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SASKIA ELETROFISIOLOGIA CARDÍACA MÓDULO 3 GUYTON CAPÍTULOS 9 E 10 Introdução e conceitos básicos • Átrios (bomba fraca de reforço): completa o enchimento dos ventrículos • Ventrículos: propelem a força da circulação propriamente dita (direito – cirulação pulmonar | esquerdo – circulação sistêmica) • Pelo lado direito do coração só circula sangue venoso cujo bombeamento é direcionado aos pulmões • Pelo lado esquerdo, só circula sangue arterial, direcionado aos demais tecidos • Sístole: contração • Diástole: relaxamento Anatomia fisiológica do coração • Miocárdio: musculatura atrial e musculatura ventricular (contração mais duradoura que a do músculo esquelético) • Fibras excitatórias e condutoras do impulso nervoso: se contraem fracamente por conterem poucas fibras contráteis, mas tem capacidade de gerar e conduzir o impulso elétrico, gerando os batimentos rítmicos OBS: são todas células musculares *O miocárdio é envolto pelo pericárdio, membrana serosa de tecido epitelial e conjuntivo que tem como objetivo reduzir o atrito do coração com tecidos adjacentes, de modo que haja maior eficiência e menor dissipação de energia na forma de calor. Coração é dividido em endocárdio, miocárdio e epicárdio. O pericárdio é dividido em fibroso e seroso. O pericárdio seroso pode ser visceral (epicárdio) ou parietal. O fibroso é o mais externo. *Valvas: conjunto de válvulas (folhetos) que impedem o refluxo de sangue Abertura: quando o gradiente de pressão é para “tentar abrir a valva” Fechamento: quando o gradiente de pressão é retrógrado, “sangue quer voltar” • Semilunares: nas artérias (pulmonar e aórtica) – impedem o refluxo de volta pros ventrículos – velocidade de fluxo sanguíneo e abrasão maiores • Atrioventriculares: entre o átrio e ventrículo direito (tricúspide – 3 válvulas) entre o átrio e ventrículo esquerdo (mitral ou bicúspide – 2 válvulas) – impedem o refluxo de volta pros átrios OBS²: O coração localiza-se no mediastino médio. OBS³: Calcificação das estruturas valvares (ESTENOSE) – obstrução da passagem de sangue (não fechamento adequado) -> regurgitação sanguínea -> acúmulo de sangue no ventrículo -> hipertrofia (músculo “trabalha mais” pra tentar bombear o sangue pela valva obstruída) *Cordas tendíneas e músculos papilares: os músculos se contraem ao mesmo tempo que os ventrículos e estão presos às valvas AV pelas cordas tendíneas. Estas “seguram as valvas para que elas não abram para cima (em direção aos átrios)”. Ou seja, as valvas só abrem para baixo, de forma passiva (sem gasto de energia) mediante gradiente de pressão. As valvas semilunares não possuem cordas tendíneas, seu mecanismo é desconhecido. Histologia: as fibras se dispõem em malha, de forma estriada, com miofibrilas típicas, de modo que as fibras deslizam juntas durante a contração; as células cardíacas são conectadas umas às outras, isto é, anastomosadas de modo que o miocárdio funciona como um sinciciofuncional (sincício atrial e ventricular). Cada um dos sincícios contrai todas as suas células simultaneamente. Entre eles, há tecido fibroso, cujo objetivo é isolar eletricamente átrios dos ventrículos para que os átrios possam se contrair primeiro. A regulação da contração dos ventrículos após os átrios é dada pelo feixe A-V, composto por células condutoras. Entre as células, há membranas denominadas discos intercalares, onde se localizam as GAP junctions ou junções comunicantes (especializações de membrana compostas por conexinas que permitem a acoplação elétrica - propagação do impulso elétrico célula a célula e passagem de íons). Potencial de ação Não é neural o mecanismo que gera a mecânica cardíaca (ciclo cardíaco), é automático, gerado pelas células do nodo sinusal, localizado na parede lateral superior do átrio direito, próximo à abertura da veia cava superior. (essa parte vai ser melhor explicada à frente) Impulso elétrico (potencial de ação) -> contrações rítmicas -> condução rápida por todo o coração Platô: as células contráteis cardíacas, além dos canais de sódio voltagem-dependentes (abertura e fechamento rápido), possuem canais de cálcio-sódio lentos, que demoram a fechar, permitindo um maior influxo de cargas positivas e, por isso, uma maior tempo de despolarização da membrana, gerando, também, maior força de contração. Além disso, o influxo grande de cargas positivas reduz a permeabilidade da membrana para o efluxo de íons potássio em até 5 vezes, contribuindo para impedir o retorno da membrana ao seu potencial basal. 