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OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS APÓS A EMENDA 
Nº45/2004: SUA DENÚNCIA (PARCIAL OU TOTAL) E OS REQUISITOS E 
PROCEDIMENTOS DE TRAMITAÇÃO LEGISLATIVA PARA FINS DE APROVAÇÃO 
NOS TERMOS DO § 3º DO ARTIGO 5º DA CONSTITUIÇÃO 
 
 
Ana Carolina De Almeida Tannuri Laferté 
Advogada da União 
 Tatiana Zuconi Viana 
 Advogada 
RESUMO: Pretende-se, no presente trabalho, discorrer sobre os tratados 
internacionais de direitos humanos, à vista dos §§ 2º e 3º do artigo 5º da Constituição 
da República, notadamente as implicações desses dispositivos constitucionais com a 
denúncia (parcial ou total) desses tratados e os requisitos e os procedimentos de 
tramitação legislativa a serem observados para fins de aprovação do tratado 
internacional de direitos humanos como emenda constitucional. 
PALAVRAS-CHAVE: Tratados internacionais de direitos humanos. Emenda 
Constitucional nº 45/2004. Denúncia. Aprovação como emenda constitucional. 
Procedimentos. Tramitação legislativa. 
ABSTRACT: It is intended, in this work, discuss international treaties on human 
rights, in view of paragraphs 2th and 3th of Article 5th of the Federal Constitution, 
especially the implications of these constitutional provisions with the denunciation of 
these treaties and the requirements and procedures for the legislative procedure to be 
followed for approval of the international human rights treatu as a constitutional 
amendment. 
 
KEY WORDS: International human rights treaty. Constitutional amendment n. 
45/2004. Denunciation. Approval as a constitutional amendment. Procedures. 
Legislative procedure. 
SUMÁRIO: 1 Dos tratados internacionais; 2 Dos 
tratados de direitos humanos e sua recepção na 
ordem interna; 3 Tratados internacionais de direitos 
humanos após a Emenda Constitucional n° 45/2004; 
4 Denúncia de tratados de direitos humanos pelo 
Presidente da República; 5 Processo Legislativo para 
aprovação de tratados internacionais de direitos 
humanos sob a nova ordem introduzida pela Emenda 
Constitucional n. 45/2004 
1 DOS TRATADOS INTERNACIONAIS 
Os tratados internacionais são acordos celebrados de forma escrita entre Estados 
(Convenção de Viena, art. 2º, 1º, letra a) e destinados a produzir efeitos jurídicos não 
só na ordem internacional, como também na ordem interna dos signatários. No 
entanto, somente podem produzir efeitos na ordem interna após a ela incorporados 
mediante ato complexo dos Poderes Executivos e Legislativo. 
A negociação e assinatura do tratado internacional é de competência privativa do 
Presidente da República (art. 84, inc. VIII, da CF). Ao Legislativo incumbe a tarefa de 
controle desse ato (art. 49, inc. I da CF), através da apreciação e aprovação – total ou 
parcial – do tratado, mediante edição de decreto legislativo. Por fim, mas não menos 
importante, o tratado somente terá vigência e eficácia após ratificação do Presidente 
da República, expedindo, logo após, decreto presidencial, por meio do qual é conferida 
publicidade. 
Assim, ao Legislativo 
 
 
[...]é atribuída a incumbência de examinar, uma vez consumada a 
celebração do ato pelo Presidente, se tal decisão pode ser mantida, em 
nome do interesse nacional. A harmônica coordenção entre os Poderes 
Legislativo e Executivo da União, nesse assunto, decorre de preceito 
constitucional inscrito no art. 21, I, segundo o qual compete à União 
‘manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações 
internacionais’
1
. 
E isto constitui tendência característica das Constituições contemporâneas, onde 
a constitucionalidade da ratificação latu sensu (ratificação pelo Poder Executivo + 
aprovação pelo Poder Legislativo) é indispensável. Como se percebe, por conseguinte, 
estamos diante de um procedimento complexo dos poderes da União, onde, para a 
formalização dos tratados, participam sempre o Legislativo e o Executivo. 
A propósito, Resek assinala que a “assunção de um compromisso externo 
repousa sobre a vontade conjugada dos dois poderes políticos. A vontade 
individualizada de cada um deles é necessária, porém não suficiente”.
2
 
