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PONTO 10 - consumidor

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PONTO 10
DIREITO ECONÔMICO E DIREITO DO CONSUMIDOR: Convenção coletiva de consumo
1. Previsão legal
TÍTULO V
Da Convenção Coletiva de Consumo
Art. 107. As entidades civis de consumidores e as associações de fornecedores ou sindicatos de categoria econômica podem regular, por convenção escrita, relações de consumo que tenham por objeto estabelecer condições relativas ao preço, à qualidade, à quantidade, à garantia e características de produtos e serviços, bem como à reclamação e composição do conflito de consumo.
 § 1° A convenção tornar-se-á obrigatória a partir do registro do instrumento no cartório de títulos e documentos.
 § 2° A convenção somente obrigará os filiados às entidades signatárias.
 § 3° Não se exime de cumprir a convenção o fornecedor que se desligar da entidade em data posterior ao registro do instrumento.
 Art. 108. (Vetado).
2. A convenção coletiva de consumo (noções gerais)
Uma das atividades previstas pelo Código de Defesa do Consumidor, de iniciativa empresarial e associativo/empresarial,são as chamadas convenções coletivas de consumo,previstas pelo art. 107do Código de Defesa do Consumidor.
Embora se cuide de um instrumento importantíssimo, no que concerne ao pragmatismo e, sobretudo, à prevenção de conflitos de relações de consumo, lamentavelmente tem sido pouquíssimo, ou quase nada utilizado. 
Esse importante instrumento foi claramente inspirado nas chamadas convenções das categorias econômicas e convenções de marca, instituídas pela chamada Lei das Concessionárias de Automóveis, ou Lei Ferrari(Lei n. 6.729/1979).
A ideia dos redatores do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor foi exatamente a de dotar as entidades que o representam, de um lado, e as que assumem responsabilidade pelos fornecedores, de poderes no sentido de convencionarem questões, sobretudo polêmicas, advindas das relações de consumo, por analogia com a lei das concessionárias de automóveis.
Tome-se o exemplo da chamada obsolescência de produtos de consumo duráveis,notadamente os produtos eletrodomésticos e eletroeletrônicos.
O art. 32 do Código do Consumidor diz, por exemplo, que “os fabricantes e importadores deverão assegurar a oferta de componentes e peças de reposição enquanto não cessar a fabricação ou importação do produto.”E seu parágrafo único complementa essa ordem de idéias, estabelecendo que “cessadas a produção ou importação, a oferta deverá ser mantida por período razoável de tempo, na forma da lei”.
Ora, mas que período razoável é esse, quando não houver leis específicas --- em sentido lato (e.g., normas técnicas) são bastante escassas, no que diz respeito, por exemplo, à durabilidade mínima de uma lâmpada elétrica ( “x” horas) ---?
O período razoável, por conseguinte, poderia perfeitamente ser cuidado em cláusula de convenção coletiva de consumo, já que o dispositivo do Código de Defesa do Consumidor é bem mais restritivo do que a lei de concessionárias. Isto é, a convenção somente pode dizer respeito a condições relativas a: a) preço; b) qualidade; c) quantidade; d) garantia e características; e) reclamações; e f) composição de conflitos de interesses,mediante, em última análise, recurso ao juízo arbitral, tal qual a referida lei de concessionárias de veículos.
Observe-se também que o referido dispositivo consumerista reza que somente as entidades civis de consumidores - excluídas, por conseguinte, os órgãos públicos congêneres que já têm a prerrogativa de firmarem o compromisso de ajustamento de conduta, ex vi do disposto no art. 113 do Código de Defesa do Consumidor, que acrescentou um § 6º ao art. 5º da Lei nº 7.347/1985, a saber: “Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromissos de ajustamento de sua conduta ás exigências legais, mediante combinações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial”---, é que poderão participar das convenções coletivas de consumo. E, do outro lado, da parte dos fornecedores, as associações terão legitimidade as suas associações ou sindicatos de categoria econômica respectiva. O requisito, por outro lado, do registro da convençãotem o fito de torná-la obrigatória e pública.Importante ainda salientar que a referida convenção tutela interesses manifestamente coletivos, stricto sensu,na medida em que somente obrigará os filiados às entidades signatárias.Ou, na linguagem do próprio código, quanto aos efeitos da coisa julgada coletiva, a avença ou convenção terá efeitos ultra partes, e não erga omnes.
Relevante salientar, por outro lado, que conforme o dispositivo sob comento, o fornecedor que se desligar da entidade em data posterior ao registro do instrumento, não se eximirá de cumprir a convenção.
