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II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 CONSERVATÓRIO ESTADUAL DE MÚSICA JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA: A História de Um Edifício. SILVA, JASMINE LUIZA S. 1. Universidade de São Paulo Campus São Carlos Programa de Pós-graduação do Instituto de Arquitetura e Urbanismo Rua Josefina Ferreira Bolzan, 82 37558-333, Pouso Alegre - MG contato@jasminearquitetura.com RESUMO O Conservatório Estadual de Música Juscelino de Oliveira Kubitschek localizado em Pouso Alegre, MG, ocupa um edifício histórico da cidade que traz consigo uma longa bagagem histórica e arquitetônica. O edifício que hoje é tombado como patrimônio histórico municipal foi construído em 1918 pelo arquiteto paulista Mario Gissoni para servir como Escola Normal e educar as moças da cidade e região. A construção de 3.943 m² abrigada 300 moças em regime de internato com administração religiosa, o edifício foi projetado seguindo as preocupações higienistas dando prioridade para ventilação e insolação dos espaços. A partir de 1978 o prédio passa a ser ocupado pelo Conservatório Música Juscelino de Oliveira Kubitschek como escola de música, canto e cursos técnicos. Esse trabalho propõem uma leitura história e arquitetônica do prédio para entender sua importância para história do município e região. Este estudo realizado junto ao programa de pós- graduação da Universidade de São Paulo campus São Carlos, objetiva compreender o edifício propondo uma leitura história e arquitetônica do prédio, colocando em pauta sua restauração e estado de preservação para compreender os significados de sua presença na cidade. Palavras-chaves: Conservatório de Música; Escola Normal; Instituto Santa Dorothea; Patrimônio de Pouso Alegre. II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 Introdução O Conservatório Estadual de Música Juscelino de Oliveira Kubitschek (CEMJPA), é um dos 12 Conservatórios de Minas Gerais, sendo um dos maiores e mais reconhecidos, situado na região central de Pouso Alegre, no sul de Minas Gerais é um importante edifício na história educacional e social da cidade. Localizado em local estratégico na cidade, na esquina das Ruas Cel. Otávio Meyer e Francisco Sales, no centro de Pouso Alegre, um edifício imponente com três pavimentos ganhava destaque nas fotografias e na paisagem urbana. Figura 1: Praça Senador José Bento em Pouso Alegre. Ao fundo o Instituto Santa Dorothéa, atual Conservatório de música. Foto sem data definida, porém podemos perceber que é anterior a 1947 pela presença da antiga Catedral. Fonte: Acervo Museu Tuany Toledo. Este estudo realizado junto ao programa de pós-graduação da Universidade de São Paulo campus São Carlos na disciplina “Produção Arquitetônica Paulista do Séc. XIX ao Séc. XX”, objetiva compreender o edifício propondo uma leitura história e arquitetônica do prédio, colocando em pauta sua restauração e estado de preservação para compreender os significados de sua presença na cidade. II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 O conservatório em atividade a mais de 60 anos, oferece aulas musicais, aulas artísticas de pintura e interpretação além de cursos técnicos como: Técnico em Instrumento, Técnico em Canto e Técnico em Design de Interiores. Foi a partir da escola que surgiram diversos grupos musicais, grupos de teatros e atores, orquestras, cantores solistas e corais. A história do edifício começa com a chegada da Madre provincial das Irmãs Dorothea a Pouso Alegre, vinda de Portugal em fevereiro de 1911. Em 1918 tem início as primeiras obras do edifício, projetado para abrigar a Escola Normal Santa Dorothea, um colégio para meninas, a construção se inicia sob projeto do engenheiro e arquiteto Mário Gissoni. Baseados nos ensinamentos religiosos e morais, a escola Santa Dorothea ensinava as meninas e moças da cidade uma educação pontada pela sabedoria religiosa e habilidades para exercerem as atividades domésticas. Para dar apoio ao ensino religioso e evitar que as estudantes se desloquem