por exemplo, são este tipo de transportadores que medeiam o transporte da glucose e da bilirrubina, portanto, o uso de fármacos que usem os mesmos transportadores, pela competição pelo mesmo local de ligação, podem provocar hipoglicémia (diminuição dos níveis de glicose plasmática) ou icterícia (coloração amarelada da pele, das escleróticas e das mucosas)). Adicionalmente, cerca de 6% do nosso genoma codifica para proteínas transportadoras, estando sujeitas à existência de vários polimorfismos genéticos, o que contribui para a variabilidade interindividual na resposta aos fármacos. A glicoproteína-P (Pg- P) é expressa em grandes quantidades nos enterócitos intestinais (as principais células absortivas do intestino), nos hepatócitos, nos linfócitos, na placenta e nas células que fazem parte da barreira hematoencefálica (BHE). Este facto, permite a criação de santuários, ou seja, locais onde os fármacos não conseguem chegar em concentrações eficazes para exercer a sua ação, devido à existência de proteínas que medeiam o seu efluxo. Para evitar a falta de eficácia dos fármacos podem ser administrados concomitantemente inibidores da glicoproteína-P, contudo, isto pode trazer efeitos adversos, pois esta proteína também transporta produtos resultantes do metabolismo celular. Os transportadores podem ser o alvo terapêutico direto. Por exemplo, os antidepressivos inibem o SERT (o transportador que faz a recaptação de serotonina para o interior dos neurónios), os anticancerígenos inibem ABC: - MDR1 ou glicoproteína-P - SPGP - BCRP (Brest Cancer Resistence Protein) SLC: - OATP (Organic Anion Transporter Protein) - OCTP (Organic Cation Transporter Protein) Exemplo: A bilirrubina é transportada pelo transportador MRP2. Se o individuo tomar um fármaco que utilize este transportador, este vai competir com a bilirrubina pelo mesmo local de ligação, e esta última acumula-se preferencialmente em zonas ricas em fibras de elastina, causando a condição clínica conhecida como icterícia. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 13 os transportadores de nucleótidos, os fármacos usados no tratamento da síndrome metabólica inibem os GLUTs (os transportadores que fazem o transporte facilitado da glicose para o interior das células), etc. As interações: A grande maioria das interações medicamentosas pode ser dividida em dois grandes grupos, as interações de indução e as interações de inibição. Um fármaco pode induzir a metabolização do outro ao ativar vias de sinalização que vão culminar no aumento da transcrição dos genes que codificam para as enzimas responsáveis pela sua metabolização. Nas interações de inibição, um medicamento inibe a ação do outro interagindo com as proteínas da mesma via, saturando-as, por exemplo. O conhecimento da farmacocinética permite-nos realizar uma medicina personalizada , ajustando a dose individual de uma dada substância. Por exemplo, se o doente tiver uma enzima com uma atividade metabólica baixa (“low metabolic rate”) para a degradação de um dado fármaco, este vai ter tendência a acumular-se, desencadeando reações adversas medicamentosas (utilização da Farmacogenética para conhecer os polimorfismos). Outro exemplo, se um fármaco for muito metabolizado no fígado, este não pode ser administrado a um indivíduo com insuficiência hepática . Parâmetros Farmacocinéticos: Os parâmetros farmacocinéticos são obtidos a partir da curva concentração/tempo. Desta curva é possível obter a concentração máxima (Cmáx), ou seja, a concentração máxima plasmática que o fármaco atinge ao longo do tempo; o tempo máximo (Tmáx) ou lag time, ou seja, o tempo necessário para que se atinja a Cmáx do fármacos em circulação; a concentração mínima (Cmin), ou seja, a concentração mínima plasmática do fármaco atingida ao longo do tempo; a concentração vale (Cvale), ou seja, a concentração imediatamente antes da próxima administração que deve ser sempre superior à Cmin; a concentração eficaz mínima (Cef), ou seja, a concentração plasmática mínima necessária do fármaco, para que este produza um efeito. Desta curva é ainda possível obter o parâmetro AUC (Area Under the Curve), que avalia a biodisponibilidade (F), isto é, a velocidade e a quantidade de fármaco que é absorvida. Pode obter-se também a duração de ação, que corresponde ao tempo em que o fármaco se mantém numa concentração plasmáticasuperior ou igual à concentração eficaz mínima. A reter: Os “azoles” são medicamentos inibidores do metabolismo. Efeito Booster - decorre da utilização de fármacos potenciadores do metabolismo, ou seja, ao inibirem certas enzimas inibem o metabolismo de certos fármacos, fazendo com que estes permaneçam mais tempo no organismo para exercerem a sua ação. Nota: - Cmáx está relacionada com a toxicidade. - Tmáx está relacionado com a velocidade de absorção. - Cmin está relacionada com a eficácia. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 14 Para avaliar a eficácia e a segurança do fármaco usamos a janela terapêutica , isto é, o intervalo compreendido entre a concentração eficaz mínima e a concentração tóxica mínima ou concentração segura máxima. Quanto maior for a janela terapêutica, maior é a segurança do fármaco. Sempre que as concentrações do fármaco são superiores à concentração tóxica mínima este está em concentrações tóxicas para o organismo, sempre que as concentrações são inferiores à concentração eficaz mínima o fármaco está em concentrações subterapêuticas. Avaliando as concentrações plasmáticas ao longo do tempo, tendo em conta a janela terapêutica de referência para um fármaco, é possível fazer a sua monitorização terapêutica (TDM). A monitorização terapêutica deve ser feita para fármacos cuja a janela terapêutica é muito estreita, para fármacos que tenham uma grande variabilidade de resposta interindividual e para fármacos em que haja uma alteração na correlação entre as concentrações e a toxicidade. A maioria dos fármacos não é administrado numa toma única diária, mas sim em doses mais pequenas em maior frequência para que as concentrações se mantenham estáveis e dentro da janela terapêutica durante um maior intervalo de tempo. Estado Estacionário ou “Stady State” (SS): é o ponto em que o perfil farmacocinético de um fármaco já não muda após a administração da dose seguinte. É o ponto em que se atinge um equilíbrio entre a quantidade de fármaco que entra no organismo e a quantidade que é eliminada (a concentração mantém-se estável no organismo). Tempo de semivida (t1/2): corresponde ao tempo necessário para que 50% do fármaco seja eliminado do organismo. O estado estacionário só é alcançado após terem passado 3 a 5 semividas do fármaco. Absorção: A absorção de um fármaco depende de vários fatores, depende da via de administração, da forma farmacêutica, das características do fármaco, da estrutura absorvente, de fatores fisiológicos (idade, sexo, raça, etc.), e de fatores patológicos (ex.: insuficiência hepática, insuficiência renal, febre, etc.) Muitos fármacos não podem ser administrados por via oral (ex.: fármacos que são proteínas), pois são inativados pelo pH acídico do estômago, são degradados por protéases e sofrem efeito de primeira passagem hepática e intestinal. Efeito de Primeira Passagem: mede a fração ou percentagem do fármaco administrado que é removida pela passagem através da parede gastrointestinal, do fígado ou de outros órgãos, antes de atingir a circulação sistémica. Assim, a circulação portal é um sistema capaz de nos proteger de forma natural de agentes externos, uma vez que leva tudo o que é absorvido exogenamente até ao fígado, o órgão capaz de biotransformar e modelar esses mesmos agentes para que sejam mais rápida e facilmente excretados. O efeito de primeira passagem vai diminuindo Doses: - od (once a day); qd (quite a day) = uma vez ao dia - bid = duas vezes o dia - tri = três vezes ao dia NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 15 consecutivamente da via oral, para a via inalatória, para a via subcutânea, para a via intramuscular, sendo nulo na via intravenosa. Para que os fármacos aumentem a sua eficácia deve-se evitar o efeito de primeira passagem, atingindo assim estes a circulação sistémica em maior quantidade. Contudo, nem sempre o efeito de primeira passagem é desvantajoso. Alguns fármacos que são administrados por via inalatória (via vantajosa que faz com que seja necessária uma menor quantidade de fármaco para o mesmo efeito, tem um inicio de ação mais rápido e tem menos efeitos tóxicos), se alcançarem a circulação sistémica podem ter reações adversas importantes. As partículas que ficam alojadas na orofaringe podem alcançar a circulação sistémica pela deglutição, o que é evitado pelo efeito de primeira passagem (ex.: acontece com os corticosteroides inalados usados no tratamento das crises asmáticas). Biodisponibilidade (F): corresponde à quantidade e à velocidade com as quais um composto ativo ou a sua porção terapeuticamente ativa são absorvidos, lançados na circulação sistémica e se tornam disponíveis no local de ação. No fundo mede a fração de fármaco que tem acesso à circulação sistémica na forma inalterada. As unidades da biodisponibilidade são mg/mL/h. 𝐵𝑖𝑜𝑑𝑖𝑠𝑝𝑜𝑛𝑖𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 (𝐹) = 𝐴𝑈𝐶𝑜𝑟𝑎𝑙 𝐴𝑈𝐶𝑖𝑣 Os estudos de biodisponibilidade devem ser feitos quando a quantidade de princípio ativo no medicamento é modificada, quando há uma nova formulação do princípio ativo, quando é modificada a via de administração, quando há uma nova forma farmacêutica, para o estudo das variabilidades do lote de fabrico, para o estudo da influência dos fatores fisiológicos e patológicos, para o estudo da interação entre dois ou vários princípios ativos, para a avaliação de bioequivalência entre duas formas farmacêuticas, ou seja, para o estudo e avaliação de genéricos, etc. Para a formulação de genéricos nunca se avalia a eficácia, mas sim a bioequivalência . Os genéricos são bioequivalentes ao fármaco de referência, se o ratio entre a AUC estiver compreendido entre 0,80 e 1,20. Ou seja, a variação da quantidade de princípio não pode ser inferior a 80% nem superior a 120% da existente no medicamento de referência. Para além disso, a Cmáx deve ser semelhante ou superior, desde que sejam verificadas as condições de segurança. O Tmáx apenas é avaliado quando há necessidade de um início de ação mais rápido. Formas Farmacêuticas: Formas farmacêuticas: estado final que as substâncias ativas apresentam depois de serem submetidas às operações farmacêuticas necessárias, a fim de facilitar a sua administração e obter o maior efeito terapêutico desejado. A substância ativa é administrada como uma formulação em conjunto com um ou mais agentes não medicamentosos, com diferentes funções, o expediente. A escolha da forma farmacêutica depende das características do princípio ativo, do mecanismo de ação, do local de ação, das características do doente, da dose, etc. Estas podem ser liquidas, sólidas, gasosas, etc. Nota: A biodisponibilidade é máxima (100%) quando o fármaco é administrado por via intravenosa/endovenosa. Esta via de administração tem um Tmáx igual a 0, uma vez que a concentração plasmática é máxima aquando da administração. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 16 Formas Líquidas: - Soluções: são formas liquidas homogéneas, em que a substância ativa está em dispersão uniforme num solvente aquoso ou não aquoso. Exemplo: soluções injetáveis, como a insulina. - Suspensões: são formas liquidas, em que a substância ativa se apresenta sob a forma de partículas sólidas não dissolvidas, total ou parcialmente, num meio liquido (quando o principio ativo tem baixa solubilidade). Estas normalmente têm maior duração de ação e é necessário agitá-las antes da administração, para que a dose seja uniformizada. - Emulsões: sãoformas liquidas, que resultam da mistura de dois líquidos não miscíveis. Exemplo: alimentação parentérica, administrada a doentes que não podem deglutir. - Xarope: princípio ativo em solução ou suspensão concentrada em açúcar. Ideal para a população pediátrica, porque é menos desagradável e é mais fácil adaptar a dose ao peso da criança. - Elixir: o princípio ativo está dissolvido num veiculo hidroalcóolico. - Colírios: são soluções aquosas estéreis para utilização oftálmica. Formas Sólidas: - Comprimidos: o princípio ativo é um pó medicamentoso que é preparado por compressão. Estes podem ser preparados de ação prolongada, retardada ou contínua, para uma absorção gradual do fármaco. Alguns são comprimidos com revestimento entérico que resistem à dissolução no pH acídico do estômago, mas dissolvem-se no pH alcalino intestinal (formas utilizadas para fármacos que são ativos em pH ácido). - Cápsulas: estas têm normalmente um involucro gelatinoso de forma oval que envolve a substância ativa em pó ou em grânulos. As cápsulas podem ser duras ou moles, sendo que estas últimas nunca devem ser abertas ou partidas. As cápsulas também podem conter preparados com ação prolongada. - Drageias: são comprimidos com um revestimento de cera ou açúcar, sendo geralmente coloridos. Este revestimento, para além de mascarar o odor e/ou sabor desagradável, ao ser colorido é vantajoso para a população mais idosa, que toma vários medicamentos diariamente, facilitando a posologia. - Pastilhas: pequenos discos que contém o fármaco numa base aromatizada. Devem ser completamente dissolvidos na cavidade oral para que o princípio ativo se liberte (Ex.: nitratos, para a vasodilatação coronária, no caso de angina de peito; pastilhas para a odinofagia, ou seja, para a dor de garganta, etc.). Formas Gasosas: - Inaladores Pressurizados de Dose Controlada (MDI): são vantajosos já que a formação do aerossol é assegurada pelo dispositivo e assegura a libertação de uma dose fixa através de uma válvula de dose controlada. Contudo, requer a sincronização e coordenação do doente para a ativação com a inalação. - Inaladores de Pó Seco (DPI): são vantajosos porque não requerem a sincronização, sendo mais fáceis para todas as idades. No entanto, a formação do aerossol está totalmente dependente do esforço inalatório do doente. Nota: nas gotas nasais, quanto maior é a viscosidade da solução, maior é o tempo de contacto com a superfície da mucosa nasal, logo maior é a eficácia. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 17 - Nebulizadores: a formação do aerossol é parte integrante do dispositivo, não necessitam de sincronização por parte do doente, são úteis para situações agudas de dispneia, o esforço inspiratório necessário é mínimo. São ideais para pacientes inconscientes. O único senão é a necessidade de adaptação e posição corretas da máscara. Outras Formas: - Supositórios, Óvulos: formas sólidas para administração anal ou vaginal. A substância dissolve à temperatura corporal. - Sistemas Transdérmicos: a substância ativa encontra-se sob a forma de pensos adesivos, sendo lentamente absorvida através da pele (patch). Estes têm de ser aplicados sobre zonas de pele fina, como na face lateral do braço ou na parede anterior do abdómen. É uma forma vantajosa sobretudo para o tratamento de dependências, como a dependência tabágica. Preparações semissólidas cutâneas: - Cremes: preparações multifásicas constituídas por uma fase lipofílica e por uma fase aquosa. - Pomadas: são constituídas por um excipiente monofásico no qual podem ser dispersas substâncias liquidas ou sólidas. São preparações semissólidas numa base gorda (ex.: vaselina). - Pastas: são preparações semissólidas, contendo grandes quantidades de pó finamente disperso no excipiente. - Pós: partículas sólidas finas de um princípio ativo. - Géis: são líquidos gelificados com agentes gelificantes apropriados. Bolus corresponde à administração faseada de um medicamento; refere-se à administração de uma medicação, com o objetivo de aumentar rapidamente a sua concentração no sangue para um nível eficaz (exemplo: bolus de insulina, pré-pandrial). Vias de Administração: As vias de administração podem ser tópicas ou sistémicas. As tópicas são aquelas em que o fármaco é colocado em contacto direto com o local de ação onde vai exercer o seu efeito terapêutico (ex.: anestésicos locais, descongestionantes nasais, colírios, etc.). As sistémicas são aquelas em que o fármaco tem que alcançar a circulação sistémica, para que depois seja distribuído aos seus órgãos alvo. As vias de administração sistémicas podem ser classificadas em entéricas ou parentéricas. As entéricas são aquelas em que a absorção se processa através do epitélio do tubo digestivo. As parentéricas são aquelas em que a absorção se processa fora do trato gastrointestinal. Importante: A via de administração não é igual ao efeito. Por exemplo, a via inalatória é uma via tópica, contudo os broncodilatadores administrados por esta via têm um efeito tópico, ao passo que os anestésicos gerais, também administrados por esta via, têm um efeito sistémico. A via retal é uma via sis témica entérica, mas os anti hemorroidários administrados por esta via têm um efeito tópico, ao passo que os antipiréticos têm um efeito sistémico. Ou seja, a mesma via de administração pode ser utilizada tanto para ter um efeito tópico, como um efeito sis témico. Nota: A formação do aerossol é muito importante, as partículas formadas devem ter entre 1 a 5 micrómetros, pois se forem muito pequenas podem ser facilmente expelidas, não exercendo o seu efeito, e se forem muito grandes podem ficar retidas nas vias respiratórias. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 18 Vias tópicas: cutânea (cremes, pomadas, geles), inalatória (aerossóis), bucal (pastilhas, cremes), ocular (gotas, pomadas), nasal (gotas, sprays), vaginal (óvulos, cremes). Vias sistémicas parentéricas: subcutânea, intramuscular, intravenosa, transdérmica e implante. Vias sistémicas entéricas: oral e retal. Existem vários fatores que influenciam a escolha da via de administração , desde o mecanismo de ação do fármaco, da integridade do local de administração, do estado do paciente, da rapidez do inicio de ação, da natureza do medicamento, etc. Por exemplo, os fármacos que são absorvidos pela superfíc ie cutânea, dependem da sua integridade; os fármacos administrados por via oral não podem ser usados em doentes inconscientes, etc. Estrutura absorvente: a vascularização do local, o tempo de contacto e a superfície de absorção são muito importantes. Quanto mais vascularizado for o local, maior é absorção, por exemplo, na via subcutânea a absorção é menor que por via intramuscular, uma vez que os músculos são bem irrigados. Quanto maior for a área de superfície e menor a sua espessura, maior é a taxa de absorção, e por estes motivos a via sublingual pela sua mínima espessura e o epitélio intestinal pelas suas inúmeras microvilosidades são vantajosos. O tempo de contacto é também crucial, já que alterações do tempo de trânsito intestinal condicionam a absorção pelas vias entéricas (ex.: diarreia). Vantagens e desvantagens das vias de administração: - Vias entéricas: mais convenientes e confortáveis para o doente; apropriadas para o tratamento crónico. - Vias parentéricas: ideias para fármacos de difícil absorção; a dose é mais facilmente controlável. São úteis em contexto hospitalar nas terapêuticas agudas. - Via inalatória: rápida absorção; menos tóxica; efeitolocal mais eficaz; menos efeito de primeira passagem; possibilidade de efeitos sistémicos se o fármaco alcançar a circulação; pode não ser vanta josa para doentes inconscientes. - Via oral: mais segura; mais cómoda; mais económica; permite a automedicação; maior adesão à terapêutica; absorção favorecida pelo elevado numero de vilosidades e microvilosidades intestinais (grande área de superfície); sofre um grande efeito de primeira passagem, há possibilidade de irritação da mucosa (náuseas, vómitos, diarreia); há variação no grau de absorção (pH gástrico, enzimas, motilidade); há possibilidade de interações com alimentos; tem um tempo de latência considerável. O fármaco tomado por via oral precisa de uma maior dose . - Via endovenosa: muito rápida; permite a administração de grandes volumes; controlo eficaz das doses; prevenção de efeitos tóxicos; só podem ser administradas soluções; há risco de embolia, de infeções e de irritação; pode haver sobredosagem relativa em injeções rápidas. - Via sublingual: absorção rápida de substâncias lipossolúveis; não sofre efeito de primeira passagem; pode irritar a mucosa da cavidade oral; pode ter um sabor desagradável. Tempo de latência: corresponde ao tempo que decorre entre a administração do fármaco e o seu inicio de ação. Nota: Os fármacos são distribuídos primeiramente para os órgãos melhor irrigados e de menor massa. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 19 - Via retal: vantajosa para crianças, idosos, doentes com vómitos e náuseas e para doentes inconscientes; menor efeito de primeira passagem; a absorção pode ser irregular e incompleta; pode haver irritação da mucosa retal. - Via transdérmica: a absorção é muito lenta, tendo uma duração de ação prolongada; é cómoda; não dolorosa; ideal para doentes com dificuldade na deglutição; tem menor efeito de primeira passagem; pode haver irritação local; a absorção está dependente das características da pele (espessura, integridade, pilosidade, hidratação, fluxo sanguíneo); há um menor controlo da dose. - Via subcutânea: a absorção é rápida, sobretudo para soluções; a absorção é lenta para comprimidos e suspensões; pode provocar dor e necrose dos tecidos; é muito suscetível à sensibilização do doente; a aplicação local de calor, a massagem e o exercício aumentam a velocidade de absorção. - Via intramuscular: a absorção é rápida; a administração pode ser feita em doentes inconscientes; pode provocar dor; não suporta grandes volumes como a intravenosa; pode lesar o tecido muscular; requer a administração por parte de profissionais de saúde treinados; pode provocar inflamação, embolia e infeções. - Via intratecal/intraraquídea (nos ventrículos cerebrais ou no espaço subaracnoide): usada para administração de substâncias que devem atuar no SNC, mas que não atravessam a BHE; requer pessoal especializado; pode levar a lesões do tecido nervoso e infeções graves. Posologia de um medicamento: indicação de como, quando e qual dose do medicamento deve ser tomada (instruções do tratamento). NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 20 Aulas 5 e 6: Farmacocinética Geral. Distribuição. Metabolização. Excreção. Distribuição: Após os fármacos alcançarem a circulação sistémica, depois de terem sido absorvidos, são distribuídos pelo organismo e pelos seus locais de ação, sendo que esta distribuição é feita maioritariamente pela via sanguínea, mas também pela via linfática, de forma não homogénea. A distribuição é medida através do volume de distribuição (Vd) e através do seu valor conseguimos perceber, no geral, onde o fármaco está no organismo. Num individuo estereotipado do sexo masculino com cerca de 70kg, existem cerca de 42L de água corporal, sendo que 5L estão no compartimento intravascular. No geral, um terço da água está no compartimento extracelular e os restantes dois terços estão no compartimento intracelular. Tendo em conta este facto, se um fármaco apresentar um Vd pequeno de cerca de 5L, significa que este fica confinado ao espaço vascular. Se um fármaco apresentar um Vd de 40L é porque este se distribui por toda a água corporal. Contudo, um fármaco pode ter um Vd bastante elevado na ordem dos 400L, isto significa que este se distribui para o espaço intracelular, onde fica acumulado. Quanto mais lipossolúvel for um fármaco, maior é o seu Vd. 𝑉𝑑 = 𝑑𝑜𝑠𝑒 𝐶𝑝 (𝑐𝑜𝑛𝑐𝑒𝑛𝑡𝑟𝑎çã𝑜 𝑝𝑙𝑎𝑠𝑚á𝑡𝑖𝑐𝑎 ) Sendo o Vd um parâmetro quantificável, obtido por um cálculo, assume que o fármaco se distribui de forma homogénea no organismo, o que na verdade não acontece. Os santuários correspondem a locais onde o fármaco não chega nas concentrações ideais para exercer a sua função e ocorrem nos fármacos de ação intracelular, graças à existência de transportadores de efluxo que não permitem a permanência do princípio ativo no espaço intracelular. Exemplo: os dois fármacos, A e B, são administrados na mesma dose (500mg). No entanto, o fármaco B tem um maior volume de distribuição e por isso não fica retido no compartimento intravascular porque atravessa para o espaço intracelular, tendo menor concentração plasmática. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 21 A ligação dos fármacos às proteínas plasmáticas influencia o seu Vd. A maioria dos fármacos liga- se à albumina (a principal proteína plasmática que determina a pressão oncótica e que é produzida maioritariamente no fígado), mas a α1-glicoproteina ácida , as lipoproteínas e as globulinas também são importantes proteínas de ligação aos fármacos. As hormonas esteroides, como as hormonas sexuais (estrogénios e progesterona) ligam-se principalmente às globulinas. Os fármacos que se ligam pouco às proteínas (ex.: paracetamol, aciclovir, nicotina e ranitidina) têm menor potencial para interações medicamentosas, ou para alterações da distribuição em situações patológicas (ex.: insuficiência renal ou hepática). Os fármacos interagem entre si e competem pela ligação às proteínas. Alguns fármacos ligam-se em muita extensão às proteínas plasmáticas, mas também às proteínas tecidulares, contribuindo para a sua acumulação. A interação entre as proteínas e os fármacos é na maioria das vezes reversível, instável e não seletiva. Apenas a fração livre é a ativa , a fração ligada às proteínas é inativa e contribui para prolongar o efeito do fármaco. Fármacos que se ligam muito a proteínas têm, geralmente, um Vd menor. No entanto, parâmetros como a irrigação sanguínea, a lipossolubilidade e o grau de metabolização, também afetam o Vd. Por exemplo, os anticorpos monoclonais têm um Vd baixo porque são proteínas de grandes dimensões que têm uma ação extracelular e não atravessam facilmente as membranas. O mais comum e normal é que a distribuição não seja uniforme/homogénea – ocorre redistribuição. Os fármacos chegam mais rápido aos órgãos mais irrigados e de menor massa, mas ficam muitas vezes retidos nos tecidos em que chegam em último, como no tecido adiposo (acontece nos fármacos muito lipofílicos, como as benzodiazepinas). A perda de peso leva por vezes à libertação de fármacos armazenados na corrente sanguínea, o que pode gerar reações adversas. Exemplo do tiopental (barbitúrico): o tiopental é um fármaco utilizado como indutor da anestesia. Este tem como local de ação o SNC, e por isso, como os fármacos são distribuídos para os órgãos melhor irrigados, este vai chegar rapidamente ao seu local de ação e exercer a sua funçãoe por isso a sua duração de ação é muito curta. Contudo, este Nota: os edemas também têm impacto na distribuição dos fármacos hidrofílicos, como a gentamicina, pois estes passam a ter um Vd maior, por terem muita afinidade pelos solventes como a água. A reter: Os fármacos que são ácidos fracos ligam-se maioritariamente à albumina, ao passo que os fármacos que são bases fracas se ligam sobretudo à α1-glicoproteina ácida. A albumina é facilmente saturável porque esta apresenta poucos locais de ligação para os fármacos e por isso existe maior probabilidade de interações medicamentosas. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 22 depois é redistribuído para os outros tecidos, e como é muito lipossolúvel vai -se acumulando no tecido adiposo, o que lhe dá um longo tempo de semivida. Barreira Hematoencefálica (BHE): na BHE não ocorre transporte paracelular, pois as células encontram-se justapostas e unidas por tight junctions, o que dificulta a travessia das várias substâncias, sendo que apenas atravessam aquelas para as quais existem transportadores. A existência da BHE permite que os neurónios sejam santuários e por isso grande parte dos fármacos não atravessa esta barreira ou então rapidamente é exportado por transportadores de efluxo, o que dificulta o tratamento de doenças do SNC, como tumores. Em certas situações patológicas, como inflamação das meninges (meningite), esta barreira pode estar alterada, estando a sua permeabilidade aumentada. Exemplo: os anti-histamínicos de 1ª geração são muito lipofílicos e atravessam a barreira hematoencefálica com grande facilidade, sendo um dos seus efeitos adversos a sedação. Os anti- histamínicos de 2ª geração não dão sono, porque foram modificados, para se tornarem substrato da glicoproteína P, o principal transportador de efluxo do SNC, para serem mais hidrofílicos e para terem maiore s dimensões e pesos moleculares, tendo um menor efeito sobre o SNC. Barreira placentária: esta é uma barreira muito pouco seletiva, o que contribui para o risco de toxicidade para o feto. Por exemplo, a nicotina é uma base fraca e tende a acumular-se no sangue do bebé, porque o plasma fetal é um meio acídico. Metabolização: Biotransformação: corresponde ao processo através do qual as substâncias mais lipossolúveis são convertidas em substâncias mais hidrossolúveis para facilitar a sua eliminação. Esta reação permite que substâncias estranhas e tóxicas ao organismo, se tornem mais hidrofílicas e sejam expulsas e eliminadas. A biotransformação ocorre maioritariamente no fígado, o principal órgão do metabolismo, mas também pode ocorrer no intestino, nos rins, nos pulmões, etc. O processo de biotransformação ocorre por dois tipos de reações, as reações de fase I e as reações de fase II. As reações de fase I ocorrem no retículo endoplasmático e são reações de oxidação, redução e hidrólise , que são catalisadas por enzimas, como o citocromo P450. O CYP450 é responsável pela metabolização de cerca de 50% dos medicamentos, e por esta razão, atualmente, tentam fabricar-se fármacos que não sejam metabolizados por este sistema, para evitar a existência de interações medicamentosas e reações adversas. As reações de fase II ocorrem maioritariamente no citosol, sendo estas reações de conjugação com vários tipos de moléculas. Estas reações são catalisadas por transferases, como a UDPGT (transferase do ácido glucorónico); NAT (N-acetil-transferase); SULT (sulfato transferase); GST (glutatião transferase), etc. A biotransformação pode converter os fármacos em diferentes metabolitos. O fármaco ativo após metabolizado pode dar origem a outro metabolito ativo, pode dar origem a um metabolito tóxico, ou pode NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 23 dar origem a um metabolito inativo, sendo esta última via a mais comum. Existem fármacos que são administrados na sua forma inativa e são apenas ativos por metabolização hepática, sendo estes designados de pró-fármacos. Eliminação/Excreção: A excreção não é sinónimo de eliminação. A excreção corresponde à saída dos fármacos do interior das células, ao passo que a eliminação se refere à saída do fármaco do organismo. Existem várias vias de eliminação do organismo, sendo a principal a urina, no entanto, os fármacos também podem ser eliminados pelas fezes, pela expiração, pelas lágrimas, pelo suor, pelo leite materno, pela saliva, pelo cabelo, pelas unhas, pela pele e pela descamação das mucosas. A excreção dos fármacos pela urina é assegurada pelo rim. Primeiramente, ocorre a filtração glomerular, sendo este processo determinado pela barreira de filtração e pelas forças de Starling (os fármacos de grandes dimensões ou associados a proteínas não são filtrados). Seguidamente, ocorre a reabsorção, sendo que a grande maioria do filtrado é reabsorvido. As substâncias que são tóxicas para o organismo, como os fármacos, podem ser secretadas para dentro do sistema tubular renal, através de transportadores ou por difusão passiva. O que resta do filtrado, após a reabsorção, juntamente com a porção secretada, é eliminado. A manipulação do pH da urina pode influenciar a taxa de eliminação dos medicamentos. A excreção hepática ocorre por biotransformação e por inserção dos metabolitos na bílis, sendo esta depois segregada na segunda porção do duodeno, juntamente com o suco pancreático. Circulação Enterohepática: os fármacos absorvidos pelo trato gastrointestinal são levados até ao fígado pela veia porta, e aqui são conjugados para se tornarem mais lipossolúveis e eliminados nas fezes pela libertação da bílis no duodeno. Contudo, no intestino, os fármacos podem voltar a ser desconjugados pelas bactérias intestinais, sendo novamente reabsorvidos. Assim, este circuito permite prolongar o efeito terapêuticos dos fármacos. Exemplo: os estrogénios das pílulas usadas como terapêutica hormonal de substituição no sexo feminino sofrem a ação das bactérias intestinais, no ciclo enterohepático. A administração concomitante de um antibacteriano, como um antibiótico durante um intervalo de tempo prolongado, pode comprometer a correta funcionalidade da flora intestinal, o que faz com que as bactérias deixem de desconjugar as hormonas, reduzindo a sua duração de ação e aumentando a sua excreção, o que reduz a eficácia da terapêutica. Fármaco Ativo Fármaco Inativo Fármaco Ativo Fármaco Inativo Fármaco Tóxico Fármaco Ativo Pró- Fármaco NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 24 O parâmetro da clearance, ou seja, o volume de plasma do qual é removido o fármaco por unidade de tempo, permite avaliar tanto a metabolização, como a eliminação. A clearance não é constante e varia com a idade, com o sexo, com a etnia, etc. 𝐶𝑙 = 𝑑𝑜𝑠𝑒 𝐴𝑈𝐶 × 𝐹 Parâmetros Farmacocinéticos: Tempo de semivida: corresponde ao tempo necessário para que 50% do fármaco seja eliminado do organismo, para que se atinga metade da Cmáx. Quanto maior for o tempo de semivida, menor é a clearance (a taxa de eliminação), e vice-versa. Na generalidade, o tempo de semivida é semelhante ao tempo de duração de ação, mas existem exceções. 𝑇1 2 = 0,693𝑉𝑑 𝐶𝑙 O estado estacionário atinge-se após 3 a 5 semividas. O tempo para atingir o estado estacionário depende do tempo de semivida do fármaco. Um fármaco pode apresentar mais que um tempo de semivida. As semividas α e β podem ser alteradas por fatores que afetem a distribuição ou pela formação de metabolitos que prologuem a ação. A maioriados fármacos não apresenta um modelo de distribuição e de eliminação monocompartimental, mas sim bicompartimental. O aumento da concentração plasmática de um fármaco, leva ao aumento da atividade enzimática e da atividade dos transportadores, o que, consequentemente, aumenta a clearance do fármaco, segundo um mecanismo de feedback positivo. A este fenómeno designa-se de cinética de 1ª ordem. Os fármacos de cinética saturável tendem a acumular-se. Css: corresponde á concentração em “steady-state”, e esta é diretamente proporcional à biodisponibilidade e à dose e inversamente proporcional ao intervalo entre as duas doses e à clearance. 𝐶𝑠𝑠 = 𝐹 × 𝐷 𝑇 × 𝐶𝑙 Dose de manutenção: dose de rotina; dose que, dada de um modo repetido, originará um valor de Css. Dose de carga (DL): dose administrada em situações de emergência, antes de se atingir o estado estacionário; dose dada uma única vez antes da dose de manutenção. 𝐶𝑖𝑛𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙 = 𝐷𝑙 𝑉𝑑 A farmacocinética está então dependente de três grandes moléculas: as proteínas transportadores, sobretudo para a absorção e para a eliminação, as enzimas, sobretudo para a metabolização, e os recetores transmembranares, nucleares ou citoplasmáticos para o próprio mecanismo de ação dos fármacos. Portanto, polimorfismos nos genes que codifiquem para estas proteínas têm impacto significativo. Nota: A monitorização terapêutica (TDM) só pode ser realizada após se ter atingido o estado estacionário. Nota: A dose de manutenção está altamente dependente da Cl a dose de carga altamente dependente de VD. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 25 Aulas 7 e 8: Farmacodinamia Geral I. Farmacodinamia (PD): corresponde à interação do fármaco com o corpo e inclui a interação do medicamento com as proteínas, o fenómeno de dose/efeito, os efeitos terapêuticos (mecanismo de ação) e os efeitos adversos. No organismo o fármaco interage com recetores, com canais iónicos, com enzimas, com bombas ATPases, com transportadores, etc. Exemplo de fármacos que interagem com canais iónicos: a noradrenalina/norepinefrina atua sobre os seus recetores adrenérgicos, que são recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gs . Após ativadas, estas proteínas vão promover a estimulação da adenilato ciclase (AC), a enzima transmembranar responsável por catalisar a reação que converte o ATP em cAMP. Seguidamente, o cAMP vai fosforilar várias proteínas pertencentes a diferentes vias de sinalização, como a proteína cinase dependente do cAMP, que vai desencadear uma cascata de fosforilação que culmina na ativação de mais proteínas, como a SERCA, que vai promover a libertação do Ca2+ das reservas do reticulo endoplasmático, e canais iónicos que vão promover a entrada do catião nas células. O aumento da concentração de Ca2+ intracelular vai promover a interação entre os filamentos de actina e miosina, o que por sua vez, vai possibilitar a contração do músculo liso. A norepinefrina também pode atuar em recetores metabotrópicos transmembranares acoplados a proteínas Gq. Esta proteína vai promover a ativação da fosfolipase C (PLC) que catalisa a clivagem do PIP2 em IP3 e DAG. O IP3 vai promover a libertação do Ca2+ das reservas e o DAG vai promover a fosforilação de proteínas como a proteína cinase C (PKC), contribuindo também para o aumento da concentração intracelular do catião culminando da mesma forma na contração. Os fármacos que são vasodilatadores, antiarrítmicos, anti- convulsionantes, anestésicos locais, etc., atuam sobre os canais iónicos de Ca2+, inibindo a sua ação. Exemplo de fármacos que interagem com ATPases: o omeprazol é um pró-fármaco (é administrado na forma inativa) inibidor da bomba de protões. Este fármaco, ao chegar à mucosa do estômago atravessa por difusão simples as membranas plasmáticas das células parietais (as células que sintetizam e libertam o HCl e o Fator Intrínseco) e no seu interior é convertido na sua forma ativa, uma sulfonamida. Depois, o omeprazol interage covalentemente com as bombas ATPases H+/K+, impedindo a libertação de H+, aumentando o pH do estômago. Exemplo de fármacos que interagem com enzimas: o ácido araquidónico (AA) é o lípido percursor para a formação dos prostanoides, ou seja, as moléculas envolvidas na resposta inflamatória. Este, após ser obtido pela ação da fosfolipase A2, pode seguir várias vias e ser catalisado por diferentes enzimas. Os AINEs (Anti-Inflamatórios Não Esteroides) inibem as cicloxigenases (COXs), as enzimas que sintetizam as prostaglandinas e as prostaciclinas a partir do ácido araquidónico, limitando, assim, a resposta inflamatória. A ECA (Enzima Conversora da Angiotensina) é uma enzima muito importante na regulação da pressão arterial. Quando o rim deteta uma descida da pressão arterial, promove a libertação de renina por parte das células do aparelho justaglomerular. Seguidamente, a renina converte o angiotensinogénio, existente em circulação e previamente sintetizado pelo fígado, em angiotensina I. A angiotensina I é convertida em angiotensina II pela ACE maioritariamente nos capilares pulmonares. A angiotensina II vai ter várias ações: é Exceção: Os anti-ácidos fazem a neutralização química do pH, não interagindo com outras proteínas. Existem fármacos, como o ergosterol, que interagem com os lípidos membranares. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 26 uma molécula vasoconstritora e para além disso promove a libertação de aldosterona a partir do córtex da glândula suprarrenal. Por sua vez, a aldosterona vai promover a retenção de água e sódio a nível renal. Os fármacos inibidores da ACE (IECA) são assim utilizados como anti-hipertensores. Exemplos de fármacos que interagem com transportadores: o dipiridamol é um fármaco utilizado como antiagregante plaquetário, e este inibe o transportador da adenosina, uma molécula vasoconstritora, que promove a ativação e agregação das plaquetas. Nos terminais nervosos, os neurotransmissores, após serem libertados na fenda sináptica, são degradados pelas enzimas, atuam nos seus recetores pós sinápticos ou são recaptados de novo para o interior dos neurónios e das células da glia, como os astrócitos. A cocaína inibe o transportador NET (norepinefrine transporter), a proteína que faz o uptake da norepinefrina de novo para os terminais nervosos, sendo esta co-transportada com o Na+. Ao ser inibida a recaptação, o neurotransmissor fica mais tempo na fenda, hiperestimulando o neurónio pós-sináptico. O VMAT (Vesicular Monoamine Transporter) é o transportador responsável por introduzir todo o tipo de monoaminas (adrenalina, noradrenalina, dopamina, serotonina) no interior das vesículas sinápticas. A reserpina inibe o VMAT, impedindo a recuperação das monoaminas, ficando as vesículas vazias. Este fármaco era utilizado como antihipertensor. Recetores: Os recetores são proteínas (macromoléculas) que interagem com moléculas endógenas ou exógenas, ligando-se a estas de forma reversível e com determinada afinidade, sendo responsáveis por desencadear um determinado tipo de resposta celular. Estes são regulados pelo sistema neuroendócrino. Afinidade: corresponde à habilidade que uma dada substância tem para se ligar ao seu recetor. A afinidade é geralmente superior para as moléculas endógenas, do que para as moléculas exógenas. 𝐴𝑓𝑖𝑛𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 = 𝐾1 𝐾 − 1 A afinidade é medida em Kd, sendo o Kd o inverso da afinidade. O Kd diz-nos a quantidade de substância que necessitamos para produzir uma resposta. A afinidade é tanto maior, quanto menor for o valorde Kd, e depende tanto da concentração de ligando como da concentração de recetores. Atividade Intrínseca: corresponde à habilidade que uma substância tem de provocar uma resposta celular ao ligar-se ao seu recetor, ou seja, a sua capacidade de desencadear um determinado efeito. Agonismo vs Antagonismo: Agonista: é uma substância que se liga ao recetor e provoca uma resposta celular para ter um determinado efeito fisiológico (gera sempre uma resposta). Antagonista: é uma substância que se liga ao seu recetor e não induz uma resposta, não apresenta atividade intrínseca. Nota: K1 representa a constante de associação do fármaco ao seu recetor. K-1 representa a constante de dissociação do fármaco do seu recetor. Aviso: uma substância pode ter afinidade e não ter atividade intrínseca. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 27 Tanto os agonistas como os antagonistas apresentam afinidade para o seu recetor, competindo pelo local de ligação, mas apenas os agonistas apresentam atividade intrínseca. Relação Dose/Efeito: A partir do gráfico dose/resposta podem obter-se diferentes parâmetros. No eixo do x estão representadas as diferentes concentrações/doses, ao passo que no eixo dos y estão os vários efeitos obtidos. A partir deste gráfico podemos obter o efeito máximo, isto é, a resposta máxima obtida quando os recetores estão saturados; e a EC50, isto é, a concentração de fármaco necessária para que se produza 50% do efeito máximo possível. Eficácia: é a resposta máxima alcançável pela ação da substância endógena ou do fármaco e por isso está diretamente relacionada com o efeito máximo. Potência: corresponde à dose de fármaco necessária para que se obtenha um efeito específico e, por isso, está inversamente relacionada com a EC50. Ou seja, quanto maior a potência, menor é a EC50, porque é necessária uma menor dose para obter o mesmo efeito. O conceito de afinidade está diretamente relacionado com a potência, porque quanto maior é a potência, menor é a EC50, menor é o Kd e maior é a afinidade . Tipos de Antagonismo e Agonismo: Existem vários tipos de antagonistas e estes podem ser divididos em dois grandes grupos, os antagonistas de recetores e os antagonistas que não atuam diretamente nos mesmos recetores. Os antagonistas que atuam em recetores podem ligar-se ao sítio ativo ou a um sítio alostérico. Os que se ligam ao sítio ativo de forma reversível dizem-se de antagonistas competitivos, ao passo que os que se ligam de Exemplo: O fármaco A é mais potente que o fármaco B, porque o seu EC50 é menor, mas têm igual eficácia, porque o seu efeito máximo é o mesmo. O fármaco B é menos potente que o fármaco C, porque o seu EC50 é maior, mas é mais eficaz, porque o seu efeito máximo é maior. O fármaco A tem a mesma potência que o fármaco C, porque os seus EC50 são iguais, mas é mais eficaz, porque o seu efeito máximo é maior. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 28 forma irreversível se dizem de antagonistas não competitivos. Os que se ligam ao local alostérico, também se podem de ligar de forma reversível e irreversível, mas são sempre não competitivos. Quanto aos antagonistas que não se ligam diretamente aos recetores existem dois tipos, os antagonistas químicos e os fisiológicos. Antagonismo Competitivo: os antagonistas competem pelo local de ligação do agonista e, assim, no gráfico dose/resposta, a curva desloca-se para direita. Portanto, pode concluir-se que os antagonistas competitivos diminuem a potência do agonista , passa a ser preciso uma maior quantidade de agonista para se obter o mesmo efeito. Mantém-se a eficácia, o efeito máximo, mas aumenta o EC50. Antagonismo Não Competitivo: os antagonistas ligam-se a um local alostérico, alterando a conformação do recetor, reduzindo a quantidade de recetores funcionais. Assim, este tipo de antagonismo faz com que o efeito máximo, ou seja, a eficácia diminua, mas não altera a potência, isto é, o EC50. IC50: corresponde à quantidade de antagonis ta necessário para que se reduza a resposta máxima do agonista a 50%. Agonista Parcial: os agonistas parciais são moléculas que se ligam ao mesmo local que o agonista total; têm normalmente maior afinidade que o agonista total para o recetor; e têm atividade intrínseca, contudo produzem uma resposta inferior à resposta máxima que o agonista total produz. Exemplo: a nicotina é um agonista total dos seus recetores, produzindo o efeito máximo. A vareniclina é um medicamento utilizado para a sessação tabágica. Esta atua nos recetores colinérgicos α4β2, mas como é um agonista parcial dos recetores não produz o efeito máximo igual ao da nicotina, diminuindo a dependência e ao mesmo tempo diminui os sintomas da síndrome de abstinência, porque ao produzir algum efeito mimetiza parcialmente a ação da nicotina no organismo. Os agonistas parciais têm um perfil agonista/antagonista porque em termos terapêuticos podem atuar tanto como agonistas como antagonistas, dependendo da concentração de ligando endógeno presente. Por exemplo, se existisse grande quantidade de acetilcolina (Ach), a vareniclina ia competir com a Ach para o local de ligação, diminuindo o seu efeito. Agonistas Inversos: estes quando se ligam ao seu recetor produzem o efeito totalmente oposto ao do agonista total. Estes são considerados agonistas, porque apresentam atividade intrínseca , apesar de esta ser negativa, pois estes diminuem a atividade do recetor, ao passo que os antagonistas, por não apresentarem atividade intrínseca, não alteram a atividade do recetor. Estes apenas atuam em recetores com atividade constitutiva, com atividade basal no nosso organismo. Os agonistas inversos quando se ligam ao seu recetor diminuem a quantidade de A reter: Os antagonistas competitivos diminuem a potência do agonista fisiológico. Os antagonistas não competitivos diminuem a eficácia dos agonistas fisiológicos. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 29 recetores no estado ativo. Por exemplo, o propanolol é um agonista inverso dos recetores β, diminuindo a atividade da AC, e, portanto, a quantidade de cAMP intracelular. Antagonistas Fisiológicos: um antagonista fisiológico é um agonista total que atua noutro recetor, provocando uma resposta celular biológica que anula a resposta induzida pela ação de outro agonista noutro recetor. Exemplo: os leucotrienos e a histamina ao atuarem nos seus recetores provocam broncoconstrição, contrariamente o salbutamol (usado no tratamento da asma) que ao atuar nos recetores β adrenérgicos, provoca broncodilatação. O mesmo acontece entre a prostaciclina (PGI2) e o tromboxano A2 (TXA2): a primeira é um mediador vasodilatador e que inibe a agregação plaquetária, ao passo que o segundo mediador é vasoconstritor e promove a agregação plaquetária. Recetores Spare: os recetores são considerados Spare sempre que a resposta máxima é obtida pela ação do agonista numa concentração em que não ocorre a ocupação total dos recetores disponíveis. Este mecanismo está na base no aumento da sensibilidade do sistema . Pensa-se que isto aconteça por existir um maior número de recetores do que de ligandos, ou porque os recetores continuam temporariamente ativos mesmo após o ligando se desligar do seu local de ligação. Classificação dos Recetores: Existem 5 grandes tipos de recetores: os recetores acoplados a proteínas G, os canais iónicos operados por ligandos, os recetores com atividade enzimática oucatalítica, os recetores que modelam a libertação de cálcio (estão localizados na mitocôndria e no retículo endoplasmático) e os recetores intracelulares que regulam a transcrição genética. Os recetores, na sua generalidade, podem ser separados em dois grupos: os recetores ionotrópicos e os recetores metabotrópicos. Os recetores ionotrópicos são canais iónicos operados por ligando que medeiam uma resposta celular localizada, rápida e de curta duração . Por outro lado, os recetores metabotrópicos são macromoléculas transmembranares acopladas a proteínas G que medeiam uma resposta mais lenta, mais longa e menos localizada ; estes atuam através de segundos mensageiros, podendo ativar canais iónicos. Os recetores metabotrópicos permitem uma amplificação da resposta. A maioria dos canais iónicos são pentaméricos, isto é, são formados por 5 subunidades inseridas nas membranas que formam um poro no seu interior para a passagem de iões. A maioria dos recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G são formados por 7 hélices transmembranares, com o domínio extracelular para a interação com o ligando e um domínio intracelular que participa na ativação da cascata de sinalização. Exemplos de recetores: Recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G: recetores muscarínicos (de M1 e a M5) da Ach; recetores mGluR (do 1 ao 7) do glutamato; recetores GABAb do neurotransmissor GABA; recetores 5-HT Nota: Ordem crescente no tempo de atuação dos diversos recetores: 1º - Canais iónicos operados por ligando (milissegundos); 2º - Recetores acoplados a proteínas G (segundos); 3º - Recetores com atividade enzimática (minutos); 4º - Recetores intracelulares (horas). Nota: O GABA e o glutamato são os principais neurotransmissores do SNC, sendo o primeiro inibitório e o segundo estimulador. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 30 da serotonina (1,2, 4 e 5); recetores D (do 1 ao 5) da dopamina; os recetores α e β da noradrenalina; os recetores A2A e A2B da adenosina; os recetores do ATP; etc. Canais iónicos operados por ligando: canais GABAa do GABA; canais iónicos do glutamato; canais nicotínicos da Ach; etc. Recetores com atividade enzimática/catalítica : recetores da insulina; recetores dos fatores de crescimento (VEGF, EGF); etc. Recetores intracelulares: recetores das hormonas esteroides; recetores dos corticoides; etc. Recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G: As proteínas G são formadas por três subunidades, uma α, uma β e uma ᵞ, estando as duas últimas ligadas entre si. Todas as subunidades estão ancoradas na membrana, sendo que a α está ligada ao recetor. O agonista liga-se ao recetor no seu domínio extracelular. A ligação desencadeia uma alteração da conformação no recetor, que culmina na ativação do domínio intracelular com consequente ativação a subunidade α da proteína. A subunidade α apresenta atividade GTPase intrínseca, e quando ativada troca o GDP por GTP, dissociando-se das subunidades β e ᵞ. A subunidade α ativa vai ativar outras proteínas, como enzimas e canais iónicos, promovendo a atividade de vias de sinalização. Existem vários tipos de proteínas G. As proteínas Gs, quanto ativadas, ativam a AC, aumentando o cAMP intracelular. As proteínas Gi, quanto ativadas, inibem a AC, diminuindo a quantidade de cAMP. As proteínas Gq, quando ativadas, ativam a PC. Recetores Intracelulares: estes recetores podem ser citosólicos ou nucleares. Estes encontram-se normalmente associados a proteínas chaperonas que mantêm a sua localização intracitoplasmática. Sobre este tipo de recetores só atuam moléculas que sejam lipossolúveis e que se consigam difundir através da membrana plasmática para alcançarem o seu local de ligação no recetor. Este tipo de recetores regula a transcrição génica, modelando a atividade celular, sendo por isso de ação mais lenta. Canais Iónicos Operados Por Ligando: estes podem ser catiónicos ou aniónicos. Os catiónicos deixam-se atravessar por iões positivos como o Na+, o Ca2+, o K+ e o H+ e por isso são responsáveis pela despolarização das células, ou seja, pelo aumento do potencial de membrana das células excitáveis (ex.: glutamato e serotonina). Os aniónicos deixam-se atravessar por iões negativos como Cl- e por isso são responsáveis pela hiperpolarização das células, isto é, pela diminuição do valor de potencial de membrana (ex.: GABA e glicina). NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 31 Recetores Com Atividade Catalítica : estes recetores são transmembranares e atuam após formarem dímeros, aquando a ligação de duas moléculas de ligando. Estes podem ser do tipo tirosina cinase, tirosina fosfatase e serina/treonina cinase. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 32 Aulas 9 e 10: Farmacodinamia Geral II. Regulação da atividade dos recetores – fenómenos de sensibilização: Os recetores estão sujeitos a alterações estruturais e funcionais, com o objetivo de se estabelecer um equilíbrio entre a sua estimulação e a resposta (resposta adaptativa). Os recetores podem diminuir a sua atividade através da dessensibilização ou da refratoriedade. Os recetores podem aumentar a sua atividade pela supersensitização e pela hiperreatividade. Dessenssibilização: esta pode ser homóloga quando ocorre apenas num recetor, ou heteróloga quando ocorre em mais do que um recetor. Através deste processo o recetor perde a habilidade de responder ao estímulo, mesmo na presença do agonista, sendo este fenómeno mediado por processos de fosforilação, reversível e rápido. Acontece na presença e exposição temporária a grandes quantidades de ligando. Este processo ocorre maioritariamente em canais iónicos, mas também pode ocorrer em recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G através da sua fosforilação e da sua reciclagem em endossomas (ex.: ocorre nos recetores β- adrenérgicos, e este mecanismo está na base da tolerância desenvolvida aos broncodilatadores). Inativação: por este processo os recetores perdem a habilidade de responder aos estímulos. Ocorre sobretudo nos canais iónicos, mudando a sua conformação de aberto para fechado. Refratoriedade: quando os recetores adquirem o estado refratário, após a estimulação, precisam de um período para que possam ser estimulados novamente. Down-regulation: corresponde à diminuição do número de recetores na membrana. Este fenómeno é também designado de hiporreatividade, decorre da exposição crónica ao agonista e é um processo lento, a longo prazo. Este fenómeno é mediado pela destruição dos recetores nos lisossomas após estes serem endocitados. Up-regulation: corresponde ao aumento do número de recetores na membrana. Este processo decorre da exposição crónica ao antagonista ou pela ausência crónica de estimulação pelo agonista. (ex.: up regulation dos recetores de adenosina na presença de grandes quantidades de cafeína.) Concluindo: Se estimularmos muito a célula ela diminui o número de recetores para uma dada substância. Se a inibirmos muito ela aumenta a quantidade de recetores para assegurar a sua função. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 33 Segurança dos fármacos: Especificidade e seletividade são conceitos distintos. A maioria dos fármacos não são específicos porque conseguem atuar em diferentes tiposde recetores. Por exemplo, os antidepressivos tricíclicos atuam sobre o SERT e sobre o NERT, inibindo a recaptação da serotonina e da norepinefrina, respetivamente, mas também atuam sobre os recetores α-adrenérgicos, sobre os canais de Na+ e Ca2+ dependentes de voltagem, etc. Contudo, a maioria dos fármacos é seletivo numa dada gama de concentrações, tendo maior afinidade para um tipo de recetor, nesse intervalo de dosagem. Janela Terapêutica : corresponde ao intervalo compreendido entre a concentração eficaz mínima e a concentração tóxica mínima ou segura máxima. Corresponde a um intervalo de concentrações plasmáticas aceitável no qual os resultados terapêuticos são positivos. Quanto maior for a janela terapêutica de um fármaco, mais seguro este é. Por exemplo, a teofilina, um broncodilatador, apresenta uma janela terapêutica muito reduzida e por isso é um fármaco para o qual está aconselhada a realização de monitorização terapêutica. A curva dose/resposta obtém-se através de frequências cumulativas. ED50: corresponde à dose eficaz mínima em 50% da população, é a dose necessária para produzir 50% do efeito terapêutico. (EC50 é determinado em estudos in vitro). TD50: corresponde à dose do fármaco que é tóxica para 50% da população. Se aumentarmos a dose de um fármaco, não aumentamos a sua duração de ação porque o seu tempo de semivida é exatamente o mesmo. Índice Terapêutico: é um indicador da segurança do fármaco e obtém-se a partir do quociente entre a TD50 e a ED50. Alguns fármacos têm índices terapêuticos pequenos, como os antineoplásicos, contudo continuam a ser comercializados e utilizados devido ao seu elevado rácio benefécio/risco. 𝐼𝑛𝑑𝑖𝑐𝑒 𝑇𝑒𝑟𝑎𝑝ê𝑢𝑡𝑖𝑐𝑜 = 𝑇𝐷50 𝐸𝐷50 Margem de Segurança: define a razão entre a concentração do fármaco que é letal em 1% da população e a dose que é eficaz terapeuticamente em 99% da população. 𝑀𝑎𝑟𝑔𝑒𝑚 𝑑𝑒 𝑆𝑒𝑔𝑢𝑟𝑎𝑛ç𝑎 = ( 𝑇𝐷1 𝐸𝐷99 − 1) × 100 A segurança dos medicamentos durante o seu desenvolvimento: A talidomida foi um fármaco colocado no mercado para o tratamento dos enjoos matinais nas grávidas e era também utilizado como sedativo e hipnótico. Contudo, após alguns anos , este foi retirado do mercado, Exemplo: se o índice terapêutico for igual a 2,62 quer dizer que basta aumentar a dose para pouco mais que o dobro para que o fármaco seja tóxico para 50% da população. Assim, o índice terapêutico deve ser o maior possível para que o fármaco seja mais seguro. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 34 pois descobriu-se que provocava malformações, como focomielia, nos fetos. A talidomida inativa o gene que codifica para a proteína Cereblon (CRBN) importante nos primeiros meses de vida para a formação dos membros e para o desenvolvimento cerebral, ou seja, é um fármaco com importantes efeitos teratogénicos. A segurança dos medicamentos é avaliada antes dos estudos clínicos, durante os ensaios clínicos e após a sua introdução no mercado através da farmacovigilância . Objetivos dos estudos não clínicos: caracterizar o perfil farmacocinético; caracterizar os efeitos farmacodinâmicos benéficos; caracterizar os potenciais efeitos adversos do fármaco, ou seja, definir a dose inicial segura. A toxicidade reprodutiva é o único estudo que pode ser realizado após já ter sido efetuado o pedido de AIM e já terem sido realizados os estudos não clínicos. Nos humanos fazem-se estudos de doses tóxicas e não de doses letais. Conceitos relacionados com a variabilidade da resposta aos fármacos: Tolerância: corresponde à hiporreatividade como consequência da exposição prévia ao fármaco; corresponde à redução do efeito da substância por administração repetida, conduzindo à necessidade de aumentar progressivamente a dose para produzir um efeito sobreponível ao efeito inicial. No fundo, a tolerância é a perda de eficácia . Taquifilaxia: corresponde à tolerância adquirida muito rapidamente após a exposição curta ao fármaco. Imunidade: corresponde à tolerância adquirida como consequência da formação de autoanticorpos. Dependência: apetência ou compulsão para tomar, regular ou periodicamente, um fármaco com o propósito de sentir os seus efeitos psíquicos e físicos, ou para evitar o sofrimento decorrente da suspensão desta administração (síndrome de abstinência ou de privação). Tem vindo a substituir o termo habituação. A variabilidade depende de alterações na concentração do fármaco que alcança o recetor, ou seja, de variações na farmacocinética; de variações na concentração endógena do mediador; na alteração do número e função dos recetores (fenómenos de sensibilização); por características do doente, como fatores genéticos. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 35 Aulas 11 e 12: Fármacos Que São Proteínas: Propriedades Farmacodinâmicas E Farmacocinéticas. Genéricos E Biossimilares. Os fármacos que são proteínas são fármacos relativamente recentes, são obtidos por intermédio de técnicas de DNA recombinante e estes são um dos fármacos mais dispendiosos e, portanto, mais lucrativos para a indústria farmacêutica. Classificação funcional dos fármacos que são proteínas: Os fármacos que são proteínas podem ser divididos, tendo em conta o seu mecanismo de ação, em várias classes/grupos: - Grupo I: neste grupo estão inseridos os fármacos que são proteínas que apresentam uma atividade enzimática ou reguladora . Os do grupo Ia destinam-se a substituir uma proteína que está deficiente ou ausente no organismo. Os do grupo Ib destinam-se a estimular uma via já existente, aumentado a sua atividade. Os do grupo Ic destinam-se a atribuir uma nova funcionalidade ou atividade a uma dada proteína. - Grupo II: neste grupo estão inseridos os fármacos que são proteínas que apresentam alvos terapêuticos muito específicos. Os do grupo IIa interferem diretamente com uma molécula ou organismo. Os do grupo IIb entregam outros compostos ou proteínas aos alvos específicos. Os fármacos deste grupo são usados especificamente no contexto da patologia oncológica. - Grupo III: neste grupo estão inseridos os fármacos que são proteínas que são utilizados como vacinas. Os do grupo IIIa são usados como vacinas para o tratamento de patologias provocadas por agentes estranhos ao organismo. Os do grupo IIIb são usados como vacinas para o tratamento de doenças autoimunes. Os do grupo IIIc são usados como vacinas para o tratamento do cancro. - Grupo IV: neste grupo estão inseridos os fármacos que são usados no diagnóstico. Grupo Ia – Insulina: A insulina é uma proteína utilizada para o tratamento da diabetes e pertence ao grupo Ia. A diabetes é uma doença metabólica que se caracteriza pela existência de hiperglicemia (níveis elevados de glicose no sangue) derivada da ausência de produção de insulina, da ação deficiente da insulina, ou de ambas as situações. A insulina é um polipéptido formado por 51 aminoácidos, constituído por duas cadeias, uma α e uma β, que se ligam entre si por duas pontes de dissulfito (enxofre, SH). Esta é produzida nas células β dos ilhéus de Langherhans do pâncreas sobre a forma de pré-pró-hormona, sendo depois clivada no complexo de Golgi em insulina ativa e em péptido C. A medição dos níveis de péptido C plasmáticos é um bom indicador para avaliar a produção endógena de insulina. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 36 O principal estímulo para a libertação da insulina é o aumento dos níveis de glicose plasmáticas.Sempre que aumenta a glicémia, a glicose entra para o interior das células β pancreáticas por difusão facilitada através dos transportadores membranares GLUT2. No interior das células a glicose é oxidada, seguindo a via da glicólise, com o principal intuito de obtenção de energia por intermédio da participação dos vários substratos no ciclo de Krebs e na fosforilação oxidativa. O aumento dos níveis de ATP intracelulares inativa os canais iónicos de K+ dependentes de ATP. Ao fecharem, estes canais promovem a acumulação do catião no interior da célula com a consequente despolarização da membrana. O aumento do valor de potencial de membrana leva à ativação dos canais de Ca2+ dependentes de voltagem. O influxo do cálcio culmina na fusão das vesículas de insulina com a membrana plasmática e consequente libertação da hormona para a circulação. Sendo a insulina uma proteína, a sua utilização na prática clínica está muito condicionada. Esta não pode ser administrada por via oral, pois é instável no pH acídico gástrico, sofre a ação de protéases gástricas, intestinais e pancreáticas e, para além disso, devido à sua hidrofobicidade, à sua grande dimensão e ao seu elevado peso molecular, esta não consegue atravessar facilmente as membranas, para ser absorvida. Assim, a insulina é administrada sob a forma de injeções subcutâneas, para reduzir o efeito de primeira passagem e otimizar a sua absorção, aumentado a sua biodisponibilidade. Esta via é a via parentérica mais cómoda para o doente, permite a automedicação; contudo tem desvantagens, pois pode provocar aumento de peso, lipodistrofia (anormal distribuição da gordura corporal) local, inflamação, dor, etc. A insulina para ser injetada por via endovenosa tem de ser solúvel. A Exubera concretizou a primeira tentativa de produção de insulina para administração por via inalatória. Porém, este tipo de insulina era administrada através de aparelhos pouco cómodos, pouco práticos, de difícil transporte, de difícil montagem, que tinham de ser lavados após cada utilização. Seguidamente, a Afrezza desenvolveu também insulina para administração por via inalatória e que está atualmente disponível no mercado, mas não ainda em Portugal. A insulina Afrezza é administrada com a ajuda de aparelhos muito mais pequenos, práticos e portáteis. Apesar de eficazes, estes tipos de insulinas são de ação rápida e por isso são aconselhadas apenas para o uso em caso de emergência e não como terapêutica de substituição. São usadas na maioria dos casos em crises de hiperglicemia ou como insulina de administração pré-pandrial. A molécula de insulina tem vindo a ser modificada de modo a tornar a sua farmacocinética mais vantajosa e de modo a aumentar a sua duração de ação e eficácia, tornando-a mais semelhante à molécula endógena. A molécula tem vindo a ser alterada sobretudo na região β26-β30, uma zona que não é critica para a ligação da insulina ao seu recetor. Quanto à sua duração de ação, as insulinas podem ser divididas em dois grupos, as de administração por bolus e as de administração basal. As de administração por bolus são utilizadas em casos de emergência e antes das refeições para controlar a glicémia pós-pandrial, ao passo que as de NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 37 administração basal são utilizadas como terapêutica de substituição, sendo administradas sobretudo no período noturno, o período mais crítico para os diabéticos. As insulinas de administração por bolus podem ser de dois tipos, as de ação rápida e as de ação curta. As de ação rápida são a aspartato, a glusilina e a lipsro, iniciam a sua ação em 10 a 15 minutos, atingindo o seu pico na circulação sanguínea passada 1 hora ou 1 hora e meia, tendo uma duração de ação total de 3 a 5 horas. Estas são também designadas de insulinas ultrarrápidas, sendo apenas administradas por via subcutânea. A de ação curta é a insulina regular, inicia a sua ação em 30 a 45 minutos, atinge o pico na circulação plasmática passadas 2 a 3 horas e tem uma duração de ação total de 6 horas e meia. As insulinas regulares ou humanas são solúveis, são soluções límpidas, e por isso podem ser administradas por via endovenosa ou por bomba de perfusão, sendo ideais para doentes internados, ou com diabetes refratária ou outro tipo de terapêutica. As insulinas de administração basal também podem ser de dois tipos, as de ação intermédia e as de ação lenta. As insulinas de ação intermédia são a NPH e a lente, iniciam a sua ação em 1 a 3 horas, atingem um pico em circulação em 5 a 8 horas e têm uma duração de ação total de 14 e 18 horas. As insulinas intermédias têm associadas a si protaminas, o que faz com que as protéases demorem mais a degradá-las. As insulinas de ação lenta são a detemir, a glargina, a degludec e a ultralente. A detemir e a glargina têm um inicio de ação passadas 1 a 2 horas. A detemir apresenta um pico na circulação após 8 a 10 horas, tendo uma duração de ação total de 12 a 24 horas. As restantes, ou seja, a glargina, a degludec e a ultralente não apresentam um pico em circulação e têm durações de ação muito longas. As insulinas ultralentas têm associadas a si cristais de zinco, e por isso têm longas durações de ação, permanecendo mais tempo no organismo. A insulina glargina é obtida pela substituição do último aminoácido da cadeia β por uma glicina e pela adição de duas argininas. Esta insulina deve ser administrada uma vez ao dia. A insulina glargina é ativada a pH acídico fisiológico (aproximadamente 4), formando um microprecipitado de longa duração de ação. A insulina detemir é obtida pela adição de um ácido gordo na extremidade da cadeia β e pela acilação do ultimo resíduo de lisina. Esta modificação permite que a proteína se ligue mais facilmente à albumina, o que aumenta a sua duração de ação. Esta insulina deve ser administrada duas vezes ao dia. A insulina degludec é obtida pela adição de um ácido gordo com 16 carbonos conjugado com um ácido glucorónico na extremidade da cadeia β. Devido à sua estrutura em multihexámero, esta vai sendo degrada em pequenos monómeros e dímeros ativos, mais facilmente absorvidos, o que lhe confere longa duração de ação, podendo ser administrada apenas três vezes por semana. Nota: As insulinas que não apresentam um pico de concentração plasmática dizem de “pick less” e estas são mais semelhantes à molécula endógena e são aconselhadas para a administração noturna. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 38 Grupo Ia – Fatores de Coagulação: Os fatores de coagulação são proteínas sintetizadas endogenamente no fígado, com exceção do fator de coagulação VIII que é sintetizado pelo endotélio, e que asseguram a correta coagulação sanguínea, contribuindo para a hemóstase secundária, ao terem um papel crucial na cascata de coagulação. Quando estão ausentes ou são deficientes, por exemplo, pela existência de mutações genéticas, podem causar patologias graves, como a hemofilia, uma doença genética que se caracteriza pela deficiente coagulação sanguínea. Os fatores de coagulação, sobretudo o V e o VIII, são utilizados no tratamento da hemofilia A e B e pertencem ao grupo Ia, dos fármacos que são proteínas. Grupo Ib – Eritropoietina e Alteplase: A eritropoietina é uma hormona produzida pelos fibroblastos peritubulares renais perante determinados estímulos, como a hipoxia (diminuição dos níveis de O2 nos tecidos). Esta, através da corrente sanguínea alcança os órgãos hematopoiéticos (medula óssea), promovendo, assim, a eritropoiese. A eritropoietina recombinante é utilizada no tratamento de anemias(diminuição de eritrócitos ou de hemoglobina no sangue) e pertence ao grupo Ib, uma vez que estimula uma via já existente. A alteplase é uma proteína que promove a fibrinólise (processo através do qual o coágulo de fibrina é destruído) e pertence ao grupo Ib. Esta é usada no tratamento do embolismo pulmonar e do enfarte agudo do miocárdio. Grupo Ic – Colagenase: A colagenase pertence ao grupo Ic e é utilizada para o tratamento de regiões dérmicas lesadas, como em úlceras dérmicas, casos de cicatrização deficiente ou em queimaduras graves. Esta enzima promove a degradação e remodelação do colagénio do tecido conjuntivo, não sendo uma proteína produzida endogenamente, mas sim veiculada exogenamente. Grupo IIa – mAbs puros: Os mAbs (anticorpos monoclonais) são usados no tratamento de patologias de carácter crónico, sobretudo no cancro e nas doenças autoimunes, como a artrite reumatoide. Este tipo de fármacos é extremamente dispendioso, mas devido à sua elevada especificidade no alvo terapêutico t êm grande eficácia e um grande rácio beneficio/risco. Para perceber a ação destes fármacos é importante ter em conta vários conceitos. Promoção do crescimento: O EGF (Epidermal Growth Factor) é um fator de crescimento importante para a proliferação celular, uma vez que ao ligar-se aos seus recetores, promove o crescimento celular. Os recetores do EGF estão muitas vezes expressos em grandes quantidades nas membranas celulares dos carcinomas. Importante: Todos os recetores envolvidos no processo de carcinogénese são recetores com atividade enzimática/catalítica. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 39 O TGF-α (Tumoral Growth Factor α) é um fator de crescimento que ao ligar-se aos seus recetores também estimula a proliferação celular. Os recetores ErBb1 e ErBb2 são dois recetores enzimáticos, com atividade catalítica tirosina-cinase que estão sobreexpressos em muitos carcinomas, estando o ErBb1 muito associado ao carcinoma do pulmão e o ErBb2 muito associado ao carcinoma da mama . A angiogénese: A angiogénese é o processo através do qual são formados novos vasos sanguíneos a partir de vasos pré-existentes. Este processo é crucial para a irrigação de tecidos isquémicos, no processo de regeneração e cicatrização de tecidos e também na carcinogénese, uma vez que os tumores precisam de formar novos vasos que assegurem o fornecimento de oxigénio e nutrientes e a remoção de produtos do metabolismo das células tumorais. Para além disso, a angiogénese é um processo fundamental para a metastização (formação de uma nova lesão tumoral a partir de outra, mas à distância, não contínua). O principal estimulo para a angiogénese é a ligação do VEGF (Vascular Endotelium Growth Factor) ao seu recetor. Este fator apresenta várias isoformas, sendo a mais angiogénica a isoforma A. Artrite Reumatoide: A artrite reumatoide é uma doença autoimune de caráter crónico e que se caracteriza por um estado pró-inflamatório, que destrói a matriz óssea e cartilagínea . Esta causa edema, rubor, rigidez e perda de função das articulações, começando por afetar as articulações mais periféricas do corpo. Esta doença é mediada por autoanticorpos e por citocinas inflamatórias, como o TNF-α e a IL-1. O TNF-α é uma citocina pró-inflamatória produzida pelos macrófagos e pelos linfócitos T, tal como as interleucinas 1 e 6. Estas constituem o alvo terapêutico dos mAbs utilizados no tratamento da atrite. Fármacos: Bevacizumab: é um inibidor da angiogénese, um mAb (anticorpo anti-VEGF) que se liga ao VEGFa, impedindo a sua ligação ao seu recetor, inibindo assim a angiogénese. Este tem uma eficácia modesta quando usado em monoterapia, pelo que deve ser associado a outros fármacos, uma vez que impede apenas a formação de novos vasos, mas não impede a divisão celular. Este fármaco é muito utilizado no tratamento do cancro colorretal e do cancro do pulmão. Cetuximab: é um mAb que compete com o EGF pela ligação ao recetor EGFR (ErBb1), inibindo a proliferação celular. Este é muito utilizado para o tratamento do cancro do pulmão e cancro colorretal. Trastuzumab: é um mAb que compete com o EGF pela ligação ao recetor EGFR (ErBb2), inibindo também a proliferação celular. É sobretudo utilizado no tratamento do cancro da mama. Rituximab: é um anticorpo anti CD20, utilizado no tratamento de linfomas Não-Hodjkin. Alemtuzumab: é um anticorpo anti CD52, utilizado no tratamento de leucemias e linfomas. Nota: Estes fármacos ligam-se aos recetores com uma afinidade superior aos ligandos endógenos, para garantir a sua eficácia terapêutica. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 40 Panitumumab: liga-se ao EGFR, impedindo a proliferação celular. É utilizado no tratamento do cancro colorretal com metastização. Infliximab: liga-se e neutraliza o TNF-α. É usado no tratamento de doenças inflamatórias e autoimunes crónicas (última linha para o tratamento, por exemplo, da artrite reumatoide). Etanercept: recetor solúvel para o TNF-α, com maior afinidade para o ligando. Possui dois locais de ligação para o TNF-α, e sendo este um trímero, liga-se com maior afinidade ao Etanercept do que ao recetor endógeno, que só tem um local de ligação. É também utilizado para o tratamento da artrite reumatoide. Anakinra: é um mAb antagonista do recetor da IL-1, utilizado no tratamento de doenças inflamatórias crónicas e sistémicas. Adalimubab: é um mAb que se liga e neutraliza o TNF-α. Abacept: este impede a ativação dos linfócitos T, essenciais na resposta imune adquirida. É um recombinante da Ig-1. (Ig = imunoglobulina) Omalizumab: é um anticorpo que se liga e neutraliza a Ig-E. Este fármaco é utilizado no tratamento da asma alérgica, apenas quando não há resposta à terapêutica convencional de base, uma vez que a Ig-E está na base da resposta anafilática contra alergénios. Tocizumab: é um mAb antagonista do recetor da IL-6. Grupo IIb – mAbs conjugados: Os mAbs deste grupo são designados de conjugados, uma vez que estão associados a outras moléculas (como radioisótopos, agentes radioativos, etc.), limitando-se a entregá-las ao seu alvo terapêutico. Estes funcionam como meios de transporte de outras substâncias. Este tipo de mAbs é muito bem tolerado, por ser pouco reativo, mas as moléculas que transportam podem provocar várias reações adversas. A sua principal aplicação terapêutica é no tratamento dos cancros malignos do tecido hematopoético. Gemtuzumab ozogamicina: anticorpo anti CD33 associado a um agente quimioterapêutico. Utilizado no tratamento de leucemia mieloide aguda . Tositumomab: anticorpo anti CD20 associado a um radioisotopo. Usado para o tratamento de leucemias e linfomas de células B. Estes fármacos puros/isolados (sem nenhuma substância conjugada) são mais seguros e menos reativos, embora não tenham grande efeito terapêutico – “Naked mAbs”. Os mabs são capazes de desencadear uma resposta do sistema imune, ativando o sistema do complemento e por isso o seu benefício deve ser sempre ponderado. Grupo III – Vacinas: Existem vários fármacos que são proteínas que são usados na formulação de vacinas. Uma das vacinas mais relevantes na prática clinica é a vacina contra o vírus do HPV, o vírus responsável por cerca de 60% dos cancros do colo do útero no sexo feminino. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 41 Grupo IV – Diagnóstico: Existem vários fármacos biológicos usados para o diagnóstico de várias doenças, como o DPPD para o diagnóstico da tuberculose, os antigéniosanti-HIV para o diagnóstico de SIDA, os antigénios antivírus da hepatite C para a hepatite C e a pentedina capromab para o diagnóstico do cancro da próstata, etc. Anticorpos Monoclonais – Generalidades: Os anticorpos podem ser de dois tipos, monoclonais ou policlonais. Os anticorpos monoclonais são obtidos a partir, maioritariamente, de rato ou de coelho e são homogéneos, isto é, existe só um tipo molecular. Devido a esta sua característica estes anticorpos são mais bem tolerados e têm um efeito preditivo. Os anticorpos policlonais são obtidos de ovelhas ou coelhos e são diferentes, tendo diferentes fontes de linfócitos. Estes têm um processo de fabrico mais rápido e mais barato. É ainda de salientar que os anticorpos monoclonais têm origem na mesma linhagem celular que os linfócitos T, ao contrário dos anticorpos policlonais. Os mAbs são administrados sobretudo por via endovenosa, e mais raramente por via subcutânea, uma vez que são proteínas, não podendo por isso ser administrados por via entérica. São usados sobretudo no tratamento de doenças de caráter crónico (como cancro, doenças autoimunes, imunossupressão, etc.). Os mabs têm, normalmente, maior afinidade que os ligandos endógenos. Os mAbs podem ter várias origens. Os mAbs murinos (provenientes do rato) têm uma imunogenicidade muito elevada; têm um tempo de semivida muito curto e por isso não podem ser administrados por via oral; têm baixa eficácia terapêutica e têm capacidade de est imular o sistema de complemento humano. Para ultrapassar estas barreiras os mAbs murinos foram modificados quimicamente. Nos mAbs quiméricos a região constante é humana e só as regiões variáveis são murinas. Nos mAbs humanizados só as regiões hipervariáveis são murinas. Existem ainda os mAbs totalmente humanos. A humanização da molécula tem como principal objetivo diminuir a imunogenicidade e, portanto, a resposta do sistema imune. A imunogenicidade corresponde à possibilidade de se poder desenvolver uma reação do foro imunológico, o que pode conduzir ao abandono da terapêutica por parte do paciente. A imperfetividade terapêutica pode traduzir-se na necessidade de um aumento na dose e, consequentemente, num aumento das reações adversas. Por exemplo, a produção de anticorpos neutralizantes está na base da ineficácia terapêutica com necessidade de aumentar a dose . Nomenclatura dos mAbs: o prefixo inicial, que corresponde a uma só silaba, é especifico dos vários mAbs, é o que lhes confere identidade (não existem 2 prefixos iguais). O primeiro infixo refere-se ao alvo, onde o Exemplo: Bevacizumab – é um mAb humanizado, que atua sobre a vasculatura, inibindo a angiogénese. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 42 fármaco vai atuar. O segundo infixo dá-nos a origem do mAb (mo – murino; xi – quimérico; zu – humanizado; hu ou u – humano). O sufixo é sempre igual, mab. Os mabs são bastante seguros (não costumam interagir com outros fármacos), devido à sua elevada especificidade. Contudo podem gerar reações adversas como hipersensibilidade, vasculites, broncoespasmo, dispneia, infeções, trombocitopenia (diminuição dos níveis de plaquetas), anemias hemolíticas, síndrome da lise tumoral, reações de infusão, síndrome de libertação de citocinas (TGN1412). Os Crs são recetores ativados pela ligação aos mAbs específicos que desencadeiam a libertação em massa/exacerbada de citocinas. A “Cytocine Storm” é a síndrome mais grave. No entanto, estes fenómenos não são habituais, são muito raros, ocorrendo num grupo muito restrito de indivíduos. Os mabs são obtidos por técnicas de DNA recombinante em bibliotecas de hibridoma . A sua estabilidade e qualidade (transporte, temperatura, armazenamento, etc.) são altamente controladas, uma vez que a estabilidade é muito importante em qualquer biofármaco. Por estas razões estes fármacos são extremamente dispendiosos. A relação custo/beneficio tem de ser tida em conta, principalmente no âmbito de terapêuticas crónicas, já que é fundamental que o doente adira à terapêutica. Farmacocinética dos Biofármacos: Via de administração: estes fármacos não devem ser administrados por via oral devido ao seu elevado peso molecular, à sua hidrofobicidade, à sua elevada dimensão, à sua instabilidade a pH acídico e à sua afinidade por protéases pancreáticas e intestinais. Também não devem ser administrados por via transdérmica, porque tinham de ser muito lipofílicos para atravessar o estrato córneo da epiderme. Para além disso, existem enzimas proteolíticas na pele capazes de degradar estes fármacos; a sua absorção estaria dependente da integridade e da pilosidade da pele. A via subcutânea é vantajosa para alguns dos fármacos, como a insulina, pois permite a automedicação. Os restantes são administrados sobretudo por via endovenosa, como os mAbs, pois o efeito é obtido mais rapidamente. Estes fármacos podem ainda ser administrados mais invulgarmente por via intramuscular ou inalatória, sendo que a vasopressina é o único péptido administrado por via inalatória . Os biofármacos têm uma biodisponibilidade subcutânea muito variável (entre 24 e 95%), pois podem alcançar logo os capilares regionais quando têm pequenas dimensões (inferior a 1000 Daltons), mas os restantes (com peso molecular superior a 16 kilodaltons) alcançam a circulação sistémica via circulação linfática, daí a vantagem da administração endovenosa. Volume de distribuição, Vd: estes fármacos têm volumes de distribuição muito baixos devido às suas propriedades físico-químicas e aos seus alvos terapêuticos. Adicionalmente, na linfa, ligam-se à α- Notas: A velocidade de absorção do fármaco depende das suas características e das características do doente. A α-macroglobulina é uma proteína de ligação linfática, ao passo que a albumina é uma proteína de ligação plasmática. Se os fármacos estabelecerem ligações de caráter covalente e irreversível com as proteínas de ligação, estes são facilmente eliminados, uma vez que não se conseguem desligar para exercer a sua ação. Contudo, se estes estabelecerem reações de caráter reversível, a sua permanência no organismo é maior, pois são protegidos da degradação enquanto permanecem ligados às moléculas proteicas. Atenção, que são proteínas de ligação plasmáticas e linfáticas e não proteínas tecidulares, porque se fossem tecidulares, o fármaco tenderia a acumular-se no organismo. