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ALUBRAT – Associação Luso Brasileira de Transpessoal CESBLU – Centro de Educação Superior de Blumenau ROGÉRIO CANCIAM MOTIVAÇÕES E PSICOLOGIA – A PRESENÇA DE ABRAHAM A. MASLOW CAMPINAS 2009 ALUBRAT – Associação Luso Brasileira de Transpessoal CESBLU – Centro de Educação Superior de Blumenau ROGÉRIO CANCIAM MOTIVAÇÕES E PSICOLOGIA – A PRESENÇA DE ABRAHAM A. MASLOW Monografia apresentada no Curso de Pós-Graduação em Psicologia Transpessoal Lato Sensu do CESBLU – Centro Educacional de Blumenau & ALUBRAT – Associação Brasileira de Transpessoal como requisito para obtenção do título de Especialista em Psicologia Transpessoal, sob a orientação do Profº Ms. Luiz Carlos Garcia. CAMPINAS 2009 3 Dedico este trabalho para todas as pessoas que não estão motivadas, na sua vida, e para aquelas que já descobriram que a maior motivação começa por si mesma. E aos meus sobrinhos, que nunca deixem de viver a motivação: Thais, Beatriz, Júlia, Mário Francisco, Roberta, Pietra, Carlos Alberto e Gustavo. 4 AGRADECIMENTOS À querida Profª Drª Vera Saldanha, pelo carinho e estímulos em saber dividir o conhecimento na psicologia. Ao meu professor e orientador Mestre Luiz Carlos Garcia, que, pela paciência e dedicação, me ajudou a descobrir a motivação. Ao meu querido Pai e Pastor Dom Bruno Gamberini, pelo apoio e incentivo. Aos meus colegas da pós-graduação pela amizade e partilha nas vivências e no saber. Ao meu amigo e professor José Antônio Lourenço Barros, que sempre disponível e alegre acolheu em seu saber. Eterna gratidão! Ao amigo e companheiro Padre Carlos Roberto Marassato de Moraes, que soube respeitar e apoiar meus estudos e pela amizade. Ao Padre João Luiz Fávero, que acreditou em mim. Aos amigos Marilza, Rodrigo e Rafael Danelon, pela amizade e carinho. Ás minhas amigas professoras e psicólogas Arlete, Célia e Márcia, pela alegria, pelo conhecimento e pela amizade. À minha querida amiga Beth Peres, pelo companheirismo e apoio nas horas difíceis. Ao meu amigo Fernando Souza que, com sua dinâmica, soube compreender e admirar a psicologia. Aos meus queridos amigos da paróquia São Sebastião, Aydê Capovilla, Augusta Fazani, Sidney Costalonga, Filomena e João Amatti. Às secretárias Ariana e Amanda que, com sua simpatia, sempre acolheram meus pedidos. Ao Deus da vida e a Nossa Senhora, meu reconhecimento, gratidão e amor, num louvor eterno! 5 REVOLUÇÃO DA ALMA Ninguém é dono da sua felicidade, por isso não entregue sua alegria, sua paz, sua vida nas mãos de ninguém, absolutamente ninguém. Somos livres, não pertencemos a ninguém e não podemos querer ser donos dos desejos, da vontade ou dos sonhos de quem quer que seja. A razão da sua vida é você mesmo. A tua paz interior é a tua meta de vida, quando acreditares que ainda está faltando algo, mesmo tendo tudo, remete teu pensamento para os teus desejos mais íntimos e busque a divindade que existe em você. Pare de colocar sua felicidade cada dia mais distante de você. Não coloque objetivo longe demais de suas mãos, abrace os que estão ao seu alcance hoje. Se andas desesperado por problemas financeiros, amorosas, ou de relacionamentos familiares busca em teu interior a resposta para acalmar-te, você é reflexo do que pensas diariamente. Pare de pensar mal de você mesmo(a), e seja seu melhor amigo(a) sempre. Sorrir significa aprovar, aceitar, felicitar. Então abra um sorriso para aprovar o mundo que te quer oferecer o melhor. Com um sorriso no rosto as pessoas terão as melhores impressões de você mesmo, que está “pronto” para ser feliz. Trabalhe, trabalhe muito a seu favor. Pare de esperar a felicidade sem esforços. Pare de exigir das pessoas aquilo que nem você conquistou ainda. Critique menos, trabalhe mais. E, não se esqueça nunca de agradecer. Agradeça tudo que está em sua vida nesse momento, inclusive a dor. Nossa compreensão do universo ainda é muito pequena para julgar o que quer que seja na nossa vida. A grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las. Aristóteles, filósofo grego, escreveu este texto “Revolução da alma” no ano 360 a.C. e é eterno. 6 RESUMO _______________________________________________________ CANCIAM, Rogério. MOTIVAÇÕES E PSICOLOGIA – A PRESENÇA DE ABRAHAM A. MASLOW, Orientador: Profº Ms. Luiz Carlos Garcia. Monografia apresentada como requisito para obtenção do título de Especialista em Psicologia Transpessoal, p. 137. __________________________________________________________________ Este estudo, de fundo analítico sobre bases bibliográficas, constitui-se na investigação especialmente de uma obra de Abraham A. Maslow, o “Diário de Negócios, editado por Deborah C. Stephens. Nosso objeto de pesquisas pretende restringir-se à compreensão de alguns elementos fundamentais sobre a Teoria da Motivação de Maslow e suas repercussões de ordem mais direta sobre assuntos com Liderança e Criatividade, mas também busca, nesse mesmo recorte, articular as concepções de Maslow com a Psicologia Transpessoal, sobretudo com as etapas interativas e integrativas relacionadas como os sete passos. Assim, nossa opção foi por efetuar um trabalho de investigação e análise bibliográfico – teóricas, de tal modo que a argumentação aqui apresentada pudesse garantir os nossos propósitos – poder verificar, já com Maslow, a emergência de uma 4ª força no terreno da Psicologia e, especialmente com relação ao mundo das organizações e empresas, recolher informação que também nos possam ajudar a entender melhor a nossa presente época de tantas e radicais transformações. Palavras-chave: Teoria da Motivação em Maslow – Necessidades – Auto-realização – Criatividade – Psicologia Transpessoal. 7 ABSTRACT _______________________________________________________ CANCIAM, Rogério. MOTIVATIONS AND PSYCHOLOGY – THE PRESENCE OF ABRAHAM A. MASLOW. Orientador: Profº Ms. Luiz Carlos Garcia. Monografia apresentada como requisito para obtenção do título de Especialista em Psicologia Transpessoal, p. 137. __________________________________________________________________ This study, characteristicaly analytical based on pertaining bibliography, is an investigation of a specific work of Abraham Maslow, the “Maslow Business reader”, edited by Deborah C. Stephens. As object of research we made the choice for exploring, in a restricted way, the understanding of some fundamental elements about the theory of motivation as proposed by Maslow and its implications, more directly, over subjects such as Leadership and Creativeness; but also we intended to search, in this same delineation, to articulate the conceptions of Maslow with Transpersonal Psychology, mainly with interative and integrative moments. So, our choice carried us to a work of analysis and inquiry on theoretical issues and literature, so as to guarantee our argumentation here developed in relation to our proposals – may proceed the verification of, since with Maslow, the emergence of a so-called 4thforce in Psychological domains; and, related specifically with business and organization world, to achieve some information that may helps us witha better understanding of our present times of so many and radical changings. Key-words: Maslow Theory of Motivation – Necessities – Self-actualization – Creativiness – Transpersonal Psychology. 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................................................................09 CAPÍTULO I MOTIVAÇÃO: O CONTEXTO IMPLICADO................................................................16 CAPÍTULO II MASLOW: O HOMEM E A OBRA...............................................................................35 CAPITULO III ORGANIZAÇÃO E HUMANIZAÇÃO EM MASLOW...................................................48 CAPÍTULO IV MOTIVAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DE NEGÓCIOS – O QUE PODEMOS FORMULAR, SEGUNDO MASLOW?................................................................................................76 CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................123 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................127 ANEXOS SUPLEMENTO: UMA AULA SOBRE MOTIVAÇÃO.................................................130 9 INTRODUÇÃO O tema da ação humana tem sido pensado, refletido e discutido desde sempre. Uma afirmação como essa não é desprovida de fundamentos, uma vez que, com base nos indícios e registros que muitos estudiosos, investigadores e pensadores conseguiram recuperar, descobrir e organizar a respeito de povos e civilizações muito antigos, ou mesmo a respeito de grupos e comunidades em nossa época ainda em plena oralidade primária, muitas informações de peso puderam ser reunidas, através de inúmeros recursos e tecnologias atualmente possíveis que nos serviram para tanto. Assim, sabemos hoje que mesmo as culturas mais afastadas de nós temporalmente, de uma ou outra forma, tematizaram e problematizaram a questão do agir humano. Tanto nas tradições mais propriamente ocidentais, quanto nas que caracterizaram civilizações mais afastadas espacialmente, cujo conhecimento, em termos relativos, é para nós recente, conseguimos perceber o quanto esse assunto tem sido recorrentemente reposto e reiterado dentre as 10 preocupações mais centrais da humanidade em sua história. Representações grafadas em pedra, pictóricas ou esculturais, registros antiqüíssimos em materiais incipientes de escrita e, inclusive, relatos transmitidos oralmente em grupos e comunidades ágrafas (ainda hoje), por