0,2/0,3 segundos após a abertura, os canais de cálcio lentos se fecham, permitindo que os de potássio se abram e repolarizando a membrana. O período refratário diz respeito ao intervalo de tempo no qual não se pode reexcitar uma área já excitada (corresponde mais ou menos ao período do platô) *Período refratário relativo: pode excitar, mas é mais difícil porque não terminou de repolarizar completamente Íons cácio para a contração muscular: no miocárdio, além do cálcio proveniente do retículo sarcoplasmático (que está em quantidade menor do que no reticulo das células musculares esqueléticas) é necessário que, pelos túbulos T, entre cálcio proveniente do meio extracelular. Os túbulos T no miocárdio são maiores que no músculo esquelético e, em seu interior, possuem mucopolissacarídeos com carga negativa capazes de aderir ao cálcio e levá-lo ao interior da fibra quando necessário. Além disso, o cálcio que entra no citosol proveniente do meio extracelular contribui para a abertura dos canais de rianodina e maior saída de cálcio do reticulo sarcoplasmático para o citosol. Dessa forma, torna-se essencial para a contração muscular cardíaca uma concentração ideal de íons cálcio no meio extracelular, visto que os túbulos T conectam este diretamente à célula cardíaca. Ciclo cardíaco: período entre um batimento e outro Cerca de 80% do sangue entra nos ventrículos antes da sístole atrial, no momento em que o miocárdio ta todo relaxado. A sístole atrial é responsável por apenas 20%, apenas melhorando a eficácia do bombeamento ventricular. POR QUÊ? O ventrículo acaba de contrair (muito sangue se acumula nos átrios) -> relaxa o miocárdio todo -> pressão ventricular fica baixíssima na diástole ventricular -> abertura das valvas atrioventriculares pela pressão de sangue no átrio (enchimento rápido dos ventrículos) -> sangue flui da maior pra menor pressão - > valva aberta o sangue vai quase todo pro ventrículo -> sístole atrial só “termina de encher” o ventrículo OBS4: O coração normalmente (repouso) bombeia 300% a 400% a mais de sangue do que o necessário, por isso se os átrios pararem de funcionar, dificilmente isso será percebido, exceto sob esforço físico. Etapas do ciclo: 1. Enchimento dos ventrículos: durante a sístole ventricular acumula-se muito sangue nos átrios, porque as valvas AV estão fechadas. Cessada a sístole o ventrículo assume pressão diastólica muito baixa e a pressão sanguínea atrial é suficiente pra abrir as valvas AV, ocorrendo o enchimento rápido no primeiro terço da diástole ventricular. No segundo terço ocorre o enchimento lento advindo das veias passando diretamente pelos átrios até os ventrículos. No último terço ocorre a sístole atrial e o enchimento adicional de sangue dos átrios para os ventrículos (20% finais). 2. Contração isovolumétrica: Assim que o ventrículo inicia a sístole, sua pressão tem um abrupto aumento, fazendo com que avalva atrioventricular se feche, só que ainda demora 0,02/0,03 segundos pra ter pressão suficiente pra abrir a valva semilunar. Durante esse período não há encurtamento das fibras, pois não há esvaziamento do sangue no ventrículo. 3. Período de ejeção: quando o ventrículo direito alcança 8mmHg e o esquerdo 80mmHg, há a abertura das valvas semilunares e o esvaziamento rápido (no primeiro terço da sístole sai 70% do sangue) e lento (segundo e terceiro terço da sístole) do ventrículo. 4. Período de relaxamento isovolumétrico: relaxamento súbito ventricular, de forma que a pressão cai muito, enquanto a pressão nas artérias ta muito alta porque acabou de receber sangue, por isso há o fechamento das valvas semilunares. O músculo ventricular está relaxando, mas o volume ainda não diminuiu, permanecendo assim de 0,03 a 0,06 segundos. Quando termina de relaxar, permite a abertura das valvas AV. Gráfico: • ONDA P = despolarização atrial • COMPLEXO QRS = despolarização ventricular • ONDA T = repolarização ventricular Regulação do bombeamento cardíaco • Mecanismo de Frank-Starling É intrínseco, pois é determinada pelo retorno venoso (quantidade