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DISTROFIA MUSCULAR DE DUCHENNE GENÉTICA: A DMD tem uma incidência de cerca de um a cada 3.300 meninos nativivos, com uma taxa de mutação calculada de 10-4, uma ordem de grandeza maior do que a observada em genes envolvidos na maioria das outras doenças genéticas. De fato, dada a produção de cerca de 8 × 107 espermatozóides por dia, um homem normal produz um espermatozóide com uma nova mutação no gene DMD a cada 10 a 11 segundos! É um distúrbio recessivo ligado ao X típico que é letal nos homens, de modo que se prevê que um terço dos casos é de mutantes novos e dois terços dos pacientes têm mães portadoras. A grande maioria das mulheres portadoras não apresenta manifestações clínicas, embora cerca de 70% apresentem um nível levemente elevado de creatinina-quinase sérica. Entretanto, de acordo com a inativação aleatória do cromossomo X, o cromossomo X normal parece ser inativado em uma proporção crítica de células em alguns heterozigotos do sexo feminino; cerca de 19% das mulheres portadoras adultas apresentam alguma fraqueza muscular, e 8% apresentam miocardiopatia com risco de vida e incapacidade muscular proximal grave. Em raros casos, foram descritas mulheres com DMD; algumas têm translocações X; autossomo; outras têm apenas um cromossomo X (síndrome de Turner) com mutação da DMD neste cromossomo, e um grupo raro consiste em gêmeas monozigóticas heterozigóticas. A PROTEÍNA: A distrofina é uma proteína estrutural que ancora um grande complexo protéico na membrana celular. O complexo protéico distrofina é uma verdadeira constelação de polipeptídeos associados a distrofias musculares geneticamente distintas (Fig. 12-20). A composição deste complexo pode variar significativamente dependendo das isoformas da proteína, da própria distrofina ou de outros componentes, particularmente os sarcoglicanos, que estão presentes. O complexo distrofina executa várias funções principais. Primeiro, acredita-se que seja essencial para a manutenção da integridade da membrana muscular, por ligar o citoesqueleto de actina à matriz extracelular. Segundo, por ser necessária para posicionar as proteínas no complexo e assim fazê-las funcionarem corretamente. Por exemplo, o complexo distrofina é necessário na junção neuromuscular para a localização apropriada da acetilcolina durante o desenvolvimento. O complexo também pode conter canais de íons e moléculas de sinalização, sugerindo a sua participação no reconhecimento célula-célula ou célulasubstrato. Embora a função de várias proteínas do complexo seja desconhecida, sua associação a doenças musculares indica que estas proteínas são componentes essenciais do complexo. Portanto, as mutações em muitas das proteínas no complexo glicoprotéico da distrofina são responsáveis por formas recessivas autossômicas de distrofias semelhantes à DMD, distrofias musculares das cinturas dos membros e outras distrofias musculares. As cinco doenças resultantes de mutações nas glicosil-transferases, em que a perda de função resulta em hipoglicosilação do α-distroglicano, são de especial interesse. O fato de cinco proteínas serem necessárias para as modificações pós-traducionais de um outro polipeptídeo atesta a importância destas modificações para o funcionamento normal da maioria das proteinases para a natureza crítica da glicosilação na função do α-distroglicano em particular. PATOGENIA: O DMD codifica a distrofina, uma proteína intracelular que é expressa predominantemente nos músculos lisos, esqueléticos e cardíacos, assim como em alguns neurônios do cérebro. No músculo esquelético, a distrofina é parte de um grande complexo de proteínas associadas ao sarcolema que conferem estabilidade a ele. As mutações em DMD que causam a doença incluem grandes deleções (60% a 65%), grandes duplicações (5% a 10%), e pequenas deleções, inserções ou mudanças no nucleotídeo (25% a 30%). A maior parte das grandes deleções acontece em 1 de 2 pontos quentes. As mudanças no nucleotídeo ocorrem por todo o gene, predominantemente nos dinucleotídeos CpG. Mutações de novo aparecem com freqüência parecida durante a ovogênese e a espermatogênese; a maior parte das grandes deleções de novo aparece durante a ovogênese, enquanto a maior