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Sociologia da Educação: Tipos e Perspectivas Rafael Antunes Lorenzo Conde Samuel Werner Jhennifer Mantovani Jacyanne Faria A sociologia nasce como uma ciência ao mesmo tempo que a vida em sociedade começa a se organizar de uma nova forma. Neste novo modo de organizar a vida, observa-se uma profunda transformação nas relações de trabalho, marcada agora por uma relação contratual de trabalho, concomitante à crença na ideia de progresso, dessa forma a sociologia nasce e firma-se como uma tentativa de compreensão de situações novas, criadas pela então nascente sociedade capitalista (CUNHA, 2010). A sociologia da educação, apesar da sua origem recente, conhece um notável desenvolvimento quantitativo e qualitativo. Precisa lidar no seu interior com um processo de desenvolvimento e diversificação de tratamento de seu objeto empírico, os sistemas de ensino geral, e com uma gama infindável de opções teóricas e metodológicas para a sua investigação (FERREIRA, 2006). Reiterando o que foi dito por Ferreira (2006) e Cunha (2010); Sposito (2003) citando Bourdieu diz que: “A sociologia da educação configura seu objeto particular quando se constitui como ciência das relações entre a reprodução cultural e a reprodução social, ou seja, no momento em que se esforça por estabelecer a contribuição que o sistema de ensino oferece com vista à reprodução da estrutura das relações de força e das relações simbólicas entre as classes”. Ainda em Sposito (2003), Duru-Bellat e Van Zanten dizem que: [..] uma ‘verdadeira sociologia da educação’ recobriria um campo extremamente vasto, pois os ‘mecanismos por meio dos quais uma sociedade transmite a seus membros seus saberes, o saber-fazer e o saber-ser que ela estima como necessários à sua reprodução são de uma infinita variedade’ (SPOSITO, 2003, p. 211) A sociologia da educação, em consonância com o que apresenta a ciência da qual se originou, divide-se me diversas correntes teóricas (FERREIRA, 2006). Dentre os principais pensadores da “Sociologia da Educação” estão – Émile Durkheim, Karl Marx, Friedrich Engels, Max Weber – no entanto, vale ressaltar que existem outros pensadores. Nespoli et al. (2007), divide a história da “Sociologia da Educação” em três etapas: (1) Teorias Sociológicas Clássicas, onde aborda Émile Durkheim, Karl Marx, Friedrich Engels e Max Weber; (2) Teorias Sociológicas Contemporâneas e; (3) Teorias Sociológicas no século XXI. O presente trabalho, fará um apanhado geral somente sobre as Teorias Sociológicas Clássicas. A sociedade materialista – histórica – dialética de Karl Marx (1818-1883) é a sociologia da luta de classes, a sociologia das relações de poder no seio das sociedades capitalistas, do estruturalismo sócio – econômico – político (LOPES, sem data). Na perspectiva tanto de Karl Marx, quanto de Friedrich Engels, o Homem, isto é, o gênero humano, para se constituir como tal organiza-se em sociedade, o que implica estabelecer relações com outros Homens e com o ambiente que o cerca, mediadas pelo trabalho (NESPOLI et al., 2007). Karl Marx, embora, não tenha sido o primeiro a escrever sobre a sociedade capitalista, foi, certamente, quem mais influenciou as análises críticas posteriores. Marx elaborou uma teoria geral do capitalismo, que estava acima das fronteiras disciplinares que se constituíam naquela época. Sua análise foi, ao mesmo tempo, filosófica, econômica, histórica e sociológica (SOUZA, 2006). Apesar da educação não ser a temática principal de seu trabalho, Karl Marx, diz que o enquadramento da educação se faz, também, em relação ao seu desenvolvimento no processo histórico das sociedades, isto é, a concepção marxista de educação tem por base o materialismo histórico. Lopes (s/ data) diz que para Marx: A educação é uma forma de socialização, de integração dos indivíduos numa sociedade sem classes, no contexto do materialismo histórico. No modelo marxista infra-estrutural – super-estrutural (dialético, de relação recíproca), a escola faz parte da super-estrutura (tal como o Estado ou a família, por exemplo) e a educação é assumidamente um elemento de manutenção da hierarquia social, de controle de classes dominantes sobre as classes dominadas, isto é, de dominação da burguesia sobre o proletariado (LOPES, s/ data, p. 2) Dessa forma do ponto de vista especifico da educação na sociedade capitalista, Karl Marx e Friedrich Engels viam na educação um poderoso instrumento de perpetuação da exploração de uma classe social sobre a outra, utilizada pela burguesia para disseminar