para as outras igrejas da cidade, em outubro de 1926 é inaugurada a Capela do Sagrado Coração de Jesus, junto à Escola Normal. O colégio funcionou no local até 1975, após a construção de novo prédio próximo a Av. Tuany Toledo, as freiras transferiram suas atividades para o novo local. O conservatório anteriormente se localizava na Praça João Pinheiro, antiga Rodoviária de Pouso Alegre, onde funcionou por 24 anos. Após a saída das freiras para a nova localidade, em 1978 o edifício passa a abrigar o Conservatório Estadual de música J. Kubitschek até março de 1987 quando acontece um incêndio criminoso no prédio. Somente após 7 anos, o Conservatório volta a ocupar o edifício retomando as aulas em setembro 1994. A pesquisa abordou uma investigação da história, feita através de leitura e análise das bibliografias existentes que tratam do tema de patrimônio arquitetônico, dissertações que se referem ao Conservatório de Música e o Instituto Santa Dorothea. Para melhor compreensão foi realizada visita ao local, estudo de sua arquitetura, fotografias, análise do projeto de reforma e entrevista com um dos arquitetos responsáveis pela restauração do edifício após o incêndio. Entender o Conservatório foi indispensável para entender seu processo de tombamento e analisar as condições de preservação. O estudo faz uma apuração da II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 história do edifício, o incêndio e o processo de reconstrução, de que modo a população teve papel importante na reabertura da escola e como se encontra a arquitetura desse edifício com o passar dos anos. História Escola Santa Dorothea Em 11 de fevereiro de 1911, a Escola Normal Santa Dorotéia foi fundada pela Madre Antonieta Montani Leoni - provincial da congregação de Santa Dorotéia. Foi equiparada à Escola Normal do Estado pelo Decreto de nº. 3.256 de 25 de julho do mesmo ano. A escola para moças era a única forma de educação da região para as filhas de fazendeiros e de ricos comerciantes. Responsável pela difusão de comportamentos considerados adequados às mulheres com currículo enciclopédico com predomínio dos estudos clássicos, oferecia uma educação dentro dos padrões europeus. Pouso Alegre foi uma das cidades pioneiras ao receber um Instituto de educação para mulheres: àquela época, o bispo local viaja à Itália com a missão de convidar as religiosas da Congregação de Santa Dorotéia, para assumirem a direção da futura Escola Normal para meninas. As irmãs Dorotheas vieram de Portugal, devido à situação política criada pela Revolução Republicana de Portugal, em fins de 1910, cujo governo expulsou, violentamente de suas casas e colégios, todas as religiosas. Aproveitando o convite de Dom Antônio Augusto de Assis, estabelecendo na cidade para dirigir a Escola Normal. II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 Figura 2: Instituto Santa Dorothéa, 1930 – Sede atual do Conservatório. Fonte: http://museutuanytoledo.blogspot.com.br/2012/05/conservatorio-estadual-de-musica.html As aulas do curso normal iniciaram-se em março de 1911 ainda no Convento de Visitação, em 7 de abril há a mudança para o sobrado cedido por uma família no Largo da Catedral. Porém, já no início de 1912 o prédio mostrou-se pequeno para atender a procura dos pais de toda a região do Sul de Minas, e mais alguns cômodos foram construídos. O trabalho das irmãs popularizava-se na região, e o número crescente de alunas também,forçando-as, em janeiro de 1914, a mudarem para o Palácio Episcopal. A escola funcionou no Palácio até 1915 quando há a transferência das Irmãs da Visitação para São Paulo e a eleição do novo bispo de Pouso Alegre. De volta ao Convento de Visitação, a escola fica por pouco tempo nesse local em razão da solicitação do Governo Federal pedindo o espaço para instalação do 8º Regimento de Artilharia Montada. Recebendo as Irmãs Dorotheas uma indenização de Cr$ 35.000,00 para auxiliar a construção de um novo Edifício. Em 29 de junho de 1919 inaugura-se o imponente edifício, terminando, assim, a prolongada fase de transferências