de sangue que retorna ao coração pelas veias), de forma que quanto maior o retorno venoso, maior o fluxo de sangue nos ventrículos, maior a interação actina e miosina (dispostos de forma mais próxima ao grau ideal de superposição) e, consequentemente, maior a força de contração. “Dentro dos limites fisiológicos, o coração bombeia todo o sangue que retorna a ele pelas veias.” Representação gráfica do mecanismo de Frank-Starling (quanto maior a pressão atrial - retorno venoso maior - o débito ventricular): • Controle do coração pela inervação simpática e parassimpática Apesar de o ritmo dos batimentos cardíacos ser determinado pelo nodo sinusal, a inervação do sistema nervoso autônomo regula a frequência cardíaca de acordo com a necessidade do organismo (por meio dos nervos vagos). Há barorreceptores no arco aórtico e nos seios carotídeos, os quais são terminações nervosas que percebem a variação de pressão arterial fazendo com que a informação seja conduzida por nervos vagos até o tronco encefálico onde se localiza o bulbo, que, por ser centro de controle cardiovascular, estimula o aumento ou diminuição da FC, por meio, respectivamente, do SNA simpático e parassimpático, que ocasionarão aumento ou diminuição da pressão arterial. Simpático: estímulos dos nervos simpáticos fazem com que a FC aumente de 70 a até 250 bpm, aumentando a força de contração e a irrigação sanguínea dos tecidos. A diminuição do estímulo simpático afeta moderadamente o batimento, já que como o coração bombeia normalmente 30% a mais do que o necessário, a desestimulação do simpático faz com que o bombeamento diminua justamente esses 30%. O estímulo simpático aumenta frequência de descargas no nodo sinusal, a excitabilidade das fibras de todo o coração, e a força de contração. As terminações nervosas liberam norepinefrina, que se liga ao receptor adrenérgico beta 1, que aumenta a permeabilidade da membrana ao sódio e cálcio, tornando o potencial de repouso mais positivo e mais fácil de atingir o limiar. Essa entrada maior de cálcio também colabora para estimular a contração muscular. – GERA TAQUICARDIA Parassimpático: estímulos dos nervos parassimpáticos fazem com que o coraçao pare por alguns instantes “escapando” e então batendo a 20 ou 40 bpm. As fibras vagais estão dispersas pelos átrios, por isso, essa regulação afeta mais a FC e não tanto a força de contração (a qual é determinada pelos ventrículos), mas pode diminuir o bombeamento ventricular em 50% ou mais. A estimulação dos nervos vagais faz com que suas terminações liberem acetilcolina, a qual diminui o ritmo do nodo sinusal e reduz a excitabilidade das fibras AV. Grandes estímulos podem fazer com que o coração pare. Além disso, a acetilcolina aumenta a permeabilidade das membranas ao potássio, fazendo com que ele saia da célula gerando hiperpolarização, e tornando o tecido muscular cardíaco menos excitável. No nodo sinusal, o potencial de repouso torna-se mais negativo, fazendo com que seja mais difícil atingir o limiar, podendo até inviabilizar o nodo se o estímulo for muito grande. – GERA BRADICARDIA • Efeito dos íons Potássio: o excesso de potássio no meio extracelular faz com que o potencial da membrana se torne mais negativo, tornando mais difícil despolarizar a membrana, o que diminui o potencial de ação e consequentemente as contrações serão progressivamente mais fracas. Cálcio: o excesso de cálcio faz com que o coração realize contrações espasmóticas, visto que é o íon desencadeante do processo de contração propriamente dito. Já a falta causa a fraqueza muscular. (muito raro distorções na concentração de cálcio) • Efeito da temperatura Com o aumento da temperatura ocorre o aumento da permeabilidade da membrana do músculo cardíaco a íons que regulam a contração, aumentando a frequência cardíaca (FEBRE). Com a diminuição da temperatura ocorre a diminuição da permeabilidade da membrana (mais rígida) diminuindo a frequência cardíaca (HIPOTERMIA). OBS5: O aumento brando na temperatura corporal, como no exercício físico, é positivo, visto que aumenta a força de contração pelo aumento da FC. Excitação rítmica do coração 1. Nodo sinusal: encontrado na parede posterolateral superior do átrio direito, quase não tendo filamentos contráteis, mas sendo importante para a geração do