3. Questões interessantes
- Polo dos consumidores
Não parece haver uma ligação direta entre o artigo 107e o artigo 82, IV, do Código de Defesa do Consumidor, que exige da entidade civil pelomenos um ano de existência para o ajuizamento de uma demanda judicial. Opróprio artigo 82, IV, afirma que a legitimação concorrente ali estabelecida entre MinistérioPúblico, entes públicos e associações com um ano de existência somente se aplica “paraos fins da defesa coletiva a ser exercida em Juízo”. 
- Ausência de entidade de representação de consumidor.
Não parece haver espaço de manobra para os consumidores na hipótese deinexistência de entidades civis organizadas para sua defesa: a Convenção Coletiva deConsumo não poderá ser levada adiante. O artigo 107 exige expressamente que apenasaquelas entidades poderão negociar e concretizar o instrumento ora em estudo. Não seabriu espaço para os consumidores partirem sozinhos para a negociação e tampoucoparece ser o caso de aplicação analógica da Consolidação das Leis do Trabalho, cujo art. 617 prevê, sob certascircunstâncias, a assinatura de Convenção Coletiva pelos próprios interessados, sem aentidade de representação.
- Múltiplas entidades civis 
Desde logo, observe-se que o artigo 107 se valeu da expressão entidades civis deconsumidores no plural, o que permite concluir que não houve uma preocupação deescolha ou de prioridade, como acontece no direito trabalhista.
Qualquer entidade, desde queformalmente constituídas para a defesa dos interesses dos consumidores, poderádesempenhar o papel que o artigo 107 lhes reserva. Há plena concorrência entre todasquantas houver na região e, ademais, nada existe a obrigá-las à negociação. 
- Polo dos fornecedores
As associações de fornecedores concorrem com igualdade com os sindicatos dascategorias econômicas para a participação da mesa de negociações de ConvençãoColetiva de Consumo, ou seja, podem firmar lado a lado, e devem, acima de tudo, deixarsuas divergências em segundo plano, sob pena de inviabilizar a importante ferramenta deaprimoramento das relações de consumo.
Sobre o tema, vale falar sobre a possibilidade de desfiliação dasentidades signatárias como forma de “escapar” dos efeitos da Convenção Coletiva deConsumo. Pode parecer uma ironia e uma fraude estimulada pelo legislador, mas acombinação dos dois parágrafos finais do art. 107 revela que o consumidor, se quiser,pode ignorar a Convenção Coletiva de Consumo, bastando que se desligue daorganização signatária do texto, ao passo que o fornecedor não pode deixar de lado anorma, ainda que se desfilie de sua associação ou de seu sindicato econômico. Será essadiscrepância inconstitucional?
Há quem entenda que somente o princípio da tutela do consumidor, assim entendido como a parte mais vulnerável da relaçãode consumo, pode justificar tal tratamento excepcional, para desprestígio da vontade dantesmanifestada por meio de representação legítima.
Para alguns (por exemplo, Fabio Ulhoa Coelho) o direito de associação consagrado peloart. 5º, XVII, da Constituição Federal de 1988 inclui necessariamente o direito de nãoassociação, desse modo, quandoo parágrafo terceiro do art. 107 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que “nãose exime de cumprir a convenção o fornecedor que se desligar da entidade em dataposteriorao registro do instrumento” existe uma afronta à liberdade de não se associar. 
De outro lado, há quem pondere que o parágrafo terceiro emmomento algum tolhe o direito de não se associar. Ao contrário, sustentam que ele prevê essa hipótesenitidamente (“o fornecedor que se desligar”), mas apenas cria regra no sentido de queaquelas condições negociadas para as relações de consumo (naquele período e naquelelocal) sejam respeitadas em qualquer hipótese. 
- Natureza jurídica 
Em matéria de direito do trabalho, em que o tema já vem sendo há muito tempopesquisado, aduz Amauri Mascaro Nascimento a existência de três concepções sobre a natureza jurídica dasconvenções coletivas: concepção contratual (caráter obrigacional),concepção regulamentar(não se criam situações jurídicas subjetivas, mas apenas modelos de estipulação contratualindividual), e concepção mista (caráter contratual quanto à formação e regulamentar quantoaos efeitos).
Daí ser mais correta, salvo melhor juízo, a concepção de que a convençãocoletiva é um ato normativo, servindo de modelo à contratação individual, esta sim denatureza eminentemente obrigacional. Em outras palavras, ausentes os contratosindividuais, será nenhuma a eficácia da convenção coletiva; e tanto isto é verdade que,conforme o Professor Carlos Alberto Bittar (in Direitos do Consumidor, ForenseUniversitária, 4ª edição, página 109), somente após o descumprimento da convençãocoletiva - o que apenas poderá verificar-se na prática das relações de consumo -, é que terãocabimento as ações de cumprimento.

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