2 DOS TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS E SUA RECEPÇÃO NA ORDEM 
INTERNA 
De forma geral, entende-se que os tratados internacionais se inserem na ordem 
normativa em equivalência às leis ordinárias. Contudo, no caso de tratados que 
consagrem direitos humanos paira há muito discussão quanto a sua posição na ordem 
normativa, considerando a pirâmide Kelseniana. 
A Constituição Federal, desde sua promulgação, dispõe no § 2º do art. 5º que 
“os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes 
do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a 
República Federativa do Brasil seja parte”. 
A partir do texto desse dispositivo, quatro correntes interpretativas buscaram 
definir a hierarquia dos tratados de direitos humanos no ordenamento jurídico interno, 
são elas: 
a) a hierarquia supraconstitucional destes tratados; b) a hierarquia 
constitucional; c) a hierarquia infraconstitucional, mas supralegal; e d) a paridade 
hierárquica entre tratado e lei federal.3 
Na doutrina, merece destaque a tese segundo a qual os tratados internacionais 
de direitos humanos são recepcionados com status de norma materialmente 
constitucional, embora sob o aspecto formal não o sejam. Segundo Flávia Piovesan
4
, 
inova a Carta de 1988 
ao incluir, dentre os direitos constitucionalmente protegidos, os direitos 
enunciados nos tratados internacionais de que o Brasil seja signatário. 
Ao efetuar tal incorporação, a Carta está a atribuir aos direitos 
internacionais uma hierarquia especial e diferenciada, qual seja a de 
norma constitucional. 
Já o Supremo Tribunal Federal, até recentemente, entendia que os tratados 
internacionais de direitos humanos eram recepcionados no ordenamento interno com 
 
1 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito internacional: tratados e direitos humanos fundamentais na ordem jurídica brasileira. Rio 
de Janeiro: América Jurídica, 2001, p. 165. 
2 RESEK, Francisco. Congresso Nacional e tratados. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Brasília, v. 75, n. 1, p. 74-81, jan-
março/2009. 
3 PIOVESAN, Flávia. Reforma do judiciário e direitos humanos. In TAVARES, Ramos. LENZA, Pedro. ALARCÓN, Pietro de Jesús 
Lora (Coord.). Reforma do judiciário analisada e comentada. São Paulo: Método, 2005, p. 67-81. 
4 I biderm, p. 69-70. 
 
 
 