do colégio, agora confortavelmente instalado no centro da cidade. Projetado especialmente para abrigar a Escola Normal, o edifício em estilo II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 Neoclássico segue os padrões higienistas da época, presando por grandes quantidades de aberturas para garantir a ventilação dos espaços. Conservatório Estadual De Música Juscelino Kubitschek De Oliveira Em 1951, o governador de Minas Gerais da época, Juscelino Kubitschek de Oliveira, baixou um ato criando seis Conservatórios Estaduais de Música que deveriam ser instalados em regiões distintas do Estado, Pouso Alegre foi uma das cidades contempladas. O então Conservatório foi inaugurado no dia 30 de maio de 1954 pelo então governador de Minas Gerais Juscelino Kubitschek, teve três dias de festas para comemorar a abertura da escola. A princípio a escola funcionava em um imóvel alugado na Praça João Pinheiro, nº 114, que pertencia ao patrimônio da Associação de Proteção à Infância (API). O Início das atividades foram em setembro de 1954 quando aconteceu a primeira seleção de candidatos a alunos. As aulas começaram em fevereiro do ano seguinte contando com pouco menos de 40 alunos. A primeira apresentação dos alunos do Conservatório em público ocorreu no dia 4 de junho de 1956 em uma audição geral para todos os pousoalegrenses. O Conservatório realizou diversos festivais de música e arte, entre eles, em 1968, o primeiro Festival de Música Erudita (Festival Debussy) e o Concurso Nacional de Piano, trazendo à cidade músicos e professores de diversas localidades, como São Paulo e Paraná, e de outros países, como Rússia, Alemanha e França. (Borges, pag. 40) Com o crescente número de alunos, em 1978, após 24 anos funcionando na Praça João Pinheiro, o Conservatório foi transferido parcialmente para o prédio na Rua Francisco Sales, dividindo o espaço com a Escola Estadual Ana Augusta de Faria e também o curso pré-vestibular do Colégio Anglo. O ginásio e os cursos técnicos passaram a funcionar na nova sede, mas o primário musical continuava as suas atividades no prédio da Praça João Pinheiro, nesta data o Conservatório já possuía 1.529 alunos. O Doloroso Incêndio Em março de 1987 o Conservatório enfrentou um grande desastre, um incêndio criminoso começou na madrugada do dia 9 e resultou em grande perda material e simbólica para a cidade. Quem primeiro notou o incêndio foi o vigia, ao escutar barulhos de explosões, II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 avistou algumas chamas na entrada do prédio. Também estava no edifício o professor de violino Dalton Ferreira Nunes, que havia vindo de Campinas e encontrava-se instalado no segundo andar da construção. Ambos acionaram a polícia para dar início a tentativa de apagar as chamas. Figura 3: Foto do interior do edifício após o incêndio. Fonte: Museu Municipal Tuany Toledo O fogo se espalhou rápido por todo prédio que possuía assoalho de madeira. Muitos ex-alunos e moradores próximos ajudaram na retirada de instrumentos enquanto os bombeiros tentavam diminuir as chamas, contaram também com a ajuda do 14º Grupo de Artilharia de Campanha do Exército e 20º batalhão de Polícia Militar. Infelizmente, antes que conseguissem acabar com as chamas, a água do carro de bombeiro se esgotou e foi preciso retirar água do Rio Mundo, que ficava a 2,5km de distância do local. Nesse espaço de tempo o fogo alastrou-se por todo o assoalho de madeira, cortinas e instrumentos. O incêndio destruí todo assoalho do 2° piso e do 3°, queimou o telhado, história, instrumentos musicais, arquivos. A memória da escola que estava registrada em livros de atividades, onde continha todos os trabalhos anuais, bem como um arquivo iconográfico, II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 contendo mais de 700 fotografias, desde a sua criação, foram todas consumidas pelo fogo. Aproximadamente 100 atividades desenvolvidas, desde a inauguração do Conservatório até o ano de 1978 foram perdidas. Dos 20 pianos, 4 deles foram queimados. O prejuízo ficou em torno de cinco milhões