parte das mudanças no nucleotídeo de novo aparece durante a espermatogênese. As mutações que provocam um fenótipo nulo da distrofina causam uma doença muscular mais grave em comparação com a provocada por alelos DMD mutantes que expressam uma distrofina parcialmente funcional. Uma correlação genótipo-fenótipo compatível não foi definida para a incapacidade intelectual. FENÓTIPO E HISTÓRIA: A DMD é uma miopatia progressiva resultando em degeneração e fraqueza musculares. Começando com os músculos da cintura dos quadris e os flexores do pescoço, a fraqueza muscular envolve progressivamente a cintura dos ombros e os músculos dos membros distais e tronco. Quase 95% dos pacientes com DMD têm algum comprometimento cardíaco (cardiomiopatia dilatada ou anomalias eletrocardiográficas, ou ambas), e 84% têm esse comprometimento comprovado na autópsia. A insuficiência cardíaca crônica se desenvolve em quase 50% dos pacientes. Raramente, a insuficiência cardíaca é a queixa apresentada pelos pacientes com DMD. Embora a distrofina esteja presente também no músculo liso, as complicações nessa musculatura são raras. Estas incluem dilatação gástrica e paralisia do íleo e da bexiga. Os pacientes com DMD têm um QI médio de aproximadamente um desvio-padrão abaixo da média, e aproximadamente um terço tem algum grau de retardamento mental. A base deste problema não foi estabelecida. Os meninos acometidos são normais até 1 ou 2 anos de vida, mas desenvolvem fraqueza muscular entre os 3 e 5 anos de idade, quando começam a apresentar dificuldades para subir escadas e levantar-se da posição sentada. A criança é confinada a uma cadeira de rodas por volta dos 12 anos de idade e é improvável que sobreviva além dos 20 anos de idade. Os pacientes morrem por insuficiência respiratória ou, porque o músculo cardíaco também é acometido, de insuficiência cardíaca. Nos estágios pré-clínicos e precoces da doença, o nível sérico de creatinina-quinase está muito elevado (50 a 100 vezes acima do limite normal) por causa da sua liberação do músculo doente. O cérebro também é afetado; em média, ocorre uma diminuição modesta do QI em cerca de 20 pontos. Ocorre também a pseudo-hipertrofia das panturrilhas de um menino de 8 anos de idade com distrofia muscular de Duchenne devida à substituição de tecido muscular normal por tecido conjuntivo e gordura. HOMENS: Embora se manifeste ocasionalmente no período neonatal com hipotonia ou retardo no crescimento e desenvolvimento, os pacientes do sexo masculino geralmente apresentam anomalias na marcha entre os 3 e os 5 anos de idade. Aos cinco anos de idade, a maior parte dos pacientes utiliza a manobra de Gowers e tem pseudo-hipertrofia na panturrilha, ou seja, um aumento da panturrilha devido à substituição do músculo por tecido adiposo e conjuntivo. Aos 12 anos de idade a maior parte dos pacientes está confinada a uma cadeira de rodas e já tem ou está desenvolvendo contraturas e escoliose. A maioria morre por insuficiência pulmonar e pneumonia. A idade média de morte é de 18 anos. MULHERES: A idade de início e a gravidade da DMD em mulheres dependem do grau de desvio da inativação do X. Se o cromossomo X que carrega o alelo mutante de DMD estiver ativo na maior parte das células, as mulheres desenvolverão sinais de DMD; se o cromossomo X que carrega o alelo normal de DMD estiver predominantemente ativo, as mulheres terão pouco ou nenhum sintoma da DMD. Independentemente dos sintomas clínicos de fraqueza no músculo esquelético, a maior parte das mulheres portadoras tem anomalias cardíacas, como cardiomiopatia dilatada, dilatação do ventrículo esquerdo, e alterações eletrocardiográficas. DIAGNÓSTICO: O diagnóstico da DMD baseia-se na história familiar e na análise de DNA ou biópsia do músculo para testar a imunorreatividade para distrofina.O diagnóstico da distrofia muscular de Duchenne envolve a triagem por deleções e duplicações por um procedimento conhecido como reação em cadeia da polimerase (PCR) multiplex. Com a utilização de um conjunto de iniciadores que amplificam várias regiões do gene em uma única reação, o DNA do paciente é analisado quanto à ausência de bandas ou presença de bandas aberrantes em um gel de eletroforese. A detecção precisa de portadores e o