status de lei ordinária. Essa era a posição majoritária entre os ministros da Corte 
desde a ordem constitucional anterior, conforme acórdão proferido no RE nº 
80004/SE, Relator Ministro Xavier de Albuquerque, julgado em 01/06/1977, litteris: 
Convenção de Genebra, Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas 
Promissórias - aval aposto a nota promissória não registrada no prazo 
legal - impossibilidade de ser o avalista acionado, mesmo pelas vias 
ordinárias. Validade do decreto-lei nº 427, de 22.01.1969. Embora a 
convenção de genebra que previu uma lei uniforme sobre letras de 
câmbio e notas promissórias tenha aplicabilidade no direito interno 
brasileiro, não se sobrepõe ela às leis do país, disso decorrendo a 
constitucionalidade e consequente validade do dec-lei nº 427/69, que 
institui o registro obrigatório da nota promissória em repartição 
fazendária, sob pena de nulidade do título. Sendo o aval um instituto 
do direito cambiário, inexistente será ele se reconhecida a nulidade do 
título cambial a que foi aposto. Recurso extraordinário conhecido e 
provido. 
Na vigência da atual Constituição, o entendimento jurisprudencial sobre a 
recepção dos tratados internacionais com status de lei ordinária foi confirmado nos 
julgamentos do HC 72.131-1/RJ e da ADI-MC nº 1.480/DF, sendo que, nesta ação 
direta de inconstitucionalidade,firmou-se o entendimento de que qualquer tratado de 
direito internacional, seja ele de direitos humanos ou não, ingressa no ordenamento 
interno no mesmo patamar das leis ordinárias, a elas se equiparando
5
. 
Merece destaque, entretanto, a posição externada pelo Ministro Sepúlveda 
Pertence que, apesar de não admitir a hierarquia constitucional dos tratados de 
direitos humanos, passou a aceitar o status supralegal desses instrumentos
6
, 
conforme se extrai do voto proferido por ocasião do julgamento do RHC 79.785-RJ. 
3 TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS APÓS A EMENDA 
CONSTITUCIONAL N° 45/2004 
Presente a controvérsia doutrinária e jurisprudencial a respeito da recepção dos 
tratados internacionais de direitos humanos, afirma a doutrina que a inclusão, pela 
Emenda Constitucional nº 45/2004, do § 3º ao art. 5º da Carta “pretendeu por termo 
às discussões relativas à hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos 
no ordenamento jurídico pátrio”
7
. 
Segundo Eliane Meira Barros de Oliveira
8
, a introdução do parágrafo 3° ao artigo 
5° da Carta Magna, promovida pela Emenda Constitucional n. 45/2004, foi pensada a 
partir de audiência pública na qual o Ministro Celso de Mello anotara sua preocupação 
em garantir aos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil fosse 
signatário status de norma constitucional, à semelhança do que estabelece a 
Constituição da Argentina, a partir da reforma de 1994. 
Com efeito, pode-se afirmar que o Poder Constituinte Reformador pretendeu, 
com esse dispositivo, atribuir aos tratados internacionais de proteção dos direitos 
humanos que sejam aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, 
 
5 ADI-MC n. 1480: “Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no 
sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias, 
havendo, em conseqüência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa.” 
6 Registre-se, ainda, que o Ministro chegou a reconhecer a supremacia constitucional dos tratados de direitos fundamentais firmados 
pelo Brasil antes da Carta de 1988, conforme se infere do voto proferido por ocasião do julgamento da ADI-MC nº 1675. 
7 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito internacional público: parte geral. 4 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 
101. 
8 OLIVEIRA, Eliane Meira Barros de. Tratado de direitos humanos e a Constituição: análise do impacto jurídico do acréscimo do 
parágrafo 3° ao artigo 5° da Constituição Federal. Brasília: Instituto Brasiliense de Direito Público- IDP, 2005. 109 p. 
 
 
por três quintos dos votos dos respectivos membros, equivalência às emendas 
constitucionais. Consequentemente, passam a ter status de norma formal e 
materialmente constitucional. Mas, e os demais tratados de direitos humanos? 
Em relação a esses tratados, firmou entendimento o Supremo Tribunal Federal, 
no RE 466.343/SP
9
, no sentido de que os tratados internacionais de direitos humanos 
adentram a ordem interna com uma posição diferenciada, com status supralegal, mas 
infraconstitucional. A propósito, confira-se trecho elucidativo do voto do Ministro 
Gilmar Mendes no referido julgado: 
Portanto, diante do inequívoco caráter especial dos tratados 
internacionais que cuidam da proteção dos direitos humanos, não é 
difícil entender que a sua internalização no ordenamento jurídico, por 
meio do procedimento de ratificação previsto na Constituição, tem o 
condão de paralisar a eficácia jurídica de toda e qualquer disciplina 
normativa infraconstitucional com ela conflitante. 
Nesse sentido, é possível concluir que, diante da supremacia da 
Constituição sobre os atos normativos internacionais inciso LXVII) não 
foi revogada pelo ato de adesão do Brasil ao Pacto Internacional, a 
previsão constitucional da prisão civil do depositário infiel (art. 5º, dos 
Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre 
Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), mas 
deixou de ter aplicabilidade diante do efeito paralisante desses tratados 
em relação á legislação infraconstitucional que disciplina a matéria, 
incluídos o art. 1.287 do Código Civil de 1916 e o Decreto-Lei nº 911, 
de 1º de outubro de 1969. 
Tendo em vista o caráter supralegal desses diplomas normativos 
internacionais, a legislação infraconstitucional posterior que com eles 
seja conflitante também tem sua eficácia paralisada. É o que ocorre, 
por exemplo, com o art. 652 do Novo Código Civil (Lei nº 
10.406/2002), que reproduz disposição idêntica ao art. 1.287 do 
Código Civil de 1916. 
O principal fundamento desse novo posicionamento jurisprudencial evidencia-se 
na “abertura cada vez maior do Estado constitucional a ordens jurídicas 
supranacionais de proteção de direitos humanos”
10
. Com efeito, aponta o Ministro 
Gilmar Mendes 
[...]uma tendência contemporânea do constitucionalismo mundial de 
prestigiar as normas internacionais destinadas à proteção do ser 
humano. Por conseguinte, a partir desse universo jurídico voltado aos 
direitos e garantias fundamentais, as constituições não apenas 
apresentam maiores possibilidades de concretização de sua eficácia 
normativa, como também somente podem ser concebidas em uma 
abordagem que aproxime o Direito Internacional do Direito 
Constitucional. 
Tomando-se esse entendimento da Suprema Corte como premissa para o 
raciocínio que passaremos a desenvolver, tem-se, então, a partir desse julgamento, a 
seguinte situação: 
i) tratados internacionais que não são de direitos humanos são recepcionados na 
ordem interna com status de lei ordinária; 
ii) tratados internacionais de direitos humanos são recepcionados na ordem 
interna com status supralegal, ou seja, estão entre a Constituição e a lei ordinária; 
 