diversos meios podemos hoje ter uma noção razoavelmente aproximada do que pôde significar para nossos antepassados o fenômeno que, paulatimente, mas já desde épocas muito antigas, foi se configurando na idéia da agência humana, que torna o ser humano sujeito e autor de atos, atitudes, disposições visívivelmente intencionadas, orientadas e dirigidas, em contraposição a comportamentos mecânicos, reativos, involuntários e/ ou inconscientes. Hoje, tanto as ciências sociais e humanas, quanto, indiretamente, também as naturais e Biológicas têm por um dos objetos privilegiados o agir do homem. Por exemplo, na Filosofia e, por conseqüência, nos saberes sobre os comportamentos de indivíduos e grupos em geral, ação e intenção, causa e motivo, consciência e mecanismo, são, dentre vários outros, aspectos aprofundamente discutidos. O levantar de um braço pode ser explicado em termos voluntários e causais assim como fisiologicamente, e saber com propriedade se esse tipo de explicação ou compreensão diz respeito ao como ou ao porquê tem trazido muito material para a discussão. Saberes como a Antropologia e a História levaram-nos a poder verificar que a noção do si mesmo em termos da identidade agencial, ou seja, a questão da subjetividade, não se apresentou inalterada desde o surgimento da espécie humana, mas, diversamente, colocou-se mais propriamente em função dos desenvolvimentos experimentados pelos grupos sociais. Assim, por exemplo, podemos constatar, por meio do acesso de que hoje dispomos sobre manifestações de comunidades historicamente diferenciadas ao longo do tempo, que os relatos conservados em legendas e mitos, de início, na própria época de sua constituição, versados apenas oralmente (inclusive como primeira função de salvaguarda da memória do grupo) e posteriormente registrados em documentos mais sistematizados, apresentam comunidades e grupamentos sociais em que a diferenciação identitária não é nem nítida nem naturalmente manifesta, mas se mostra como se constituindo aos poucos, gradativamente, em ritmos e medidas diversos segundo o desenvolvimento dos grupos e sociedades. Assim, o sentimento 11 e a noção da coletividade aparecem como preponderantes, o que implicar em termos de apreciar e considerar com bastante cuidado noções que hoje nos parecem bastante simples e naturais, como consciência, autoria, agência, dentre outros. É nesse sentido que, exemplarmente, o surgimento enfático do gênero trágico na literatura e na artística da Grécia Antiga (sobretudo no período clássico) mostra- se, aos nossos olhos de hoje, dentre outros aspectos também fundamentais, como a configuração de um embate no qual a tentativa de uma ação mais pessoal, contrária muitas vezes às determinações coletivas, não fez senão reforçar a figura do destino – o caso mais classicamente discutido, inclusive na Psicologia mesma (propriamente nas interpretações psicanalíticas), é o de Édipo que exatamente faz aquilo que oracularmente havia sido previsto, ainda que medidas tenham sido tomadas para que se não o cumprisse – sem o saber, Édipo dá fim a Laio, seu pai, e casa-se com a própria mãe, Jocasta. Aí prevalece ainda a direção impressa pelo destino e é bem isso o que a tragédia aponta: querer escapar, por modos próprios ao que se anuncia para o futuro, não é senão reforçar e garantir um direcionamento que escapa ao controle humano, e, neste caso, não pode o homem ser visto singularmente como autor e agente, mas bem mais como ser submisso às legislações maiores (que aquelas determinadas por sua interioridade). Enfim, todo este longo preâmbulo nestas páginas introdutórias tem por finalidade fornecer horizonte e o panorama com que nosso tema será introduzido. Exatamente intencionamos verificar o papel e o significado da motivação que induz a um ou outro comportamento ou disposição, tal como ela é proposta e investigada por um psicólogo americano, A. Maslow, cuja obra e atividade fornecem subsídios relevantes para a instalação de outras perspectivas no campo da Psicologia. Mas, esclarecemos, tal investigação será levada com atenção a uma sua obra específica, aquela que, no Brasil, aparece com o título de Diário de Negócios de Maslow cuja organização coube a Deborah C. Stephens. Pretendemos, com isso, encontrar e apresentar respostas para uma pergunta que poderia ser formulada como: qual a relevância e o significado da apropriação, efetuada por A. Maslow para o campo das 12 organizações negociais e empresariais, de suas teorias sobre motivação para a área da chamada Psicologia Transpessoal? Com esta investigação, pretendemos proceder à localização e situação de conceitos e categorias fundantes em seu pensamento, tais como motivação, necessidade, patologia e saúde, liderança e criatividade, psicologia transpessoal, dentre outros. E nosso interesse, com tais procedimentos, reside em se afigurar como bastante importante verificar com adequação e propriedade as implicações da teoria psicológica da motivação, em Maslow, para o campoempresarial, tendo em vista poder contemplar por tal viés a abertura para concepções, formuladas por esse psicólogo, conducentes ao patamar de uma Psicologia que hoje conhecemos como Transpessoal. Em breves palavras, trata-se de verificar a contribuição de Maslow, por um viés específico, para a instalação de uma vertente outra no campo da Psicologia. Todavia, é necessário que ressaltemos que o nosso interesse pelas concepções de Maslow radica-se sobretudo no fato de que, com o pensamento que desenvolveu e propôs para o campo psicológico, ele faz adentrar em um patamar diferenciado que se vai constituir no fortalecimento das condições para a emergência e fundamentação daquela que hoje conhecemos como a 4ª força no campo do saber psicológico – a Psicologia Transpessoal, para a qual a sanidade humana resulta da consideração, de forma integrada e interada, dos vários elementos característicos que parecem constituir o que poderíamos chamar, tal como usualmente se faz, de personalidade. Não se trata, portanto, para nós de explorar uma teoria motivacional que aparece, ainda que de modo não exatamente sistematizado, aplicável, tal como pode sugerir a obra maslowiana, a propósito de estruturas e organizações empresariais e de negócios, a situações definidas por regulações que costumeiramente chamamos econômicas. Tal situação constitui, sem dúvida alguma, tanto quanto outras demais, adequadamente legítima para Maslow. Mas, parece-nos, conforme o pudemos entender, que o que aí podemos encontrar, ao final das contas, é também mais um fator, uma dimensão em que, também, as considerações levantadas por Maslow parecem remeter a um parâmetro mais 13 essencial, mais fundante – a questão da compreensão do alcance daquilo que subjaz à idéia mesma de humanidade. Nosso procedimento, para tanto, consistiu em investigar, em alguma obras que escolhemos como centrais, situações contextuais e, mais especificamente, com base em um texto em que a situação organizacional e empresarial parece mais reiteradamente expressa – o “Dicionário de Negócios de Maslow”, editado por Deborah C. Steplens e publicado em língua portuguesa, no Brasil, em 2003, pela Editora Qualitmark. Com isso, nossa metodologia procurou, por meio da consulta bibliográfica, levantar aspectos conceituais que nos pareciam fornecer condições para entender como se ia constituindo o assunto e terreno tal como trabalhados por Maslow. É, portanto, a nossa monografia uma obra de análise e articulação, esclarecimento e formulação de nexos, de uma vertente ou face do pensamento de Maslow; e ela tem a intenção, tanto quanto podemos, de situar e pensar contextos, alcance e significado numa perspectiva algo crítica, mais do que apenas comentadora. Embora a relação bibliográfica acompanhe nosso trabalho, pensamos que, com respeito à obra – marco frequentemente consultada por nós, é conveniente indicarmos desde já como instituímos aqui nosso modo de referenciação dessa obra – sendo composta de artigos, ensaios, cartas, comunicações, organizados e editados por Deborah C. Stephens -, toda vez que em nossas citações a utilizamos, o “Diário de Negócios de Maslow” aparece referenciado como Stephens (autor), ano e página (quando necessário), uma vez que, na relação bibliográfica, essa obra é introduzida pela entrada correspondente a STEPHENS, Deborah C. Retomamos, após tais esclarecimentos, sinoticamente os objetivos: - verificar como A. Maslow compreende e intervém, com base em sua teoria psicológica, a propósito da situação; - por conseqüência, verificar com sua obra, nesse contexto, vincula-se ao momento atual da Psicologia Transpessoal; - oferecer possibilidades de avanço a respeito da situação analisada. Esperamos, com nossa investigação, obter a articulação de informações de relevância, junto à teoria da motivação de A. Maslow, de modo a levar a compreender, também por esse aspecto, em quê sua contribuição pode ser 14 evidenciada, de forma mais evidente, como essencial para o campo da Psicologia, de uma forma bem informada, integrada e crítica. Os capítulos componentes da obra caracterizam-se da seguinte forma: - o 1º capítulo tem natureza de revisão bibliográfica, com o propósito de oferecer os contextos intelectuais e históricos sobre o pensamento a respeito da Motivação, em geral, procurando introduzir informações de caráter terminológico, conceitual e da histórica do pensamento filosófico (e psicológico) sobre as principais tendências vigentes, de modo a proporcionar elementos para situar a obra de Maslow