diagnóstico pré-natal com técnicas moleculares modernas estão disponíveis para a maioria das famílias com histórico de DMD. Em 60% a 70% das famílias em que a mutação resulta de deleção ou duplicação, a presença ou ausência do defeito pode ser identificada pelo exame do DNA fetal por reação em cadeia da polimerase simples ou quantitativa multiplex. Em outras famílias, as mutações de ponto podem ser identificadas pelo seqüenciamento da região codificadora e nos limites íntronéxon. O gene DMD apresenta um tamanho grande que torna o seqüenciamento caro e demorado, mas o seqüenciamento automatizado é um teste médico economicamente praticável. Naquelas famílias em que a análise direta não identifica uma mutação, marcadores ligados permitem o diagnóstico pré-natal com 95% de precisão. O principal obstáculo na detecção do portador e diagnóstico pré-natal é que os métodos atuais são restritos para famílias com histórico de DMD. A doença apresenta uma alta freqüência de novas mutações e manifesta-se em uma minoria de mulheres portadoras, por isso, aproximadamente 80% dos meninos com DMD nascem em famílias sem histórico prévio da doença. Portanto, a incidência de DMD não aumentará substancialmente até que seja possível uma triagem pré-natal universal para a doença. TRATAMENTO: Atualmente, não existem tratamentos para curar a DMD, embora o melhor tratamento sintomático tenha aumentado a longevidade média do fim da infância para o começo da idade adulta. Os objetivos da terapia são: retardo da progressão da doença, manutenção da mobilidade, prevenção e correção das contraturas e da escoliose, controle do peso, e otimização do funcionamento pulmonar e cardíaco. A terapia com glicocorticóides pode atrasar a progressão da DMD por alguns anos. Algumas terapias experimentais, incluindo a transferência gênica, estão sob investigação. A maioria dos pacientes necessita também de um acompanhamento extenso para lidar com os efeitos psicológicos de ter uma doença crônica e fatal. RISCO DE HERANÇA: Um terço das mães que têm um único filho afetado não é portadora da mutação no gene da DMD. A determinação do estado de portador permanece difícil, entretanto, porque os métodos moleculares atualmente disponíveis não detectam pequenas alterações tais como as mudanças de nucleotídeo. A determinação do risco de portador em famílias sem deleções ou duplicações identificáveis se baseia na análise de ligação, nos níveis séricos seriados de creatina quinase, e na expressão em mosaico da distrofina em amostras da biópsia do músculo (devido à inativação aleatória do cromossomo X). A informação sobre o risco de recorrência deve levar em conta o alto índice de mosaicismo na linhagem germinativa (aproximadamente 14%). Se uma mãe é portadora, cada filho tem 50% de risco de ter DMD e cada filha tem 50% de risco de herdar a mutação em DMD. Refletindo a natureza aleatória da inativação do cromossomo X, as filhas que herdam a mutação em DMD têm um baixo risco de desenvolver DMD; no entanto, por razões não entendidas completamente, seu risco de anomalias cardíacas pode ser da ordem de 50% a 60%. Se uma mãe, segundo o teste de DNA, aparentemente não é uma portadora, ela, ainda assim, tem um risco de aproximadamente 7% de ter um menino com DMD devido ao mosaicismo na linhagem germinativa. A informação e possivelmente um diagnóstico pré-natal são indicados para estas mães. DISTROFIA MUSCULAR DE BECKER A distrofia muscular de Becker (DMB) também é decorrente de mutações no gene da distrofina, mas os alelos Becker produzem um fenótipo bem mais brando. Considera-se que os pacientes têm DMB se eles ainda estiverem andando aos 16 anos de idade. Existe uma variabilidade significativa na progressão da doença e alguns pacientes continuam andando por vários anos. Em geral, os pacientes com DMB são portadores de alelos mutantes que mantêm a fase de leitura da proteína e, portanto, expressam alguma distrofina, embora frequentemente seja um produto alterado e em níveis reduzidos. A presença de distrofina no músculo de pacientes com DMB geralmente é demonstrável tanto transferência por Western quanto por imunofluorescência. Em contraste, os pacientes com DMD apresentam pouca ou nenhuma distrofina detectável por ambos os métodos.