de Cruzados. Sabe-se que o incêndio foi criminoso, porém até hoje o caso não foi solucionado a ponto de identificar o autor do crime. A primeira hipótese era de o incêndio ter iniciado por um curto-circuito, no entanto, no ambiente onde se iniciou o fogo havia apenas um interruptor de luz e este se encontrava no lado oposto do local que iniciara as chamas. A fiação toda foi examinada e não foi encontrado nada irregular. O relatório assinado pelo delegado Carlos Eduardo Pinto, com data de 15 de julho de 1987 ficou bem claro que o incêndio foi criminoso, causado por uma substância inflamável. A Reconstrução e Restauração O incêndio causou muitas perdas lastimáveis, dezenas de instrumentos musicais, registros, documentos, memorias importantes. O edifício permaneceu com as fachadas intactas, por algumas fotografias cedidas pelo Museu Municipal Tuany Toledo1, percebe-se que as paredes internas permaneciam “em pé”, porém sem revestimento, os assoalhos de madeira dos pisos superiores foram totalmente queimados, como também todo telhado e a escada de madeira maciça que dava acesso aos demais pavimentos. Também pelas fotos percebe-se que algumas salas de aula do piso térreo não foram atingidas pelo fogo. Segundo informações fornecidas pela arquiteta Daniela Guilherme2, docente do curso Técnico Design de Interiores, as últimas duas salas do pavimento térreo do corredor direito, permanecem com sua configuração inicial sendo os pisos, paredes, janelas e portas originais anteriores ao incêndio. 1 O Museu Municipal Tuany Toledo cedeu de forma digital as fotografias do conservatório após solicitação via e- mail. 2 As informações fornecidas pela arquiteta Daniela Guilherme foram cedidas em conversa informal no dia 1/11/2017. II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 O incêndio causou grande comoção nos moradores de Pouso Alegre, para arrecadar fundos para a restauração do prédio foram realizadas diversas festas como a tradicional Caipiarte. Muitos comerciantes e empresas locais fizeram doações através de uma campanha organizada pela Associação do Médio Sapucaí. A reconstrução do prédio começou devagar em 1988, com projeto de restauração doado pelos arquitetos Marcos Vilas Boas e Roduvaldo Vono Carneiro. (XAVIER,2016. Pag. 22 ) Figura 4: Conservatório Estadual de Música Juscelino Kubitschek de Oliveira, estado atual do edifício feita em novembro de 2017 pela autora. Acervo pessoal da autora. Em entrevista informal com Marcos Vilas Boas, o arquiteto contou que foi convidado a participar do projeto pelo arquiteto Roduvaldo que havia recebido da diretora do conservatório na época, Wilma Andery, o pedido para o desenvolvimento do projeto arquitetônico. Nas palavrasde Marcos Vilas Boas “O fogo destruiu tudo, mas foi tudo mesmo destruído... só sobraram as paredes e mais nada... e o reboco externo, de resto, por dentro, tudo destruído”. (Vilas Boas, 2017) Segundo o arquiteto, no projeto de reconstrução, haviam proposto uma rampa para acesso aos pavimentos superiores, prevista para ser implantada no local das “saletas” de II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 ensaio no corredor da biblioteca, essas salas seriam transferidas para o então sótão, entre as tesouras do telhado, porém, na obra o projeto foi alterado excluindo a rampa e reconstruindo as pequenas salas de ensaio no mesmo local. “As paredes internas continuaram, apenas algumas foram demolidas e eliminadas, mas 90% foram recuperadas. Quase não haviam estrutura de concreto armado, algumas paredes inferiores sim, havia vigas de ligação para vão maiores e/ou em corredores maiores, de resto, toda a estrutura das paredes eram e foram executadas em argamassas mistas e de barro, na maioria eram em barro o assentamento dos tijolos, estes, os tijolos, é que faziam parte da estrutura, por ser sua forma na época das olarias e o costumeiro de se construir, a composição de tijolos de 14 x 29 x 6,5. ” (Vilas Boas, 2017) Marcos Vilas Boas contou que no projeto novo (depois do incêndio) foram adicionados estrutura de concreto armado