9 RE 466.343/SP, Relator Ministro Cezar Peluso, julgado em 03/12/2008. 
10 Ministro Gilmar Mendes, por ocasião do voto proferido no RE 466.343/SP. 
 
 
iii) tratados internacionais de direitos humanos aprovados nos termos do § 3º do 
art. 5º da Carta da República equivalem a emendas constitucionais e, portanto, têm 
status formal e material de norma constitucional. 
Nesse ponto, rechaçamos a tese segundo a qual os tratados de direitos 
fundamentais, de acordo com a regra do § 2º do art. 5º da Constituição, seriam 
normas materialmente constitucionais, pois, em virtude da inserção do § 3º ao art. 5º, 
a leitura que se extrai é a de que o Poder Constituinte derivado deliberou que as 
normas internacionais que protegem direitos humanos somente alcançariam status 
constitucional mediante procedimento solene e com quorum mais qualificado. 
Se a doutrina discutia sobre possível intenção do Poder Constituinte originário de 
conceder às normas internacionais de direitos humanos status Constitucional, o Poder 
Constituinte derivado, ao trazer preceito expresso que exige processo legislativo 
diferenciado para tal fim, estancou a divergência
11
. 
No mesmo sentido, aliás, leciona Cármen Tibúrcio que 
O texto introduzido pela emenda, atualmente em vigor, não deixa 
dúvidas: os tratados internacionais sobre direitos humanos têm a 
mesma hierarquia das emendas constitucionais, desde que obedecido o 
quorum privilegiado de aprovação dessas. 
De qualquer forma, embora aparentemente essa posição contrarie a nova 
tendência de Constitucionalismo
12
, denominada por Marcelo Neves de 
Transconstitucionalismo, a Suprema Corte temperou os efeitos de tal retração, ao 
agasalhar, no RE 466.343/SP, o entendimento de que tais normas teriam status 
supralegal, ou seja,na pirâmide Kelseniana, um degrau abaixo da Constituição 
Federal, quando não observado o procedimento previsto no §3° do art. 5° da 
Constituição Federal. 
Estas conclusões têm implicações diretas com o exercício da competência do 
Presidente da República para denunciar
13
 os tratados internacionais de que o Brasil 
seja signatário. É sobre o que se passa a discorrer. 
4 DENÚNCIA DE TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS PELO PRESIDENTE DA 
REPÚBLICA 
A prática brasileira atual em matéria de denúncia de tratados internacionais 
encontra fundamento no inciso VII do art. 84 da Lei Maior, que inclui entre as 
competências privativas do Presidente da República manter relações com Estados 
estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos
14
. 
 