epistemologicamente. - o 2º capítulo pretende aprofundar contextualmente a atuação de Maslow, tendo por foco diretor a obra de Maslow com relação ao terreno da Motivação e suas implicações e conseqüências, assinalando, no interior dos desenvolvimentos de seu momento, a repercussão de seu pensamento, inclusive no sentido de buscar preparar a emergência de novos patamares na consideração da teoria psicológica, com ressonâncias para a instalação de novos paradigmas – Humanista e Transpessoal. Nesse momento, nossa atenção estará focalizada em depreender as conotações presentes em alguns conceitos centrais utilizados em Maslow, como estrutura, organização e o próprio sentido de humanismo, humanização, bom e bondade. - o 3º capítulo pretende atribuir uma atenção mais centrada, em relação às concepções formuladas por Maslow, à questão da Motivação, tendo por objeto a análise justamente da obra que trata mais especificamente da situação também em relação ao campo mais delimitado dos negócios e empresarial numa situação de organização capitalista de mercado, preparando a consecução, para o 4º capítulo, dos quadros contextualizados até então para efetuar a ponte entre sua obra e a Psicologia Transpessoal. - o 4º capítulo buscará, com base na imbricação, a partir das perspectivas levantadas por Maslow entre motivação e necessidades, formular, num terreno adequado, a atuação desse meio, de forma que, além do tratamento de alguns outros elementos de importância, como criatividade e liderança, e afins, centra nossa atenção para a relevância de sua contribuição a respeito da Psicologia 15 Transpessoal. Aqui, procuraremos, ressalvados os limites próprios pessoais e os trabalho, demonstrar a pertinência da obra maslowiana inclusive junto a construtos teóricos em voga, atualmente, no estudo da Psicologia Transpessoal. A tal capítulo seguir-se-ão as considerações finais de natureza mais conclusivas, o trabalho apresentará, ainda, após as referências listadas como anexo e suplemento, a proposta de elaboração, formulação e operacionalização envolvendo o tema investigado, na forma da Relação entre motivação, Necessidades, Liderança e Criatividade. 16 CAPÍTULO I MOTIVAÇÃO: O CONTEXTO IMPLICADO “Não tenho medo de morrer, tenho saudade de deixar a vida” Tota A investigação que pretendemos aqui desenvolver tem por tema as implicações, ao menos algumas que nos parecem relevantes, a propósito da obra de Maslow com relação à articulação ou envolvimento dos aspectos ligados à Motivação, Criatividade, Auto-Realização e Liderança, no seio e no âmbito do mundo organizacional, notadamente empresarial, tendo por base, sobretudo, o chamado “Diário de Negócios de Maslow”, obra organizada e editada por Deborah O. Stephens reunindo e articulando os pensamentos registrados e as observações elaboradas por Abraham Maslow, num período de sua vida, cuja publicação e conhecimento pelo público, principalmente nas últimas décadas (após a morte de seu autor), têm resultado em desenvolvimentos muito expressivos, porpsicólogos, administradores, gestores, e outros, contribuindo em muito para diversos campos do saber humano sobre o próprio homem. 17 Poderíamos estabelecer, como termos do problema que nos interessa cuidar, a situação da relação entre Motivação e Comportamentos segundo a ótica elaborada e proposta por Maslow e, para nós, justamente o elemento problematizador, aí, reveste-se da preocupação em verificar se essa relação pode, legitimamente, basear, fundar e extrapolar para outros níveis do conhecimento psicológico contemporâneo. Pensamos, com relação a esse aspecto, nas possíveis implicações para o desenvolvimento da Psicologia Transpessoal, como um nível diferenciado do campo psicológico, e nas atualizações que o pensamento Maslowiano, em sua versão e extrapolação para a área organizacional, empreendedora e de negócios, poderia fornecer, seja a que título fôr. Embora saibamos que um trabalho dessa dimensão possa (e deva) contemplar áreas afins de conhecimentos e, institucionalmente, aquelas que mais de perto dizem respeito à perspectiva empresarial, como por exemplo, Relações Humanas, Psicologia do Trabalho, Gestão de Negócios, entre muitas outras, não é escopo deste trabalho delimitar-se segundo essas confirnações. Nesse sentido, embora possa o tema estar sendo delimitado, permanece uma dimensão de generalidade e abrangência, necessária, segundo pensamos, para que se mantenha possível transcender a aplicação do conhecimento psicológico votado, de início, ao campo empresarial para uma dimensão que parece não se ater nem corresponder exatamente à definição de uma área estritamente delimitada. Por várias razões, sobretudo a que se refere às condições de tempo e consecução objetiva, nosso estudo estará limitado a um levantamento de informações de ordem bibliográfica e à analise e, se possível, avaliação do material enfocado. Os critérios, tanto para a análise quanto para a avaliação, estão sendo determinados, nos quadros de nossa pesquisa, principalmente pelos elementos de coerência (interna e externa) do material a ser estudado e investigado em sua relação com a proposta de verificar a possibilidade de seu alcance e extrapolação, conseqüentes, para dimensões outras que apenas a negocial, ainda que, tal como neste momento é – nos possível prever, muitas das situações exploradas o sejam em contextos bem delimitados (aqueles fornecidos pela obra principal em estudo, tal como organizada por Deborah C. Steplens). 18 Acreditamos que não exista maior justificativa para tal empreendimento que o fato de, após ter sido escrito há quase quatro décadas, nas quais as mudanças objetivas, seja de fundo tecnológico quanto filosófico-existencial, parecer-nos prudente e proveitoso verificar em que medida Maslow (aqui tomado em sua singularidade frente a outros pensadores da área que igualmente são considerados como propulsionadores para um novo modelo do conhecimento psicológico) realmente é um contribuidor, ou, mais modestamente, é visto como tal. Trabalhamos com a hipótese de que, com relação a esse aspecto, lidamos com uma situação um tanto híbrida: Maslow, de fato, trouxe e sugeriu contribuições efetivas para o desenvolvimento do conhecimento e do saber sobre o psiquismo humano que oferecem uma abertura considerável; mas, ao mesmo tempo, essa sua dimensão não pode ser sobreestimada, sobretudo por aqueles que querem a todo custo legitimar o curso dos encaminhamentos, de modo a evitar mistificações em nada desejáveis, uma vez que, em isso ocorrendo, as reais contribuições estariam sendo obliteradas. Julgamos que, para iniciar convenientemente a discussão seria de interesse voltar um pouco à conceituação (teórica, filosófica e mesmo etimológica) dos termos e conceitos com os quais nosso estudo procede. Ao mesmo tempo, cremos que, por conta disso, o âmbito da discussão acabará por se tornar mais claro, isto é, teremos ou disporemos dos elementos conceituais para pensar o contexto do problema da motivação. Igualmente, em momento subseqüente, parece-nos também importante pensar o próprio contexto da história do pensador, e, nesse sentido, iremos recuperar alguns elementos que nos soam como significativos acerca do percurso de Abraham Maslow. Somente então estaremos considerando de fato as proposições com que suas teorias se distinguiram e dando andamento ao que nos propomos nesta investigação. O que significa dizer que as pessoas, as mais diferentes possíveis e em situações também muito diversas, chegaram a um estágio tal de motivação que foram capazes de, muitas vezes alterando comportamentos habituais e regulares, 19 disporem-se a adotar outros e enfrentarem mudanças e novidades de modo a conseguir atingir tanto objetivos, metas, estados e situações antes inexistentes bem como criar condições para a consecução e efetivação para tanto? Qual é a compreensão que, usualmente, temos quando ouvimos dizer ou mesmo constatamos que alguém está muito (ou pouco) motivado? Por que, em nossos dias, os estudos de natureza psicológica e filosófica, sobretudo, têm se voltado com tanta freqüência para a investigação daquilo que, comumente, subjaz ao termo motivação? É bem verdade que o interesse por tal assunto (ou tema) sempre se apresentou nas mais diversas considerações, ao longo da história do pensamento sobre as práticas humanas, que se preocuparam tanto com aspectos éticos, morais e pragmáticos quanto com aqueles de natureza fisiológica (basta ver as questões levantadas pelas teorias sobre a ação) vinculados aos elementos determinantes da conduta humana. E, com relação a tais considerações, nos defrontamos com uma longa tradição iniciada, no mundo ocidental, desde os pré-socráticos e atingindo o pensamento da modernidade, cujo clímax, naquilo que nos interessa, chega a residir nos problemas relativos às questões de liberdade, suscitados pelo pensamento iluminista. No conjunto desse universo de observações, podemos considerar, com legitimidade, traços e elementos etimológica e conceitualmento implicados no termo Motivo – como originariamente esclarecedor para esse outro, o de Motivação, que nos interessa para os fins do presente estudo; e aqui o fazemos agora exatamente com o propósito de trazer à cena informações de ordem conceitual para mais adequadamente nos orientarmos. Assim, recorrendo a Abbagnano (1970), encontramos algumas indicações bastante elucidadoras para nos situarmos no contexto adequado de nossa investigação. No verbete dedicada a Motivo, a noção que nos é trazida