para ancorar e segurar as paredes internas que ficaram totalmente comprometidas pelo fogo, foram colocadas as lajes de piso, lajes treliçadas com ferragem adicional. Na proposta do projeto, mantinha-se a execução da escada original em madeira, mas foi feita de concreto na obra. Algumas orientações de gestão do espaço foram alteradas pela própria diretoria da escola como sala diretor, secretaria e atendimento, bem como acesso secundário do conservatório. Sobre as janelas e portas externas: “foram todas reconstruídas... foram feitos os desenhos de toda a fachada lá na calçada, copiado e por fotos executadas. ” (Vilas Boas, 2017) De acordo com Xavier, 2016, o edifício sofreu algumas alterações quando se deu o início a restauração. Forma elaborados os projetos elétrico, hidráulico e telefonia para se adequar as necessidades da escola de música. A entrada principal, que antes ficava entre a secretaria e biblioteca, passou a ser usada como sala de direção, além disso, o auditório foi modificado sendo invertido a posição do palco, os camarins passaram a ocupar a sala onde II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 antes funcionava a supervisão, as poltronas foram trocadas pela do antigo cinema da cidade, Cine El Dourado. No local onde funciona a sala de direção, no segundo piso, transformou-se em banheiros para os professores. Os pisos do segundo e terceiro pavimentos, anteriormente de assoalhos de madeira foram substitutos por lajes de concreto. A escada que antes era toda de madeira, atualmente é de mármore e somente o corrimão de madeira, além desta, foi implantada uma nova escada para acesso aos pisos superiores. Em uma comparação entre duas fotografias do edifício, uma sem data registrada, porém ainda com a denominação de Escola Normal, ou seja, anterior a 1975, e outro registrada em novembro de 2017, podemos identificar somente alteração da porta principal na fachada. Somente em 1993, após 6 anos do incêndio, foram liberadas as verbas do Estado de Minas Gerais para finalização da obra. No ano seguinte, em 10 de setembro o Conservatório foi reinaugurado com uma festa com apresentação de musicais, bancas, homenagens e exposições de quadros doados por artistas da cidade. Algumas outras modificações foram realizadas no prédio, porém não é possível afirmar que fazem parte da restauração de década de 1990, sendo algumas visivelmente novas como a implantação de porta de vidro colocada recentemente entre a entrada de funcionários e o corredor das salas de aula. A construção do prédio anexo com 10 salas de aulas, implantação de cobertura translucida e cobertura metálica nos corredores laterais, algumas salas foram subdivididas e foi retirado o do jardim que ocupava o pátio com duas árvores Paineiras, atualmente há somente uma árvore no pátio. Características Arquitetônicas Segundo o laudo técnico de tombamento (1999), o edifício é caracterizado como estilo arquitetônico Neoclássico e detalhes barrocos em seu interior. Nesse trabalho não será feito uma classificação de qual estilo arquitetônico o edifício segue, mas sim dar atenção adequada a sua morfologia, elementos e detalhes. Construído em 1918 pelo arquiteto paulista Mario Gissoni e a construção supervisionada por engenheiros do exército, tem 3.943 m2 de área construída. Foi projetado II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 para abrigar 300 moças em regime de internato na Escola Normal Santa Dorothéa, o prédio segue princípios higienistas característicos da época, pensando em melhor ventilação e insolação dos ambientes é vasto em aberturas e varandas. Uma arquitetura voltada para educação que se preocupará com a organização do espaço escolar. O terreno foi estrategicamente escolhido com localização privilegiada, ao alto com vista para toda cidade. Inicialmente com três pavimentos, era uma construção imponente, marcava seu significado no tecido urbano contribuindo para a composição de uma paisagem urbana que expressava o requinte dos materiais e elementos arquitetônicos importados, principalmente da Europa. A