11 TIBÚRCIO, Carmem. A EC n. 45 e temas de direito internacional. In Reforma do Judiciário: primeiros ensaios críticos sobre a Ec. 
45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 121-139. 
12 Cf. Lilian Baltmant Emerique e Sidney Guerra: “Caso contrário, o poder reformador teria apenas estatuído um procedimento que 
trouxe maior complexidade (quorum qualificado) para internalização dos tratados internacionais sobre direitos humanos, diluindo 
os dispositivos contidos no §§1° e 2° do art. 5° da Constituição de 1988 e indo na contramarcha do pensamento hodierno sobre o 
caráter especial dos tratados internacionais sobre direitos humanos, uma vez que mais e mais se observa o aumento da abertura do 
Estado constitucional a ordens jurídicas supranacionais de proteção aos direitos humanos”. In Revista Jurídica, Brasília, v. 10, n. 
90, Ed. Esp., p. 01-34, abr./maio, 2008. Disponível em www.planalto.gov.br/revistajurídica. Acesso em 28/04/2010. 
13 “Denúncia dos tratados: entende-se por denúncia o ato unilateral pelo qual um partícipe em dado tratado internacional exprime 
firmemente sua vontade de deixar de ser parte no acordo anteriormente firmado. Difere da ab-rogação justamente pelo fato de ser 
levada a efeito unilateralmente por uma determinada parte no tratado, e não pela totalidade delas. Trata-se de forma de extinção do 
tratado pela vontade unilateral do Estado-parte”. MAZZUOLI, Valério. Direito internacional público. 4ª ed. São Paulo: Revista dos 
Tribunais, 2008, p.67. 
14 “Neste sentido, a denúncia, como ato pelo qual o Brasil informa a parceiros internacionais que não mais deseja se manter vinculado 
a determinado compromisso consagrado na forma de tratado, é da alçada do Poder Executivo. Cabe destacar que não existe norma, 
nem na Constituição Federal nem em outro diploma legal, que sequer disponha explicitamente sobre a denúncia dos tratados, 
estabelecendo a forma como a autoridade brasileira deverá proceder no âmbito interno para tomar as medidas necessárias para a 
sua implementação.” PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. A possibilidade da denúncia de tratados de direitos humanos no Brasil 
 