impulso nervoso, conectando-se diretamente com as células musculares atriais para transmitir o potencial de ação. As fibras do nodo sinusal possuem potencial de cerca de -55mV, diferente das fibras ventriculares (-90mV) por conta da maior permeabilidade do nodo ao cálcio e sódio. A autoexcitação das fibras do nodo sinusal dá-se da seguinte maneira: Canais de sódio e cálcio que estão sempre abertos (correntes IF e do tipo T) permitem o influxo desse íon para o meio intracelular, despolarizando a membrana de -55mV para -40mV (LIMIAR). Após isso, como qualquer membrana com potencial acima de -55mV têm os canais de sódio rápidos (voltagem-dependentes) inativados, essa despolarização faz com que sejam abertos os canais lentos de sódio-cálcio, no momento em que atinge -40mV, deflagrando o potencial de ação, que é transmitido para as demais células musculares (contráteis), de forma que esse potencial advindo do nodo sinusal serve como gatilho para que as células contráteis atinjam seu limiar (-90mV -> -55mV -> limiar), abrindo seus próprios canais de sódio voltagem-dependentes (rápidos) e realizando a contração. 100 a 150 ms após sua abertura, os canais de sódio-cálcio do nodo sinusal se fecham, ao passo que os de potássio se abrem, permitindo a repolarização. Entretanto, os canais de sódio sempre abertos não permitem que a membrana permaneça em repouso, fazendo com que o influxo de sódio logo ocasione um novo potencial de ação espontâneo. 2. Vias internodais: conduzem com grande velocidade o impulso do nodo sinusal para os átrios 3. Nodo AV e Feixe AV: localizado exatamente atrás da valva tricúspide, possui reduzido número de junções comunicantes (GAP), de forma que há resistência na passagem de íons de uma célula para a outra, retardando a condução. Esse retardo no nodo AV-feixe AV é de aproximadamente 0,13 segundos, que somados aos 0,03 do nodo sinusal resultam num atraso da contração do ventrículo em relação ao átrio de 0,16 segundos (esse retardo não é prejudicial, é fisiológico); a transmissão nesse feixe AV é unidirecional,impedindo a transmissão de impulso do ventrículo para o átrio OBS6: Há um tecido fibroso que isola o átrio do ventrículo eletricamente. Em casos raros, se o músculo atravessa esse tecido em outro local que não seja o feixe AV, pode ocorrer transmissão do ventrículo para o átrio causando arritmias graves. 4. Fibras de Purkinje: permitem a transmissão mais rápida do sistema, quase espontânea, visto que suas junções comunicantes têm permeabilidade altíssima; têm pouquíssimas miofibrilas (quase não se contraem). Essa transmissão muito rápida permite que os ventrículos se contraiam praticamente ao mesmo tempo. 5. Transmissão do impulso nos ventrículos: quando o impulso atinge a extremidade final das fibras de purkinje ele é transmitido para toda a musculatura ventricular pelas próprias fibras contráteis, mas com menor velocidade que nas fibras, passando desde o endocárdio ao epicárdio. OBS7: Todas essas estruturas condutoras são capazes também de gerar impulso, mas a eficiência do nodo sinusal é muito maior e, por isso, compatível com a vida (*valores aproximados*: nodo sinusal – 70 bpm; nodo av – 40 bpm; fibras de purkinji – 15 bpm). Por isso o nodo sinusal é o gerador, e os demais são condutores. Marcapasso ectópico: quando alguma parte do coração desenvolve descargas rítmicas mais rápidas que o nodo sinusal, assumindo o papel gerador de impulso, gerando sequências anormais de contração. Pode ser ocasionado pelo bloqueio da transmissão do impulso do nodo sinusal para o nodo AV, de forma que este assume a geração do impulso. *Síndrome de Stokes-Adams: Quando ocorre um bloqueio na transmissão do impulso do átrio para o ventrículo, de forma que o átrio vai ser estimulado pelo nodo sinusal, e o ventrículo acaba sendo estimulado pelas fibras de purkinje (escape ventricular). Contudo, após o bloqueio AV, o estímulo pelas fibras só ocorre de 5 a 20 segundos depois, só que a pessoa desmaia após 4 a 5 segundos depois do bloqueio, pela falta de sangue no cérebro. OBS8: Problema no nodo sinusal por algum microinfarto na região (morte de células) -> coloca-se um marcapasso que assume a função de estimulo com a frequência correta. Entretanto, essa frequência é fixa, limitando o paciente de, por exemplo, correr.