a ideologia dominante, fazendo crer ao trabalhador que é dele o modo burguês de ver o mundo, mas que, no entanto, poderia ser utilizada, pois, como um instrumento valioso a ser usado em favor da emancipação do Homem. Esses autores, também, diziam que “não existe educação destituída de um conteúdo de classe. Dependendo desse conteúdo, ela pode ser uma educação para a alienação ou uma educação para a emancipação” (NESPOLI et al., 2007, p. 16). Então Marx diz: A educação tem por missão (histórica) a emancipação do homem, a sua libertação (práxis libertadoras) que levará à construção de uma nova ordem social. O processo educativo deve ser entendido, então, como o processo pelo qual os indivíduos produzem a sua existência (homem-cidadão, sujeito produtor do seu próprio processo histórico), numa perspectiva abrangente (em vários sentidos) e como meio de combate a uma alienação crescente, típica das sociedades capitalistas (LOPES, s/data, p. 4) Émile Durkheim (1858-1917) é sociólogo por excelência, pai da Sociologia Geral e da Sociologia da Educação (SOUZA, 2006). Esse autor defende a sociologia estruturalista – funcionalista – sistémica, em outras palavras, a sociologia da objetivação do social, da coisificação das relações sociais. Durkheim acredita que a ciência autônoma e empírica, assente na teoria do fato social, e essa é a solução para decifrar o mundo. Dessa forma, a teoria de Durkheim é fundamentada na sociologia geral, ele acreditava que a educação tem que ter como cerne a sociologia, isso porque ele se encantou pelo caráter social-histórico do fenômeno educativo, pelos métodos de educação de cada sociedade em determinado período histórico, pela forma como uma sociedade se disciplina e se integra através da educação, pela forma como favorece a realização dos seus membros (LOPES, s/ data). Durkheim dizia: Quando nascemos encontramos todos um sistema de crenças, normas e valores já constituído ao qual devemos ser incorporados através da educação [...] a sociedade exerce uma coerção sobre os indivíduos [...] A educação é uma das forças de exercício dessa coerção, porque toda atividade pedagógica supõe um esforço de permitir aos indivíduos internalizarem algo já constituído. A língua, as leis, as normas da convivência coletiva [...] precedem ao nascimento dos indivíduos. É tarefa da educação permitir aos indivíduos a apropriação dessas normas (SOUZA, 2006, p. 26) Para Durkheim, existem no indivíduo dois seres, distintos embora separáveis apenas por abstração: o “ser individual” (estados mentais particulares) e o “ser social” (sistema de ideias, sentimentos e hábitos que exprimem o grupo ou grupos a que pertencemos), tendo isso como alicerce, o autor diz que o propósito da educação é constituir o ser social, de forma a perpetuar e reforçar a homogeneidade entre os seus membros fixando com antecedência na alma da criança as similaridades que a vida coletiva exige. Acrescenta, ainda, que a educação cria no homem um novo ser. Dessa forma, a educação é um processo de socialização constante do indivíduo que tem por finalidade fazer dele um ser verdadeiramentehumano, um ser novo, assegurando, simultaneamente e em consequência, entre os cidadãos uma comunhão de ideias sem os quais qualquer sociedade é impossível (LOPES, s/data). Em suma, na ótica de Durkheim, a sociedade impõe ao indivíduo maneiras de agir e de pensar que são consagradas pela sua condição de ser social, isto é, exterior, coercitiva e geral, e que atuam sobre todos nós, independentes das manifestações que possam ter do ponto de vista individual (NESPOLI, NOGUEROL, RANGEL, & BOTELHO, 2007). A sociologia acionalista – compreensiva – interpretativa – explicativa de Max Weber (1864-1920) é a sociologia da ação social dotada de sentido e de significado subjetivo: o sentido é interativo porque tem significado social, é subjetivo porque é individual (LOPES, s/data). As reflexões de Weber acerca da educação podem ser compreendidas a partir dos tipos de dominação que descreveu e de seu enfoque sobre a mudança social ocasionada pelo processo de racionalização da sociedade, ocorrido no decorrer da História, e que interferiu na conduta de vida prática dos indivíduos e, portanto, na sua maneira de educar (NESPOLI et al, 2007). Os tipos de dominação que Weber se referia podem ser de três tipos: (1) dominação racional; (2) dominação tradicional e; (3) dominação carismática. A dominação racional é a que repousa sobre a legalidade de ordenações instituídas e dos direitos de mando dos chamados por essas ordenações a exercer a autoridade: a autoridade legal (NESPOLI et al., 2007). Em outras palavras, a dominação racional requer uma forma particular de autoridade. Ao contrário do caráter pessoal das relações de mando tradicional e carismático, na dominação racional, o indivíduo que exerce esse tipo de autoridade o faz em nome de “regras impessoais” que foram conscientemente instituídas como produto de um debate coletivo. É de caráter racional, pois tende a expressar o esforço coletivo de estabelecer, a partir de critérios racionais, normas às quais todos devem obedecer, essa dominação ainda tem, caráter legal, pois essas normas são expressas em leis (SOUZA, 2006). Para Weber: [...] para que a dominação racional aconteça, é necessário que exista uma burocracia, que organize a sociedade, não na base da tradição ou do carisma pessoal do líder, do mago ou do herói, mas na racionalidade, na impessoalidade e legalidade [...] A esse tipo de educação dá-se o nome de pedagogia do treinamento [pois] a racionalização da sociedade capitalista impõe uma prática pedagógica que, em vez de contribuir para o desenvolvimento dos talentos do ser humano, tem contribuído para a obtenção de status privado e treinamento de indivíduos para o desempenho de determinadas tarefas, funcionando como mecanismo de ascensão social, isto é, as pessoas de maior privilégio e poder utilizam-se da educação como um recurso para melhorar seu status. A finalidade da educação especializada da educação especializada, isto é, daquela que transmite o conhecimento especializado, é permitir que se dominem todas as coisas pela previsão (NESPOLI et al., 2007, p. 18) A dominação tradicional é a que repousa sobre a crença cotidiana na santidade das tradições que vigoram desde os tempos longínquos e na legitimidade dos que são designados por essa tradição para exercer a autoridade: autoridade tradicional (NESPOLI et al., 2007). De forma sucinta a dominação tradicional se estabelece “em virtude da crença na santidade das ordenações e dos poderes senhoriais há muito existentes”. É um tipo de relação de mando que se assenta na tradição, assegurado por laços de fidelidade entre senhor e súditos. Temos a exemplo, a história do Brasil, que desde os tempos de colônia estabeleceu-se em uma sociedade patriarcal centrada na figura do senhor de escravos e terras, que atendia geralmente a alcunha de coronel (SOUZA, 2006). Nesse tipo de dominação, geralmente em sociedades patriarcais, a educação tem o caráter de uma formação erudita, literária e intelectual, restrita a um grupo de indivíduos. Para Weber, essa educação se estabelecia na pedagogia do cultivo, na qual o indivíduo era preparado, através de uma educação geral, para exercer determinados tipos de comportamento, possibilitando, assim o desenvolvimento de um processo educacional peculiar que correspondia a seu modo de vida (NESPOLI et al., 2007) Por fim, a dominação carismática, que é a que repousa sobre a entrega extra cotidiana à sanidade, ao heroísmo, ou à exemplaridade de uma pessoa, e às ordenações por ela criada ou reveladas: autoridade carismática (NESPOLI et al., 2007). A dominação carismática é uma forma de exercício do poder típica dos momentos de crise, uma vez que descontentamento e desequilíbrio social podem desregulamentar as formas rotineiras de vida, desintegrando as instituições ou o poder de mando do chefe tradicional. Na visão de Weber, os momentos de crise são propícios para o surgimento de líderes carismáticos, pois, eles são vistos como personagens extraordinários, portadores de qualidades sobrenaturais ou excepcionais. Esses líderes podem se manifestar em diferentes contextos sociais e históricos, podem ser líderes religiosos ou políticos. Cabe ressaltar que a legitimidade da autoridade carismática baseia-se sempre, e qualquer que seja o contexto em que está tenha surgido, no fato de todos (a população) acreditarem na autenticidade da missão do líder (SOUZA, 2006). Então para Weber a educação, no que tange a dominação carismática, dizia que: [...] a educação carismática pretendia despertar no noviço uma capacidade inata, um dom exclusivamente pessoal, que só se aplicaria a quem revelava características especiais, que fugia do que era comum. O rumo que tomaria esse tipo de educação dependia da importância atribuída a ela, como, por exemplo, a educação dos sacerdotes e sacerdotisas entre os druidas, grupo religioso que entre os Celtas ocupavam o lugar de juízes, doutores, sacerdotes, adivinhos, magos, médicos, astrônomos, pedagogos, etc. (NESPOLI et al., 2007, p. 17) Por fim Weber conclui que