 
Por outro lado, da sistemática posta extraem-se duas categorias possíveis de 
tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento jurídico pátrio: os que 
possuem status supralegal e, portanto, não foram aprovados nos termos do § 3º do 
art. 5º da Carta
15
, e os que são equivalentes às emendas constitucionais, uma vez 
que sejam aprovados na forma desse dispositivo constitucional. 
Ocorre que a aprovação na forma do § 3º do art. 5º da Lei Maior acarreta, 
inexoravelmente, reforma constitucional, ou seja, o tratado passa a integrar, 
formalmente, inclusive, o texto constitucional. Sendo assim, entendemos, como Flávia 
Piovesan16, que esses tratados não podem ser denunciados. Confira-se: 
Já os tratados material e formalmente constitucionais não pode ser 
objeto de denúncia. Isto porque os direitos neles enunciados 
receberam assento no texto constitucional, não apenas pela matéria 
que veiculam, mas pelo grau de legitimidade popular contemplado pelo 
especial e dificultoso processo de sua aprovação, concernente à 
maioria de três quintos dos votos dos membros, em cada Casa do 
Congresso Nacional, em dois turnos de votação. Ora, se tais direitos 
passaram a compor o quadro constitucional, não só no campo material, 
mas também formal, não há como admitir que um ato isolado e 
solitário do Poder Executivo subtraia tais direitos do patrimônio popular 
– ainda que a possibilidade de denúncia esteja prevista nos próprios 
tratados de direitos humanos ratificados, como já apontado. 
Também Francisco Resek17 entende que 
Não haverá quanto a semelhante tratado a possibilidade de denúncia 
pela só vontade do Executivo, nem a de que o Congresso force a 
denúncia mediante lei ordinária (v. adiante o § 53), e provavelmente 
nem mesmo a de que se volte atrás por meio de uma repetição, às 
avessas, do rito da emenda à Carta, visto que ela mesma se declara 
imutável no que concerne a direitos dessa natureza. 
De outra forma, uma vez que terão status supralegal os tratados de direitos 
fundamentais que não se submeterem ao rito específico do § 3º do art. 5º da Carta, 
não sendo, portanto, normas constitucionais – nem sob o aspecto formal, nem sob o 
aspecto material –, entendemos que não haverá óbice à denúncia desses instrumentos 
internacionais, até porque a denúncia é própria aos tratados internacionais, tanto que 
costumam ser previstas no próprio instrumento. 
Cabe apontar que está sob julgamento no Plenário do Supremo Tribunal Federal, 
a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1625, proposta pela Central Única dos 
Trabalhadores – CUT, em que se questiona violação ao art. 49, I, da Carta da 
República, em razão da denúncia da Convenção da OIT n° 158, promovida pelo 
Presidente da República através do Decreto n. 2.100/1996. 
O julgamento da referida ação teve início em 02.10.2003, quando os Ministros 
Maurício Corrêa – Relator – e Carlos Britto se manifestaram pela procedência parcial 
da ação para, emprestando interpretação conforme ao art. 49, I, da Carta, determinar 
que a denúncia da Convenção 158 da OIT condiciona-se ao referendo do Congresso 
Nacional, a partir do que produz sua eficácia plena. Também já apresentaram seus 
votos os Ministros Nelson Jobim e Joaquim Barbosa, sendo o primeiro pela 
improcedência, e o segundo pela procedência total da ação. O julgamento foi adiado 
 
e o Congresso Nacional. Disponível em: <http://www.esmarn.org.br/ojs/index.php/revista_teste/article/viewFile/17/3>. Acesso em: 
28/04/2010. 
15 Cabe ressaltar que no RE 466.343/SP o Plenário do STF se manifestou apenas sobre os tratados incorporados a ordem interna em 
momento anterior à edição da Emenda Constitucional n. 45/2004. Carmem Tibúrcio salienta a possibilidade de, mesmo após o 
advento da referida Emenda Constitucional, a deliberação não obter o quorum qualificado, o que implicaria na admissão do tratado 
internacional com status de lei ordinária. TIBÚRCIO, Carmem. AEC n. 45 e temas de direito internacional. In: Reforma do 
Judiciário: primeiros ensaios críticos sobre a Ec. 45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 121-139. 
16 PIOVESAN, op. cit., p. 74. 
17 RESEK, op. cit. 
 