apresenta-o como “causa ou condição de uma escolha, ou seja, de uma volição ou de uma ação” (1970, p. 655). Trata-se, assim, de uma noção que introduz, ao verificarmos com certo cuidado o seu significado, duplamente dimensões tanto de âmbito externo quanto interno; e isso porque, referindo-se a volição ao campo da vontade e a ação ao do comportamento e da prática, respectivamente, temos como implicação as duas 20 acima referidas dimensões. Enquanto a volição, não colocada em ação, mantem-se fora das vistas do observador (mesmo quando expressando-se uma suposta volição experimentada), o mesmo já não ocorre de tal modo com a ação, a práxis, cuja característica é a de ser observável como comportamento e atitude. Essa “duplicidade” está também presente, na mesma noção, com relação à menção de causa ou condição. Pois é-nos bastante comum, no senso usual, tratarmos o motivo segundo a acepção de causa, razão, que, sem dúvida, são-lhe correspondentes, mas igualmente, não lhe são exclusivas; por exemplo, segundo o autor: “...chama-se alguma vezes movente (Franc. Móbile; al. Triebfeider) o Motivo que não tem caráter “racional”, isto, que não pode ser considerado uma ‘razão’ da escolha. (ABBAGNANO, 1970, p. 655). As informações trazidas, neste Dicionário de Filosofia de Abbagnano, sãoricamente exaustivas e essenciais; contudo, vamos nos restringir, de acordo com nosso interesse, aos aspectos que mais de perto dizem respeito ao objeto de nossa investigação. Tendo passado por algumas formulações historicamente relevantes para a constituição do entendimento contemporâneo desse conceito, inclusive em relação à obra de pensadores cuja repercussão foi bastante grande no terreno da Psicologia, o que nos chama a atenção é o aspecto, ali mencionado e discutido, do papel dos diferentes graus de determinação vinculados ao Motivo, uma vez que o problema que aqui se coloca, com respeito a essa diferenciação, é o problema da liberdade, ou seja, resumidamente, a compreensão do conceito tanto enquanto causa quanto em termos de explicação está correlacionada à presença ou não da situação de liberdade com que se poderia caracterizar um estatuto de humano, de humanidade. Chamamos a atenção para esse ponto porque, a nosso ver, como poderemos observar mais adiante, a questão (ou questões) levantada com o estudo da motivação em contexto, isto é, sobretudo no interior do pensamento da A. Maslow, aqui tematizado, e no âmbito das implicações verificadas nas vertentes e conseqüências daí derivadas, propõe a necessidade de lidarmos, com clareza suficiente, com o conceito de motivação. 21 Aliás, ainda respaldados em Abbagnano (1970), basta seguir o encaminhamento de suas considerações, no referido verbete, a propósito de Dewey, que considerava, em situações cotidianas (isto é, apreciadas segundo a ótica do senso comum), a motivação como uma: “... verdade extrapsicológica” (ABBAGNANO, 1970, p. 655); e que apenas e notadamente, atribuía ao conceito um papel de relevância quando, referindo-se ao ser humano, destacava a pertinência do conceito quando se tratava de desencadear, provocar ou elicitar ações exigidas de modo específico, e, ainda mais, fazia notar que, nessas condições, o Motivo constituiria “... o elemento do complexo total da atividade humana...” (ABBAGNANO, 1970, p. 655 grifo nosso). De acordo com uma concepção desse porte, o motivo poderia ser tomado sobretudo enquanto um instrumento para “...orientar e guiar a conduta humana do que um fator de explicação desta”. (ABBAGNANO cita a obra de onde deriva essa visão – “Humana Nature and Conduct, pps. 199-220). É imprescindível atentar com cuidado e profundidade para esse tipo de orientação teórica, pois Dewey, no campo dos estudos psicológicos desenvolvidos nos E.U.A., serve de referência fundamental para toda uma elaboração posterior por pensadores de peso, dentre os quais também Maslow, na área psicológica. E, enfim, poder ter elementos de modo a perceber que o entendimento adequado do desempenho teórico-experimental de uma figura relevante, como esta, não pode dispensar a apreciação de perspectivas historicamente significativas para o desenvolvimento e efetivação (atualização) dos aparatos e arcabouços conceituais posteriormente colocados em ação. Oras, o estudo e a reflexão daí advinhas trouxeram-nos, com maior interesse então, à apreciação do próprio conceito de Motivação, também presente no referido dicionário (ABBAGNANO, 1970), com o que, após também uma série de observações de grande clareza (apresentando inclusive Schopenhauer como um precursor significativamente determinante), o referido conceito aparece claramente vinculado e expresso em termos da forma de causalidade do motivo, diferenciada de 22 outras formas de causalidade, que, em nossos tempos e em nossos teóricos e pesquisadores, ainda se conserva como essencial e permanece vigente, uma vez que a motivação pode ser e boa medida reconhecida como: “...ação determinante do motivo” (ABBAGNANO, 1970, p. 655). Reproduzimos aqui a enunciação em Abbagnano: “... quaisquer que sejam os limites que se coloquem a tal determinação. Os problemas da Motivação são, por um lado, de natureza psicológica, e concernem ao modo de agir dos motivos enquanto se presta a ser observado pelos instrumentos de que a psicologia dispõe; por outro lado, são de natureza filosófica enquanto concernem os limites ou as modalidades de determinação e, portanto, a liberdade e o determinismo” (1970, p. 655 – grifos nossos). Parece-nos, sem dúvida, que, a despeito da “separação” aí formulada, para os interesses dos estudos psicológicos são essenciais todos os elementos apontados. E isto porque, apesar da indispensabilidade das comprovações do/de comportamento, por meio de um instrumental apropriado (aspecto ao qual voltaremos mais adiante), para os propósitos da significação de um conceito como esse, não é possível escapar de pensar as limitações apresentadas quando se vincula o conceito de motivação a outros, igualmente essenciais, como o de necessidade (s) (imbricado nas considerações derivadas tanto do aspecto da liberdade quanto do determinismo, nos contextos apropriados); e, tendo no horizonte nossa investigação pautada em variadas formulações de Maslow, tal ponto parece assumir, em consonância com a “teoria” da hierarquia das necessidades e dos movimentos “dialéticos” aí presentes, a característica de dever ser pensado e verificado, junto ao nosso autor principal, como um ponto fulcral para a precisa compreensão da relação motivação- necessidade, base para outros demais considerações que em nossa monografia são essenciais. Além do mais, e seguindo a explanação do dicionarista, essa relação e suas implicações parecem ter sido bastante bem percebidas e elaboradas por outro investigador/pensador fundamental na contemporaneidade, Husserl, que se coloca como um dos pilares da corrente fenomenológica que, ultrapassando os “limites” do 23 pensamento filosófico, adentraram os terrenos das Ciências Sociais e Humanas e, notadamente, o da Psicologia – referimo-nos, agora, à vinculação, em tal pensador, das condicionantes trazidas pela experiência ao fenômeno da Motivação, como elemento de conexão que permite o estabelecimento de uma base concreta para a manifestação, efetividade e atualização da motivação (ABBAGNANO, 1970). Estas apreciações revelam-nos, desde já, as dificuldades percebidas e enfrentadas (com maior ou menor sucesso), por estudiosos e investigadores na Psicologia, bem como em Maslow, caso que nos interessa mais de perto. Na medida em que temos a intenção de verificar, neste autor, os subsídios para uma reflexão sobre a motivação, criatividade, comportamento e Psicologia Transpessoal, não resta dúvida de que é preciso explorar com acuidade o terreno por onde nos movemos. Um primeiro passo está sendo dado com a remissão aos problemas conceituais, de natureza teórica, envolvidos na noção e em suas implicações; e foi nesse sentido que buscamos o recurso a Abbagnano. Daqui, e é o que faremos imediatamente a seguir, podemos, acreditamos, delinear algumas reflexões que parecem se nos apresentar seja como problemáticas, seja como exigindo uma maior explicitação, de sorte que, ao mesmo tempo em que possamos deixar de lado um senso comum tão repisado, consigamos nos preparar com questões bem constituídas para poder verificar o alcance do pensamento de Maslow, de modo a podermos prosseguir segundo o nosso percurso programado. Passamos, assim, a um segundo momento central, qual seja, tendo estabelecido, no interior do pensamento ocidental, a respeito da história do conteúdo da noções-base, substratos comuns e fundantes, perquirir algumas das relações que daí derivam e interessam ao desenvolvimento de nosso raciocínio. Nesse sentido, manter à vista as imbricações que podem, usualmente, serem desdobradas entre o fenômeno investigado-a motivação -, em suas manifestações passíveis de apreciação psicológica, e variados fatores intervenientes significa estabelecer relações, de modo a respeitar exigências (de cunho metodológico inclusive) por um cuidadoessencial para não incorrer definitivamente em uma abordagem estática e fragmentada. Aliás, um tal tipo de preocupação, que 24 encontramos em diversos estudiosos, é bastante bem caracterizado em Maslow. Quando ele se refere, por exemplo, no que respeita às teorias sobre a motivação, a um “status definitivo” (MASLOW, 2003, p. 249), uma tal preocupação é muito evidenciada na relação apresentada das propostas sugeridas (ver p. 