planta em formado de L forma um pátio, que anteriormente ajardinado, dava acesso a Capela Santa Dorothéa construída em 1926 para servir de apoio ao ensino religioso da Escola Normal. Atualmente, o edifício e a capela são separados por um muro. O pátio é uma clara influência dos antigos mosteiros onde era principal local de socialização, porém sempre “vigiado” pelas janelas altas do prédio. As paredes externas do prédio possuem espessuras diferentes em cada pavimento, característica comum das construções da época, no primeiro pavimento as paredes externas são de 80cm de espessura, no segundo 60cm e no terceiro 40cm. Os ambientes possuem pé direito alto, entre 3,45m e 4,20m. A cobertura é feita em estrutura de madeira e telhas tipo francesas. Construído no alinhamento das ruas, possui dois “braços” tangenciados pela fachada principal. Quatro portas externas dão acesso ao prédio, cada uma com duas folhas de madeira com visor protegido por grades, no alto das portas, bandeira com caixilho de vidro. No segundo pavimentos, as portas dão acesso a sacadas em balaústre vazadas sustentadas por elementos decorativos, guisas de mão francesa. Acima das portas há elementos decorativos retangulares. As janelas do primeiro pavimento são tipo de porão de guilhotina de duas folhas protegidas por grades metálicas, no segundo e terceiro pavimentos as janelas possuem peitoril baixo, aproximadamente 40cm, são em guilhotina de três folhas, atualmente II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 protegidas com grades metálicas devido ao peitoril baixo. São emolduradas por faixas em alto relevo, abaixo e acima, arabescos e elementos decorativos geométricos. As colunas são destacadas da fachada com elementos que se alargam na altura das sacadas, no alto do segundo e terceiro pavimento uma faixa em alto relevo com detalhes decorativos fitomorfos, circulares e arabescos, vão unindo as janelas em todas fachadas do edifício. No alto da cobertura, mãos francesas decorativas apoiam um beiral proeminente frisado que se alonga portoda extensão das fachadas, duas colunetas limitam beiral em arco em três elementos vazados, no centro se insere um globo pleno e em cima um medalhão. Tombamento O edifício onde hoje funciona o Conservatório Estadual de Música JKO é parte importante na história da cidade, como já mencionado, foi o primeiro colégio para atender moças que de Pouso Alegre e região, tem em sua história um incêndio que comoveu toda população e hoje é um dos maiores Conservatórios de música de Minas Gerais, faz parte do acervo arquitetônico da cidade por ser um edifício imponente e significativo. O processo de tombamento teve início logo após sua reinauguração, após a restauração do prédio, em 1995, pela prefeitura municipal de Pouso Alegre. Foram feitos laudos técnicos para avaliar as condições dos elementos como piso, paredes, pintura e estrutura. Em 1999, o prédio é tombado como patrimônio histórico e arquitetônico, feito pelo Decreto nº 2348/1999 de 06/04/1999 assinado pelo então prefeito Jair Siqueira. Curiosidades O arquiteto Mário Gissoni era um profissional de renome na cidade, já havia realizado construções expressivas, onde, diversas delas, hoje, são tombadas e consideradas Patrimônio da cidade de Pouso Alegre, como por exemplo: o Colégio Estadual Professor José Marques de Oliveira, o Palácio Episcopal, o Fórum, entre outros. II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 Posteriormente, denominou-se Conservatório Estadual de Música de Pouso Alegre (CEMPA), retornando à denominação de origem de acordo com a Lei N.