é possível uma educação que equilibre a tensão entre burocracia e carisma (NESPOLI et al., 2007). A atualidade do pensamento de weberiano é evidente, pois, está presente no crescente processo de burocratização das sociedades (e das instituições, dos processos e dos sistemas educativos), está presente na necessidade de especialização (tecnicismo e tecnologia, tendo no horizonte a sociedade da informação, ou do conhecimento), está presente na diversificação de formas de educação (traduzida em currículos e politicas educativa renovadas a grande rotação) (LOPES, s/ data). A Sociologia da Educação no Brasil, especialmente no início do século XX, mostrou-se fortemente influenciada pelas teorias marxistas, isto ocorre, pois, num momento onde os olhares voltavam-se principalmente para os problemas do subdesenvolvimento no continente. A Sociologia Brasileira, teve início, a partir das décadas de 1920 e 1930, quando os estudiosos dessa área passaram a se dedicar a pesquisas que visavam construir um entendimento acerca da formação da sociedade brasileira analisando temáticas cruciais para essa compreensão. Dessa forma, esses estudiosos voltaram-se para estudos referentes à escravatura e a abolição, estudos sobre índios e negros e o êxodo dessas populações, e mesmo analise sobre o processo de colonização. Nas décadas que surgiram, no entanto, a Sociologia Brasileira passou a voltar-se para os estudos que abordassem prioritariamente temas relacionados às classes trabalhadoras, buscando compreender a relação de trabalho, salários, jornadas de trabalho, ambientes de trabalho urbano e rural, organização e condição dosambientes de trabalho e a relação entre empregados e empregadores. Foi a partir da década de 1960, que pôde-se observar uma crescente preocupação com o processo de industrialização que se instaurava no país. Ainda na década de 60, percebe-se uma instabilidade da disciplina de Sociologia em escolas de Ensino Básico, que fora, inicialmente banida pelo regime militar, perdurando por 20 anos. Durante esse período a Sociologia era considerada disciplina facultativa, estando presente, então em poucas instituições. Somente em 2009 voltou a ser obrigatória na grade curricular nacional, e novamente em 2017, tornou-se facultativa (SCOTTÁ & MOUGEOLLE, 2018). No Brasil os sociólogos clássicos foram Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Júnior e Fernando Henrique Cardoso. Florestan Fernandes teve uma grande importância para a Sociologia Brasileira, pois mostrou-se extremamente comprometido com estudos de perspectivas teórico – metodológicas esforçando-se no âmbito da fundamentação da sociologia enquanto ciência. Darcy Ribeiro, por sua vez, desenvolveu trabalhos fundamentalmente nas áreas de educação, sociologia e antropologia, é, também, conhecido por seus trabalhos desenvolvidos a partir das temáticas voltadas para os povos indígenas. Gilberto Freyre, realiza um trabalho onde observa a colonização e a formação de desenvolvimento dos trópicos. Sérgio Buarque de Holanda, aborda a formação da cultura brasileira e do processo de formação da sociedade, e também, analisa o legado português no Brasil assim como a dinâmica de transferência cultural que ocorreu entre metrópole e colônia. Caio Prado Júnior, atentou-se a formação do Brasil contemporâneo, justamente para pensar na evolução histórica brasileira desde o período colonial. Por fim, Fernando Henrique Cardoso, escreve sobre política e governo com cunho sociológico, foi também um dos ideólogos da corrente desenvolvimentista (SCOTTÁ & MOUGEOLLE, 2018). Referências CUNHA, M. A. (2010). Sociologia da educação. Belo Horizonte: Editora UFMG. FERREIRA, R. A. (2006). Sociologia da Educação: Uma Análise de suas Origens e Desenvolvimento a Partir de um Enfoque da Sociologia do Conhecimento. Revista Lusófona de Educação, n.7, p. 105-120. LOPES, P. C. (sem data). Educação, Sociologia da Educação e Teorias Sociológias Clássicas: Marx, Durkheim e Weber. Lisboa: Univerisdade Autonoma de Lisboa / Centro de Estudos e Sociologia ISCTE-IUL. NESPOLI, Z. B., NOGUEROL, A. C., RANGEL, C. M., & BOTELHO, J. (2007). Sociologia da Educação. Rio de Janeiro: Editora UCB. SCOTTÁ, G., & MOUGEOLLE, L. (6 de Junho de 2018). Portal Sociologia. Fonte: Portal Sociologia: http://www.sociologia.com.br SOUZA, J. V. (2006). Sociedade, cultura, educaçao e escola. Belo Horizonte: Editora UFMG. SPOSITO, M. P. (2003). Uma perspectiva não escolar no estudo sociológico da escola. Revista USP, São Paulo, n.57, p. 210-226.
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