249/250), e, analisando-a, é possível verificar que as questões vinculadas aos “aspectos” da unidade, integração, totalidade, organicidade e contextualidade são enfaticamente assinaladas, sobretudo quando a 13ª afirmação é introduzida, de modo a esclarecer a situação de uma teoria da Motivação frente aos problemas levantados pela teorização acerca do comportamento humano em função da distinção aí traçada. Reproduzindo os termos da obra, encontramos: “13. A Teoria da Motivação não é o mesmo que teoria comportamental. As motivações são apenas uma entre as várias classes de determinantes do comportamento. Assim como o comportamento quase sempre é motivado, também é quase sempre determinado biológica, cultural e circunstancialmente”. (MASLOW, 2003, p.250). Não fica fora de propósito, pensamos, considerar que, exatamente porque efetua uma discriminação clara com relação a ambas as teorias, reduzindo as motivações a uma dentre as variadas classes de determinantes do comportamento humano, Maslow introduz uma imbricação de interatividade – os diversos tipos de fatores ou elementos determinantes do comportamento humano acabam por interrelacionar-se e influenciar sistemicamente – o que faz ressaltar, segundo seu pensamento, as propriedades características daquilo que ele denomina de “uma teoria positiva da motivação” (MASLOW, 2003, p. 251). Estes traços assertivos são já fornecidos pela/ na relação apresentada. É interessante, e não menos curioso, percebermos que, neste momento, Maslow procura deixar claro que é necessário dizer o que é, ou como se caracteriza de modo afirmativo, o conjunto de proposições capazes de levar à emergência de uma teoria motivacional humana, justamente quando busca mostrar que a descrição, a que procedeu anteriormente no artigo, pode ser tomada como propiciadora da 25 constituição de uma teoria “válida”, a respeito da qual as filiações inspiradoras podem ser reconhecidas, assim como o caráter “exploratório” se mantém indicado. Enfim, o que gostaríamos de estar apontando especificamente nesse momento de análise da obra de Maslow é que, além do conteúdo positivo das próprias afirmações relacionadas, também a “tipologia constitucional” da teoria que ele avança metodologicamente preserva requisições de organicidade, sistematicidade e abertura a ponto de poder explicitamente declarar: “Essa fusão em síntese pode ser arbitrariamente chamada de teoria geral e dinâmica” (MASLOW, 2003, p.251). Oras, são esses aspectos que acabamos de fazer notar que nos reconduzem às considerações com que iniciamos a proposição de um segundo momento (neste trabalho). O importante não é recuperar, apenas, elementos de fundo histórico da constituição, sobretudo, do pensamento ocidental no qual poderíamos buscar encontrar a presença do que viria a constituir, em nossos dias, correntes teóricas mais afinadas com a elaboração de visões, perspectivas e posições na Psicologia que queremos discutir; antes , nossa intenção é manter em vista o contexto das diversas vertentes que promoveram (e promovem) a apreciação e a atualização de pensamentos acerca do homem, de sua natureza e, inclusive, da própria questão da existência ou não de uma natureza humana. Muito se poderia investigar aqui, com grande proveito para diversos aspectos em que os estudos e investigações da condição psicológica levam a encaminhar esse saber (e prática) para outros patamares, mais abrangentes e transcendentes, sobretudo com relação à tradição clássica greco-latina de natureza, desafiada modernamente por correntes expressivas do pensamento humano, desde o darwinismo, passando pelo materialismo histórico, o pensamento da psicanálise e as vertentes estruturalistas e pós-modernas, cujas implicações trazem sérias dúvidas e questionamentos para o próprio conceito (e seu estatuto) de natureza. Na realidade, o que nos interessa mais é apontar alguns traços fundamentais de tal modo que possamos ter e constituir consistentemente uma perspectiva sólida, na qual se posiciona Maslow ( e outros pensadores de seu nível), com suas proposições e teoria frente ao contexto constituído pelos diferentes posicionamentos clássicos, e possamos claramente discernir os lugares de onde fala Maslow e poder perceber 26 quais são os seus interlocutores, ou antes, bem mais, o background que lhe serve (positiva e negativamente) de referência. Brevemente, pois, introduzimos agora um sumário do que nos parece relevante apontar, delineado com base nos quadros de uma estipulação conceitual (sobre a motivação), bastante simples, mas, por isso mesmo, de utilidade para remeter-nos às implicações envolvidas. Assim, embora a motivação pareça corresponder a tudo o que é capaz de compelir alguém a comportamentos determinados, entre aqueles que se dedicam (e dedicaram) a verificar a situação com relação aos elementos, fatores e “variáveis” impulsionadoras, isto é, todos aqueles que, de uma outra maneira, poderiam ser significativos no que diz respeito a induzir a ações, atitudes e comportamentos (no homem), a questão não é exatamente pacífica e as posições muitas vezes chegam a divergir até chegar mesmo a antagonismos. Desde há muito, desde quando se afirmaram os embriões de um pensamento tido por racional e desenvolvido na cultura da civilização grega em face de tradicionais visões míticas do mundo e do homem, as posições foram se diversificando. Sem dúvida, para aqueles para os quais o homem, por sua natureza de criatura passiva, encontrava-se submetido à força e ação de elementos sobrenaturais, a própria questão dos motivos e da motivação não se colocava, uma vez que substantivamente era percebido muito mais como instrumento, e nesta situação tudo quanto se referisse a aspectos motivacionais seria, antes de mais nada, da ordem do externo, não passível de controles eficientes científicos ou racionais (cabe notar que, mesmo em formulações muito posteriores, na época moderna e mesmo em nossa própria contemporaneidade, traços dessa visão se mantiveram, sobretudo em configurações extremamente reducionistas e mecanicistas, nas quais a determinação originava-se e submetia-se quase que exclusivamente por elementos fora do âmbito de uma volição humana, de tal modo que falar em motivos reduzia-se a pensar em elementos de causalidade, fazendo-se subtrair à questão uma dimensão mais presente de subjetividade humana); são dessa ordem, as visões materialistas e mesmo aquelas ortodoxamente derivadas da postulação de um inconsciente cujo acesso praticamente era negado, bem como 27 posições de caráter estruturalista inadequadamente fundamentadas que reservavam ao ser humano o papel de um ator cujo comportamento, atitudes e mesmo concepções já eram estabelecidos e dados de antemão, de tal modo que não restava a ele senão assumir papéis previamente estipulados. Sem dúvida, nestes momentos mais recentes das concepções teóricas, mesmo aquilo que se poderia considerar como determinações procedentes de um âmbito interno, o fato de que a subjetividade se encontrasse cerceada, seja por estruturas internalizadas seja por dimensões de um desconhecido ao qual não se teria senão acessos mediatizados por fenômenos dependentes de interpretação, trazia (traz) um deslocamento tal que falar-se em motivação causava, no mínimo, um certo desconforto. Por outro lado, a evolução do pensamento ocidental atingiu igualmenteimplicações restritivas quando, tendo o ser humano passando a ser considerado (sob o influxo de correntes que, na atualidade, se caracterizaram por um racionalismo de tipo positivista e mecanicista) como mecanismo, as ações e reações, nele, deveriam ser observadas e consideradas, no máximo, como resultados da atuação de leis de tipo físico (da Física), o que levava a uma perspectiva na qual assumia (assume) extrema relevância a presença (ou não) de estímulos (conhecidos e observáveis) originadores de reações (também para as quais se requeria a necessidade de conhecimento e observação adequadas, para os fins do estabelecimento de uma regularidade forte que permitisse considerar-se a presença atuante de leis); neste caso, ganham (ganhavam) um peso extremamente decisivo os critérios suscetíveis do estabelecimento de teorias comportamentalistas fundamentalmente positivistas. Já nos séculos XVIII e XIX, em plena época moderna, com os descobrimentos ocorrendo nas diversas áreas das Ciências Naturais, adquirem particularmente uma expressão de relevância aquelas concepções derivadas de teorias que culminariam no que conhecemos como teoria da evolução (e suas derivações), para as quais, numa compreensão bastante rasa, o homem, na escala evolutiva, decerto seria um animal superior aos demais, mas ainda assim um animal, o que implicaria em que nada de sumamente substantivo tornaria sua natureza distinta da dos demais animais. Como resultado de tal tipo de visão, o que se coloca sobretudo como 28 implicativo e essencial é a compreensão do papel das necessidades básicas, fontes, impulsos “primários” situados na ordem do instintivo, de cuja satisfação dependeria basicamente a determinação do comportamento humano. Ainda que tais concepções carreguem uma vinculação aparentemente mais próxima entre necessidades e satisfação (ou frustração) e os conseqüentes comportamentos suscitados, as propriedades em se trabalhar conceitualmente com categorias como motivo e motivação, no interior desse quadro, não permitiriam ainda abrir adequadamente o espaço para se pensar também um outro grande tema correlato, o da liberdade, também estudado ao longo da