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 43 macroglobulina, o que aumenta a sua duração de ação, o seu tempo de semivida e o Tmáx, alterando a sua distribuição. O tempo que o fármaco permanece na via linfática torna-o mais sujeito a sofrer degradação por protéases, apesar dos fármacos poderem estabelecer interações reversíveis com proteínas, mas é por esta razão que se justifica a utilização da via endovenosa. Metabolização: estes fármacos são metabolizados sobretudo por proteólise mediada por enzimas, tal como as proteínas endógenas, e menos comumente podem ser degradadas por lisossomas, ou podem sofrer endocitose não especifica ou mediada por recetores. Eliminação: os biofármacos são eliminados maioritariamente por via renal, por filtração glomerular. Contudo, não atravessam facilmente a barreira de filtração devido à sua eletronegatividade, elevada dimensão, interação com proteínas e elevado peso molecular. Quando atravessam são endocitados pelas células tubulares, onde são degradados nos lisossomas em aminoácidos, que posteriormente são eliminados na urina ou de novo reabsorvidos. Os fármacos catiónicos são mais propensos à reabsorçãotubular pelos mecanismos de transporte aí existentes. Por esta razão têm elevados tempos de semivida e durações de ação (até semanas). Alguns podem ser eliminados por via hepática , sendo maioritariamente endocitados por recetores (via saturável e seletiva). Quando esta via está saturada, sofrem pinocitose, uma via não seletiva, não especifica e não saturável. Por exemplo, a insulina é eliminada pela via biliar. Resumindo: Propriedades Pequenas Moléculas Anticorpos Monoclonais (Terapêuticos) Farmacocinética Administração sobretudo oral Administração sobretudo por via parentérica Absorção para a circulação sistémica maioritariamente pelos capilares sanguíneos Absorção para a circulação sistémica maioritariamente por via linfática Distribuição elevada para os vários órgãos e tecidos Distribuição geralmente limitada ao plasma ou ao espaço extracelular Metabolização em metabolitos ativos ou inativos Metabolizados por proteólise em aminoácidos endógenos Eliminação hepática ou renal Eliminação renal semelhante às imunoglobulinas (IgG) Clearance usualmente linear Clearance é usualmente irregular e inconstante (ex.: por endocitose mediada por recetores) Interação com outros fármacos moderada Baixa probabilidade de interação com outros fármacos Tempo de semivida no geral de algumas horas ou dias Longos tempos de semivida na magnitude de várias semanas Não esquecer: A barreira de filtração renal é formada por proteoglicanos carregados negativamente que repelem as cargas negativas e atraem as positivas, e por isso, os catiões (iões positivos) são mais facilmente filtrados que os aniões (iões negativos). NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 44 Genéricos e Biossimilares: Medicamento de Referência: é o medicamento cuja substância ativa foi autorizada e comercializada pela primeira vez no mercado com base em documentação completa, incluindo os resultados de ensaios químicos, biológicos, farmacêuticos, farmacológicos, toxicológicos e clínicos. Medicamento Genérico: medicamento com a mesma composição qualitativa e quantitativa em substâncias ativas, a mesma forma farmacêutica e cuja bioequivalência com o medicamento de referência haja sido demonstrada por estudos de biodisponibilidade e de farmacocinética apropriados. Os medicamentos genéricos, para receberem aprovação, têm de conter a mesma substância ativa que o medicamento de referência (embora os ingredientes ativos possam variar dentro de certos limites); devem ser idênticos na dose, na via de administração e na forma farmacêutica ; de ser bioequivalentes têm de ter a mesma indicação terapêutica . Os medicamentos genéricos são utilizados para as mesmas aplicações clínicas que os medicamentos de referência e por isso são intersubstituíveis, pelo que não necessitam de prescrição médica . Os medicamentos genéricos são aqueles para os quais a patente original já expirou e podem agora ser produzidos por outros métodos e outras entidades que os originais. Os genéricos podem ter pequenas variações na composição dos estridentes e na dose dentro de certos limites. Estes têm de ser mais baratos que os de referência em cerca de 35%. Para que a biodisponibilidade seja aprovada o ratio entre a AUC e a Cmáx a 90% tem de estar entre 0,80 e 1,25. Estes também não têm de ser sujeitos a estudos de eficácia e segurança . Os genéricos não precisam de ser submetidos a estudos não clínicos e a estudos clínicos desde que seja demonstrada a sua bioequivalência com base em estudos de biodisponibilidade – pedido de AIM abreviado. Exclusividade de Dados: período desde a data de aprovação da AIM do medicamento de referênc ia durante o qual não pode ser submetido um pedido de AIM de um medicamento genérico. Dura 8 anos. Exclusividade de Mercado: período desde a data de aprovação da AIM do medicamento de referênc ia durante o qual não pode ser comercializado um medicamento genérico. Dura 10 anos. Dois fármacos são considerados bioequivalentes se estes forem farmaceuticamente equivalentes ou se forem farmaceuticamente alternativos; se as suas biodisponibilidades após a administração da mesma dose molar e os seus efeitos, eficácia e segurança são semelhantes. Medicamentos Biossimilares: os biossimilares são produtos biológicos que apesar de semelhantes ao medicamento de referência podem ter outras aplicações, necessitam de estudos clínicos e não clínicos, necessitam de prescrição médica (não são substituíveis) e não têm um pedido de AIM abreviado como os genéricos. Podem ter variações no principio ativo. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 45 NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 46 Aulas 13 e 14: Farmacologia Geral Da Proliferação Celular. Antineoplásicos. Revisões do Ciclo Celular: O ciclo celular é formado por duas grandes fases, a interfase e a mitose. A interfase está dividida em fase G1, em fase S e em fase G2. Na fase G1 a célula aumenta o seu tamanho e sintetiza enzimas necessárias para a síntese do DNA, estando metabolicamente ativa. Contudo, certas células, saem do ciclo celular e param de se dividir, continuando, contudo, metabolicamente ativas, diz-se que estas células entraram em G0, designando-se de quiescentes. Este período de repouso pode ser temporário ou permanente. Também acontece em células que atingiram a sua diferenciação máxima e não se dividem mais, como os neurónios. Na fase S a célula replica o seu material genético. A fase G2 corresponde ao intervalo de tempo entre a síntese de DNA e a mitose, e durante este período a célula faz a síntese proteica, a síntese de RNA e continua a aumentar o seu tamanho. A mitose ou fase M está dividida em prófase, prometafase, metáfase, anáfase e telófase . Nesta fase o crescimento celular e a síntese proteica para e toda a energia da célula é dirigida para a divisão da célula em duas células filhas iguais de forma equitativa. As células que estão mais sujeitas a desenvolver um processo neoplásico, são as células com grande atividade proliferativa, como as células do epitélio intestinal ou as células sanguíneas , da linhagem hematopoiética. Antineoplásicos: Os antineoplásicos interferem com o ciclo celular, impedindo/limitando a proliferação. Estes podem ser específicos de ciclo, não específicos de ciclo (quando atuam em todas as células, mesmo nas que estão na fase G0), não específicos de fase e específicos de fase (quando atuam inibindo uma fase especifica do ciclo celular). Os não específicos de ciclo são mais eficazes no tratamento dos tumores de grandes dimensões e de crescimento lento, ao contrário dos específicos de ciclo que são mais eficazes para o tratamento de tumores de rápido crescimento, atuando melhor em multi do que em monoterapia (os específicos de ciclo atuam em todas as fases, mas não em G0). Os antineoplásicos podem ainda ser classificados em citotóxicos (agentes alquilantes, antibióticos, taxanos, alcaloides da vinca, antimetabolitos, etc.), análogos hormonais e imunomodeladores (imunoestimulantes e imunossupressores, como as interleucinas e os interferões). Alguns exemplos importantes: Específicos de fase: Fase S – antimetabolitos; Fase G1 – asparaginase; Fase G2 – bleomicina; Fase M – alcaloides da vinca; taxanos; epipodofilotoxinas; epotilonas; Não específicos de fase: - Nitrosureias; agentes alquilantes; antibióticos;sais de platina. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 47 Fármacos bifuncionais: pequenas moléculas que têm duas funcionalidades, como por exemplo, conseguir ligar-se a duas proteínas simultaneamente. Químicos que induzem a dimerização (CID): pequenas moléculas que podem causar especificamente a dimerização de duas moléculas proteicas, como dois recetores. Fármacos híbridos: são fármacos que resultam da fusão covalente de dois ou mais fármacos previamente existentes, de modo a gerar uma molécula única, mas com múltiplas funções e/ou com múltiplos alvos terapêuticos. Estas características são fundamentais, porque é preciso atuar em mais do que um mecanismo celular para destruir as células neoplásicas e são muito mais vantajosos na terapêutica multifármica crónica. Agentes Alquilantes: Os agentes alquilantes foram os primeiros fármacos antineoplásicos a serem utilizados na indústria farmacêutica. Estes são antineoplásicos não específicos de ciclo, que atuam estabelecendo “cross links” entre as bases de guanina do DNA, entre os fosfolípidos membranares e entre proteínas celulares, formando ligações covalentes (onde há partilha de eletrões), impedindo a síntese e a transcrição do material genético. São pró-fármacos que são ativados por remoção de um átomo de cloro (clorina). A sua ativação torna-os eletrofílicos (com afinidade para eletrões) e estes estabelecem ligações com os nucleótidos. Os próprios agentes alquilantes são mutagénicos e cancerígenos, uma vez que provocam modificações da molécula de DNA, podendo estas evoluir para a formação de um tumor, por ausência de reparação dos erros. São fármacos bifuncionais (estabelecem duas ligações) que acabam por causar a apoptose das células. Nota: O alvo terapêutico dos agentes alquilantes é o DNA, através da alquilação, ou seja, através do estabelecimento de “cross link” na mesma cadeia (intracadeia) ou entre cadeias (intercadeia). NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 48 Os possíveis mecanismos de resistência dos agentes alquilantes são a diminuição da permeabilidade das células para o fármaco, o aumento da taxa e eficácia dos mecanismos de reparação do DNA e a competição com outras moléculas para a alquilação da molécula. Ciclofosfamida: esta é um agente alquilante e é administrada por via endovenosa ou por via oral. Como é um agente alquilante é um pró-fármaco que é ativado no fígado pela via microssomal pelo CYP 450 nos seus 2 compostos ativos, a 4-hidroxiciclofosfamida e a aldofosfamida. Depois estes dois metabolitos são entregues tanto às células normais, como às células tumorais, sendo posteriormente a 4- hidroxiciclofosfamida convertida em aldofosfamida. A aldosfosfamida, por uma via não enzimática , é convertida em acroleína e fosforamida, os compostos citotóxicos e capazes de formar os “cross links” com o DNA e com outras proteínas e lípidos celulares. Quando segue a via enzimática é convertida em carboxifosfamida, o composto inativo e facilmente excretado. A ciclofosfamida é usada no tratamento do cancro da mama, do cancro dos ovários, de linfomas não Hodjkin, de leucemia linfocítica crónica, de neuroblastomas, de sarcomas de tecidos moles, no tumor de Wilms (nefroblastoma, tumor do rim frequente em crianças) e nos rabdomiossarcomas. Os seus principais efeitos adversos são as náuseas, os vómitos, a alopecia (perda de cabelo), a depressão da medula óssea, as hemorragias, a diminuição do número de células brancas e vermelhas, a pigmentação da pele e a fibrose pulmonar. Ifosfamida: é em tudo semelhante à ciclofosfamida , tanto no mecanismo de ação, como nas reações adversas, mas é utilizada no tratamento de tumores de células germinais, cancros do colo do útero, do pulmão, sarcomas e linfomas. Compostos de Platina: estes são incluídos nos agentes alquilantes, porque apesar de apresentarem uma estrutura molecular completamente diferente, o seu mecanismo de ação é muito semelhante. A cisplatina é utilizada sobretudo no tratamento de cancro do testículo, podendo também ser usada no tratamento do cancro dos ovários, da bexiga e da cabeça e do pescoço. Os seus principais efeitos adversos são a nefrotoxicidade (toxicidade renal), a ototoxicidade (toxicidade dos sistemas coclear e vestibular do ouvido interno), a neuropatia periférica e as náuseas e os vómitos severos. A carboplatina é um metabolito derivado da cisplatina, mas menos tóxica. Os agentes alquilantes podem ser classificados de diferentes formas. A ciclofosfamida, tal como a ifosfamida e a mecloretamina, pertencem ao grupo das chamadas “nitrogen mustards”. A carmustina e a lomustina pertencem ao grupo das nitrosureias. Agentes ligantes da Tubulina: Na anáfase, a separação dos cromatídeos irmãos de forma equitativa para a formação das duas novas células filhas é garantida pela formação do fuso acromático, durante a prometafase e a metáfase. O fuso acromático é formado pelos microtúbulos, um dos componentes do citoesqueleto celular. Os microtúbulos são cruciais tanto para a polaridade, como para o movimento intracelular. Estes são pequenos tubos constituídos por 13 protofilamentos justapostos, sendo estes últimos constituídos por dímeros de tubulina α e NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 49 β. Ao impedirmos a formação do fuso acromático ou perturbarmos a sua despolimerização afetamos a divisão celular, impedindo assim a proliferação. Os taxanos e os alcaloides da vinca interferem com a formação do fuso mitótico e por isso são fármacos antineoplásicos específicos de ciclo e específicos de fase M. Os alcaloides da vinca , como a vimblastina, a vincrestina e a vinorelbina ligam-se à tubulina, impedindo a formação dos microtúbulos. Adicionalmente, a vimblastina promove ainda a metilação do DNA, promovendo a condensação da cromatina. Os taxanos, como o placitaxel e o docetaxel promovem a polimerização da tubulina , mas impedem a sua despolimerização, travando a fase M. Todos estes fármacos são administrados por via intravenosa, sendo utilizados para o tratamento de diferentes cancros. Os seus efeitos adversos são os vómitos, as náuseas e a depressão da medula óssea. Os taxanos e a vincrestina provocam neurotoxicidade, que se manifesta, por exemplo, por sintomas como a dor neuropática (uma dor com origem no tecido nervoso, intensa e difusa, que não responde à terapêutica analgésica convencional) e hiperalgesia. Inibidores da Topoisomerase: A topoisomerase é uma enzima de extrema importância na replicação e condensação do DNA. Esta é responsável por fazer quebras na molécula de DNA, evitando o superenrolamento. Existem duas principais topoisomerases, a I e a II. A I produz quebras apenas numa cadeia e permite que a cadeia do DNA quebrada gire sobre a cadeia intacta, estabilizando-se assim os superespiralamentos da molécula. A II catalisa quebras nas duas cadeias, evitando a condensação excessiva do material genético. As epipodofilotoxinas são antineoplásicos específicos de fase S, podendo também atuar na fase G2, que inibem a topoisomerase II, conduzindo à apoptose das células, sendo os mais importantes o etoposido, o teniposido e topecano. Estes são administrados por via intravenosa e as suas principais reações adversas são a depressão da medula óssea e a alopecia. L-asparaginase: A L-asparaginase hidrolisa a asparagina , um aminoácido essencial para síntese de DNA das células leucémicas, sendo usada no tratamento de leucemias e linfomas (cancros do tecido hematopoiético).É administrada por via intravenosa ou por via intramuscular e provoca náuseas, vómitos, depressão da medula óssea, úlceras no trato gastrointestinal e pancreatites. Antibióticos: Os antibióticos usados no contexto da patologia oncológica são assim designados porque são obtidos a partir de bactérias ou de fungos. Os antibióticos usados no tratamento do cancro têm diferentes mecanismos de ação, mas, no geral, estes inibem a síntese de DNA e RNA e a síntese proteica, essenciais para o metabolismo celular. A maioria dos antibióticos são muitas vezes apelidados de antraciclinas. Estes são na sua maioria não específicos de ciclo. A bleomicina promove a fragmentação do DNA, inibindo a replicação e a transcrição do DNA, com consequente indução da apoptose da célula neoplásica. A doxorubicina, para além de inibir a síntese de DNA e RNA, inibe ainda a topoisomerase II. Para além da NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 50 bleomicina e da doxorubicina, os antibióticos utilizados no tratamento do cancro são a dactinomicina, a daunorubicina, a procarbazina e a mitomicina C, sendo esta última considerada um agente alquilante . São todos administrados por via intravenosa. A principal e característica reação adversa das antraciclinas é a cardiotoxicidade (tóxicas para o miocárdio). Adicionalmente, a principal reação adversa da mitomicina C e da bleomicina é a fibrose pulmonar. E simultaneamente, estas provocam também náuseas, vómitos, depressão da medula óssea e alopecia. Antimetabolitos: Os antimetabolitos são usados como antineoplásicos e como imunossupressores (utilizados para o tratamento de doenças autoimunes). Os antimetabólicos inibem o metabolismo, impedem a síntese de um metabolito essencial para a proliferação celular, essencial para a síntese de DNA. O metotrexato é um análogo do ácido fólico, que inibe a síntese de tetrahidrofolato (composto ativo, crucial para a transferência de grupos metil), essencial para a síntese das bases de purina e pirimidina, através da inibição da dihidrofolato redutase . É administrado por via endovenosa e as suas principais reações adversas são a nefrotoxicidade tubular e teratogénese (provoca defeitos na embriogénese, como a espinha bífida, a anencefalia e os meningocelos e mielomeningocelos). O mecanismo envolvido na sua resistência poderá ser o facto de este usar o mesmo tipo de transportador para as células que o folato. A mercaptopurina, a azatioprina e a tioguanina são análogos da purina e as suas principais reações adversas são as náuseas, os vómitos, a depressão da medula óssea, a diarreia e as reações alérgicas. A azatioprina é mais utilizada como imunossupressor. O 5-fluorouracilo é o principal análogo das pirimidinas, inibindo a síntese de DNA. Este compete com os metabolitos endógenos pela timidilato sintetase . As suas principais reações adversas são o dano do epitélio do trato gastrointestinal e a depressão da medula óssea. Este é administrado como pró-fármaco. A citarabina é um análogo da citosina também utilizada como antimetabolito. Os análogos das purinas e das pirimidinas são administrados por via oral. Análogos Hormonais: Os análogos dos estrogénios e da progesterona são utilizados sobretudo para o tratamento de tumores da próstata dependentes da ação hormonal dos androgénios. Os análogos da GnRH (Gonodotropin-releasing hormone), como o acetato de goserelina, são usados para o tratamento de cancros da mama , nas mulheres, e da próstata, nos homens. Os seus efeitos adversos são a hipersudorese, a impotência, a infertilidade, a ginecomastia, as alterações do humor e as anormalidades menstruais. O tamoxifeno inibe seletivamente a ação dos estrogénios sobre o tecido mamário e mimetiza a ação dos estrogénios sobre o osso e sobre o tecido uterino, ao atuar sobre os recetores dos estrogénios, Algumas particularidades: A dactinomicina é usada para o tratamento de cancros do tecido muscular. A doxorubicina é metabolizada pelo sistema CYP450 e pode condicionar o aparecimento de uma urina de cor avermelhada. A mitomicina C e a bleomicina também degradam o DNA através da formação de radicais livres. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 51 sendo muito utilizado para o tratamento de carcinomas da mama hormonossensíveis (dependentes da ação hormonal). Simultaneamente, o tamoxifeno afeta a expressão de oncogenes e promove a apoptose celular. Este tem várias reações adversas, como as cefaleias, as tonturas, as alterações do humor, a depressão, a diminuição da acuidade visual, as náuseas, os vómitos, a hipercalcemia, as irregularidades menstruais, etc. O tamoxifeno aumenta o risco de carcinoma do colo do útero e dos ovários, apesar de diminuir o risco de carcinoma da mama e de osteoporose. Mecanismos de Resistência dos Fármacos Antineoplásicos: Os principais mecanismos de resistência destes fármacos são o aumento da expressão de transportadores de efluxo, como a glicoproteína P (transportador de efluxo do tipo ABC), a ocorrência de mutações nos genes supressores de tumor e oncogenes, como no p53 (ocorre em cerca de 50% dos tumores) e defeitos nos genes e proteínas envolvidas nos mecanismos de reparação do DNA, como o mismatch repair e a reparação homóloga. Estes mecanismos aumentam a quantidade de erros na replicação e consequentemente a displasia e proliferação celular. O grande problema da terapêutica antineoplásica são os mecanismos de resistência desenvolvi dos. Para que a terapêutica tenha eficácia esta deve ser seguida à risca, sem interrupções, desde inicio. A terapêutica antineoplásica é uma terapêutica multifármica. Os ciclos devem ser realizados com algum intervalo, de 3 em 3 semanas, para que haja tempo para a recuperação dos tecidos normais e de grande atividade proliferativa, como o epitélio do trato gastrointestinal e o tecido hematopoiético. Uma das várias consequências da quimioterapia é a redução do número de leucócitos circulantes, faz que com haja uma maior suscetibilidade a infeções, uma vez que os glóbulos brancos desempenham um papel ativo na resposta imunitária no nosso organismo. Para resolver este problema, após cada ciclo, são administrados fatores de crescimento leucocitário, para prevenir o aparecimento de infeções bacterianas ou septicémias. Outro fator importante a ter em conta é que se a pessoa adoecer entre os ciclos de quimioterapia e tiver inclusive que ficar hospitalizada, a eficácia terapêutica pode ficar comprometida pela interrupção do tratamento anticancerinogéneo. A reter: Antraciclinas (antibióticos) – cardiotoxicidade. Compostos de Platina e metotrexato – nefrotoxicidade. Taxanos (agentes ligantes da tubulina) – neurotoxicidade. A toxicidade aumenta com o aumento da dose. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 52 Aulas 15 e 16: Farmacologia Geral do Transporte Iónico. Anestésicos Locais. Generalidades: Existem vários tipos de transporte celular, sendo um dos mais importantes o transporte iónico através de canais proteicos. Os canais iónicos podem ser de vários tipos, podem ser canais operados por ligandos (a sua conformação muda de fechado para aberto após a ligação do ligando ao domínio extracelular do poro proteico), podem ser dependentes de voltagem (d.d.v.) (quando a sua conformação se altera consoante as alterações do potencial de membrana), ou podem ser mecanossensiveis (quando a alteração da conformação é dependente de estímulos mecânicos). Para além disso, os canais iónicostambém podem ser classificados em catiónicos ou aniónicos, sendo que os primeiros dão passagem a iões positivos, como o Na+, o Ca2+, o K+ e o H+, e os segundos dão passagem a iões negativos, como o Cl-. Canais Iónicos Dependentes de Voltagem: Os canais d.d.v. são sensíveis a variações do valor de Vm e alteram a sua conformação consoante o estado de despolarização da célula. Assim, fármacos que atuem nestes canais vão modelar a intensidade e a frequência dos potenciais de ação. Os canais iónicos d.d.v. têm 3 estados, o de repouso, o de ativação e o de inativação. Para serem ativados estão dependentes de alterações de Vm nas células excitáveis, estando abertos durante intervalos de tempo muito pequenos. O mecanismo de cadeia bola é o mecanismo que inativa (fecha) o canal, impedindo o influxo de iões e é ele que determina o período refratário do canal, o intervalo que medeia entre o estado de inativação e o estado de repouso, o período em que o canal não pode voltar a ser ativado. Todos os canais d.d.v. são formados por 4 subunidades α. Cada subunidade α é formada por 4 domínios transmembranares (I, II, III e IV), inseridos na membrana celular, e por sua vez, cada domínio é formada por 6 subunidades de S1 a S6 (alguns canais de K+ são uma exceção à regra). O domínio S4 é o domínio sensível à voltagem (é este que deteta as variações de Vm, permitindo que o canal abra ou feche). As subunidades S5 e S6 formam o poro do canal . Isto acontece para os canais d.d.v. de Ca2+, Na+ e alguns de K+. Outros canais de K+ podem ser formados por 2, 4 ou 6 domínios transmembranares. Os canais de K+ com domínios transmembranares Kir estão envolvidos na modelação do potencial de ação cardíaco, sendo responsáveis pelas fases de repolarização e de hiperpolarização. Alguns antiarrítmicos atuam nestes canais de K+, pertencendo estes à classe 3, como a dofetilida e a Nota: A amiodarona é um antiarrítmico que pertence à classe III. Esta apresenta iodo na sua fórmula química e por essa mesma razão uma das suas principais reações adversas é o híper ou o hipotiroidismo, consequente a alterações da produção de hormonas tiroideias. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 53 amiodarona. Os canais de K+ d.d.v. têm subunidades auxiliares que modelam a resposta celular. Existem 5 subtipos de canais de Ca2+d.d.v., os L, os T, os N, os R, e os P/O. Os canais do tipo L estão envolvidos na libertação de neurotransmissores (NT). Os canais do tipo L e T participam nos potenciais de ação cardíacos. Estes canais de Ca2+ são formados também por 4 subunidades α, mais precisamente α1. Para além destas subunidades α1, estes canais têm subunidades β e α2/σ auxiliares. São as características da subunidade α1 que conferem as diferentes propriedades aos vários canais de Ca2+. Estes canais são alvos terapêuticos de vários fármacos usados para o tratamento de hipertensão, anginas de peito, dor e arritmias. A gabapentina e piperidina (análogos do GABA, um NT inibitório no SNC) são utilizadas para bloquear os canais de Ca2+ ao atuarem sobre a subunidade α2 e por isso são usados no tratamento da dor, pois impedem a libertação do glutamato (NT excitatório no SNC) na sinapse medular da via ascendente da dor, impedindo que a informação álgica chegue aos níveis superiores . Na hipertensão ocorre, por vezes, vasoconstrição excessiva das arteríolas, com consequente aumento da resistência periférica total e, portanto, da pressão arterial. Os inibidores dos canais de Ca2+ provocam vasodilatação ao impedirem o influxo de cálcio para o interior das células, diminuindo a resistência vascular e consequentemente a pressão arterial. Os antagonistas dos canais de Ca2+ diminuem também a frequênc ia cardíaca e a contratilidade e por isso são usados no tratamento da angina. Os inibidores dos canais de Ca2+ podem ser usados no tratamento de arritmias, por diminuírem a velocidade de condução, pertencendo à classe IV. Existem 9 subtipos de canais de Na+ d.d.v. (de v.1.1 a v.1.9.). Estes canais dividem-se em dois grandes subgrupos de acordo com a sua sensibilidade à tetrodoxina . Os canais v.1.5., v.1.8. e v.1.9. não são sensíveis à neurotoxina (afinidade inferior a 30 nanomolares), ao passo que os restantes são. Estes canais estão presentes predominantemente no SNC e no músculo esquelético. Mutações nos genes que codificam para estes canais (canalopatias) podem conduzir à manifestação de várias patologias, como a dor neuropática. Todos os canais de Na+ d.d.v. têm um local de ligação para os anestésicos locais no domínio intracelular S6 e por esta mesma razão os anestésicos locais devem ser muito lipossolúveis para conseguirem atravessar as membranas e ligar-se ao canal. Os resíduos de isoleucina, fenilalanina e tirosina são essenciais para a ligação do anestésico ao domínio S6. Anestésicos Locais: Os anestésicos locais fazem a inibição reversível da condução nervosa , quando aplicados localmente (ação tópica), ao ligarem-se a canais de Na+ d.d.v., bloqueando a geração e a propagação de potenciais de ação, e por isso atuam sobre células excitáveis, ou seja, células musculares cardíacas, neurónios e células musculares lisas. Concluindo, os anestésicos locais atuam sobre a condução nervosa e não sobre a transmissão sináptica . História: a cocaína foi o primeiro anestésico local a ser desenvolvido, no entanto apresentava elevados níveis de toxicidade, tinha muitas reações adversas, não podia ser esterilizado e causava dependência. Foi Nota: A tetrodoxina é uma neurotoxina que bloqueia os canais de Na+ d.d.v. através de um mecanismo diferente. Esta liga-se ao poro do canal, bloqueando totalmente a passagem dos iões e não altera a conformação do canal de aberto para fechado como a grande maioria dos outros fármacos. A reter: Os anestésicos locais devem ser lipossolúveis para se conseguirem ligar ao seu local de ligação no domínio intracelular dos canais iónicos. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 54 depois descoberta a procaína, um metabolito que resultava da degradação da cocaína, e que é um anestésico local muito mais potente. A lidocaína é atualmente um dos anestésicos locais mais usados. Os anestésicos locais podem ser divididos em dois grandes grupos, as amidas e os ésteres, sendo que ambos possuem na sua estrutura um anel benzénico, o que lhes confere a sua elevada lipossolubilidade . Os anestésicos locais são tanto mais potentes, quanto mais lipofílicos forem e para isso o anel aromático na estrutura é crucial. Nomenclatura: todos os anestésicos locais terminam em “-caína”, contudo, as amidas distinguem-se dos ésteres, porque antes do sufixo a palavra apresenta um “i”, o que não acontece nos ésteres. Ésteres e amidas: os ésteres são desvantajosos, porque são mais tóxicos, apresentem mais reações adversas, apresentam margens de segurança estreitas (janela terapêutica pouco ampla), a maioria não pode ser esterilizada (exceto a procaína), são metabolizados por colinesterases dando origem ao metabolito PABA, envolvido nas reações de hipersensibilidade (exceto a cocaína) e são menos potentes. Contudo, as amidas e a cocaína são metabolizadas pelo sistema CYP450, o que aumenta a possibilidade de reações de interações medicamentosas, uma vez que o sistema do citocromo é responsável pela metabolização de cerca de 50% dos fármacos existentes. Para além disso, estas são extensamente eliminadas, apresentado menor tempo de duração de ação (maior depuração). Características: os anestésicos locais não são específicos, nem seletivos para os váriossubtipos de canais de Na+, estes ligam-se a todos os tipos de canais de sódio. Estes ligam-se geralmente a todo o tipo de fibras nervosas e por essa mesma razão têm reações adversas medicamentosas como a toxicidade cardíaca e o bloqueio motor (a toxicidade está sempre relacionada com a dose). A lidocaína é um dos anestésicos que bloqueia os vários tipos de fibras mais ou menos nas mesmas proporções (igual afinidade para as fibras motoras e as fibras sensitivas). A bupivacaína inibe preferencialmente as fibras nociceptivas, em vez das fibras motoras e por isso é muito utilizada na epidural na altura do parto, por não bloquear em grande proporção as fibras motoras. Os anestésicos locais são muito mais seletivos e têm muito mais afinidade, para se ligar aos seus canais, quando a célula já está despolarizada, ou seja, ligam-se melhor aos canais que estão ativos/abertos. A ligação dos anestésicos aos canais, para além de depender da voltagem, depende também do intervalo de tempo, isto é, se os intervalos de tempo entre os potenciais de ação forem grandes (meno r frequência) a inibição é tónica , se os intervalos forem pequenos (maior frequência) o grau de inibição aumenta a cada impulso, a inibição é fásica. No fundo, os anestésicos locais aumentam o período refratário dos canais iónicos. Os anestésicos locais, por não serem específicos, podem atuar nos canais de Ca2+ e K+ sem grande significado clinico. Contudo, em certas doses podem atuar ao nível da medula espinhal , promovendo a libertação de neuropéptidos, como a substância P, a bradicinina e o glutamato (aminoácido excitatório, principal neurotransmissor excitatório no SNC), diminuindo o limiar da dor (hiperalgesia), o que tem implicações na anestesia espinhal. Aviso: As formas levogiricas são menos tóxicas. A reter: Os anestésicos locais ligam- se com maior afinidade aos canais que se encontram na conformação ativa e por isso às células que já iniciaram a sua despolarização. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 55 Via de administração e afinidade pelas fibras nervosas: a maioria destes fármacos é administrado via intramuscular ou via subcutânea. Os anestésicos locais ao alcançarem as fibras nervosas têm, de atravessar o epinêurio, o perineurio (mais difícil de atravessar) e o endoneurio. Para além destes fatores, os diferentes anestésicos locais têm diferentes afinidades para diferentes fibras. Por exemplo, a lidocaína tem mais afinidade para as fibras C, de condução mais lenta, uma vez que este tipo de fibras nociceptivas é desprovido de mielina e tem um menor diâmetro. O fármaco ideal: o anestésico local para que seja um fármaco ideal precisa de provocar inibição sensitiva especifica, total, local e reversível ; precisa de ter um reduzido tempo de latência ; precisa de ser solúvel e estável à esterilização; precisa de ter uma margem de segurança elevada e precisa de ser ativado localmente (não pode necessitar de biotransformação). Lipossolubilidade: a potência e a concentração intracelular de um anestésico local estão sempre diretamente relacionadas com a sua lipossolubilidade , pois estes têm de atravessar a membrana para se ligarem ao domínio S6 intracelular do canal. Contudo, não podem ser demasiado lipossolúveis, senão acumulam-se na membrana plasmática ao interagirem com os fosfolípidos membranares. Simultaneamente, a velocidade com que atravessam a membrana está dependente também da lipossolubilidade, determinando o inicio de ação (período de latência). Concluindo, a lipossolubilidade determina a potência e o inicio da ação . Ligação às proteínas: este tipo de fármacos liga-se com facilidade a proteínas plasmáticas, como a albumina e a glicoproteína α, o que contribui para a sua maior duração de ação. Grau de ionização: os anestésicos locais são aminas com caráter básico, pouco solúveis e estáveis em solução aquosa. O anestésico local precisa de estar na sua forma neutra para atravessar a membrana , mas depois para se ligar com maior facilidade ao seu local de ação precisa de ser protonado, entrando os protões, H+, pelo poro do canal. O equilíbrio entre a forma ionizada e a forma não ionizada está dependente do pH do meio. Quanto menor o pH, maior o número de protões no meio e consequentemente maior é a forma ionizada o que é vantajoso para a ligação da droga ao canal, mas pode ser desvantajoso para que esta atravesse a membrana (queremos mais forma ionizada no espaço intracelular e mais forma neutra no espaço extracelular). Quanto mais próximo o pKa estiver do pH extracelular, mais rápido é o inicio de ação do fármaco. (O pKa deve ser semelhante ao ph fisiológico.) A forma desprotonada, neutra, é a forma que é capaz de difundir através das membranas do nervo e bloquear os canais de sódio, permitindo um inicio de ação mais rápido. Notas: Existe uma relação direta entre a lipossolubilidade e a ligação às proteínas plasmáticas e entre a ligação às proteínas plasmáticas e a duração de ação. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 56 Propriedades Vasodilatadoras: todos os anestésicos locais são vasodilatadores, exceto a cocaína. Quanto maior for o grau de vasodilatação que estes provoquem, maior é a sua absorção e menor é a sua duração de ação, pois estes difundem - se rapidamente. Este fator pode aumentar a sua toxicidade. Para ultrapassar esta propriedade estes fármacos são administrados concomitantemente com vasoconstritores, como a epinefrina/adrenalina, para aumentar o efeito local. A epinefrina por ser um potente vasoconstritor não deve ser utilizada em doentes com insuficiência cardíaca congestiva, hipertensão não controlada, arritmias cardíacas, angina de peito instável, AVC, enfarte agudo do miocárdio e hipertiroidismo; não deve ser utilizado em locais pouco vascularizados, pois a oclusão dos vasos pode levar a posterior isquemia e necrose dos tecidos (ex.: extremidades). Taquifilaxia: é o nome dado ao fenómeno de rápida diminuição do efeito de um fármaco em doses consecutivas, à perda rápida de eficácia. Uma das formas de diminuir a probabilidade de ocorrência de taquifilaxia com o uso dos anestésicos locais, é administrar soluções de bicarbonato. Por exemplo, em zonas inflamadas, o pH do meio está mais baixo, mais ácido, aproximando-se do pKa dos fármacos, a forma ionizada do fármaco no compartimento extracelular aumenta e o fármaco deixa de atravessar as membranas. A administração do bicarbonato permite alcalinizar o meio, aumentando o pH – efeito “buffer”. A taquifilaxia pode ser revertida após a paragem do tratamento durante um curto intervalo de tempo. Efeitos farmacológicos: os anestésicos locais são utilizados na inibição da dor, na inibição das fibras nervosas sensitivas, simpáticas e motoras, na inibição do tecido nervoso central, na inibição do tecido do miocárdio e na inibição do músculo esquelético e cardíaco. Os anestésicos locais são usados nas anestesias, nas infiltrações, nos bloqueios, como antiarrítmicos e no tratamento da dor. Toxicidade: quanto maior a distribuição destes fármacos, maior a sua toxicidade. A toxicidade local manifesta-se sobretudo por lesão nervosa traumática ou por irritação local. Regionalmente, como consequência do bloqueio de grandes troncos, pode ocorrer hipotensão, por vasodilatação periférica. A toxicidade sistémica manifesta-se por sintomas e sinais como a inconsciência, bradicardia, hipotensão, assistolia, depressão respiratória, diminuição da contratilidade e morte. Os sintomas prodrómicos são as parestesias da língua, a dormência peribucal, asalterações visuais e auditivas e o sabor metálico. A bupivacaina expressa a sua toxicidade cardíaca através da alteração dos componentes da cadeia transportadora de eletrões da fosforilação oxidativa da mitocôndria. É cardiotóxica, por ativação da cardiolipina, atuando sobre a mitocôndria, alterando os componentes da cadeia transportadora de eletrões, da fosforilação oxidativa, inibindo a síntese de ATP. Os tecidos mais afetados são os que necessitam de mais oxigénio, por terem uma maior atividade metabólica, ou seja, os que possuem menos tolerância à hipoxia, como o miocárdio. Simultaneamente, a bupivacaina bloqueia os canais de Na+ dos miócitos cardíacos durante a sístole, mas é muito lenta a dissociar-se durante a diástole, o que promove arritmias de reentrada. Vantagens da associação de vasoconstritores aos anestésicos locais: - Diminuir a distribuição sistémica; - Diminuir o tempo de indução; - Aumentar a potência; - Aumentar a duração de ação; - Diminuir as reações adversas; - Diminuir as hemorragias. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 57 Aulas 17 e 18: Farmacologia Da Transmissão Gabaérgica E Glutamatérgica. Ansiolíticos E Antiepiléticos. Neurotransmissores: Generalidades: os principais neurotransmissores excitatórios do SNC são o glutamato e a acetilcolina (Ach), ao passo que os principais neurotransmissores inibitórios são o GABA e a glicina. No processo de neurotransmissão participam ainda péptidos que atuam como modeladores, como é o caso da serotonina (5-HT) (responsável pela regulação do apetite e do humor), da dopamina (envolvida na regulação do movimento e nas vias da adição e da dependência do SNC), da norepinefrina, da histamina, etc. Tanto o glutamato como o GABA são cruciais para a nossa sobrevivência. Metabolismo: os neurónios glutamatérgicos diferem dos neurónios gabaérgicos pelo seu metabolismo, isto é, pela presença ou ausência da expressão de certas enzimas. Em ambos os neurónios o piruvato é obtido pela oxidação da glicose (glicólise), ou em casos de défice de energia através do lactato, pela ação da lactato desidrogenase (LDH). Seguidamente, o piruvato é transformado em Acetil-CoA, pelo complexo piruvato desidrogenase (PDH), sendo que o Acetil-CoA participa depois no ciclo de Krebs ou ciclo dos ácidos tricarboxílicos (TCA) para a obtenção de α-cetoglutarato (α-KG). O α-KG é convert ido em glutamato, um aminoácido essencial, pela a ação de transaminases. Nos neurónios glutamatérgicos, o neurotransmissor é inserido em vesiculas sinápticas, para que seja, posteriormente, libertado na fenda sináptica, aquando do aumento de cálcio intracelular. Nos neurónios gabaérgicos, a glutamato descarboxilase (GAD) é responsável por converter o glutamato em GABA, ou seja, o GABA é um produto do metabolismo do glutamato. Depois, o GABA é também inserido em vesiculas para ser libertado na fenda sináptica, para que possa atuar nos seus recetores alvo. Após se localizarem na fenda sináptica, os neurotransmissores podem ter vários destinos, podem atuar nos seus recetores localizados no neurónio pós-sináptico, podem ser degradados pelas enzimas responsáveis pelo seu catabolismo ou podem ser recaptados de novo para o interior dos neurónios pré- sinápticos ou para células da glia, como os astrócitos, por transportadores específicos. Os astrócitos são elementos celulares cruciais para esta via metabólica, já que asseguram a reciclagem de uma quantidade importante de neurotransmissores. O glutamato, depois de ser captado para os astrócitos, é convertido em glutamina, pela glutamina sintetase (GS). A glutamina, NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 58 por ser muito lipossolúvel, difunde-se rápida e facilmente pelas membranas plasmáticas, entrando nos neurónios glutamatérgicos e gabaérgicos, onde é convertida novamente em glutamato, pela glutaminase fosfato ativada (PAG). O GABA quando é captado para o interior dos astrócitos, participa como substrato do ciclo de Krebs, dando origem ao α-KG, que depois é convertido em glutamato, pela transaminase do GABA e por aminotransferases, para que possa ser transformado em glutamina, para se difundir para as células nervosas vizinhas. O nosso organismo não expressa a enzima glutamato sintetase , esta é exclusiva de seres mais simples, como as plantas. Nós sintetizamos o glutamato a partir do α -KG, pela ação de aminotransferases. Se inibirmos a transmissão glutamatérgica no nosso organismo, expressam-se vários sintomas, como consequência da falta de estimulação: depressão respiratória, alterações da pressão arterial (hipotensão), sedação, ataxia (falta de equilíbrio e de coordenação dos movimentos), disforia (mudança repentina e transitória do estado de ânimo); paranoia (padrão de desconfiança e suspeita constantes ); catatonia (rigidez postural arreativa, contratura sistémica com origem neuronal); alucinações e perda de memória. As reações adversas dos fármacos que inibem a ação do glutamato são muito graves e por isso existem poucos fármacos deste tipo e a sua utilização é muito limitada. Por outro lado, também pode ocorrer a hiperexcitabilidade glutamatérgica , resultante do excesso de libertação do neurotransmissor na fenda ou pela sua permanência durante intervalos de tempo superiores ao normal na fenda sináptica ou por défice do seu catabolismo. Pensa-se que esta seja a base de vários distúrbios como a epilepsia, a hiperalgesia e doenças neurodegenerativas, como a esclerose lateral amiotrófica (ELA), o Alzheimer e o Parkinson. Alterações como epilepsia, alucinações e convulsões resultam muitas vezes do excesso da atividade excitatória, de um desequilíbrio do glutamato e do GABA. Recetores: o glutamato para além de ser um dos neurotransmissores excitatórios mais importantes no SNC, tem também ações importantes em vários locais do organismo. É o substrato para a formação de GABA; é essencial para a formação do glutatião (molécula antioxidante); participa no ciclo da ureia; é substrato do ciclo de Krebs. O glutamato atua tanto em recetores ionotrópicos (canais iónicos operados por ligando que permitem uma resposta rápida), como em recetores metabotrópicos (associados a proteínas G, com uma ação mais lenta e com um efeito mais modelador do que propriamente desencadeante de ação). Grande parte dos recetores ionotrópicos do glutamato estão no SNC, na membrana dos neurónios. Os restantes metabotrópicos estão espalhados por vários locais do organismo. Por estas razões, a manipulação de recetores metabotrópicos tem menos reações adversas, do que a intervenção direta sobre recetores ionotrópicos do glutamato. Os recetores ionotrópicos do glutamato são canais catiónicos, que respondem ao fluxo de iões positivos. Este tipo de recetores tem uma dada afinidade para o ligando endógeno e para os seus análogos e é de acordo com essa afinidade que estes são classificados. Os canais iónicos operados por ligando do NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 59 glutamato são de três tipos: NMDA, AMPA e KAINATO. Os recetores KAINATO e AMPA permitem o influxo de sódio e os NMDA permitem o influxo tanto de sódio, como de cálcio. Os recetores metabotrópicos do glutamato estão divididos em três grupos e são em número de 8. Os recetores 2, 3, 4, 6, 7 e 8 estão acoplados a proteínas Gi, inibem a adenilato ciclase, diminuindo o cAMP intracelular. Os recetores 1 e 5 estão acoplados a proteína Gq e ativam a fosfolipase C (PC), aumentando o IP3 e o DAG intracelulares.A libertação excessiva de glutamato na fenda sináptica, faz com que este atue sobre os seus recetores, mesmo sobre os “Spare Receptors” (recetores que existem a mais comparativamente com aqueles que são suficientes para produzir o efeito máximo). A hiperestimulação dos vários tipos de recetores conduz a um aumento de cálcio intracelular. O aumento do cálcio no citosol tem vários efeitos, como a perpetuação da libertação dos neurotransmissores por fusão das vesiculas sinápticas, a ativação das proteínas dependentes de cálcio, aumento do stress oxidativo, o aumento dos endoperoxidos, como as prostangladinas envolvidas na resposta inflamatória e o aumento do óxido nítrico (NO), envolvido na vasodilatação. Todos estes efeitos contribuem para a apoptose e necrose . Os GAT são proteínas que realizam transporte facilitado, garantindo o “up take” do GABA, após este ser libertado na fenda sináptica, desempenham um papel preponderante na reciclagem do neurotransmissor. Os diferentes tipos de GAT são específicos de determinadas células. Por exemplo, os GAT4 estão presentes nas membranas celulares dos astrócitos e os GAT1 nos neurónios pré-sinápticos. Enquanto os recetores ionotrópicos do glutamato são canais catiónicos, os recetores de GABA e glicina são aniónicos e respondem ao cloro. O GABA também atua em recetores ionotrópicos e metabotrópicos. Os mais importantes são o GABAa e o GABAb. O GABAa é um canal iónico operado por ligando que permite o influxo de cloro de modo a hiperpolarizar a célula. O GABAb é um recetor metabotrópico associado a proteínas Gi, que inibe a adenilato ciclase, ativa os canais de potássio e inibe os canais de cálcio d.d.v., evitando deste modo a despolarização da célula. Os recetores GABAA (muito bem estudados e caracterizados o que permite a criação de fármacos mais específicos) são recetores pentaméricos, com vários locais de ligação bem caracterizados e cujas Nota: Os recetores NMDA são recetores envolvidos no LTP (“Long Term Potentiation”), ou seja, na manutenção do potencial de ação, fundamental para a aprendizagem e criação de memória. Estes recetores só são ativos, isto é, só mudam a sua conformação do estado fechado para o estado aberto para a passagem de catiões, após o glutamato se ligar, após o Mg2+ se dissociar e quando a célula já se encontra previamente despolarizada pelos recetores AMPA ou KAINATO. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 60 subunidades podem variar de zona para zona, sendo a isoforma mais comum a α1β2ᵞ2. Dependendo das subunidades às quais o fármaco se liga, diferentes vão ser as suas ações. Fármacos: O principal agonista do recetor GABAb é o Baclofeno, um fármaco usado como relaxante muscular central, por potenciar a transmissão gabaérgica. O principal antagonista dos recetores de glicina é a estricnina. Os recetores GABAa são alvos de muitos fármacos como os barbitúricos, os anestésicos gerais, os hipnóticos, o etanol, as benzodiazepinas, o zolpidem, o flumazenil e os esteroides. Benzodiazepinas (BZ): As benzodiazepinas são fármacos que atuam sobre o recetor GABAa. Estas não são agonistas dos canais iónicos, pois não conseguem induzir a sua abertura, mesmo na presença de GABA. As benzodiazepinas são sim modeladoras alostéricas positivas destes canais, mantendo-os abertos durante mais tempo, aumentado a sua frequência de abertura e facilitando a ligação do GABA. As benzodiazepinas ligam-se ao canal entre as subunidades α1 e ᵞ2. Por isso, apenas os recetores que expressam subunidade ᵞ2 têm local de ligação para as benzodiazepinas. A “down regulation” das subunidades α1 e ᵞ2 e a “up regulation” das subunidades raras está na base no desenvolvimento de tolerância (perda de eficácia) destes fármacos. Todas as benzodiazepinas têm vários efeitos no SNC. Têm efeito ansiolítico, sedativo, hipnótico, anestésico, anti-convulsionante e relaxante muscular. Elas distinguem- se umas das outras pela dose mínima terapêutica necessária para provocar um dado efeito, ou seja, pelo seu grau de seletividade, e pela sua duração de ação. Por exemplo, para terem um efeito anestésico as benzodiazepinas têm de ser administradas em grandes doses; as usadas como hipnóticas têm durações de ação curtas. O diazepam é o fármaco de referência das benzodiazepinas, pois é a única benzodiazepina utilizada como relaxante muscular e é a que tem maior duração de ação, porque a sua metabolização hepática dá origem a vários metabolitos ativos. O midazolam e o triazolam são os que têm menor duração de ação, sendo utilizados como indutores da anestesia . O lorazepam é utilizado como hipnótico por ter uma duração de ação muito curta, visto que é um metabolito do diazepam. Notas: As benzodiazepinas têm diferentes durações de ação e diferentes seletividades, e a sua via de administração e a sua dose condicionam a sua ação. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 61 Farmacocinética: as benzodiazepinas são muito lipofílicas, apresentando grandes biodisponibilidades orais (são rapidamente absorvidas), grandes volumes de distribuição e ligando-se em grande extensão às proteínas plasmáticas. Estas são metabolizadas no fígado pelo CYP3A4 e por conjugação com o ácido acético ou com o ácido glucorónico, sendo que, desta metabolização, resultam, normalmente, metabolitos ativos. Por serem muito lipossolúveis, estes fármacos sofrem redistribuição, ou seja, chegam em primeiro lugar ao SNC e só depois são distribuídos pelos restantes locais do organismo. As benzodiazepinas têm uma margem de segurança muito ampla (grande janela terapêutica). A maioria dos fármacos tem uma semivida inferior ou semelhante à sua duração de ação (mesmo após se atingir metade da concentração plasmática máxima do fármaco este continua a exercer a sua ação). Contudo, as benzodiazepinas têm tempos de semividas superiores à sua duração de ação, pois atuam nos recetores GABAa ao nível do SNC e só depois sofrem redistribuição. Simultaneamente, demoram muito tempo a serem eliminadas, pois ao serem metabolizadas vão dando origem a outros metabolitos ativos e como são muito lipossolúveis precisam de sofrer mais reações para se tornarem hidrossolúveis. A principal desvantagem destes fármacos é que causam dependência e tolerância , devendo o seu uso ser evitado. Contudo, têm um inicio de ação muito rápido (tempo de indução curto). Estes fármacos têm como efeito secundário a perda de memória a curto prazo e, portanto, podem ser vantajosas quando usadas como indutoras de anestesia, fazendo com que o doente não se lembre dos momentos iniciais. As β-carbolinas, como o flumazenil, são agonistas inversos dos canais GABAa e usados para tratar a intoxicação por benzodiazepinas. Zolpidem: O zolpidem é um sedativo com inicio de ação rápido, tempo de semivida relativamente curto e duração de ação também curta (5 a 6 horas). É utilizado como indutor de sono e causa dependência física e psíquica, embora seja menor que a causada pelas benzodiazepinas. Tal como as benzodiazepinas, é muito lipossolúvel, apresentando uma grande biodisponibilidade oral e é bem tolerado (muito seguro, com poucas reações adversas). O zolpidem é seletivo para as subunidades α1 dos recetores GABAa, e, por isso, não tem efeito ansiolítico e relaxante muscular e causa menos dependência . O zaleplon é um análogo do zolpidem. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 62 Antiepiléticos: Estes fármacos têm váriosmecanismos de ação e podem ser divididos em 4 grupos, os fármacos que potenciam a atividade gabaérgica , os que diminuem a atividade dos canais de Na+ d.d.v., os que diminuem a atividade dos canais de Ca2+ d.d.v. e os que antagonizam os recetores do glutamato. Felbamato: inibe os canais de NMDA do glutamato; é utilizado no tratamento da epilepsia; não provoca sedação; as suas principais reações adversas são a ataxia, a astenias, as cefaleias, a insónia, a letargia, as tonturas, a diarreia, a anorexia, os vómitos, a anemia e a falência hepática; não deve ser administrado com a carbamazepina, a fenitoina e o valproato. Mecanismo de Ação Fármacos Antagonistas dos Recetores NMDA - Riluzol - Memantina - Amantadina - Felbamato - Topiramato - Cetamina Inibidores dos canais de Ca2+ d.d.v. - Valproato - Zonisamida - Levetiracetam Inibidores dos canais de Na+ d.d.v. (mais antigos) - Carbamazepina - Acetato de Eslicarbazepina - Lamotrigina - Topiramato - Valproato - Fenitoina - Levetiracetam - Zonisamida Fármacos que potenciam a atividade gabaérgica Mecanismo de Ação Fármacos Ligação ao recetor GABAA - Benzodiazepinas - Barbitúricos Inibição da transaminase do GABA - Vigabatrina - Valproato Estimulação da descarboxilase do glutamato (GAD) - Valproato Inibição da recaptação do GABA (GAT) - Tiagabina NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 63 Levetiracetam: liga-se à proteína vesicular S2VA, impedindo a fusão das vesiculas sinápticas com a membrana plasmática, diminuindo, assim, a libertação do neurotransmissor na fenda sináptica. Gabapentina: inibe os canais de Ca2+ d.d.v.; é utilizada como analgésico, anticonvulsionante e na profilaxia da enxaqueca; tem como reações adversas a sonolência, as vertigens, a ataxia e a fadiga; não tem muitas interações medicamentosas por ser semelhante estruturalmente aos aminoácidos endógenos; é pouco eficaz no tratamento da epilepsia. Barbitúricos: tal como as benzodiazepinas não são agonistas, mas sim modeladores alostéricos dos canais GABAa. Facilitam a ligação do GABA, a ligação das benzodiazepinas e aumentam o tempo de abertura dos canais, ao se ligarem ao canal entre as subunidades α e β. Estes têm janelas terapêuticas muito estreitas e por isso têm uma margem de segurança muito reduzida (são bons para o suicídio por intoxicação). Atualmente, são utilizados, dentro de limites muito estreitos nos blocos operatórios como indutores da anestesia geral, com grande risco de causarem depressão cardiorrespiratória . Os barbitúricos são depressores não seletivos e gerais do SNC e atuam segundo vários mecanismos. Reduzem a excitabilidade neuronal por aumento da inibição mediada pelo GABA via recetores GABAa; potenciam o efeito do GABA na condutância ao Cl-; em doses elevadas mimetizam o efeito do GABA na sua ausência; aumentam a probabilidade de ligação do GABA ao recetor; aumentam a probabilidade da ligação das benzodiazepinas ao recetor; prolongam o tempo de abertura (mas não a frequência) dos canais; em concentrações subanestéscias, diminuem a ativação dos recetores AMPA do glutamato e inibem os canais de Na+ d.d.v.; em concentrações muito elevadas reduzem a condutância para o K+. Os barbitúricos são indutores enzimáticos de várias isoformas do citocromo P450, apresentando muitas reações adversas; não têm nenhum agonista inverso, como as benzodiazepinas; causam alta dependência e abuso; são muito pouco seguros; causam hipotensão e depressão respiratória. Exemplos de Barbitúricos: - Tiopental; - Metoexital; - Fentobarbital; - Secobarbital; - Amobarbital; - Fenobarbital. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 64 Acetato de Eslicarbazepina: é utilizado no tratamento da epilepsia e da doença bipolar na fase maníaca; é um inibidor dos canais de Na+ d.d.v., estabilizando a forma inativa do canal, impedindo a sua passagem à forma ativa. Esta, após metabolizada, contrariamente à carbamazepina, não forma metabolitos epóxidos tóxicos. A eslicarbazepina é de patente portuguesa e é um dos antiepiléticos mais recente . A carbamazepina induz a CYP3A4, e, portanto, promove a metabolização das benzodiazepinas, e tem menos vantagens que o acetato de eslicarbazepina, que tem menos potencial para interações farmacológicas. Valproato: inibe os canais de Na+ d.d.v.; inibe os canais de Ca2+ d.d.v. do tipo T; aumenta a atividade da GAD, aumentando a síntese de GABA; inibe a atividade das enzimas que degradam o GABA (transaminases do GABA); é utilizado para o tratamento de convulsões e epilepsia. Lamotrigina: estabiliza o estado inativo dos canais de Na+ d.d.v., reduzindo a excitabilidade membranar, o número de potenciais de ação e a libertação de glutamato; é utilizada no tratamento da epilepsia e da doença bipolar na fase depressiva; é metabolizada pela conjugação com o ácido glucorónico e não utiliza o sistema CYP 450, tendo menor potencial para interações medicamentosas. Zonisamida: inibe os canais de Na+ d.d.v.; inibe os canais de Ca2+ d.d.v.; liga-se alostericamente aos canais GABAa; aumenta a recaptação do GABA; inibe o “up take” do GABA pelo GAT1; é usada no tratamento da epilepsia, das convulsões e da doença bipolar. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 65 Aulas 19 e 20: Farmacologia Geral Do Sistema Nervoso Vegetativo Adrenérgico E Colinérgico. Pequena Revisão: O sistema nervoso autónomo é uma divisão do sistema nervoso periférico, controlada pelo hipotálamo, que influenc ia o funcionamento das glândulas exócrinas, do músculo liso e do músculo cardíaco, independentes da nossa vontade. Este sistema está dividido em simpático e parassimpático. O sistema nervoso simpático é o que medeia as respostas de “figth or flight”, que se destinam a aumentar o substrato energético disponível, enquanto que o sistema nervoso parassimpático é o que medeia as respostas de “rest and digest”, que se destinam a repor as reservas energéticas. Ao contrário do sistema nervoso somático, as divisões do sistema nervoso autónomo são formadas sempre por dois neurónios, um neurónio pré- ganglionar e um neurónio pós- ganglionar. A acetilcolina (Ach) é o neurotransmissor usado nas sinapses entre os neurónios pré e pós-ganglionares de ambas as divisões e entre o neurónio pós-ganglionar e os órgãos alvo do parassimpático. Entre os neurónios pós-ganglionares e os órgãos alvo do simpático os neurotransmissores utilizados são a adrenalina/epinefrina e a noradrenalina/norepinefrina , produzidas pela medula da glândula suprarrenal, com exceção das glândulas sudoríparas, onde é usada a Ach. Outra exceção, é a enervação da medula da glândula suprarrenal por um único neurónio pré-ganglionar simpático e não por dois. Anatomicamente, o sistema nervoso parassimpático está distribuído pela região crânio- sagrada do SNC, os seus neurónios pré-ganglionares são maiores do que os neurónios pós-ganglionares e os gânglios autonómicos estão mais próximos do órgão alvo , ou até mesmo localizados nas suas paredes. O sistema nervoso simpático está distribuído pela região toracolombar do SNC, os neurónios pré-ganglionares são mais pequenos e os gânglios estão distribuídos ao longo da coluna vertebral, formando o troncosimpático. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 66 A Ach e a noradrenalina são os agonistas endógenos colinérgicos e adrenérgicos, respetivamente. A Ach é ainda utilizada para melhorar a memória e é utilizada no tratamento do Alzheimer. Sistema Nervoso Simpático ou Adrenérgico: A noradrenalina é produzida nos neurónios a partir do aminoácido essencial tirosina . Seguidamente, é introduzida, juntamente com os neuromodeladores, nas vesículas sinápticas. Depois, aquando da chegada do potencial de ação ao terminal nervoso, o neurotransmissor e os neuropéptidos são libertados na fenda sináptica. A noradrenalina pode então atuar nos seus recetores pré e pós-sinápticos, pode ser metabolizada por enzimas, como a COMT (15%) e a MAO (80%), ou pode ser recaptada de novo para o neurónio pré-sináptico ou para as células da glia, como os astrócitos, através de transportadores, como o NET. Recetores: Os recetores adrenérgicos, que respondem à noradrenalina, são de vários tipos, os recetores α1 (α1A, α1B, α1D), os α2 (α2A, α2B, α2C) e os β (β1, β2, β3). Os recetores α1 estão localizados na musculatura lisa e nas glândulas. São recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gq, que ativam a enzima fosfolipase C (PC), que vai hidrolisar o PIP2 em IP3 e DAG, aumentando a sua concentração intracelular. O IP3 vai promover a mobilização do cálcio das reservas no reticulo endoplasmático, aumentando a quantidade do catião no espaço intracelular, e o DAG vai promover a fosforilação de proteínas que participam na cascata de sinalização, como a PKC. Estes recetores, quando estimulados, promovem a vasoconstrição, a midríase, a contração muscular, a secreção e a ejaculação. Os recetores α2 estão localizados nos terminais nervosos e na musculatura lisa vascular. São recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gi , que diminuem a atividade da adenilato ciclase (AC), que deixa de hidrolisar o ATP em cAMP, diminuindo a concentração intracelular do 2º mensageiro. Quando estimulados diminuem a libertação de norepinefrina na fenda sináptica, provocam sedação, diminuem a libertação de substância P no corno posterior da medula espinhal, promovem a vasodilatação e diminuem a libertação de insulina pelo pâncreas. Os recetores β1 estão localizados no músculo cardíaco e no aparelho justaglomerular renal. São recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gs, que ativam a adenilato ciclase, que hidrolisa o ATP em cAMP, aumentado a concentração intracelular do 2º mensageiro. Quando estimulados aumentam a força de contração e a frequência cardíaca e aumentam a libertação de renina pelos fibroblastos peritubulares. Os recetores β2 estão localizados na musculatura lisa, nos mastócitos, no fígado e no músculo cardíaco. São recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gs. Quando estimulados promovem o relaxamento da musculatura brônquica, vascular, uterina, intestinal, diminuem a libertação de histamina nos mastócitos, aumentam o influxo de K+ para o interior das células, promovem a acomodação do cristalino para a visão ao longe, aumentam a libertação de insulina pelo pâncreas, diminuem a drenagem do humor aquoso, estimulam a produção de humor aquoso e promovem a glicólise e neoglicogénese no fígado. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 67 Os recetores β3 estão localizados no tecido adiposo. São recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gs, que aumentam a atividade da adenilato ciclase, aumentando a quantidade de cAMP intracelular. Quando estimulados promovem a lipólise . As catecolaminas mais importantes são a noradrenalina, a adrenalina e o isoproterenol . Cada uma tem diferentes afinidades para os recetores adrenérgicos. A noradrenalina liga-se maioritariamente aos recetores α, ao passo que o isoproterenol se liga maioritariamente aos recetores β. A adrenalina liga-se mais ou menos com a mesma afinidade a ambos os recetores. Noradrenalina: é uma catecolamina endógena; é uma agonista não seletiva que atua em todos os recetores adrenérgicos, exceto nos β2. Tem um tempo de semivida muito curto (2 a 3 minutos), pois é rapidamente metabolizada, e por esta mesma razão não pode ser administrada por via oral. É útil no choque cardiogénico e na paragem cardíaca, para aumentar a pressão arterial, sobretudo devido à sua ação sobre os recetores α1. Adrenalina/Epinefrina: é também uma catecolamina endógena, agonista não seletiva de todos os recetores adrenérgicos. Também tem um tempo de semivida muito curto (2 a 5 minutos), sendo administrada parentericamente. É administrada no mal asmático, ao induzir broncodilatação. É utilizada no choque cardiogénico, no choque anafilático, na paragem cardíaca a na anestesia local. Isoprenalina: é uma catecolamina exógena que atua apenas nos recetores adrenérgicos β. Esta também tem um curto tempo de semivida (5 a 7 minutos) e só pode ser administrada por via parentérica. Esta estimula os recetores β1, aumentando a frequência cardíaca e ao atuar nos recetores β2 provoca vasodilatação e broncodilatação. Já não tem lugar na terapêutica da asma brônquica por causa das reações adversas cardíacas. Atualmente, só tem indicação na terapêutica da intoxicação pelos β-bloqueantes. Dopamina: é uma catecolamina endógena, agonista adrenérgico não seletivo que atua diretamente nos recetores dopaminérgicos e nos β1. Tem um tempo de semivida também muito curto (3 a 5 minutos), sendo administrada parentericamente. Esta também é metabolizada pela MAO. A estimulação dos recetores D1 culmina na vasodilatação dos leitos mesentérico e renal, na diminuição da concentração da aldosterona, na reabsorção do edema pulmonar ao aumentar a atividade da bomba Na+/K+ nas células epiteliais alveolares, no aumento da força de contração do diafragma e na diminuição da peristalse NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 68 (ilius paraliticus). A estimulação dos recetores D2 culmina na libertação de noradrenalina, no aumento da diurese e natriurese, no aumento da produção de PGE2 e na diminuição da peristalse. Anfetamina: é um agonista adrenérgico não seletivo, que atua indiretamente pelo aumento da libertação de noradrenalina e de dopamina. Pode ser administrada por via oral, tem um maior tempo de duração de ação. É metabolizada no fígado. Esta é utilizada para suprimir o apetite ao atuar no hipotálamo, para o tratamento da narcolepsia (ataques irresistíveis de sono diurnos) e para o tratamento da síndrome de défice de atenção e hiperatividade. Esta provoca tolerância, dependência física e psíquica, insónia, anorexia, agitação, confusão, ansiedade, paranoia, psicose, irritabilidade e hipertensão. Metilfenidato: é usado para o tratamento da síndrome de défice de atenção e hiperatividade; este inibe a recaptação da dopamina e aumenta a sua atividade. Efedrina: é um agonista adrenérgico não seletivo que atua diretamente sobre os recetores adrenérgicos e indiretamente pelo aumento da libertação de norepinefrina. Esta é semelhante à anfetamina, mas não suprime o apetite e não causa dependência. Agonistas e Antagonistas α2: Enquanto os recetores α1 são sobretudo pós-sinápticos, os recetores α2 são pré-sinápticos, e mediam a hiperpolarização e a inibição da libertação do próprio neurotransmissor, segundo um mecanismo de feedback negativo. Os recetores α2A e α2C encontram-se sobretudo no SNC (em maior concentração no locus ceruleus) e a sua estimulação é responsável pelos efeitos de sedação, hipnose, analgesia e por efeitos simpaticolíticos. Os recetores α2B encontram-sesobretudo na musculatura lisa vascular e a sua estimulação é responsável pela vasodilatação (diminuindo a pressão arterial). A estimulação α2 causa diminuição da atividade da adenilato ciclase, com diminuição do cAMP, e consequente diminuição da libertação de noradrenalina, o que culmina no relaxamento da musculatura lisa e diminuição da secreção glandular. A estimulação α2 causa também um aumento da atividade dos canais K+, a diminuição da libertação de insulina no pâncreas, o aumento da agregação plaquetária, aumento da neoglicogénese no fígado, o aumento da lipólise no tecido adiposo, o aumento da drenagem do humor aquoso no epitélio ciliar (glaucoma), diminuição da peristalse do trato gastrointestinal. Os principais agonistas destes recetores são a clonidina, a tizanidina e a dexmedetomidina . Antigamente, a clonidina era utilizada como descongestionante nasal. Esta é um derivado de imidiazole, mais seletiva para os recetores α2. Esta pode ser administrada por via oral, transdérmica e epidural, sendo utilizada atualmente como anti hipertensor. Nas primeiras doses terapêuticas, promove hipertensão transitória, ao atuar sobre os recetores pós-juncionais α1 (perda de seletividade inicial). É utilizada no tratamento da síndrome de hiperatividade e défice de atenção , diminuindo a libertação de norepinefrina no córtex pré-frontal. A tizanidina é um agonista α2 semelhante à clonidina, mas apresenta algumas diferenças. Tal como a clonidina tem efeitos sedativos, ansiolíticos e analgésicos, mas tem uma menor duração de ação, tendo menos efeitos sobre a frequência cardíaca e sobre a pressão arterial . É utilizada sobretudo como sedativo. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 69 A dexemedetomidina é também um derivado de imidiazole , com ainda maior afinidade para os recetores α2 que a clonidina. Esta liga-se extensamente às proteínas plasmáticas (94%) e é eliminada tanto pelo rim como pelo fígado. É apenas administrada por via intravenosa e é usada sobretudo como sedativo. Em baixas doses pode provocar diminuição da pressão arterial ao atuar nos recetores α2 periféricos. É o fármaco que tem menos impacto sobre o sistema respiratório, não causando a sua depressão. Os antagonistas α2 são a mirtazapina (que também atua nos recetores de serotonina 2 e 3, sendo usada como antidepressivo), a ioimbina e a apraclonidina (tópica para o olho). Agonistas e Antagonistas α1: A estimulação α1 causa no músculo liso vascular vasoconstrição, com aumento da resistência vascular periférica e consequente aumento da pressão arterial; no músculo radial da íris causa a sua contração, com consequente midríase; no músculo liso dos esfíncteres do trato gastrointestinal e no músculo do esfíncter interno da bexiga causa contração e encerramento dos esfíncteres; nas vesículas seminais leva à ejaculação; no fígado causa neoglicogénese e glicogenólise ; no tecido adiposo causa lipólise. A fenilefrina é um agonista seletivo α1, ao passo que a prazosina, a terazosina, a doxazosina e a tamsolusina (α1a) são antagonistas seletivos α1. Fenilefrina: agonista relativamente seletivo α1; não é metabolizada pela MAO nem pela COMT; tem uma duração de ação maior que as catecolaminas endógenas. Esta é utilizada como midriático na fundoscopia, como descongestionante nasal e como vasopressor em casos de hipotensão. Os antagonistas adrenérgicos são utilizados para o tratamento da hipertensão, para o tratamento da hipertrofia benigna da próstata e para o tratamento de doenças vasculares periféricas. As suas principais Notas: - Os recetores adrenérgicos α1 são os determinantes majores do tónus arteriolar, portanto, a hipertensão pode ser tratada através do bloqueio α1. - A vasoconstrição dos vasos da mucosa nasal, causa alivio da congestão, portanto, os agonistas α1 são utilizados para o tratamento do congestionamento nasal. - O uso de antagonistas α1 pode ser aplicado para evitar a retenção urinária, através da indução do relaxamento do esfíncter interno da bexiga – Tamsolusina. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 70 reações adversas são a hipotensão ortostática, a taquicardia, a congestão das mucosas, a inibição da ejaculação e a retenção de água e sódio. Agonistas e Antagonistas β1: A estimulação β1 causa , no coração, um aumento da frequência cardíaca (nó sinusal - efeito cronotrópico positivo), um aumento da contratilidade (miocárdio – efeito ionotrópico positivo), um aumento da velocidade de condução (sistema de condução – efeito dromotrópico positivo); no aparelho justaglomerular do rim, um aumento da libertação de renina , com consequente aumento da pressão arterial; no tecido adiposo, aumento da lipólise . A dobutamina é um agonista seletivo dos recetores β1 usado como hipertensor, ao passo que o atenolol, o esmolol e o metoprolol são antagonistas seletivos destes recetores. Agonistas e Antagonistas β2: A estimulação β2 causa , no músculo liso brônquico, broncodilatação; no músculo liso vascular do músculo esquelético, vasodilatação (efeito mascarado pela ação dos recetores α1); no músculo liso da parede do trato gastrointestinal, diminuição da peristalse; no músculo liso da parede da bexiga, relaxamento; no músculo liso uterino, relaxamento; no fígado, aumento da neoglicogénese e da glicogenólise; no pâncreas, aumento da secreção de insulina; causa ainda aumento do influxo celular de K+; no músculo ciliar, causa um relaxamento do músculo liso para a acomodação da visão ao longe e para diminuir a drenagem do humor aquoso via canal de Schlemm; no epitélio ciliar causa um aumento da produção de humor aquoso. Os agonistas seletivos β2 são o salbutamol, o salmeterol, a terbutalina, o formeterol, a ritodrina, etc. Os agonistas β2 são usados como broncodilatadores, para inibir a libertação de histamina pelos mastócitos, para inibir a exsudação plasmática e para o aumento da atividade ciliar. Os antagonistas β adrenérgicos são usados para o tratamento da angina de peito, do enfarte do miocárdio, de arritmias, da insuficiência cardíaca, da hipertensão, do glaucoma, da ansiedade, através so bloqueio dos efeitos resultantes da estimulação β1. Salbutamol: pode ser administrado por via oral, inalatória ou parentérica. É utilizado clinicamente para o tratamento da asma e da hipercaliemia refratária. Notas: - Apesar da estimulação dos recetores β2 aumentar tanto a neoglicogénese e glicogenólise, como a secreção de insulina pelo pâncreas, a resposta final é o aumento da glicémia, já que o principal objetivo do sistema nervoso simpático é o aumento dos substratos disponíveis, aumentando o metabolismo. - A estimulação dos recetores β2 é útil para o tratamento de hipercaliemias. - O uso de agonistas β2 pode ser útil para evitar o parto prematuro, já que causa o relaxamento da musculatura lisa uterina. - Para o tratamento do glaucoma é útil o uso de antagonistas β2. Antagonistas β adrenérgicos: Não seletivos: - Propanolol - Alprenolol - Nadolol - Pindolol - Timolol - Sotalol β1 Seletivos: - Acebutolol - Atenolol - Practolol - Metoprolol β2 Seletivos: - Butoxamina (usada para induzir o parto) NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 71 Salmeterol e formeterol: têm uma duração de ação superior ao salbutamol, ambos são administrados apenas por via inalatória. O salmeterol é um agonista parcial e por isso tem menos reações adversas e o formeterol tem um início de ação mais rápido.Ritodrina: é usada para a ameaça de parto prematuro, por causar o relaxamento do músculo liso uterino. Agonistas e Antagonistas β3: A estimulação dos recetores β3 causa um aumento da lipólise, no tecido adiposo. Contudo, hoje, sabe-se que estes recetores são expressos noutros tecidos como a bexiga, coração, próstata, trato gastrointestinal, miométrio e SNC. A estimulação destes recetores também tem um efeito antiarrítmico. O único agonista seletivo β3, possivelmente vantajoso desenvolvido, é o YM178 (mirabegron). Sistema Nervoso Parassimpático ou Colinérgico: A acetilcolina (Ach) é o principal neurotransmissor da divisão parassimpática do sistema nervoso autónomo. A Ach é produzida a partir da colina pela ação da enzima acetil CoA. O neurotransmissor é depois introduzido nas vesículas sinápticas pela ação da colina acetil transferase . Após ser libertada na fenda sináptica, a Ach pode atuar nos seus recetores pós-sinápticos ou pode ser metabolizada pela acetilcolinesterase (AchE), em colina e acetato, sendo a colina reciclada ao ser recaptada de novo para o neurónio pré-sináptico. Recetores: A atividade colinérgica ocorre entre os neurónios pré-ganglionares e os neurónios pós-ganglionares do sistema nervoso autónomo, entre os neurónios pós-ganglionares e os órgãos alvos do sistema nervoso parassimpático, nas junções neuromusculares, entre as fibras pós-ganglionares simpáticas e as glândulas sudoríparas e entre as fibras pré-ganglionares simpáticas e a medula da glândula suprarrenal. A Ach pode atuar em recetores muscarínicos ou em recetores nicotínicos. Os recetores nicotínicos são canais iónicos operados por ligando, sobretudo permeáveis ao sódio. Os recetores muscarínicos são de 5 subtipos, são recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G. Os recetores M2 e M4 são recetores acoplados a proteínas Gi, que diminuem a atividade da AC quando estimulados, diminuindo a quantidade de cAMP intracelular. A estimulação dos recetores M2 e M4 leva à hiperpolarização das células, sendo responsável pela inibição cardíaca e pelo antagonismo do relaxamento do músculo liso. Os recetores M1, M3 e M5 são recetores acoplados a proteínas Gq, que estimulam a PC a hidrolisar o PIP2 em IP3 e DAG. A estimulação destes recetores leva à despolarização das células sendo responsável pela contração muscular e pela secreção glandular. O recetor M1 é responsável pela secreção gástrica, o M2 é responsável pela inibição cardíaca e neuronal, o M3 é responsável pela secreção gástrica, pela contração do músculo liso do trato gastrointestinal, pela acomodação ocular e pela vasodilatação. O M4 e o M5 são pouco importantes na prática clinica. Nota: Atuação da Ach sobre os recetores M3 do músculo ciliar da íris provoca miose. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 72 Fármacos: Os efeitos farmacológicos dos agonistas colinérgicos são, no sistema cardiovascular, o efeito cronotrópico negativo, o efeito inotrópico negativo, o efeito dromotrópico negativo e a vasodilatação; no sistema gastrointestinal, o aumento da contração do músculo da parede do trato gastrointestinal (aumento da peristalse), o aumento da secreção ácida e o relaxamento dos esfíncteres; no sistema genitourinário, a contração do músculo destursor da bexiga , o relaxamento do esfíncter interno da uretra e o relaxamento do músculo liso do epidídimo, do canal deferente, da vesícula seminal, da próstata e do miométrio; no SNC, a regulação da função cognitiva (memória e aprendizagem), comportamental, sensorial e motora, importante em patologias como o Alzheimer, o Parkinson, a esquizofrenia e a depressão; no sistema respiratório é responsável pela broncoconstrição e aumento da secreção traqueobrônquica ; no olho leva à contração do músculo ciliar (dificuldade na acuidade visual) e aumenta ainda a secreção salivar, sudorípara e lacrimal. Os efeitos adversos dos agonistas colinérgicos são o aumento da sudorese, as cólicas abdominais, a dificuldade na acomodação visual, o aumento da salivação, os vómitos e as cefaleias. Os agonistas colinérgicos estão contraindicados em casos de asma, de distúrbios péptidos ácidos, de hipotensão, de insuficiência coronária e de hipertiroidismo. Os agonistas colinérgicos são maioritariamente administrados por via oral. Betanecol: utilizado para estimular o músculo liso do trato gastrointestinal e da bexiga, em certos quadros neurológicos e pós-cirúrgicos de atonia. Pilocarpina: utilizada no tratamento do glaucoma e da xerostomia. Cevimelina: utilizada no tratamento da xerostomia (boca seca). Anticolinesterásicos: O Alzheimer é causa mais comum da maioria dos casos de demência a nível mundial. A marca da doença de Alzheimer é a perda de neurónios colinérgicos no parênquima cerebral, envolvidos na função cognitiva. A melhoria da transmissão colinérgica através do uso de anticolinesterásicos (fármacos que inibem a enzima acetilcolinesterase, diminuindo a degradação da Ach, aumentando a sua quantidade na fenda sináptica), melhora o défice cognitivo verificado nos doentes com tal demência. O sistema colinérgico também participa na patogenia de outras doenças neurológicas. Por exemplo, o desequilíbrio entre a quantidade de neurónios colinérgicos e dopaminérgicos está na base da fisiopatologia da esquizofrenia. O antagonismo dos recetores colinérgicos melhora os sintomas depressivos da depressão major. No SNC predominam os recetores nicotínicos da Ach, canais catiónicos pentaméricos, ou seja, formados por 5 subunidades, sendo os mais comuns os α7 e os α4β2. Nota: Existem cogumelos que produzem toxinas agonistas colinérgicas e que podem conduzir à intoxicação facilmente fatal. Como exemplos temos a Amanita Muscaria, o Inocybe, o Clitocybe, o Psilocybe, O Panaeolus e a Amanita Phalloides. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 73 A deposição de placas senis de amiloide Aβ é característica da doença de Alzheimer. Estas placas ligam-se com afinidade aos recetores α7, comprometendo a sua função. A vulnerabilidade seletiva dos neurónios que expressam canais nicotínicos para a toxicidade das placas Aβ conduz à falência da transmissão colinérgica e à disfunção cognitiva. A vareniclina, um agonista parcial dos recetores nicotínicos α4β2, foi o único fármaco com ação sobre os recetores nicotínicos aprovado para a cessação tabágica, mas sem melhorias no tratamento do Alzheimer. A falência da terapêutica nicotínica nos pacientes de Alzheimer pode ser atribuída a diferentes razões: à “down regulation” dos recetores nicotínicos no cérebro dos doentes, à baixa expressão de canais α4β2, à baixa eficácia e potência dos compostos testados, aos efeitos adversos a nível periférico que comprometem a dose e a adesão à terapêutica. Tacrina: tem um tempo de semivida de 3 a 5 horas; é afetada pela ingestão de alimentos; é metabolizada no fígado pelo sistema CYP450 (CYP1A2); é associada à hepatotoxicidade. Donepezil: tem um tempo de semivida de 70 horas; é metabolizado pelo sistema CYP450 no fígado (CYP3A6 e CYP2D6); bem tolerado. Rivastigmina: é um anticolinesterásico de 2ª geração; tem um tempo de semivida de 1 hora e meia; tem um metabolismo particamente independente do sistema hepático CYP450 ; os efeitos adversos gastrointestinais são comuns. Galantamina: tem um mecanismo de ação duplo, porque para além de inibir de forma competitiva a acetilcolinesterase, também faz a modelação alostérica dos recetores nicotínicos pré e pós-sinápticos; melhora os aspetos major do Alzheimer, desde a cognição, à função,ao comportamento; é segura e bem tolerada; tem um efeito neuroprotetor; tem efeitos adversos gastrointestinais, como as náuseas e a perda de peso; está contraindicada em doentes com bloqueio cardíaco; tem poucas interações medicamentosas. Os anticolinesterásicos têm mais usos terapêuticos. A neostigmina é usada para o tratamento da atonia da bexiga , do ílio paralítico e da mistenia gravis (doença de caráter autoimune que ataca as junções neuromusculares, caracterizando-se por fadiga mais intensa no final do dia). O ecotiofato é usado no tratamento do glaucoma. A fiostiagmina é usada para tratar a intoxicação por anticolinérgicos. A neostagmina juntamente com a atropina são usadas para reverter o bloqueio neuromuscular. A intoxicação por anticolinesterásicos pode manifestar-se por fasciculações, fraqueza, paralisia, sintomas colinérgicos exacerbados, confusão, depressão respiratória, convulsões e neuropatias tardias. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 74 Antagonistas muscarínicos colinérgicos: Os principais antagonistas muscarínicos são a atropina, a pirenzepina, a homatropina, a escopolamina o ipratrópio, o tiotrópio, o biperideno, o benzexol, a oxibutinina e a tolterodina. O biperideno e o benzexol são usados no tratamento do tremor e da salivação associadas ao Parkinson. A oxibutinina e a tolterodina são usados no tratamento da incontinência urinária . Os antagonistas colinérgicos são usados para o tratamento de úlceras péptidas, para diminuir a motilidade gastrointestinal, na fundoscopia, na asma e na bronquite, na doença de Parkinson, na cinetose (enjoo do movimento), nas cólicas renais, na intoxicação por organofosforados. Os principais efeitos adversos dos antagonistas colinérgicos são a xerostomia, a taquicardia, a visão turva, a dificuldade na micção, a diminuição da motilidade do trato gastrointestinal. Nicotina: A nicotina influencia a libertação de vários neurotransmissores, como a dopamina (envolvida no prazer, na adição e na supressão do apetite), a norepinefrina (envolvida na excitação e na supressão do apetite), a acetilcolina (envolvida na excitação e no aumento cognitivo), o glutamato (envolvido na memória e na aprendizagem), a serotonina (envolvida na modulação do humor e na supressão do apetite), a endorfina (envolvida na redução da ansiedade e tensão), e o GABA (envolvido na redução da ansiedade e tensão). A nicotina é metabolizada maioritariamente a nível hepático pelas isoformas CYP2A6, CYP2B6 e CYP2E1. A nicotina é excretada maioritariamente pela urina ou pela saliva. A nicotina tem vários efeitos: suprime o sistema imune, ao aumentar os níveis de ACTH e cortisol; aumenta o tónus simpático, provoca disfunção endotelial, acelera o processo de aterosclerose, diminui a produção de PGI2 e promove a vasoconstrição coronária, o que tem tudo impacto no sistema cardiovascular; a nível celular, a nicotina estimula a proliferação celular, inibe a apoptose, estimula a expressão génica e estimula a produção de espécies reativas de oxigénio (ROS), através da diminuição das enzimas superóxido dismutase (SOD), catálase e glutatião redutase. Assim, a nicotina é um carcinogéneo. A nicotina aumenta também a síntese de catecolaminas ao estimular as enzimas tirosina hidroxilase e dopamina-β-hidroxilase. No SNC a nicotina liga-se preferencialmente aos recetores nicotínicos α4β2, na área tegmental ventral, causando um aumento da libertação de dopamina, envolvida nas vias da recompensa, e pensa-se que este seja o mecanismo que explica a dependência. Os principais objetivos da terapêutica farmacológica da cessação tabágica são minimizar os sintomas da síndrome de abstinência e facilitar a abordagem cognitiva e comportamental. Fármacos: Notriptilina é um antidepressivo tricíclico (TCA); Moclobemida restaura a MAO, diminuindo a quantidade de dopamina e, portanto, o prazer; Fluoxetina é um inibidor da recaptação da serotonina; Dopexina. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 75 Amfebutamona/Bupropiona faz a recaptação de dopamina, norepinefrina e serotonina da fenda sináptica. É absorvida rapidamente pelo trato gastrointestinal. Tem um tempo de semivida de cerca de 21 horas. Liga-se em 84% ás proteínas plasmáticas. Tem uma eliminação maiori tariamente renal. É muito segura, com pouco risco de interações medicamentosas e baixo potenc ial para o abuso. É bem tolerada, sendo os seus efeitos adversos mais frequentes as insónias, as cefaleias e a xerostomia. Não deve ser utilizada concomitantemente com anticonvulsivos. Novas propostas - Acomplia: antagonista do recetor canabinoide CB1. Oxsoralen: diminui o metabolismo da nicotina, mantendo o seu nível sérico, diminuindo a compulsão para fumar. Vacina (imunoterapia): produção de anticorpos anti-nicotina, que se ligam a esta, impedindo que esta atravesse a barreira hematoencefálica, evitando a sua distribuição cerebral. A vacina é vantajosa porque é segura, tem elevada especificidade, tem um efeito prolongado, é de baixo custo e tem maior adesão. Vareniclina: é um agonista parcial do recetor α4β2, impedindo a ligação da nicotina e diminuindo a libertação de dopamina . A vareniclina é eliminada em 92% sobre a sua forma inalterada pela urina, não é metabolizada pelo sistema CYP450 (menos potencial para interações medicamentosas). Fármacos colinérgicos e o relaxamento muscular: Os agonistas nicotínicos são usados no tratamento da mistenia gravis (doença autoimune onde há produção de anticorpos contra os próprios recetores colinérgicos). Os antagonistas colinérgicos são usados como bloqueadores na junção neuromuscular. D-tubocurarina é o princípio ativo do curare, esta bloqueia a transmissão nervosa entre o nervo e o músculo. Foi retirada do mercado por promover a libertação de histamina pelos mastócitos quando utilizada em doses terapêuticas. Os relaxantes musculares podem ser despolarizantes ou não despolarizantes. Os despolarizantes mimetizam o efeito da Ach, provocam fasciculações seguidas de paralisia muscular, previnem a repolarização da membrana muscular e têm um início de ação muito rápido. A succinilcolina é o único relaxante muscular despolarizante usado na prática clinica. Os seus efeitos laterais são a bradicardia, a hipercaliemia, o aumento da pressão intracraniana e ocular, reações de hipersensibilidade, dores musculares, hipertermia maligna e rabdomiólise (lise do músculo esquelético). A succinilcolina está contraindicada em doentes com paraplegia, após AVC, após queimaduras, em miotonias e distrofias musculares e em doentes com história familiar de hipertermia maligna. Os relaxantes musculares não despolarizantes competem com Ach pela ligação aos seus recetores na junção neuromuscular. Alguns exemplos são o pancurónio (eliminação renal), o vecurónio (eliminação hepática, mas sem efeitos cardiovasculares), atracúrio e cisatracúrio (curta duração de ação e vantajosos para doentes com insuficiência hepática e renal). NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 76 Aulas 21 e 22: Farmacologia Geral Da Inflamação. Fármacos Anti-inflamatórios Não Esteroides. A Artrite Reumatoide. Inflamação: A inflamação é uma reação de defesa do organismo frente a uma agressão aos tecidos. Esta pode ser classificada em aguda ou crónica. Inflamação Aguda Inflamação Crónica Resposta rápida, despoletada em segundos ou minutos Resposta longa, prolongada no tempo Duração de ação curta, de horas a dias Duração de ação longa, de semanas a anos, podendo ser eterna, com episódiosrecorrentes agudos Caracterizada pela migração e recrutamento de neutrófilos (polimorfonucleares) e macrófagos e ativação dos respetivos leucócitos Caracterizada pela presença de leucócitos mononucleares como os linfócitos, eosinófilos e macrófagos Existem alterações na vasculatura, nomeadamente vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular, o que determina o extravasamento de fluido rico em proteínas para o espaço extracelular, gerando edema, e estase Neste tipo de inflamação o período de resolução coexiste com o período de dano celular. A fibrose, a angiogénese e a perda de função do tecido são típicas Mediadores químicos na inflamação: A histamina é uma amina vasoativa (efeitos diretos na vasculatura), que contribui para a vasodilatação e para o aumento da permeabilidade vascular, ao atuar sobre as células endoteliais, ativando-as. A vasodilatação também contribui para a diminuição da resistência periférica total e consequente diminuição da pressão arterial. É um dos primeiros mediadores a ser libertado durante a resposta inflamatória, atuando nos primeiros passos. Esta é libertada por mastócitos, plaquetas e basófilos e atua em recetores β1 e β2. As prostaglandinas, as prostaciclinas, as lipoxinas, os leucotrienos, as resolvinas, as protetinas, as maresinas e outros são mediadores derivados dos fosfolípidos da membrana celular, produzidos pelas células que participam na resposta inflamatória, maioritariamente leucócitos. As citocinas e o sistema de complemento são o primeiro mecanismo de resposta inata aquando do dano celular, sendo libertados por células endoteliais, pelas plaquetas e pelos leucócitos. As citocinas são pequenos péptidos ou proteínas que são sintetizadas e libertadas por células do sistema imunitário e que têm um papel central na regulação e coordenação da resposta inflamatória. A superfamília das citocinas inclui as interleucinas, os interferões, os fatores de crescimento e as quimoquinas. Atuam localmente através de mecanismos parácrinos ou autócrinos em várias células, nomeadamente, NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 77 nos leucócitos, nas células endoteliais, nos mastócitos, nos fibroblastos, nas células hematopoiéticas e nos osteoclastos, controlando a sua proliferação, diferenciação e ativação. A IL-1 e o TNF-α são as duas citocinas inflamatórias mais importantes no contexto da patologia inflamatória, uma vez que contribuem para a amplificação da resposta inflamatória (o TNF-α ao ligar-se aos seus recetores promove a libertação de mais citocinas inflamatórias e induz a expressão de enzimas, como a COX-2, a enzima responsável pela síntese de eicosanóides). Todos os recetores onde atuam as citocinas, com exceção dos recetores das quimiocinas que são recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G, são recetores com atividade catalítica (enzimáticos), ligados a proteínas cinases que vão ativar cascatas de sinalização, que modelam a transcrição génica. O PAF (“Platelet-Activating Factor”) é um mediador químico importante na resposta inflamatória, que deriva de um ácido gordo insaturado presente nos fosfolípidos membranares, o acetil-PAF. Este é produzido maioritariamente pelas plaquetas. O acetil-PAF é desterificado da membrana pela ação da enzima fosfolipase A2, obtendo-se liso-PAF. Este sofre depois a ação de uma acetil-transferase, dando origem ao PAF na sua forma livre ativa. O PAF atua nos seus recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gq (PAFR) e desempenha várias ações, nomeadamente, vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, ativação e agregação plaquetárias, recrutamento e migração de leucócitos (quimiotaxia), contração do músculo liso (ex.: broncoconstrição), formação de radicais livres de oxigénio, angiogénese, etc. Os eicosanóides derivam também de ácidos gordos dos fosfolípidos das membranas celulares. O ácido araquidónico (AA) (é um ácido gordo derivado do ómega 6, o ácido linoleico) é o percursor lipídico dos eicosanóides, sendo que este não existe fisiologicamente na sua forma livre, existe apenas esterificado nos fosfolípidos membranares. A fosfolipase A2 cliva o AA, desterificando-o das membranas, obtendo-se, assim, a sua forma livre. A fosfolipase A2 é a enzima que catalisa a primeira reação da via de formação dos mediadores químicos, constituindo este o passo limitante da síntese dos eicosanóides. Tanto a fosfolipase A2, como o percursor lipídico encontram-se fisiologicamente inativos. Estes são ativados por fosforilação, sendo que a adição de grupos fosfato está dependente da existência de vários estímulos, como a ativação de um fibroblasto num miofibroblasto, a libertação de bradicinina, a ativação e agregação plaquetárias, uma reação imune antigénio-anticorpo, etc. Após a obtenção de AA na sua forma livre , este pode seguir 4 vias, sendo 3 enzimáticas e 1 não enzimática. Pode seguir a via das cicloxigenases (COXs), uma via enzimática, que depende da expressão das isoformas COX-1 e COX-2. Através desta via obtém-se os prostanoides, ou seja, as prostaglandinas, a prostaciclina e o tromboxano A2 (TxA2). Pode seguir a via das lipoxigenases (LOXs), uma via enzimática, cujos produtos de reação são os leucotrienos e as lipoxinas. Pode seguir a via das epoxigenases microssomais do CYP450, uma via enzimática, que promove a oxigenação do AA, obtendo- se os EETs. (Esta via é importante em tecidos que não expressem COX e LOX, pensa-se que tenha importância na função renal e vascular.) Pode ainda seguir a via não enzimática dos isoprostanos, que são NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 78 potentes vasoconstritores e são capazes de ativar a via do fator de transcrição NF-KB, que potencia a inflamação ao induzir a expressão de citocinas pró-inflamatórias. Os dois isoprostanoides principais potenciadores desta via são o 8-epi-PGF22 e 8-epi-PEE2. Esta última via está envolvida no stress oxidativo. Os eicosanóides têm um tempo de semivida curto, pois são rapidamente metabolizados por reações de β-oxidação e hidroxilação, tornando-se mais hidrossolúveis para que sejam mais facilmente excretados e eliminados. A distribuição dos prostanoides pelo organismo está diretamente depende da expressão das enzimas responsáveis pela sua síntese e pela sua metabolização. Por exemplo, o tromboxano A2 é o principal eicosanóide das plaquetas, pois estas expressam a tromboxano sintetase . A prostaciclina é o principal eicosanóide do endotélio, uma vez que as células endoteliais expressam a prostaciclina sintetase . Portanto, a distribuição dos eicosanóides é difusa. Existem 3 isoformas de prostaglandinas conhecidas, sendo a número 2 (PGE2) a mais abundante e que desempenha um papel fundamental na homeostasia dos tecidos como a mucosa gástrica, importante na regulação da atividade plaquetária e na autorregulação do fluxo renal. Os prostanoides atuam em recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G. O tromboxano A2 atua em recetores TP que são responsáveis pela vasoconstrição e pela ativação plaquetária . A prostaciclina, PGI2, atua em recetores IP, acoplados a proteínas Gs, que aumentam o cAMP intracelular, promovendo, assim, a vasodilatação e a inibição da agregação plaquetária . Ou seja, a PGI2 é um antagonista fisiológico do TxA2. É o balanço destes dois prostanoides que é responsável pela regulação da pressão arterial e na formação de trombos. As prostaglandinas (PGE) atuam em recetores diversos, EP e DP, apresentando também ação variadas. Os agonistas dos recetores FP, bastante expressos na musculatura lisa uterina, são usados como indutores abortivos. O misoprostol é um análogo da PGE2 utilizado como antiulceroso, contudo, em “off label” é utilizado como agente abortivo. O iloprost (epoprostenol) é um agonista dos recetores da PGI2 utilizado como antiagregante plaquetário. O latanoprost é utilizado no tratamento do glaucoma. Os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) interferem com a Importante: O TxA2 e a PGI2 são antagonistas fisiológicos . O TxA2, obtido pela ação da tromboxano sintetase, sobretudo expressa nas plaquetas, promove a agregação plaquetária e a vasoconstrição, ao atuar nos seus recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gq, que ativam a PC, que hidrolisa o PIP2 em DAG e IP3, que por sua vez, fosforilam a PKC e mobilizam o Ca2+ das reservas. A PGI2 é obtida pela ação da prostaciclina sintetase, expressa sobretudo nas células endoteliais, promove a vasodilatação e inibe a agregação plaquetária, ao atuar nos seus recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gs, que ativam a AC que aumenta o cAMP intracelular. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 79 via das cicloxigenases, atuando diretamente sobre as COXs. Via das lipoxigenases: o substrato das lipoxigenases, LOX, é o AA. Existem 3 isoformas das LOXs conhecidas, e estas são capazes de inserir uma molécula de O2 (oxigenação) no ácido gordo dos fosfolípidos da membrana. As 3 isoformas são a 5-LOX, a 12-LOX e a 15-LOX, cujo número indica o local de ligação onde é adicionado a molécula de O2. A 5-LOX é a isoforma mais relevante e é responsável por catalisar os 2 primeiros passos da via das lipoxigenases, levando à formação de leucotrienos e lipoxinas. A 5-LOX está fisiologicamente inativa e é ativada ao ser transportada para o núcleo, sendo associada à 5- FLAP, a proteína responsável pela sua ativação. O primeiro passo da via consiste na conversão do AA em 5-HPETE (ácido 5-hidroperoxieicosatetranoico), pela 5-LOX (passo limitante da via). 5-HETE é um ácido, que é rapidamente convertido, pela 5-LOX, em leucotrieno A4, que é extremamente instável, que é depois convertido em leucotrieno B4 (expresso em maior escala nos eritrócitos, sendo importante para a quimiotaxia) ou em leucotrieno C4 (presente sobretudo nos macrófagos e mastócitos, sendo obtido por conjugação com o ácido glucorónico). Por sua vez, este último pode ser convertido em leucotrieno D4, E4 e F4, sendo interconvertíveis entre si e tendo um papel importante na patologia respiratória, pois induzem a broncoconstrição. Os leucotrienos C4, D4, E4 e F4 são designados de cistainil -leucotrienos porque se ligam a resíduos de cisteína do glutatião. Os LT-B4 atuam em recetores BLT1 e BLT2. Os recetores CysLT1 e CysLT2 são ativados pela ação dos LT-C4, D4, E4 e F4. Podemos intervir na via das lipoxigenases, administrando antagonistas dos cis-leucotrienos, que são usados no tratamento da asma , por terem uma ação anti-inflamatória e broncodilatadora . Estes são muito utilizados em crianças por serem mais seguros, no entanto são menos eficazes que os cort icosteroides e os agonistas β2. Também podem ser administrados inibidores da 5-LOX, o que impede a formação de todos os leucotrienos. O AA pode sofrer a ação da 15-LOX, obtendo-se as lipoxinas (LXA4 e LXB4), moléculas anti- inflamatórias endógenas. As resolvinas, as protetinas e as maresinas derivam do ómega 3 e são também moléculas anti-inflamatórias. Todos estes mediadores são importantes para a resolução da inflamação, pois limitam a magnitude e a duração da resposta inflamatória. Estes mediadores atuam também sobre recetores metabotrópicos acoplados a proteínas G. As cicloxigenases, COX1 e COX2: Existem 3 isoformas das COXs, a 1, a 2 e a 3. A isoforma 3 encontra-se expressa no SNC, é a menos útil na prática clinica. As COX-1 e 2 têm alguns pontos em comum: utilizam ambas o AA como percursor, e catalisam as mesmas reações (os efeitos produzidos pela inibição da COX1 e da COX2 são exatamente os mesmos, exceto na hipersensibilidade e na ativação e função plaquetária), dando origem a produtos semelhantes. A COX-1 é constitutiva e é expressa ubiquamente em todos os tecidos. A COX-2 é indutivel (exceto no rim e no SNC), sendo o principal estímulo para a sua indução a libertação de TNF-α e IL-1. É da inibição da COX-1 que resultam a maioria das reações adversas e da inibição da COX-2 que resultam a maioria dos efeitos terapêuticos. Os AINEs vão penetrar no canal hidrofóbico das COXs para inibir a ligação do AA. Estes fármacos ligam-se a um resíduo de arginina na posição 120 da enzima, promovendo a formação de pontes de hidrogénio. A isoforma 2 tem uma “side poket” que aloja os Coxibs. Os Coxibs foram alterados NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 80 estruturalmente, aumentando o volume dos grupos substituintes, para que não conseguissem entrar no canal hidrofóbico mais estreito da isoforma 1, sendo seletivos para a isoforma 2. COX-1 COX-2 É constitutiva, é expressa de forma ubíqua em todas as células. Com exceção do rim e do SNC onde é expressa de forma constitutiva, nos outros territórios é indutível e o principal estimulo para a indução é a libertação de citocinas como o TNF-α, a IL-1 e o INF-ᵞ. Os produtos finais derivados da ação da COX-1 são as prostaglandinas que garantem a homeostasia da mucosa gástrica, ao inibirem a secreção gástrica e estimularem a secreção muco e HCO3-. (Esta foi uma das razões para que se tentassem desenvolver fármacos seletivos para a COX-2, os Coxibs) Esta enzima tem uma “side poket” que permite acomodar os Coxibs, os inibidores seletivos da COX- 2. Estes não conseguem atingir o centro catalítico da COX-1, pois embora, tanto a COX-1 como a COX-2 tenham um canal hidrofóbico para alojar o AA, o da COX-1 é mais estreito. Grupo 1 AINEs pouco seletivos, que inibe tanto a COX1 como a COX2 Ibuprofeno, diclofenac, aspirina, piroxican e naproxeno Grupo 2 Fármacos capazes de inibir ambas as COXs, mas têm maior afinidade para a isoforma 2 Celocoxib, meloxicam, nimesulida e etodolac Grupo 3 Fármacos que inibem fortemente a COX2 e têm fraca afinidade para a COX1 Rofecoxib Grupo 4 AINEs que são inibidores fracos de ambas as isoformas Salicilato de sódio e nabutamona Efeitos Terapêuticos e Efeitos Adversos dos AINEs: Os AINEs são uns dos fármacos mais prescritos e mais utilizados pela polução geral, sendo considerados fármacos de venda livre. São classificados de acordo com a sua estrutura ou a sua duração de ação, não tendo o primeiro tipo de classificação muita relevância na prática clinica, sendo mais utilizada a segunda. Todos os AINEs são ácidos fracos e todos eles promovem alivio sintomático, mas não modificam a patologia de base, a origem da inflamação. Todos eles, com exceção do ácido acetilsalicílico (aspirina), são inibidores reversíveis das COXs, ou seja, inibem a formação de prostanoides. Os efeitos adversos dos AINEs decorrem sobretudo da inibição da COX-1, já que esta dá origem às prostaglandinas responsáveis por manter a homeostasia dos tecidos . Contrariamente, os efeitos terapêuticos dos AINEs derivam sobretudo da inibição da COX-2, uma vez que esta dá origem a prostaglandinas envolvidas na fisiopatologia da febre, da hiperalgesia e da inflamação. Foram, então, desenvolvidos os Coxibs que inibem seletivamente a COX-2, não atuando sobre a isoforma 1. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 81 Para alem de atuarem nas COXs, os AINEs têm a capacidade de intervir sobrea ação de outras enzimas, o que justifica o aparecimento de outras reações adversas. O ácido acetilsalicílico é capaz de inibir o NF- KB, o fator de transcrição responsável pela codificação de genes de inúmeros mediadores inflamatórios. Por exemplo, a sulfalasina inibe as COXs e sequestra os radicais livres de oxigénio formados pelos macrófagos durante a sua ação, tendo propriedades antioxidantes. Os AINEs para além de anti-inflamatórios, têm também efeitos antipiréticos e analgésicos. O efeito antipirético resulta da inibição da formação da PGE2, responsável por desregular o centro hipotalâmico termorregulador, aumentando o “set point” hipotalâmico. Todos os AINEs têm efeito antipirético, mas nem todos são utilizados com este objetivo. O efeito analgésico é apenas eficaz para dores moderadas ou ligeiras com um processo inflamatório subjacente, uma vez que estes são capazes de inibir a formação de prostaglandinas que sensibilizam os terminais nociceptivos. O efeito anti-inflamatório resulta da inibição da formação da PGI2 e da PGE2, reduzindo a vasodilatação e consequentemente o edema. Os principais efeitos adversos surgem sobretudo quando administrados em grupos de risco, como crianças e idosos, quando administrados em doses elevadas ou ainda da administração prolongada (durante um longo intervalo de tempo). As reações adversas a nível gástrico são as mais relevantes e decorrem da inibição da COX-1. Estes podem provocar úlceras gástricas ao inibirem a COX-1, porque esta produz a PGE2 que garante a secreção de muco e bicarbonato essencial para a proteção da mucosa gástrica. Embora, os Coxibs sejam seletivos para a COX-2 não são desprovidos de efeitos adversos gastrointestinais, pois pensa-se que esta isoforma esteja envolvida no processo de cicatrização de úlceras pré -existentes e na diminuição de hemorragias dos tecidos. A sua inibição leva à deficiente cicatrização e ao aumento do tempo de hemorragia. Embora menos graves, a inibição da COX-2 continua a ter efeitos secundários no trato gastrointestonal. A nível local, como os AINEs são ácidos fracos, apresentam um pka entre 3 e 5, e por isso, ao nível do estômago, onde o pH é mais acídico, estes apresentam maior percentagem de forma não ionizada, conseguindo atravessar mais facilmente as membranas e serem mais absorvidos, devido à maior lipossolubilidade, derivada da carga neutra. Uma vez no interior das células, estes tendem a ser novamente ionizados, ficando retidos no seu interior – “ion trapping”. A retenção dos AINEs no interior das células conduz à sua lesão, à lise osmótica e à apoptose, alterando a barreira protetora do estômago, havendo, assim, lesão da mucosa. Pensa-se que este seja o mecanismo tópico, de menor importância, envolvido na lesão da mucosa do tubo gastrointestinal, para além da inibição das prostaglandinas responsáveis pela a homeostasia deste tecido, uma vez que mesmo administrados em baixas doses ou em concomitância com um protetor de estômago ou por via parentérica continuam a manifestar-se estas reações. Os AINEs devem ser administrados sempre conjuntamente com um protetor gástrico em doentes com maior risco de desenvolvimento de doenças gastrointestinais. O Coxib só deve ser administrado em doentes que não tolerem a administração de outro AINE com um protetor de estômago, pois este fármaco apresenta Relembrando: Os principais mecanismos protetores da mucosa gástrica são a barreira de muco e bicarbonato; as células epiteliais ligadas por tight junctions; a vascularização da submucosa e as prostaglandinas. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 82 maior toxicidade cardiovascular. As pessoas com história de ulceração gástrica não devem de todo tomar Coxibs ou AINEs clássicos. Para além dos efeitos adversos ao nível do trato gastrointestinal, os AINEs também provocam efeitos adversos no sistema cardiovascular e no sistema renal. O efeito hipertensor resulta da inibição da COX-2 ao nível da mácula densa renal, diminuindo a produção de PGI2 e PGE2 e a libertação de renina. Diz-se que a hipertensão cursa com baixos níveis de renina. Os baixos níveis de renina , levam, de forma compensatória, ao aumento da atividade da angiotensina II em circulação sobre o endotélio vascular, aumentando a vasoconstrição arteriolar, o que condiciona o aumento da pressão arterial transitória. O ácido acetilsalicílico é o único AINE, que quando administrado em doses baixas, apresenta função de antiagregante plaquetário, sendo vantajoso do ponto de vista cardiovascular. O naproxeno é o AINE mais seguro do ponto de vista cardiovascular. Os AINEs podem provocar insuficiência renal, resultando esta da inibição da produção da PGI2 e da PGE2 responsáveis por regularem o fluxo sanguíneo renal, ao promoverem a vasodilatação da arteríola aferente que contraria o efeito vasoconstritor derivado da ação da norepinefrina endógena e da angiotensina II local. Ao serem inibidos os efeitos vasodilatadores, diminui a taxa de filtração glomerular o que pode conduzir a nefrite e necrose, culminando em nefropatia irreversível. Em regra geral, a insuficiência renal aguda é reversível após a paragem da toma. Uma das principais causas de transplante renal é a utilização exacerbada de AINEs. Os AINEs não são escolhidos ao acaso, mas sim tendo em conta os seus efeitos adversos. Fármacos Inibidores das Cicloxigenases: Os AINEs são ácidos fracos; têm curtas durações de ação; são muito lipofílicos; são metabolizados a nível hepático por reações de fase I e de fase II; são excretados a nível renal; ligam-se com facilidade às proteínas plasmáticas, à exceção do paracetamol; e têm uma boa disponibilidade oral (são bem absorvidos). Estes fármacos atravessam a barreira placentária; tendem a acumular-se em tecidos inflamados, devido ao baixo pH do local; e distinguem-se entre si pelo tempo de semivida e duração de ação (que depende do caráter reversível e irreversível da inibição das COXs e da sua capacidade de recuperação/”turn over”). O Ácido Acetilsalicílico (Salicilatos): Os salicilatos medeiam uma inibição de caráter irreversível das cicloxigenases. São os únicos AINEs com função de antiagregantes plaquetários e, portanto, vantajosos do ponto de vista cardiovascular. O caráter da inibição provocada pela ação do ácido acetilsalicílico é irreversível, através da acetilação de um resíduo de serina na estrutura enzimática, tendo maior afinidade para a isoforma 1. Simultaneamente, a COX-1 tem mais dificuldade em recuperar a sua atividade catalítica , e é abundantemente expressa nas plaquetas (em 70%), que são fragmentos celulares anucleados que não podem fazer a síntese proteica e, por isso, produzir novas enzimas, ao contrário das isoformas endoteliais que têm alguma capacidade de recuperação. Assim o ácido acetilsalicílico tem um efeito de antiagregante plaquetário mais duradouro que os outros AINEs. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 83 A aspirina tem uma reduzida semivida, mas tem uma elevada duração de ação , semelhante ao tempo de semivida de uma plaqueta (7 a 10 dias). No entanto, não se deve administrar ácido acetilsalicílico em doses maiores, pois este passa a inibir tanto a COX-1 plaquetária como a endotelial, responsáveis pela formação de tromboxano A2 e prostaciclina, respetivamente, sendo estes mediadores antagonistas fisiológicos. O ácido acetilsalicílico, para além de inibir as cicloxigenases, é responsável também pela formação de 15-epi-lipoxinas, mediadores anti-inflamatórios (estereoisómeros que mimetizam a ação das lipoxinas clássicas e endógenas). A aspirina podeinduzir asma , porque a inibição irrevers ível das COXs faz com que o AA siga a via das LOXs, formando-se em maior quantidade cisteinil leucotrienos com atividade broncoconstritora. No fundo, a inibição da via das COXs, conduz à hiperativação da via das LOXs, com hiperformação de leucotrienos. Os antagonistas dos recetores dos cisteinil leucotrienos são usados no tratamento da asma em crianças e são bastante eficazes no tratamento da asma induzida pela aspirina. O ácido acetilsalicílico está relacionado com outras reações adversas, como a Síndrome de Reye, uma encefalopatia hepática com esteatose associada à infeção viral comum nas crianças, pelo que nas crianças com menos 12 anos se evita administração de AINEs. Coxibs: O rofecoxib foi retirado do mercado, pois tinha efeitos adversos graves cardiovasculares (detetados por métodos de farmacovigilância). O meloxicam, apesar de não ser um coxib tem mais afinidade para a isoforma 2 e por isso é inserido neste grupo. Os coxibs têm tempos de semivida mais prolongados, são mais bem tolerados em termos gástricos, não têm efeitos antiagregantes, são usados no tratamento da artrite reumatoide e da osteoartrite. No entanto, são muito mais caros/dispendiosos e têm mais efeitos adversos cardiovasculares. Paracetamol: O Paracetamol não tem efeito anti-inflamatório, é utilizado como antipirético e analgésico. Este consegue atravessar a barreira hematoencefálica, penetrando no SNC; a nível periférico é um fraco inibidor da COX1 e da COX2, por isso tem mais efeitos a nível central; pensa-se que seja mais especifico para a COX-3; pensa-se também que seja inativado pelos peróxidos do tecido inflamado. O Paracetamol apesar de ser um fármaco no geral mais seguro, provoca efeitos de hepatotoxicidade grave, quando administrado em grandes concentrações, pois a sua metabolização leva à formação de NABQUI (um metabolito tóxico que forma aductos com macromoléculas intracelulares, como o DNA e proteínas celulares, aumentando o stress oxidativo e a apoptose celular). NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 84 Algumas Particularidades: - Em doses superiores a 400mg o ibuprofeno é anti-inflamatório, apesar de em doses baixas ser muito pouco eficaz. - O ibuprofeno (princípio ativo do brufen) tem atividade antiagregante plaquetária. - O diclofenac é um dos AINEs mais potentes. - A nabumetona é um pró-fármaco e por isso é contraindicada para insuficientes hepáticos, é mais básica e não tem efeitos antiagregantes. - O naproxeno é o AINE com menos efeitos cardiovasculares. - O celocoxib e o diclofenac são afetados pela toma de alimentos. - O diclofenac e o piroxicam são os que atingem maiores concentrações no liquido sinovial e nos tecidos inflamados. A artrite reumatoide e os AINEs: A artrite reumatoide é uma doença autoimune em que há destruição do tecido ósseo e cartilagíneo das articulações pela ativação inadequada dos linfócitos T do organismo. A terapia não farmacológica utilizada no tratamento da artrite reumatoide consiste em hidroginástica e hidroterapia. Os AINEs são usados no tratamento da artrite reumatoide. Estes não devem ser administrados em monoterapia mais de três meses. A sulfalasina é um AINE usado no tratamento da artrite reumatoide, porque para além de inibir as COX, é capaz de sequestrar os radicais livres responsáveis pela destruição da matriz óssea e cartilagínea. O etarnecept (agente biológico), a anakinra (agente biológico), a hidroxicloroquina (anti-paludico de síntese), o metrotexato (imunomodelador) e a sulfasalazina (AINE) são os fármacos mais utilizados na terapêutica de fundo da artrite reumatoide. Todos eles fazem parte de um grupo muito heterogéneo de fármacos conhecidos como DMARDs. Estes impedem a progressão da doença , têm mecanismos de ação muito distintos e que não são específicos para a artrite reumatoide (ao contrário do que acontece com os anticorpos monoclonais, mABs, que atuam especificamente sobre as citocinas inflamatórias), são muito dispendiosos, são tóxicos, têm muitos efeitos adversos e são fármacos com um inicio de ação muito lento. É durante o período de latência que são utilizados os AINEs e os glucocorticoides como terapêutica de ponte (terapêutica limitada no tempo). Não esquecer: Os AINEs provocam apenas alivio sintomático e não alteram a sintomatologia de base. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 85 O DMARD mais potente é a hidroxicloroquina. Os DMARDS são prescritos de forma empírica, no entanto continuam a apresentar uma razão favorável de beneficio/risco. Os agentes biológicos aparecem no topo da pirâmide da terapêutica da artrite reumatoide. Estes só são utilizados em último recurso, quando a terapia de base ou os DMARDs não são eficazes, pois são bastante dispendiosos. O etarnecept é um recetor solúvel do TNF-α e que apresenta dois locais de ligação para a molécula endógena. A anakinra é um antagonista dos recetores da IL-1, impedindo a sua ligação ao recetor. O alizumab e o infliximab são os dois mABs mais usados no tratamento da artrite reumatoide, pois atuam sobre os recetores do TNF-α. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 86 Aulas 23 e 24: Farmacologia Geral Da Inflamação. Anti-inflamatórios Esteroides. Farmacologia Geral Da Histamina. Anti-histamínicos. Anti-inflamatórios Esteroides: Glândula Suprarrenal: A glândula suprarrenal é uma glândula endócrina, paravertebral, retroperitoneal, que se encontra localizada junto ao polo superior dos rins, sendo formada por duas partes com origens embrionárias distintas, uma parte mais periférica, o córtex, e uma parte mais central, a medula. O córtex da glândula suprarrenal é responsável pela síntese e libertação de várias moléculas. Este está dividido em 3 áreas que, da periferia para o centro, são a zona glomerulosa , a zona fasciculada e zona reticulada. A zona fasciculada é responsável pela síntese e secreção de glucocorticoides, sendo o principal glucocorticoide endógeno o cortisol. A sua síntese é estimulada pelos níveis da ACTH (“adrenocorticotropic hormone”), uma hormona produzida pela hipófise anterior (adenohipófise), cuja secreção é por sua vez controlada pela secreção da CRH (“corticotropin-releasing hormone”) produzida no hipotálamo. Por sua vez, o cortisol regula os níveis das duas hormonas, ACTH e CRH, através de um mecanismo de retroalimentação, feedback negativo. Os androgénios são sintetizados pela zona reticulada, sendo a sua secreção também regulada pela a ACTH. A zona glomerulosa produz os mineralocorticoides, sendo o mais importante a aldosterona. Os dois principais estímulos para a sua secreção são o aumento dos níveis de angiotensina II e o aumento da concentração de potássio, K+. O córtex adrenal não é capaz de armazenar hormonas, a síntese e a libertação das mesmas é feita aquando de um estímulo. A medula da glândula adrenal é responsável pela síntese de catecolaminas, como a norepinefrina e a epinefrina, e respetiva libertação na corrente sanguínea, sendo a sua síntese estimulada pela libertação de acetilcolina pelas fibras pré-ganglionares simpáticas. A síntese das diferentes moléculas está intimamente dependente da expressão de determinadas enzimas. A aldosterona é sintetizada pela zona glomerulosa porque esta expressa a aldosterona sintetase , os androgénios são sintetizados pela zona reticuladaporque esta expressa a 17-α-hidroxilase, o cortisol é sintetizado pela zona fasciculada porque esta expressa a 11-β-hidroxilase. Mnemónica: “Rei Ficou Gordo” – para as camadas do córtex da glândula suprarrenal, do centro para a periferia, reticulada, fasciculada e glomerulosa. “Salt, Sugar, Sex” – para o que cada camada do córtex da glândula suprarrenal produz, da periferia para o centro, mineralocorticoides, glucocorticoides e hormonas sexuais. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 87 A síntese dos glucocorticoides: Todas as hormonas esteroides derivam do colesterol que é endocitado pelos recetores LDLR, após ter sido absorvido nos enterócitos intestinais e transportado até aos órgãos alvo pelas quilomicras. O colesterol é uma molécula que apresenta 27 átomos de carbono na sua estrutura. Este depois é convertido em pregnelona, uma molécula com 21 átomos de carbono, após sofrer clivagem. A pregnelona é a molécula percursora de todas as hormonas esteroides sintetizadas no córtex da glândula suprarrenal. Este primeiro passo da síntese das hormonas está intimamente dependente da quantidade de colesterol disponível e da ocorrência do estimulo para a produção e constitui o passo limitante. A pregenelona sofre depois oxidação mediada por oxidases, formando-se cortisol e outras hormonas. Cada tipo de oxidase catalisa um tipo especifico de reação, pois estas são expressas em determinadas zonas do córtex. A 11β-oxidase é responsável pela síntese de cortisol e é expressa exclusivamente na zona fasciculada. A 17α-oxidase é exclusiva da zona reticula, sendo responsável pela síntese de androgénios. O principal estimulo que desencadeia a síntese e a libertação das hormonas é o aumento dos níveis de cAMP no interior das mitocôndrias. A ACTH liga-se aos seus recetores, que são recetores metabotrópicos acoplados a proteínas Gs, que estimulam a atividade da Adenilato Ciclase, a enzima responsável por catalisar a conversão de ATP em cAMP e ADP. Os glucocorticoides e as proteínas plasmáticas: O cortisol liga-se em elevada extensão às proteínas plasmáticas. Cerca de 90% do cortisol em circulação está associado a proteínas e os restantes 10% correspondem à forma livre do fármaco disponível para atravessar as membranas e exercer a sua ação. 75% do cortisol está ligado à transcortina ou CBG (“corticoesteroid-binding globulin”), que apresenta elevada afinidade para o cortisol, mas rapidamente fica saturada . Os restantes 15% encontram-se ligados à albumina, que apresenta menos afinidade para o cortisol, mas mais capacidade de transporte . Esta propriedade farmacocinética dos glucocorticoides influenc ia diretamente a sua biodisponibilidade, a sua duração de ação e a fração livre do fármaco capaz de desencadear uma resposta. A metabolização dos glucocorticoides: Os glucocorticoides são metabolizados principalmente no fígado e no rim. No fígado estes são metabolizados por reações de fase I e fase II, sobretudo por conjugação com ácido glucorónico, tornando estas hormonas esteroides, marcadamente lipossolúveis, em substâncias mais hidrofílicas e mais facilmente eliminadas pelo rim. A 11β-hidroxiesteroide desidrogenase é uma enzima que afeta o metabolismo dos glucocorticoides. Esta possui duas isoformas. A isoforma 1 é exclusiva do fígado e a isoforma 2 é exclusiva do rim. Estas isoformas catalisam reações diametralmente opostas. A isoforma 2 (11β-HSD2) converte o cortisol em cortisona , ou seja, promove a inativação do cortisol, uma vez que a cortisona tem um grupo carbonilo na posição 11, e não um grupo hidroxilo, deixando de ser capaz de se ligar aos recetores dos glucocorticoides e desencadear um efeito. A isoforma 1 (11β-HSD1) converte a cortisona em cortisol, isto é, promove a sua ativação. A maior ou menor afinidade das hormonas para as isoformas das enzimas vai determinar a sua biodisponibilidade e a sua duração de ação. A reter: CBG ou Transcortina: elevada afinidade e baixa capacidade de transporte Albumina: baixa afinidade e elevada capacidade de transporte NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 88 Os recetores: Os glucocorticoides de síntese vão mimetizar a ação dos glucocorticoides endógenos, provocando os mínimos efeitos adversos possíveis, ao atuarem em recetores. Existem dois tipos de recetores. Os recetores do tipo 1 são recetores com atividade mineralocorticoide expressos maioritariamente nos órgãos de excreção, como o rim, o cólon, as glândulas salivares e as glândulas sudoríparas. Os recetores tipo 2 são os recetores com atividade glucocorticoide, apresentando estes uma distribuição mais difusa no organismo. A ligação dos agonistas aos recetores tipo 2 é responsável pelos efeitos anti-inflamatórios, ou seja, pelos efeitos terapêuticos, enquanto que a ativação dos recetores tipo 1 está associada aos efeitos adversos destes fármacos. Os recetores dos glucocorticoides, como o cortisol, são recetores citoplasmáticos, intracelulares. Isto é possível porque os anti-inflamatórios esteroides (tal como as moléculas endógenas) são marcadamente lipossolúveis, atravessando facilmente as membranas celulares, alcançando o compartimento intracelular, tendo a capacidade de se ligar ao seu local de ligação no recetor. No interior das células, os recetores estão ligados a proteínas chaperonas, como a FK-Bindig Protein hsp90, que têm uma função protetora, uma vez que estas cobrem determinadas regiões especificas do recetor cruciais para que este seja transportado para o núcleo, garantindo a sua localização citoplasmática. Os glucocorticoides, após se difundirem passivamente através da membrana, ligam-se ao seu recetor, induzindo-lhe uma alteração de conformação, permitindo que este se desligue da proteína chaperona, o que faz com que o complexo glucocorticoide/recetor seja transportado até ao núcleo. Glucocorticoides e os seus mecanismos de ação: Uma vez no núcleo, o complexo liga-se a regiões especificas do DNA, aos GRE (“glucocorticoide responsive element”), sendo que o resultado desta ligação é a alteração da transcrição génica de genes que codificam para proteínas anti-inflamatórias e para proteínas pró-inflamatórias. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 89 Quando o complexo se encontra no núcleo pode desencadear-se três mecanismos diferentes. Primeiro pode haver a formação de um homodímero, através da junção de dois complexos. De seguida este homodímero liga-se aos GRE, induzindo a transcrição de genes que codificam para proteínas anti- inflamatórias, como a anexina-1 (lipocortina). Este processo designa-se de “trans-activation”. Segundo, após a formação do homodímero, este pode ligar-se a GRE negativos o que conduz à supressão de genes que codificam proteínas essenciais para o nosso metabolismo e homeostasia, sendo este o mecanismo responsável pelos efeitos adversos, designando-se este fenómeno de “cis-repression”. Por exemplo, leva à diminuição da síntese de osteocalcina, o que aumenta o risco de fraturas e de desenvolvimento de osteoporose; leva à diminuição da produção de queratina e de colagenase o que pode conduzir ao aparecimento de fragilidade cutânea, à formação de estrias e á formação de equimoses fáceis. Assim, o mecanismo de “cis-repression” não concorre para o efeito anti-inflamatório destes fármacos. Em terceiro lugar, o complexo, sem formar um homodímero, pode ligar-se à proteína CBP (“CREB Binding Protein”), a proteína responsável pela indução da transcriçãode genes que codificam para proteínas pró-inflamatórias, como as citocinas. A ligação do complexo a esta proteína, impede que esta ativa o fator de transcrição NF-KB, limitando-se assim a extensão da resposta inflamatória. Este mecanismo designa-se de “trans-repression” e é o mais importante dos três. Para além dos mecanismos genómicos, existem outros mecanismos não genómicos. O complexo formado pelo glucocorticoide e o seu recetor pode interferir com a ação de fatores de transcrição cruciais na resposta inflamatória, ligando-se a eles de forma direta e funcional, impedindo a transcrição genética . O complexo pode ligar-se às proteínas fos e jun, impedindo que estas se liguem ao AP-1 (“Activator Protein 1”), fosforilando-o, responsável pela transcrição de genes. Da mesma forma, o complexo pode ligar-se às proteínas P65 e P50, deixando estas de conseguir ligar-se ao fator de transcrição NF-KB, que deixa de induzir a transcrição de genes envolvidos na resposta inflamatória. Por outro lado, os complexos conseguem também interferir com a atividade de enzimas como a histona-desacetilase e a histona-acetiltransferase. Os glucocorticoides estimulam o recrutamento da primeira e inibem a ação da segunda enzima. A exposição da cromatina, a sua descondensação, é crucial A reter: O mecanismo de “trans- repression” é o mecanismo mais importante para o tratamento da inflamação. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 90 para que ocorra transcrição génica. A histona- acetiltransferase promove a transcrição génica ao promover a acetilação das histonas. Pelo contrário, a histona-desacetilase promove a supressão génica ao desacetilar as histonas da cromatina. Assim, a transcrição de genes como aqueles que codificam para as COXs ou para citocinas inflamatórias fica inibida. Outras das ações que concorre para o efeito anti - inflamatório destes fármacos é a ação mediada pela lipocortina. Os glucocorticoides, através do processo de “trans-activation”, promovem a tradução da lipocortina ou anexina-1, responsável por inibir a fosfolipase A2, a enzima responsável por desterificar o ácido araquidónico, a molécula percursora para a formação de prostanoides e eicosanóides. Ou seja, os glucocorticoides são inibidores indiretos da fosfolipase A2. Para além deste mecanismo, os glucocorticoides, pela “trans-repression”, impedem a formação de cicloxigenases e dos recetores dos eicosanóides. Ao mesmo tempo também impedem a formação de COX-2, uma enzima induzível, ao reduzirem um dos maiores estímulos para a sua produção, a expressão de citocinas pró- inflamatórias, como o TNF-α e IL-1. (Assim os glucocoricoides têm uma maior latência de efeito que os AINEs, mas uma maior eficácia terapêutica.) Os glucocorticoides são usados na patologia da asma pelas suas ações anti-inflamatórias. Ao mesmo tempo, indiretamente, podem provocar broncodilatação, porque aumentam a expressão de recetores adrenérgicos β2, ao qual se ligam os seus agonistas, promovendo o relaxamento da musculatura lisa brônquica (amplificação da resposta). Ações fisiológicas do cortisol: Quanto às ações fisiológicas do cortisol, este concorre, no geral, para o aumento da disponibilidade de nutrientes (aumenta os substratos energéticos), pois é também designado de hormona do stress. Ele aumenta a glicémia ao aumentar a síntese de glicose, a neoglicogénese e reduzir o “up-take” periférico da glicose, antagonizando a ação da insulina; aumenta a quantidade de aminoácidos livres e proteínas ao aumentar o catabolismo proteico no músculo e a síntese proteica no fígado; aumenta a quantidade de ácidos gordos livres ao aumentar a lipólise, através da estimulação da lípase hormono-sensivel. Este também promove uma distribuição anormal da gordura corporal periférica , concentrando-se esta a nível central, na cabeça, pescoço e tronco, o que se designa de obesidade central ou centrípeta. A síndrome “Cushing” resulta do aumento dos níveis de glucocorticoides, essencialmente pela administração excessiva de glucocorticoides de síntese (causa iatrogénica). Os doentes apresentam uma NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 91 fácies típica em lua cheia , a bossa de búfalo, muita gordura abdominal e os membros superiores e inferiores finos. Para além disto, os glucocorticoides competem com a vitamina D (responsável pela homeostasia do cálcio), diminuindo a absorção de cálcio a nível intestinal e aumentando a sua excreção a nível renal. Ao diminuir a concentração plasmática de cálcio, estes aumentam a quantidade da paratormona (PTH) e consequentemente aumentam a atividade dos osteoclastos e diminuem a atividade dos osteoblastos, o que facilita o aparecimento da osteoporose. Concluindo, um dos efeitos adversos dos glucocorticoides é osteoporose, não só pelo mecanismo de “cis repression”, mas também porque estes competem com a vitamina D, aumentando a PTH em circulação. Os glucocorticoides, quando administrados, diminuem a vasodilatação e a permeabilidade vascular, controlando a situação de edema, típico da inflamação, ao diminuírem a expressão de moléculas pró-inflamatórias. Eixo hipotálamo-hipófise: O eixo hipotálamo-hipófise-adrenal controla o metabolismo, ao regular a secreção de cortisol. As citocinas inflamatórias atuam no hipotálamo, estimulando a produção de CRH. A CRH é libertada, atuando sobre a hipófise anterior ou adenohipófise, estimulando a libertação de ACTH que, por sua vez, após ser libertada em circulação, atua no córtex da glândula suprarrenal, desencadeando um estimulo trófico. Seguidamente, segundo um mecanismo de retroalimentação (feedback negativo), o cortisol inibe a secreção de ACTH pela adenohipófise e de CRH pelo hipotálamo. Nunca se deve fazer suspensão abrupta de terapêutica glucocorticoide, mas sim um desmame progressivo, independente da via de administração (oral, intravenosa, tópica, etc.). A administração exógena de glucocorticoides de síntese provoca um efeito de feedback negativo, diminuindo a produção de CRH e ACTH, que deixa de estimular troficamente o córtex, tornando-se este atrófico. Se se parar a administração destes glucocorticoides a atrofia do córtex não é recuperada nem reposta instantaneamente, pode levar semanas. Esta paragem abrupta conduz a insuficiência adrenal aguda , com falta de produção das hormonas do córtex adrenal. Fármacos – os glucocorticoides de síntese: Os glucocorticoides de síntese são sintetizados a partir do cortisol “Back Bone”, a estrutura de base percursora. Todos têm um grupo hidroxilo, -OH, na posição 11, o que lhes permite que se liguem ao seu recetor. A cortisona tem um grupo carbonilo, -O, não tendo por isso atividade glucocorticoide, porque não se pode ligar aos recetores do tipo 2, com atividade anti-inflamatória. A prednisona é um pró-fármaco, exatamente por ter um grupo carbonilo, -O, na posição 11, tendo que ser metabolizada previamente, para que adquira a sua forma ativa. Esta não pode ser administrada por via tópica nem a insuficientes hepáticos. Quando são fabricados tenta-se que estes fármacos tenham uma maior duração de ação que o cortisol, tenham uma maior ação anti-inflamatória e tenham a mínima atividade mineralocorticoide possível , NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 92 reduzindo, assim, os efeitos adversos (uma vez que assim não mimetizam a ação da aldosterona, não contribuindo para a retenção de sódio e água, o que conduz ao aumento da pressão arterial). Clinicamente, estes fármacos são indicados como anti-inflamatórios,como imunossupressores (no período pós-transplante, minimizando o risco de rejeição), ou como terapêutica de substituição. Neste último caso não se administram doses terapêuticas, mas sim doses fisiológicas, para que o glucocorticoide de síntese mimetize ao máximo a ação do cort isol endógeno em falta. Para além disso, sendo esta uma terapêutica de substituição feita quando há insuficiência adrenal, as doses devem ser baixas já que o doente a vai fazer para toda a vida (de forma crónica). Cada um dos glucocorticoides de síntese apresenta uma atividade glucocorticoide relativa e uma atividade mineralocorticoide relativa (relativa porque é comparada com a atividade do cortisol), e é esta atividade que é utilizada para escolher o fármaco mais adequado para cada situação. Quanto à sua duração de ação eles são divididos em fármacos de curta duração de ação (inferior a 12 horas), duração de ação intermédia e longa duração de ação (superior a 48 horas). Quanto maior é duração de ação, mais potente é o fármaco do ponto de vista anti-inflamatório. A hidrocortisona é o glucocorticoide de síntese mais semelhante ao cortisol. Esta tem a mesma atividade glucocorticoide e mineralocorticoide que o glucocorticoide endógeno e tem uma curta duração de ação. É indicada para a terapêutica de substituição, em doses baixas para evitar efeitos adversos. A prednisolona/prednisona e a metilprednisolona têm uma atividade anti-inflamatória superior à do cortisol e uma atividade mineralocorticoide inferior, o que é mais vantajoso. A dexametasona e betametasona são fármacos muito potentes do ponto de vista anti-inflamatório, têm uma longa duração de ação e a sua atividade mineralocorticoide é muito baixa e a sua atividade glucocorticoide é muito elevada. A dexametasona é utilizada em situações de edema cerebral, devido à sua elevada eficácia. A fludrocortisona apresenta também uma atividade anti-inflamatória apreciável, mas a sua atividade mineralocorticoide é muito elevada, o que contribui para a ocorrência de efeitos adversos. Existem vários fatores que contribuem para a duração de ação destes fármacos. A capacidade de ligação a proteínas plasmáticas é uma das propriedades farmacocinéticas que contribuem em grande escala para a permanência dos fármacos no organismo. O cortisol liga-se maioritariamente à CBG, contrariamente os glucocorticoides de síntese ligam-se sobretudo à albumina. Cerca de 2/3 do fármaco liga-se à proteína do plasma e os restantes 1/3 encontram-se na sua forma livre, pronta a exercer a sua ação. Quanto maior for a fração livre, A reter: A ligação às proteínas plasmáticas é diferente entre o cortisol endógeno e os glucocorticoides de síntese. O cortisol liga-se em 95% às proteínas plasmáticas, sendo a principal proteína a transcortina. Por outro lado, os glucocorticoides de síntese ligam-se apenas a 2/3 das proteínas plasmáticas, sendo a principal a albumina. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 93 mais rapidamente o fármaco á eliminado, pelo que a capacidade de ligação às proteínas, condiciona a duração de ação. A lipossolubilidade é outras das características do fármaco que determina a sua duração de ação. Quanto mais lipofílico for o fármaco, maior é a quantidade do fármaco que fica acumulado/retido nas reservas, isto é, no tecido adiposo, e, consequentemente, maior é a sua duração de ação. Para além disto, quanto mais lipofílico for o fármaco, mais facilmente este atravessa as membranas, sendo mais rapidamente absorvido. A afinidade do fármaco para a enzima 11β-hidroesteroide desidrogenase (11β-HSD) é um ponto chave na farmacocinética destes fármacos. Quanto mais afinidade estes fármacos tiverem para a enzima, menor é a sua duração de ação, uma vez que estes são metabolizados no rim na sua forma inativa a uma maior escala. A afinidade do fármaco para o recetor também determina a sua duração de ação. Quanto maior é a afinidade para o recetor, maior é a duração de ação, já que, enquanto o fármaco está ligado, este está a exercer a sua ação. Estes fármacos apesar de serem bem absorvidos devido à sua elevada lipossolubilidade, sofrem muito efeito de 1ª passagem, e por esta razão, têm biodisponibilidades diferentes quando administrados por via oral. Os glucocorticoides quando administrados sistemicamente têm vários efeitos adversos. Ou seja, os glucocorticoides quando administrados via oral, por provocarem mais reações adversas, devem ser feitos durantes curtos períodos de tempo e em baixas doses, pois quanto maior é a dose e a duração do tratamento, maior é a incidência de efeitos adversos. Estes fármacos devem ser administrados localmente, por exemplo através da via inalatória, na pele através de pomadas ou cremes, nas articulações, etc. A via inalatória é a via de eleição para o tratamento da asma, no entanto podem desencadear-se efeitos sistémicos por acumulação de partículas na orofaringe que seguem o sistema digestivo, sendo posteriormente absorvidos no epitélio do trato gastrointestinal. Esta é a via de administração mais segura, sobretudo para crianças e idosos. A forma farmacêutica e as características do individuo também são muito importantes. Por exemplo, o gel é muito melhor absorvido que a pomada, no entanto, o estado da integridade da pele também condiciona a absorção, uma vez que quanto mais integra for a pele, mais difícil é a absorção do fármaco. A pilosidade também é outro fator preponderante na absorção. Nunca podemos administrar glucocorticoides que sejam pró-fármacos por via tópica , uma vez que, a pele e as articulações não expressam a enzima responsável por converter o glucocorticoide na sua forma ativa. Os glucocorticoides de síntese são metabolizados sobretudo a nível hepático por reações de fase I e de fase II (conjugação). Estes são eliminados maioritariamente por via renal. Os principais efeitos adversos dos glucocorticoides de síntese são a hiperglicemia, a diabetes (por antagonismo da ação periférica da insulina); a osteoporose, o maior risco para a ocorrência de fraturas, défices no desenvolvimento (devido a alterações no metabolismo fosfo-cálcico); bossa de búfalo; cataratas; estrias, equimoses (fragilidade cutânea); convulsões, insónias (atuam no SNC por serem fármacos muito lipossolúveis que atravessam facilmente a barreira hematoencefálica); aumento da pressão arterial (devido à atividade mineralocorticoide); imunossupressões com maior suscetibilidade para infeções (candidíase orofaríngea – infeção fúngica); etc. Os efeitos adversos são dose e tempo dependentes. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 94 Anti-histamínicos: Histamina: A histamina foi o primeiro autacoide a ser descoberto e a ser sintetizado artificialmente. Este é um mediador importante na inflamação, nos momentos iniciais, sendo crucial para a vasodilatação e para o NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 95 aumento da permeabilidade vascular. Esta é também responsável por desencadear reações do foro anafilático. Secundariamente, é importante para a secreção gástrica, concomitantemente com a gastrina e com a acetilcolina. A histamina está ainda envolvida na neurotransmissão, sendo um importante neuromodelador do SNC. A histamina é uma molécula extremamente hidrofílica, devido à sua estrutura formada por um anel imidiazólico ligado a um grupo amina (NH2), e por isso os seus recetores não podem ser intracelulares, estessão recetores transmembranares localizados na membrana celular. A L-histidina é o aminoácido percursor da histamina e é o substrato da histidina descarboxilase , a enzima que descarboxila a L-histidina transformando-a no mediador inflamatório. Seguidamente, a histamina é inserida em vesiculas por transportadores específicos, como o VMAT (“Vesicular Monoamine Transporter”), para depois ser libertada pelas células. A histamina é sintetizada por várias células, nomeadamente pelos mastócitos, pelos basófilos, por neurónios do SNC e pelas células enterocromafim-like (ECL) da mucosa gástrica, sendo armazenada, na maioria das vezes, sob a forma de grânulos. Nos mastócitos e nos basófilos a histamina está armazenada em grânulos, constituindo a “slowly turning over pool”. Isto é, existe um principio de tudo ou nada , há uma desgranulação total e maciça das células, aquando a ocorrência de um estimulo, na resposta inflamatória. As reservas são deletadas e ficam a zero. O período de tempo para a reposição das reservas demora algumas semanas (é um processo lento). Existem vários estímulos que conduzem à libertação imediata de histamina, como a simples exposição ao frio, a exposição a alergénios, o trauma mecânico, uma reação antigénio/anticorpo. A morfina também induz a libertação de histamina. Nestas células os estímulos são para a libertação e não para a síntese . As células enterocromafim-like não são capazes de armazenar histamina e, portanto, nestas células a síntese e a libertação ocorrem em simultâneo e mediante a existência de um estimulo. O principal estimulo constitui a chegada de alimentos ao estômago, pois estimula a enzima histidina descarboxilase. Assim, nestas células diz-se que existe um “rapidly turning over pool”. A histamina existente em circulação é rapidamente inativada por reações de oxidação e metilação, sendo sobretudo metabolizada no fígado. Por esta razão a histamina tem uma curta duração de ação. O ácido acético-imidiazólico é um dos produtos da metabolização da histamina encontrado na urina e por isso permite-nos ter uma ideia da quantidade de molécula que existe em circulação. A distribuição dos recetores de histamina no corpo é muito difusa. Os recetores H1 da histamina estão presentes no músculo liso brônquico e quando estimulados promovem a broncoconstrição , provocando os chamados sintomas asma-like. A sensibilidade de um asmático para a atuação da histamina sobre os seus recetores H1 é muito superior ao normal (respostas mais exacerbadas). A histamina é uma amina vasoativa. Quando esta atua nos recetores H1 presentes na musculatura lisa vascular conduz à vasodilatação das arteríolas e à vasoconstrição das vénulas, conduzindo ao edema típico da inflamação, NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 96 por aumento da pressão hidrostática. Para além disso estão presentes nas células endoteliais e promovem a sua contração, o que faz com que os espaços intercelulares sejam maiores e a permeabilidade vascular aumente, contribuindo ainda mais para a acumulação de fluido no espaço extracelular. Os recetores H1 presentes nos nervos periféricos, quando estimulados pela histamina, levam a uma estimulação das terminações nervosas nociceptivas com consequente maior sensibilidade à dor (sensitização) e conduzindo ao prurido. No coração, a estimulação dos recetores H2 pela histamina faz com que o influxo de cálcio para o interior dos miócitos seja maior, conduzindo a um ligeiro aumento da contratilidade/inotropismo e da frequência cardíaca (efeitos ténues). No estômago, a estimulação dos recetores H2 conduz ao aumento da secreção gástrica de HCl, atuando sempre em concomitância com a acetilcolina (Ach) e com a gastrina. No SNC, a histamina pode ter efeitos ao nível da neurotransmissão , atuando nos recetores H3. A sedação é um dos efeitos dos anti-histamínicos a nível central, já que, fisiologicamente a histamina aumenta os níveis de vigília. Os recetores H4 estão expressos nas células da linhagem hematopoiética , mas a sua função ainda não é bem conhecida. Todos os recetores de histamina são recetores transmembranares metabotrópicos acoplados a proteínas G. Estes distinguem-se entre si pelas proteínas G, pelos segundos mensageiros e pelas vias de sinalização que ativam ou inibem e pela sua distribuição tecidular. Os recetores H1 quando são estimulados pela histamina alteram a sua conformação e a proteína Gq ativa a PC, que por sua vez aumenta a hidrólise do PIP2 em IP3 e DAG. O IP3 mobiliza o cálcio das reservas, aumentando a concentração do catião intracelular. O cálcio liga-se à calmodulina, formando-se o complexo cálcio/calmodulina responsável por fosforilar a miosina, promovendo a contração. O DAG fosforila a PKC, que ao entrar no núcleo, fosforila o fator de transcrição NF-KB, que fica ativo, levando à transcrição de genes que codificam proteínas pró-inflamatórias. Para além destes mecanismos, o IP3 aumenta a atividade da NO sintetase. O NO é um mediador gasoso, potente vasodilatador, crucial na resposta inflamatória. Nos vasos de grande calibre, a vasoconstrição predomina, devido à grande espessura da parede dos vasos, o efeito vasoconstritor sobrepõem-se ao efeito vasodilatador induzido pelo NO. Nota: H1 – acoplados à proteína Gq11, que ativa a PC, aumentando o IP3 e o DAG, que aumentam a quantidade de cálcio e da PKC. H2 – acoplados à proteína Gs, que ativa a AC, que aumenta a quantidade de cAMP, que aumenta a quantidade de cálcio e a contração. H3 e H4 – acoplados a proteínas Gi, que inativam a AC, diminuindo a quantidade intracelular de cAMP. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 97 Os recetores H2 quando estimulados pela histamina alteram a sua conformação e a proteína Gs ativa a AC, a enzima responsável por converter o ATP em cAMP. Esta molécula fosforila proteínas cinases, ativando-as, e estas, por sua vez, ativam bombas de protões, garantindo a secreção do ião hidrogenião. Os recetores H3 e os H4 quando estimulados pela histamina alteram a sua conformação e a proteína Gi inativa a AC, diminuindo, assim, o cAMP, intracelular. Esta diminuição leva à diminuição dos níveis de cálcio e ao aumento de fosfolipase A2. Atualmente não existem fármacos usados na prática clinica que atuem sobre os recetores H3 e H4, mas pensa- se que a intervenção sobre os recetores H4 tenha vantagem no tratamento da hiperatividade e da doença de Alzheimer. Fármacos – Anti-histamínicos: A isoforma 1 dos recetores de histamina existe em dois estados conformacionais, designando-se esta propriedade de “Two-State Model”. Na ausência de histamina (agonista total) há um equilíbrio entre os dois estados conformacionais, isto é, o número de recetores inativos é igual ao número de recetores ativos. A histamina liga-se com maior afinidade ao recetor ativo, invertendo o equilíbrio no sentido da ativação, ou seja, passam a existir mais recetores no estado ativo. Os anti-histamínicos são agonistas inversos e não antagonistas dos recetores da histamina, pois estes fármacos ligam-se aos recetores inativos e deslocam o equilíbrio no sentido da inativação, aumentando o número de recetores na conformação inativa. Estes fármacos alteram a atividade intrínseca do recetor, diminuindo-a. Se fossem antagonistas, estes ligar-se-iam de forma indiferenciada aos recetores, impedindo a ligação da histamina de forma competitiva. Para além de atuarem nos recetores estes fármacos têm outras ações, como por exemplo, impedem a libertação de histamina pelos mastócitos, ao estabilizarem as suas membranas(mecanismos não mediados por recetores). Estes fármacos podem ser classificados quanto à sua estrutura química, o que do ponto de vista clinico não tem grande interesse clinico. A classificação funcional é mais útil, sendo estes divididos em dois grandes grupos, os fármacos de 1ª geração e os de 2ª geração, sendo que da 1ª para a 2ª geração houve um aumento da performance do fármaco. Os fármacos de 1ª geração têm efeito sedativo, encontram-se na forma neutra a pH fisiológico, logo são mais lipofílicos, atravessando em maior escala as membranas, inclusive a barreira hematoencefálica, atuando ao nível do SNC. Por serem mais lipofílicos também tem elevados volumes de distribuição. Para além disso, estes fármacos não têm afinidade para a glicoproteína P , um transportador de efluxo do tipo ABC, e têm baixo peso molecular. Estes fármacos têm um baixo tempo de semivida . Têm baixa NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 98 seletividade, atuando noutro tipo de recetores para além dos recetores da histamina, o que contribui em maior escala para a ocorrência de efeitos adversos. Os fármacos de 1ª geração sofrem metabolização hepática e são substrato da enzima CYP450, o que contribui para as interações medicamentosas, com substâncias indutoras ou inibidoras das isoformas do citocromo P 450. Os fármacos de 1ª geração ao atuarem nos recetores H1 e H3 expressos no SNC provocam sedação, aumento do apetite e diminuição da função cognitiva; ao atuarem nos recetores muscarínicos da acetilcolina provocam xerostomia, retenção urinária, taquicardia sinusal e midríase; ao atuarem nos recetores α- adrenérgicos provocam hipotensão ortostática e tontura; ao atuarem nos recetores serotoninérgicos aumentam o apetite; e ao atuarem nos canais de K+ cardíacos aumentam as arritmias ventriculares. Os fármacos de 2ª geração não têm efeito sedativo, estes estão na forma ionizada a pH fisiológico e, por isso, são mais hidrossolúveis, não atravessando em grande escala a barreira hematoencefálica. Por serem menos lipofílicos, têm volumes de distribuição mais baixos. Estes foram ainda modificados de forma a que tivessem maior peso molecular e afinidade para a glicoproteína P . Estes ligam-se ainda em maior escala às proteínas plasmáticas, existindo menos forma livre disponível. Estes têm maior tempo de semivida e são altamente seletivos para os recetores de histamina (menos efeitos adversos). A Cetirizina, a Fexofenadina e a levocetirizina são os fármacos de 2ª geração que são menos metabolizados pelo sistema CYP450. Os fármacos de 2ª geração, apesar de terem menos interações medicamentosas por serem metabolizados em menor extensão pelo CYP450, apresentam mais interações com as substâncias que são substrato da glicoproteína P . Por exemplo, o verapamilo, um inibidor dos canais de tipo L de cálcio, usado para o tratamento da hipertensão, é substrato da glicoproteína P e por isso não pode ser administrado concomitantemente com anti-histamínicos de 2ª geração. Os fármacos de 1ª geração são usados na rinite alérgica, nas dermatites, e na urticária, “off-label” são utilizados como antieméticos, na cinetose (enjoo associado ao movimento), e nas insónias (por não serem tão seletivos). A prometazina é utilizada inclusivamente como sedativo nas crianças e nos idosos. O uso destes fármacos para o tratamento de insónias nos idosos é mais vantajoso, pois podem substituir as benzodiazepinas que causam dependência, tolerância e são substâncias de abuso. A difenidramida, a prometazina e o dimenidrato são usados nas cinetoses. Os anti-histamínicos H2 são utilizados como anti-ulcerosos, ao reduzirem a secreção de HCl. O tripolisant é um agonista inverso dos recetores H3, que se pensa que venha a ser um fármaco órfão promissor, para o tratamento da sonolência diurna (rara), a narcolépsia. Os agonistas H3 são usados no tratamento das insónias, da enxaqueca e da esquizofrenia. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 99 A alcaftadina é o único fármaco no mercado que atua nos recetores H4 usado no tratamento do prurido da conjuntivite e que não está disponível em Portugal. No entanto, este não é seletivo para estes recetores, atuando também nos H1 e nos H2. Cromalinas: As cromolinas não são consideradas anti-histamínicos. Estas inibem a libertação da histamina pelos mastócitos, mas não atuam nos recetores da histamina. Estas diminuem a atividade dos mastócitos e aumentam a estabilidade das suas membranas, ao interferirem com o fluxo iónico, sobretudo com o fluxo de cálcio e cloro. Este facto impede a fusão da membrana das vesiculas contendo histamina com a membrana celular dos mastócitos. Estas são usadas sobretudo no tratamento da asma em crianças por via inalatória, por terem menos efeitos adversos. Mas são apenas usadas em asma com componente alérgica evidente e subjacente. Exemplos: Nedocromil e cromoglicato disódio. 1ª Geração: - Hidroxizina - Prometazina - Tripolidina - Cinarizina - Clemastina - Clorofenoxamina - Di-hexazina - Difenidramina - Dimetideno - Mequitazina - Dimenidrato 2ª Geração: - Bilastina - Cetirizina - Desloratadina - Ebastina - Fexofenadina - Levocetirizina - Loratadina - Mizolastina - Rupatadina Nota: A loratidina é um pró-fármaco, sendo convertida em desloratidina. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 100 Aulas 25 e 26: Farmacologia Da Transmissão Serotoninérgica. Antidepressivos E Ansiolíticos. O humor corresponde a um estado emocional permanente, mantido ao longo do tempo, que pode estar sujeito a variações momentâneas. O afeto corresponde a um estado emocional imediato, momentâneo, temporário. As perturbações do humor, como a depressão, a mania e as perturbações de ansiedade, estão associadas à disfunção das catecolaminas endógenas e mais genericamente das aminas biogénicas, como a dopamina, a serotonina, a norepinefrina, a epinefrina, entre outras. Contudo, as alterações do humor estão também dependentes de outros fatores, como os níveis hormonais, o ambiente social, etc. A ação dos inibidores da monoamina oxidase (MAO), os primeiros antidepressivos desenvolvi dos , aponta para o efeito antidepressivo do aumento dos níveis de serotonina e noradrenalina, lançando as bases da hipótese catecolaminérgica da depressão. Alguns doentes com perturbação unipolar e bipolar do humor exibem alterações funcionais do córtex pré-frontal, na circunvalação do corpo caloso, em localização ventral em relação ao joelho do corpo caloso, pertencente ao sistema límbico. Na fase depressiva há uma diminuição da atividade nesta área, enquanto na fase maníaca há um aumento da atividade nesta área. No SNC, existem várias vias serotoniérgicas e noradrenérgicas essenciais para manter a homeostasia do estado emocional do organismo. As projeções serotoninérgicas têm origem sobretudo nos núcleos de Raffe do tronco encefálico, projetando-se depois para zonas como o cerebelo, o tálamo, o córtex pré-frontal, o estriado e o hipocampo. As vias noradrenérgicas têm origem sobretudo no locus ceruleus e na área tegmental lateral do tronco encefálico, projetando-se para regiões como o cerebelo, o tálamo, o hipotálamo, o córtex pré-frontal e a amígdala. Existem vários fármacos que interferem com o metabolismo e transmissão da serotonina nos terminais nervosos, como os ansiolíticos, os antidepressivos, os anti-eméticos,os pró-cinéticos, os analgésicos nas cefaleias, os fármacos usados na profilaxia da enxaqueca e os psicoestimulantes. A serotonina: A serotonina é obtida a partir da dieta, no entanto, esta não chega a alcançar a corrente sanguínea em quantidades significativas, uma vez que é rapidamente metabolizada até alcançar a circulação sistémica. Por este motivo esta é produzida endogenamente a partir do aminoácido essencial triptofano, também obtido através da dieta. O triptofano é co-transportado para o interior do terminal nervoso juntamente com o sódio (transporte ativo secundário). Sobre o triptofano atua a triptofano-5-hidroxilase, originando-se 5-HTP (5-hidroxitriptofano), sendo este o passo limitante da síntese da serotonina. Seguidamente, sobre a ação de uma descarboxilase aromática , liberta-se uma molécula de CO2 e forma-se a serotonina (5-HT), que é incorporada nas vesiculas sinápticas dos neurónios serotoninérgicos pelo VMAT (“Vesicular Monoamine Transporter”). Aquando a chegada de um potencial de ação ao terminal nervoso, a membrana é Em suma: Com desenvolvimento dos primeiros antidepressivos desenvolveu-se a hipótese catecolaminérgica da depressão, que defende que esta resulta da redução dos níveis de catecolaminas (aminas biogénicas) na fenda sináptica em determinadas regiões do SNC, sendo o córtex cingulado frontal subgenual uma área chave. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 101 despolarizada, com consequente entrada de cálcio. A entrada do catião promove a fusão das vesiculas c om a membrana plasmática, sendo o neuromodelador libertado na fenda sináptica, juntamente com outros neurotransmissores. Quando na fenda sináptica, a serotonina pode ter vários destinos, pode atuar nos seus recetores transmembranares pré e pós-sinápticos, pode ser recaptada de novo para o interior dos neurónios noradrenérgicos, pode ser recaptada para o interior das células da glia, sobretudo dos astrócitos, ou pode ser metabolizada por enzimas especificas, que garantem a sua degradação. A serotonina é metabolizada pela MAO (Monoamina oxidase), da qual existem duas isoformas, a isoforma MAOa que degrada praticamente todas as catecolaminas, e a MAOb, que é mais seletiva para a dopamina . A degradação da serotonina pode ocorrer no interior dos neurónios ou na fenda sináptica. Um dos fármacos que eram bastante utilizados no tratamento da depressão eram os inibidores da MAO. O SERT é um transportador que transporta a serotonina novamente para o interior das células pré- sinápticas e das células da glia, realizando o co- transporte com o Na+, que não é 100% seletivo para a amina biogénica. Por ser rapidamente metabolizada a serotonina apresenta uma curta duração de ação. A reserpina é um fármaco utilizado como inibidor vesicular de monoaminas. Esta inibe o VMAT, o transportador responsável por introduzir as catecolaminas no interior das vesiculas neurotransmissoras. Quando este começou a ser usado como anti-hipertensor, percebeu-se que cerca de 15% dos pacientes apresentavam sintomas de depressão. A serotonina, para além de ser um neurotransmissor e um neuromodelador importante no SNC, é uma hormona periférica importante, uma vez que regula a secreção gástrica, a contração da musculatura lisa do trato gastrointestinal , está envolvida na vasodilatação, no apetite e na contração muscular. Está ainda presente nas plaquetas, onde promove a agregação plaquetária. A distribuição geral da serotonina no organismo faz-se de uma maneira geral da seguinte forma: 90% nas células enterocromafins-like e nos neurónios do plexo mioentérico do trato gastrointestinal, 8% nas plaquetas e 2% no SNC. Existem 14 subtipos de recetores de serotonina. Todos eles são recetores transmembranares metabotrópicos acoplados a proteínas G, exceto os recetores 5-HT3, que são canais iónicos operados por ligando. Nota: a serotonina é por excelência uma hormona e um neurotransmissor estimulante. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 102 Os recetores 5-HTR1 são recetores acoplados a proteínas Gi, que inibem a AC, diminuindo os níveis de cAMP intracelular. Estes são autorrecetores, isto é, estão localizados na membrana pré-sináptica, regulando a libertação do próprio neurotransmissor que os ativa , segundo mecanismos de feedback negativo. No entanto, estes também podem estar localizados na membrana pós -sináptica. Os recetores 5- HTR2 são de três tipos, A, B e C, estão acoplados a proteínas Gq, ativando a PC, que por sua vez hidrolisa o PIP2 em IP3 e DAG, que aumentam a atividade das vias de sinalização pelo cálcio. Os recetores 5-HTR4 são recetores estimulatórios, visto que estão acoplados a proteínas Gs, que ativam a AC, aumentando a quantidade intracelular de cAMP. Os recetores 5-HT1 são expressos sobretudo no SNC e quando estimulados têm um efeito inibitório na transmissão sináptica, contudo também são expressos na musculatura lis a vascular, promovendo a vasoconstrição. Os recetores 5-HT2 são expressos sobretudo no SNC, nas plaquetas e na musculatura lisa do estômago e quando são estimulados promovem a excitabilidade neuronal, a agregação plaquetária e a contração muscular e a secreção. Os recetores 5-HT3 são canais iónicos operados por ligando que estão expressos no SNC e no SNP e quando estimulados provocam a excitabilidade neuronal e a emése. Os 5-HT4 estão presentes sobretudo no SNC e na musculatura lisa do sistema gastrointestinal, promovendo a excitabilidade neuronal e a peristalse quando estimulados. Fármacos: Os fármacos que intervêm na transmissão serotoninérgica não são seletivos, atuam sobre vários neurotransmissores para além da serotonina, como a norepinefrina, a dopamina, a epinefrina, etc. Os fármacos menos seletivos são os mais eficazes no tratamento da dor. Ansiolíticos: Os ansiolíticos mais utilizados, na prática clinica, são a buspirona , que é um agonista parcial dos recetores 5-HT1A, a nefazodona, a trazodona e a ritanserina que são antagonistas dos recetores 5-HT2 e 5-HT3. A buspirona é um agonista parcial dos rectores 5-HT1A da serotonina que é utilizada como ansiolítico, uma vez que não tem propriedades sedativas. Esta não causa dependência, contudo pode causar cefaleias, náuseas e vertigens. Tem um tempo de semivida de aproximadamente 2 a 3 horas. Para além de não causar dependência, nem tolerância, nem sedação, esta não é potenciada pelo álcool, nem influencia a coordenação motora, o que lhe confere vantagens em relação ao uso de benzodiazepinas. As únicas desvantagens são a sua grande latência de efeito (cerca de 2 a 4 semanas) e a sua duração de ação curta (aproximadamente de 8 horas). Antidepressivos: Existem várias classes de antidepressivos, podendo estes ser divididos em 4 grupos. Os antidepressivos tricíclicos ou TCA, os inibidores seletivos da recaptação da serotonina ou SSRIs, os inibidores NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 103 da MAO e os atípicos. Os SSRIs inibem o SERT, impedindo a recaptação da serotonina para o interior do terminal pré-sináptico. O uso crónico destes antidepressivos pode aumentar a agressividade. Os antidepressivos tricíclicos ou TCA inibem tanto a recaptação da serotonina, como também a recaptação de norepinefrina . Ao afetarem mais neurotransmissores são mais eficazes, no entanto possuem muitos efeitos adversos, visto que, para além de atuarem no SERT e no NERT, atuam ainda nos canais de Na+ d.d.v., nos recetores adrenérgicos, nosrecetores de histamina e nos recetores muscarínicos da acetilcolina . Os TCA ao serem menos seletivos são mais eficazes no tratamento da dor, e por isso são utilizados na profilaxia da enxaqueca. Os inibidores da MAO, diminuem a degradação da serotonina, permanecendo esta durante mais tempo na fenda sináptica. Estes já não são utilizados, pois são muito pouco seguros. A inibição da MAO pode levar à formação de um composto, a tiramina (composto que também existe no queijo e nos enchidos), que é um composto simpaticomimético, causando crises hipertensivas. Os antidepressivos atípicos têm vários mecanismos de ação. Antidepressivos tricíclicos: imipramina, desipramina, amitriptilina, notriptilina, clomipramina. SSRIs: fluoxetina, fluvoxamina, paroxetina, citalopram. Inibidores da MAO: moclobemida. Atípicos: bupropriona, mirtazapina, trazodona, agomelatina, anfetamina, metilfenidato, modafinil . Mecanismo de ação e latência de efeito: se administrarmos um agonista dos recetores de serotonina este atua sobre os recetores 5-HTR1 que são inibitórios, diminuindo ainda mais a libertação de serotonina na fenda sináptica e é por esta razão que temos de acompanhar os doentes nas primeiras semanas, pois os sintomas podem piorar (exacerbação dos sintomas). No entanto, a longo prazo há down- regulation dos recetores, por hiperestimulação, e há aumento da transmissão serotoninérgica , pois deixa de existir o mecanismo de feedback negativo sobre a libertação de serotonina, e é por este motivo que NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 104 existe um período de latência apreciável. Os antagonistas que atuem sobre os autorrecetores aumentam a libertação da serotonina na fenda sináptica, ao impedirem a inibição sobre a libertação das vesiculas. Antidepressivos tricíclicos: Os TCA são divididos em dois grupos, as aminas terciárias e as aminas secundárias. As aminas terciárias estão ligadas a três grupos substituintes diferentes, ou seja, nenhum átomo de hidrogénio está ligado ao átomo de azoto. Estas são mais seletivas para o SERT. Nas aminas secundárias o átomo de azoto está ligado a um átomo de hidrogénio e a dois grupos radicais. Estas atuam tanto sobre o NERT como sobre o SERT. Os TCA têm muitas reações adversas, provocam sedação (por atuarem nos recetores de histamina), hipotensão ortostática (por serem antagonistas dos recetores adrenérgicos α1), provocam arritmias (por serem inibidores dos canais de Na+ d.d.v.), provocam convulsões por aumentarem em demasia a transmissão noradrenégica. Os TCA ligam-se em grande extensão às proteínas plasmáticas. SSRIs: Estes causam com facilidade sintomas de privação, os sintomas são tanto maiores, quanto menor for o tempo de semivida do composto. A síndrome de abstinência destes compostos manifesta-se por perturbações no equilíbrio, como tonturas, vertigens e ataxia, por perturbações digestivas, como náuseas e vómitos, por perturbações do sono, como insónias e sonhos intensamente vividos, por sintomas do tipo gripal, como fadiga, astenia e mialgia e ainda por outros sintomas, como a ansiedade, a irritabilidade e a agitação. Os sintomas manifestam-se normalmente entre um a três dias após a interrupção do tratamento. Os sintomas são normalmente ligeiros e transitórios. Antidepressivos Atípicos: A dextranfetamina, o metilfenidato e o modafinil têm ação sobre a dopamina, norepinefrina e serotonina, sendo utilizados no tratamento da depressão no idoso e no tratamento da narcolepsia. A dextranfetamina e o metilfenidato ou ritalina são utilizadas no tratamento da síndrome de hiperatividade e défice de atenção. A bupropriona é muito usada na cessação tabágica e na depressão associada à cessação tabágica por interferir com os recetores nicotínicos. Esta tem um mecanismo de ação complexo, pensa-se que esta seja um inibidor fraco da recaptação da dopamina (DAT) e da norepinefrina (NET), que aumente a libertação de norepinefrina e serotonina, que seja um antagonista não competitivo dos recetores nicotínicos da Ach. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 105 Apesar deste ser um dos únicos antidepressivos que não reduz a libido, pode predispor para a ocorrência de convulsões. A agomelatina (fármaco recente) pensa-se que restabeleça a transmissão serotoninérgica, dopaminérgica e noradrenégica. Pensa-se que seja um antagonista dos receteores 5-HTR2c e que seja agonista dos recetores de melatonina, fazendo a regulação dos ritmos circadianos (resincronização). Esta tem propriedades ansiolíticas e preserva a função sexual, a libido (quase todos os antidepressivos típicos afetam a função sexual). Os antidepressivos e o tratamento da dor: A utilização dos antidepressivos no tratamento da dor é feita à custa da inibição dos canais de Na+ d.d.v. e portanto sobretudo através dos TCA (amitriptilina, nortriptilina e imipramina). Os seletivos para a serotonina são os menos eficazes (paroxetina, fluoxetina e citalopram), apenas atuam no componente depressivo associado à dor crónica. A dor neuropática provém da lesão direta das fibras nervosas e esta não responde aos AINEs ou aos opiáceos convencionais. Utilizam-se os antidepressivos e fármacos como a gabapentina. Estes atuam sobre os canais de Na+ na via descendente da dor. A trazodona e a venlafaxina são semelhantes aos TCA, mas têm menos efeitos adversos, porque são mais seletivos. Cefaleias: Primeiramente, as cefaleias, vulgarmente chamadas dores de cabeça, podem ser classificadas em primárias e em secundárias. As cefaleias primárias são aquelas que não têm uma causa aparente conhecida e podem ser de três tipos, cefaleias tipo tensão, cefaleias tipo cluster e as enxaquecas. As cefaleias secundárias derivam de uma causa pré-existente, como um tumor intracraniano, uma infeção do SNC, hemorragias subaracnoídeas, rutura de aneurismas, hematomas, AVC, vasculites, etc. As cefaleias tipo tensão são as mais comuns, são leves ou moderadas, são de localização bilateral, não são pulsáteis, não são afetadas pela atividade física, não produzem fotofobia nem fonofobia e não estão associadas a vómitos ou náuseas (ao contrário das enxaquecas). As cefaleias tipo cluster são unilaterais, apresentam-se por uma tensão na região temporal e supra- orbital, associam-se ao lacrimejar, ao corrimento nasal e são de intensidade elevada. As enxaquecas são unilaterais, podem durar entre 4 e 72 horas, mas as alterações da dor são mínimas com o decorrer do tempo, são mais prevalentes no sexo feminino, pois pensa-se que estejam associadas a alterações hormonais. Estas são cefaleias incapacitantes, associadas a náuseas, vómitos, fotofobia e fonofobia. As crises são consideradas frequentes quando ocorrem mais de duas vezes por mês. Para fazer o despiste entre cefaleia primária e cefaleia secundária deve-se fazer uma ressonância magnética e depois iniciar a profilaxia. A reter: É o bloqueio dos canais de Na+ e o aumento da atividade anti-nocicetiva das projeções serotoninérgicas e noradrenérgicas da via descendente que permite que estes fármacos sejam usados no tratamento da dor. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 106 As enxaquecas podem ser precedidas de aura, isto é, uma constelação de sintomas neurológicos que aparecem cerca de 30 a 45 minutos antes da enxaqueca, como zumbidos nos ouvidos (acufenos), alterações de equilíbrio, visão de pontos ou manchas/borrões. As pessoas que têm aura conseguem intervir terapeuticamente de forma mais eficaz, pois conseguem antever aocorrência de uma enxaqueca. A aura é acompanhada de vasoconstrição central, ao passo que a enxaqueca é acompanhada de vasodilatação central. A ativação dos neurónios adrenérgicos provoca vasoconstrição neuronal. A ativação de neurónios serotoninérgicos provoca vasoconstrição e a libertação de mediadores e modeladores que aumentam a sensitização à dor. Pensa-se que as crises de enxaqueca decorram de uma descarga neuronal anormal de serotonina e noradrenalina. Existem várias causas para a enxaqueca como por exemplo comida com muito glutamato, comida com muitos nitratos, comida com muita tiramina, cansaço, stress, alterações hormonais ou até causas genéticas. Durante a enxaqueca há diminuição dos níveis de serotonina plasmáticos e há um aumento da excreção da serotonina na urina. A administração de serotonina venosa melhora a enxaqueca, ao atuar sobre os recetores 5-HT1B e D. A terapêutica farmacológica da enxaqueca centra-se não só na terapêutica da crise, como também na profilaxia. Na crise da enxaqueca, o objetivo da terapêutica é promover o alivio rápido e completo da dor, diminuindo a vasoconstrição e a estimulação nociceptiva perivascular. No tratamento profilático, o principal objetivo é diminuir a frequência e a intensidade das crises, impedindo as variações do tónus vascular e modelando a transmissão neurológica da dor. Para o tratamento das crises são usados os AINEs, os agonistas dos recetores de serotonina e os anti- eméticos, sendo que estes últimos são usados como coadjuvantes. A ergotamina também é utilizada no tratamento das crises. Os triptanos são agonistas dos recetores de serotonina e são usados para o tratamento das crises. O Sumatriptano é o único de primeira geração, pois não atravessa a barreira hematoencefálica, ao contrário dos de segunda geração. Os triptanos têm uma semivida muito curta e uma baixa disponibilidade oral (não são bem absorvidos). Estes para terem efeito têm de ser administrados antes, no período da aura, uma vez que a sua eficácia diminui com a progressão da enxaqueca. A maioria dos triptanos é agonista dos recetores 5-HT1D. Os agonistas destes recetores inibem a vasodilatação dos vasos extracerebrais, diminuindo a síntese de NO, diminuem a descarga dos neurónios sensitivos, e diminuem a descarga de neuropéptidos, como a substância P (SP), o glutamato e o CGRP. Atualmente não existe nenhum fármaco eficaz na profilaxia da enxaqueca . O mais eficaz é o propanolol, um β-bloqueante, que está envolvido na transmissão adrenérgica e não envolvido na transmissão serotoninérgica. Antigamente o topiramato era usado, mas este, causa perda de memória, os TCA também são usados na profilaxia da enxaqueca. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 107 O metisergide foi o único fármaco especificamente desenvolvido para a profilaxia da enxaqueca, mas não é utilizado devido aos seus efeitos adversos (náuseas, vómitos, ganho ponderal, diarreia, dores musculares transitórias, desconforto abdominal e alucinações). Pensa-se que este seja um agonista parcial dos recetores 5-HT2 e um agonista dos recetores 5-HT1B e D. Este promove a vasoconstrição craniana e inibe a inflamação neurogénica. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 108 Aulas 27 e 28: Anestésicos Gerais. Relaxantes Musculares. Anestésicos Gerais: Os anestésicos gerias podem ser divididos em dois grupos, consoante a sua via de administração. Estes podem pertencer ao grupo que é administrado por via inalatória ou podem pertencer ao grupo que é administrado por via intravenosa . No geral, todos os anestésicos gerais têm como principal objetivo diminuir a transmissão glutamatérgica e aumentar a transmissão gabaérgica , diminuindo assim a atividade do SNC. Estes interferem sobretudo com a transmissão sináptica e não com a condução nervosa, pois não afetam os canais iónicos dependentes de voltagem, contrariamente ao que acontecia com os anestésicos locais. Como estes fármacos têm inicio de ação muito rápido não poderiam atuar sobre recetores metabotrópicos, estes atuam sim sobre recetores que são canais iónicos, como os recetores GABA A, os recetores nicotínicos da Ach, os recetores da serotonina (5-HT3) e sobre os recetores do glutamato. Os anestésicos gerais administrados por via intravenosa são os barbitúricos, como o tiopental, o propofol, o etomidato, a cetamina, as benzodiazepinas, os opioides e o droperidol. Os anestésicos gerais que administrados por via inalatória são os gases como o protóxido de azoto e o xénon, e os vapores como o halotano, o isoflurano, o sevoflurano, o desflurano, o enflurano e o metoxiflurano. Um dos importantes mecanismos na cirurgia é o relaxamento muscular, não só para facilitar o procedimento, mas também para que a incisão seja mais fácil, menos lesiva e mais precisa. Ou seja, a diminuição do tónus muscular é crucial. Um grande grupo de anestésicos gerais são gases ou vapores, sendo administrados por via inalatória . Para serem administrados, o doente tem de ser ventilado e entubado, o que implica que haja relaxamento dos músculos respiratórios (sobretudo o diafragma) e dos músculos auxiliares da respiração, com interrupção da respiração espontânea, isto é, a respiração que se opõe à entrada da sonda. Esta via de administração permite ao profissional de saúde controlar a concentração de fármaco que é administrado em cada instante. Esta característica torna os anestésicos gerais inalatórios mais vantajosos, porque para além de se controlar a quantidade de fármaco administrada, quando necessário pode acelerar-se a sua eliminação, forçando a respiração, aumentando a frequência respiratória (são eliminados por expiração). Mecanismo de Ação: Os canais nicotínicos da ACh são inibidos pelo isoflurano e pelo enflurano, e é este mecanismo que está envolvido na analgesia. Os canais de K+ são potenciados pelos anestésicos gerais inalatórios, e é este mecanismo que está na base da amnésia. Nota: Anestesia – diminuição da sensibilidade; Analgesia – diminuição da dor. Existem anestésicos gerais que não são analgésicos. Nota: Os canais de K+ de 2 poros são aqueles que não são dependentes da voltagem, designando-se de K2p. Estes são ativados pelos anestésicos gerais, diminuindo a concentração de K+ intracelular, ocorrendo a hiperpolarização da célula, aumentando o limiar de excitabilidade, diminuindo-se assim a excitabilidade neuronal. Estes canais são muito sensíveis à ação dos anestésicos gerais, às variações de pH e à temperatura. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 109 A reter: Anestésicos Gerais Canais GABAa Canais de K+2p Canais de Glicina Canais NMDA do Glutamato Anestésicos Intravenosos Barbitúricos Potenciam Sem efeito Potenciam Inibem Propofol Potencia Sem efeito Potencia Inibe Etomidato Potencia Sem efeito Potencia Sem efeito Benzodiazepinas Potenciam Sem efeito Inibem Sem efeito Anestésicos gerais voláteis Éter Potencia Potencia Potencia Inibe Derivados do Éter Potenciam Potenciam Potenciam Inibem Hidrocarbonetos hidrogenados Potenciam Potenciam Potenciam Inibem Cetamina Sem efeito Sem efeito Sem efeito Inibe Óxido Nítrico, NO2 Sem efeito Potencia Potencia Inibe Xénon Sem efeito Potencia Potencia Inibe Resumindo: os anestésicos gerais intravenosos estimulam/potenciam os canais de GABA e glicina, exceto as benzodiazepinas,que apenas atuam nos canais GABAa. Os inalatórios potenciam os canais de GABAa, os canais de K+ de dois poros e os canais de glicina e inibem os canais de NMDA. Os barbitúricos e o propofol também inibem os canais de NMDA. A cetamina, o NO2 e o xenon inibem os canais de NMDA. Anestesia Geral: corresponde a uma alteração do estado funcional do sistema nervoso central, de indução rápida e reversão fácil, provocada por fármacos e caracterizada por hipnose, analgesia, ausência de resposta muscular e autonómica à agressão (narcolepsia), impossibilidade de posterior recordação consciente dos acontecimentos peranestésicos (amnesia) e um certo grau de relaxamento muscular. A anestesia é dividida em 4 estados. O estadio I ou Amnesia é a primeira fase da anestesia onde é induzida a anestesia, a analgesia e a amnésia. Seguidamente, segue-se o estadio II ou Delirium, um estado caracterizado pela excitação, pela dilatação das pupilas e pela respiração irregular, um estado muito aflitivo e desconfortante para o doente. O estadio III ou Anestesia cirúrgica é o estado ideal durante o qual se deve fazer a cirurgia e que se caracteriza pela respiração regular seguida de apneia e pelas pupilas mióticas e convergentes, centradas. O estadio IV ou Depressão Medular é o estado mais grave e que nunca deve ser alcançado, uma vez que se caracteriza pela depressão respiratória e cardiovascular. No fundo, as três fases da anestesia consistem na indução, na manutenção e no recobro . Nota: Os anestésicos locais podem funcionar como anestésicos gerais ao atuarem nos canais de Na+ e este seu efeito depende não só da dose, como também da via de administração. No entanto, o seu uso é mais difícil de controlar uma vez que todo o tipo de células excitáveis tem canais de Na+ d.d.v. Assim, os anestésicos locais têm uma segurança baixa e baixa especificidade. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 110 Não há um único anestésico geral que em doses terapêuticas consiga provocar os vários efeitos desejados (relaxamento muscular, sedação, anestesia, analgesia, hipnose, etc.) e por isso usa-se a anestesia balanceada, isto é, conjugação vários fármacos de modo a conseguir provocar os vários efeitos, com as doses mínimas possíveis e o menor número de reações adversas e interações medicamentosas. Na anestesia dissociativa o doente permanece com os olhos abertos e está em respiração espontânea (não é induzida a depressão respiratória); no entanto não responde a estímulos sensitivos e sensoriais. Caracteriza-se por um estado de analgesia profunda em que o doente realiza movimentos involuntários. A anestesia dissociativa consegue-se através do uso da cetamina administrada por via intravenosa . Esta é designada de anestesia dissociativa porque há uma discrepância naquilo em que o doente está a ver e aquilo que está a sentir. Este tipo de anestesia é muito utilizado em doentes com complicações hemodinâmicas, como os idosos, onde há um risco muito grande em deprimir o aparelho cardiovascular. Neste tipo de cirurgia o grau de depressão do centro cardiovascular é muito leve. Na pré-indução da anestesia os anestésicos gerais são administrados por via endovenosa, nasal ou sublingual. O principal objetivo desta fase é diminuir a ansiedade, induzir a amnesia inic ial e potenciar a ação dos restantes anestésicos. É também durante esta fase que são administrados os fármacos que minimizam os efeitos laterais da anestesia (salivação, vómito e bradicardia) e que minimizam a dor pré e pós -operatório. Na indução da anestesia os anestésicos gerais são administrados por via intravenosa, inalatória ou intramuscular. Nesta fase, o doente perde a consciência, os seus reflexos são deprimidos e a via aérea é assegurada pelo uso de relaxantes musculares e pela entubação. Na manutenção da anestesia os anestésicos gerais são administrados pela via intravenosa, pela via inalatória ou por ambas. Durante esta fase faz-se a manutenção da ventilação (espontânea na anestesia dissociativa ou controlada pelo uso de relaxantes musculares e entubação), assegura-se a analgesia pelo uso de AINEs e opioides e garante-se a arresponsividade e amnésia. Os opioides podem aumentar a libertação de histamina pelos mastócitos e basófilos. Anestésicos gerais endovenosos: Os anestésicos gerais administrados por via intravenosa são extremamente lipofílicos, sendo rapidamente absorvidos. Assim, estes anestésicos têm um tempo de latência muito rápido (reduzido tempo de indução), sendo utilizados sobretudo na indução, na sedação e na manutenção da anestesia. Estes anestésicos não provocam a fase excitatória , de delirium tão aflitiva para o doente. Depois de administrados, a sua concentração plasmática e o seu efeito são Nota: Anestésicos gerais endovenosos são usados sobretudo na indução da anestesia e em anestesias de curta duração. Anestésicos gerais administrados por via inalatória são aconselhados sobretudo para a manutenção da anestesia e para cirurgias de longa duração. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 111 muito mais difíceis de controlar/manipular. Estes anestésicos provocam tanto depressão respiratória , como depressão cardiovascular. O tiopental é um barbitúrico, com curta duração de ação e que é metabolizado no fígado. Este diminui a perfusão cerebral e, consequentemente, a pressão intracraniana (pode causa isquemia do SNC, muito pouco seguro). Para além de anestésico geral é um potente anticonvulsivante. Em certas doses diminui a pressão arterial ao diminuir a contratilidade do miocárdio. Consegue também, em certas doses, aumentar a frequência cardíaca. Este anestésico causa depressão respiratória . O etomidato é utilizado para a indução da anestesia , sobretudo em doentes com complicações hemodinâmicas, mas não é recomendado em crianças. Em doses sedativas, tem um efeito mínimo sobre a respiração. Este diminui a taxa de consumo de O2 do cérebro, diminuindo a perfusão e a pressão intracraniana . Este fármaco não tem propriedades analgésicas. Este pode provocar dor à injeção e movimentos mioclónicos. As suas principais reações adversas são as náuseas, os vómitos e a supressão da glândula adrenal. O etomidato é o que tem menos efeitos sobre o sistema cardiovascular. A cetamina é utilizada na anestesia dissociativa . Esta tem propriedades analgésicas importantes, apresenta um efeito broncodilatador potente, preserva os reflexos da via aérea. Esta aumenta a perfusão cerebral e, consequentemente, a pressão intracraniana. Aumenta também a frequência cardíaca, o débito cardíaco e a pressão arterial . Este anestésico é usado sobretudo em crianças e pacientes com complicações hemodinâmicas. Contudo pode provocar alucinações, delirium e pesadelos (é semelhante ao LSD). Apesar de ser administrada maioritariamente por via endovenosa, pode ser administrada por via intramuscular, oral e parentérica. Anestésicos Gerais Inalatórios: A potência dos anestésicos gerais inalatórios mede-se em MACs, ou seja, a concentração alveolar mínima a 1atm que inibe a resposta motora ao estimulo cirúrgico, em 50% dos pacientes. Assim, quanto maior é a potência do anestésico geral, menor é o valor do MAC. Se o MAC for 1 ou maior que 1 quer dizer que o fármaco tem de estar numa percentagem de 100% ou superior no ar inspirado e por isso estes fármacos não podem ser utilizados e administrados sozinhos (precisamos de mais ou menos 21% de O2). Por sua vez, o MAC é inversamente proporcional ao coeficiente de partilha lípido/gás, sendo estecoeficiente crucial para medir a potência. Quanto maior é o valor do coeficiente lípido/gás mais eficaz é o Relembrando: Apesar da sua curta duração de ação, por ser muito lipofílico, tal como as benzodiazepinas, tem um grande tempo de semivida. Pode mesmo ter dois tempos de semivida, um α e um β, sendo o segundo sempre maior que o primeiro. Sofre redistribuição. Nota: MAC, em português CAM, Concentração Alveolar Máxima. Quando falamos de substâncias gasosas, a pressão parcial é diferente de concentração. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 112 anestésico, pois este acumula-se mais no compartimento lipídico, ou seja, nas membranas, não ficando retido no compartimento gasoso alveolar, no fundo é mais rapidamente absorvido. O coeficiente de partilha corresponde à distribuição de um agente, em equilíbrio, entre duas substâncias que se encontram à mesma temperatura, pressão e volume. Quando se diz que se atingiu o equilíbrio, a pressão parcial do anestésico no gás inalado é igual à pressão parcial do anestésico no gás alveolar. Em equilíbrio não há uptake do anestésico do alvéolo para o sangue. O coeficiente sangue/gás refere-se à distribuição do anestésico entre o sangue e o gás à mesma pressão parcial. Este coeficiente é crucial para medir o tempo de indução do anestésico geral. Quanto maior for o valor do coeficiente sangue/gás, maior é o tempo de indução , ou seja, mais lento é o inicio de ação do anestésico geral. Os anestésicos gerais inalatórios diminuem a pressão arterial, ao causarem a diminuição do débito cardíaco e da resistência periférica total, podendo estes também alterar a frequênc ia cardíaca e a contratilidade do miocárdio. Tal como os anestésicos locais endovenosos, estes também causam depressão do centro respiratório. Tal como a cetamina, têm um efeito broncodilatador e adicionalmente deprimem a função muco-ciliar. Estes aumentam a taxa de perfusão cerebral, diminuem a taxa de filtração glomerular, diminuem a perfusão hepática (diminuindo assim o metabolismo) e causam o relaxamento da musculatura uterina. O éter e o clorofórmio foram os primeiros anestésicos gerais voláteis desenvolvidos e utilizados, mas rapidamente foram abandonados, o primeiro por ser inflamável, e o segundo pela sua toxicidade hepática e cardíaca. O protóxido de azoto é um gás inodoro, não inflamável, com uma grande eficácia analgésica . Este é vantajoso, não só pelas suas propriedades analgésicas, mas também porque não irrita as vias respiratórias , não relaxa a musculatura esquelética e não é metabolizado. A sua principal reação adversa é a possibilidade de desenvolvimento de anemia megaloblástica , por diminuição da atividade da metionina sintetase. O halotano é um gás não inflamável e não explosivo, usado como indutor da anestesia nas crianças. Este apesar de ter um elevado valor de coeficiente lípido/gás, e, portanto, uma elevada potência , tem um tempo de indução lento, pois apresenta um valor elevado do coeficiente sangue/gás. Este é vantajoso porque não irrita as vias aéreas, é um potente broncodilatador (reverte o broncospasmo) e provoca pouca agitação. Contudo, diminui o tónus simpático, diminui a pressão arterial e provoca bradicardia sinusal. O halotano pode causar hipertermia maligna (uma doença autossómica dominante que faz com que haja um A reter: O coeficiente lípido/gás prediz a potência do anestésico. Quanto maior for o valor do coeficiente do anestésico, maior é a sua potência e menor é o valor de MAC. O coeficiente sangue/gás prediz a velocidade de indução do anestésico. Quanto maior for o valo do coeficiente, mais lento é o tempo de indução, pois o anestésico fica retido no compartimento vascular. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 113 aumento da temperatura corporal devido à alteração dos mecanismos fisiológicos de regulação da temperatura devido à mutação do gene RYr, um transportador de cálcio do reticulo sarcoplasmático). O isoflurano é também um gás não inflamável e não explosivo usado na manutenção da anestesia . Este praticamente não é metabolizado. Este diminui a pressão arterial ao diminuir a resistência periférica total. É simultaneamente um potente vasodilatador coronário, aumentando a perfusão cardíaca. Apesar do seu efeito broncodilatador, este fármaco provoca irritação das vias aéreas. Concomitantemente, tem a capacidade de aumentar a perfusão cerebral e, consequentemente, a pressão intracraniana. Pode ainda diminuir de modo reversível a taxa de filtração glomerular e, simultaneamente, comportar-se como um relaxante muscular, potenciando os efeitos de outros relaxantes musculares. O desflurano é o que tem o coeficiente sangue/gás mais baixo e, consequentemente, é o que tem mais rápido inicio de ação. Este é usado na manutenção da anestesia . Este não é metabolizado, é irritante para as vias aéreas e é pouco solúvel em gorduras. O sevoflurano é usado como indutor da anestesia . Tem também um baixo valor de coeficiente sangue/gás. Este tem uma função broncodilatadora e relaxante muscular. O xénon é muito vantajoso porque não é metabolizado, tem efeitos cardiovasculares e respiratórios mínimos, está isento de toxicidade hepática e renal, tem um efeito protetor sobre os órgãos e tem uma indução e recuperação rápidas. Contudo, por ser um gás nobre, é muito caro/dispendioso. Devido ao seu baixo valor de coeficiente lípido/gás, é muito pouco potente . Regra geral, os anestésicos gerais voláteis aumentam a perfusão cerebral . Relaxantes Musculares: Os relaxantes musculares podem ser divididos em dois grandes grupos: os centrais e os que atuam na junção-neuromuscular. Estes últimos podem ainda ser divididos em dois grupos, os despolarizantes e os não despolarizantes. Os relaxantes musculares centrais são o diazepam (uma benzodiazepina), o baclofeno (que atua no recetor GABAb, um recetor metabotrópico acoplado a uma proteína Gi), a tizanidina, a ciclobenzaprina e o tiocolquicosido. Os relaxantes musculares que atuam na junção neuromuscular não despolarizantes são o atracúrio, o cisatracúrio, o pancurónio, o rocurónio e o vecurónio. O único relaxante muscular que atua na junção neuromuscular e que é despolarizante é a succinilcolina. Para além destes, existem ainda os inibidores da libertação da Ach que são a toxina botulínica A e B. Os relaxantes musculares não despolarizantes atuam bloqueando competitivamente a ligação da Ach ao seu recetor, bloqueando a atividade ionotrópica dos canais de Ach. Estes relaxantes musculares ligam-se aos recetores, mas não desencadeiam qualquer resposta. Os relaxantes musculares despolarizantes despolarizam a membrana plasmática das fibras musculares, mimetizando a ação da acetilcolina. Estes ligam-se aos recetores, desencadeando uma resposta, que culmina na paralisia muscular. A succinilcolina mimetiza a ação da Ach no terminal pós-sináptico, diminuindo a repolarização, causando fasciculações (contrações pequenas, locais e involuntárias). Os efeitos laterais da succinilcolina são a bradicardia grave, a hipercaliemia, o aumento da pressão craniana e ocular, Xénon: MAC – 0,71 Coeficiente sangue/gás – 0,14 Coeficiente lípido/gás – 1,9 NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 114 as reações de hipersensibilidade, as dores musculares, a hipertermia maligna e a rabdomiólise (lise das células musculares lisas). A toxina botulínica impede a fusão das vesiculas colinérgicas com a membrana do terminal pré - sináptico. A tizanidina atua aonível da medula espinhal. Esta estimula os recetores α2, inibindo a libertação de aminoácidos excitatórios, como o glutamato. A tizanidina é rapidamente absorvida, tendo uma boa biodisponibilidade oral. Tem também um considerável volume de distribuição, ligando-se em 30% às proteínas plasmáticas. A tizanidina é metabolizada maioritariamente pelo sistema CYP450 no fígado, sendo excretada a nível renal. Os seus principais efeitos adversos são a hipotensão, a síndrome de privação e a toxicidade hepática. Esta tem uma janela terapêutica estreita e apresenta elevada variabilidade interindividual, sendo aconselhada a monitorização terapêutica. A ciclobenzapina estimula a libertação de norepinefrina no locus ceruleus, sendo um relaxante muscular e um depressor do SNC. Esta apresenta uma boa biodisponibilidade oral, sendo bem absorvida; liga-se em grande extensão às proteínas plasmáticas; é metabolizada a nível hepático por conjugação com o ácido glucorónico e é eliminada a nível renal. Este provoca taquicardia sinusal, arritmias, EAM (enfarte agudo do miocárdio), AVC (acidente vascular cerebral), efeitos anticolinérgicos e pode prejudicar as atividades física e mental. Esta potencia os efeitos do álcool, dos barbitúricos e das benzodiazepinas. O Tiocolquicosido é um antagonista dos canais GABAa, atuando sobretudo a nível supra- espinhal. Este é rapidamente absorvido e rapidamente metabolizado. Apresenta um grande volume de distribuição e é metabolizado a nível intestinal e hepático em diferentes metabolitos. O tiocolquicosido pode provocar convulsões e é tóxico para o fígado, sobretudo quando administrado em concomitância com AINEs ou paracetamol. Nota: de todas as aulas de Farmacologia Geral, a aula de anestésicos gerais e relaxantes musculares foi para mim a mais difícil de compreender e a mais incompleta, pois envolve vários conceitos e pressupõe a existência de conhecimentos de neurociências consolidados, que não foram corretamente abordados ao longo do semestre nem durante a aula teórica lecionada. Assim, para esta aula aconselho vivamente a leitura do capitulo dos anestésicos gerais do Goodman ou do Golan. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 115 Aula 29: Bases Farmacológicas Da Medicina De Precisão. A resposta aos fármacos dos indivíduos é diferente e está dependente, não só das características de cada um, como dos fatores externos. A variabilidade depende sobretudo das características próprias dos indivíduos, como por exemplo do sistema imunitário, do património genético, etc. A maioria dos fármacos é eficaz em apenas 25-65% dos pacientes. Existem vários tipos de variabilidade . A variabilidade farmacocinética corresponde à variabilidade na absorção, na distribuição, no metabolismo e na excreção (ADME). A variabilidade farmacodinâmica corresponde à variação existente no número e na função dos alvos terapêuticos (recetores, enzimas, etc.), à variação na quantidade de ligando endógeno existente e à variação proteínas de ligação plasmática. Quanto maior a quantidade de ligando endógeno menor é a eficácia do fármaco, uma vez que existem menos locais de ligação disponíveis para o fármaco. A variabilidade idiossincrática corresponde às reações adversas extremamente raras, que ocorrem num grupo muito restrito da população, que são imprevisíveis, que não estão relacionados nem com a dose nem com o mecanismo de ação do fármaco e cuja causa é desconhecida. Estas reações dependem de fatores individuais, como fatores genéticos relacionados com o metabolismo do fármaco e com a resposta imune. A hiperreatividade corresponde a uma resposta aumentada à dose normal do fármaco, ou uma resposta elevada quando o fármaco é administrado em doses mais baixas às normais. A hipersensibilidade corresponde a uma reação adversa normal a um fármaco desencadeada pelo sistema imune do organismo (comumente designadas de reações alérgicas). A tolerância corresponde à perda lenta de eficácia do fármaco ao longo do tempo. O efeito do fármaco pode ser reposto com o aumento da dose. A taquifilaxia corresponde à perda de eficácia repentina do fármaco. A eficácia não é resposta com o aumento da dose, apenas é, se o tratamento for interrompido durante um curto intervalo de tempo. A falta de imunidade garante a ausência de resposta imune contra os antigénios. A resistência corresponde à habilidade dos microrganismos ou das células cancerígenas suportarem o efeito dos fármacos desenhados contra a sua própria ação. Pode ser contrariada através do aumento da dose. Ocorre sobretudo com fármacos que atuam na proliferação celular, como os anti -tumorais, os antibacterianos, os antifúngicos e os antivirais. A variabilidade na resposta a fármacos pode ser influenciada por vários tipos de fatores, sendo os mais importantes os fatores genéticos, ambientais e fisiológicos. O consumo de álcool, o consumo de tabaco e a ingestão de certos alimentos são fatores externos/ambientais que podem induzir a tolerância a certos NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 116 fármacos, ou que podem contribuir para o aumento da incidência de certas reações adversas medicamentosas. Fatores fisiológicos: A idade é um dos fatores que tem um papel preponderante na variabilidade da resposta aos fármacos, devido às várias modificações fisiológicas que o nosso corpo vai sofrendo ao longo do tempo e que alteram a farmacocinética. Nas crianças e nos idosos a secreção gástrica está diminuída, tal como a perfusão sanguínea intestinal. A acloridria e a diminuição do fluxo sanguíneo intestinal contribuem para a diminuição do metabolismo do fármaco e da sua absorção. O aumento do pH gástrico favorece a absorção dos fármacos que são bases fracas e diminui a absorção de fármacos que são ácidos fracos. Nas crianças a síntese de albumina (principal proteína plasmática responsável pelo transporte de fármacos) pelo fígado está diminuída o que pode interferir com a duração de ação, o tempo de semivida e o volume de distribuição do fármaco. Também nas crianças o peso total e o tamanho dos órgãos são mais pequenos e a composição de água corporal é máxima, o que interfere com o volume de distribuição. Nas crianças a permeabilidade da barreira hematoencefálica está aumentada o que pode contribuir para a existência de mais efeitos adversos, uma vez que um maior número de fármacos passa a conseguir alcançar o SNC. Nas crianças com menos de 1 ano a atividade enzimática está diminuída, ao passo que nas crianças com mais de 8 anos a atividade enzimática está aumentada, o que interfere com o metabolismo dos vários fármacos. Nos idosos, tanto a massa do fígado, como a perfusão sanguínea hepática estão diminuídas, o que diminui o metabolismo e a excreção dos fármacos, alterando a sua farmacocinética. Nas crianças o pH da urina está diminuído o que aumenta a excreção de fármacos ácidos. Nos idosos o número de nefrónios funcionais e o fluxo sanguíneo renal estão diminuídos o que interfere com a excreção dos fármacos. Tanto nas crianças até aos 6 meses, como nos idosos a taxa de filtração glomerular (TFG) está diminuída, alterando a permanência dos fármacos no organismo, condicionando a sua excreção. Com a idade aumenta a quantidade de massa gorda corporal, o que contribui para o aumento do volume de distribuição e para a acumulação de fármacos lipofílicos, como por exemplo, as benzodiazepinas. O género também influencia a farmacocinética. O pH gástrico é ligeiramente superior nas mulheres, relativamente aos homens. O tempo de trânsitointestinal também é superior no género feminino, o que altera a absorção de muitos fármacos. Nas mulheres a percentagem de massa gorda é NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 117 superior, o que contribui para a acumulação de fármacos lipofílicos nas reservas lipídicas. A taxa metabólica basal é mais baixa nas mulheres, logo o metabolismo dos fármacos está diminuído. Para além disso, nas mulheres existe menos quantidade de enzimas de fase II. Nas mulheres a TFG, a secreção tubular e a reabsorção tubular são menores que nos homens. A gravidez influencia fortemente a farmacocinética. Nas mulheres grávidas a secreção gástrica está diminuída, o fluxo sanguíneo está aumentado (devido ao aumento do débito cardíaco), o esvaziamento gástrico está diminuído e a peristalse intestinal também está diminuída. Todos estes fatores alteram a absorção dos vários fármacos. Na gravidez a massa gorda total aumenta, tal como o volume total do organismo e a produção de albumina diminui, o que interfere com o volume de distribuição dos fármacos. Na gravidez a atividade do sistema CYP450 está diminuída, mas contrariamente o fluxo sanguíneo hepático está aumentado o que permite manter um equilíbrio na metabolização hepática dos fármacos. Nas grávidas, a excreção dos fármacos está aumentada, pois o fluxo sanguíneo renal também está aumentado. Fatores Patológicos: Várias doenças comprometem a farmacocinética dos fármacos. Na enxaqueca o esvaziamento gástrico está diminuído. Nas doenças inflamatórias do intestino, como a Doença de Crohn e a Colite Ulcerosa, na falência cardíaca por doença cardíaca, na síndrome nefrótica e nos estados infeciosos, a absorção intestinal está comprometida. Nas doenças hepáticas e renais a produção de proteínas, como a albumina e a 1α -glicoproteina ácida, está comprometida. Nas meningites (inflamação das meninges que envolvem o SNC) a permeabilidade da barreira hematoencefálica está alterada. Nas infeções, na hipotermia, na insuficiência cardíaca e nas doenças hepáticas a atividade do sistema CYP450 e o fluxo sanguíneo hepático estão abaixo do normal. Na insuficiência cardíaca, nas infeções, na hipotermia e nas doenças renais a TFG está diminuída. Na síndrome nefrótica a albumina é perdida pela barreira de filtração glomerular (proteinúria). Insuficiência hepática: - A diminuição da síntese de albumina e de α1-glicoproteina ácida aumenta a fração livre do fármaco disposta a exercer a sua ação, mas também sujeita à degradação. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 118 - A redução do fluxo sanguíneo hepático, a redução da atividade enzimática (as de fase I são as mais afetadas, as de fase II quase não sofrem alteração), a redução da atividade dos transportadores dos canalículos biliares e dos sinusoides hepáticos e a redução da produção e secreção de bílis no duodeno diminui a clearance hepática, o que aumenta a biodisponibilidade dos fármacos, por redução do efeito de primeira passagem. - Embora o mecanismo ainda não seja bem conhecido, a insuficiência renal pode culminar em insuficiência hepática. Insuficiência Renal: - A proteinúria (aumento da perda de proteínas, incluindo a albumina na urina), aumenta a porção de fármaco livre no plasma, mas aumenta a quantidade de fármaco associado a proteínas na urina, o que pode interferir sobretudo com os fármacos que atuam a nível renal. Para além disso, se a perda de proteína não for compensada, diminui a pressão oncótica sanguínea, predispondo à ocorrência de edemas. - A diminuição do fluxo sanguíneo renal e, consequentemente, da TFG, diminui a clearance renal, aumentado o tempo de semivida dos fármacos. - Na insuficiência renal, há também alteração nos transportadores e enzimas que participam no metabolismo dos fármacos. Obesidade: - O aumento da percentagem de massa gorda aumenta o volume de distribuição dos fármacos lipofílicos (benzodiazepinas, barbitúricos e anestésicos gerais), mas, contrariamente, diminui a sua concentração plasmática. A acumulação dos fármacos hidrofóbicos nas reservas lipídicas, aumenta o seu tempo de semivida, permanecendo mais tempo no organismo. Diabetes: - A glicação não enzimática das proteínas, incluindo da albumina, contribui para o aumento da fração de fármaco livre no plasma. - A nefropatia diabética contribui para a microalbuminuria, o que também aumenta a fração plasmática livre de fármaco. Também associada à nefropatia, a diminuição da TFG, diminui a clearance ranal, aumentando o tempo de semivida. Cronofarmacologia: A cronofarmacologia estuda a influência dos ritmos circadianos e dos ritmos biológicos na farmacocinética e na farmacodinamia. Os ritmos biológicos afetam as funções fisiológicas, como a peristalse intestinal, a mobilidade e o pH gástricos, o fluxo sanguíneo, a concentração plasmática de proteínas e a atividade enzimática, e afetam a severidade das várias patologias (a severidade e sintomatologia das doenças variam ao longo do dia). Exemplo: as catecolaminas, a frequência cardíaca e a pressão arterial média são máximas de manhã. Por exemplo, este facto tem implicância na administração de antiarrítmicos e anti-hipertensivos. A reter: Os ritmos biológicos ajudam-nos a determinar qual o momento do dia é o ideal para a administração do fármaco. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 119 Se a sua administração for feita à noite temos de garantir/assegurar que estes têm uma duração de ação grande o suficiente para ainda fazerem efeito ao acordar. O estudo dos ritmos circadianos e biológicos é importante para determinar a melhor altura para a administração de um determinado fármaco. Fatores Genéticos: O impacto das variantes genéticas, sobretudo dos polimorfismos (alteração de um só nucleótido), é grande ao nível da variabilidade de respostas farmacológicas. Estas variações são importantes quando estão em genes que codificam para enzimas, recetores, proteínas transportadoras, proteínas envolvidas na reparação do DNA, etc. que participam no metabolismo do fármaco, levando à alteração da sua expressão e/ou da sua atividade. Os SNPs (“Single Nucleotide Polimorfisms”) são relevantes, sobretudo quando não existem vias alternativas. Estes podem afetar tanto a metabolização como a ativação (pró-fármacos) dos fármacos. As distribuições polimórficas podem ser de dois tipos, bimodais ou multimodais. Nas bimodais existem apenas dois tipos de pessoas, as que expressam as enzimas de metabolização rápida, e as que expressam as enzimas de metabolização lenta. Nas distribuições multimodais existem várias isoformas com diferentes ritmos de metabolização: as ultrarrápidas, as extensivas, as intermédias, as lentas, etc. O efavirenz é um antirretroviral bastante tóxico para o SNC, estando diretamente relacionado com a neurotoxicidade. Este, normalmente, é metabolizado pela isoforma CYP2B6, do sistema citocromo P450 hepático, sendo convertido no seu metabolito inativo, para que depois possa ser excretado. Contudo, a existência do alelo polimórfico G516T no gene que codifica para a enzima pode comprometer a metabolização do fármaco, com consequente aumento do risco de neurotoxicidade nos doentes que fazem terapêutica com o antirretroviral. Existem polimorfismos que afetam diretamente o alvo terapêutico do fármaco . Por exemplo, o Cetuximab é um antineoplásico que se liga ao EGFR, inibindo a proliferação celular, contudo, quando existem mutações/polimorfismos no gene que codifica para o KRAS, a viade sinalização fica constitucionalmente ativa, mesmo sem a ligação do ligando ao seu recetor ou mesmo com a ligação do fármaco ao recetor a proliferação celular permanece elevada. Nestes casos o teste para a determinação de existência de mutação no gene do KRAS é mandatário. Os HLA (complexo major de imunohistocompatibilidade) são moléculas que distinguem aquilo que é próprio e aquilo que é estranho ao organismo. Estes complexos são muito polimórficos e muitos específicos para cada indivíduo. Por este motivo existem pessoas que têm maior probabilidade de desenvolve r hipersensibilidade a certos fármacos. O teste genético para as HLA é obrigatório nos doentes com SIDA/HIV. Se a presença do alelo HLA-B*5701 for positiva os doentes não podem fazer terapêutica com Abacavir. Existem três modelos que tentam explicar o fenómeno de hipersensibilidade, o modelo hepático, o autoimune e o farmacológico. Nota: Mutações KRAS podem resultar na ativação constitutiva da via de sinalização, propagando- se o sinal proliferativo, mesmo na presença de inibidores EGFR. Esta mutação afeta entre 30 a 50% dos pacientes com cancro colorretal. O teste da mutação KRAS é mandatário. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 120 Os fenómenos apenas genéticos não explicam toda a variabilidade farmacológica existente. A resposta aos fármacos nas diferentes pessoas não depende só de variações da sequência do DNA/genoma, depende também de fenómenos epigenéticos, como a hidroximetilação, a acetilação e a existência de microRNAs, sendo todos eles mecanismos capazes de alterar a expressão e atividade de genes. Quase todas as enzimas, as proteínas que participam na farmacocinética estão sujeitas a fenómenos/mecanismos epigenéticos - Farmacoepignética . A Doxorubicina é um fármaco antitumoral. O gene ABCB1 é o gene que codifica para a glicoproteína P (principal fator que confere resistência à ação dos antitumorais) e quando este gene está hipermetilado há uma menor expressão do transportador de efluxo, o que confere maior sobrevivência aos doentes quando fazem terapêutica com este antineoplásico. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 121 Aula 30: Mecanismos Gerais De Hepatotoxicidade E Nefrotoxicidade Induzida Por Fármacos. A toxicidade farmacológica tem implicações a vários níveis. Tem implicações na saúde, na adesão à terapêutica por parte dos doentes, a nível económico (por exemplo, as reações adversas e o seu tratamento são dispendiosos; a maioria dos estudos clínicos e pré-clinicos são realizados para a avaliação da toxicidade dos fármacos). Efeito adverso é qualquer efeito negativo derivado da administração do fármaco. Inclui as reações adversas derivadas da toma de doses terapêuticas do fármaco e as reações que derivam do uso de doses superiores/sobredosagens, ou de incorretas administrações. As reações adversas são os efeitos negativos que derivam da toma de doses terapêuticas do fármaco e que não ocorrem em todos os indivíduos (não incluem as sobredosagens). Existem vários fatores de risco que contribuem para a toxicidade. Fatores relacionados diretament e com o fármaco (tipo, dose, duração da terapêutica, interações medicamentosas), relacionados com o ambiente (toxinas, poluentes, dieta, álcool, tabaco), relacionados com o próprio organismo (idade, género, doenças, gravidez, polimorfismos genéticos). Todos estes fatores de risco afetam a farmacocinética, a atividade dos recetores e os mecanismos de reparação e antioxidantes, o que aumenta o risco de toxicidade. A toxicidade farmacológica pode ser de classificada de várias formas. Pode ser dependente da dose, pode ter várias durações (aguda ou crónica), pode ser ou não previsível consoante está ou não (idiossincrática) relacionada com o mecanismo de ação do fármaco, pode ter vários graus de severidade, pode afetar diferentes órgãos (isoladamente ou em simultâneo) e pode ter diferentes mecanismos (on-target , off-target, mediada por metabolitos reativos, imunomediada, idiossincrática). Toxicidade on-target: este tipo de toxicidade resulta da ligação do fármaco ao seu recetor, desencadeando uma resposta. Esta toxicidade ocorre quando o fármaco é administrado em doses superiores ao normal (overdoses), alterando a farmacocinética e a farmacodinâmica, ou quando o fármaco atua no seu recetor expresso em tecidos que não são o alvo terapêutico (ex.: a sedação derivada do uso de anti- histamínicos, a rabdomiólise derivada do uso de Estatinas, a diarreia derivada do uso de antibióticos). Este tipo de toxicidade está sempre relacionado com o mecanismo de ação do fármaco. Toxicidade off-target: este tipo de toxicidade resulta da ligação do fármaco ao recetor que não é o seu alvo celular e está diretamente relacionada com a seletividade do fármaco (quanto menos seletivo for o fármaco, maior a probabilidade de desenvolver toxicidade off-target). Exemplos: a ação dos antagonistas adrenérgicos β1 sobre os recetores β2, induzindo a broncoconstrição; a ação dos antagonistas muscarínicos M3 sobre os recetores M2, induzindo a taquicardia; a ação dos anti-histamínicos H1 de primeira geração sobre os canais de K+, induzindo taquicardia; a ação dos antifúngicos sobre o colesterol endógeno, provocando danos renais. Toxicidade mediada por metabolitos reativos: este tipo de toxicidade resulta das reações de metabolitos derivados do metabolismo do fármaco, com as proteínas celulares. A bioativação dá origem a dois tipos de metabolitos reativos, os eletrofílicos (moléculas com défices de eletrões que têm afinidade por espécies iónicas) e os radicais livres, sendo as principais enzimas envolvidas neste processo NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 122 o CYP450, a mieloperoxidase e a PGH sintetase. Os metabolitos reativos induzem dano celular de forma não covalente, através da peroxidação lipídica, da formação de radicais livres, da depleção do glutatião, da modificação de grupos proteicos, ou induzem dano celular de forma covalente, reagindo com o DNA, proteínas, lípidos, carbohidratos e outras macromoléculas. O aumento do risco da bioativação é induzido pelos indutores do CYP e pela depleção de moléculas antioxidantes, como o glutatião. Exemplo: a interação do NABQUI derivado do metabolismo do paracetamol com as proteínas e o DNA celulares. Toxicidade mediada pelo sistema imune: este tipo de toxicidade pode manifestar- se de duas formas, por reações de hipersensibilidade ou através de reações autoimunes. Nas primeiras existem três teorias que as tentam explicar. A teoria do heptano diz que o metabolito ou o fármaco não conseguem por si próprios desencadear a ativação do sistema imune, é necessário que estes se liguem a determinadas proteínas para constituírem um complexo que é reconhecido como antigénio estranho pelos linfócitos e macrófagos. A teoria do dano diz que o fármaco ou metabolito, quando provocam dano celular desencadeiam a ativação e a resposta do sistema imunitário. A teoria farmacológica diz que o próprio fármaco ou os metabolitos derivados do seu metabolismo conseguem ativar diretamente as células do sistema imunitário. Os fármacos podem desencadear todos os tipos de reações imunes, desde a I à IV. A penicilina ao reagir com a IgE na superfície dos mastócitos, desencadeia a libertação de histamina, conduzindo a reações como a urticária, a broncoconstrição e a hipotensão – reações imunes do tipoI. As reações imunológicas do tipo III provocam comummente glomerulonefrite, pela formação de imunocomplexos que se depositam nos tecidos. O sistema imunitário pode passar a produzir autoanticorpos para as nossas próprias proteínas e não contra o fármaco, desencadeando reações autoimunes. Neste tipo de reações o mecanismo exato é desconhecido. Exemplos: a Metildopa induz a produção de anticorpos anti-Rh, desencadeando uma anemia hemolítica; a Hidralazina e a Isoniazida induzem anticorpos anti-mieloperoxidase, desencadeando uma síndrome semelhante ao lúpus; a Procainamida induz a formação de anticorpos anti-DNA, desencadeando uma síndrome semelhante ao lúpus; o Tielinic induz a formação de anticorpos anti-CYP2C9, causando danos hepáticos. Relembrando: Mecanismos de defesa: - Moléculas antioxidantes: vitamina E, vitamina A, ácido ascórbico (vitamina C), glutatião (GSH, tripéptido de cisteína, glicina e glutamato ou ácido glutâmico), NADPH. - Enzimas antioxidantes: superóxido dismutase (SOD), catálase, glutatião peroxidase, glutatião redutase. - Mecanismos de reparação proteica: redução dos grupos tiol oxidados e as proteínas de choque térmico (chaperonas e protéases). - Mecanismos de reparação do DNA: nucleotide excison reparir (NER), base excison repair (BER), recombinação homóloga. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 123 Toxicidade idiossincrática: corresponde às reações adversas raras (1000 ou 10000 indivíduos), cujo o mecanismo não é óbvio. Este tipo de toxicidade tem uma baixa incidência, é independente da dose, não é previsível, uma vez que o mecanismo subjacente não é conhecido, está diretamente relacionado com as características genéticas individuais únicas (polimorfismos que afetem proteínas envolvidas no metabolismo ou na resposta imune). Exemplos: a impossibilidade de uso do abacavir quando há o alelo HLA-B*5701. Toxicidade hepática: o fígado é o órgão central do metabolismo (está envolvido no efeito de primeira passagem e no processo de biotransformação através das reações de fase I e fase II) e por isso é o alvo primário das reações adversas medicamentosas. A toxicidade hepática pode manifestar-se de diferentes formas (apresentação histopatológica e clínica), por necrose, esteatose (acumulação de gordura), hepatite (inflamação), colestase, e fibrose (cirrose). O dano inicial causado pelos fármacos ou pelos seus metabolitos pode ser diretamente exercido sobre a célula, pode ser realizado indiretamente pela lesão da mitocôndria (lesão do DNA mitocondrial, inibição da fosforilação oxidativa, inibição da β-oxidação) ou pode ser realizado pelo sistema imune. A maioria dos fármacos tem como alvo celular a mitocôndria. Os fármacos podem inibir a DNA polimerase ᵞ, inibindo a produção de DNA mitocondrial, que codifica para as proteínas da mitocôndria, nomeadamente as proteínas envolvidas na cadeia transportadora de eletrões. Os fármacos podem ligar- se a proteínas da cadeia transportadora de eletrões ou às enzimas da β-oxidação, o que pode condicionar a falta de produção de ATP e a ocorrência de esteatose, respetivamente. A lesão pode culminar em MPT (mitochondrial permeability transition), que corresponde à formação de poros na mitocôndria que favorecem a entrada massiva de H+ para a matriz mitocondrial. Este influxo leva à inativação da ATPase, diminuindo a síntese de ATP, culminando na desintegração total da mitocôndria, com saída de proteínas pró-apoptóticas, com ativação dos mecanismos responsáveis pela apoptose. Isto só acontece se ainda existir ATP, uma vez que a apoptose é um processo de morte celular ativo, que implica a presença de energia. A Hepatotoxicidade Intrínseca do Paracetamol: O paracetamol é metabolizado por enzimas de fase II, no fígado, sendo conjugado maioritariamente com o ácido glucorónico ou com grupos sulfato. Na mitocôndria existe uma via minoritária em que o paracetamol é metabolizado pelo CYP (CYP2E1, 1A2 e 3A4), levando à formação de um metabolito tóxico, o NABQUI (metabolito que tem como alvo as proteínas mitocondriais). Se este for conjugado com uma molécula de glutatião é excretado na urina sob a forma de ácido mercaptúrico, caso contrário forma ligações covalentes com as proteínas mitocondriais e com o DNA. A formação de maior quantidade de metabolito reativo em casos de sobredosagem ocorre, uma vez que as outras vias catalisadas por enzimas de fase II estão Relembrando: A mitocôndria é um organelo crucial para a apoptose, para a β-oxidação (degradação lipídica), para a produção de ATP (ciclo de Krebs e fosforilação oxidativa). O gradiente de protões é a força motriz para a produção de ATP. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 124 saturadas e os mecanismos de defesa, como os mecanismos antioxidantes, como o glutatião, já não são suficientes. Ocorre também em casos de uso concomitante de indutores da isoforma CYP2E1, como o álcool. O carbono ativado liga-se ao paracetamol, inibindo a sua absorção. A administração de N-acetil-cisteina leva à formação de maiores quantidades de cisteína, o aminoácido percursor para a síntese de glutatião. Estas são as duas formas de tratar a intoxicação por paracetamol. Quadro característico de hepatotoxicidade pelo paracetamol é um quadro necrótico. Toxicidade Renal: o rim é o órgão responsável pela excreção da maioria dos xenobióticos (substâncias estranhas ao organismo) e por isso está sujeito a processos de toxicidade. Esta toxicidade pode ser classificada de acordo com o compartimento do rim afetado (tubular, glomerular, vasculatura renal), de acordo com a função renal que é afetada (filtração do sangue, formação da urina, equilíbrio ácido base), de acordo com a duração (aguda ou crónica), de acordo com a enzima alterada e de acordo com o mecanismo (imunomediada, intrínseca). Tal como a toxicidade hepática, esta também pode ter diferentes apresentações histopatológicas (apoptose, necrose, perda da bordadura em escova, dilatação do lúmen, fibrose). Existem vários mecanismos de toxicidade direta. O rim controla a volémia do organismo, diminuindo ou aumentando a taxa de filtração glomerular, por dois principais mecanismos, pela produção de prostaglandinas locais que atuam diretamente na arteríola aferente, promovendo a vasodilatação, ou por produção local de angiotensina II, atuando diretamente na arteríola eferente, promovendo a vasoconstrição. Qualquer fármaco que modifique este mecanismo pode alterar a taxa de filtração glomerular, como é o caso dos inibidores da enzima conversora da angiotensina (ACE) e os AINES (que inibem a formação de prostaglandinas). Existem fármacos que precipitam, formando cristais no lúmen do sistema tubular, causando nefrolitíase, reduzindo o lúmen do tubo. Por exemplo, as Estatinas têm como efeito adverso a rabdomiólise, e os produtos de lise do músculo liso precipitam no tubo. Este mecanismo é um mecanismo de lesão indireta uma vez que resulta de um efeito adverso do fármaco. Os aminoglicosídeos quando estão muito aumentados produzem nefrotoxicidade. Ligam-se a fosfolípidos membranares produzindo aductos que Notas: - A cisteína é o aminoácido lim itante para a síntese de glutatião. - O tempo total de absorção do paracetamol é de aproximadamente 4 horas. - A dose ideal de paracetamol são 4000mg e 2000mg nos alcoólicos. A dose única diária de 10g induz hepatotoxicidade e a dose de 25g é letal. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 125 alteram a funcionalidade celular.Existem fármacos que lesam diretamente os túbulos renais dos nefrónios . Existem ainda fármacos capazes de alterar endotélio, promovendo a microangiopatia, como a ciclosporina, a mitomicina C, a quinina e o clopidogrel. Podem ser afetados diferentes organelos e componentes celulares, a mitocôndria, a membrana plasmática, os fosfolípidos, os transportadores proteicos das membranas tubulares, etc. Conseguiste! NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 126 Testa-te Cada pergunta tem 5 alíneas, estando apenas uma correta. Testa-te! No fim vê as soluções e confirma o teu conhecimento! (Exames de 2014/2015; 2015/2016 e 2016/2017) 1 – A qualidade dos medicamentos é controlada pelos fabricantes e pelas agências reguladoras. Qual dos seguintes parâmetros está incluído nesta avaliação? a. AUC; b. Efeito máximo; c. Concentração plasmática; d. Composição; e. Duração de ação. 2 - A avaliação da qualidade de um medicamento inclui uma avaliação: a. Da composição e propriedades físico-químicas; b. Das propriedades farmacocinéticas; c. Das propriedades farmacodinâmicas; d. Das reações adversas; e. De todas as anteriores. 3 - Os padrões de não conformidade na qualidade dos medicamentos incluem: a. Menores concentrações plasmáticas; b. Maior número de reações adversas; c. Maiores doses; d. Menor eficácia; e. Necessidade de maiores doses para produzir os mesmos efeitos. 4 – Um fármaco define-se como um agente capaz de modificar uma atividade fisiológica. Como carateriza a maioria dos fármacos atualmente disponíveis no arsenal terapêutico? a. Têm massa molecular superior a 50 KDa; b. Têm um volume de distribuição na ordem dos 5 L; c. São etiotrópicos; d. São proteínas; e. Atuam em alvos proteicos. 5 - Um fármaco denomina-se medicamento experimental quando se utiliza: a. Com fins terapêuticos para outra indicação que não a aprovada; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 127 b. Com fins terapêuticos numa população que não foi abrangida em ensaios clínicos; c. Com fins experimentais em modelos pré-clínicos; d. Em ensaios clínicos como fármaco de referência; e. Em qualquer tipo de investigação. 6 - A farmacovigilância aplica-se a um novo fármaco: a. Desde as primeiras experiências em modelos não clínicos; b. Desde a primeira vez que o fármaco é utilizado no homem; c. Desde a primeira vez que o fármaco é utilizado em doentes; d. Após a obtenção de AIM; e. Após a sua comercialização. 7 - A razão mais frequente para que 90% de novas moléculas que são produto de investigação não chegue a ser comercializada é: a. Preço de custo muito elevado; b. Reações adversas e toxicidade; c. Falta de eficácia; d. Problemas de absorção, distribuição e eliminação; e. Falta de financiamento para realizar ensaios clínicos. 8 - Dizer que um fármaco tem AIM aprovada em Portugal significa que: a. Está à venda nas farmácias; b. O seu preço é comparticipado pelo estado; c. O seu perfil de benefício–risco é favorável; d. É um fármaco inovador relativamente aos existentes; e. Está comercializado em toda a Europa. 9 - As autorizações de introdução no mercado português de medicamentos: a. São atualmente todas emitidas pela Agência Europeia do Medicamento; b. São emitas sempre pelo INFARMED para todos os medicamentos; c. Podem ser solicitadas a um outro estado membro da CE e posteriormente reconhecidas pelo INFARMED; d. Só as dos produtos de biotecnologia é que são obrigatoriamente analisadas pelo INFARMED; e. Requerem sempre a análise de pelo menos 3 estados membros da CE. 10 - O resumo das características de um medicamento (RCM) é dirigido: a. Às autoridades que avaliam os medicamentos; b. Aos profissionais de saúde; c. Aos doentes; d. A qualquer estudante de farmacologia; e. Ao público em geral e é sinónimo de Folheto Informativo. 11 – A posologia de um medicamento refere-se ao número de vezes e à quantidade de medicamento a ser utilizada. A que se refere “qd” na posologia de um medicamento? a. Quantidade determinada pelos sintomas dos doentes (ex.: situações de agudização); NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 128 b. Toma única diária; c. Quatro vezes ao dia; d. Dose de carga; e. Dependente do ritmo circadiano. 12 – A cronofarmacologia estuda a dependência da resposta farmacológica dos ritmos biológicos. Que fator a ocorrer no período diurno pode influenciar a resposta? a. Pico de cortisol – glucocorticoides; b. Decréscimo da motilidade gástrica – fármacos administrados por via oral; c. Menor taxa de filtração glomerular – fármacos polares; d. Menores níveis de albumina – fármacos que são ácidos fracos; e. Menor capacidade de extração hepática – fármacos lipossolúveis. 13 - Relativamente aos fenómenos de dessensibilização de recetores assinale a resposta correta: a. A dessensibilização rápida de canais iónicos está na base de desenvolvimento de tolerância aos recetores β-adrenérgicos; b. A internalização de recetores é o fenómeno que está na base da dessensibilização rápida de canais iónicos; c. A degradação lisossómica está envolvida na reciclagem rápida de recetores acoplados a proteínas G; d. A reciclagem endossómica está envolvida na reciclagem rápida de recetores G metabotrópicos; e. As β-arrestinas fosforilam resíduos de cisteína presentes nos canais iónicos operados por ligando sendo responsáveis pela dessensibilização rápida destes canais. 14 – A dessensibilização de recetores pode estar na base do desenvolvimento de tolerância aos fármacos. Sobre os fenómenos de dessensibilização assinale a opção verdadeira : a. A dessensibilização homóloga envolve mais que um recetor; b. A reciclagem endossómica rápida, de canais iónicos operados por ligando, ocorre devido à exposição a uma elevada concentração de agonista; c. Decorrem da exposição crónica ou a concentrações elevadas dos ligandos; d. Podem incluir a refratariedade, que é definida como o aumento do número de recetores na membrana; e. Podem incluir a up-regulation dos recetores, que ocorre devido a exposições crónicas a um agonista. 15 - Assinale a afirmação correta: a. A down-regulation de recetores explica o desenvolvimento de tolerância a fármacos como a cafeína; b. A dessensibilização de recetores é um dos fenómenos que está na base do desenvolvimento de taquifilaxia e tolerância aos fármacos β-adrenérgicos; c. A down-regulation dos canais α4β2 nicotínicos explica o desenvolvimento de dependência à nicotina; d. A up-regulation de recetores ocorre por exposição crónica aos seus agonistas; e. Os fenómenos de down e up-regulation de recetores são fenómenos de dessensibilização rápida. 16 - A up-regulation de recetores é um mecanismo que visa a homeostasia celular. Qual a afirmação que melhor caracteriza este fenómeno? a. Explica o desenvolvimento de tolerância a antagonistas após exposição crónica; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 129 b. Explica o desenvolvimento de tolerância a fármacos como os agonistas β-adrenérgicos; c. Ocorre em resposta a uma exposição crónica a agonistas inversos; d. É um fenómeno exclusivo para a exposição a agonistas totais; e. Ocorre em resposta à exposição crónica a agonistas parciais. 17 – Os recetores estão sujeitos a fenómenos de regulação fisiológica comimplicações relevantes na resposta aos fármacos. O que caracteriza o fenómeno de down-regulation de recetores? a. Decorre da exposição crónica ao antagonista; b. Pode justificar a tolerância à cafeína; c. É um fenómeno de refratariedade; d. Manifesta-se após um período curto de exposição ao fármaco; e. Deve-se a uma exposição crónica ao agonista. 18 - A down-regulation de receptores é um mecanismo que visa estabelecer a homeostasia celular. O que é correto afirmar relativamente a este fenómeno? a. É responsável pela taquifilaxia após uso regular de agonistas β2 adrenérgicos; b. Pode levar a uma diminuição do efeito broncoprotector dos agonistas β2 de longa duração de ação; c. Ocorre apenas em receptores que possuem atividade constitutiva; d. É o mesmo que reciclagem endossómica rápida; e. É um processo rápido com uma duração de segundos-minutos. 19 – Os fármacos que interagem com recetores podem comportar-se como antagonistas competitivos. Isto significa que: a. Diminuem a atividade constitutiva do recetor; b. Se ligam ao centro alostérico do recetor para inibir a sua atividade; c. Possuem atividade intrínseca entre 0 e 1; d. Só têm interesse terapêutico na presença de um excesso de agonista fisiológico; e. Se comporta como um agonista inverso. 20 - Os antagonistas competitivos: a. Incluem fármacos como o ácido acetilsalicílico; b. Diminuem a potência dos agonistas sem alterar a sua eficácia; c. Diminuem quer a potência como a eficácia dos agonistas; d. Incluem fármacos como a rivastigmina; e. Ligam-se irreversivelmente aos recetores, os efeitos desaparecem quando o fármaco é metabolizado. 21 - Os antagonistas competitivos: a. Alteram o mecanismo de ação do agonista; b. Alteram a eficácia do agonista; c. Desviam a curva dose-resposta do agonista para a esquerda; d. Ligam-se a um recetor diferente contrariando o efeito fisiológico do agonista; e. Ligam-se ao mesmo local de ação no recetor que o agonista. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 130 22 – O recurso a agonistas parciais revela-se útil no tratamento de dependências. Qual a afirmação que melhor os caracteriza? a. Possuem ação fisiológica contrária à do agonista total; b. Possuem uma atividade intrínseca de 1; c. Não possuem atividade intrínseca; d. Possuem afinidade igual ou superior para o recetor que o agonista total; e. O seu efeito máximo é superior ao do agonista total. 23 - Os agonistas parciais são importantes no tratamento das dependências porque: a. Possuem atividade intrínseca entre o e 1; b. Possuem afinidade e atividade intrínseca 0; c. Possuem atividade intrínseca entre 0 e -1; d. Possuem menor potência que os agonistas totais; e. Têm atividade intrínseca maior que o agonista total. 24 - Qual dos efeitos caracteriza um agonista parcial? a. Menor duração de ação que o agonista endógeno; b. Maior eficácia que o agonista endógeno; c. Menor afinidade que o agonista endógeno; d. Possuir a mesma atividade intrínseca que o antagonista competitivo, mas menor afinidade; e. Comportar-se como antagonista se as concentrações de agonista endógeno forem elevadas. 25 – Os fármacos que são agonistas inversos ligam-se apenas a recetores que possuem atividade constitutiva. Como caracteriza os agonistas inversos? a. Possuem atividade intrínseca negativa; b. Inibem a atividade do recetor por ligação ao centro alostérico do mesmo; c. Inibem a ação fisiológica do agonista total por ligação a um recetor diferente; d. Não possuem atividade intrínseca, mas sim afinidade para o recetor; e. Comportam-se como antagonistas competitivos, uma vez que competem com o agonista total para o local de ligação no recetor. 26 – Os fármacos que interagem com recetores podem comportar-se como agonistas inversos. Isto significa que: a. Possuem atividade intrínseca de valor igual ou superior à do agonista total; b. Atuam exclusivamente em recetores com atividade constitutiva; c. Só têm efeitos funcionais na presença do agonista total; d. Possuem atividade intrínseca entre 0 e 1; e. Possuem afinidade inferior à dos agonistas totais. 27 - Os agonistas inversos: a. Atuando no mesmo recetor têm ações de sentido oposto aos antagonistas competitivo; b. Quando ligados aos recetores aumentam a fração de recetores num estado conformacional ativo; c. Tem atividade intrínseca negativa; d. Só atuam em recetores que possuam locais de modulação alostérica; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 131 e. Desencadeiam uma resposta contrária à do agonista fisiológico atuando em recetores diferentes. 28 - O que é correto afirmar relativamente ao agonista inverso? a. É um tipo de antagonismo competitivo; b. Aumenta a fração de receptores em estado conformacional ativo; c. É desprovido de atividade intrínseca; d. Só se aplica a receptores que possuam atividade constitutiva; e. Desencadeia uma resposta contrária à do agonista fisiológico, atuando em receptores diferentes. 29 – A aplicação de antagonistas fisiológicos revela-se útil em situações de sobredosagem medicamentosa. Como caracteriza os antagonistas fisiológicos? a. Atuam no mesmo recetor que o agonista de maneira a impedir a ação do mesmo; b. Não possuem atividade intrínseca; c. Possuem atividade intrínseca igual à do agonista fisiológico; d. Atuam no mesmo recetor que o agonista, mas têm ações contrárias; e. Atuam em recetores diferentes do agonista e possuem ações contrárias. 30 - Relativamente ao índice terapêutico de um fármaco assinale a resposta correta: a. É diretamente proporcional à sua potência terapêutica; b. Corresponde ao TD50/ED50; c. Calcula-se a partir da curva dose-efeito; d. É igual à sua margem de segurança; e. Deve ser igual ou superior a 1. 31 - O índice terapêutico é um dos parâmetros que permite aferir a segurança dos fármacos. Qual a afirmação que melhor o caracteriza? a. É sinónimo de janela terapêutica; b. Deve ser maior ou igual a 1; c. É a razão entre a dose eficaz e a dose tóxica em 50% da população; d. Se for igual a 5, uma dose cinco vezes superior à dose eficaz produz efeitos tóxicos em 50% da população; e. Expressa-se em %. 32 - O índice terapêutico é um parâmetro que visa avaliar a segurança dos fármacos. O que é correto afirmar relativamente a este parâmetro? a. Corresponde à razão entre a dose eficaz mínima e a dose tóxica mínima; b. Corresponde ao intervalo de concentrações entre a dose eficaz mínima e a dose tóxica mínima; c. Quanto mais elevado for maior a segurança do fármaco; d. É a razão entre a dose eficaz em 50% da população e a dose tóxica em 50% da população; e. É um parâmetro extrapolado a partir da curva dose-efeito do fármaco. 33 – O EC50 é um parâmetro farmacodinâmico extrapolado da curva dose-efeito de um fármaco. Qual a afirmação verdadeira sobre o EC50? a. Utiliza-se para comparar a eficácia de dois fármacos; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 132 b. Define-se como a concentração de fármaco necessária para produzir o efeito máximo; c. Permite comparar a potencia de dois fármacos; d. Permite distinguir entre agonistas totais e parciais; e. Corresponde a 50% da dose necessária para produzir o efeito máximo. 34 - O EC50 é um parâmetro farmacodinâmico que permite estabelecer a comparação entre fármacos. O que significa afirmar que o fármaco A tem um EC50 superior ao fármaco B? a. O fármaco A é mais eficaz que o fármaco B; b. O fármaco B possui maior afinidade para o recetor queo fármaco A; c. O fármaco A possui maior afinidade para o recetor que o fármaco B; d. O fármaco B é mais eficaz que o fármaco A; e. O índice terapêutico do fármaco A é superior ao do fármaco B. 35 – O EC50 é um parâmetro farmacodinâmico extrapolado da curva dose-efeito de um fármaco, e que permite a comparação entre fármacos. Se o fármaco A tiver um EC50 superior ao fármaco B, isto significa que: a. O fármaco A é mais eficaz que o B; b. O fármaco B possui maior afinidade para o recetor que o fármaco A; c. O fármaco A possui maior afinidade para o recetor que o fármaco B; d. O fármaco B é mais eficaz que o A; e. O índice terapêutico de A é superior ao de B. 36 - A afinidade de um fármaco para um recetor é um dos parâmetros que permite avaliar a seletividade do mesmo. Em relação ao conceito de afinidade indique a opção correta: a. Indica se o fármaco é agonista ou antagonista; b. Utiliza-se para avaliar a eficácia dos fármacos; c. Indica a concentração necessária para que o fármaco se ligue a um recetor; d. Permite antever se o fármaco irá ter uma indicação clínica; e. Permite inferir se o fármaco terá efeito terapêutico. 37 - Qual o significado da expressão: “um fármaco possui um EC50 de 1μM”? a. Estamos a avaliar um parâmetro farmacocinético; b. Este fármaco é mais eficaz que outro com um EC50=0,5 μM; c. Com esta concentração obtém-se 50% do efeito máximo do fármaco; d. Esta concentração causa um determinado efeito em 50% da população; e. Este fármaco é menos eficaz que outro com um EC50=0,5 μM. 38 - A janela terapêutica é um parâmetro que avalia a segurança dos fármacos. Dizer que um fármaco tem uma janela terapêutica estreita significa que: a. A sua concentração tóxica máxima está perto da concentração que produz efeito terapêutico; b. A concentração para a qual aparecem efeitos tóxicos está perto da concentração que produz efeito terapêutico; c. Corresponde a um fármaco com um índice terapêutico elevado; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 133 d. O EC50 é igual ao ED50; e. As doses tóxicas são das ordem de 102 vezes superiores às terapêuticas. 39 – Sobre o percurso do medicamento no organismo, é verdade que: a. A circulação entero-hepática determina, em geral, uma maior duração de ação de um fármaco; b. A glicoproteína P transporta fármacos do espaço extracelular para o interior das células; c. A distribuição é especialmente influenciada por compostos existentes no sumo de toranja; d. A depuração renal está aumentada na população pediátrica; e. A secreção tubular não é influenciada por fatores farmacogenéticos. 40 - Um dos principais fatores que condicionam a eficácia dos fármacos é o efeito de primeira passagem. Qual o significado deste efeito? a. Traduz-se num aumento da distribuição dos pro-fármacos; b. É mediado pelo sistema enzimático CYP450 no fígado; c. Aumenta o risco de hepatotoxicidade dos fármacos; d. Aumenta a duração de ação dos fármacos; e. Influencia o parâmetro AUC obtido a partir da curva concentração-tempo. 41 - É uma proteína envolvida no efeito de primeira passagem dos fármacos: a. Glicoproteína P; b. γ-glutamilciclotransferase; c. Albumina; d. Asparaginase; e. Proteína G. 42 - O que permite avaliar o parâmetro AUC (area under the curve)? a. Equipotência de fármacos; b. Concentração eficaz mínima; c. Interação medicamentosa; d. Bioafinidade do fármaco; e. Duração de ação de um fármaco. 43 – O que pode significar um aumento do Tmáx numa curva concentração-tempo? a. Aumento do tempo necessário para atingir o estado estacionário; b. Aumento da concentração máxima; c. Aumento do tempo para atingir metade da concentração máxima; d. Diminuição da depuração do fármaco; e. Diminuição da velocidade de esvaziamento gástrico. 44 - A concentração plasmática de um fármaco em estado estacionário é tanto maior quanto maior for o(a): a. Volume de distribuição; b. Depuração; c. Intervalo de administração entre doses; d. Tamanho do fármaco; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 134 e. Dose de fármaco administrada. 45 - Relativamente ao tempo de semi-vida de um fármaco, é correto afirmar que: a. Pode ser superior ou inferior à duração de ação; b. É diretamente proporcional ao Tmax; c. É diretamente proporcional à clearance; d. É superior ao tempo para atingir o estado estacionário; e. É inversamente proporcional ao volume de distribuição. 46 - O cálculo da dose de carga de um fármaco é dependente: a. Da depuração; b. Da biodisponibilidade; c. Do Tmáx; d. Do volume de distribuição; e. Do intervalo de dosagem. 47 - A concentração vale de um fármaco: a. Refere-se à concentração mínima necessária para produzir um efeito; b. Refere-se à concentração mínima que um fármaco atinge no plasma quando administrado em doses sucessivas; c. É um conceito que se aplica a fármacos administrados em dose única; d. É inferior à concentração mínima; e. É a concentração mensurável imediatamente antes da toma seguinte. 48 - O deslocar da curva concentração-tempo de um fármaco ao longo do eixo das abscissas traduz - se num(a) maior; a. Tempo máximo; b. Tempo de semivida; c. Depuração; d. Velocidade de esvaziamento gástrico; e. Duração do efeito. 49 - O conhecimento dos parâmetros farmacocinéticos é fundamental na definição da posologia dos medicamentos. O que pode afirmar sobre o volume de distribuição de um fármaco muito lipofílico? a. É dependente da via de administração; b. É diretamente proporcional ao peso molecular do fármaco; c. Relaciona-se inversamente com concentração plasmática do fármaco; d. Diminui à medida que aumenta a idade do doente; e. É bifásico nos indivíduos obesos. 50 - O volume de distribuição é um parâmetro extrapolado e não uma propriedade física mensurável. Qual a base para esta extrapolação? a. Volume de água corporal pela qual o fármaco se distribui; b. Débito sanguíneo do órgão-alvo; c. Coeficiente de partição lípido/água; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 135 d. Concentração plasmática do fármaco; e. Capacidade de ligação às proteínas plasmáticas do fármaco. 51 - Relativamente à redistribuição de um fármaco nos tecidos, é correto afirmar que: a. Se aplica aos fármacos muito hidrossolúveis com efeitos no sistema nervoso central; b. Se aplica aos fármacos que são proteínas, como os mABs; c. É diminuída por compostos existentes no chá de hipericão; d. Aumenta a semi-vida de eliminação do fármaco; e. Depende de transportadores da família ABC, como a P-gP. 52 - A ligação dos fármacos às proteínas plasmáticas: a. É o principal fator que condiciona o volume de distribuição de um fármaco; b. É com as globulinas, para a maioria dos fármacos; c. É pouco frequente, mas deve ser conhecida por causa das potenciais interações medicamentosas; d. É com a albumina se os fármacos forem ácidos fracos; e. Tem significado clínico sempre que for >50%. 53 - Qual dos seguintes enzimas catalisa reações de Fase II da biotransformação dos fármacos? a. Sulfotransferases; b. Glicoproteína-P; c. Oxidases; d. Alfa1-glicoproteína ácida; e. Hidrolases. 54 - Qual dos seguintes fatores pode favorecer a clearance hepática de um fármaco? a. Interação medicamentosa; b. Idade; c. Insuficiência cardíaca; d. Cirrose hepática; e. Obesidade. 55 - A excreção renal constitui a principal forma de depuração de fármacos, especialmenteos polares. O que é correto afirmar relativamente à excreção renal? a. Ocorre no glomérulo por filtração para a maioria dos fármacos; b. É inferior na urina acídica fármacos ácidos-fracos; c. Está aumentada da população pediátrica; d. É independente do pK do fármaco na reabsorção tubular passiva; e. É independente do débito sanguíneo. 56 - Uma das consequências do desenvolvimento de tolerância é a deslocação da curva dose-efeito do fármaco ao longo do eixo dos “X”. Este deslocamento dá-nos indicação: a. Da eficácia do fármaco; b. Da biodisponibilidade; c. Do metabolismo do fármaco; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 136 d. Da dose necessária para produzir um determinado efeito; e. Da duração do efeito. 57 – A relação dose-efeito é um dos princípios gerais da farmacodinamia. Que informação se pode inferir na curva dose-efeito de um fármaco? a. Margem de segurança; b. Duração de ação; c. Biodisponibilidade; d. Afinidade; e. Intervalo de dosagem. 58 - Que informação é possível inferir a partir da curva dose-efeito de um fármaco? a. Margem de segurança; b. Duração de ação; c. Biodisponibilidade; d. Afinidade; e. Intervalo entre administrações. 59 - A deslocação de uma curva dose-efeito ao longo do eixo dos “X” dá-nos indicação: a. Da eficácia do fármaco; b. Da biodisponibilidade do fármaco; c. Da dose necessária para produzir um efeito; d. Da duração de ação do fármaco; e. Da distribuição do fármaco no organismo. 60 - Os recetores metabotrópicos: a. São canais iónicos operados por ligando; b. Ativam ou inibem canais iónicos; c. Medeiam a transmissão celular rápida; d. São recetores com atividade enzimática; e. Não utilizam segundos mensageiros para mediar a transmissão celular. 61 - O transporte paracelular de fármacos: a. É limitado nos capilares do sistema nervoso central; b. É limitado na filtração glomerular; c. É independente do fluxo sanguíneo; d. É facilitado por transportadores ABC; e. Ocorre na maioria dos tecidos epiteliais. 62 - A glicoproteína P: a. Interfere essencialmente com o influxo intracelular de um fármaco; b. É uma proteína de transporte de fármacos no plasma; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 137 c. É responsável por reduzir as concentrações intracelulares de fármacos de muitos grupos farmacológicos diferentes; d. É uma proteína responsável pela resistência a fármacos antineoplásicos porque interfere com a transcrição do DNA; e. É uma proteína que transporta especificamente fármacos corticoesteróides. 63 – Os transportadores controlam o efluxo e influxo de substâncias endógenas e exógenas, mantendo a homeostasia celular. Os transportadores da família (SLC): a. Mediam transporte facilitado e ativo de fármacos; b. Requerem ATP para a sua atividade; c. São exemplos o MDR-1 e o BCRP; d. Estão localizados na fração microssomal da célula; e. São induzidos por fármacos como o ritonavir. 64 - Qual dos seguintes transportadores de fármacos é dependente da hidrólise do trifosfato de adenosina? a. MRP (Multidrug resistance protein); b. PXR (Pregnane X receptor); c. PPAR (Peroxisome proliferator-activated receptor); d. SGLT (Sodium-glucose linked transporter); e. OAT (Organic anion transporter). 65 - O cobicistat é um booster recentemente aprovado como parte integrante da terapêutica para uma infeção crónica. O que é o efeito de boosting em farmacologia? a. Corresponde a uma interação sinérgica; b. Observa-se com a associação paracetamol + N-acetilcisteína; c. Observa-se na associação entre organotrópicos; d. Aplica-se a inibidores do efeito de primeira passagem; e. Traduz-se num aumento da AUC do booster. 66- O efeito “boosting”: a. Corresponde normalmente a uma interação farmacodinâmica; b. Corresponde normalmente a uma indução enzimática; c. Corresponde normalmente a um efeito aditivo; d. Utiliza-se para aumentar a biodisponibilidade; e. Observa-se na associação entre antineoplásicos ciclo-específicos e ciclo-inespecíficos. 67 – Na definição de regimes terapêuticos pode justificar-se a associação de fármacos. O que pode afirmar sobre um potenciador farmacocinético? a. É administrado em doses terapêuticas: b. Aumenta a ativação de pró-fármacos; c. Tem carácter hidrofílico; d. Permite reduzir as doses de um fármaco; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 138 e. Tem como alvo os recetores nucleares. 68 – Os fármacos que são proteínas são únicos na sua forma e função, apresentando manifestas diferenças em relação aos fármacos que são pequenas moléculas. Qual das seguintes características se aplica aos biofármacos? a. Apresentam modesta seletividade para os seus alvos terapêuticos; b. São fármacos com elevado peso molecular e baixa hidrossolubilidade; c. Têm na sua maioria, uma duração de ação que excede as 24 horas; d. São mais propensos a interações do que os fármacos que são pequenas moléculas; e. Têm baixo potencial imunogénico. 69 - A farmacocinética dos fármacos que são proteínas apresenta inúmeras especificidades em relação aos fármacos que são pequenas moléculas. Qual das seguintes afirmações considera correta? a. São eliminados em forma ativa por filtração glomerular; b. Apresentam uma baixa distribuição tecidular; c. São eliminados em forma ativa por secreção biliar; d. O seu catabolismo é principalmente mediado pelos lisossomas; e. Os anticorpos monoclonais são eliminados mais rapidamente que os fatores de crescimento. 70 - Os fármacos que são proteínas constituem uma classe de medicamentos que têm vindo a assumir uma importância crescente no arsenal terapêutico atual, sendo indicados num número significativo de patologias. Qual das seguintes afirmações considera correta? a. A insulina NPH não apresenta qualquer efeito de pico; b. A fibrina constitui o alvo terapêutico do alteplase; c. Os mAbs puros apresentam mais reações adversas que os mAbs conjugados; d. A formação de anticorpos neutralizantes não justifica a necessidade de aumentar a dose do mAb; e. A insulina detemir é uma insulina de ação ultra-lenta. 71 - Relativamente à farmacocinética dos fármacos que são proteínas: a. A pinocitose é um mecanismo de uptake hepático saturável na presença de elevadas doses do fármaco; b. O tempo de trânsito na circulação linfática não afeta de forma apreciável a biodisponibilidade destes fármacos; c. A localização, expressão e turnover do target condicionam a distribuição tecidular destes fármacos; d. O metabolismo mediado pelos lisossomas é a principal via catabólica destes fármacos; e. Os anticorpos monoclonais apresentam uma taxa de eliminação semelhante à dos fatores de crescimento. 72 - Das afirmações, relativas aos fármacos que são proteínas, assinale a que considere ser verdadeira: a. A insulina glargina é uma insulina de ação intermédia, formulada a pH 4 e indicada apenas para administração subcutânea; b. A vasopressina, sendo um biofármaco, não pode ser administrada por via inalatória; c. Os anticorpos monoclonais puros apresentam uma incidência de efeitos adversos semelhante à dos anticorpos monoclonais conjugados; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 139 d. A formação de anticorpos neutralizantes não justifica a eventual inefetividade terapêutica dos anticorpos monoclonais; e. Os seus biossimilares requerem a demonstração de eficácia em ensaios clínicos. 73 - Os fármacosque são proteínas: a. Apresentam elevado peso molecular e elevada biodisponibilidade oral; b. São os únicos fármacos com seletividade para os alvos terapêuticos; c. Têm maioritariamente durações de ação não superiores a 48h; d. São frequentemente metabolizados por conjugação e hidroxilação; e. Apresentam um potencial imunogénico superior ao da maioria dos fármacos que são pequenas moléculas. 74 - Dos fármacos que são proteínas indique o que tem por alvo terapêutico um recetor com atividade tirosina-cinase? a. Etanercept; b. Adalimumab; c. Bevacizumab; d. Tositumomab; e. Gemtuzumab ozogamicin. 75 - A farmacocinética dos biofármacos apresenta inúmeras especificidades. O que considera correto afirmar em relação à eliminação destes fármacos? a. Não são eliminados por excreção biliar; b. A taxa de eliminação do infliximab é inferior à do EGF; c. A pinocitose é um mecanismo de transporte saturável; d. As moléculas catiónicas não sofrem filtração glomerular; e. As proteínas aniónicas são mais propensas à reabsorção tubular. 76 - A insulina foi a primeira proteína humana a ser produzida por tecnologia de DNA recombinante. O que apresentam em comum a insulina regular humana e a insulina glargina? a. São formuladas a pH 7; b. São insulinas de ação lenta; c. Ausência de um “efeito de pico” evidente; d. Apresentam-se sob a forma de soluções límpidas; e. São administráveis através de bomba de perfusão. 77 - Doente diabético tipo 1 dá entrada no serviço de urgência de um hospital central com uma crise de hiperglicemia. Que tipo de insulina considera mais adequada administrar a um doente nestas circunstâncias? a. Insulina NPH; b. Insulina Lispro; c. Insulina Glargina; d. Insulina Degludec; e. Insulina regular humana. NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 140 78 - Relativamente à classificação funcional dos fármacos que são proteínas: a. O infliximab é um mAb anti-TNFα que pertence ao grupo IIa; b. O grupo IIb inclui os fármacos que vão estimular uma via já existente, de que é exemplo a colagenase; c. A larga maioria dos fármacos incluídos nos grupos Ia e Ib são anticorpos monoclonais; d. O alteplase é um fármaco pertencente ao grupo IIb, sendo usado em situações de enfarte agudo do miocárdio; e. O tositumomab é um anticorpo monoclonal puro incluído no grupo IIb. 79 – No seu sistema de classificação funcional, os fármacos que são proteínas são agrupados tendo por base as suas características farmacodinâmicas. Qual das seguintes afirmações considera correta? a. O infliximab é um mAb quimérico que pertence ao grupo IIb; b. A eritropoietina recombinante, estimula uma via já existente, pertencendo ao grupo Ic; c. O omalizumab é um mAb humano, com interesse em situações de asma ligeira; d. A adenosina desaminase e a colagenase estão incluídos no grupo Ic; e. O tositumomab é um mAb conjugado incluído no grupo IIb. 80 – O anticorpos monoclonais são fármacos indiscutivelmente uteis no contexto da patologia oncológica e da artrite reumatoide. Qual das associações que abaixo se apresentam considera correta? a. Bevacizumab – anti-VEGF-A; b. Tocilizumab – anti-TNF-α; c. Cetuximab – anti-HER2-Neu; d. Adalimumab – anti-IL-6R; e. Gentuzumab ozogamicin – anti-CD20. 81 - O que é correto afirmar sobre o trastuzumab? a. Tem como alvo terapêutico o recetor EGFR (ErbB1); b. Distingue-se de um antagonista competitivo pela ausência de atividade intrínseca; c. É um anticorpo monoclonal humanizado com indicação no carcinoma do pulmão; d. Apresenta um tempo de semi-vida superior ao dos mAbs murinos; e. É um inibidor da angiogénese com baixa eficácia em monoterapia. 82 - O Cetuximab é um anticorpo monoclonal ____________. Qual a opção que melhor completa esta afirmação? a. Quimérico; b. Conjugado com um isótopo radioativo; c. Que atua num receptor metabotrópico; d. Que tem por alvo terapêutico o receptor VEGFR2; e. Cujo alvo terapêutico se encontra sobrexpresso no carcinoma da mama. 83 - São alvos de anticorpos monoclonais disponíveis para terapêutica antineoplásica: a. Nucleótido pirimidínicos; b. ABCB1; c. Recetores de fatores de crescimento do epitélio; d. Recetores de estrogénio; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 141 e. Caspases. 84 - Das associações que abaixo se apresentam assinale a que considera correta: a. Adalimumab – anti-VEGF-A; b. Cetuximab . anti-TNFα; c. Trastuzumab – anti- HER2-Neu; d. Infliximab – anti-IL-6R; e. Tositumomab - anti-CD33. 85- Os inibidores do VEGF: a. Tem como alvo de atuação um recetor metabotrópico; b. São antagonistas competitivos do recetor do VEGF, desprovidos de atividade intrínseca; c. Incluem fármacos como o rituximab; d. Estão associados a reações adversas como hemorragias gastrintestinais e alterações da cicatrização; e. São anticorpos monoclonais e por isso com menor risco de desencadear reações de hipersensibilidade do que os fármacos que são pequenas moléculas. 86 – Os anti-inflamatórios não esteroides incluem um número muito diversificado de fármacos. Qual a característica comum a todos os fármacos deste grupo? a. Terem atividade anti-pirética; b. Serem antagonistas dos recetores de prostaglandinas; c. Inibirem a síntese de COX-1; d. Inibirem a síntese de COX-2; e. Inibirem a síntese de IL-1 e TNF-α. 87 – A administração repetida de anti-inflamatórios não esteroides pode causar um aumento da pressã arterial. Qual o mecanismo de ação mais relacionado com este efeito? a. Estimulo central do sistema nervoso simpático; b. Atividade agonista parcial dos recetores da aldosterona; c. Inibição da síntese de monóxido de azoto pelo endotélio; d. Inibição do efeito vasodilatador das prostaglandinas na arteríola eferente do rim; e. Inibição da síntese de renina pelas células justaglomerulares renais. 88 – Os anti-inflamatórios não esteroides têm algumas características que os diferenciam. Qual dos seguintes fármacos possui maior risco de causar eventos tromboembólicos? a. Celecoxib; b. Indometacina; c. Naproxeno; d. Ácido acetilsalicílico; e. Ibuprofeno. 89 – Há anti-inflamatórios não esteroides que são utilizados pelas suas propriedades anti-agregantes plaquetárias. Qual das características destes fármacos é responsável por este efeito? a. Inibição seletiva da COX-2; NOVA Medical School Mestrado Integrado em Medicina, 2º Ano Marta Simões, 2016/2017 142 b. Inibição seletiva da tromboxano sintetase; c. Inibição irreversível da COX-1; d. Inibição irreversível da prostaciclina sintetase; e. Antagonismo seletivo dos recetores TXA2. 90 - Em relação aos anti-inflamatórios não esteroides: a. A administração de ibuprofeno pode estar associada ao desenvolvimento do chamado Síndrome de Reye’s em crianças com infeções virais; b. O naproxeno é um fármaco seguro em doentes com elevado risco de hemorragias gastro-intestinal; c. O paracetamol não possui atividade anti-inflamatória porque não inibe as COX; d. A nimesulida apresenta elevado risco de hepatotoxicidade e a sua absorção não é afetada pela presença de alimentos; e. A clonixina está particularmente associada a reações adversas hematológicas. 91 - Médico prescreve a um doente diclofenac, numa dose terapêutica em intervalos de 4 em 4 horas. O doente tem uma hemorragia digestiva alta. Estamos perante que tipo de efeito? a. Um evento adverso (ADE); b. Uma reação adversa medicamentosa (ADR); c. Um efeito idiossincrático; d. Uma reação idiopática; e. Um