º 8.709, de 24 de outubro de 1984, publicada no MG de 25 de outubro de 1984, folhas 05, coluna 01. Em 1969, devido aos grandes trabalhos que estavam sendo realizado pelo Conservatório, este foi escolhido como uma das cinco melhores escolas de música do país em 1970. Foi realizada a pesquisa por músicos da rádio Jovem Pan de São Paulo, onde trouxe à escola o título de Conservatório Modelo do Estado e o Cartão de Prata, como Estabelecimento do Ano. Além de vários conjuntos de câmara e bandas, o Conservatório mantém uma Big Band, uma camerata de cordas, duas orquestras (Orquestra Experimental e Orquestra de violões); mantém diversos corais e grupos teatrais (infanto-juvenis, adultos e da terceira idade); promove mostras e exposições de artes visuais, decoração; e mantém programas de integração cultural, realizando eventos oferecidos à sociedade de toda região. (Borges,2008. pag.39) Considerações Finais A história de uma cidade também pode ser contada através da história de suas arquiteturas, assim como, podemos conhecer a sociedade e modos de vida da época. O edifício do Conservatório Estadual de Música JKO tem grande valor histórico e cultural para a cidade, em utilização até hoje, o patrimônio foi palco para músicos, instrumentistas e cantores. Levando-se em conta o que foi estudado, podemos ressaltar que a reconstrução tentou manter ao máximo a arquitetura original respeitando fielmente a fachada que possui diversos adereços típicos das construções da década de 20. Por mais que o edifício se apresente em bom estado de preservação ainda assim necessita de muitos cuidados. Sendo tombado municipalmente como patrimônio histórico o prédio tem seu valor reconhecido, grande apreço da população da cidade, alunos e Ex alunos, porém, ao visitar a escola percebe-se as marcas do tempo, o edifício se encontra em situação precária por mal- uso, as paredes e pisos com revestimentos desgastados, sujas e com pichações. Após 23 II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 anos de sua reinauguração, entende-se que é necessário realizar uma restauração do prédio, priorizando a preservação de sua arquitetura e características que dão beleza ao edifício e mostram sua importância para o município. Em conversa informal com arquiteta docente da escola, pode-se perceber que está em andamento o processo para uma possível reforma. Ao se estudar o projeto, pode-se identificar algumas alterações no pátio, a implantação de um anexo, retirada do “palco” de apresentações externas e acréscimo de banheiros e rampas para alunos com necessidades especiais. É necessário que haja uma preocupação sobre como essa reforma será realizada, se está será feita respeitando o patrimônio e suas características e principalmente, respeitando sua história. O edifício que traz grande alegria a cidade, ainda mantem suas atividades, mesmo passando por diversos empecilhos durante as décadas, o Conservatório forma diversos alunos todos os anos e atrai filas de próximos candidatos e amantes da arte musical. Diferente de que estamos acostumados e ver com imponentes arquiteturas históricas que, ao se tornar patrimônio também se tornam museus ou são destinados a utilidades diferentes, o Conservatório mantem sua função de educacional. É necessário que prédios históricos não percam sua função dentro da sociedade, a restauração e conservação devem ser diários mas para ser arquitetura deve-se ter uma função, para não se tornarem apenas monumentos. II Simpósio Científico do ICOMOS Brasil Belo Horizonte/MG - de 25 a 28/04/2018 Referências 1. BALBINO, Antônio Gilberto. História e Memória Do Instituto Santa Dorotéia De Pouso Alegre Mg -1911-1976. Universidade São Francisco. 2. BORGES, Alvaro Henrique. Abordagens Criativas: Possibilidades Para O Ensino/Aprendizagem Da Música Contemporânea. São Paulo, 2008. Dissertação - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Instituto de Artes 3. MUSEU HISTÓRICO MUNICIPAL TUANY TOLEDO. Conservatório Estadual de Música Juscelino Kubitschek de Oliveira. Disponível em:< http://museutuanytoledo.blogspot.com.br/2012/05/conservatorio-estadual-de- musica.html> Acesso em: outubro, 2017. 4. SANCHES, William; CASTRO, Luciene F. Memórias que um incêndio não destruiu. Pouso Alegre – MG, 2003. Apoio cultural Prefeitura de Pouso Alegre. 5. XAVIER, Tamires Mayara Lopes. Conservatório Estadual de Música Juscelino Kubitschek de Oliveira. Poços de Caldas, 2016, Monografia - Pontifícia Universidade Católica campus Poços de Caldas.
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