história do pensamento na civilização ocidental, uma vez que a dominância de necessidades básicas e sua satisfação apresentavam inúmeros problemas para se poder pensar a situação do ser humano, da constituição de sua natureza, e o papel, as funções e os significados de situações de escolher e de toda uma série de noções, categorias e conceitos associados, como, por exemplo, o de transcendência, superação, realização, valores, dentre outros (para nós, no escopo de nossa investigação, decisivos para se pensar os rumos dos atuais momentos dos saberes psicológicos com a intervenção de A. Maslow). Enfim, do lado desta vertente, as pesquisas e investigações levadas a efeito, por exemplo, com experimentos envolvendo ratos, cobaias, macacos e outros animais seriam capazes de fornecer dados informacionais básicos para, por extrapolação ou analogia, pensar-se a investigação da situação humana, uma vez que o homem nada de novo apresentaria, ainda que situado no ápice de uma cadeia evolutiva, em relação aos demais seres vivos, sendo visto, ainda, como resultado e produto de tendências instintivas, isto é, básicas. Se, guardadas as devidas proporções, observarmos como, no decorrer do pensamento ocidental, o homem chega a ser compreendido e pensado como produto da sociedade em que vive – o que, de uma ou outra maneira, negativamente ou não, foi a tônica de estudiosos mais diretamente preocupados com as conseqüências do comportamento humano para os aspectos sócio-políticos das organizações sociais, apenas estamos deixando um pouco mais à parte a situação das determinantes de caráter biológico para fazer sobrelevar aquelas de natureza 29 social. Àqueles que se pautam por tal orientação, a motivação acaba sendo colocada, predominantemente, em elementos de ordem externa-social, que, levados às últimas conseqüências acabam por subordinar o homem às estruturas e padrões culturais dominantes. No entanto, a matriz de raciocínio que conjuga e condiciona essa vertente ainda é substancialmente a mesma- a ação e o comportamento humanos determinam-se por necessidades (naturais ou socialmente elaboradas), reduzindo-se as dimensões da motivação também aos limites de uma teoria da causalidade cujo poder de fogo explicativo privilegia esquemas dominantemente positivistas. Por outro lado, uma tendência ocupou (e tem ocupado) com bastante expressividade essa área de interrogações, desde que, buscando atingir um estatuto de maior cientificidade, segundo o modelo nomológico-explicativo da tradição ocidental racionalista, a Psicologia enveredou pelos caminhos de uma maior auto nomização, também possível de ser percebida, dentre várias das vertentes, com a emergência de posições que levam o tratamento e consideração do comportamento humano para uma perspectiva, igualmente bastante restritiva, segundo a qual são forças, pulsões, tendências, cujo conhecimento nos é imediatamente negado ou acessível, e que se formulam (aos olhos dos estudiosos) como inconscientes, ou seja, à parte das condições de reflexividade usuais, aqueles elementos determinantes das atitudes, posicionamentos e comportamentos humanos; nessa situação, as assim, poderíamos dizer, razões legítimas e genuínas (as motivações, usando outro registro) compelidoras seriam, em sua originalidade, ignoradas de todo por nós, ainda que supostamente pensássemos saber reconhecer as razões pelas quais agimos de uma ou outra forma (essa, por exemplo, seria a situação das racionalizações elaboradas, por exemplo, subjetivamente, para se entender e explicar comportamentos). Também, neste caso, a impossibilidade de se chegar à coisa em si (vertente Kantiana no campo psicanalítico) mas apenas aos modos de manifestações delas – os fenômenos, como sonhos, lapsos, associações, etc. - , reduziria, agora sob limitações de natureza hermenêutica e fenomenológica, igualmente a figura humana a uma passividade frente a forças em sua primordialidade desconhecidas. Com o 30 quê, novamente, a questão da motivação e do comportamento do ser humano apresentar-se-ia reduzida, tanto do ponto de vista do conteúdo envolvido quanto daquele mais metodológico, a parâmetros no mínimo mecanicistas, ainda que inconscientes. E essa situação, não obstante a tentativa de buscar sucedâneos passíveis de, pela observação e elaboração da manifestação de eventos, subsidiar a organização de recursos para a formulação de substratos teóricos regulares, não poderia transcender a situação de uma metateoria, ou seja, a de uma explicação e descrição baseadas não exatamente sobre os objetos em estudo mas em sua apresentação à compreensão humana. É diante desse quadro que pretendemos considerar alguns aspectos significativos no pensamento de Maslow a propósito do problema da motivação no ser humano e de algumas de suas implicações para as condutas e comportamentos. O que nos interessa apontar, aqui, é o fato de que, se não houver espaço, em qualquer teoria, de modo adequado, para se levar em conta a possibilidade de tratar tantas questões fora dos quadros de um determinismo estrito e de um reducionismo precário, o universo determinado pela presença e efetividade da motivação, e suas conseqüências, perde todo o sentido. Assim, as posições de Maslow, compreendidas contra o fundo do quadro traçado, como um enfrentamento aos problemas derivados desse quadro, acarretam uma revisão de parâmetros tradicionalmente sedimentados, que levam a introduzir princípios e conseqüências que necessitam ser compreendidos com precisão para se poder atinar com o desvendamento de novas dimensões, no interior do conhecimento psicológico, e seu real alcance. E isto, é nossa intenção,será elaborado a seguir. É importante, e esclarecedor, para fins de compreender o quanto as elaborações de Maslow sobre a motivação humana se tornaram relevantes, repercutindo em diversas áreas e adquirindo, conforme o contexto, significações de vulto, atentar para as palavras de Stephens (2003), que aqui reproduzimos: “Maslow é importante porque entendeu a natureza humana, a motivação e o desempenho auto-realizador melhor do que qualquer um ainda vivo hoje é capaz” (p.11). 31 São palavras escritas no prefácio com que Deborah C. Stephens introduz a obra que editou e organizou para “O Diário de Negócios de Maslow, escrita nos anos finais do século XX, muito próximas de nós, portanto. E expressam, com abrangência, o alcance que as anotações de Maslow a respeito do papel das motivações, necessidades e auto-realização, pensadas no contexto do mundo do trabalho, do gerenciamento e da gestão de negócios, adquiriram e se impuseram ao pensamento administrativo em geral. Embora não fosse o único, dentre seus pares, a voltar a atenção, a respeito do assunto, para a área das organizações, influenciando, concordando e divergindo de vários expoentes de renome no setor, a influência que Maslow exerceu tornou-se ímpar e, novamente, retomando as palavras de Stephens (2003, p. 10), podemos perceber claramente uma grande razão para tanto: “Na medida em que vamos abraçando as inovações e o capital humano como fatores primordiais da superioridade competitiva, Maslow torna-se mais importante agora do que na época em que se encontrava entre nós”. É bem verdade que tais palavras são enunciadas a partir de uma perspectiva bem específica, uma vez que, para Maslow, transpor para “áreas empresariais” diversas das implicações constantes do cerne de seu pensamento tratava-se de uma decorrência quase que natural de suas observações e teorizações a respeito de seus interesses idiossincráticos no terreno da Psicologia, enquanto que para Stephens, cujo foco é já, desde o início das atividades que desenvolve, voltado para a área negocial, o contato e o estudo de sua obra representam um aprofundamento de sua própria experiência. Sem dúvida, esse tipo de observação significa fazer notar que, não obstante a convergência de interesses e situações, para ambos, ainda que haja redigido muitas observações e especificamente publicado, em 1960, uma obra de caráter gerencial, as preocupações de Maslow são mais universais. Contudo, nossa intenção neste trabalho é propriamente lançar nossos olhos sobre esse tipo de obra e verificar algumas das implicações de maior relevo cuja significação, originada no interior das formulações de Maslow, de natureza mais 32 ampla e geral, pode contribuir para podermos levantar alguns aspectos que mais diretamente nos tragam informações conseqüentes sobre motivação e criatividade, inovação, liderança e auto-realização, tópicos que elegemos para nossa investigação. Apenas para aqui notificar, após procedermos à nossa investigação, também estabeleceremos alguns comentários mais críticos. No entanto, no sentido de finalizar esta breve introdução ao tema e assunto, cumpre, para observarmos com precisão a apreciação que a organizadora da obra apresenta, na mesma (Stephens, p.11, 2003), revermos o que por ela também foi dito: “Suas [de Maslow] mensagens são nítidas: • os seres humanos são capazes de aquisições extraordinárias. • a criatividade e inovação são elementos naturais de nossa formação. ... a política de gerenciamento esclarecido não apenas aperfeiçoa os produtos e lucros por cota de ação; ela aperfeiçoa pessoas e desses e, dessa forma, melhora o mundo. • Esses pensamentos sobre os quais Maslow escreveu há tanto tempo, hoje repercutam em nós de maneira clara e impositiva” (grifos nossos) Tendo logo atrás expresso quais especificamente são os pontos que nos chamam atenção, ao investigar “O Diário de Negócios” de