 
em razão de pedido de vista da Ministra Ellen Gracie, na sessão plenária de 
03.06.2009. 
5 PROCESSO LEGISLATIVO PARA APROVAÇÃO DE TRATADOS 
INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS SOB A NOVA ORDEM 
INTRODUZIDA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 45/2004 
Em momento anterior à edição da EC n. 45/2004, Valério Mazzouli
18
 e Francisco 
Resek
19
 discorrem, com maestria, sobre o procedimento legislativo para aprovação ou 
recusa de um tratado internacional assinado pelo Presidente da República. 
Não há, contudo, qualquer ato normativo, seja lei stricto sensu ou estabelecidono Regimento Interno das Casas do Congresso Nacional, que regule a tramitação de 
tratado internacional de direitos humanos, considerando a nova ordem instituída pela 
EC n. 45/2004. 
Para Resek
20
: 
Não é de crer que o Congresso vá doravante bifurcar a metodologia de 
aprovação dos tratados sobre direitos humanos. Pode haver dúvida 
preliminar sobre a questão de saber se determinado tratado configura 
realmente essa hipótese temática, mas se tal for o caso o Congresso 
seguramente adotará o rito previsto no terceiro parágrafo, de modo 
que, se aprovado, o tratado se qualifique para ter estatura 
constitucional desde sua promulgação – que pressupõe, como em 
qualquer outro caso, a ratificação brasileira e a entrada em vigor no 
plano internacional. 
Já Pedro Lenza
21
: 
Entendemos, pela regra do art. 49, I (que não poderá ser desprezada), 
continua sendo o decreto legislativo o ato pelo qual o Congresso 
Nacional, no procedimento de incorporação dos tratados internacionais, 
resolve definitivamente sobre os tratados e convenções internacionais 
sobre direitos humanos. Veja que a nova regra não diz que o 
procedimento deverá ser o das Emendas, mas que, cumpridas as 
formalidades, equivalerão às Emendas. 
Em geral, têm-se, assim, dois posicionamentos divergentes quanto ao processo 
legislativo a que se refere o § 3º do art. 5º da Carta. Uma parte da doutrina que 
entende que, a partir da EC n. 45/2004, os tratados de direitos humanos devem ser 
submetidos apenas uma vez à deliberação do Congresso Nacional, já com o quórum 
qualificado para aprovação ou não como emenda. A outra parte entende que os 
tratados devem ser submetidos, num primeiro momento, para fins do art. 49, I, da 
Carta e, somente após ratificado e facultativamente, para fins de sua aprovação como 
emenda constitucional. 
Para nós, a posição de Manoel Jorge e Silva Neto é a mais acertada. Entende o 
doutrinador como obrigatório o “início da apreciação legislativa acerca do tratado 
sobre direitos humanos de acordo com o processo constitucionalmente estabelecido 
para emendas.”
22
. Frise-se: apenas o início da apreciação, pois o Parlamento não se 
 
18 MAZZUOLLI, op. cit. 
19 RESEK, op. cit. 
20 RESEK, op. cit. 
21 LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2009. 
22 NETO, Manoel Jorge e Silva. Devido processo legislativo e aprovação de tratados internacionais sobre direitos humanos. Disponível 
em: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 29/04/2010. 
 
 
encontra vinculado à aprovação da medida como emenda constitucional, o que não 
obsta à posterior ratificação do tratado, havendo aprovação com quórum simples. 
Com efeito, se se tratasse apenas de uma faculdade a submissão do tratado ao 
rito do § 3º do art. 5º da Carta, “ter-se-ia uma alteração constitucional sem qualquer 
utilidade, pois sempre pôde o CN aprovar, como emenda constitucional, novo direito 
fundamental, incorporando-o ao rol trazido pela Constituição de 1988”
23
. 
Dessa forma, entendemos que a iniciativa desse específico processo legislativo 
será do Presidente da República, pois a ele compete celebrar tratados, nos termos do 
84, VIII, da Lei Maior. Nesse contexto, o Presidente da República, ao firmar um 
tratado, envia uma mensagem ao Congresso Nacional, com o texto do instrumento e 
exposição de motivos do Ministro das Relações Exteriores
24
, restando deflagrado o 
processo legislativo, o qual deve seguir os trâmites estabelecidos no art. 60 da 
Constituição. 
Resta um esclarecimento, com relação ao início da tramitação. Nesse ponto, 
recorremos a André Ramos Tavares, que afirma que 
As votações sobre tratados ou convenções de direitos humanos 
deverão ter início na Câmara dos Deputados, aplicando-se a regra de 
que o Senado á a Casa iniciadora apenas quando a proposta provenha 
dos próprios senadores.
25
 
Cumpre registrar, por derradeiro, que se encontra em tramitação na Câmara dos 
Deputados o Projeto de Resolução n. 204, de 2005, que propõe alteração no 
Regimento Interno da Casa para adequá-lo ao conteúdo da Emenda Constitucional n. 
45/2004. De acordo com o Projeto, a iniciativa de dar ao tratado internacional 
tramitação equivalente a de emenda constitucional será da Casa ou do Presidente da 
República, e a norma a ser editada será decreto legislativo, com processo de 
tramitação equivalente ao da emenda constitucional. 
 
23 TAVARES, André Ramos. Reforma do Judiciário no Brasil pós-88.Des/estruturando a Justiça. São Paulo: Saraiva, 2005 
24 Idem, p. 45. 
25 Ibidem, p. 45.

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