Maslow, cumpre que sejamos suficientemente claros para chegar a poder abordá-los articuladamente. Assim, e mantendo em vista o que anteriormente já expressamos acerca do desenvolvimento de Maslow e da orientação que desenvolveu nos terrenos da Psicologia, gostaríamos de assinalar que, para os fins que pretendemos enfrentar, as relações entre motivação, necessidades e auto-realização, sobretudo, são pontos nodais para os quais decidimos nos voltar mais de perto, de tal modo que o problema que gostaríamos de discutir transpareça translucidamente. Para tanto, é mister que possamos estabelecer, desde agora, as já bem conhecidas bases da teoria de Maslow, não só porque, mesmo o fazendo brevemente, recuperamos um arcabouço consistente, mas também lançamos, assim procedendo, os requisitos para podermos ir além da mera reflexão sobre Maslow, conseguindo igualmente reunir aqueles nos serão necessários para pensar as 33 influências, conseqüências e articulações com o pensamento da Psicologia Transpessoal e o que ela nos tem revelado em termos de uma transcendência que, a nosso ver, é vital para compreendemos com maior propriedade a situação do ser humano; e aí nos reencontramos, sem sombra de dúvida, com implicações fundamentais da obra Maslowiana. Queremos, aqui, retornar a um ponto já bastante comentado por estudiosos de Maslow e encampado, também, por pesquisadores que o seguiram na vertente que inaugurou. Ou seja, Maslow considerava fundamental, para os propósitos de um saber psicológico adequado, nem observar apenas o comportamento humano limitado pelas restrições inevitáveis (e reducionistas) da teoria behaviorista, nem, tampouco, focalizar exclusivamente (ou quase) a visão e o enfoque psicológicos e terapêuticos em patologias psíquicas, como se tal situação de coisas correspondesse legitimamente e tão apenas às constantes do psiquismo humano a ser estudado, investigado e tratado. Maslow, sobretudo tendo em vista, as situações de auto-realização de pessoas notadamente realizadoras, propôs que ao campo do saber psicológico também, e com ênfase, se reservasse a investigação não apenas do caráter constitutivo e das atitudes e comportamentos reiterados de tal tipo de pessoas como também a investigação dos contextos e das condições pelas quais um tal tipo de comportamento se pudesse observar em seus mecanismos e procedimentos. Julgamos que este ponto nos coloca muito próximos ao terreno da discussão da motivação, tal como Maslow elaborava a questão. E a razão pela qual assim pensamos reside no fato de que, como tão bem compreendeu o nosso pensador, se a todos os elementos motivacionais correspondesse rotineiramente situação e condições de falta, deficiência ou, para resumir, fatores que poderíamos visualizar como “negativos” – isto é, relacionados à ordem do não ser, não ter, não poder, não conceber, e assim por diante – ao campo de estudos da Motivação estariam ausentes variáveis de suma importância capazes de estabelecer, sobre estados de necessidades e contextos problemáticos, o encaminhamento de condutas e atitudes para a superação, para o ir além, por parte de seres humanos cujas obras, realizações e modos de ser os distinguiram de muitos outros, com os quais, ao 34 menos com base numa perspectiva positiva, ficaria muito difícil de caracterizar em termos de realização. Maslow, não apenas por seu passado acadêmico e pelas influências que o marcaram profundamente, reconhecia o papel e a função crucial da atuação das necessidades, mesmo no interior de uma escala puramente animal. E, com certeza, a clareza de seu julgamento sobre as observações e experimentos realizados levou- o ao desenvolvimento de uma “teoria” das necessidades (e de sua satisfação e frustração), no âmbito do psiquismo e conduta humanas, cuja unidade teórica e articulação argumentativa, em que pesem muitas críticas que então e posteriormentese fizeram, são ainda hoje marcantes e servem de inspiração para muitos estudos de proveito atualmente. Não há dúvida de que Maslow soube analisar cuidadosamente a contribuição tanto de estudiosos clássicos quanto a de seus contemporâneos, e delas sabiamente tirar partido. 35 CAPÍTULO II MASLOW: O HOMEM E A OBRA “Há três coisas em que nunca pude acreditar: que Deus criasse o mundo como o nosso e depois lhe desse as costas; que Ele criasse o homem e depois o desertasse na sepultura; que Ele plantasse o desejo da imortalidade no coração humano e falhasse em fazer as adequadas provisões para sua realização” Charles B. Yale, p. 140 Torna-se importante, neste momento, ampliar a apresentação do tema com o qual trabalhamos e uma forma mais organizada de fazê-lo, acreditamos, consistiria em introduzir informações mais substanciais a respeito do autor e pensador que escolhemos para nortear nossa pesquisa, assim como a respeito de suas formulações teóricas e seu pensamento, notadamente no que se relaciona à questão da Motivação. Utilizamos, nesse sentido, basicamente dois livros editados no Brasil, quais sejam, o de Vera Saldanha (2008), e aquele organizado por Deborah Stephens (2003), na medida em que neles são apresentadas informações de grande 36 relevância. Procuramos, tendo por foco o ponto sobre o qual nos debruçamos, organizarmos da forma mais conseqüente esse material central utilizado, até onde nos foi possível e visível no conjunto desta investigação. Mas, como bem observa Saldanha (2008), “... a publicação de sua obra no Brasil é limitada...” (p.70), “... há pouco aprofundamento sobre sua teoria em nosso país” (p.70), e além de variáveis não exatamente tão favoráveis à compreensão de seu trabalho, como, por exemplo, a questão de terem sido seus últimos textos publicados postumamente, e em publicação cuja edição não observou uma “ordenação prévia” dos muitos rascunhos, acresce mais uma interveniente, a dispersão dos inúmeros “conceitos e conclusões” (p. 71). Além disso, Saldanha (2008) faz observar o caráter da prolixidade do autor em pauta, “...pois citava de diferentes formas e com diferentes exemplos os dados obtidos, ou definições similares, o que tornava o seu trabalho experimental ‘mais explanatório’ do que conclusivo, sem tentar ‘provar’ algo, constituindo-se mais numa forma de esclarecer e acrescentar detalhes às suas teorias” (p. 71). Embora isso não adquira a feição de um contraponto negativo, uma vez que a dimensão e significado do trabalho de Maslow ultrapassam de muito esse aspecto, para os fins de um trabalho como o nosso, implica um conhecimento bastante aprofundado do conjunto de sua produção, do qual, reconhecemos, o nosso saber é precário; e, portanto, essas características acabam por poder nos levar a formulações inadequadas, extempôraneas ou anacrônicas, as quais somos os primeiros a reconhecer. Não obstante, o fato de que, dentro dos limites apresentados por Saldanha (2008), tenha havido, de sua parte, uma “reordenação dos textos”, muito nos auxiliou a avançar, inclusive para o nosso entendimento da edição da obra de Stephens (2003), a propósito do “Diário de Negócios de Maslow”. Assim, tendo sido colocadas tais observações, parece-nos uma boa opção apresentarmos um pouco da pessoa e figura desse pensador. Filho mais velho (dentre sete) de uma família judia, de imigrantes russos, Maslow, nascido em 1908, em Nova York, fez seus estudos de graduação na 37 Universidade de Wisconsin, onde tornou contato profundo com o behaviorismo e a psicologia experimental. Em 1934, obteve o doutorado, com uma tese a respeito da “dominância e o comportamento sexual entre os primatas” ( SALDANHA, 2008, p.71); é relevante observar esse dado uma vez que, mais tarde, efetuou vários estudos de pesquisa incidentes sobre o comportamento sexual humano, sob a influência de teses psicanalíticas a propósito da relevância do papel e função do sexo em termos do comportamento humano. (SALDANHA, 2008). As influências sofridas e experimentadas por Maslow são derivadas de diversos campos do saber, e não apenas do campo psicológico. Por outro lado, é conveniente observar que Maslow esteve sempre muito ligado a toda uma série de eventos concernentes aos destinos de grupos sociais, maiores ou menores, e um caso exemplar reside na atitude que desenvolve por ocasião da Segunda Guerra Mundial ao perceber e constatar que as ciências psicológicas, tal como se haviam estabelecido e desenvolvido, muito pouco haviam trazido em termos de contribuição para o enfrentamento e a solução de grandes problemas daí derivados para a convivência humana pacífica. Esse tipo de situação levou Maslow a se voltar e interessar por aspectos de cunho nitidamente mais social, reservando para a Psicologia Experimental um espaço bastante menor dentre seus interesses. Assim, os aspectos culturais presentificados nos comportamentos de grupamentos humanos bem como aqueles que mais diretamente incidiam sobre o problema da personalidade humana e seu desenvolvimento acabam por redirecionar as atenções do psicólogo. É bastante interessante notar que, por essa época, a América do Norte recebera um contingente expressivo de intelectuais europeus forçados a emigrar com a ascensão nazista. Embora não haja nenhum tipo de evidência direta de relações entre as pesquisas, humanas, psicológicas e sociais, desenvolvidas por parte desse pessoal, é bastante significativo observar que uma parcela considerável desses trabalhos e pesquisas conduziam à verificação de condições favoráveis ou não à instalação de traços de personalidade mais ou menos democráticos e à tematização, sob diversos aspectos e óticas, da discussão de problemas correlatos, 38 como o da liberdade e o das condições para o desenvolvimento de personalidades saudáveis franqueado por situações de maior ou menor liberdade. Um dos grandes trabalhos, por exemplo, desenvolvido por essa época por um dos expoentes da chamada Escola de Frankfurt, Theodor Wiesengrund Adorno (associado a colegas também emigrados, como Horkheimer e Franz Neumann), trata justamento da personalidade autoritária. Quanto a outros estrangeiros, residentes desde então na América, como Erich Fromm e Melanie Klein, é certo que as influências exercidas sobre Maslow foram bastante significativas e diretivas, ao menos para o levantamento de problemas de importância. Outros expoentes da intelectualidade americana, como foi o caso de Ruth Benedict, Mead, Linton e das correntes antropológicas de cunho sócio-cultural, exerceram também sobre Maslow um impacto bastante grande. O que é correto enunciar é que os interesses de Maslow passaram a versar, com bastante conseqüência, sobre aspectos culturais, e os processos de introjeção e internalização operantes, responsáveis, em alguma medida, pela constituição de traços de personalidade, comportamentos e atitudes, em função de uma preocupação, que Maslow absorveu não apenas a partir do espírito da época, concernente às determinantes substantivas da sanidade do psiquismo humano. Assim, desde muito cedo, ainda no período da Guerra, Maslow constitui como objeto de grande interesse seu as relações entre motivação, comportamento e elementos elicitadores como necessidades, centrados a partir de um foco que privilegiava as capacidades de desenvolvimentoe atualização/ efetivação de estados de realização (pessoal). Todas essas observações têm por finalidade mostrar uma característica bastante presente na personalidade e no trabalho de investigação próprios a Maslow, isto é, um grande grau de abertura ao mundo circunstante e aos contextos, o que, nele, o leva a propugnar pela ampliação dos campos estabelecidos nos estudos psicológicos na medida em que estes podiam, e de fato proporcionavam, fornecer indícios de ampliação, maior abrangência e superação que deveriam ser respeitados e resguardados como espaços legítimos para os desenvolvimentos, sob várias orientações e sentidos, das realizações da Ciência Psicológica. 39 Portanto, é notável verificar como Maslow encampou, extrapolou, reviu e redirecionou contribuições sumamente representativas das influências das ciências psicológicas afins que recebeu a partir do convívio com as idéias e teorias de figuras como Freud, Goldstein, Werheimer, Hartman, dentre outros, e dos conjuntos representados pelas vertentes do gestaltismo, do humanismo (do qual o próprio maslow é um dos iniciadores – formadores). Notável porque, com esse tipo de abertura e aproximação, Maslow conseguiu pôr em relevo a importância das capacidades de disponibilização favoráveis, seja por processos de extrapolação, de recontextualização, reinterpretação, analógicos e outros, à instalação de predisposições indispensáveis para reavaliações, insights e reorientações capazes de fornecer novas chaves, ainda inapercebidas e indisponíveis, suscetíveis de elevar a novas dimensões e patamares os conhecimentos até então obtidos. É a respeito desse tipo de orientação, presente em Maslow, com relação às influências recebidas que gostaríamos de nos estender, em nossos comentários, agora; e isso, ao menos por duas boas razões, das quais a primeira já foi comentada no parágrafo anterior; e, quanto à segunda, pelo fato de poder demonstrar, de modo mais concreto, como a atitude de Maslow permitiu-lhe descobrir e avançar, junto a pontos e aspectos já levantados por outros pensadores, novas posições e significações, ou seja, um lado reverso da moeda. E este aspecto, principalmente, acarreta para as psicologias que se sucederam ao que se convencionou chamar de psicologia humanista, algo que, praticado com e em Maslow, transcendeu um nível puramente metodológico e passou a constituir mesmo uma característica inusitada, relativa ao próprio conteúdo das correntes psicológicas derivadas, que tornou capaz, juntamente com mais alguns elementos de relevo, de fundar paradigmas inovadores, dentre os quais aqueles que levaram, por exemplo, à emergência da Psicologia Transpessoal. Nesse sentido, gostaríamos de apresentar com algum detalhe as “apropriações” levadas a efeito por Maslow com relação a influências determinantes que acabaram por formar seu pensamento. Tendo vivido sobretudo nos três primeiros quartos do século XX, Abraham Maslow vivenciou um período bastante conturbado, com duas grandes guerras que 40 envolveram muitos países do mundo e diversas outras guerras localizadas, ocupando os Estados Unidos papel central em boa parte delas. Ao mesmo tempo, presenciou um grande desenvolvimento científico e tecnológico, nos diversos campos da Ciência, desde a introdução das teorias acerca da relatividade, da física quântica, biologia genética, dentre outros, que mudaram radicalmente o plano de compreensão do funcionamento da vida e do universo. Também foi contemporâneo de grandes mudanças nos comportamentos e situações sociais e individuais, que, a partir do final da 2ª Grande Guerra, trouxeram sobretudo mentalidades, movimentos e atitudes de revolta e contestação – é a época dos movimentos de libertação das colônias, na África e Ásia; e também o momento do surgimento nas artes e modo de vida de comportamentos não- conformistas; e no próprio campo da Psicologia, após um domínio quase que exclusivo das vertentes behavioristas, nos Estados Unidos, a emergência das tendências psicanalíticas e analíticas, conjuntamento com eventos de grande significação como experimentos com substâncias chamadas alucinógenas, cuja experimentação inclusive por pesquisadores e cientistas, e também por pessoas comuns, revelou aspectos até então desconhecidos ou ignorados do funcionamento mental, que representaram a consubstancialização de condições que tiveram grande impacto na reorientação do pensamento de Maslow. Todos esses e vários outros aspectos, concernentes inclusive à própria vida pessoal de Maslow, acabaram, evidentemente, por reorientar as preocupações desse estudioso. Formado acadêmicamente dentro dos parâmetros de um paradigma cientificista de alto teor positivista, mas tendo subsequentemente entrado em contato com a Psicanálise freudiana e algumas das vertentes daí decorrentes (inclusive com notória contraposição), com matrizes fundamentais do pensamento antropológico social culturalmente estabelecido, assim como com os avanços das neurociências e ciências cognitivas, o caminho de Maslow foi se configurando cada vez mais por tendências aos questionamentos e aberturas, até que, propugnando que os saberes psicológicos não podiam deixar de atender aspectos centrais como os fatores afetivos e emocionais, acaba por lançar as bases daquela que ficou conhecida como psicologia humanista, ainda que ressalvando sempre que essa 41 orientação “nova”, fundada em elementos provenientes das grandes correntes que movimentavam o pensamento filosófico, cultural e social, tais como a Fenomenologia e o Existencialismo, apenas podia ser resultado da colaboração e troca do esforço de vários pesquisadores e intelectuais. O que nos interessa indicar, como ponto central, nessa situação, é uma recusa a um pensamento psicológico fundado em elementos deterministas e mecanicistas, bem como o descarte, como “expediente” observacional direto e exclusivo, da postura positivista que acaba por determinar como científico o tipo de conhecimento determinado sobretudo pelas contraposições quantificáveis oriundas da observação e experimentação. Com tal recusa, Maslow abria as portas para o reconhecimento da importância dos aspectos subjetivos mais internos, cujo estudo poderia ser formulado em contextos de introspecção, para os quais os processos hermenêuticos-interpretativistas de busca e avaliação poderiam contribuir notadamente. Assim, é possível compreender claramente como Maslow, em seus anos de maturidade, compreendia a relevância dos procedimentos analíticos e terapêuticos derivados tanto da escola freudiana quanto das que a partir daí se constituíram, na medida em que elas propugnavam a possibilidade de se encontrar significados válidos para um mundo psíquico interno que, aparentemente, fugia à compreensão humana. É certo que Maslow, assim como outros pensadores e psicólogos, ressalvava, quanto ao paradigma psicanalítico, o fato de se restringir ao estudo de situação patológicas e doentias. No entanto, não deixava de reconhecer a valiosíssima compreensão, ou, ao menos os esquemas de compreensão assim alicerçados, atualizados e efetivados no sistema psicanalítico. Oras, isso nos pode mostrar que Maslow percebia com grande lucidez o que os esquemas tradicionais da psicologia tradicional deixavam de lado. Ou seja, todo o campo da intencionalidade e da subjetividade pessoais humanas colocado agora ao alcance do entendimento para a formulação e constituição de um vasto território, cuja pesquisa, efetuada por mecanismos de aproximação válidos, poderia resultar no encontro de chaves básicas para a apreensão do comportamento humano. 42 O que Maslow e companheiros defendiam, contra uma visão centrada na psicopatologia pelo freudismo e análogos, era a possibilidade da descoberta dos elementos integradores de uma experiência do psiquismo humano mais
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